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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO
Instituto de Bioquímica Médica
Educação, Gestão e Difusão de Biociências
Marina Verjovsky de Almeida Ribeiro de Souza
ESTUDOS DE CASO:
DIFERENTES VISÕES SOBRE OS MICRORGANISMOS
TESE SUBMETIDA À UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO VISANDO
A OBTENÇÃO DO GRAU DE MESTRE EM QUÍMICA BIOLÓGICA, SUB-ÁREA EM
EDUCAÇÃO, GESTÃO E DIFUSÃO DE BIOCIÊNCIAS
Rio de Janeiro
2009
I
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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO
Instituto de Bioquímica Médica
Educação, Gestão e Difusão de Biociências
Marina Verjovsky de Almeida Ribeiro de Souza
ESTUDOS DE CASO:
DIFERENTES VISÕES SOBRE OS MICRORGANISMOS
Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Química
Biológica, Sub-área em Educação, Gestão e Difusão de Biociências, do Instituto de
Bioquímica Médica, Universidade Federal do Rio de Janeiro, como parte dos
requisitos necessários à obtenção do grau de Mestre em Química Biológica.
Orientadora: Drª Vivian Mary Barral Dodd Rumjanek
Co-orientadora: Drª Claudia Jurberg
Rio de Janeiro
2009
II
Souza, Marina Verjovsky de Almeida Ribeiro de.
Estudo de caso: diferentes visões sobre os
microrganismos / Marina Verjovsky de Almeida Ribeiro de
Souza. – Rio de Janeiro: UFRJ / IBqM, 2009.
Xi, 167 f. : il. ; 1 cm
Orientadora: Vivian Mary Barral Dodd Rumjanek
Co-orientadora: Claudia Jurberg
Dissertação (Mestrado) - Universidade Federal do Rio de
Janeiro, Instituto de Bioquímica Médica / Programa de Pósgraduação em Química Biológica, Modalidade Educação,
Gestão e Difusão em Biociências, 2009.
Referências bibliográficas: f. 158-167.
1. microrganismos. 2. patogênicos. 3. benéficos.
4.concepções populares. 5. divulgação científica. 6. jornalismo
científico. I. Rumjanek, Vivian Mary Barral Dodd; Jurberg,
Claudia. II. Universidade Federal do Rio de Janeiro, Instituto
de Bioquímica Médica, Programa de Pós-graduação em
Química Biológica, Modalidade Educação, Gestão e Difusão
em Biociências. III. Título.
III
Marina Verjovsky de Almeida Ribeiro de Souza
Estudo de caso: diferentes visões sobre os microrganismos
Instituto de Bioquímica Médica,
Subárea em Educação, Gestão e Difusão em Biociências
Rio de Janeiro, ....... de ....................... de 2009
_____________________________________
Orientadora: Profª. Vivian Mary Barral Dodd Rumjanek, Professora Titular do Instituto de
Bioquímica Médica da Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ.
_____________________________________
Co-orientadora: Dra. Claudia Jurberg, Tecnologista da Fundação Oswaldo Cruz – Fiocruz.
_____________________________________
Prof ª. Débora Foguel, Professora Associada do Instituto de Bioquímica Médica, da
Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ.
_____________________________________
Prof. Alexandre Soares Rosado, Professor Adjunto do Instituto de Microbiologia Professor
Paulo de Góes, UFRJ.
_____________________________________
Dra. Lacy Varella Barca de Andrade, Gerente de Documentação e Pesquisa da Associação de
Comunicação Educativa Roquette-Pinto - ACERP, TVE BRASIL.
_____________________________________
Revisor/Suplente interno: Prof. Franklin Rumjanek, Professor Titular do Instituto de
Bioquímica Médica da Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ.
_____________________________________
Suplente externo: Profª. Ângela Hampshire de Carvalho Santos Lopes, Professora Adjunta do
Instituto de Microbiologia Professor Paulo de Góes, UFRJ.
IV
À minha família,
Com muito carinho.
V
Agradecimentos
Em primeiro lugar, gostaria de agradecer às minhas orientadoras, Vivian Rumjanek e Claudia
Jurberg, que acolheram a idéia deste trabalho, ao qual dedicaram seu tempo, atenção e
carinho. Também as agradeço pelos valiosos ensinamentos, que contribuem dia-a-dia para a
minha formação profissional e pessoal.
Também agradeço especialmente à Dra. Ottília Mitidieri, que participou decisivamente nos
rumos deste trabalho, além de tornar os dias mais agradáveis, com sua alegria inerente e
singular.
Obrigada aos queridos Tião e Jacqueline, pelo carinho, e, junto com André e Paulinho,
quebrarem todos os galhos possíveis.
À Nathalia, pela ótima companhia durante o mestrado, e ao Gabriel, que começa essa jornada
agora, nos contaminando com suas risadas e empolgação.
Obrigada à Graça e Clarissa, pelos papos animados e caronas; à Luciana, que será uma ótima
professora da Uff (e nos privará do seu descontraído convívio) e à Sandra, que nas idas e
vindas da Paraíba nos trás alegria e saudades.
Ao Flávio, Raphael, Alessandra, Paula e Mariana, pela prosa boa. Ao Eduardo, que, além
disso, compartilha seu tempo vago dos experimentos em nos salvar na luta diária contra as
máquinas.
Agradeço à Juliana e Fernanda (que levou sua empolgação à Inglaterra), pela afável
convivência.
Ao Tiago, Renata, Maria, Matheus, Kelly, Bruna e os alunos do Ines, que contribuem - cada
qual de sua maneira - para um ambiente sempre agradável.
Aos meus colegas de pós-graduação, pelas conversas, amizade e ajudas fundamentais.
Ao Fábio Gouveia e Sonia Mano, do Museu da Vida (Fiocruz), pelas ajudas metodológicas e
pela ferramenta de análise.
Obrigada aos meus pais, Pery e Sonia, que me apoiaram e torceram pelo meu sucesso e deste
trabalho, assim como toda a família, nos momentos tristes e felizes que ele permeou.
Ao meu amor, Matias, que se casou comigo durante o desenvolvimento deste estudo,
contribuindo com mimos, refeições saborosas e muita paciência, até nas horas mais difíceis.
Aos meus sogros, Stella e Alejandro, e suas famílias, que me acolheram com muito carinho e
também me apoiaram nesta jornada.
Agradeço aos microbiologistas que participaram espontaneamente deste trabalho, aos jovens
que também nos forneceram suas idéias e aos professores e escolas que o permitiram.
Ao Instituto de Bioquímica Médica e seu corpo de docentes e funcionários, pela oportunidade,
ensinamentos e auxílio.
E, finalmente, agradeço ao CNPq, pelo auxílio financeiro, que me permitiu realizar este
trabalho (e sobreviver a ele).
VI
“Desde que observei esses Animalúculos e comuniquei sua presença a outras pessoas, nós
nunca pudemos nos saturar de olhar tais criaturas tão magníficas.”
Carta de Anton Van Leeuwenhoek à Royal Society de Londres, em 28 de junho de 1713.
VII
Resumo
Na tentativa de averiguar as visões acerca dos microrganismos, distribuímos um questionário
a 107 alunos de 7ª série de três escolas do Ensino Fundamental do Estado do Rio de Janeiro
(duas particulares da Zona Sul e um Ciep de São Gonçalo). Os alunos responderam o que são
micróbios, bactérias, fungos, protozoários, vírus e vermes/helmintos. A partir das respostas,
concluímos que muitos destes jovens costumam associar todos os microrganismos a doenças
(especialmente os vírus e bactérias) ou sujeira. Poucos mostraram saber que alguns
microrganismos podem ser "benéficos". Também enviamos, por correio eletrônico, uma
pergunta a 681 pesquisadores de microbiologia, selecionados aleatoriamente pelo sistema de
busca do Currículo Lattes, do Conselho Nacional de Pesquisa (CNPq). Foi questionado o que
esses pesquisadores acreditam ser importante que a sociedade saiba com relação ao tema.
Obtivemos 143 respostas (21%), com divergentes padrões. A maioria (73,4%) se mostrou
preocupada em alertar a população sobre os perigos dos microrganismos, 64,3% falaram
sobre os micróbios benéficos e 38,5% ressaltaram a importância dos conceitos não atrelados a
alguma utilidade prática. Alguns (32,9%) declararam pré-conceitos, como por exemplo, sobre
a ignorância das pessoas com relação ao tema ou que elas associam todos os micróbios à
patogenicidade. Entretanto, essas categorias se misturaram no discurso, produzindo diferentes
padrões. Por fim, também analisamos uma amostra de 315 matérias veiculadas na internet e
selecionadas em março, abril e maio de 2008 pelo serviço de Alertas do Google. A maioria
(83%) também abordou temas relacionados aos malefícios que podem ser provocados pelos
microrganismos, que prevaleceu em todos os tipos de micróbios abordados. No entanto, os
micróbios em geral, as bactérias e os fungos foram os que obtiveram mais abordagens
favoráveis (21,7%, 15,4% e 13,3% das matérias, respectivamente). Das 315 notícias, 68
(21,6%) abordam resultados de pesquisas científicas e apenas 25 sobre pesquisas brasileiras.
A partir dessa análise, concluímos que, apesar da indiscutível importância histórica e social
dos microrganismos patogênicos, boa parte dos cientistas brasileiros também acredita na
importância dos microrganismos benéficos e que estes devem conquistar mais espaço na
mídia e no conhecimento popular. Porém, isso não se reflete no conhecimento do grupo de
jovens estudado e nas matérias jornalísticas analisadas. Nós acreditamos que estratégias de
divulgação científica direcionadas poderiam colaborar para modificar esse fluxo de
informações na sociedade.
VIII
Abstract
This study aimed to identify some points of views about microorganisms. We distributed a
questionnaire to 107 junior high students from two private and one public school from Rio de
Janeiro State, Brazil. The students answered what they believe to be microbes, bacteria,
fungus, protozoan, virus and worms/helminthes. Based on their answer, we concluded that a
majority of these students used to associate all kind of microorganisms with diseases
(especially virus and bacteria) or dust. Very few of them demonstrated knowledge related to
the existence of some beneficial microorganisms. Also, we mailed a one item questionnaire to
681 microbiologists, selected randomly by Lattes curriculum database, from the National
Research Counseling (CNPq, in Portuguese). We asked them what they believed to be
important to know about microbiology in general society. We got back a 21% of response
(143 researchers), with four different kinds of answers. Most of them (73.4%) mentioned the
importance of dangerous microorganisms‘ alert; 64.3% called attention to the importance of
the microorganisms‘ benefits; 38.5% regarded the importance of a non-practical knowledge
and a few (32.9%) made prejudicial statements about the population knowledge – focusing on
a supposed general ignorance about the theme or in the fact that people only do associate
microbes with pathogens. However, these statements categories are mixed, producing
different patterns. Finally, we analyzed 315 Internet news on microbes. They were selected in
March, April and May of 2008 by the Google Alerts News‘ service. Most of those (83%) also
addressed issues related dangers associated to microbes, which prevailed in all kinds of
microorganisms approached. However, general microbes, bacteria and fungi received the
most favorable association (21.7%, 15.4% and 13.3% of subjects, respectively). Of all 315
reports, 68 (21.6%) dealt with scientific research results of which only 25 reported Brazilian
research. From those analysis we conclude that, despite the pathogenic microorganisms‘
undeniable historic and social importance, a lot of Brazilian scientists also believe in the
importance of dealing with beneficial microorganisms and consider it crucial to get more
space in media and popular knowledge for that manner. On the other hand this is not reflected
by the students‘ knowledge and Internet news content‘s analyzed. We believe that oriented
scientific divulgation strategies could collaborate to change this information flow in society.
IX
Sumário
1 Introdução .................................................................................................................
1.1 Classificação dos organismos .....................................................................
1.2 Os micróbios como causadores de doenças ...............................................
1.2.1 Primórdios do conceito de doença ................................................
1.2.2 A descoberta dos micróbios ...........................................................
1.2.3 A microbiologia no Brasil ..............................................................
1.2.4 Aspectos atuais sobre os micróbios patogênicos ..........................
1.3 Os microrganismos benéficos .....................................................................
1.3.1 Uma história antiga ........................................................................
12
12
14
15
18
26
35
39
40
1.4 Doenças e microrganismos no imaginário popular .................................. 47
1.5 Ciência, saúde, mídia e sociedade .............................................................. 52
2 Objetivos ...................................................................................................................
2.1 Objetivos específicos ...................................................................................
61
61
3 Metodologia ..............................................................................................................
3.1 Questionário dos alunos ..............................................................................
3.1.1 Elaboração ......................................................................................
3.1.2 Métodos de análise .........................................................................
62
63
63
64
3.2 Pergunta aos pesquisadores .......................................................................
3.2.1 Elaboração ......................................................................................
3.2.2 Métodos de análise .........................................................................
3.3 Análise das matérias ...................................................................................
3.3.1 Elaboração ......................................................................................
3.3.2 Métodos de análise .........................................................................
66
66
67
68
68
68
4 Resultados .................................................................................................................
4.1 Idade dos alunos ..........................................................................................
70
70
4.2 Questões respondidas ..................................................................................
4.3 Categorizações das respostas .....................................................................
4.4 Respostas dos alunos ...................................................................................
4.4.1 Doenças ...........................................................................................
4.4.2 Sujeira .............................................................................................
4.4.3 Benefícios ........................................................................................
4.4.4 Seres vivos .......................................................................................
4.4.5 Conceitos complexos ......................................................................
4.4.6 Confusão entre seres ......................................................................
72
76
86
86
89
91
93
95
97
X
4.4.7 Noção de tamanho ..........................................................................
4.4.8 Transmissibilidade .........................................................................
4.4.9 Exemplos certos ..............................................................................
4.4.10 Habitat ..........................................................................................
4.4.11 Análises posteriores .....................................................................
4.4.11.1 Malefícios .........................................................................
4.4.11.2 Micróbios .........................................................................
4.4.11.3 Bactérias ...........................................................................
4.4.11.4 Fungos ..............................................................................
4.4.11.5 Protozoários .....................................................................
99
101
103
105
107
107
109
111
113
116
4.4.11.6 Vírus .................................................................................
4.4.11.7 Helmintos .........................................................................
4.5 Respostas dos pesquisadores ......................................................................
4.5.1 Categorização das respostas ..........................................................
4.6 Análise das matérias ...................................................................................
4.6.1 Principais temas abordados ..........................................................
4.6.1.1 Micróbios ...........................................................................
4.6.1.2 Bactérias .............................................................................
4.6.1.3 Fungos ................................................................................
4.6.1.4 Protozoários .......................................................................
118
120
123
123
130
132
132
133
134
136
4.6.1.5 Vírus ...................................................................................
4.6.1.6 Helmintos ...........................................................................
137
138
5 Discussão e conclusões ............................................................................................. 141
5.1 Sobre a metodologia .................................................................................... 141
5.2 Sobre os resultados ...................................................................................... 142
6 Anexo ......................................................................................................................... 152
7 Referências bibliográficas .......................................................................................
158
XI
1. Introdução
1.1 Classificação dos organismos
A ciência da taxonomia classifica, nomeia e descreve os organismos vivos. Os domínios são
agrupados em reinos, que são subdivididos em filos, classes, ordens, famílias e, por fim, em
gêneros, de acordo com aqueles que compartilham determinadas características comuns –
principalmente genéticas (Pelczar, 1996).
Durante a metade do século XVIII, os organismos vivos foram divididos pelo médico e
botânico sueco Carolus Linnaeus (1707-1778) em dois reinos, Plantae e Animália, descritos
em seus livros ―Systema Natura‖ (de 1735) e ―Systema Plantarum‖ (de 1753) (Haas, 1993).
Em 1866, o zoologista alemão Ernst H. Haeckel (1834-1919) propôs um terceiro reino, o
protista, que incluía os microrganismos com características tanto de plantas como de animais
e incluía bactérias, algas e protozoários (Pelczar, 1996).
Com os avanços da microscopia eletrônica na década de 1940, a descoberta mais evidente das
estruturas internas das células levou a uma nova classificação: as células eucariotas, que
apresentam núcleo separado do citoplasma por uma membrana, estrutura ausente nos
procariotos. Esta classificação separou as bactérias de todos os outros organismos conhecidos
até então (Pelczar, 1996).
Em 1969, o botânico e ecologista Robert H. Whittaker (1920-1980) ampliou esse sistema de
classificação e propôs uma divisão em cinco reinos, com base na forma com que os
organismos obtêm nutrientes (por fotossíntese, ingestão ou absorção de nutrientes dissolvidos
em água). Este sistema é dividido entre os reinos: 1) Monera, do qual fazem parte os
12
procariotos; 2) Protista, pertencente pelos eucariotos unicelulares, como protozoários, algas e
fungos limosos; 3) Plantae, das plantas e algas superiores; 4) Animalia, dos animais que
ingerem alimentos e 5) Fungi, fungos superiores, como leveduras e bolores (Pelczar, 1996).
Na década de 1970, o microbiologista norte-americano Carl Woese (1928-) reconheceu pela
primeira vez o RNA ribossomal como ferramenta útil para determinar as relações
filogenéticas. Com base nesse método, definiu que as arqueobactérias deveriam ser separadas
do reino das bactérias. Assim, criou um sexto reino, Archaea e a tecnologia empregada nesses
estudos tornou-se rotineira (Pelczar, 1996, Madigan et.al., 2004).
Porém, as árvores filogenéticas a partir do RNA ribossomal (rRNA) podem gerar
classificações erradas. Cavalier-Smith (2004) ressalta que isso acontece porque nem sempre
as mudanças no rRNA ocorrem de acordo com a ordem cronológica geral de evolução dos
microrganismos.
Um exemplo é o caso da microsporídia, que ao julgar pelo seu rRNA era classificada no reino
Protozoa, mas análises de inúmeras proteínas e do seu genoma completo mostraram que, na
verdade, faz parte do reino Fungi (Cavalier-Smith, 2004). Assim, a comunidade científica
ficou incerta a respeito do microrganismo Pneumocystis sp. que tem características
morfológicas semelhantes às dos protozoários, mas o RNA ribossomal indicava afinidades
com os fungos (Edman, et.al., 1988). Mais uma vez, as análises de DNA foram utilizadas e
este foi identificado como um fungo (Sritangratanakul, et.al., 2004).
As técnicas moleculares também são muito úteis para a classificação e identificação de
espécies microscópicas ainda desconhecidas. Isso constitui a maioria dos micróbios, pois
13
aqueles que não são cultiváveis em laboratório são pouco conhecidos. A amplificação de
DNA extraído diretamente das amostras ambientais é uma poderosa forma de explorar o
nosso grau de ignorância com relação aos principais grupos de microrganismos. Análises
desse tipo, avaliadas profundamente, mostram que provavelmente não existem novos reinos
ainda ocultos, mas que há uma imensa diversidade de espécies que precisam ser mapeadas
(Cavalier-Smith, 2004).
A definição de microrganismo é também de cunho informal, rotineiramente empregada para
designar grupos de organismos não visíveis a olho nu. Sob o aspecto taxonômico, essa
definição engloba organismos filogeneticamente distintos, incluindo desde organismos
eucariotos, como algas microscópicas, fungos filamentosos, leveduras e protozoários, até
arqueobactérias (Archaea), bactérias e parasitas intracelulares obrigatórios, como os vírus.
Cada um desses grupos apresenta esquemas de classificação e identificação distintos (Manfio,
2000). As subdivisões dos microrganismos encontram-se no Anexo I.
1.2 Os micróbios como causadores de doenças
As histórias da microbiologia e das doenças infecciosas estão intimamente relacionadas.
Embora apenas a minoria dos microrganismos cause doenças, a magnitude da devastação que
esses seres provocaram – e ainda provocam – durante toda a existência do homem é uma
explicação plausível para que os poucos patógenos tenham prevalecido, durante séculos, na
história da disciplina.
O biólogo evolucionista norte-americano Jared Diamond fornece a sua visão sobre o papel
dos micróbios na evolução e dominação entre os povos, em seu livro ―Armas, germes e aço‖
(2001). Ele explica que a produção de alimentos se difundiu em velocidade desigual em
14
lugares diferentes, gerando níveis diversos de poder e riqueza entre distintos povos. Porém, o
contato com os animais também concedeu poder microbiológico aos povos agricultores, pois
muitas guerras foram vencidas não pela qualidade dos exércitos, generais e armas, mas pelos
germes.
―Os humanos que domesticaram animais foram as primeiras vítimas desses
novos germes, mas desenvolveram então uma boa resistência às novas
doenças. Quando esses povos parcialmente imunes entraram em contato com
outros povos, que não tinham sido expostos anteriormente aos germes,
provocaram epidemias em que até 99% da população atingida morria.
Portanto, os germes adquiridos dos animais domesticados tiveram um papel
decisivo nas conquistas européias dos nativos americanos, australianos, sulafricanos, e dos habitantes das ilhas do Pacífico.‖
(Diamond, 2001)
Além disso, enquanto os nômades migravam e deixavam sua sujeira para trás, os agricultores
eram sedentários, o que proporcionou aos micróbios um curto caminho entre uma pessoa
doente e a água que outra usava para beber. Portanto, as doenças de multidão só puderam
surgir a partir da formação das grandes e densas populações humanas, que começou com o
surgimento da agricultura, há cerca de dez mil anos, e depois se acelerou com o nascimento
das cidades, há alguns milhares de anos (Diamond, 2001).
1.2.1 Primórdios do conceito de doença:
O Papiro Ebers, um tratado médico proveniente do Egito, dos mais antigos que se têm notícia,
relata as primeiras referências a uma epidemia (que provocava febres pestilentas semelhantes
à malária) há cerca de 2000 anos a.C. Ainda antes da era cristã, foram descritas diversas
doenças hoje conhecidas como lepra, caxumba, sarampo, catapora, herpes, influenza, etc. No
entanto, é difícil determinar quais microrganismos assolam os seres humanos há mais tempo,
pois a maioria não deixa rastros nos ossos – os restos mortais humanos que perduram por
mais tempo (López-Moreno, Garrido-Latorre & Hernández-Avila, 2000; Ujvari, 2008). No
15
entanto, a bactéria causadora da tuberculose deixa cicatrizes nos ossos da coluna vertebral.
Estas lesões foram encontradas por arqueólogos em diversas múmias egípcias (Ujvari, 2008).
As novas técnicas de biologia molecular, associadas à dedução dos hábitos de vida de
determinadas épocas, mostraram que a tuberculose era comum entre os egípcios em
praticamente toda a sua história, desde aproximadamente 3500 anos a.C. (Zink et al., 2003).
Com essa tecnologia, a mais recente descoberta do tipo foi publicada pelo grupo de
Hershkovitz (2008). Eles identificaram o DNA da bactéria causadora da tuberculose em
fósseis de uma mulher e seu bebê, mortos há nove mil anos e escavados de Alit-Yam, um
antigo vilarejo neolítico localizado na costa de Israel. Este trabalho provou que a doença teria
aparecido pelo menos três mil anos antes do que se imaginava (Hershkovitz, 2008).
O conceito de infecção evoluiu ao longo dos anos e foi atribuído desde a Antiguidade a ―algo
de origem estranha e que ataca o homem‖. Porém, não se conhecia quem eram os agressores,
que foram, portanto, associados por muitos anos a conceitos místicos. Sentimentos de culpa,
medo e superstições eram ligados às doenças, epidemias, dor, sofrimento e à perspectiva da
morte. Muitos povos antigos viam as doenças como sobrenaturais, contra a qual nada se podia
fazer, ou como obra dos deuses. Assírios, babilônios e outros povos da Ásia acreditavam que
as doenças eram causadas por espíritos malignos que deviam ser expurgados das mais
diversas formas pelos feiticeiros, sacerdotes ou xamãs (Figueiredo, 1995; Barros, 2002;
Sevalho, 1993).
Mesmo assim, alguns povos antigos desenvolveram conhecimentos ―intuitivos‖ acerca da
prevenção de doenças. Os egípcios admitiam um princípio infeccioso às fezes; os romanos
drenavam os pântanos e os gregos zelavam pelos corpos e acendiam fogueiras para purificar o
16
ar (Sevalho, 1993). A Bíblia, o Corão, o Talmude e diversos livros chineses e hindus
recomendam diversas práticas sanitárias preventivas, como lavar as mãos e os alimentos, a
circuncisão, o asilamento de doentes e a cremação de cadáveres (López-Moreno, GarridoLatorre & Hernández-Avila, 2000). Os líderes hebreus, antes de 1000 a.C., proibiam a
ingestão de carne de porco (o que evitava a contaminação por helmintos) e os chineses, há
2.500 anos, usavam o mofo da soja para tratar doenças de pele (uma premissa às substâncias
antibióticas produzidas por alguns fungos). No entanto, esses povos desconheciam os agentes
etiológicos (Figueiredo, 1995).
A mudança na percepção da doença como algo sobrenatural surgiu no Ocidente a partir do
grego Hipócrates (460– 370 a.C.) e seus seguidores. Eles preconizavam que os pacientes
deveriam ser estudados, desviando o foco das forças sobrenaturais e a doença passou,
gradativamente, a ser vista como um fenômeno natural, passível de ser compreendido. A
concepção humoral estabelecida pelos hipocráticos consistia nos postulados de que o corpo
humano é formado por um número variável de líquidos, e a saúde é o equilíbrio entre os
humores, enquanto a doença é o desequilíbrio entre eles (Sevalho, 1993; Barros, 2002; LópezMoreno, Garrido-Latorre & Hernández-Avila, 2000).
Esse conhecimento sofreu retrocessos quando, na Idade Média (do século V ao XV), o mundo
ocidental foi profundamente influenciado pela Igreja Católica e as representações de doença
retomaram um caráter fundamentalmente religioso. Foi reinstituída a teoria mística, na qual a
febre era causada por possessões demoníacas, tratáveis com exorcismo (Sevalho, 1993;
López-Moreno, Garrido-Latorre & Hernández-Avila, 2000).
17
Porém, a concepção humoral persistiu através das teorias do médico grego Galeno (122-199
D.C.), que passou grande parte de sua vida na Roma antiga. Seus escritos foram transmitidos
aos médicos árabes que os traduziram e os seguiram na Idade Média, protegendo-os do
catolicismo romano e da Santa Inquisição (Sevalho, 1993). Sua idéia é que a fisiologia
consistia no fluxo permanente dos humores que, por sua vez, dependia das influências
ambientais, do calor inato e da ingestão de alimentos. Assim, as causas mórbidas podiam ser
internas (ligadas à constituição e predisposição individual), externas (excessos alimentares,
sexuais ou de exercícios físicos) ou conjuntas. Para ele, deveria ser outorgada maior ênfase ao
uso dos medicamentos fitoterápicos (Barros, 2002).
Com o declínio da Idade Média, uma racionalidade humanista e individualista foi se
configurando sobre o anonimato e a depreciação da criatividade e espírito crítico que o
catolicismo havia imposto. Foi se estabelecendo outro contexto científico que separava o ser
humano da natureza. Deste contexto, emergiu o racionalismo científico, base da ciência
moderna, modelada no empirismo indutivo e no racionalismo dedutivo mecanicista de Francis
Bacon (1561–1626) e de René Descartes (1596-1650) (Sevalho, 1993).
