Detecção de Resíduos em Imagens de Bolsas de Sangue

Propaganda
Detecção de Resíduos em Imagens de Bolsas de Sangue Utilizando
Transformada Wavelet
Cássio Avelino Adorni
[email protected]
Adilson Gonzaga
[email protected]
Departamento de Engenharia Elétrica, Escola de Engenharia de São Carlos
Universidade de São Paulo – USP
RESUMO - A medicina de transfusão de sangue cada vez
mais exige produtos e processos mais seletivos. Deste
modo as bolsas de sangue são submetidas a processos
com grande variação de temperatura e a várias
centrifugações sucessivas, e se no seu filme existir
qualquer material ou resíduo poderá causar ruptura da
bolsa com conseqüente perda de seu conteúdo. Estes
materiais ou resíduos podem ser detectados durante o
processo de manufatura e fabricação, mas algumas
empresas adotam o sistema de inspeção visual manual,
que não garante que todas as bolsas estejam livres destes
resíduos, devido ao fator humano e a juízo de valor. Para
automatizar este processo este artigo propõe uma
metodologia de Inspeção Visual Automática. No
processamento das imagens foi utilizada a Transformada
Wavelet para destacar as altas freqüências nas imagens.
A metodologia proposta, baseada em wavelets, alcançou
resultados promissores e confiáveis indicando que sua
implantação em uma linha de produção pode melhorar a
qualidade do produto final.
INTRODUÇÃO
Com a evolução da medicina de transfusão de
sangue nos últimos tempos, são necessários processos e
produtos mais seletivos. As bolsas de sangue, produto
utilizado na armazenagem de componentes sanguíneos,
são submetidas a vários processos com grandes variações
de temperatura, de 120ºC na esterilização à -70ºC no
armazenamento de sangue e centrifugações sucessivas de
até 5000 RPM [1].
Para garantir sua qualidade, o filme plástico com
a qual é fabricada, não pode conter qualquer material ou
resíduo que cause alteração em seu estado ou resistência,
para evitar que durante os processos de armazenamento
ou centrifugação não haja ruptura da bolsa, causando a
perda do conteúdo e por conseqüência graves transtornos.
Estes materiais ou resíduos podem ser detectados
no processo de fabricação e manufatura da bolsa de
sangue, durante as inspeções de qualidade.
Em algumas empresas o processo de inspeção de
bolsa de sangue é feito visualmente, a olho desarmado ou
a olho nu, como na Figura 1, fato que não permite garantir
a ausência de resíduo por estar diretamente ligado ao fator
humano e a juízo de valor [2].
Figura 1 – Processo de Inspeção Visual manual.
É preciso garantir que as bolsas comercializadas
para coleta de sangue, não contenham qualquer tipo de
resíduo, a um custo que não inviabilize a competitividade
comercial das empresas, que somente pode ser conseguida
com sistemas automatizados.
Para automatizar o processo de inspeção visual,
este artigo propõe uma metodologia para o
desenvolvimento de um sistema de visão de máquina
(Inspeção Visual Automática), por meio de Visão
Computacional. Com o avanço dos sistemas
computacionais, os algoritmos para reconhecimento de
padrões em imagens têm apresentado excelentes
resultados quando aplicados em sistemas automatizados,
obtendo avanços significativos em várias áreas [3] [4].
CAPTURA DAS IMAGENS
Na captura das imagens, foi usado um sistema de
iluminação omni-direcional [5], para isolar as bolsas para
coleta de sangue das adversidades do ambiente.
Este equipamento, na parte superior possui uma
abertura e um suporte no qual é fixada a câmera para
digitalização das imagens. A iluminação é realizada
através de quatro lâmpadas fluorescentes tubulares de luz
branca excitadas por fonte de alta freqüência (15 KHZ).
Estas lâmpadas estão direcionadas para a parte superior
do difusor, que reflete a luz na bolsa para coleta de sangue
e assim distribuindo a luz de maneira uniforme e isolando
das adversidades do ambiente.
Foi utilizada a câmera de vídeo KP-110CCD da
Hitachi, com um conjunto de lentes de zoom óptico de 16
vezes e controle de abertura do diafragma.
Esta câmera gera imagens analógicas que
posteriormente são digitalizadas.
Para a formação do primeiro banco de imagens
foram utilizadas 48 bolsas para coleta de sangue com os
dois tipos de filmes: Di (2-etilhexil) ftalato (DEHP) e tri
(2-hetilexil) trimelitato (TEHTM), nos formatos de bolsa
satélite e mãe. Estas bolsas foram retiradas da linha de
produção, e classificadas, por um Laboratório de Controle
de Qualidade, em “Bolsa com resíduo” e “Bolsa sem
resíduo”, determinando-se a quantidade de resíduos em
cada bolsa.
Cada bolsa para coleta de sangue foi catalogada,
numerada e dividida em oito partes, como na Figura 2.
Figura 2 - Imagens geradas de uma bolsa de sangue.