1.2.2 A descoberta dos micróbios:
Mesmo antes do advento do microscópio, já se falava sobre doenças serem transmitidas por
organismos vivos. A primeira referência aos microrganismos surgiu um século a.C., por
Marco Terêncio Varrão (Marcus Terentius Varro, 116-27 a.C.), que afirmou que as doenças
eram causadas por seres vivos invisíveis (Animalia minuta), transmitidos pelos alimentos e
pelo ar. Porém, na época não havia como comprovar essa hipótese (Finkielman, 2007;
Gutiérrez, 2004).
18
Bem mais tarde, Girolano Fracastoro (1483-1553), de Verona, escreveu três importantes
obras: Syphilis sive morbus gallicus (1530), De contagione et contagiosis morbis et curatione
(1546) e De simpathia et antipathia rerum (1553), onde sugeriu a primeira teoria do contágio,
na qual doenças como peste, lepra, sarna, varíola, antrax, tracoma e sífilis (esta descrita por
ele) surgiam devido a organismos pequenos demais para serem vistos, denominados
―sementes invisíveis‖, ou ―contagium vivum‖. Eles podiam ser transmitidos de uma pessoa a
outra de três formas: por contato, por fomites (roupas e objetos) e à distância. Estava certo de
que nem todas as doenças eram transmitidas de longe, mas que todas passavam através do
contato físico. Também acreditava que o mesmo se aplicava aos vegetais, nos quais a doença
poderia passar fruta a fruta, pelo contato. Porém, suas idéias também não foram aceitas
(Fracastoro, 1930 In: Bulloch, 1979; Gutiérrez, 2004; Pelczar, 1996; López-Moreno, GarridoLatorre & Hernández-Avila, 2000).
A teoria do miasma, predominante na época, preconizava que as epidemias eram transmitidas
pelos vapores (matéria morta e peçonhenta) dos corpos em putrefação ou de alterações
climáticas e emanações da terra (Figueiredo, 1995). Portanto, para a higiene clássica, os
homens deveriam pensar no ambiente habitado, com relação à circulação da água e do ar, que
podem transportar miasmas ou gases nocivos, numa preocupação constante com a moral e a
pobreza (Caponi, 2002).
A construção do primeiro microscópio pelo alemão Zacharias Jannsen (1580-1638), por volta
de 1600, foi fundamental para a descoberta dos microrganismos (Gutiérrez, 2004). Porém, o
comerciante holandês Antony Van Leeuwenhoek (1632-1723) utilizava seu tempo livre para
polir lentes e as montava para produzir seus próprios microscópios. Ele fez descrições
19
detalhadas à Royal Society sobre o que viu (água, saliva, fezes, etc.) nas lentes de aumento,
especialmente com relação a bactérias e protozoários, denominando-os de ―animáculos‖. Por
isso, é considerado um dos fundadores da microbiologia, incitando calorosas discussões sobre
a origem desses pequenos animais (Dobell, 1932 In: Bulloch, 1979; Pelczar, 1996; Madigan
et.al., 2004).
E, apesar da posterior relação quase indissociável que se estabeleceu no imaginário popular
entre esses seres e as doenças, essa associação demorou mais de um século para ser
estabelecida. Ela foi sugestionada pelo inglês Benjamin Marten (1700-1782) que, em 1720,
publicou um artigo chamado ―A new theory of consumptions: more especially of a phthisis or
consumption of the lungs‖, no qual afirmava que a origem e causa essencial da tuberculose
eram espécies de Animacula, ou seres vivos muito pequenos que se alojam nos pulmões
(Doetsch, 1978; Gutiérrez, 2004).
Em 1762, Anton Von Plenciz (1705-1786), de Viena, afirmou que seres vivos causavam
doenças (o que chamou de contagium vivum) e que diferentes agentes eram responsáveis por
distintas doenças. Entretanto, ainda faltavam mais comprovações para a teoria se firmar
(Pelczar, 1996; Figueiredo, 1995).
A primeira comprovação de que microrganismos poderiam causar doenças foi do italiano
naturalista Agostino Bassi (1773-1856). Em 1807, ele começou a buscar o que provocava uma
doença que causava enorme prejuízo à Itália ao dizimar bichos-da-seda, numa pesquisa que
durou cerca de 30 anos. Através de uma série de experimentos controlados e observações dos
animais saudáveis e doentes, Bassi não só descobriu a causa da doença, como desenvolveu
formas de prevenção e cura. No final do trabalho, ele o manteve escondido por muitos anos,
20
pois enfrentava problemas financeiros e esperava ganhar dinheiro ao vender seus resultados –
mas ninguém fez nenhuma oferta por eles (Porter, 1973).
Finalmente em 1834, Bassi desiste de esperar e promove uma demonstração pública de seu
trabalho na Universidade de Paiva, na Itália. Depois, também o publicou em duas
monografias: ―Del mal del segno calcinaccio o moscardino malattia che affligge I bachi da
seta e sul modo di liberarne le bigattaje anche le piu infestate. Parte I: teoria (1835), Parte
II: Pratica” (1836). Nestes textos, explicou que encontrou o agente causador da doença num
líquido de animais doentes que morreram. Quando essa substância era inoculada no animal
saudável, este desenvolvia a doença. Por observações ao microscópio, verificou que essa
substância continha um organismo vivo, um fungo, e intuiu que ele se multiplicava no bichoda-seda e o matava por entupir-lhe os vasos. Assim, formulou a primeira teoria de doença
parasitária. Além disso, demonstrou que, para prevenir a doença, os ovos do bicho-da-seda
deveriam ser desinfetados com soluções de cloreto de cálcio ou ácido nítrico, além de outras
medidas preventivas de desinfecção e higiene. O fungo depois foi caracterizado por
Vuillemin, em 1912, e nomeado de Botrytis bassiana, em sua homenagem (Porter, 1973).
Após publicar sua primeira descoberta, Bassi passou a aplicar a teoria em diversas outras
doenças, inclusive humanas, como varíola, febre tifóide, gonorréia, sífilis, cólera, etc. Em
1849, 34 anos antes de Robert Koch (1843-1910) isolar a bactéria da cólera, Bassi descreveu
que o germe da cólera é bem menor que o fungo do bicho-da-seda, mas que lhe permanecia
um enigma. Apesar disso, ainda recomendou quarentena aos infectados e que seus utensílios
como lençóis e talheres deveriam ser fervidos para destruir o agente infeccioso. Porém, seu
trabalho ainda foi muito criticado pelos seguidores da teoria da geração espontânea (Porter,
1973).
21
Mesmo antes da comprovação de Bassi, em 1798, o médico inglês Edward Jenner (17491823) criou a primeira vacina contra a varíola, injetada no menino John Phipps. Além do
costume popular da variolização, ele constatou que ordenhadores expostos à versão bovina da
doença ficavam imunes à varíola humana, usando-a, portanto, para imunizar pessoas de forma
mais segura (Figueiredo, 1995).
No século XIX, o conhecimento sobre as infecções se desenvolveu muito. Descreveram-se
muitos microrganismos relacionados a doenças e, em 1840, o médico Friedrich Gustav Jakob
Henle (1809 -1885) publicou o trabalho Pathologische untersuchungen, no qual procurou
melhorar a confiabilidade dessas descobertas postulando que, para que seja comprovado um
germe como causador de doença, é preciso encontrar constantemente o micróbio no indivíduo
doente e depois, ao transferi-lo, reproduzir a doença em outro organismo - postulado que foi
aperfeiçoado mais tarde por Koch (Figueiredo, 1995; Gutiérrez, 2004).
O aprimoramento do microscópio também permitiu que o francês Charles Cagniard-Latour
(1777-1859) descrevesse pela primeira vez, em 1837, as leveduras da cerveja e do vinho
como seres vivos e não substâncias químicas inertes, como se acreditava. Ele também afirmou
que elas eram as responsáveis pela fermentação alcoólica, porém, apenas quando vivas
(Barnett, 2003).
O mesmo tema foi estudado alguns anos depois, em 1854, por um dos mais importantes
personagens para o estabelecimento da microbiologia. O químico francês Louis Pasteur
(1822-1895) verificou que vinhos bons ruins continham micróbios diferentes e que os
produtos da fermentação do suco de uva eram resultantes da presença de microrganismos, e
22
não que a fermentação os produzia (Pelczar, 1996; Ribeiro, 1997). Depois, sugeriu que cada
tipo de doença infecciosa deveria ser causado por um microrganismo diferente, da mesma
forma que tipos variados de fermentação eram relacionados a distintos microrganismos.
Através da experimentação, Pasteur derrubou a teoria da geração espontânea dos
microrganismos e confirmou a noção de contágio. A partir daí, buscou por formas de tornar os
organismos imunes à ação dos micróbios (Figueiredo, 1995; Ribeiro, 1997). Depois de seus
estudos, as medidas de saneamento que antes tinham explicações químicas e miasmáticas,
agora ganham caráter microbiológico (Caponi, 2002).
Outro personagem fundamental nessa história foi do médico e microbiologista alemão Robert
Koch (1843-1910), que começou a explorar o mundo microbiano ao ganhar um microscópio
em 1871. A partir daí, ele e Pasteur se tornaram profissionais rivais. Ambos disputavam
descobrir a causa do carbúnculo (antrax), uma doença que dizimou condutores de gado e
ovelha na Europa. Em 1876, Koch encontrou uma bactéria em forma de bastão no sangue de
um carneiro morto pela doença. Depois de isolar a bactéria e injetá-la em um camundongo
que também desenvolveu o carbúnculo, provou que um tipo específico de micróbio causa uma
doença específica. Mais tarde, ele e seus colegas descobriram bactérias causadoras da cólera e
tuberculose (Pelczar, 1996; Gutiérrez, 2004).
Apesar de rivais, Pasteur e Koch influenciaram cientistas de todo o mundo pela busca de
novos métodos e técnicas de obtenção de culturas bacterianas e na determinação do papel
específico dos micróbios nas doenças. Por isso, foram considerados os fundadores da
bacteriologia (Ribeiro, 1997; Figueiredo, 1995). Assim, na década de 1870, a microbiologia
consolida-se como uma nova disciplina científica. Koch redefine as normas para a pesquisa
científica (antes postuladas por Henle) e sistematiza os procedimentos nos seguintes passos: a
23
demonstração da presença do microrganismo; o seu isolamento; a obtenção da cultura
artificial ou laboratorial do microrganismo e a inoculação em animais de laboratório (Ribeiro,
1997).
A partir da emergência da microbiologia, a saúde pública se redefine como medicina de
epidemias, com estratégias (muitas vezes militares) de prevenção contra os micróbios e seus
vetores (Caponi, 2002). A descoberta da vacina da raiva por Pasteur, em 1884, foi
fundamental para a fundação, em 1888, do Instituto Pasteur de Paris, que se tornou um dos
principais modelos para o desenvolvimento da pesquisa bacteriológica, do ensino da
microbiologia e para a produção de profiláticos e terapêuticos (Ribeiro, 1997).
Sem ao menos saber da existência dos vírus, Pasteur identificou que a raiva se estabelecia nos
tecidos nervosos de coelhos e verificou que a agressividade da doença era diminuída quando
submetida à atenuação por calor, produzindo assim a vacina anti-rábica. Com ela, tratou o
menino Joseph Meister, que havia sido mordido por um cão raivoso (Science, 1885). No
entanto, os vírus apenas foram identificados mais tarde, em 1898, pelo microbiologista
alemão Martinus Wilhelm Beijerinck (1851-1931), ainda antes do advento do microscópio
eletrônico. Beijerinck estudou o que provocava a doença do mosaico do tabaco e foi o
primeiro a afirmar sobre a existência de vírus, seres muito menores do que as bactérias e que
pareciam não serem formados por células, apesar precisarem delas para sobreviver (O‘Malley,
2008).
Assim, o conceito de vírus emergiu com base na capacidade de passar pelos filtros que barram
as bactérias, pela invisibilidade à luz do microscópio óptico e sua incapacidade de crescer em
meios artificiais (fora dos organismos hospedeiros). No entanto, a virologia foi revolucionada
24
com o advento do microscópio eletrônico. Este apenas foi desenvolvido em 1931 pelos
engenheiros alemães Ernst Ruska (1906-1988) e Max Knoll (1897-1969), no trabalho que
rendeu a Ruska o prêmio Nobel em 1986 (Kruger, et.al., 2000).
Ainda no século XIX insurgem os conceitos de assepsia, especialmente na área cirúrgica e, no
final do século, o surgimento da imunologia permite entender melhor o antagonismo entre o
germe que agride e o organismo que se defende (Figueiredo, 1995). Já nos fins do século
XIX, a teoria microbiana passa a predominar de tal forma que, em boa medida, faz obscurecer
as concepções da multicausalidade das doenças (Barros, 2002). A medicina experimental
baseada na microbiologia era tida como a "chave" com a qual se abririam as possibilidades de
resolução de todas as questões ligadas ao entendimento do universo vivo. A experimentação
microbiológica permitia que os cientistas formulassem uma concepção otimista frente ao
universo microscópico, agora visível e dizível. A doença passou a ter uma designação de
caráter provisório e caberia à microbiologia fornecer os elementos da "cura infalível" ou as
soluções profiláticas dos maiores flagelos humanos (Albuquerque, 1999).
No começo do século XX, a exclusividade microbiológica já imperava na compreensão de
saúde e doença (Sevalho, 1993). Os conhecimentos microbiológicos, fisiopatológicos e
clínicos relacionados às infecções se ampliaram enormemente e também surgiram os
primeiros antimicrobianos. A penicilina, produzida pelo fungo filamentoso Penicillium
notatum, foi descoberta em 1929 pelo escocês Alexander Fleming (1881–1955). A ampliação
do uso deste antibiótico nos anos 40 abriu uma nova era na medicina e promoveu uma
extensiva busca na natureza por compostos bioativos. Na década de 40, como resultado dessa
busca, descobriu-se a streptomicina, primeira droga capaz de curar a tuberculose (Gootz,
25
1990). Em 1953, outra grande descoberta foi a cefalosporina C, um antibiótico de amplo
espectro produzido pelo fungo marinho Cephalosporium acremonium (Manzi & Mayz, 2003).
1.2.3 A microbiologia no Brasil:
No Brasil, a microbiologia se instituiu com uma dualidade entre as medicinas pasteuriana e
tropical. A pasteuriana estava voltada para a investigação dos agentes microbianos de
doenças, dos meios biológicos de convertê-los em soros e vacinas e dos meios químicos para
a cura e/ou prevenção dessas doenças. A medicina tropical tinha em mira o estudo dos seres
que hospedam vermes e micróbios e que servem de vetores à propagação das doenças
causadas por esses organismos em coletividades humanas e populações animais (Benchimol,
2003).
A primeira evidência de ciência moderna no país começou com a Escola Tropicalista Baiana.
Este grupo de médicos se organizou, entre 1866 e 1915, e foi pejorativamente qualificado de
pré-científico, pois permaneceu na fronteira entre o paradigma miasmático/ambientalista e a
teoria dos germes. No entanto, eles se interessavam pelo papel dos parasitos na produção de
doenças (especialmente as dos trópicos, como a ancilostomíase e filariose), além da influência
do clima sobre as raças e sobre a geração ou multiplicação de miasmas e germes. Assim,
produziram investigações originais sobre as patologias nativas daquela região da "zona
tórrida", mantendo posições independentes e à margem da Faculdade de Medicina existente
na antiga capital do Brasil colônia (que encarava o progresso como imitação da ciência e das
instituições européias). Entre eles, sobressaíram três médicos: o português Otto Wucherer
(1820-1875), o escocês John L. Paterson (1820-1882) e o português José Francisco da Silva
Lima (1826-1910) (Benchimol, 2000; Carreta, 2006; Edler, 2002; Caponi, 2002).
26
Os tropicalistas baianos deixaram de existir como grupo em meados da década de 1880,
quando foram absorvidos pelo establishment médico e pelas lutas políticas que resultaram na
extinção da escravidão (1888), na queda da monarquia (1889) e na consolidação da
República. Eles não conseguiram institucionalizar seu precoce programa de pesquisas de
maneira a formar discípulos que continuassem sua obra. Porém, os principais integrantes do
grupo ascenderam profissionalmente, sobretudo aqueles que se transferiram para o Rio de
Janeiro (Benchimol, 2000).
No entanto, para alguns autores, como Ribeiro (2007), a microbiologia apenas chega ao Brasil
na década de 1880, com Domingos José Freire (1842-1899). Professor de química orgânica e
biologia da Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro, ele anunciou ter descoberto o micróbio
da febre amarela, em dezembro de 1879. Nessa época, também propôs um remédio contra a
doença: injeções subcutâneas de salicilato de soda, um antisséptico e antipirético –
antepassado popular da aspirina. Em 1883, Domingos Freire desenvolveu uma vacina contra a
febre amarela, com o Cryptococcus xanthogenicus, um fungo (ainda considerado na época
como uma planta microscópica) cuja virulência atenuou por meio de técnicas recémconcebidas por Pasteur (Ribeiro, 1997; Benchimol, 2000; Benchimol, 1995).
A vacina de Freire – referida pela historiografia como o mais retumbante ‗erro‘ cometido na
medicina experimental brasileira - foi apoiada por D. Pedro II e logo se tornou muito popular.
No mesmo ano em que foi anunciada, Freire foi nomeado presidente da Junta Central de
Higiene Pública - o que facilitou difundi-la pelos cortiços do Rio de Janeiro. Pelo menos
12.329 pessoas foram inoculadas com a vacina entre 1883 e 1894. Ela também chegou até
Porto Rico, Jamaica, Guianas e outras colônias da França (Benchimol, 2000; 1995).
27
No Brasil, o principal competidor de Freire era o médico João Batista de Lacerda (1846-1915)
que, ainda em 1883, incriminou outro microrganismo como o verdadeiro agente da doença: o
micróbio polimórfico (capaz de mudar de forma e função conforme o meio e o clima) Fungus
febris flavae (Benchimol, 2000).
Além disso, alguns pesquisadores estrangeiros preferiam a hipótese sustentada por Koch, de
que a febre amarela era causada por um bacilo similar ao da cólera. Um deles era George
Sternberg (1838-1915), presidente da American Public Health Association e, mais tarde,
Surgeon General dos Estados Unidos. Sternberg produziu, em 1887, um inquérito sobre as
teorias e vacinas em voga no continente, que reforçava as idéias de Koch. O documento foi
aceito pela comunidade científica internacional como prova definitiva de que os sulamericanos haviam fracassado em suas tentativas de isolar o micróbio e produzir uma vacina
eficaz (Benchimol, 1995).
Freire ficou isolado e desacreditado. Porém, isso não pareceu afetar seu prestígio no país pois,
ironicamente, esse período coincidiu com a criação do Instituto Bacteriológico Domingos
Freire na cidade do Rio de Janeiro, em 1890 (concomitantemente ao Instituto Bacteriológico
de São Paulo). O Instituto surgiu no auge de uma epidemia e da deposição do governo, com a
proclamação do novo regime republicano (Benchimol, 1995) e pouco após a criação do
instituto Pasteur de Paris, em 1888 (Ribeiro, 1997).
A criação do Instituto de Domingos Freire revoltou uma talentosa nova geração de
bacteriologistas: Francisco Fajardo (1864-1906), Eduardo Chapot Prévost (1864-1907),
Carlos Seidl (1867-1929), Oswaldo Cruz (1872- 1917) e outros jovens médicos que haviam
28
passado pelo laboratório de Freire e questionavam seus fatos científicos. Eles se mantinham
em precários laboratórios em suas próprias casas e, agora, tinham em mira a fundação de um
instituto para a pesquisa como carreira profissional, patrocinada pelo Estado. O conflito com
os discípulos foi acirrado e Freire tornou-se ainda mais isolado. Porém, não perdeu o apoio de
seus amigos republicanos e sua vacina apenas deixou de ser usada depois de sua morte, em
1899, que também levou à extinção, pouco tempo depois, do Instituto que levava seu nome
(Benchimol, 2000; 1995).
O instituto Pasteur se tornou referência para os jovens cientistas brasileiros durante a criação
dos institutos soroterépicos de Butantã e de Manguinhos, em 1900. O primeiro, chefiado por
Vital Brazil (1865-1950) e o segundo por Oswaldo Cruz (1872- 1917) (Benchimol, 2000).
Porém, outro personagem foi essencial para a criação dos institutos: Adolfo Lutz (18551940), médico e diretor do Instituto Bacteriológico de São Paulo (uma das repartições do
Serviço Sanitário instituído em 1892). À frente do instituto, Lutz realizou investigações de
grande relevância sobre as doenças infecciosas que grassavam endêmica ou epidemicamente
no estado, combatendo epidemias como a febre tifóide, a cólera, entre outras, entre 1893 e
1895 (Ribeiro, 1997; Benchimol, 2003). Em 1899, quando a peste bubônica chegou aos
portos brasileiros, sua intervenção em Santos foi exemplar e estabeleceu as bases dos serviços
de controle da peste. Portanto, foi esta, mais do que a febre amarela, o gatilho para a resposta
governamental às endemias e epidemias que acometiam as cidades brasileiras, que culminou
na criação das duas instituições (Silva, 2003).
O interesse do imperador D. Pedro II pelas novidades científicas e tecnológicas que surgiam
na Europa era tanto que, nove meses antes da inauguração do Instituto Pasteur de Paris, a
cidade do Rio de Janeiro ganhou o primeiro Instituto Pasteur, totalmente montado com
29
aparelhagem importada para a produção e aplicação da vacina anti-rábica. Depois, outros
institutos foram criados, com o mesmo propósito, no Recife (1899), em São Paulo (1903), em
Juiz de Fora (1908), em Porto Alegre (1910), em Santa Catarina (1912) — que, no entanto
não tinham qualquer ligação institucional com o Instituto Pasteur de Paris. Destes, segundo
Ribeiro, apenas o instituto de São Paulo diversificou suas atividades, para cobrir a
investigação bacteriológica, o ensino e a produção de imunizantes (Ribeiro, 1997).
A virada do século XIX para o XX foi marcada pela controvérsia entre o paradigma
microbiano e as práticas inspiradas nas teorias miasmáticas e ambientalistas. Estas últimas
ainda eram sustentadas por alguns clínicos e higienistas frente aos graves problemas sanitários
que alvoroçavam as aglomerações urbanas do Sudeste do Brasil (Benchimol, 2003).
Porém esse quadro enfrentou uma grande mudança depois que, em 1900, o médico americano
Walter Reed (1851-1902) demonstrou a hipótese de que o mosquito Aedes aegypti transmitia
a febre amarela – formulada inicialmente em 1881 pelo cubano Carlos Juan Finlay (18331915). A comprovação diminuiu consideravelmente as polêmicas relacionadas à etiologia da
doença e viabilizou campanhas sanitárias que neutralizaram, por algum tempo, as epidemias
nos núcleos urbanos litorâneos da América. Os partidários desta teoria, liderados por Oswaldo
Cruz, se esforçaram para obter o aval da corporação médica à nova estratégia de combate à
febre amarela (Benchimol, 2000; 2003).
Logo em seguida, Francisco de Paula Rodrigues Alves tornou-se o quarto presidente da
República brasileira (1903-1906), que prometia recuperar a imagem do país (tido como
pestilento) com a modernização visível dos centros urbanos em curto prazo. Para isso,
nomeou o engenheiro Francisco Pereira Passos (1836—1913) como prefeito do Rio de
30
Janeiro, concedendo-lhe poderes excepcionais. Oswaldo Cruz assumiu a direção da Saúde
Pública, com o compromisso de derrotar a febre amarela, a varíola e a peste bubônica
(Benchimol, 2000; Albuquerque, 1999).
No Rio de Janeiro, a principal campanha de Oswaldo Cruz começou com a criação do Serviço
de Profilaxia Específica da Febre Amarela, em abril de 1903. Formou brigadas de matamosquitos, providenciou o isolamento domiciliar e remoção dos doentes para os hospitais,
começou uma verdadeira caça aos ratos da cidade e instaurou a obrigatoriedade da vacinação
contra a varíola em todo o país, com cláusulas rigorosas (Benchimol, 2000).
No debate público, havia o temor de que a vacina representasse um perigo à saúde. Cruz
publicou, em 1902, um livro que minimizava os acidentes com soro, afirmando que os seus
benefícios superavam eventuais desconfortos que a prática pudesse causar (Carreta, 2006).
Por fim, a aprovação da lei gerou a Revolta da Vacina, considerada um dos maiores levantes
populares ocorridos no Brasil durante o século XX, e representou, além da recusa à vacinação,
uma profunda oposição aos programas de higienização do espaço urbano (Moulin, 2003;
Pôrto & Ponte, 2003).
No entanto, à medida que se aproximava o fim do governo Rodrigues Alves, as estatísticas
comprovavam o êxito das campanhas contra a febre amarela e a peste bubônica. As pessoas
que animaram a revolta da vacina foram expulsas das áreas renovadas e boa parte dos
adversários da reforma e saneamento urbanos se rendeu à "regeneração" do Brasil. O Instituto
Soropédico de Manguinhos alcançou visibilidade internacional, pois seus pesquisadores
também procuravam publicar em periódicos respeitados. Assim, conseguiu se transformar em
Instituto de Patologia Experimental em 1907 (um sonho antigo de Oswaldo Cruz, de voltá-lo
31
para o estudo das doenças infecciosas tropicais) e rebatizado no ano seguinte para Instituto
Oswaldo Cruz (IOC) (Benchimol, 2000).
Outro ponto favorável para o prestígio do Instituto foi quando, com o apoio dos pesquisadores
do IOC, Carlos Chagas (1879-1934) completou a descoberta de uma nova doença tropical, o
Trypanossoma cruzi, em março de 1909. A doença ficaria internacionalmente conhecida
como doença de Chagas e consolidou a protozoologia como uma das mais importantes áreas
de pesquisa da instituição (Benchimol, 2000; Carreta, 2006; Albuquerque, 1999).
Nesse mesmo período, novos pesquisadores brasileiros ingressaram no Instituto Oswaldo
Cruz. A principal aquisição foi Adolfo Lutz, que deixou o Instituto Bacteriológico de São
Paulo, em 1908. Ele deu grande impulso à zoologia, botânica e micologia médicas, e publicou
trabalhos fundamentais sobre o ciclo de vida do Schistosoma mansoni (Benchimol, 2000).
A seguir, sucedeu-se a era da ―descoberta dos sertões‖. O primeiro esforço das administrações
republicanas para a reintegração da região ao resto do país foi a missão médica enviada pelo
IOC ao interior do Nordeste, em 1912, dando origem ao sanitarismo rural (Santos, 1985). No
mesmo ano, foi construído na região do instituto um hospital para estudo dos casos clínicos
recolhidos no interior rural do Brasil (Benchimol, 2000). Em 1916, o IOC publicou os
cadernos de viagem dos médicos Arthur Neiva (1880-1943) e Belisário Pena (1868-1939)
através de vários estados do Nordeste e Goiás, denunciando as péssimas condições de vida no
interior do país (Santos, 1985).