As imagens foram dividas em oito partes, porque
desta maneira pode-se ampliar as imagens usando os
recursos da filmadora e do conjunto óptico.
Além das oito imagens de cada bolsa foram
capturadas imagens de partes das bolsas que representem
cenas que possam gerar dificuldades no processamento e
na classificação dos pixels de resíduos. Estas imagens
geralmente são partes escuras, com níveis de cinza
próximos aos de resíduos, ou que tem grande variação. As
imagens contêm hímens, “tear off”, tubos de saída,
interruptor de fluxo e vários resíduos próximos das bordas
e com níveis de cinza diferentes, como mostrados na
Figura 3.
Figura 3 - Exemplos de imagens capturadas.
O primeiro banco de imagens foi gerado no
formato BMP, resolução de 608 x 456 pixels e 256 níveis
de cinza, com 504 imagens das quais 380 sem resíduos e
124 imagens com resíduos.
O segundo banco de imagens foi gerado usando
cem bolsas para coleta de sangue retiradas da linha de
produção, também com os dois tipos de filmes e com os
mesmos formatos, resolução e níveis de cinza do
primeiro, com 800 imagens, ou seja, 8 imagens de cada
bolsa.
Estas bolsas foram inspecionadas, classificadas
apenas em “Bolsa com resíduo” e “Bolsa sem resíduo”
pelo mesmo laboratório de controle de qualidade, sem
determinar a quantidade de resíduos em cada bolsa, e em
seguida numerada de um a cem. Nenhuma das bolsas
usadas nesta inspeção foi usada na geração das imagens
do primeiro banco de imagens.
A captura das imagens foi realizada da mesma
maneira que na geração do primeiro banco de imagens,
considerando-se as oito imagens, sem imagens adicionais.
PROCESSAMENTO DAS IMAGENS UTILIZANDO A
TRANSFORMADA WAVELET
Nesse trabalho foi usada a análise de
multiresolução (Multiresolution Analisys - MRA),
desenvolvida por Mallat [6] [7] e a Wavelet de Haar [8]
[9], devido sua simplicidade para implementação, baixo
custo computacional, e ser amplamente usada em
processamento de imagens digitais [10].
Foram utilizados dois níveis de decomposição,
mas somente os coeficientes horizontais do segundo nível
[11] foram capazes de detectar a presença de resíduos.
Os resíduos presentes nestas bolsas não
apresentam tamanho inferior a 10 e superior a 60 pixels,
pois, são oriundos de pequenos fios de cabelo humano,
partículas de poeira ou outros materiais. Entretanto, as
bordas das bolsas quando processadas via Transformada
Wavelet destacam-se da mesma maneira que os resíduos
procurados. A diferença está no tamanho do agrupamento
de pixels formantes das bordas.
Portanto, verificando-se na imagem de
coeficientes horizontais do segundo nível de
decomposição a conectividade de todos os pixels, usando
a vizinhança de quatro na vertical e na horizontal (N4(p))
[2] [3] e em seguida identificando-se quais os objetos
(grupos de pixels conectados) na imagem possuem mais
de 350 pixels conectados, é possível descartar “blobs”
maiores considerando-os como bordas e não resíduos.
Foi usado um limiar para gerar os pixels de
interesse, e dessa forma isolar os pontos de mais alta
freqüência. Este limiar foi determinado em testes
empíricos, com auxílio da base de imagens, observandose as características dos resíduos. O valor do limiar foi
estabelecido em 204.
Por fim, para cada agrupamento encontrado na
imagem, foi verificada a quantidade de pixels que
possuíam e considerado resíduos somente aqueles entre
10 e 60 pixels conectados, gerando-se uma imagem
binária com apenas os pixels que representam resíduos,
como na Figura 4.
Para a avaliação dos resultados obtidos foi
realizada uma inspeção visual manual em cada bolsa para
coleta de sangue utilizada na montagem do primeiro
banco de imagens. Esta inspeção visual manual foi
realizada por três inspetoras de uma linha de produção.
Cada inspetora tem características e experiência
diferentes, como acontece no trabalho de qualquer
empresa. A Inspetora 1 tem 3 meses de experiência nesta
função, a Inspetora 2, um ano de experiência nesta função
e a Inspetora 3, um ano e dois meses de experiência nesta
função. Nenhuma das inspetoras usam lentes corretivas.
ANÁLISE ESTATÍSTICA
Na comparação dos resultados foi utilizada a
análise estatística do Teste t Student [12] para amostras
pareadas, com o intervalo de confiança de 95%, sendo
consideradas diferenças estatisticamente não significantes
quando o valor de p < 0,05, ou seja, com baixo nível de
incerteza.
O coeficiente de correlação de Pearson [12] foi
utilizado para análise comparativa entre os resultados das
inspeções realizadas e a classificação do laboratório de
controle de qualidade. Esta correlação varia de -1 a 1,
onde -1 indica correlação inversa e 1, a correlação
perfeita.