Quando Oswaldo Cruz faleceu, em 11 de fevereiro de 1917, seu Instituto era consolidado
dentro e fora do país (Benchimol, 2000). O aspecto inovador desse instituto foi o
32
estabelecimento de um padrão de organização da pesquisa no país. Havia uma preocupação,
quase ausente nas instituições anteriores, com a formação de cientistas e de associação entre
ensino e pesquisa. O sucesso em vida de Oswaldo cruz e a consolidação de seu mito, talvez,
se devam não só à sua capacidade como cientista, mas, sobretudo, à sua habilidade como
operador desses aspectos políticos e simbólicos da ciência microbiológica do período
(Carreta, 2006). Em seguida, Carlos Chagas assumiu a liderança do Instituto até sua morte,
em 1934 (Benchimol, 2000).
A revolução pasteuriana exauriu-se nesses anos. Durante a Primeira Guerra Mundial (19141918), minimizou a devastação das doenças infecciosas, mas foi desarmada pela pandemia da
gripe espanhola, que ceifou pelo menos 21 milhões de vidas. No Brasil, o trágico número de
óbitos expôs a incapacidade dos médicos de lidarem com a nova espécie de inimigo
(Benchimol, 2000).
O novo código sanitário de 1920 deu maior poder ao governo federal para intervir nos
estados. Em poucos meses, 11 estados haviam firmado acordos com o governo central para a
criação de postos de profilaxia no interior. Sete estados eram da região Norte e Nordeste
(Santos, 1985). O Departamento Nacional de Saúde Pública, agora, comandado por Carlos
Chagas, teve seu raio de ação pela primeira vez ampliado, além das campanhas contra
epidemias em algumas poucas cidades litorâneas. Iniciaram-se ações mais prolongadas, de
caráter curativo e preventivo, contra doenças endêmicas nas zonas rurais e suburbanas
(Benchimol, 2000).
Os anos 20 constituíram a fase de maior politização do movimento sanitário no Brasil. Com o
regresso da febre amarela ao Rio de Janeiro, em 1928-1929, Clementino Fraga, então diretor
33
do Departamento Nacional de Saúde Pública, reativou parte dos dispositivos de origem
militar das campanhas sanitárias, mas sem dispor mais das condições políticas e ideológicas
que favoreceram seu uso. A cidade estava muito mais populosa e a doença se deslocou para a
periferia suburbana (Benchimol, 2000).
A Revolução de 30 e o Estado Novo traziam em seu bojo as melhores condições para o
avanço do movimento sanitarista e para a concretização da meta de redenção dos sertões. O
período varguista adotou um critério econômico de combate às endemias. Entretanto, no
período pós-30 o movimento perdeu progressivamente o vigor dos últimos dez a 15 anos da
República Velha. Passaram a promover apenas campanhas sanitárias de caráter localizado,
como a realizada no Ceará, entre 1930 e 1945, para combater uma epidemia devastadora de
malária. Tratavam de surtos epidêmicos, mas não se combatiam as doenças endêmicas em
extensas áreas do interior do país (Santos, 1985).
A burocratização teve um efeito paralisante sobre o movimento. A criação do Ministério da
Educação e Saúde Pública, em 1930, converte a reforma sanitária em projeto governamental,
retirando sua força ideológica e provocando um esvaziamento político do movimento
sanitarista (Santos, 1985).
1.2.4 Aspectos atuais sobre os micróbios patogênicos:
A relação entre micróbios e doenças não permanece apenas no passado da história da
microbiologia. Os micróbios patogênicos continuam a mexer com o medo e o imaginário
humano, assolando populações em todo o mundo e preocupando a comunidade científica.
34
Depois da Segunda Guerra Mundial (1939-1945), as doenças infecciosas deixaram de ser uma
causa importante de morte nos países desenvolvidos. Parecia que determinados micróbios
estavam sendo erradicados, ou pelo menos controlados pelos remédios e vacinas (Foladori,
2005; Silva, 2003). Mas o mesmo não aconteceu nas populações menos desenvolvidas, onde a
redução de mortes foi moderada ou inalterada. Nesse cenário, os Estados Unidos da América,
que desenvolveram uma enorme capacidade de organização sanitarista durante a guerra,
perceberam que o controle das doenças endêmicas e epidêmicas poderia ser um importante
trunfo em tempos de Guerra Fria (1945-1991) e ofereceram tecnologias da saúde como forma
de atrair países para o seu modelo de desenvolvimento e para longe dos modelos soviético e
chinês.
Assim, o governo norte-americano, através de diversas agências de cooperação internacional e
os organismos internacionais de saúde - a Organização Pan-americana da Saúde (Opas) e
Organização Mundial da Saúde (OMS) -, empreenderam uma série de ações globais ou
regionais com vistas ao controle e a erradicação de doenças (Silva, 2003; Gee, 2001). Com
esses esforços, apesar de a mortalidade de várias populações do terceiro mundo ter começado
a declinar, a maioria dos países em desenvolvimento continuou com uma relativa alta
proporção de mortes provocadas por micróbios (Gee, 2001).
Porém, entre 1980 e 1992, as mortes por doenças infecciosas aumentaram 58% nos EUA.
Além do retorno de antigas doenças, novas surgiram. No final do século XX, as doenças
infecciosas constituíam um quarto das causas de morte no mundo. Mas, se for considerado
que mortes causadas por câncer, problemas de circulação ou respiratórias muitas vezes são
causadas por microrganismos, o índice se torna bem maior (Foladori, 2005).
35
Diversas causas levaram a esse quadro e estas questionam a forma moderna de vida.
Scholthof (2007) cita alguns aspectos, como as condições ambientais locais e globais, que
podem incluir condições econômicas, ecológicas, mudanças na população hospedeira,
viagens, tecnologias e mudanças na população de microrganismos. Também contam outros
fatores como fome, guerras, armas biológicas e cataclismos como furacões, desmatamento,
seca, poluição do ar e da água. Além das questões sociais de acesso à saúde e necessidades
básicas como abrigo, comida, eletricidade, saneamento, etc. Outros fatores também são
apontados por Foladori, (2005), como os efeitos da produção de mercado que, forçados pelo
lucro, estabelecem a monocultura, uso extensivo de inseticidas e pesticidas, substituição das
populações rurais e sua concentração nas áreas urbanas, aumento da pobreza, etc. Estes e
outros aspectos, além de tornarem os seres humanos menos imunes, geraram supermicróbios.
Nos últimos 30 anos, houve um crescimento no número de infecções fúngicas, que coincide
com o aumento dramático na população de pessoas severamente imunocomprometidas,
acometidas pelo vírus da Aids. Antes, essas infecções se desenvolviam principalmente em
pacientes com doenças hematológicas, como as provocadas por leucemias, que passavam por
cirurgias extensas e/ou que recebiam doses elevadas de corticóides ou outras terapias
imunossupressoras agressivas. Portanto, embora há poucos anos os fungos patogênicos
fossem um grupo bem definido e conhecido, agora surgem cerca de 20 novas espécies de
fungos oportunistas a cada ano (Musial et.al., 1988; Guarro, et.al., 1999).
O aumento da resistência bacteriana em nível mundial tem estimulado as grandes companhias
e pesquisadores na busca por novos antibióticos e a seqüenciar o genoma das bactérias
patogênicas (Manzi & Mayz, 2003). A vacinação tem sido apresentada como a solução para a
maioria das epidemias e doenças infecciosas, mas basta um único imunizante ser visto como
36
ineficaz, perigoso ou apenas suspeito para colocar em xeque toda essa estrutura. As pressões
no campo médico-social provêm em particular das firmas farmacêuticas, que por serem pouco
numerosas no setor de vacinas tendem à monopolização, constituindo poderosos lobbys
(Moulin, 2003).
No entanto, pouco tem sido feito no sentido de atuar diretamente na origem do problema, que
é principalmente de ordem social, econômica e tecnológica (Foladori, 2005). O ambiente há
muito foi considerado fator determinante das doenças em plantas e humanos, mas que, quando
a teoria dos germes se tornou um dogma, essa teoria tornou-se sub-valorizada. Principalmente
do início ao meio do século XX, quando a noção dominante era de que vencer doenças era um
trabalho da ciência, melhor reconhecida pelo desenvolvimento comercial e distribuição global
das vacinas e antibióticos. Os laboratórios buscavam apenas pela interação patógenohospedeiro (Scholthof, 2007).
Diante deste panorama, o consumo de medicinas alternativas e complementares (como
homeopatia, ervas medicinais, etc.) aumentou nas últimas duas décadas em diversos países
desenvolvidos. Foladori (2005) argumenta que os recentes dilemas da saúde estão desafiando
o paradigma biomédico. Sua teoria parece excessivamente alarmista, no entanto, ao
relembrarmos a trajetória da disciplina, nos faz questionar se a microbiologia mais uma vez se
coloca como uma batalha a ser vencida pelos médicos e pesquisadores na afirmação de sua
ciência. Estaríamos vivenciando a volta do cenário de controversas que, segundo Carreta
(2006), no início do século XIX, culminou na descrença da medicina?
Um editorial da Nature (volume 10, de 1º de dezembro de 2004) abordou o tema ―homem
versus micróbios‖ e revela a preocupação da comunidade científica com a questão da nova
37
ameaça dos patógenos. O editorial explica os motivos para a seleção do mote da revista, que
reuniu uma coleção de artigos que exploram a ciência por trás das doenças infecciosas
emergentes. O objetivo principal desta seleção foi procurar entender como e por que as novas
doenças infecciosas emergiram nos últimos anos:
―O que nós aprendemos sobre a patogênese de algumas novas doenças
emergentes? Que progressos têm sido feitos na busca de vacinas e terapias
efetivas? E quais lições nós aprendemos de recentes surtos de doenças?‖
(tradução livre de: Nature Medicine Editorial, 2004).
A partir daí, questionam todo o conhecimento biomédico acerca dos microrganismos
adquirido na história:
“Hoje, mais de 100 anos depois de Robert Koch mostrar inequivocamente
que uma doença – antrax – era causada pela bactéria, nós sabemos mais. Nós
sabemos que a Yersinia pestis foi a provável causa da ―morte negra‖, que os
vírus da varíola e sarampo contribuíram para o declínio da civilização Asteca
e que a Mycobacterium tuberculosis é a causa da doença conhecida no
século XIX como ―consumption‖. Certamente, nós temos um incrível débito
no entendimento sobre a diversidade dos patógenos infecciosos e os
mecanismos que eles usam para burlar a defesa do hospedeiro e causar
doença. Ainda, este conhecimento apenas ameniza parcialmente a ameaça
dos patógenos infecciosos.‖
(tradução livre de: Nature Medicine Editorial, 2004).
Portanto, fica claro que a comunidade científica, representada pelas opiniões de uma das
revistas mais conceituadas no meio acadêmico, sente-se desafiada e até acuada pela nova
ameaça dos microrganismos patogênicos, mas sem abrir mão do modelo atual de busca por
novos medicamentos, na esperança de que um dia conseguirão debelar o inimigo. Porém,
ressaltamos um ponto importante desse editorial, que é a ausência completa do papel que
podem desempenhar nesse cenário os outros microrganismos (afinal, os patogênicos são
apenas a minoria deles), inclusive daqueles que já são conhecidos por trazerem benefícios aos
seres humanos.
38
1.3 Os microrganismos benéficos
Será que a população ainda está muito atrelada às relações históricas entre os microrganismos
e as doenças e, portanto, subjugam o conhecimento sobre as relações dos parasitos humanos
com os outros micróbios que o habitam? Será que, uma vez superada esta poderosa barreira,
os próprios microrganismos (porém, aqueles que nos trazem benefícios) poderiam fortalecer a
crença popular na biomedicina?
Pois já existem algumas abordagens inovadoras, nesse sentido, sobre a infecção microbiana.
Essas filosofias acreditam que é importante a tentativa de se reduzir a vulnerabilidade
humana, em vez de confiar apenas no enfoque biomédico, que aposta no sucesso dos
remédios. A investigação por novos medicamentos não é questionada, mas é considerada
como sendo apenas a busca por uma solução imediata, que não resolverá o cerne do problema
(Foladori, 2005).
Elas recusam o vocabulário simplista da defesa e do ataque e desejam dar a palavra aos
fenômenos de simbiose, de complementaridade dos organismos, de comensalismo (Moulin,
2003). Sansonetti enfatiza o importante papel da bactéria na fundação da biosfera e lembra
que, se nós aprendemos muito sobre os patógenos bacterianos, não sabemos virtualmente
nada sobre a fisiologia da nossa própria flora residente. O autor espera que pesquisas sobre
essa ―boa flora‖ em breve se beneficiarão do incrível progresso estimulado pela necessidade
urgente de controlar e erradicar a ―flora ruim‖ (Sansonetti, 2000).
Os estudos atuais sobre probióticos envolvem testes in vitro e in vivo, na tentativa de
determinar o impacto dos possíveis efeitos benéficos de cada cepa ao hospedeiro. O sucesso
39
dessas pesquisas é citado por Gillor e colaboradores (2008), como alternativas promissoras ao
uso clássico de antibióticos.
1.3.1 Uma história antiga
Para além das questões das doenças, outros fenômenos associados aos microrganismos já
impressionavam os povos antigos, como a fermentação que produz o vinho e o pão.
Principalmente porque a partir de uma pequena amostra se propagava o fermento por grandes
quantidades de massa e tonéis de vinho. Esse processo relativo ao pão é inclusive citado na
Bíblia, em Carta de São Paulo aos Coríntios, I 5:6 (Figueiredo, 1995). Existem vários
exemplos de que povos antigos produziam bebidas e alimentos que hoje sabemos serem frutos
da fermentação microbiana. Uma cerveja derivada do arroz na China, chamada Kiu, tem
origem por volta de 2300 a.C., o molho de soja da China e Japão é produzido há muitos
séculos, assim como o saquê (bebida japonesa também derivada da fermentação do arroz
moído), o Koumiss (bebida alcoólica de tribos da Ásia Central elaborada a partir do leite de
égua ou camelo). Os antropologistas e historiadores não conhecem nenhuma sociedade que
não utilize a fermentação para produzir alimentos ou bebidas (Pelczar, 1996).
Já por volta de 1854, Pasteur iniciou suas pesquisas, como químico, preocupado com
problemas na fermentação de cervejas e vinhos, antes de se dedicar a identificar
microrganismos patogênicos (Ribeiro, 1997). Na época, Pasteur atendeu à solicitação de um
produtor de vinhos francês e, examinando lotes de vinhos bom e ruim, verificou que eles
continham microrganismos diferentes. Assim, concluiu que a seleção de microrganismos
podia assegurar um bom produto. Para certificar-se, destruiu os microrganismos do suco de
uvas por aquecimento (num processo hoje conhecido como pasteurização) e depois colocou
40
nele uma pequena quantidade do vinho de boa qualidade (com o tipo desejado de
microrganismo). Assim, concluiu que o suco tornou-se, mais tarde, um vinho de ótima
qualidade, revolucionando esta indústria (Pelczar, 1996; Ribeiro, 1997).
A constatação de efeitos benéficos de bactérias data de muitos anos e tem variado, ao longo
do tempo, em função do conhecimento em diferentes momentos. As bifidobactérias foram
isoladas pela primeira vez no final do século XIX pelo médico francês do Instituto Pasteur,
Henry Tissier (1866-1926), que as defendia como importantes para a saúde e nutrição das
crianças, incluindo os recém-nascidos afetados por diarréias. Este efeito era atribuído à
capacidade dessas bactérias removerem outros microrganismos responsáveis pelas desordens
gástricas, e de se restabelecerem ecologicamente como microrganismos intestinais
dominantes. Atualmente, o gênero Bifidobacterium incluí mais de 30 espécies, das quais
pouco mais da metade é de origem animal (fezes e rúmen), cerca de um terço é de origem
humana (cáries dentárias, fezes e vagina), duas de águas residuais e uma de leite fermentado,
sendo que novas espécies ainda são descritas constantemente (Gomes, 1999, Meile, Blay &
Thierry, 2008).
Pouco depois, Élie Metchnikoff (1845-1916), um zoólogo russo, atribuiu propriedades
curativas ao iogurte. Na última década de sua vida, quando trabalhava no Instituto Pasteur,
descobriu que a Bulgária possuía um incrível número de pessoas centenárias, apesar de ser um
dos países europeus mais pobres e com serviço médico de qualidade muito precária. Ele
observou que eles consumiam muito iogurte. Depois, isolou uma bactéria desse alimento e
passou a defender que conferiam ao produto o benefício da promoção de longevidade.
Metchnikoff alegava que o consumo regular de grandes quantidades de iogurte contendo
espécies de L. acidophilus resultava numa capacidade mais alargada de controlar infecções
41
por agentes patogênicos entéricos (Daza, 2004; Gomes, 1999; Metchnikoff, 1908 In: Etzion
et. al., 2008).
Assim, Metchnikoff se tornou um firme defensor de que a dieta pode proteger o corpo da
invasão de patógenos e melhorar a qualidade de vida. Foi a primeira pessoa a desenvolver um
medicamento a base de lactobacilos em forma de cápsulas orais, dando início oficial à era da
probiótica (Daza, 2004).
Probióticos são microrganismos vivos que, administrados em quantidades adequadas,
conferem benefícios à saúde do hospedeiro. A microbiota intestinal humana exerce um papel
importante tanto na saúde quanto na doença e a suplementação da dieta com probióticos pode
assegurar o seu equilíbrio. Existem também os prebióticos, carboidratos não-digeríveis, que
estimulam seletivamente a proliferação das populações de bactérias desejáveis no cólon. Um
produto referido como simbiótico é aquele no qual um probiótico e um prebiótico estão
combinados (Saad, 2006).
Durante as últimas décadas, as propriedades nutritivas e terapêuticas de alimentos funcionais
que incorporam bactérias probióticas têm sido alvo de atenção considerável. No entanto,
alguns dos resultados obtidos são altamente variáveis e por vezes inconsistentes, o que
dificulta o estabelecimento, de forma clara e inequívoca, de um determinado benefício para a
saúde. Para isso, existe um importante empenho na organização de estudos sobre bactérias
probióticas, para provar essas relações através de ensaios cuidadosamente planejados,
randomizados e controlados por placebo (Gomes, 1999).
42
Além disso, vários microrganismos naturalmente presentes nos ambientes desempenham
papéis fundamentais. Por exemplo, alguns modificam elementos como nitrogênio, carbono e
enxofre em formas que possam ser utilizadas pelas plantas para o seu crescimento. Ou seja,
além de benéficos, são essenciais para a vida no planeta (Madigan et.al., 2004; Filip &
Demnerova, 2007).
O primeiro pesquisador que pensou nos microrganismos como possíveis agentes em favor da
agricultura foi o russo Sergei Nikolaevich Vinogradskii (1856–1953), com a descoberta da
quimiossíntese, em 1890. Esta idéia lhe ocorreu após descobrir que alguns micróbios
sobrevivem em meios de cultura puramente inorgânicos e realizou trabalhos com bactérias
nitrificantes. Assim, ele testou os complexos biológicos envolvidos na conversão de amônia
em nitratos e nitritos no solo e capturou a atenção da comunidade científica mundial,
mudando a forma como se estudava o papel dos micróbios no solo (Ackert, 2006).
Os microrganismos também podem ser usados na biorremediação de solos contaminados, pois
alguns tipos de bactérias e fungos são capazes de degradar ou diminuir a concentração de
determinados
poluentes,
como
o
petróleo.
Existem
diferentes
metodologias
de
biorremediação, que podem implicar na remoção física do solo afetado ou no tratamento do
material contaminado no próprio local e dependem do tipo de ambiente a ser despoluído. Para
que ela seja bem-sucedida é preciso usar o micróbio adequado no ambiente certo e nas
condições fundamentais. Entretanto, alguns compostos químicos, como os metais pesados,
não são biodegradáveis e outros também podem gerar metabólitos tóxicos. Portanto, devem
ser feitos estudos em escalas menores antes de atuar na área afetada (Boopathy, 2003)
43
Além de despoluir solos, os micróbios também podem ser usados na biorremediação de
ambientes aquáticos. O tratamento utiliza populações microbianas que modificam ou
decompõem determinados poluentes, tanto pelo isolamento de micróbios do próprio ambiente
contaminado, como na adição de microrganismos provenientes de outros sítios ou de estirpes
geneticamente modificadas. A estratégia mais adequada deve levar em consideração a
quantidade e composição do contaminante, as características do local, a profundidade do
lençol d‘água, a relação custo/benefício e o tempo de tratamento. Esses processos requerem
monitoramentos constantes (geralmente feitos com técnicas de Biologia Molecular e
Bioinformática) para assegurar a sua eficiência e se não ocorreram danos ao ecossistema local
(Cunha et al., 2008).
É importante ressaltar que os micróbios constituem mais de 60% da biomassa de toda a
biosfera e cerca de 90% das células do corpo humano. Bactérias e fungos povoam nosso
intestino, pele, boca e outros orifícios, com os quais mantém relações benignas, ou mesmo até
mesmo benéficas. As plantas e animais surgiram dentro de um mundo microbiano e mantém
uma relação íntima com eles, bem como a sua dependência (Filip & Demnerova, 2007).
Um exemplo desta dependência é a atuação de alguns tipos de micróbios na digestão dos
ruminantes. As primeiras culturas puras de bactérias de ruminantes foram isoladas em
laboratório por Hungate em 1950 (Hungate, 1950) e depois foram descobertos outros tipos de
microrganismos nesse ambiente, como fungos e protozoários, que atuam em menor
proporção. Estes micróbios produzem enzimas que degradam a resistente parede celular das
plantas, permitindo que sejam digeridas por esses animais (Weimer, 1996; Wallace, 1994).
44
Inclusive, esses tipos de enzimas, produzidos por diversos microrganismos, também são
aproveitados pelas indústrias. Os micróbios que degradam as fibras da parede celular dos
vegetais, como celulose, lignina e pectina, são úteis na produção de papel (e para torná-lo
mais branco), na produção de biocombustíveis, de alimento animal, na degradação de
poluentes, na clarificação e estabilidade de sucos concentrados, na extração de óleos vegetais,
fermentação do chá e café e na extração de fibras têxteis. Os que degradam o amido dos
vegetais também têm aplicações na indústria de alimentos processados, fabricação de álcool
etílico, indústrias têxteis e de papel (Pandey et al., 1999).
As proteases representam quase 60% do mercado industrial de enzimas em todo o mundo.
Elas são implicadas em uma série de processos biotecnológicos, como na transformação de
alimentos e produtos farmacêuticos, indústria de couro, detergente industrial, etc. Além disso,
as enzimas microbianas que degradam lipídeos têm uma vasta gama de aplicações industriais
na produção e transformação de detergentes, óleos, gorduras e de produtos lácteos e na
preparação de fármacos. As que degradam açúcares como galactose têm aplicações na
indústria farmacêutica e alimentar e as que degradam aminoácidos como a glutamina são
aplicados na indústria alimentícia para realçar o sabor de alimentos e no tratamento de
leucemias (Pandey et al., 1999).
Outros importantes produtos do metabolismo microbiano são os imunossupressores
ciclosporina, rapamicina e tacrolimus. A ciclosporina foi isolada como produto do fungo
Tolypocladium inflatum e teve seus efeitos imunossupressores descritos por Borel e
colaboradores em 1976. A substância começou a ser usada em transplantes humanos por
Calne em 1977, na Inglaterra, e aperfeiçoado por Starzl no ano seguinte. Assim, ocorreu um
marco na história dos transplantes, pois aumentou a sobrevida dos pacientes de 30 para 70 a
45
80%, em média, no primeiro ano após a cirurgia (Borel et al, 1976; Mies et al, 2003; MartínDávila, Blanes & Fortún, 2007).
A rapamicina foi descrita primeiramente, em 1975, como um produto natural da bactéria
Streptomyces hygroscopicus, isolada do solo de Vai Atore, na Ilha de Páscoa. Porém, seu
efeito imunossupressor só foi descoberto cerca de 10 anos depois, quando um grupo de
pesquisadores japoneses isolou a substância tacrolimus de metabólitos da bactéria
Streptomyces tsubukubaensis, de solo japonês. Esta apresentou um efeito imunossupressor
cerca de 10 a 100 vezes mais potente que a ciclosporina e tinha uma estrutura muito similar à
rapamicina – que se mostrou ainda mais imunossupressora. Além disso, atualmente também
foram atribuídas propriedades anticancerígenas à rapamicina (Huang & Houghton, 2001;
Martín-Dávila, Blanes & Fortún, 2007).
Além de serem importantes na saúde humana, de animais, ao meio ambiente e em diversas
aplicações industriais, os microrganismos também são fundamentais para muitas pesquisas
científicas em biologia molecular. Afinal, graças a uma Arquea que é possível realizar as
famosas reações de amplificação do material genético, conhecidas como PCR. Ela foi
descoberta nos anos 60, numa expedição do microbiologista Thomas Brock ao Parque
Nacional de Yellowstone, nos EUA, famoso pelos gêiseres e fontes termais. Brock pretendia
estudar a ecologia microbiana desses ambientes extremos e seu grupo conseguiu isolar o
organismo Thermus aquaticus, capaz de sobreviver em temperaturas muito elevadas, de até
73ºC. Logo foi descoberto que esse organismo produz uma enzima capaz de agir no DNA - a
base de um negócio multimilionário que revolucionou a ciência em todo o mundo (Brock,
1998).
46
Hoje, a biotecnologia se utiliza dos microrganismos para produzir inúmeros tipos de produtos,
que vão desde alimentos, bebidas e suplementos alimentares, à produção de substâncias
químicas farmacêuticas (como vacinas, antibióticos, drogas esteróides, insulina, inibidores
enzimáticos, agentes farmacológicos e imunologicamente ativos, fatores de crescimento,
antioxidantes, etc.), substâncias de valor comercial (solventes e enzimas), biocidas
(inseticidas biológicos que controlam plantações de infestações de larvas e insetos), produção
de metano (gás natural), diversas aplicações na indústria do petróleo, etc. (Pelczar, 1996;
Manzi & Mayz, 2003). Portanto, tem crescido muito o interesse da medicina e agricultura
modernas pela identificação e caracterização biológica e molecular de microrganismos úteis
(Manzi & Mayz, 2003).
1.4 Doenças e microrganismos no imaginário popular
Diversas pesquisas já foram desenvolvidas acerca das percepções da população (inclusive de
jovens) sobre as relações entre saúde e doença em geral e também de algumas doenças
especificamente. Uchôa & Vidal (1994) demonstram a pertinência do discurso antropológico
na abordagem da saúde e da doença:
―Sabemos hoje que noções, como as de saúde e doença, aparentemente
simples referem-se, de fato, a fenômenos complexos que conjugam fatores
biológicos, sociológicos, econômicos, ambientais e culturais. A
complexidade do objeto, assim definido, transparece na multiplicação de
discursos sobre a saúde que coexistem atualmente, cada um privilegiando
diferentes fatores e sugerindo estratégias de intervenção e de pesquisa
também diversas.‖
(Uchôa & Vidal, 1994)
Este tipo de estudo é muito usado para desenvolver novas abordagens de políticas em saúde.
Na perspectiva antropológica, o universo sócio-cultural do doente não é visto como um
obstáculo à efetividade dos programas e práticas terapêuticas, mas como o contexto onde
estão arraigadas as concepções sobre as doenças e os comportamentos diante delas. Os
47
autores ressaltam que ―a doença é ora vista como um problema físico ou mental, ora como
biológico ou psicossocial, mas raramente como fenômeno multidimensional‖ e atribuem essa
visão reducionista a um legado de Descartes, relacionado à visão mecanicista do corpo
(Uchôa & Vidal, 1994).
Muitas vezes, o micróbio aparece no papel de causador de doenças, como nos estudos de
Boruchovitch e Mednick (2000) e Boruchovitch e colaboradores (1991), feitos com jovens do
Ensino Fundamental. Além disso, uma comparação entre crianças sadias e hospitalizadas
mostrou que a doença é vista como provocada por algo, desde um vírus até um vício, e que a
criança hospitalizada se atém à sua própria experiência na conceituação geral de doença
(Moreira & Dupas, 2003).
Outros estudos mostram os micróbios em segundo plano na concepção da doença, como o
desenvolvido por Minayo (1988), sobre trabalhadores que vivem em favelas do Rio de
Janeiro. A visão de saúde-doença dessa população é repleta de contradições, pluralista,
ecológica e holística, integrando explicações de origem natural, emocional e sobrenatural que se expressam no corpo, porém, o ultrapassam.
Também destacamos aqui alguns trabalhos sobre percepções de populações sobre
determinadas doenças específicas. Uma população que procurou atendimento em unidades
sanitárias da zona urbana de Santa Maria, no Rio Grande do Sul, mostrou saber que a cárie
dentária é formada por microrganismos presentes nos dentes, expressos como ―bactéria‖,
―fungo‖, ―bichinho‖ e ―verme‖. Ela foi atribuída à falta de higiene e de escovação (Unfer &
Saliba, 2000).
48
Sobre o HIV, a população da favela da Rocinha, no Rio de Janeiro, mostrou concepções
equivocadas, tanto a respeito do papel do mosquito como vetor quanto do ato de doar sangue
poder acarretar a doença no doador (Fernandes, 1998). Além disso, outros estudos mostram
resultados discrepantes sobre o uso da camisinha na prevenção da doença. Embora Ferreira
(2008) afirme que, entre 1998 e 2005, houve um grande aumento no nível de informação da
população nesse sentido, Fernandes e colaboradores (2000) mostraram que mulheres
atendidas na rede primária de saúde de Campinas, São Paulo, a relacionam mais com a
prevenção de gravidez do que de doenças e a utilizam pouco.
Com relação à dengue, Claro e colaboradores (2004) fizeram uma revisão de estudos (entre
1990 e 2002) sobre os conhecimentos, crenças, atitudes, práticas e representações populares a
respeito da doença. Os estudos focam mais o mosquito transmissor e pouco o agente
etiológico viral e mostram um grande conhecimento das pessoas sobre a dengue, seus
sintomas e vetores. Porém, uma população em área de risco, no litoral norte do Estado de São
Paulo, revelou ter conhecimento incompleto, fragmentado e às vezes equivocado sobre a
dengue e seu vetor, principalmente na sua relação com a água limpa, que colide com a
representação social clássica, segundo a qual a doença tem a ver com ―sujo‖ e saúde com
―limpo‖ (Lefèvre et al., 2007).
Outra população residente de região endêmica, dessa vez para a esquistossomose, foi estudada
por Noronha e colaboradores em 1995. O grupo de jovens muito pobres da cidade de Santo
Antonio de Jesus, no Recôncavo Baiano, atribuem a doença aos hábitos de higiene pessoal, o
contato com as águas e alimentos contaminados e a forma de prepará-los. Para eles, o mais
difícil é compreender os aspectos invisíveis do ciclo de transmissão da doença, como a
49
existência de seres microscópicos que contribuem para completar o ciclo. A crença prevalente
é que, fora do corpo humano, os vermes morrem (Noronha et al., 1995).
Outro tipo de estudo, que despontou na década de 70, busca elucidar as concepções
alternativas dos alunos, sobre diversos tipos de fenômenos científicos aprendidos nas escolas
(Villani, 2001; Driver, 1989; Mortimer, 1996). Eles visam trabalhar as idéias alternativas dos
alunos em várias situações em favor das concepções científicas. Foram muito motivados pela
necessidade de desvendar problemas de comunicação e possibilitar uma nova perspectiva de
aprendizado, com a elaboração de testes e instrumentos que despertassem a atenção do aluno
em sala de aula (Villani, 2001; Driver, 1989).
Estudos em diferentes países mostram que há algo em comum na forma como os alunos
constroem a interpretação dos acontecimentos do mundo natural, mesmo que se leve em
consideração as influências de diferentes culturas (Driver, 1989). Estas idéias alternativas de
crianças e adolescentes são pessoais, relativamente incoerentes, difíceis de serem
verbalizadas, fortemente influenciadas pelo contexto do problema e muito resistentes a
mudanças (Mortimer, 1996; Pozo, 1996).
Apesar de Massarani e Moreira (2005) mostrarem alunos de segundo grau (de escolas
públicas e privadas do Rio de Janeiro) relativamente bem informados sobre aspectos de
aplicação da genética, como alimentos transgênicos e resultados do projeto genoma humano,
outros estudos apontam da direção contrária. Um exemplo é a pesquisa desenvolvida em 2007
por Pedrancini e colaboradores, na qual alunos do 3º ano do ensino médio de escolas
estaduais e particulares da região Noroeste do Paraná apresentaram muitas idéias alternativas
50
e definições equivocadas em relação aos seres vivos, células, composição química e função do
material genético.
Termos como DNA e genes foram abordados com naturalidade e identificados como
determinantes da informação genética. Porém, alguns consideraram que ele é constituído por
―uma filinha de letrinhas‖ ou ―pela adenina, timina, um outro que começa com U e um
negocinho que era um pentágono‖. Somente alguns reconheceram seu papel como o principal
constituinte dos cromossomos, enquanto que para outros ―o cromossomo é uma célula‖ e ―o
gene é constituído de cromossomos‖. Estas concepções podem indicar que o aluno apropriouse da palavra e não necessariamente do conceito (Pedrancini et al., 2007).
Sutton (1997) conclui que a escola promove uma visão distorcida da ciência. Segundo ele, os
alunos acham que ciência é acumulação de teorias, que foram descobertas por um único
cientista e sem argumentação. Não entendem suas instituições sociais nem a formação do
consenso científico. Os experimentos e teorias são desconectados e muitos não sabem ao
menos o que é um experimento.
Num paralelo com a filosofia da ciência, o autor argumenta que os termos científicos se
originam quando as novas idéias são colocadas em prova na comunidade científica - na forma
de convencimento, com o uso constante da metáfora. Quando a idéia é aceita e estabelecida, a
linguagem é ―etiquetada‖ com termos exatos atribuídos a cada conceito. Apenas então, os
conceitos chegam ao livro texto e os alunos só têm acesso a essa linguagem rígida estipulada,
que reforça a crença na fatalidade dos descobrimentos. Assim, Sutton (1997) acredita que a
história social da ciência pode ajudar o aluno a entender o esforço interpretativo e o raciocínio
que os cientistas tiveram.
51
Além disso, outros estudiosos sobre o ensino de ciências, como Pozo (1996), citam a forte
influência dos meios de comunicação na construção de ‗representações sociais‘ do
conhecimento científico. Por serem transmitidas através dos canais de socialização, se tornam
mais arraigadas nas práticas cotidianas. Diversos estudos também destacam a importância da
mídia como fonte de informação e atualização sobre os temas relacionados à saúde
(Fernandes, 1998; Fernandes et al., 2000; Lefrèvre et al., 2007) e ciência (Silva & Krasilchik,
2005; Massarani & Moreira, 2005; Pedrancini et al., 2007).
Ressaltamos que a mídia, além de desempenhar um importante papel no conhecimento da
população, também é formada por agentes sociais que sofrem influência dos diversos fatores
sócio-culturais que permeiam esses temas (Moscovici, 2003; Verjovsky et al., In press).
Assim, esse meio também é passível de estudo.
1.5 Ciência, saúde, mídia e sociedade
Os brasileiros estão cada vez mais interessados em temas de ciência e tecnologia, embora
grande parcela ainda entenda pouco ou nada dos assuntos da área, segundo uma pesquisa
recente do Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT). O trabalho mostrou que o tema
favorito da população é medicina e saúde, que o interesse em assuntos científicos é superior à
política e que a população prefere receber informações sobre ciência intermediadas por
jornalistas, para facilitar a compreensão da temática, considerada difícil (Moreira &
Massarani, 2007).
A popularização do conhecimento acontece quando a teoria científica se difunde a partir do
―inventor‖ para a população. Segundo Moscovici (2003), toda teoria científica tende a se
52
tornar primeiro senso comum em um grupo restrito (uma minoria de cientistas, por exemplo)
e depois é distribuída através da maioria, a sociedade. Então, a nova idéia interfere em ideais
existentes na sociedade, torna-se foco de conversações, debates, etc. que os reforçam e
intensificam. Assim, ocorrem reformulações e um novo conhecimento é criado, uma nova
representação é partilhada pelo senso comum, com seu próprio estilo e conteúdo que, algumas
vezes, torna-se irreconhecível. Afinal, a minoria inicial (no caso, os cientistas) não está imune
às pressões da maioria, o que pode levar à relutância em expressar novas idéias (Moscovici,
2003).
―Até hoje, mesmo após tanto se bater na tecla da necessidade de se divulgar
a ciência, ainda há aqueles pesquisadores que ficam com um pé atrás –
quando não os dois – ante os pedidos de jornalistas e outros profissionais
divulgadores para conceder uma entrevista ou prestar algum esclarecimento,
por pequeno que seja. E muitas vezes, quando cedem, o fazem com certo
temor e até chegam a pedir que se lhes envie o texto, para verificação, antes
da publicação.‖
(Destácio, 2008)
Assim, talvez o maior desafio para os divulgadores de ciência seja o de conciliar a clareza
necessária ao entendimento pelo público e a precisão inerente ao campo científico. Porém,
manter a precisão científica, muitas vezes resulta em imprecisão no entendimento. O
divulgador deve buscar a linguagem adequada - e a medida na qual os pormenores científicos
serão esmiuçados dependerá de cada público (Destácio, 2008).
Alguns profissionais e estudiosos da área, como Reis (2007), consideram fundamental que a
divulgação de ciência leve em conta as deficiências educacionais do país e, portanto, deve ser
feita criteriosamente com o intuito de preencher lacunas de formação básica. Porém, outros
autores afirmam que não é papel do jornalista científico ser o responsável por educar
cientificamente a sociedade: ―Mesmo sabendo da realidade educacional em que se encontra o
país, não pode ser passada a responsabilidade de educar aos jornalistas científicos. Esse papel
53
fica a cargo das escolas, em maior grau, e da divulgação científica, em menor grau‖ (Maia &
Gomes, 2006).
Caldas (1998) faz uma reflexão sobre o papel da mídia na formação crítica da opinião pública
sobre a política científica e tecnológica do país e coloca que ela desempenha uma função
estratégica como agente de desenvolvimento e bem-estar social. Porém, o cientista também
divide a responsabilidade social, em parceria com o jornalista, na divulgação da ciência.
Afinal, a decodificação do discurso científico pelo público leigo ainda é um obstáculo a ser
vencido, particularmente porque o analfabetismo científico se aprofunda cada vez mais,
devido à velocidade com que as novas idéias são trazidas à tona. Inclusive, deve-se levar
também em consideração outras facetas menos nobres da ciência e da tecnologia, pois
ocorrem suspeitas contra empresas, universidades e mesmo cientistas, acusados de
privilegiarem interesses políticos, econômicos, comerciais ou pessoais. Assim, a divulgação
de ciência e tecnologia exige uma postura do jornalismo científico, comprometido com uma
perspectiva crítica desse processo (Bueno, 2001).
Outro aspecto ao qual está relacionada a qualidade da divulgação científica é o fato de que
uma notícia sobre ciência, tal como qualquer outra, tem de competir por espaço, e o fato de
ser publicada depende de vários fatores. Um dos principais é a característica do jornal
(informativo, interpretativo, popular, sensacionalista, etc.), as bases culturais dos editores e o
número de jornalistas experientes na área. ―Assim, as notícias sobre bactérias assassinas, vírus
exterminadores, e terapias milagrosas tendem a ter maior apelo, uma vez que tais histórias
competem com assassinatos, estupros, catástrofes ecológicas, e declarações de pessoas
famosas‖ (Semir, 1996).
54
Na tentativa de estabelecer boas práticas no jornalismo científico, os editores procuram
garantir informações confiáveis se respaldando em estudos publicados em revistas científicas
renomadas, que sofrem revisão rigorosa por outros pesquisadores. Estas revistas escrevem
resenhas de alguns artigos (os chamados press releases), que são enviados com antecedência
para mídias de todo o mundo, junto com os contatos (telefone, fax e e-mail) dos principais
pesquisadores, para facilitar o trabalho dos jornalistas e, assim, influenciar favoravelmente na
publicação da notícia (Semir, 1996).
Os jornalistas usam outros sistemas para obter informações, como através de assessores de
imprensa das instituições, ou também podem simplesmente comprar notícias já prontas de
outras fontes de notícias, nacionais ou internacionais, o que ocorre muito nos veículos da
mídia com editorias de ciência muito pequenas ou inexistentes.
―Atualmente, o espaço dedicado à ciência nos jornais é, no geral, bastante
limitado e há ainda poucos jornalistas especializados em ciência. (...) Parte
significativa dos artigos sobre ciência que são publicados é constituída de
traduções de textos comprados ou disponibilizados de jornais ou revistas do
exterior.‖
(Moreira & Massarani, 2002)
Nisbet e colaboradores (2002) observaram que diferentes tipos de mídia (jornais, televisão em
geral, televisão sobre ciência e revistas sobre ciência) afetam a percepção do público de
formas diferentes. Os leitores de jornais, os que assistem canais sobre ciência e os que lêem
revistas sobre ciência, têm uma visão mais positiva de ciência. A TV em geral tem uma
audiência muito mais ampla e fornece visões positivas e negativas sobre a ciência e a sua
capacidade de informar o público cientificamente não pode ser subestimada. Quando a
educação formal acaba, a mídia se torna a principal fonte (e às vezes, a única) para o público
conseguir informações sobre descobertas científicas, controversas, eventos e o trabalho dos
55
cientistas. Embora existam outras fontes, como museus e fontes interpessoais, nenhuma
fornece tanto acesso como a mídia de massas (Nisbet et al., 2002).
Porém, as visões acerca da ciência variam conforme os diferentes jornais e países - como
mostra uma análise da cobertura de ciência em seis importantes jornais de três países da
América Latina. Os resultados sugerem que os jornais argentinos e mexicanos dão mais
ênfase aos temas sobre medicina, saúde e uma maior valorização dos cientistas nacionais,
como indivíduos. Já os jornais brasileiros, no entanto, dão mais foco às ciências exatas, aos
temas ambientais e aos resultados das pesquisas, em detrimento aos seus realizadores. Um dos
jornais mexicanos se destacou por dar mais espaço à política científica. Além disso, a maioria
das matérias foi assinada pelos próprios jornalistas das equipes dos jornais, e os cientistas
foram usados como as principais fontes de informação (Massarani et al., 2008).
Algo semelhante foi observado por Listerman (2008), que analisou a cobertura sobre
biotecnologia em dois principais jornais da Alemanha, da Inglaterra e dos EUA entre 2000 e
2002. O autor observou uma tendência geral de cobertura mais positiva do que negativa nos
três países, sendo que os EUA foram mais positivos que os outros. A seleção das notícias foi
muito similar durante a cobertura rotineira e variou apenas em resposta a eventos regionais,
por curtos períodos de tempo.
Mesmo dentro de um só veículo, esta abordagem pode variar conforme o tempo, como indica
uma análise de como a nanotecnologia foi abordada no jornal de maior circulação nacional, a
Folha de São Paulo, desde a primeira vez em que foi noticiada pelo jornal, em 1996, até
março de 2007. No início, prevaleciam as promessas sobre a tecnologia, que foram
apresentadas como ―revolucionárias‖ e com o potencial de melhorar vários aspectos da vida
56
humana. Depois, o jornal passou a apresentar algumas controvérsias sobre os riscos da
nanotecnologia. As notícias, que estavam concentradas na seção ―Ciência‖, passaram a
aparecer também nas seções ―Negócios‖ e ―Dinheiro‖. Também houve mudança na forma
como ela foi explicada, com a diminuição do termo ―nanorrobô‖ no decorrer dos anos
(Amorim, 2008).
Também foram observadas variações com relação a diferentes temas. Uma análise sobre a
cobertura da mídia impressa no Canadá e EUA em fevereiro de 2004 - quando ocorreu a
reunião anual da Associação Americana para o Avanço da Ciência, na qual um grupo de
cientistas coreanos anunciou ter clonado embriões humanos - mostrou que praticamente não
foi abordada a questão da privacidade genética nesse período e prevaleceu um argumento
receoso com relação aos alimentos geneticamente modificados. Quanto às células-tronco,
prevaleceu um panorama norte-americano favorável (especialmente com relação ao potencial
medicinal das pesquisas), mas no Canadá a mídia abordou mais a questão ética e sobre a
necessidade de regulamentação dessas pesquisas (Priest, 2006).
No Brasil, um estudo feito pelo nosso grupo mostrou que a mídia televisiva nacional foi
parcial ao fornecer mais visões favoráveis às pesquisas com células-tronco embrionárias,
durante as votações sobre sua constitucionalidade no Supremo Tribunal Federal. No entanto,
refletiu a opinião pública, o que culminou com a aprovação destas pesquisas em maio de
2008. No entanto, o período foi marcado por uma profunda discussão de cunho religioso
(Verjovsky et al., In press). Outro estudo norte-americano mostrou que o conservadorismo
cristão está ligado a uma visão mais negativa sobre as células-tronco embrionárias e aqueles
que liam mais jornais tinham uma atitude mais positiva a respeito dessas pesquisas (Nisbet &
Goidel, 2007).
57
Porém, Leite (2000) faz um importante alerta sobre a limitação da comparação desses estudos
internacionais com a situação brasileira.
―A polêmica no Brasil sobre a regulamentação dos alimentos transgênicos
costuma ser interpretada à luz da dicotomia de atitudes entre Estados Unidos
e Europa. Pesquisas de opinião recentes revelam, no entanto, um quadro
muito mais matizado, tornando essas categorias em grande medida
irrelevantes para a compreensão da controvérsia brasileira. A divulgação
científica pela imprensa pode contribuir para aumentar o grau de
objetividade desse debate, mas se encontra tolhida por deficiências diversas,
do baixo grau de informação científica do público à sua própria incapacidade
de problematizar a apresentação ideológica da biotecnologia.‖
(Leite, 2000)
Além de formadores de opinião sobre a ciência, os meios de comunicação de massa, entre eles
a grande imprensa, também se constituem em importantes veículos na divulgação de
informações de saúde para parcelas significativas da população (Barata, 1990). Onde exercem
igualmente uma função social que ultrapassa o papel de apenas informar a sociedade (Darde,
2004).
A mídia exerce grande influência na percepção pública das doenças e epidemias, por
exemplo. Darde (2004) analisou a postura dos meios de comunicação brasileiros em relação à
epidemia da Aids nas duas últimas décadas. Segundo o autor, a cobertura da doença se tornou
rotineira a partir de 1989, quando passou a ser enquadrada principalmente como um
acontecimento de investigação científica. Então, as notícias procuraram abordar as novas
pesquisas publicadas em revistas científicas e sobre o alastramento da epidemia, através das
estatísticas.
Muitas vezes, a ação governamental sobre as epidemias depende da divulgação da grande
imprensa, como no caso da meningite meningocócica, por volta de 1986, em São Paulo. O
assunto ter surgido na imprensa paulistana foi crucial para que as autoridades assumissem a
58
existência da epidemia, levou a população e os médicos a se mostrarem atentos para o
problema e gerou buscas por atendimento e diagnóstico mais precoces (Barata, 1990).
Porém, algumas vezes a atenção midiática a situações de risco coletivas pode atingir
dimensões desproporcionais e se desvirtua inclusive do seu papel de informar e prevenir a
população, como mostra uma analise da cobertura do Estado de Minas, principal jornal diário
de Belo Horizonte, Minas Gerais, sobre as epidemias de dengue naquela capital entre 1996 e
2000. O número de notícias foi estreitamente relacionado com o número de casos registrados
e as epidemias eram praticamente esquecidas pelo noticiário quando diminuíam os casos.
Além disso, pouco espaço foi destinado à prevenção da doença (França et al., 2004).
O enfoque no número de casos indica um interesse pela informação renovável. As medidas de
controle são informações ―antigas‖, que não se renovam no curso da narrativa sobre a
epidemia e, portanto, são consideradas de menor apelo para captar a atenção do público. O
discurso da mídia muitas vezes privilegiou o enfoque da denúncia e serviu à simples troca de
acusações entre instâncias de poder, sem aprofundar fatores políticos que determinam os
investimentos em saúde (França et al., 2004).
Resultados semelhantes foram encontrados no estudo de Roche e Muskavitch (2003). Eles
verificaram uma baixa abordagem sobre modos de prevenção em surtos da doença causada
pelo Vírus do Oeste do Nilo - um flavivírus transmitido por mosquito que emergiu em 1999
nos EUA, infectando centenas de pessoas e causando algumas mortes (Roche & Muskavitch,
2003). O mesmo foi observado por Ungar (2008) com notícias em inglês sobre a gripe aviária,
de diversos países, selecionadas por dois anos pelo sistema de alertas do Google. Ocorreu
uma cobertura consistente sobre o alastramento da doença, as chances de uma mutação mortal
59
e as mortes de pessoas infectadas, criando o sentido de que ―um vírus monstruoso está
chegando‖.
Em alguns casos os cientistas tiveram pouca voz nos meios de comunicação, quando
comparados a políticos. Um estudo sobre a cobertura do ―mal da vaca louca‖ em seis
importantes jornais da Espanha mostrou que a posição atribuída aos cientistas é qualificada,
mas não muito eficiente, pois falam de questões ainda hipotéticas, que estão sendo
pesquisadas e não oferecem respostas imediatas às necessidades sociais (Calsamiglia &
Ferrero, 2003).
Por fim, ressaltamos que todos os aspectos aqui abordados estão intimamente interligados. A
história dos microrganismos e das doenças infecciosas influencia as visões da população e de
como a mídia aborda esses temas. Porém, os estudos aqui apresentados não têm como
objetivo principal o entendimento das concepções atribuídas especificamente aos
microrganismos, embora possamos retirar deles informações úteis nesse sentido. Além disso,
nenhum buscou averiguar também a opinião dos pesquisadores sobre a divulgação de ciência
e/ou dos microrganismos.
60
2. Objetivos
Este trabalho procurou comparar como alunos de uma amostra de escolas do Rio de Janeiro
apreendem o tema microrganismos com o que os pesquisadores da área acreditam que a
população deveria saber sobre o assunto e a forma como a mídia aborda o tema através da
internet.
2.1 Objetivos específicos:
. Averiguar aspectos gerais sobre como alguns alunos de escolas do Rio de Janeiro
conceituam os microrganismos.
. Identificar quais são os aspectos sobre os microrganismos que os pesquisadores da área
consideram mais importantes que a população em geral tenha conhecimento a respeito.
. Avaliar se notícias publicadas pela mídia e veiculadas na internet têm abordagem positiva,
negativa ou neutra com relação aos microrganismos.
. Comparar as diferentes análises feitas.
61
3 Metodologia
A análise dos materiais desta pesquisa foi executada segundo metodologias propostas pela
pesquisadora francesa Laurence Bardin (1977). Na etapa denominada pela autora como ―préanálise‖, foram formulados os objetivos e hipóteses da pesquisa, escolhidos os documentos a
serem analisados que forneçam informações sobre o problema e elaborados os indicadores
que fundamentarão a interpretação final.
Os indicadores trazem à tona determinadas características do texto analisado consideradas
importantes pela hipótese da pesquisa. Eles consistem em definir as unidades de registro e de
contexto do material. Ou seja, identificar quais os elementos do texto (palavras ou conceitos)
que devem ser considerados na análise.
A unidade de registro determina o segmento de conteúdo que servirá como base para a
categorização e contagem. Neste trabalho, agrupamos esses termos em unidades temáticas,
que consistem em: ―descobrir os núcleos de sentido que compõem a comunicação e cuja
presença ou freqüência de aparição podem significar alguma coisa para o objetivo analítico
escolhido‖ (Bardin, 1977) .
Já a unidade de contexto é a busca por um exemplo, dentro do material analisado, que
contextualize onde as unidades de registro estão inseridas. Pode ser, por exemplo, uma frase
onde a palavra está inserida.
As regras de enumeração consistem em definir como as unidades de registro serão
quantificadas. Existem diferentes tipos de contagem com funções diversas e abordaremos de
62
forma detalhada os tipos utilizados nesta pesquisa posteriormente, dentro dos itens específicos
de análise de cada material.
Ainda na etapa de ―pré-análise‖, o material é preparado conforme sua necessidade particular
(por exemplo, editado, recortado, digitado, etc.) e, então, é estabelecido o primeiro contato
com o material a ser analisado, fase denominada de leitura flutuante. Consiste em:
―conhecer o texto deixando-se invadir por impressões e orientações. (...)
Pouco a pouco, a leitura vai tornando-se mais precisa, em função de
hipóteses emergentes, da projeção de teorias adaptadas sobre o material e da
possível aplicação de técnicas utilizadas sobre materiais análogos.‖
(Bardin, 1977)
Nas etapas seguintes, o material é analisado, segundo as decisões tomadas na etapa anterior.
Então, os resultados brutos são tratados de forma a serem válidos. Assim, o analista pode
propor inferências e interpretar os resultados segundo os objetivos previstos ou a descobertas
inesperadas.
As especificidades metodológicas de cada material serão explicitadas a seguir.
3.1 Questionário dos alunos
3.1.1 Elaboração:
Participaram deste trabalho, 30 e 41 alunos de duas escolas particulares da Zona Sul do Rio de
Janeiro, identificadas aqui respectivamente como escolas 1 e 2, e 36 alunos de um Ciep,
localizado em São Gonçalo, identificado aqui como escola 3. Foi solicitado aos respectivos
professores de biologia a aplicação do questionário para alunos da 7ª série do Ensino
63
Fundamental (atual 8º ano), que já haviam entrado em contato na escola com os temas
analisados.
De forma a averiguar as concepções destes jovens acerca dos microrganismos, elaboramos as
seguintes questões abertas:
―Explique o que são:
1.
Micróbios:
2.
Bactérias:
3.
Fungos:
4.
Protozoários:
5.
Vírus:
6.
Helmintos / Vermes:‖
Depois de cada tópico, foram traçadas três linhas com o intuito de se oferecer liberdade para
que o aluno se manifestasse através da escrita.
Em seguida, este material foi preparado para análise com a digitação das respostas em
arquivos de texto unitários, identificados de acordo com a escola, a pergunta e o número
identificador de cada aluno.
3.1.2 Métodos de análise:
A regra de enumeração utilizada como base para esta análise foi a freqüência. Ela consiste na
medida mais utilizada e corresponde ao postulado (válido em alguns casos) de que ―a
64
importância de uma unidade de registro aumenta com a freqüência de aparição‖ (Bardin,
1977).
Para isso, as respostas dos alunos foram analisadas com a ferramenta Triviumsoft,
desenvolvida pelos filósofos Michel Serres e Pierre Levy e pelo matemático Michel Authier,
que nos permite agrupar e quantificar mais facilmente os padrões de respostas, formando
árvores de conhecimento (Authier et.al., 2006). A partir da identificação dos termos mais
freqüentes, eles foram então categorizados, ou seja, organizados por grupos temáticos.
Com as análises quantitativas, buscamos quais desses grupamentos tiveram mais termos
citados em cada tipo de resposta (micróbios, bactérias, fungos, protozoários, vírus ou
helmintos / vermes) e selecionamos uma resposta que exemplifique as principais idéias
apresentadas em cada um dos tipos (as unidades de contexto). Com esta metodologia, apenas
foi possível comparar os diferentes discursos e identificar qual prevalece mais dentro deste
grupo de alunos.
Depois, selecionamos alguns desses grupamentos de palavras para também serem usados
como parâmetro para uma análise qualitativa e manual de todos os questionários. Portanto,
este processo de análise do material dos alunos foi realizado manualmente e através de
ferramenta de informática.
65
3.2 Pergunta aos pesquisadores
3.2.1 Elaboração:
Entre os dias 27 de março e 5 de abril de 2007, foi enviada uma pergunta aberta para 672
pesquisadores da área de microbiologia selecionados, durante o mês de março de 2007, pelo
sistema de busca avançada do Currículo Lattes, do Conselho Nacional de Pesquisa (CNPq),
disponível no ambiente http://lattes.cnpq.br. Na época, selecionamos apenas os profissionais
com doutorado concluído e cadastrados como pesquisadores na área de microbiologia, de
acordo com um descritor de assunto próprio. Os dados foram selecionados por ordem
aleatória, com a única condição de que tivesse o e-mail cadastrado disponível para
visualização. Foram obtidas 146 respostas.
Com o objetivo de averiguar as visões que este grupo tem acerca da importância da
divulgação científica dos microrganismos e os conhecimentos que acreditam ser mais
pertinentes de serem abordados nessa prática, foi solicitado que respondessem à seguinte
pergunta aberta:
―O que o(a) Sr.(a) considera importante que o público geral (incluindo adultos, jovens e
crianças) deva saber com relação aos temas de microbiologia?‖.
O material foi preparado para análise com a compilação das respostas em um único arquivo
de texto, identificando cada resposta com o endereço eletrônico do pesquisador
correspondente.
66
3.2.2- Métodos de análise:
No material dos pesquisadores, as unidades de registro foram identificadas a partir da
leitura flutuante do texto, quando então foi feita a sua categorização.
A partir daí, as respostas foram analisadas segundo a regra de enumeração de freqüência
(usada no material dos alunos). Assim, buscamos quais dessas categorias foram mais citadas e
selecionamos uma resposta que exemplifique as principais idéias apresentadas em cada uma
delas (as unidades de contexto).
Porém, também analisamos o material segundo a regra de presença ou ausência. Esta
consiste em identificar determinados elementos no texto. Neste caso, a simples presença ou
ausência dos elementos pode ser significativa e veicular um sentido, funcionando como
indicador.
Desta forma, foi realizada uma análise das relações, uma técnica que vai além da simples
freqüência da aparição dos elementos no texto, pois determina as relações que estes elementos
mantém entre si. Esta análise promove uma matriz de dados (por meio de tabelas), onde se
assinala a presença e ausência dos elementos e também podem ser aferidas as freqüências de
aparições dos elementos. Todo este processo foi realizado manualmente.
67
3.3 Análise das matérias
3.3.1 Elaboração:
Foram analisadas 315 matérias veiculadas pela internet durante os meses de março, abril e
maio de 2008. Elas foram selecionadas por pelo sistema de Alertas do Google, com as
palavras-chave: micróbio, bactéria, fungo, vírus, protozoário e verme.
3.3.2- Métodos de análise:
A princípio, estabelecemos que usaríamos como categorização o tipo de abordagem das
matérias, ou seja, identificar qual a freqüência de matérias que abordavam fatores benéficos,
maléficos, ambos, ou fatores neutros com relação aos microrganismos.
Em seguida, após a leitura flutuante dos textos, surgiu a necessidade de analisarmos também
outro tipo de categoria, que consistem na presença ou ausência de matérias sobre pesquisas
científicas e o país de origem das pesquisas reportadas, assim como determinar a freqüência
dessas matérias.
Por fim, exemplificamos em tabelas os principais temas abordados nas matérias. Também
identificamos quais dessas matérias relatam resultados de pesquisa e qual a origem das
respectivas pesquisas. Nesse caso, se mostrou importante ressaltar que algumas fontes de
notícias não são brasileiras, mas portuguesas. Resolvemos manter essas matérias na pesquisa,
pois, no caso do fluxo de informações pela Internet, o fato de serem em português e
aparecerem na busca do Google para os termos indicados torna-as de livre acesso para
68
qualquer leitor brasileiro. No entanto, para que se possa analisar a inserção de matérias sobre
essas pesquisas na mídia, em comparação com fontes de pesquisas de outros países, foi
preciso destacar as matérias de fontes lusitanas.
69
4 Resultados
4.1 Idade dos alunos
Participaram deste trabalho, 30 e 41 alunos de duas escolas particulares da Zona Sul do Rio de
Janeiro, identificadas aqui respectivamente como escolas 1 e 2, e 36 alunos de um Ciep,
localizado em São Gonçalo, identificado aqui como escola 3. A idade dos alunos de 7ª série
do Ensino Fundamental variou entre as três escolas estudadas. Da Escola 1 (particular), 80%
dos alunos têm 13 anos. Esse número cai para 68,3% na Escola 2 (também particular) e para
30,5% entre os alunos do Ciep (escola 3), que são um pouco mais velhos - 41,6% destes
alunos tem 14 anos (figura 1).
Figura 1: Diferenças de idade entre os alunos da Escola 1 (A), Escola 2 (B), Escola 3 (C)
e das três escolas (D).
A)
70
B)
C)
D)
71
4.2 Questões respondidas
Ao todo, 178 questões foram deixadas em branco pelos alunos (27,7% do total), o que reflete
a incapacidade de alguns dos jovens participantes em ao menos tentar correlacionar as
perguntas com as questões que aprenderam na escola, ou vivenciaram no seu cotidiano principalmente aqueles que não responderam a nenhuma (sete alunos) ou até três questões (26
alunos). No entanto, a maioria (81 alunos, ou 75,7%) tentou responder à maior parte do
questionário (de quatro a seis questões). O padrão de respostas deixadas em branco variou
entre as escolas. Na escola particular 1 (com um total de 30 alunos), localizada na zona Sul do
Rio de Janeiro, os adolescentes deixaram mais questões em branco (pouco mais de 10%). A
outra escola particular 2 (com total de 41 alunos), teve o maior percentual de resposta a todas
as questões levantadas (41,5%). A escola 3 (Ciep), apresentou um total de 36 alunos e teve o
menor percentual de alunos que respondeu a todas as questões (22,2%). No entanto, a maioria
dos alunos de todas as escolas respondeu entre quatro, cinco ou todas as seis questões, como
evidenciado na figura 2.
72
Figura 2: Aponta qual a porcentagem de alunos de cada escola que respondeu aos
determinados números de questões.
Podemos ver na figura 3 que as questões mais respondidas foram as relacionadas aos vírus,
fungos e bactérias. A questão sobre vermes teve baixo índice de resposta, nas três escolas.
Nas questões sobre os micróbios e protozoários, houve uma variação muito grande entre os
índices de resposta entre alunos das três escolas. Além disso, o gráfico mostra que não houve
muita diferença no número de respostas entre as diferentes escolas, a não ser para a questão ―o
que são micróbios‖ (que os alunos da escola 1 responderam menos questões que os das outras
escolas) e ―o que são protozoários‖ (que os alunos da escola 3 responderam menos que os
outros). Quando observamos os dados de todas as escolas unificados (figura 4), os
protozoários foram os menos respondidos, seguido pelos vermes e micróbios. A figura 5
mostra que o mesmo padrão foi encontrado na freqüência das unidades de registro para cada
questão, ou seja, que os vírus foram os mais citados, seguidos dos fungos e bactérias e os
vermes tiveram um baixo índice de citações. Além disso, os termos mais citados foram
relacionados às doenças, seguido dos que relacionam a seres vivos e ao habitat (figura 6).
73
Figura 3: Porcentagem de alunos de cada escola que respondeu a cada tipo de questão
proposta.
Figura 4: Porcentagem de alunos de todas as escolas que respondeu a cada tipo de
questão proposta.
74
Figura 5: Freqüência (em números absolutos) das unidades de registro por cada
questão.
Figura 6: Freqüência (em números absolutos) das unidades de registro por cada
categoria.
75
4.3 Categorizações das respostas
Foram identificadas dez categorias nas respostas dos alunos, organizadas por grupos
temáticos:
1.
Doenças:
Palavras que relacionam os microrganismos às doenças, como: doença, maleficiosos, saúde
(no sentido de ausência de), atacam, infecção, sintomas, estouram (no sentido de que os vírus
estouram as células do hospedeiro), morto, cuidado, parasitas, nomes de doenças, etc. Veja o
quadro completo na Tabela 1.
76
Tabela 1: Unidades de registro da categoria “doenças”.
Doenças
Micróbios
Bactérias
Fungos
Unidades de registro Freqüência Unidades de registro
Freqüência
Unidades de registro Freqüência
doença
maleficiosos
causador
saúde
atacam
conjuntivite
danos
estragos
invasores
malignos
vítimas
28
4
2
2
2
2
1
1
1
1
1
1
1
1
1
1
1
1
1
1
doença
causam
atacam
infectam
frieira
irritação
parasitas
inflamação
malignos
matá-las
matar
morrem
mortais
mortas
pragas
saúde
17
3
2
2
1
1
1
1
1
1
1
Protozoários
doenças
infecção
sintomas
morto
cuidado
atacam
sarampo
pneumonia
perigoso
patogênica
mau
matam
maligno
inflamação
gripe
ferimento
febre
contaminar
câncer
asma
Vírus
7
6
3
3
2
2
2
1
1
1
1
1
1
1
1
1
Vermes
Unidades de registro Freqüência Unidades de registro
Freqüência
Unidades de registro Freqüência
parasitas
doenças
sinusite
infecções
infecciona
invadem
51
12
9
7
7
5
5
5
2
2
2
1
1
1
1
1
1
doença
instalam
dor
atacam
causadores
contaminado
parasitas
danos
vômito
sintomas
8
7
3
2
1
1
doença
gripe
destroem
aids
atacam
causador
dengue
hiv
contaminação
hepatite
invasores
atingem
candidíase
catapora
contaminada
estouram
sintomas
14
5
3
2
2
2
2
1
1
1
77
2.
Sujeira:
Palavras que relacionam os microrganismos à sujeira, como: sujeira, decomposição,
estragado, lixo, higiene (no sentido de ausência de), podre, nojento, esgoto, fezes, etc. Veja o
quadro completo na Tabela 2.
Tabela 2: Unidades de registro da categoria “sujeira”.
Sujeira
Micróbios
Bactérias
Fungos
Unidades de registro
Freqüência
Unidades de registro
Freqüência Unidades de registro Freqüência
sujeira
decomposição
lixo
nojentos
2
1
1
1
decomposição
estragado
lixo
higiene
banho
sujos
cocô
chão
2
2
1
1
1
1
1
1
Protozoários
Unidades de registro
Vírus
Freqüência
Unidades de registro
decomposição
estragado
podres
velhas
sujeira
validade
apodrecem
apodrecimento
sujo
Vermes
16
7
4
2
2
1
1
1
1
Freqüência Unidades de registro Freqüência
descalço
nojento
suja
fezes
chão
esgoto
estragados
lavar
podres
4
3
3
2
1
1
1
1
1
78
3.
Benefícios:
Palavras associadas aos possíveis benefícios relacionados aos microrganismos, como:
beneficiosos, benignos, insulina, ingeridos e alimento (no sentido de servirem como
alimentos). Veja na Tabela 3.
Tabela 3: Unidades de registro da categoria “benefícios”.
Benefícios
Bactérias
Micróbios
Unidades de registro Freqüência Unidades de registro Freqüência
Unidades de registro Freqüência
beneficiosos
benignos
alimento
ingeridos
comestível
Vermes
3
1
Protozoários
insulina
benigno
1
1
Vírus
Unidades de registro Freqüência Unidades de registro Freqüência
4.
Fungos
1
1
1
Unidades de registro Freqüência
Vivos:
Palavras associadas aos seres vivos, como: seres, criaturas, vivem, sobrevivem, vivos e
reproduzem. Veja na Tabela 4.
Tabela 4: Unidades de registro da categoria “seres vivos”.
Seres vivos
Micróbios
Bactérias
Fungos
Unidades de registro Freqüência Unidades de registro
Freqüência
Unidades de registro
Freqüência
seres
vivem
criaturas
32
6
3
1
seres
vivos
19
4
20
4
2
Protozoários
seres
vivos
vivem
sobrevivem
Vírus
Vermes
Unidades de registro Freqüência Unidades de registro
Freqüência
Unidades de registro
Freqüência
seres
vivem
sobrevivem
34
11
9
seres
vivem
vivos
29
6
3
20
4
1
seres
vivos
reproduzem
79
5.
Conceitos complexos:
Palavras relacionadas a conceitos complexos, independente de serem corretos ou não, como:
unicelulares, pluricelulares, eucarionte, procarionte, protista, imunológico, núcleo, cápsula,
fotossíntese, heterótrofos, flagelado, ciliado, DNA, RNA, genético, linfócito, partículas e
invertebrados. Veja na Tabela 5.
Tabela 5: Unidades de registro da categoria “conceitos complexos”.
Conceitos complexos
Micróbios
Bactérias
Fungos
Unidades de registro Freqüência Unidades de registro
Freqüência Unidades de registro Freqüência
unicelulares
eucarionte
procarionte
22
2
2
1
1
3
1
1
Protozoários
unicelulares
imunológico
eucarionte
núcleo
cápsula
Vírus
pluricelulares
unicelulares
fotossíntese
heterotrófos
procariotos
Vermes
6
6
1
1
1
Unidades de registro Freqüência Unidades de registro
Freqüência Unidades de registro Freqüência
unicelulares
núcleo
eucariontes
flagelado
pluricelulares
protista
ciliados
4
3
3
2
1
1
1
1
1
18
3
2
2
2
2
1
unicelulares
DNA
imunológico
núcleo
genético
linfócito
partículas
pluricelulares
RNA
invertebrados
1
80
6.
Confusões com outros seres:
Palavras associadas à confusão entre seres, quando o jovem cita especificamente uma doença
ou microrganismo que não pertence à classe de microrganismos determinada. Veja o quadro
completo na Tabela 6.
Tabela 6: Unidades de registro da categoria “confusão entre seres”.
Confusão entre seres
Micróbios
Bactérias
Fungos
Unidades de registro
Freqüência Unidades de registro
Freqüência Unidades de registro
Freqüência
bichos
larvas
3
2
6
4
3
1
7
1
Protozoários
vírus
vermes
bicho
protozoários
Vírus
bactérias
vírus
Vermes
Unidades de registro
Freqüência Unidades de registro
Freqüência Unidades de registro
Freqüência
bacterias
vírus
algas
fungo
5
4
2
1
6
2
1
3
1
1
1
bactérias
protozoários
vermes
bactérias
bacteriana
vírus
giárdia
81
7.
Noção de tamanho:
Palavras que mostram relações com o tamanho dos microrganismos, como: microscópicos,
microscópio, pequenos, micro, bichinhos, invisível, menores, ultramicros, olho nu e visíveis
(no sentido de que nãos são visíveis a olho nu). Veja na Tabela 7.
Tabela 7: Unidades de registro da categoria “noção de tamanho”.
Noção de tamanho
Micróbios
Bactérias
Fungos
Unidades de registro Freqüência Unidades de registro
Freqüência Unidades de registro
Freqüência
microscópicos
microscópio
pequenas
micro
bichinhos
Protozoários
10
5
1
1
1
4
1
18
11
11
5
1
microscópicos
pequenos
micro
invisível
bichinhos
Vírus
microscópicos
pequenas
Vermes
Unidades de registro Freqüência Unidades de registro
Freqüência Unidades de registro
Freqüência
microscópico
pequenos
13
6
2
1
1
1
1
1
1
4
3
microscópico
menores
ultramicros
micro
micro
microscópicos
olho nu
pequenos
visíveis
82
8.
Transmissibilidade:
Palavras que mostram a noção de que os microrganismos podem ser transmissíveis ou
transmitir doenças, como: transmissor, transmissíveis, transmitir, transmitem, contaminados,
contagiosas, contaminação, infecto-contagiosas, infecciosos, pega, introduzido, sexualmente e
comemos. Veja na Tabela 8.
Tabela 8: Unidades de registro da categoria “transmissibilidade”.
Transmissibilidade
Micróbios
Bactérias
Fungos
Unidades de registro Freqüência Unidades de registro
Freqüência Unidades de registro
transmissor
contaminados
5
2
1
3
1
protozoários
infecciosos
pega
transmitir
vírus
Freqüência
vermes
unidades de registro
freqüência unidades de registro
freqüência unidades de registro
Freqüência
transmitem
4
11
6
5
4
3
2
2
1
1
6
2
1
1
transmite
contagiosas
transmissíveis
infeccioso
transmissores
contaminação
introduzido
sexualmente
contaminada
infectocontagiosas
transmissor
contaminado
comemos
contagiosos
1
83
9.
Exemplos corretos:
Palavras associadas a exemplos certos, quando o jovem cita especificamente uma doença ou
microrganismo que pertencem à classe determinada. Isso se aplica somente aos exemplos e
não significa que a resposta como um todo esteja correta. Veja na Tabela 9.
Tabela 9: Unidades de registro da categoria “exemplos certos”.
Exemplos certos
Micróbios
Bactérias
Unidades de registro Freqüência Unidades de registro
vermes
bactérias
fungo
vírus
Protozoários
Fungos
Freqüência Unidades de registro
3
2
2
1
cogumelo
mofo
bolor
Vírus
Freqüência
7
8
2
Vermes
Unidades de registro Freqüência Unidades de registro
Freqüência Unidades de registro
Freqüência
ameba
12
7
5
5
2
1
1
1
4
4
3
2
2
1
1
gripe
Aids
dengue
HIV
hepatite
catapora
sarampo
varíola
lombrigas
plateomintos
tênia
nemateomintos
neomintos
minhocas
84
10.
Habitat natural:
Palavras que mostram que o jovem procurou identificar qual é o habitat natural dos
microrganismos perguntados, como: organismo, ar, solo, água, úmido, alimentos, comida,
frutas, pão, sapato, mosquito, barriga, intestino, etc. Veja o quadro completo na Tabela 10.
Tabela 10: Unidades de registro da categoria “habitat”.
Habitat
Micróbios
Bactérias
Fungos
Unidades de registro
Freqüência Unidades de registro
Freqüência Unidades de registro
Freqüência
organismo
ar
alimentos
solo
água
comida
5
4
2
2
1
1
9
2
2
1
1
1
28
11
7
7
7
5
4
2
2
2
1
1
1
1
1
1
1
1
Protozoários
organismos
banheiros
alimento
barriga
comida
água
Vírus
alimentos
úmido
frutas
lugares
pão
comida
mofado
abafado
ar
fechado
armário
árvores
circulação
geladeira
legume
resto
sapato
vegetais
Vermes
Unidades de registro
Freqüência Unidades de registro
Freqüência Unidades de registro
Freqüência
organismo
alimento
comida
frutas
3
1
1
1
18
6
3
3
3
14
9
7
5
3
3
2
1
1
1
1
1
célula
organismo
ar
corpo
mosquito
alimentos
organismo
barriga
comida
doce
intestino
sanitários
água
boca
frutas
pés
terra
As análises, feitas com base nestas categorias, serão descritas a seguir.
85
4.4 Respostas dos alunos
4.4.1 Doenças
Todos os micróbios são muito associados a doenças (figura 7). As unidades de registro
associadas a esta categoria foram as mais freqüentes, principalmente relacionadas aos vírus
(113 citações), seguido das bactérias (54). Esta tendência não variou muito entre os três
grupos de alunos, mas os da escola particular 2 citaram mais termos do que os das outras.
As unidades de registro mais citadas foram: ―doença‖ (124 vezes), nomes de doenças (19),
―causador/causam‖ (15), ―atacam‖ (15), etc (veja a relação de todas elas na tabela 1, pág. 77).
Essas palavras aparecem, em todas as questões, num contexto no qual os microrganismos
provocam as doenças ou até mesmo são a doença em si - como pequenas partículas de doença
latentes à espera de um organismo para atuar. Esta seria a sua finalidade e, em algumas
respostas, seu propósito de existência.
Especificamente na questão sobre os micróbios, eles são retratados de forma geral como seres
malignos que causam mal ao organismo. O mesmo ocorre para as bactérias, amplamente
associadas às doenças, inclusive esta característica é tão generalizada que as bactérias são
referidas por um jovem como ―uma denominação atribuída a praticamente todos os seres que
causam doenças‖. Assim, são extrapoladas como agentes de outras doenças específicas como
sarampo (que na realidade é provocado por um vírus) e até câncer (que raramente é provocado
pela ação de bactérias, mas sim por vírus). Elas adquirem neste discurso um papel ativo de um
ser que se instala no organismo e o ataca, mas que também pode ser combatido por
medicamentos e remédios.
86
Os vírus representam o principal exemplo de microrganismo que é tratado como
representante da ―doença em si‖. Essa característica aparece junto à polêmica de serem vivos
ou não (ver adiante, na categoria ―seres vivos‖, pág. 93), também presente na comunidade
científica. Alguns alunos que levantam a dúvida sobre eles serem vivos os retratam como
partículas. Assim, os vírus variam de agentes infecciosos a partículas de doença. Porém, é um
dos poucos casos no qual são citados tantos exemplos certos de nomes de doenças (ver
adiante, na categoria ―exemplos certos‖, pág. 103), como gripe, dengue e Aids. Além disso,
alguns alunos também afirmam que eles se multiplicam dentro das células.
Outra questão que incitou exemplos certos de doenças foi a dos fungos. Foram citados como
causa para doenças como frieira, pano branco e pano preto (nomes populares para doenças
fúngicas), além de outras infecções e inflamação.
Os protozoários, como as bactérias, também são atribuídos a um conjunto de tudo que passa
doenças e a parasitas. O parasitismo também está presente nos vermes, que eles afirmam
poder perfurar a pele e penetrar na corrente sangüínea.
As unidades de contexto estão exemplificadas na Tabela 11.
87
Figura 7: Quantos termos surgiram a respeito das doenças em cada tipo de questão e
quantas vezes foram recorrentes no discurso.
Tabela 11: Seleção de respostas dos alunos que contextualizam e exemplificam onde
estão inseridas as unidades de registro analisadas na categoria “Doenças”.
Questões
Unidades de contexto
Micróbios
―São seres bem nojentos que trazem doenças e mal estar‖.
Bactérias
―São vermes que causam gripe, febre, tontura, pressão alta‖.
Fungos
―São pluricelulares e podem causar doença se você comer algum
alimento com fungo‖
Protozoários
―São seres microscópicos que causam doenças‖.
Vírus
―São as menores partículas de doença que temos. Eles agem
destruindo nossas células e se aproveitam dela para espalhar seu
DNA‖.
Helmintos/Vermes
―Seres que causam doenças‖.
88
4.4.2 Sujeira
Os fungos se destacam dos demais por serem os microrganismos mais associados à sujeira
(figura 8). Esta característica não varia entre as escolas e está fortemente relacionada com a
sua ação como decompositor de matérias orgânicas, sendo muito associados aos alimentos
estragados. Para os fungos, foram mais freqüentes as unidades de registro que falavam sobre a
decomposição de matérias orgânicas (16 aparições) e relacionadas aos alimentos que estragam
ou apodrecem (14 aparições). As unidades de registro relacionadas a esta categoria estão
expostas na tabela 2, pág. 78.
Os vermes aparecem em segundo lugar na relação com a sujeira. Associados às minhocas
(ver categoria ―exemplos certos‖, pág. 103), são geralmente tratados como seres ―nojentos‖
(três aparições), que são transmitidos ao andar ―descalço‖ (quatro vezes citado). Esses jovens
também mencionam a relação de que cachorros e crianças costumam tomar remédio antivermes – uma clara associação a fatos do cotidiano.
O Ciep (escola 3) apresentou índices levemente maiores de associação à sujeira com relação
às questões sobre micróbios, bactérias e vermes.
As questões sobre bactérias e micróbios incitaram poucas associações à sujeira. Os
micróbios são relacionados aos alimentos contaminados e à decomposição dos seres vivos.
As unidades de registro encontradas na relação às bactérias e sujeira também foram
associadas à decomposição e alimentos estragados. São explicitadas como causadas pelas
―coisas e animais sujos‖ e ―por não escovar os dentes‖. Não foi observado nenhum
89
comentário do tipo para os vírus e protozoários. As unidades de contexto podem ser vistas
na tabela 12.
Figura 8: Quantos termos surgiram a respeito da sujeira em cada tipo de questão e
quantas vezes eles foram recorrentes no discurso.
Tabela 12: Seleção de respostas dos alunos que contextualizam e exemplificam onde
estão inseridas as unidades de registro analisadas na categoria “Sujeira”.
Questões
Micróbios
Bactérias
Fungos
Protozoários
Vírus
Helmintos/Vermes
Unidades de contexto
―Micróbios estão em nosso ambiente quando estamos em lugares
sujos e passa para a nossa mão. Com isso, esquecemos de lavá-la e
colocamos na boca e assim passa para dentro do corpo‖
―Também são seres decompositores e se alimentam de restos de
alimentos e alimentos estragados e jogados no solo e também são
unicelulares‖
―É a parte que fica podre‖
―Bicho nojento‖.
90
4.4.3 Benefícios
Esta categoria se destacou por ser a menos citada (figura 6, pág. 75). Apenas quatro alunos
(da escola 1) escreveram que os microrganismos em geral podem ser ―malignos ou benignos‖
e ―beneficiosos ou maleficiosos‖ (tabela 3, pág. 79), mas sem citarem mais especificidades.
Portanto, a escola 1 apresentou dois termos na categoria micróbios (―benigno‖ e
―beneficiosos‖), em quatro ocorrências.
As bactérias também foram citadas como possivelmente benéficas por dois alunos, um da
escola 1 e outro da escola 2. Apenas um jovem (aluno da escola 1) exemplificou um fator
benéfico: a produção de insulina a partir de bactérias. Nenhum aluno do Ciep (escola 3) se
manifestou sobre o tema.
Três alunos também citaram que os fungos podem ser ingeridos. Porém, ressaltamos que esta
análise levou em consideração duas citações sobre os cogumelos poderem ser ingeridos, mas,
de fato, o cogumelo é um tipo de fungo que não é considerado microrganismo. Apenas dois
alunos afirmaram que alguns queijos têm fungos.
Não foram observados comentários do tipo para as os vírus, protozoários ou vermes (figura
9). Nenhum jovem citou o uso de micróbios na produção de bebidas fermentadas, laticínios,
nem qualquer outro tipo de alimento, remédios, ou aplicação biotecnológica (tabela 3, pág.
79). As unidades de contexto estão expostas na tabela 13.
91
Figura 9: Quantos termos surgiram a respeito dos micróbios benéficos em cada tipo de
questão e quantas vezes eles foram recorrentes no discurso.
Tabela 13: Seleção de respostas dos alunos que contextualizam e exemplificam onde
estão inseridas as unidades de registro analisadas na categoria “Benefícios”.
Questões
Micróbios
Bactérias
Fungos
Unidades de contexto
―(...)Eles podem ser beneficiosos e maleficiosos‖.
―Podem ser usadas para produzir insulina humana, o que é ótimo,
pois muitas pessoas têm alergia a outros tipos. Bactéria pode ser
usada para outras coisas, cobaia, por exemplo‖.
―Os mais conhecidos do reino fungos são os cogumelos, nos quais
podem servir como alimento e outros que são venenosos. (...)‖
Protozoários
Vírus
Helmintos/Vermes
92
4.4.4 Seres vivos
Com um número de referências alto, foi a segunda categoria mais freqüente no discurso dos
alunos (figura 6, pág 75). Relacionada a todos os tipos de microrganismos perguntados,
especialmente aos vírus (figura 10), devido a alusões sobre a controversa no meio científico
sobre serem vivos ou não. Portanto, os vírus são tratados por alguns como ―coisas‖ e por
outros como ―seres microscópicos‖.
Os micróbios são citados como ―uma espécie de vida microscópica‖, porém, um jovem
também afirma que são ―pequenas estruturas‖. Os outros microrganismos também são
definidos como ―seres‖ e ―ser vivo‖. No entanto, houve a afirmação de que os fungos ―são
quando bactérias ficam juntas e morrem‖. Eles também são relacionados à ―vida que
sobrevive em matéria em decomposição‖.
Além disso, os vermes são tratados como ―bichos‖ e como ativos, que ―perfuram a pele‖ e
que ―se orientam ao nosso corpo‖, o que também remete à imagem de seres que estão vivos.
Esta resposta variou entre as escolas. A escola particular 1 manifestou menos opiniões com
relação aos micróbios e fungos e os da escola 3 (Ciep) expressaram menos opiniões sobre o
tema relacionado aos protozoários, vírus e vermes.
A tabela 4 (pág. 79) mostra que as unidades de registro mais freqüentes sobre o tema foram
―seres‖ (154 vezes) e ―vivos‖ (24 vezes), sendo que a segunda geralmente apareceu atrelada à
primeira no termo ―seres vivos‖. As unidades de contexto estão exemplificadas na tabela 14.
93
Figura 10: Quantos termos surgiram a respeito de se tratar de seres vivos em cada tipo
de questão e quantas vezes eles foram recorrentes no discurso.
Tabela 14: Seleção de respostas dos alunos que contextualizam e exemplificam onde
estão inseridas as unidades de registro analisadas na categoria “Seres Vivos”.
Questões
Unidades de contexto
Micróbios
―Micróbios são a definição de vida microscópica em geral‖
Bactérias
Fungos
Protozoários
Vírus
Helmintos/Vermes
―Seres microscópicos que só podem ser vistos a olho nu e fazem
mal‖
―São seres vivos que se alimentam de plantas mortas, ou seja, são
decompositores‖
―São seres microscópicos que causam doenças‖
―Alguns cientistas não os consideram seres vivos. Eles são
microscópicos e invadem as células e fazem várias de suas cópias lá
e depois estouram a célula‖
―São seres vivos visíveis a olho nu que podem entrar em um corpo
humano causando certas doenças‖
94
4.4.5 Conceitos complexos
Com relativa alta freqüência de citações (figura 6, pág 75), os conceitos complexos muitas
vezes foram encontrados em contextos errados. Restringiu-se praticamente aos protozoários,
bactérias, vírus e fungos (figura 11) e com mais expressividade da escola 1. Os alunos da
escola 3 (Ciep) abordaram respostas do tipo mais freqüentemente nas questões sobre as
bactérias e protozoários.
Os conceitos complexos mais freqüentes no discurso dos alunos foram ―unicelulares‖ (53
vezes) e ―pluricelulares‖ (nove vezes). Os fungos são igualmente enquadrados nas duas
categorias (seis citações de cada termo) e, de fato, podem apresentar as duas formas. Eles
também suscitaram abordagens sobre formas de obtenção de energia.
As bactérias são corretamente enquadradas apenas como unicelulares, porém também são
erradamente citadas como eucariontes. Os vírus são relacionados com o material genético,
tanto DNA quanto RNA e como algo que atua no ―sistema imunológico‖ e linfócitos (veja as
unidades de registro na tabela 5, pág. 80).
Os protozoários também são relacionados a organismos unicelulares e pluricelulares, mas um
jovem cita outro exemplo de conceito complexo: ―são por exemplo ―flagelado‖ que contam
uma cauda que percorre as veias (vasos sangüíneos)‖.
Foram observadas poucas características do tipo para os micróbios e vermes. As unidades
de contexto estão exemplificadas na Tabela 15.
95
Figura 11: Quantos termos surgiram a respeito de conceitos complexos em cada tipo de
questão e quantas vezes eles foram recorrentes no discurso.
Tabela 15: Seleção de respostas dos alunos que contextualizam e exemplificam onde
estão inseridas as unidades de registro analisadas na categoria “Conceitos complexos”.
Questões
Unidades de contexto
Micróbios
―são seres microscópicos que se reproduzem sexuadamente‖.
Bactérias
Fungos
Protozoários
Vírus
Helmintos/Vermes
―São seres que vivem em praticamente todos os lugares, sua forma
mais conhecida é a de bacilo e podem ser parasitas, provocando
diversas doenças‖.
―Pluricelulares, são heterotrofos. Nome científico: Reino fungi‖
―Reino protista é o nome científico‖.
―Um microrganismo que consegue traduzir um material genético em
outras células no nosso organismo. Eles se desenvolvem
rapidamente‖.
―Seres invertebrados e parasitas que vivem no estômago de um
organismo e se alimentam deste‖.
96
4.4.6 Confusão entre seres
A questão específica sobre os micróbios não provocou nenhuma resposta de confusão entre
seres (todos os exemplos citados foram de microrganismos). Porém, quando a pergunta era
específica para cada tipo de microrganismo, a confusão foi generalizada (veja na figura 12),
com representatividade maior nas escolas 2 e 3.
Os alunos da escola 3 (Ciep) confundiram de forma semelhante a maioria dos microrganismos
(entre quatro e cinco citações), menos os vírus (duas). Os da escola 2 confundiram mais os
vírus (sete) e protozoários (sete), seguidos pelas bactérias (seis) e fungos (quatro). A escola 1
apresentou poucas citações nesta categoria, duas para bactérias e três para vermes.
As bactérias foram mais comumente confundidas com os vírus, vermes e ―bichos‖, mas
também foram chamadas de protozoários. São associadas aos outros micróbios na sua relação
com as doenças - por exemplo, foi citada como causadora de sarampo e câncer.
Os vírus foram confundidos com as bactérias, como um jovem que afirmou: ―acho que é uma
bactéria media que causa uma doença contagiosa‖. Também foram associados aos
protozoários. Já os fungos foram mais confundidos com as bactérias. Um jovem afirmou que
―são quando bactérias ficam juntas e morrem‖.
Os protozoários são descritos por um jovem como ―o conjunto de tudo que passam doenças
junto com o vírus, fungos e micróbios‖ e por outro simplesmente como ―são bactérias‖.
97
Com relação aos vermes, esbarramos numa barreira metodológica. Alguns alunos associaram
os vermes às minhocas, o que está correto. Porém, a pergunta especificava ―helmintos /
vermes‖, ou seja, os tipos que podem ser microscópicos. Assim, consideramos que a questão
ficou confusa e classificamos a resposta ―minhocas‖ dentro da categoria ―exemplos certos‖,
mesmo não se tratando dos organismos aos quais gostaríamos de abordar. Além disso, foram
principalmente confundidos com as bactérias (veja nas unidades de registro, tabela 6, pág.
81). As unidades de contexto estão exemplificadas na Tabela 16.
Figura 12: Quantos termos surgiram a respeito da confusão entre diferentes seres em
cada tipo de questão e quantas vezes eles foram recorrentes no discurso.
98
Tabela 16: Seleção de respostas dos alunos que contextualizam e exemplificam onde
estão inseridas as unidades de registro analisadas na categoria “Confusão entre seres”.
Questões
Unidades de contexto
Micróbios
"Relativamente parecidos com bactérias e vírus‖.
Bactérias
―São os protozoários, vírus, etc. são praticamente todos os seres que
causam doenças‖.
Fungos
―São quando as bactérias ficam juntas e morrem. Causa infecção,
inflamação. Elas aparecem em alimentos‖.
Protozoários
Vírus
Helmintos/Vermes
―Outro tipo de agente infeccioso que pode causar tantas doenças
quanto uma bactéria ou vírus. Mas dependendo do jeito que for
adquirido será classificado como protozoário ou não‖.
―Semelhante aos micróbios e bactérias, mas menor‖.
―É um tipo de bactéria que se cria dentro da pessoa formando o
verme‖.
4.4.7 Noção de tamanho
Bem mais associados à questão específica sobre micróbios (figura 13), em todas as escolas.
Em seguida, os mais associados a esta noção de tamanho foram as bactérias e os vírus,
entretanto, com uma discrepância entre as escolas. A escola particular 2 teve expressividade
maior sobre o tema em todas as questões.
As bactérias são ―invisíveis a olho nu‖ e quando os jovens citam que está presente na pele,
também é evidente que não podem ser vistos. Elas, junto com os vírus (tratados como
―microscópicos‖), são vistas como os menores micróbios. Os protozoários são referidos
como ―pequenos‖ e os vermes, ao mesmo tempo em que uns afirmam que são macroscópicos
(como minhocas), outros dizem que são pequenos como vasos sangüíneos.
Já para os fungos não foi identificada muitas palavras relacionadas ao tamanho, mas são
freqüentemente associadas ao mofo visível que se encontra nos alimentos. Assim, se eles são
visíveis, não foram classificados como pequenos.
99
A unidade de registro mais citada nesta categoria, em geral, foi ―microscópicos‖ (50 vezes) e
―pequenos‖ (21 vezes), com alusões também ao microscópio (citado 11 vezes), palavra
restrita, porém, à questão específica sobre os micróbios (tabela 7, pág. 82).
As unidades de contexto estão exemplificadas na Tabela 17.
Figura 13: Quantos termos surgiram a respeito das relações de dimensões físicas
(tamanho) destes seres em cada tipo de questão e quantas vezes eles foram recorrentes
no discurso.
Tabela 17: Seleção de respostas dos alunos que contextualizam e exemplificam onde
estão inseridas as unidades de registro analisadas na categoria “Noção de tamanho”.
Questões
Unidades de contexto
Micróbios
―São parasitas microscópicos‖.
Bactérias
Fungos
―São células muito pequenas‖
―São células muito pequenas que nascem em cogumelos‖
―Seres pequenos que vivem no corpo humano ajudando ou causando
doenças‖
―São células microscópicas que atacam e destroem células do nosso
corpo‖.
―Vermes são animais (muitas veses pequenos) simples com diversas
formas e especies que podem tambem ser parasitas.‖
Protozoários
Vírus
Helmintos/Vermes
100
4.4.8 Transmissibilidade
Esta categoria foi mais relacionada aos vírus do que os outros micróbios (figura 14) e com
maior representatividade das escolas 2 e 3. São relacionados ao vírus idéias como a de que
―causa uma doença contagiosa‖ e ―são agentes contagiosos‖.
A questão da transmissibilidade dos micróbios está ligada aos alimentos contaminados e à
sujeira. Já a bactéria é associada com a infectividade pois ―se instala no organismo‖, ou
quando é ―causada por alguma coisa suja‖. Porém, também aparece como algo que já está nas
pessoas esperando para causar doença.
O verme é um ―micro organismo transmiçor de doenças‖. Ele não é a doença em si, mas a
transmite.
Não foram observados termos relacionados aos fungos e poucos aos protozoários. Neste
último, observa-se inclusive o contrário: um jovem afirma que são ―seres unicelulares que nós
seres humanos produzimos‖.
As unidades de registro mais freqüentes da categoria foram: ―transmissor‖/‖transmite‖ (28
vezes) e ―infeccioso‖ (nove vezes) (tabela 8, pág. 83). As unidades de contexto estão
exemplificadas na Tabela 18.
101
Figura 14: Quantos termos surgiram a respeito da transmissibilidade destes seres em
cada tipo de questão e quantas vezes eles foram recorrentes no discurso.
Tabela 18: Seleção de respostas dos alunos que contextualizam e exemplificam onde
estão inseridas as unidades de registro analisadas na categoria “Transmissibilidade”.
Questões
Unidades de contexto
Micróbios
―É um micro organismo transmissor de doenças‖
Bactérias
―Podem contaminar as águas e quem entrar nela pode pegar doenças
causadas por bactérias. Unicelulares.‖
Fungos
Protozoários
Vírus
Helmintos/Vermes
―Seres grandes em relação as bactérias e transmite doenças. É um
organismo vivo.‖
―Ataca as células. Pode passar para as pessoas pelo ar.
Unicelulares‖.
―São bichos atraídos pela sujeira, por isso nos alimentos sujos
contém vermes que podem causar doenças nos humanos‖.
102
4.4.9 Exemplos certos
Mais expressivos nos vírus (34 citações), seguido dos fungos e vermes (17 citações cada)
(figura 15). Variou muito entre as escolas. Os vermes apenas foram citados nesta categoria
pela escola particular 1, com exemplos de diversos nomes de vermes.
Os vírus também foram relacionados à diversos nomes de doenças virais, como gripe (12
citações), Aids/HIV (12 citações) e dengue (cinco citações).
Os fungos foram relacionados mais às suas formas visíveis como mofo/bolor (10 citações) e
cogumelo (sete citações) (tabela 9, pág. 84). Eles também são exemplificados corretamente
pelas doenças que provocam, como: frieira, pano branco e pano preto.
Como já explicado na categoria ―confusão entre seres‖ (pág. 98), as respostas dos alunos
sobre o que são ―vermes / helmintos‖ foram muito associados às minhocas. Apesar das
minhocas não serem helmintos, são vermes e, assim, a resposta foi considerada correta. Além
disso, alguns jovens também exemplificaram corretamente esses seres de acordo com a
doença provocada por solitárias.
Não foi observada nenhuma citação de exemplos certos para bactérias e poucos para os
micróbios, protozoários. As unidades de contexto estão exemplificadas na Tabela 19.
103
Figura 15: Quantos termos surgiram a respeito de exemplos certos relacionados a estes
seres em cada tipo de questão e quantas vezes eles foram recorrentes no discurso.
Tabela 19: Seleção de respostas dos alunos que contextualizam e exemplificam onde
estão inseridas as unidades de registro analisadas na categoria “Exemplos certos”.
Questões
Micróbios
Unidades de contexto
―Micróbios se referes ao seres microscópicos que fazem mal aos
nossos organismos, como vírus e bactérias.‖
Bactérias
Fungos
Protozoários
Vírus
Helmintos/Vermes
―cogumelos, mofo. Há vários tipos de cogumelos. O mofo ou bolor
pode surgir nos alimentos, tecidos, móveis, etc. Surgem devido à
umidade‖
―São seres unicelulares eucariontes. São eles: Ameba, bactéria, etc.‖
―São seres que fazem uma transformação em você, o vírus do HIV,
vírus da gripe‖.
―São organismos parasitas que se desenvolvem no corpo, como a
Tênia‖.
104
4.4.10 Habitat
Bastante freqüente, foi a terceira categoria mais citada (figura 6, pág 75). Muito mais
expressiva para os fungos (83 citações) do que para as outras questões, seguido dos vermes
(47) e vírus (33) (figura 16). Essa tendência se manteve nas três escolas, a não ser pela baixa
expressividade do Ciep (escola 3) com relação aos vírus nessa categoria.
O habitat é muito presente na conceituação dos fungos. Eles foram muito relacionados com os
alimentos (50 citações), como frutas, pães, vegetais, mas a maioria das menções foi sobre
alimentos/comida não especificados (35). Também são associados com lugares fechados, de
baixa circulação de ar, que ficam úmidos (11 alusões), mofados (quatro) e abafados (duas).
Um jovem escreveu que ―são seres que habitam em lugares que não possui circulação, lugares
fechados e estão presentes em vários alimentos, ex.: pão, frutas, etc.‖.
Os vermes também são relacionados aos alimentos em geral (14 referências), doces (três) e
frutas (uma), mas no contexto de provocarem doenças intestinais, instalando-se então no
organismo (nove menções), na barriga (sete) ou intestino (três). Além disso, um jovem
afirmou que são ―bichos em formato cilíndrico que vivem na terra‖, numa clara alusão às
minhocas.
A questão sobre os micróbios suscitou respostas divergentes sobre viverem nos organismos
(cinco), no ar (quatro), nos alimentos/comida (três), no solo (duas) e na água (uma) (tabela
10, pág. 85). Mas também são citados como amplamente difundidos no ambiente. Um
adolescente chega a expressar que ―estão presentes em todos os lugares‖, outro diz que ―estão
presentes em tudo‖.
105
As bactérias estão presentes em animais sujos ou mortos, ou nas pessoas; os vírus estão
presentes dentro das células, como causadores de doenças e os protozoários são parasitas que
vivem no corpo humano e foram os menos comentados nessa categoria.
As unidades de contexto estão exemplificadas na Tabela 20.
Figura 16: Quantos termos surgiram a respeito do habitat destes seres em cada tipo de
questão e quantas vezes eles foram recorrentes no discurso.
Tabela 20: Seleção de respostas dos alunos que contextualizam e exemplificam onde
estão inseridas as unidades de registro analisadas na categoria “Habitat”.
Questões
Unidades de contexto
Micróbios
―São microrganismos presentes em todos os lugares (...)‖
Bactérias
―Bactérias são armazenadas dentro das células do corpo humano‖.
―Podem ser unicelulares ou pluricelulares, que se estabelecem em
Fungos
comidas estragadas‖
Protozoários
―São ‗insetos‘ que ficam em nossos alimentos ou coisas‖.
―supostos transmissores de doenças, vivem em lugares fechados e
Vírus
sem circulação de ar‖
Helmintos/Vermes
―Comendo alimentos contaminados, eu posso pegar esses vermes‖.
106
4.4.11 Análises posteriores
Com base nos resultados encontrados, buscamos diretamente nos questionários dos alunos
algumas informações que consideramos precisarem de uma análise mais aprofundada.
4.4.11.1 Malefícios
Procuramos quantos alunos abordaram a questão dos malefícios associados aos
microrganismos (termos associados a doenças e transmissibilidade). Como já indicavam as
outras análises, os vírus foram os mais associados às doenças e transmissibilidade, em 95,5%
de todas as respostas. Como a questão teve poucas abstinências (14 alunos), observamos essa
associação com os vírus em 82,7% de todos os alunos participantes.
Entretanto, apenas a observação da prevalência do discurso nos forneceu algumas relações
equivocadas. Nele, os helmintos pareciam menos relacionados a doenças do que realmente
são (figura 7, pág. 88). Porém, apesar de 53 alunos terem feito essa relação aos helmintos
(número um pouco menor do que às bactérias, como mostra a figura 17), foi uma das
questões com maior índice de abstinência (figuras 3 e 4, pág.74), por 42 alunos. Assim,
81,5% dos alunos que responderam essa questão fizeram a associação (figura 18), relação
maior do que a das bactérias (66,8%). Algo semelhante (porém em menor proporção) ocorre
com os protozoários, que teve o maior índice de questões em branco (50 alunos), porém, não
teve uma relação tão forte com as doenças (26 alunos, 42,8% do total de respostas).
Ressaltamos que, apesar de os fungos terem tido baixa relação com as doenças em si, foram
muito relacionados a alimentos estragados (34 alunos), decomposição de matéria orgânica em
107
geral (18) e sujeira (3), como mostraremos mais adiante. Quando somarmos todos esses
alunos (alguns citam mais de um critério) obtemos um total de 67 (75,3% das respostas e
62,6% de todos os alunos) que associam os fungos a malefícios em geral, mas que não
necessariamente causam doenças.
Figura 17: Número total de alunos que relacionou os microrganismos a malefícios.
Figura 18: Porcentagem total de alunos que relacionou os microrganismos a malefícios,
pelo número de questões respondidas e pelo número total de alunos participantes (que
inclui questões deixadas em branco).
108
Figura 18A: Porcentagem de alunos de cada escola que relacionou os microrganismos a
malefícios, pelo número de questões respondidas e pelo número total de alunos
participantes (que inclui questões deixadas em branco).
4.4.11.2 Micróbios
Nas análises sobre a prevalência do discurso, os micróbios foram muito associados às
doenças, noção de tamanho e habitat, o que foi comprovado nesta análise de cada aluno.
Dos alunos que responderam essa questão, 73% (49 alunos) os relacionou a seres muito
pequenos; 49% (33) a causadores de doenças e; em menor proporção, 19% (13) a estarem
presentes em todos os lugares – esta última foi menos relacionada pelos alunos da escola 3
(Ciep) do que pelos demais (Figuras 19 e 19B). Assim, prevaleceu o discurso de que os
109
micróbios em geral são ―muito pequenos‖/ ―microscópicos‖/ ―não podem ser vistos a olho
nu‖, que geralmente causam vários tipos de doenças e podem estar presentes ―em todos os
lugares, inclusive onde você está‖.
Figura19: Número total de alunos que relacionaram os microrganismos a doenças, seres
que estão em todos os lugares e que são muito pequenos.
Figura 19A: Porcentagem de questões respondidas que relacionou os microrganismos a
doenças, seres que estão em todos os lugares e que são muito pequenos.
110
Figura 19B: Porcentagem de alunos que relacionou os microrganismos a doenças, seres
que estão em todos os lugares e que são muito pequenos, pelo número de questões
respondidas e pelo número total de alunos participantes (que inclui questões deixadas
em branco).
4.4.11.3 Bactérias
Nas análises sobre a prevalência do discurso, as bactérias foram amplamente associadas às
doenças, à noção de tamanho, à sujeira (principalmente pelo Ciep - escola 3) e ao habitat
(como estando presentes em animais sujos ou mortos, ou nas pessoas). Na análise de cada
aluno, todas essas características também se confirmam. De todas as questões respondidas,
66% (57 alunos) as relacionaram diretamente com doenças, 29% (25) com serem muito
pequenos, 23% (20) unicelulares e seis dos sete alunos que os relacionaram com a sujeira são
da escola 3 (figuras 20, 20A e 20B). Assim, prevaleceu um discurso semelhante ao
encontrado para os micróbios em geral, de serem ―muito pequenas‖, causarem vários tipos de
doenças, poderem estar presentes ―em todos os lugares‖ (em menor proporção que o atribuído
aos micróbios em geral) e com um fator a mais, por serem também associados a ―organismos
unicelulares‖.
111
Figura 20: Número total de alunos que relacionaram as bactérias a doenças, seres muito
pequenos, unicelulares e que estão presentes em lugares sujos ou em todos os lugares.
Figura 20A: Porcentagem de questões respondidas que relacionou as bactérias a
doenças, seres muito pequenos, unicelulares e que estão presentes em lugares sujos ou
em todos os lugares.
112
Figura 20B: Porcentagem de alunos que relacionou as bactérias a doenças, seres muito
pequenos, unicelulares e que estão presentes em lugares sujos ou em todos os lugares.
4.4.11.4 Fungos
Nas análises sobre a prevalência do discurso, os fungos apareciam como o terceiro
microrganismo mais associado a doenças. Porém, na análise de cada aluno vimos que os
fungos foram os micróbios relacionados por menos alunos nessa categoria, presente em
apenas 24% das questões respondidas (21 alunos). Isso ocorreu porque o discurso desses
poucos jovens estava repleto de exemplos de doenças (como já observado anteriormente) e
isso acarretou numa aparente prevalência maior das doenças associadas aos fungos dentro do
discurso global dos alunos.
As análises anteriores também mostraram uma prevalência do discurso com relação à sujeira,
mais especificamente relacionada com a sua ação como decompositor de matérias orgânicas e
aos alimentos estragados. A análise por alunos confirma essa característica, porém aqui
113
separamos essa categoria ―sujeira‖ entre seus dois componentes e vimos (figura 21 e 21B)
que a relação com a degradação dos alimentos é bem mais freqüente (56% das respostas, 50
alunos) do que decomposição de matéria orgânica em geral (20% das respostas, 18 alunos).
Quando somados dão um total de 54 jovens (60% das respostas), pois a maioria citou os dois
simultaneamente, além de mais um que citou apenas lugares sujos em geral.
Outra questão respaldada pela análise anterior foi a relacionada ao habitat em que estão
inseridos, mais expressiva para os fungos do que para todos os outros microrganismos. De
fato, além de terem sido muito relacionados aos alimentos e matéria orgânica em geral (como
já mostrado), também são associados com lugares fechados, de baixa circulação de ar, que
ficam úmidos, mofados e abafados (15 alunos, 17% das respostas), que ao todo, somam 63
alunos (70% das respostas).
Eles também foram relacionados diretamente com o mofo e cogumelos por 15 alunos. Assim,
o discurso mais prevalente relacionado aos fungos foi como sendo organismos relacionados à
decomposição dos alimentos e à matéria orgânica em geral, que algumas vezes também pode
provocar doenças e que aparecem na forma de mofo e/ou cogumelos.
114
Figura 21: Número total de alunos que relacionaram os fungos aos alimentos
contaminados ou estragados, às doenças, à decomposição de matéria orgânica em geral,
ao mofo e cogumelos.
Figura 21A: Porcentagem de questões respondidas que relacionou os fungos aos
alimentos contaminados ou estragados, às doenças, à decomposição de matéria orgânica
em geral, ao mofo e cogumelos.
115
Figura 21B: Porcentagem de alunos que relacionou os fungos aos alimentos
contaminados ou estragados, às doenças, à decomposição de matéria orgânica em geral,
ao mofo e cogumelos.
4.4.11.4 Protozoários
Nas análises sobre a prevalência do discurso, os protozoários também são atribuídos a
doenças e a parasitas muito pequenos. Estes resultados são confirmados pela análise de cada
aluno, onde 28 alunos (49% das respostas) o atribuíram às doenças. Porém, apesar da relação
deles como sendo muito pequenos não ser tão prevalente (10 alunos), outros quatro jovens
citaram que são pequenos, porém maiores que outros microrganismos como bactérias e vírus
e 20 alunos (35%) disseram que são seres unicelulares (figuras 22 e 22B), assim que a
questão de tamanho se mostra importante, com a soma de 33 alunos (58% das respostas).
Portanto, o discurso prevalente nessa categoria é o de seres unicelulares que provocam
doenças e ―relativamente maior que os outros‖ ou ―maiores que as bactérias e vírus‖.
116
Figura 22: Número total de alunos que relacionaram os protozoários às doenças, seres
unicelulares, muito pequenos ou não tão pequenos quando comparados a outros
microrganismos.
Figura 22A: Porcentagem de questões respondidas que relacionou os protozoários às
doenças, seres unicelulares, muito pequenos ou não tão pequenos quando comparados a
outros microrganismos.
117
Figura 22B: Porcentagem de alunos que relacionou os protozoários às doenças, seres
unicelulares, muito pequenos ou não tão pequenos quando comparados a outros
microrganismos.
4.4.11.6 Vírus
Nas análises anteriores, sobre a prevalência do discurso, os vírus representam o principal
exemplo de microrganismo tratado como causador de doenças, com muitos exemplos certos
de doenças, como gripe (por 12 alunos), Aids (10 alunos) e dengue (cinco alunos), que são
muito pequenos e se multiplicam dentro das células. Ao analisarmos cada questão,
confirmamos todos esses resultados. Das questões respondidas, 92% (86 alunos) relacionaram
os vírus às doenças e na escola 3 essa relação alcançou 100% dos alunos participantes
(figuras 23, 23A e 23B). Nenhum aluno relacionou os vírus com aspecto de biotecnologia. O
discurso prevalente é o de que são seres ―ultramicros‖ que ―causam diversas doenças como a
gripe‖ e ―precisam de uma célula para viver e se reproduzir‖. Por isso, ―não se sabe se são
vivos ou não‖.
118
Figura 23: Número total de alunos que relacionaram os vírus às doenças, seres muito
pequenos, que precisam de uma célula para viver, à dúvida sobre serem vivos ou não e
unicelulares.
Figura 23A: Porcentagem de questões respondidas que relacionou os vírus às doenças,
seres muito pequenos, que precisam de uma célula para viver, à dúvida sobre serem
vivos ou não e unicelulares.
119
Figura 23B: Porcentagem de alunos que relacionou os vírus às doenças, seres muito
pequenos, que precisam de uma célula para viver, à dúvida sobre serem vivos ou não e
unicelulares.
4.4.11.7 Helmintos
Nas análises anteriores, a prevalência do discurso mostrava que os helmintos eram associados
a doenças e apareceram em segundo lugar na relação com a sujeira – citados principalmente
pelos alunos da escola 3 (Ciep). Com relação ao habitat também foi o segundo mais citado,
com associações aos alimentos em geral, no contexto de provocarem doenças intestinais e
instalando-se então no organismo, na barriga, intestino. Mais uma vez, as análises de cada
questão confirmaram todos esses resultados (figuras 24, 24A e 24B). O discurso mais
recorrente, neste caso, seria o de que são seres que provocam ―doenças como dor de barriga‖,
onde ―se alimentam da nossa comida‖. ―São transmitidos pela comida‖, ―em sanitários e
esgotos‖ ou ―quando a gente anda descalço‖.
120
Figura 24: Número total de alunos que relacionaram os helmintos às doenças, no
intestino ou na barriga de seres humanos, onde se alimentam. Provenientes de alimentos
contaminados ou de lugares sujos e relativamente grandes.
Figura 24A: Porcentagem de questões respondidas que relacionou os helmintos às
doenças, no intestino ou na barriga de seres humanos, onde se alimentam. Provenientes
de alimentos contaminados ou de lugares sujos e relativamente grandes.
121
Figura 24B: Porcentagem de alunos que relacionou os helmintos às doenças, no intestino
ou na barriga de seres humanos, onde se alimentam. Provenientes de alimentos
contaminados ou de lugares sujos e relativamente grandes.
Por fim, a análise manual das respostas de cada aluno nos permitiu identificar vários aspectos
sobre o discurso desses jovens que a ferramenta Triviumsoft não foi capaz de abarcar,
servindo esta apenas como uma forma de identificar o quão forte é o discurso e as suas
principais categorias.
122
4.5 Respostas dos pesquisadores
Dos 672 e-mails enviados aos pesquisadores de microbiologia, obtivemos 21% de resposta,
com um total de 146 mensagens respondidas (Figura 25). A maioria (88%) respondeu o email até o dia 10 de abril de 2007, porém, recebemos a última resposta no dia 17 de julho do
mesmo ano.
Figura 25: Número de questionários enviados aos pesquisadores, quantos retornaram
diretamente dos servidores (não foram entregues), quantos foram respondidos e quantos
excedentes (questionários respondidos que não foram enviados por nós, mas,
possivelmente foram repassados por seus pares).
4.5.1 Categorizações das respostas
Foram identificados, a partir de uma leitura prévia, quatro parâmetros nas respostas dos
pesquisadores:
1.
Fatores de risco que os microrganismos podem trazer aos humanos e/ou ao meio
ambiente.
123
2.
Fatores benéficos que os microrganismos podem trazer aos humanos e/ou ao meio
ambiente.
3.
Fatores importantes apenas pelo conhecimento puro e não aplicado.
4.
Importância de desmistificações sobre temas com relação aos microrganismos, nos
quais os pesquisadores afirmam conhecer o que a população pensa ou sabe a respeito destes.
Foram observados três padrões de respostas, exemplificados pelas seguintes unidades de
contexto:
―Eu acho que o público em geral deveria saber pelo menos o que é uma bactéria, um fungo
e um vírus, pois é o mínimo. Pois eles misturam tudo‖.
―Acho que as pessoas também deviam saber que existem muitos micróbios bons para o
organismo, não só os patogênicos‖.
―Na minha opinião, o mais importante é o público saber sobre as principais doenças causadas
pelos microrganismos e sobre medidas simples e básicas de prevenção das mesmas‖.
Menos de um quarto dos pesquisadores (23%) respondeu apenas um tema que considerem
importantes a população saber a respeito dos microrganismos. A maioria usou de duas a três
abordagens diferentes (67%). Nove pesquisadores citaram todos os quatro critérios de
respostas (6%) e seis não responderam a nenhum dos critérios (4%), como pode ser observado
na figura 26.
124
Figura 26: Porcentagem dos pesquisadores que utilizou zero, um ou mais critérios em
suas respostas.
A maioria das respostas foi relacionada ao perigo dos microrganismos (73,4%), seguido
daqueles que consideram importante as pessoas saberem sobre os seus fatores benéficos
(64,3%). Uma parcela menor de pesquisadores (38,5%) afirmou que são importantes os
conceitos sobre microbiologia que não estariam atrelados a alguma utilidade prática. E um
número um pouco menor de pesquisadores (32,9%), apresentou um padrão de resposta que
fugiu à pergunta e representa um preconceito sobre o que eles acreditam que as pessoas sabem
(ou não sabem) com relação aos micróbios (figura 27). Entretanto, estas categorias estavam
geralmente intrincadas e 73% dos pesquisadores apresentou respostas com mais de dois
critérios. Assim, 14% dos pesquisadores entrevistados consideram importante somente alertar
sobre as principais formas de prevenção contra as doenças provocadas por microrganismos,
16,8% falam sobre riscos e benefícios e 16% citam preconceitos, além de riscos e benefícios.
125
Figura 27: Mostra quantos pesquisadores responderam a cada critério. O número total
do gráfico ultrapassa o número total de pesquisadores, pois alguns utilizaram mais de
um critério em suas respostas.
Para analisar a parcialidade do discurso dos pesquisadores, identificamos que tipo de temas
foram abordados por aqueles que abrangeram mais ou menos critérios em suas respostas
(figura 28). Assim, pudemos observar que dos pesquisadores que responderam apenas a um
tema, a maioria (60,6%) falou sobre os riscos que os microrganismos podem causar (figura
28 A). À medida que o discurso se torna mais aberto, o tema dos microrganismos benéficos
fica mais influente, mas sempre com o discurso dos micróbios patogênicos fortemente
presente. O conhecimento não aplicado sobre microrganismos prevaleceu apenas quando
atrelado a outros discursos. Já o preconceito com relação ao conhecimento da população sobre
os micróbios praticamente não aparece sozinho, mas se mantém constante conforme aumenta
o número de fatores no discurso (figuras 28 A, B e C).
126
Figura 28: Porcentagem de pesquisadores que respondeu a cada critério em discursos
onde apenas um deles foi abordado (A), onde dois foram abordados (B) e onde três
foram abordados (C).
A)
B)
C)
127
A tabela 21 resume a distribuição das quatro categorias de respostas dos pesquisadores. Ela
evidencia como o discurso acerca dos microrganismos benéficos é mais fortemente
relacionado ao discurso dos microrganismos patogênicos do que a relação inversa. Ou seja,
geralmente aqueles que citaram a importância dos benefícios também acham importante
ressaltar que alguns podem causar danos ao homem e/ou ambiente e 23 pesquisadores (15,7%
dos que responderam ao questionário) foram mais além, citando também a importância de
certos conhecimentos não aplicáveis.
Poucos foram aqueles que se detiveram apenas nos benefícios (cinco ou 3,4%), no
conhecimento puro (sete ou 4,8%) ou em ambos (dois ou 1,4%). No entanto, 20 pesquisadores
(13,7%) declararam que é importante apenas alertar a população sobre as principais formas de
prevenção contra as doenças provocadas por microrganismos. Somando-se a estes, outros seis
que também citaram riscos acerca dos micróbios, além de preocupações (preconceitos) sobre
as pessoas não saberem métodos profiláticos ou como administrar antibióticos corretamente.
A categoria ―preconceito‖ faz parte do imaginário deste grupo e, portanto, aflorou por conta
própria, intrincado entre os três outros grupos.
Por outro lado, somente 5 (3,5%) deles declararam apenas sobre a importância dos
microrganismos benéficos. Apenas um pesquisador citou somente o preconceito: ―As pessoas
tem uma noção de que a grande maioria dos microrganismos é patogênica, o que não é
verdade. Inclusive essa noção também é passada para os alunos do ensino fundamental e
médio, por meio de professores que deveriam ter conceitos mais consolidados de
Microbiologia―. Porém, ele não respondeu, de fato, o que acredita que seria importante elas
saberem.
128
Tabela 21: Mostra as relações entre os diferentes critérios (evidenciados nas colunas) e
os pesquisadores que os utilizaram (marcados nas linhas), em ordem decrescente.
Dentro dos parênteses estão indicados o número de pesquisadores que respondeu
equivalente a cada categoria.
Freqüência em que
Riscos (105) Benefícios (92) Conhecimento (56) Preconceito (47) este padrão aparece
X
X
24
X
X
X
23
X
20
X
X
X
13
X
X
13
X
X
X
X
9
X
X
9
X
7
X
X
6
6
X
5
X
X
X
3
X
X
2
X
X
X
1
X
X
1
X
1
Por fim, este estudo evidenciou que os microbiologistas participantes da pesquisa consideram
muito importante o alerta à população sobre os riscos provocados pelos microrganismos.
Porém, que também avaliam fundamental às pessoas saberem que estes não são os únicos
existentes e muitos também podem trazer benefícios à humanidade e ao meio ambiente. Eles
se mostraram descontentes com o que acreditam que seja o conhecimento atual da população
sobre o assunto, seja pelo alarde ou pelo desconhecimento acerca do tema.
129
4.6 Análise das matérias
Foram analisadas 315 matérias no período de março a maio de 2008, selecionadas através do
serviço de alertas do Google. Foram identificadas 118 matérias em março, 107 em abril e 90
em maio. Destas, a maior parte se tratou de matérias sobre os vírus (109), fungos (75) e as
bactérias (65). Foram identificadas poucas notícias sobre os protozoários (27), micróbios em
geral (23) e sobre os vermes (16) (figura 29).
Figura 29: Porcentagem de matérias que abordam cada tipo de microrganismo, nos três
meses estudados.
De todas as matérias analisadas, a maioria (83%) abordou temas relacionados aos danos e
malefícios que podem ser provocados pelos microrganismos (figura 30). O tema prevaleceu
em todos os grupos de microrganismos e foi mais acentuada com relação aos protozoários
(corresponde a 100% das matérias desse grupo), vírus (98,2% das matérias) e vermes
(87,5%), como mostra a figura 31. Também observamos que os micróbios em geral, as
130
bactérias e os fungos foram os que obtiveram mais abordagens favoráveis (em 21,7%, 15,4%
e 13,3% das matérias, respectivamente). Os micróbios em geral e os vermes também
sobressaíram com relação às abordagens neutras (com 13% e 12,5%, respectivamente).
Figura 30: Porcentagem de matérias que abordam aspectos benéficos, maléficos;
benéficos e maléficos ou neutros com relação a todos os microrganismos pesquisados,
nos três meses estudados.
Figura 31: Porcentagem de matérias que abordam aspectos benéficos, maléficos;
benéficos e maléficos ou neutros com relação a cada tipo de microrganismo pesquisado,
durante os três meses estudados.
131
4.6.1 Principais temas abordados
4.6.1.1 Micróbios
Os micróbios em geral também aparecem principalmente como causadores de doenças (74%
das matérias), mas também foram os mais abordados com relação aos benefícios (39,1%,
considerando também as matérias que abordam ambos fatores benéficos e maléficos), com
temas como possíveis aplicações biotecnológicas e de pesquisa (tabela 22). Além disso,
30,4% das matérias sobre micróbios em geral abordam pesquisas científicas (tabela 23), um
número acima da média das matérias analisadas, como mostrado adiante.
Tabela 22: Temas abordados nas 23 matérias sobre micróbios em geral (as duas notícias
sobre hanseníase também falam sobre tuberculose, portanto a soma das matérias
representadas na tabela dá 25).
Abordagem Temas
tuberculose
infecção hospitalar
Malefícios hanseníase
intoxicação alimentar
doenças de plantas
Neutras
biodiversidade genética
Mal./Ben. bactéria que causa uma doença e previne outra
identificação de fósseis
Benefícios
biotecnologia
Matérias
9
3
2
1
1
2
1
1
5
Tabela 23: Explicita as sete matérias, dentre as 23 relacionadas aos micróbios em geral,
que abordaram resultados de pesquisas científicas e os países em que foram concebidas.
Abordagem Temas
nova cepa de Mycobacterium tuberculosis
busca por enzimas farmacológicas de microrganismos
Resultados arqueomicrobiologia explica extinção de dinossauros
de pesquisas micróbio produz biocombustível
científicas
bactéria gigante tem 200 mil cópias do genoma
enzima de micróbio produz etanol (fonte lusa)
H. pylori protege crianças da asma (fonte lusa)
País
Brasil
Brasil
EUA
EUA
EUA
EUA
EUA
Matérias
1
1
1
1
1
1
1
132
4.6.1.2 Bactérias
Com relação às 65 matérias sobre bactérias, a maioria (78,5%) fala sobre doenças
transmitidas, mesmo que duas delas abordem também fatores benéficos. Ressaltamos a
importância dos alertas de novos surtos de infecções hospitalares (27,7%), devido à crescente
seleção e multiplicação das bactérias resistentes à múltiplas drogas (tabela 24).
Além disso, 36,9% das matérias sobre bactérias abordaram temas originários de pesquisas
científicas. E apenas 13,8% divulgam pesquisas nacionais (que corresponde a 37,5% das
matérias sobre pesquisas científicas no tema bactérias). Estes números levam em consideração
três matérias sobre uma pesquisa realisada por brasileiros, porém em conjunto com norteamericanos (tabela 25).
Tabela 24: Temas abordados nas 65 matérias sobre bactérias.
Abordagem Temas
infecção hospitalar
mortes por bactéria rara
outras doenças
Malefícios
tuberculose
intoxicação alimentar
leptospirose
biodiversidade
Neutras
reprodução bacteriana
combate outras doenças bacterianas
Mal./Ben.
provoca doença / biotecnologia combustível
Benefícios
bactérias intestinais
combatem o câncer
combatem mosquitos
biotecnologia (computador biológico)
Matérias
18
7
8
6
5
5
2
2
1
1
5
2
2
1
133
Tabela 25: Explicita as 24 matérias, dentre as relacionadas às bactérias, que abordaram
resultados de pesquisas científicas e os países em que foram concebidas as pesquisas.
Abordagem Temas
bioinseticida contra dengue
levedura combate salmonela
proteômica de M. leprae
sinergismo entre bactéria e gripe
novo teste diagnóstico de doenças
genótipo de cepa de M. tuberculosis
Resultados nova cepa de leptospirose
de pesquisas bactéria no tratamento de cálculo renal
científicas
E.coli como fonte de energia (hidrogênio)
biotecnologia (computador biológico)
bactéria intestinal contra colesterol
vida sexual bacteriana
bactéria contra tumores
bactéria contra câncer
biodiversidade - bactéria em spray de cabelo
País
Brasil
Brasil
Brasil
Brasil
Brasil
Brasil/EUA
EUA/Peru
EUA
EUA
EUA
França
Croácia/França
Alemanha
Suíça
Japão
Matérias
2
1
1
1
1
3
3
2
1
1
3
2
1
1
1
4.6.1.3 Fungos
A metade das matérias sobre fungos falou sobre pragas que acometem plantações de plantas e
de alimentos. Houve somente 14 notícias sobre doenças humanas e seis sobre doenças
animais (num total de 26,6%) e um número semelhante (22,6%) de notícias sobre fatores
benéficos, que é alto, se comparado com as matérias sobre os outros microrganismos
estudados (e levando em conta também as matérias que citam ambos fatores benéficos e
maléficos). Veja mais detalhes na tabela 26.
Além disso, 20% das matérias sobre fungos abordam temas de pesquisa científica. A única
matéria com fonte de pesquisa portuguesa é proveniente de fonte lusitana de notícias (tabela
27).
134
Tabela 26: Temas abordados nas 75 matérias sobre fungos.
Abordagem Temas
outras contaminações de plantas
contaminação de soja
contaminação de arroz
outras doenças humanas
doenças em animais
Malefícios
paracoccidiose humana
mofo em residências / construções
degradação de livros
candidíase humana
criptococose humana
Neutras
doenças / LSD/anti-hemorrágico
Mal./Ben.
estraga tecidos/biocombustível
leveduras probióticas
bioinseticidas
combate cancro de próstata
Benefícios
comestíveis
bebida fermentada (saquê)
gene da longevidade
Matérias
19
12
7
7
6
2
2
1
1
1
3
2
1
6
1
2
1
1
Tabela 27: Explicita as 15 matérias, dentre as 75 relacionadas aos fungos, que
abordaram resultados de pesquisas científicas e os países em que elas foram concebidas.
Abordagem
Temas
mapa de conservação de anfíbios ameaçados por fungo
bioinseticida contra mosca que ataca bovinos
100
anos
que
Adolpho
Lutz
descreveu
paracoccidioidomicose
mapa de infecção de pombos vetores de Criptococcus
Resultados
genes de fungo produz biocombustível
de pesquisas
novos genes da longevidade
científicas
morre o descobridor do LSD
molécula prebiótica de S.cerevisae
bioinseticida contra mosquito da malária
elo perdido dos sapos em extinção devido a fungos
fungo contra cancro de próstata (fonte lusa)
País
Brasil
Brasil
Matérias
2
1
Brasil
Brasil
EUA
EUA
Suíça
Itália
Holanda
Canadá
Portugal
1
1
2
1
3
1
1
1
1
a
135
4.6.1.4 Protozoários
Todas as matérias sobre protozoários trataram sobre doenças (tabela 28) e 22,2% delas
abordou pesquisa científica. Todas as fontes de notícias abordaram pesquisas nacionais e as
duas matérias sobre pesquisas portuguesas foram publicadas em fontes de notícias
portuguesas. As pesquisas da área divulgadas são todas sobre novas formas de erradicar essas
doenças (tabela 29).
Tabela 28: Temas abordados nas 27 matérias sobre protozoários.
Abordagem
Malefícios
Neutras
Mal./Ben.
Benefícios
Temas
leishmaniose
malária
doença de Chagas
giardíase
toxoplasmose
tricomoníase
calazar
-
Matérias
9
7
6
2
1
1
1
-
Tabela 29: Explicita as seis matérias, dentre as 27 relacionadas aos protozoários, que
abordaram resultados de pesquisas científicas e os países em que foram concebidas essas
pesquisas.
Abordagem Temas
genoma de Plasmodium falciparum
Resultados Leishmaniose e hipóxia
de pesquisas novos medicamentos contra Giardia
científicas
modelo matemático para erradicar malária (fonte lusa)
fatores para infecção de malária no fígado (fonte lusa)
País
Brasil
Brasil
Brasil
Portugal
Portugal
Matérias
2
1
1
1
1
136
4.6.1.6 Vírus
Apenas duas das 109 matérias sobre vírus abordou temas sobre biotecnologia (ambas sobre
terapia gênica com vetores virais), como mostra a tabela 30. Além disso, 12,8% das matérias
sobre vírus abordam pesquisas científicas. A maioria (78,6%) dessas pesquisas é sobre novas
formas de combate às doenças virais. Duas das matérias sobre pesquisas científicas são
provenientes de sites portugueses e relatam pesquisas da Espanha e do Japão (tabela 27).
Tabela 30: Temas abordados nas 109 matérias sobre vírus (os vírus da dengue e da febre
amarela são citados juntos em uma notícia, portanto, a soma das matérias da tabela é
110).
Abordagem Temas
HIV
dengue
outras doenças humanas
gripe
gripe aviária
hepatite
Malefícios
febre amarela
pólio
Vírus Sincicial Respiratório (VSR)
outras doenças animais
raiva
HPV
Neutras
Mal./Ben. Benefícios terapia genética
Matérias
25
25
21
12
8
6
3
2
2
2
1
1
2
137
Tabela 31: Explicita as 14 matérias, dentre as 109 relacionadas aos vírus, que
abordaram resultados de pesquisas científicas e os países em que foram concebidas essas
pesquisas.
Abordagem
Resultados
pesquisas
científicas
Temas
vírus da gripe 'derrete' no verão
proteína humana contra HIV
novo vírus da gripe suíno
terapia genética com vetor viral contra hemofilia
terapia genética com vetor viral contra cegueira
de teste de vacina contra dengue
tratamento contra a dengue
novo método de vigilância contra Aedes aegypti
medicamento contra HIV
engenharia genética anula progressão da dengue
anticorpo contra HIV a partir do milho (fonte lusa)
gene bloqueador do HIV
vacina para gripe aviária (fonte lusa)
País
EUA
EUA
EUA
EUA
EUA/Itália
Brasil
Brasil
Brasil
Brasil
Brasil
Espanha
Canadá
Japão
Matérias
2
1
1
1
1
1
1
1
1
1
1
1
1
4.6.1.6 Helmintos
Foram identificadas poucas matérias sobre vermes nos três meses e a maioria (81,2%) fala
sobre doenças de humanos e animais (tabela 32). Das 16 matérias sobre vermes, apenas duas
são relatos de pesquisas sobre longevidade, realizadas por pesquisadores norte-americanos
(tabela 33).
Tabela 32: Temas abordados nas 16 matérias sobre vermes.
Abordagem Temas
outras doenças em humanos
Esquistossomose
doenças em animais
Malefícios nematóide cística
doenças em plantas
angiostrongilíase abdominal
Neutras
cobaia em experimentos
Mal./Ben. Benefícios gene da longevidade
Matérias
7
2
2
1
1
1
1
1
138
Tabela 33: Explicita as duas matérias, dentre as 16 relacionadas aos micróbios em geral,
que abordaram resultados de pesquisas científicas e os países em que foram concebidas.
Abordagem
Resultados
de
pesquisas
científicas
Temas
País Matérias
novos genes da longevidade em nematóides
EUA 1
insulina inibe proteína da longevidade em verme
microscópico
EUA 1
Foram observadas poucas matérias sobre ciência e tecnologia, prevalecendo o alarde sobre
novos surtos e doenças epidêmicas em todos os grupos de microrganismos estudados. Das
315 notícias, 68 (21,6%) abordam resultados de pesquisas científicas e apenas 25 (8% do total
de matérias) sobre pesquisas brasileiras.
Apenas as matérias sobre protozoários não continham pesquisas norte-americanas. As
pesquisas portuguesas e espanholas apenas foram reportadas por fontes de notícias lusitanas
(figura 32).
Dentre as 68 notícias que abordam resultados de pesquisa, as pesquisas nacionais têm
praticamente o mesmo destaque que as norte-americanas, porém todas as fontes internacionais
juntas ultrapassam o destaque dado às notícias brasileiras. Mesmo desconsiderando as sete
fontes lusas de notícias (três sobre pesquisas portuguesas, duas norte-americanas, uma
espanhola e uma japonesa), o cenário não se modifica muito.
139
Figura 32: Origem das pesquisas científicas reportadas nas matérias sobre todos os
microrganismos, considerando as sete fontes lusas de notícias (três sobre pesquisas
portuguesas, duas norte-americanas, uma espanhola e uma japonesa).
Por fim, observamos que a mídia jornalística veiculada pela internet nesse período abordou
mais o alarde com relação aos riscos, doenças e epidemias provocadas por microrganismos,
em detrimento das pesquisas científicas realizadas na área.
140
5 Discussão e Conclusões
5.1 Sobre a metodologia
A análise dos alunos com a ferramenta Triviumsoft abrangeu um número muito grande de
questões e muitas categorias para serem avaliadas. Este fato impossibilitou observarmos as
árvores com os diferentes grupamentos de conteúdo que o programa propõe (Authier et.al.,
2006). Por isso, foi necessário re-analisar os resultados manualmente, pois uma prevalência
alta de um discurso não significa que ele foi usado pela maioria das pessoas, como nos
mostrou o resultado acerca das doenças provocadas pelos fungos. Nesta análise, os fungos
apareciam no discurso com um alto índice de associação à doença , mas foi o microrganismo
menos associado a doenças. Como já explicado, isso ocorreu devido a uma alta prevalência
desse tema no discurso dos poucos alunos que fizeram essa relação.
Assim, verificamos que para o nosso estudo de caso com os alunos (onde foram feitas muitas
perguntas de respostas curtas que abrangem muitas categorias) que a ferramenta Triviumsoft
serviu para nos fornecer uma visão mais aguçada sobre quão forte é o discurso, mas é preciso
saber de quem e de quantos ele partiu. Portanto, a ferramenta não pode ser usada como único
método de análise. Acreditamos também que uma tentativa de analisar ainda mais
profundamente certos aspectos dessa relação deva ser feita por meio de entrevistas semiestruturadas, que permitiriam uma análise qualitativa mais detalhada (Duarte, 2002).
Nós optamos pela análise majoritariamente quantitativa, conjugada com a análise qualitativa,
como proposto por Bardin (1977). Minayo e Sanches (1993) argumentam que resultados
matemáticos são relevantes para determinados objetivos, mas que colocam algumas
141
limitações na análise (como a generalização e modelos idealizados). Quanto maior a
complexidade do fenômeno, maior é o esforço para se chegar a uma quantificação adequada.
Porém, consideram que, do ponto de vista metodológico, não há contradição entre os dois
tipos de investigações. ―Assim, o estudo quantitativo pode gerar questões para serem
aprofundadas qualitativamente, e vice-versa‖.
5.2 Sobre os resultados
Diversos estudos mostram as relações das pessoas com os micróbios, partindo do ponto de
vista da doença e da ciência. Porém, partindo-se da indagação sobre o micróbio, como surgem
a doença e a ciência? Considerando que os patógenos são minoria dentre os microrganismos,
prevalece a questão histórica e social atrelada aos micróbios? Neste estudo, observamos essa
prevalência tanto no discurso dos alunos quanto nas matérias veiculadas pela internet, em
detrimento do discurso dos microbiologistas, que já começam a se desvencilhar dessa questão
histórica. Será que esse panorama reflete uma divulgação pouco desenvolvida na área?
O presente trabalho, sobre a visão relacionada aos microrganismos de alunos de 7ª série de
duas escolas particulares e uma pública do Rio de Janeiro, nos permitiu concluir que, além de
o tema sobre doenças ter sido o mais intenso no discurso total dos alunos, também é mais
prevalente entre o número de alunos. Os vírus foram os mais associados às doenças e
transmissibilidade, em 95,5% de todas as respostas, seguidos pelos helmintos (81,5%),
bactérias (66,8%), micróbios em geral (50,8%), protozoários (42,8%) e fungos (24,7%).
Outros estudos já mostraram que os micróbios aparecem como resposta para perguntas acerca
das doenças (Noronha et al., 1995; Moreira & Dupas, 2003; Unfer & Saliba, 2000). Porém, o
142
que mais se relaciona com este trabalho foi uma pesquisa feita com 96 estudantes, de seis a 14
anos, de duas escolas de ensino fundamental (uma pública e outra privada) da zona Norte do
Município do Rio de Janeiro. O estudo mostrou que os vírus e germes apareceram em
primeiro lugar (89,6%) como as atribuições de causalidade mais freqüentes para provocar
doenças (Boruchovitch & Mednick, 2000).
Outro estudo feito pelo mesmo grupo em 1991, com 123 professores e 394 alunos de primeiro
grau de 10 escolas (cinco públicas e cinco particulares) da zona Norte da cidade do Rio de
Janeiro, também mostrou que tanto a doença quanto preservação da saúde são vistas
predominantemente por seus aspectos biológicos e orgânicos, tanto pelos alunos quanto pelos
professores, que demonstraram não possuírem uma concepção da doença enquanto processo
(Boruchovitch et al., 1991).
Assim como no nosso estudo, esses trabalhos também não mostraram uma diferença
significativa entre os grupos das escolas particulares e públicas. O grupo de Boruchovitch
comenta sobre as desvantagens de se atribuir as doenças apenas aos micróbios e à higiene e da
importância de outros fatores sociológicos, econômicos, ambientais e culturais.
Por outro lado, nós também questionamos sobre as desvantagens de se aferir os
microrganismos apenas às doenças, frente à relevância de diversas aplicações, desde
alimentos, bebidas e suplementos alimentares, à produção de substâncias químicas
farmacêuticas, substâncias de valor comercial, biocidas, produção de gás natural, diversas
aplicações na indústria do petróleo, etc. (Pelczar, 1996; Manzi & Mayz, 2003). Além disso, a
minoria dos microrganismos é patogênica e até mesmo esses causam doenças apenas quando
estão em determinados locais do organismo e/ou em quantidade suficiente para isso.
143
Neste trabalho, apenas quatro alunos afirmaram que os microrganismos em geral podem ser
―malignos ou benignos‖ e ―beneficiosos ou maleficiosos‖, mas sem citarem mais detalhes.
Apenas um jovem especificou um tipo de benefício que eles poderiam trazer (produção de
insulina humana por bactérias) e três citaram que fungos podem ser ingeridos.
Outra pesquisa observou o que alunos do 3º ano do ensino médio, em dois municípios da
região Noroeste do Estado do Paraná, sabem sobre os conceitos e fenômenos biológicos e o
que pensam sobre os organismos transgênicos. Os autores identificaram muitas idéias
alternativas, fragmentadas e definições equivocadas em relação aos seres vivos, células,
composição química e função do material genético, apesar de terem estudado sobre eles na
escola. Os alunos abordaram com naturalidade termos como DNA, código genético,
cromossomos e genes e a maioria afirmou que determinam ou contém a informação genética.
Porém, os autores observaram uma deficiência nesses conceitos quando se refletem na análise
sobre fenômenos científicos, como os organismos transgênicos, que revelaram concepções
espontâneas, intuitivas e de senso comum, na maioria das vezes, desprovidas do conteúdo
científico vivenciado no ambiente escolar e muitas vezes os alunos sabem as nomenclaturas
dos conceitos científicos, mas não os relacionam corretamente às suas funções (Pedrancini et
al., 2007).
Algo semelhante foi verificado neste estudo, principalmente na categoria identificada no
discurso dos alunos como ―conceitos complexos‖. Nela, alguns jovens atribuíram bactérias a
seres eucariontes e com núcleo; fungos como procariotos e fotossintéticos; protozoários como
protistas ou pluricelulares; vírus como uni ou pluricelulares e com núcleo (tabela 5, pág 80 ).
Esta característica de que os nomes são apropriados pelos alunos, mas o conceito permanece
144
pouco compreendido pode ser exemplificada pela frase de um jovem ao definir os
protozoários: ―Reino protista é o nome científico‖ (tabela 15, pág 96).
O nosso estudo também reforça a preocupação que este e outros estudos (Massarani &
Moreira, 2005) mostram sobre a capacidade dos alunos entenderem conceitos sobre
biotecnologia, já que nenhum aluno relacionou-a com os microrganismos, nem mesmo os
vírus, que são muito comuns nos processos biotecnológicos.
Em paralelo, os 146 pesquisadores analisados nesse estudo também são bastante preocupados
com o conhecimento acerca dos riscos microbianos para o meio ambiente e, principalmente
para a saúde humana. Essa preocupação com os riscos é baseada no fato de que é possível
evitá-los conhecendo o problema e com métodos de prevenção e diagnóstico precoce. No
entanto, esta preocupação provavelmente exacerba os aspectos negativos percebidos pela
sociedade. Entretanto, um discurso concomitante entre muitos pesquisadores analisados
ressalta a importância de a população conhecer os fatores benéficos trazidos pelos micróbios.
Este grupo de pesquisadores afirma que é fundamental conhecer os riscos, mas assume que as
pessoas acham que todos os microrganismos são maléficos e que seria considerável esclarecer
que estes constituem apenas uma minoria.
Apesar de esta preocupação parecer, a princípio, uma atitude preconceituosa dos
pesquisadores (ao afirmarem já saber o que pensa a sociedade), muitos desses cientistas são
também professores e devem verificar esses problemas já na universidade. Além disso, nós
também identificamos esse tipo de resposta exacerbada neste trabalho, tanto por parte dos
alunos quanto pelas notícias veiculadas pela internet. Assim, acreditamos que os
pesquisadores tenham chegado a esta conclusão por uma análise (muitas vezes inconsciente)
145
das informações sociais que chegam até eles. Por exemplo, um pesquisador cita que o
incomoda muito as propagandas na televisão que condenam microrganismos: ―Me apavora as
propagandas de TV em que as crianças tem gerrrrrmes.... E tome sabonete anti-séptico‖.
Apesar do bom índice de resposta obtido pelos microbiologistas, não podemos aferir que este
estudo se aplica a todos os pesquisadores da área, principalmente porque não sabemos se a
relação entre os profissionais da área preocupados com a disseminação do tema sobre
micróbios benéficos versus aqueles preocupados com os patogênicos foi influenciada pelo
mote à resposta do questionário. Ou seja, se haveria algum tipo de predileção de um ou outro
grupo de pesquisadores a responder pesquisas sobre divulgação de ciências.
Pode ser que uma pesquisa hipotética ideal, que envolva todos os pesquisadores da área,
mostre proporções diferentes entre os grupos de respostas identificados e, por exemplo, se
mostrem mais preocupados com a importância do conhecimento não-aplicado sobre os
microrganismos – defendendo a ciência por ela própria. Porém, dificilmente surgiriam novas
categorias não identificadas no presente trabalho. Acreditamos que ele fornece um bom
panorama que reflete questões atuais na história da microbiologia, como a recente tentativa de
alguns grupos em reverter a relação dos micróbios, atribuída por séculos como meramente
causadores de doenças, para se tornarem também aliados, que podem inclusive colaborar com
os humanos na luta contra os patógenos.
Serge Moscovici (2003) afirma que as representações sociais se tornam senso comum, entram
para o mundo cotidiano que habitamos, discutimos com amigos e circulam na mídia que
lemos e olhamos. São sustentados pelas influências sociais da comunicação. Todas as
interações humanas, seja entre indivíduos ou grupos, pressupõem representações.
146
Portanto, os jovens que participaram da pesquisa não estão fora dessa premissa e certamente
também adquirem algumas informações sobre micróbios pela fonte alternativa de informações
fornecidas pela cultura e mídia. Por isso, averiguamos uma amostra preliminar de 315 notícias
veiculadas pela internet, em março, abril e maio de 2008, e observamos que a maioria delas
(83%) abordou temas relacionados aos danos e malefícios que podem ser provocados pelos
microrganismos. O tema prevaleceu em todos os grupos de microrganismos e foi mais
acetuado com relação aos protozoários (corresponde a 100% das matérias deste grupo),
vermes (81,2%), vírus (78,6% das matérias) e bactérias (78,5%).
Inclusive, a principal divulgação dos microrganismos estava presente no relato de novos
surtos epidêmicos. Isso poderia ser explicado, como indicam alguns estudos (Barata, 1990;
Darde, 2004), como uma tentativa de desempenhar o papel social de alerta à população e
cobrança de atitudes dos órgãos de saúde, governamentais ou não, em vista da melhoria na
qualidade de vida da população atingida.
No entanto, outros estudos denunciam uma predileção pela publicação relacionada apenas ao
alerta sobre números de casos epidêmicos em detrimento de informações sobre como evitar as
doenças. Eles afirmam que a cobertura de epidemias atende a características da notícia
jornalística, que preza pela abrangência e atualidade desses acontecimentos, que cumprem
com o interesse principal de captar a atenção do público (França et al., 2004)
Inclusive, isso ocorre com outras doenças além das contagiosas. Di Giulio e colaboradores
(2008) também discutem sobre o papel da mídia como exacerbação do risco real de uma
contaminação por chumbo a índices exorbitantes que, apesar de atrair a atenção das
autoridades em saúde, apavoraram, estigmatizaram e traumatizaram a população afetada.
147
Assim, o fato explica-se, em parte, devido a uma predileção natural da mídia jornalística
impressa, segundo França e colaboradores (2004) e veiculada pela internet (como observado
no presente estudo) quanto a divulgação de surtos e epidemias de doenças.
Além disso, não podemos esperar que a mídia, por si, seja intencionalmente parcial nesse
sentido, pois se trata de influências mais fortes do que uma pessoa, no papel de jornalista ou
editor, pode indeferir conscientemente. Como o estudo com os alunos evidenciou, é uma
questão que é colocada para a população desde cedo, tanto pela imprensa, quanto
provavelmente pela escola, família e outros círculos sociais. Afinal, o jornalista também faz
parte da sociedade, também foi à escola, lê jornais, etc. Ele também é influenciado pela
opinião pública, além de contribuir para a sua consolidação. Outro estudo feito pelo nosso
grupo apontou resultados nesse sentido, quando mostrou que a posição tendenciosa da mídia
televisiva nacional a favor das pesquisas com células-tronco embrionárias refletiu a opinião
pública (Verjovsky et al., In press).
Além disso, o jornalista também se preocupa com quem é o seu público-alvo e com que tipo
de notícias o atrairá mais e será mais lida ou assistida. Assim, os micróbios que provocam
doenças, além de serem mais prevalentes em toda a história da disciplina, estão mais
evidentes na vida cotidiana das pessoas, portanto, têm espaço cativo nas publicações de
notícias. Porém, isso explica apenas o alto índice de notícias sobre epidemias, mas não explica
o baixo índice dos outros tipos de notícias, tais como de divulgação de resultados de pesquisa,
por exemplo, que teriam implicações em outros fatores.
Nós também identificamos na análise das notícias que, dentre as poucas pesquisas relatadas,
apenas 36% abordaram pesquisas nacionais. Isso não significa que os brasileiros façam pouca
148
pesquisa na àrea de microbiologia, mas evidencia uma política editorial que apela à facilidade
de acesso às pesquisas estrangeiras, amplamente divulgadas em sites como Eurekalert
(http://www.eurekalert.org), que fornece press realeses (resumos das pesquisas) a jornalistas
de todo o mundo, com o contato dos pesquisadores (Semir, 1996).
Moreira e Massarani (2002) também alertam sobre a escassez de jornalistas especializados em
ciência no país. Assim, ―parte significativa dos artigos sobre ciência que são publicados é
constituída de traduções de textos comprados ou disponibilizados de jornais ou revistas do
exterior‖ (Moreira & Massarani, 2002).
A outra alternativa seria esperar notícias dos poucos serviços de assessoria de imprensa dos
principais centros de pesquisas brasileiros. Como a internet é um meio dinâmico, que deve ser
atualizado diariamente, infelizmente a tarefa de divulgar mais amplamente a pesquisa
nacional se torna menos viável.
Esse fato, associado à forma como a população (especialmente os jovens) absorve as
informações sobre saúde, tanto dos meios de divulgação, como da escola e outras fontes
sociais (Boruchovitch & Mednick, 2000), contribui para a manutenção do estigma dos
micróbios maléficos na população.
Como pudemos ver no trabalho de Di Giulio e colaboradores (2008), a mídia tem a
capacidade de interferir na percepção de risco da população acerca de temas relacionados à
saúde. Nós vimos, no presente trabalho, que esse aumento da imagem dos riscos relacionados
aos micróbios patogênicos pode estar ocorrendo, o que poderia ser melhor identificado com
uma análise mais profunda das diversas outras fontes midiáticas, principalmente da televisão,
149
como apresentada em diversos estudos (Fernandes, 1998; Fernandes et al., 2000; Silva &
Krasilchik, 2005) como uma importante fonte de informações para a população sobre temas
de saúde e ciência. Portanto, esperamos que outros estudos, como um panorama mais
profundo do tema em diferentes fontes midiáticas possam colaborar na melhor elucidação das
vias do fluxo de informações relacionadas à conceituação dos microrganismos perante os
jovens e à sociedade.
Por fim, a relação dos microrganismos com as doenças surgiu mesmo antes do advento do
microscópio, quando alguns pensadores, como Marcus Terentius Varro (116-27 a.C) e
Girolano Fracastoro (1483-1553), já atribuíam que diversas enfermidades deveriam ser
provocadas por seres invisíveis à vista humana (Finkielman, 2007; Gutiérrez, 2004; LópezMoreno, Garrido-Latorre & Hernández-Avila, 2000).
Apesar das leveduras terem sido descritas no processo de fermentação já em 1837 por Charles
Cagniard-Latour (1777-1859) (Barnett, 2003) e confirmadas pouco depois por Louis Pasteur
(1822-1895), a importância dos microrganismos cresceu no contexto das doenças (Ribeiro,
1997; Caponi, 2002). Os estudos de diversos autores e resultados apresentados neste trabalho
tornam claro que, dois séculos após Agostino Bassi (1773-1856) comprovar a primeira
relação entre os microrganismos e as doenças (Porter, 1973), esse estigma persiste independente da população estudada.
Nossa amostra é pequena, mas corroborou todos os achados encontrados na literatura
científica que mostram que estudantes possuem um conhecimento superficial e muitas vezes
errôneo sobre os microrganismos, mesmo quando refletem conceitos complexos, e que
150
atribuem a esses seres a capacidade de produzir doenças (Noronha et al., 1995; Boruchovitch
& Mednick, 2000; Boruchovitch et al., 1991; Moreira & Dupas, 2003; Unfer & Saliba, 2000).
Nossa pesquisa e outros estudos da literatura mostram que o alarde sobre os microrganismos
patogênico é reforçado pela mídia (França et al., 2004; Roche & Muskavitch, 2003; Ungar,
2008). Nós também mostramos que esse discurso é reiterado pelos microbiologistas,
professores da área, que sentem necessidade de reforçar a noção de risco e prevenção.
Desta forma, toda a importância dos microrganismos benéficos (e até a existência daqueles
que não provocam mal ou bem) é pouco conhecida pela sociedade, inclusive pelos jovens
estudados no presente trabalho. Finalmente, acreditamos que estratégias de divulgação
científica conscientes poderiam utilizar as informações contidas nesta pesquisa de forma útil,
que interfira nesse fluxo de informações.
151
Anexo
- Bactérias:
Organismos procariotos, as bactérias não têm núcleo diferenciado do citoplasma e nem outras
organelas presentes nos eucariotos. Apresentam várias formas, principalmente esféricas,
cilíndricos (bacilos), ou de aspecto espiralado (espirilos) (Pelczar, 1996).
São muito pequenas, mas as espécies podem variar de 0,1 até 50 micrômetros de diâmetro.
Muitas vezes permanecem agrupadas depois de se dividirem, formando diferentes arranjos.
Frequentemente se agregam em cadeias, cachos ou duplas e algumas espécies podem ser
identificadas ao microscópio apenas pelas formas incomuns de seus grupamentos (Madigan
et.al., 2004).
Compreende uma enorme variedade de procariotos, com estruturas e funções distintas. São
divididos em dois grandes grupos, denominados gram-positivos e gram-negativos. Essa
distinção é relacionada com a estrutura da parede celular (que fica acima da membrana)
(Madigan et.al., 2004).
As bactérias que são coradas pelo Gram (ou seja, Gram-positivas) têm uma parede celular
espessa, composta por um único tipo de molécula, chamada de peptideoglicano. Já as Gramnegativas apresentam, acima dessa parede, outra membrana composta por várias camadas de
uma estrutura complexa de lipídeos, açúcares e proteína, chamada de lipopolissacarídeos
(mais conhecida como LPS). Porém, também existem algumas bactérias, como o micoplasma,
que não têm parede alguma, apenas a frágil membrana (Madigan et.al., 2004).
152
Suas funções são muito variadas. Algumas espécies reciclam lixo orgânico ou produzem
antibióticos, como a estreptomicina. Outras provocam infecções como tétano, peste, cólera e
tuberculose (Pelczar, 1996).
- Árqueas:
Parecidas com as bactérias quando observadas ao microscópio, mas muito diferentes em
outros aspectos, como: composição química, atividade e habitat (Pelczar, 1996).
A maioria habita ambientes extremos, muito ácidos ou básicos, lagoas salinas, piscinas
térmicas ou vulcões. Algumas são produtoras de metano e vivem no fundo de pântanos, ou no
intestino de ruminantes. Certas espécies precisam de oxigênio, outras não o toleram (Pelczar,
1996; Madigan et.al., 2004).
Elas são relativamente pouco conhecidas, principalmente pela dificuldade de cultivo, pois a
maioria não sobrevive às condições de laboratório (Manfio, 2000; Madigan et.al., 2004).
- Protozoários:
Os protozoários são microrganismos eucariotos unicelulares. Eles ingerem partículas
alimentares, não têm parede celular rígida e não têm clorofila e geralmente são móveis
(Pelczar, 1996; Madigan et.al., 2004).
Suas características de locomoção são uma das principais formas de identificação. Alguns se
deslocam rapidamente na água pelos cílios ou flagelos (mais longos). Já as amebas se
arrastam por superfícies projetando parte de sua célula em uma direção, para que o restante
flua nessa direção, conhecido como movimento amebóide. Também existem protozoários
153
imóveis, que são geralmente parasitas de animais superiores e produzem esporos (uma forma
adormecida) durante seu ciclo de vida (Pelczar, 1996; Madigan et.al., 2004).
São amplamente distribuídos na natureza, especialmente em águas doce e marinha e alguns
vivem no solo ou em habitats aéreos. Vários são parasitas e causam doenças aos animais e
humanos, como a malária. Outros são úteis a eles, como aqueles encontrados no estômago do
gado, carneiro e cupim, e os auxiliam na digestão de alimentos (Pelczar, 1996; Madigan et.al.,
2004).
- Fungos:
São eucariotos que têm parede celular rígida, não têm clorofila (portanto, não fazem
fotossíntese) e produzem esporos. Eles absorvem nutrientes dissolvidos no ambiente. Podem
ser unicelulares, como as leveduras, ou multicelulares, como os bolores, e microscópicos ou
macroscópicos. O cogumelo é um exemplo de fungo macroscópico que cresce no solo e não é
considerado microrganismo (Pelczar, 1996).
Os bolores têm células em formato cilíndrico unidas pelas extremidades e formando um
filamento chamado de hifa. Individualmente são microscópicos, mas quando se multiplicam
muito se entrelaçam formando tufos compactos - uma massa visível a olho nu, chamada de
micélio (Pelczar, 1996; Madigan et.al., 2004).
Algumas espécies de bolores produzem antibióticos (como a penicilina), molho de soja,
queijos como o Roquefort e o Camembert, entre muitos outros produtos. Porém, também
deterioram materiais como tecidos e madeira, decompõem alimentos e causam doenças em
humanos, animais e plantas (Pelczar, 1996).
154
As leveduras são unicelulares e podem ter formas variadas, geralmente esférica, ovais, ou
cilíndricas. Algumas também podem formar filamentos, sob certas condições. A Candida
albicans, por exemplo, só provoca a doença candidíase quando na sua forma filamentosa. As
espécies com maior importância econômica são as do gênero Saccharomyces, usadas como
fermento de cozinha para a produção de pães e massas e de bebidas alcoólicas fermentadas
(Pelczar, 1996; Madigan et.al., 2004).
- Bolores limosos:
São microrganismos eucariotos, similares aos fungos e protozoários. Têm ciclo de vida e
produzem esporos como os fungos, mas se locomovem como os protozoários. São divididos
entre celulares e acelulares. Os amebóides são formados por células únicas e os plasmódios
têm massa, tamanho e forma indefinidos. Vivem principalmente em matéria orgânica em
decomposição, como restos de folha, tronco e solo (Madigan et.al., 2004).
- Vermes / Helmintos:
Os vermes pertencem ao domínio Eukaryota, reino Animália. Eles incluem desde parasitos
como a tênia até sanguessugas e minhocas. Os helmintos são vermes multicelulares que
geralmente parasitam outros animais (incluindo os humanos) e plantas. Muitas espécies são
microscópicas, mas outras podem chegar a metros de comprimento. Portanto, sua
classificação como microrganismos nem sempre é unânime. Existem dois principais grupos
(filos) de helmintos: os platelmintos (que são achatados) e os nematóides (arredondados)
(Pelczar, 1996; Hotez, 2008).
Dentro do grupo dos vermes achatados (platelmintos), existem os cestóides (ou tênias), que
em sua forma adulta são longos e se assemelham a uma fita métrica. Já os trematóides (ou
155
fascíolas) têm a forma adulta semelhante a uma folha. Um exemplo popularmente conhecido
de fascíola é o gênero Schistosoma, que causa a esquistossomose (Pelczar, 1996).
Os nematóides são muito diversos em vários aspectos, incluindo a morfologia. São
geralmente complexos e biologicamente especializados (De Ley, 2006). Fazem parte deste
filo os principais vermes intestinais (transmitidos pelo solo), as filárias, que causam as
doenças filariose e oncocercose (Hotez, 2008) e a sua fase de larva, microfilária, que é
transmitida por mosquitos e causa elefantíase em humanos (Cox, 2002).
Ainda não se sabe exatamente o motivo pelo qual os helmintos tendem a parasitar
principalmente as crianças na idade escolar (incluindo adolescentes) e pré-escolar. Como
resultado, podem provocar diminuição do crescimento e da aptidão física, além de prejudicar
a cognição e memória, acarretando em conseqüências danosas à saúde e desempenho escolar
dessas crianças (Hotez, 2008).
- Algas:
São semelhantes às plantas, pois têm clorofila, portanto fazem fotossíntese, e têm parede
celular rígida. Podem ser unicelulares e microscópicos ou multicelulares até mais de 30
metros de comprimento. Crescem em muitos ambientes diferentes, a maioria aquático e
servem de fonte de alimentos para os animais (Pelczar, 1996; Madigan et.al., 2004).
- Vírus:
Existe uma polêmica no meio científico sobre os vírus serem considerados vivos ou não, uma
vez que somente se reproduzem e desempenham funções biológicas nas células do hospedeiro
(Pelczar, 1996; Manfio, 2000). Para Pelczar (1996) eles não são vivos, mas, como têm
156
algumas características de células vivas e causam doenças em animais e plantas, são
estudados como microrganismos.
Estruturas estáticas, bastante estáveis, eles podem apresentar várias formas, como filamentos
semelhantes a uma agulha e vários modelos geométricos. São muito menores que os outros
organismos (de 20 a 300 nanômetros de diâmetro) e contém material genético (RNA ou
DNA) circundado por um envelope de proteínas, mas sem os aparatos para sintetizar as
proteínas (Pelczar, 1996, Madigan et.al., 2004).
Por isso, são parasitas celulares estritos, ou seja, apenas podem se multiplicar dentro de
células vivas, utilizando a maquinaria da célula hospedeira. Assim, são responsáveis por
diversas doenças humanas, como Aids, resfriado, herpes, poliomelite, hepatite. Além de em
animais (febre aftosa) e plantas (mosaico do tabaco) (Pelczar, 1996; Madigan et.al., 2004).
Os vírus podem se inserir no material genético das células e desregulam a expressão dos seus
genes. Por isso, em determinados casos podem levar à proliferação exagerada das células
infectadas gerando alguns tipos de câncer - como o de cólon de útero, pelo vírus HPV
(Pelczar, 1996). No entanto, esta característica permite a sua utilização biotecnológica na
engenharia genética, para inserir genes desejados em animais, plantas e até microrganismos
transgênicos (Madigan et.al., 2004).
157
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Currículum Vitae
Nome: Marina Verjovsky de Almeida Ribeiro de Souza
Nascimento: 14/04/1983
Naturalidade: Rio de Janeiro
Formação Acadêmica
Faculdade de Microbiologia & Imunologia pelo Instituto de Microbiologia e Imunologia
Professor Paulo de Góes, março de 2002 a dezembro de 2005.
Atuação profissional
Atuou, por um ano, como jornalista voluntária do Instituto Ciência Hoje/SBPC (2006).
Colabora como jornalista para o Núcleo de Divulgação do Programa Interinstitucional de
Ensino, Pesquisa e Extensão em Biologia do Câncer (Programa de Oncobiolgia).
Tem experiência na área de Comunicação, com ênfase em Jornalismo Especializado
(científico).
Textos em jornais de notícias/revistas
92 textos publicados em jornais de notícias /revistas
Comunicação em congresso
3 comunicações em congressos nacionais
2 comunicações em um congresso internacional
Publicações
JURBERG, C. ; VERJOVSKY, M ; MACHADO, G. O. C. ; AFFONSO-MITIDIERI, O. R. .
Embryonic stem cell: A climax in the reign of the Brazilian media. Public Understanding of
Science, 2009.
BERGTER, E. B. ; SASSAKI, G. ; WAGNER, R. ; SOUZA, L. M. ; SILVA, M. I. D. ;
PINTO, M. R. ; SOUZA, M. V. DE A. R. DE ; PAJGORIN . The opportunistic fungal
pathogen Scedosporium prolificans: carbohydrate epitopes of its glycoproteins. International
Journal of Biological Macromolecules, v. 42, p. 93-102, 2008.
JURBERG, C. ; SANTOS, N. F. ; BERNARDO, A. A. ; Pais, P. ; VERJOVSKY, M ;
AFFONSO-MITIDIERI, O . O poder das escolhas O que é publicado na mídia sobre câncer, o
que sabem os jornalistas e o impacto no conhecimento da sociedade. Em Formação, v. 2, p.
12, 2007.
168
Livros Grátis
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