INSPEÇÃO VISUAL MANUAL
Figura 4 – Exemplo de Processamento das Imagens
pela abordagem proposta
Todas as inspetoras foram treinadas para exercer
esta função e os treinamentos são realizados
periodicamente de três em três meses.
As três inspetoras analisaram todas as quarenta e
oito bolsas, tal como em suas atribuições diárias, ou seja,
com a rotina de trabalho habitual.
Para se obter um resultado único do sistema de
inspeção visual manual foi gerada a média das três
inspeções realizadas.
As bolsas usadas na captura das imagens foram
classificadas e a quantidade de resíduos anotada. Os
resultados obtidos pelas inspetoras, bem como média do
processo de inspeção visual manual e o tempo de
execução desta tarefa, foram comparados ao resultado do
Laboratório de Controle de Qualidade e são apresentados
na Tabela 1.
Como era de se esperar, as inspetoras obtiveram
resultados diferentes na inspeção de uma mesma bolsa de
sangue. Por exemplo, o resultado obtido pelas inspetoras
na bolsa_46 são divergentes; a Inspetora 1 encontrou 4
resíduos e as outras duas não encontraram resíduo algum.
O tempo médio para processar uma imagem e
verificar a existência de resíduos foi de 1,4 segundos. Nas
oito imagens, que uma bolsa pode gerar, o tempo médio
de inspeção foi de 11,2 segundos e o tempo total para
análise das 48 bolsas para coleta de sangue, foi de
aproximadamente 10 minutos, ou seja, tempo este inferior
à média dos tempos das inspetoras humanas.
Tabela 1 - Resultados da inspeção visual manual
Inspetora
% Acerto
Tempo
(Min.)
Coeficiente de
Correlação
1
2
3
Média
68,75
77,08
62,5
70,8
10
15
15
12
0,7016
0,2436
0,3343
0,6690
Figura 5 - Digrama de blocos do algoritmo
desenvolvido.
Este fato comprova a interferência do fator
humano nos resultados de classificação.
INSPEÇÃO VISUAL AUTOMÁTICA APLICADA ÀS
BOLSAS RETIRADAS DA LINHA DE PRODUÇÃO
RESULTADOS
AUTOMÁTICA
Para se avaliar o desempenho do sistema de
Inspeção Visual Automático desenvolvido neste trabalho,
o algoritmo desenvolvido foi aplicado nas 800 imagens do
segundo banco de imagens retirado diretamente da linha
de produção.
DA
INSPEÇÃO
VISUAL
Para analisar as imagens do banco de imagens foi
desenvolvido um algoritmo na plataforma Matlab versão
7.0 da MathWorks, Inc. Este algoritmo foi aplicado em
todas as 504 imagens do primeiro banco de imagens. A
Figura 5 mostra um diagrama de blocos do algoritmo
desenvolvido.
A metodologia proposta neste trabalho
identificou corretamente, ou seja, considerando-se o
número total de resíduos em cada uma, a existência de
resíduos em 46 das 48 bolsas analisadas, ou seja, com
96% de precisão, e o coeficiente de correlação de 0,9753.
A Figura 6 traz o gráfico com os resultados da
classificação realizada pelo laboratório e da inspeção
realizada.
Apenas duas bolsas, a bolsa_6 e a bolsa_13, não
foram corretamente analisadas. Estas bolsas têm como
características, resíduos nas bordas da imagem, como
apresentado na Figura 7.
O algoritmo não conseguiu identificar resíduos
nessas imagens, porque o resíduo estava na borda da
bolsa, e como a borda foi removida, também foi removida
a informação com o resíduo.
Figura 6 - Comparação dos resultados da inspeção
visual automática e a classificação do laboratório de
controle de qualidade.
coeficiente de correlação de 0,9526. Estes resultados
estão demonstrados na Figura 8, onde 1 indica resíduo e 0
a ausência de resíduo.
Da mesma maneira o método não obteve êxito
em duas bolsas, a bolsa_7 e a bolsa_12, porque os
resíduos nestas bolsas estão localizados na borda da
imagem, como na Figura 9.
Figura 7 - (a) Imagem do resíduo da bolsa_6; (b)
Imagem do resíduo da bolsa_13.
Nesta inspeção somente foi avaliado se existem
ou não resíduo na bolsa para coleta de sangue, sem
especificar a quantidade de resíduos encontrada.
Figura 9 - (a) Imagem do resíduo da bolsa 7; (b)
Imagem do resíduo da bolsa 12.
CONCLUSÃO
Figura 8 - Comparação resultados Inspeção Visual
Automática das bolsas retiradas da linha de produção.
Os resultados mostram que a
desenvolvida neste trabalho conseguiu
corretamente resíduos em noventa e oito das
analisadas, ou seja, com precisão de 98%,
abordagem
identificar
cem bolsas
e obteve o
Os resultados obtidos com as inspeções
realizadas pelas inspetoras da linha de produção indicam
que existem divergências na inspeção de uma mesma
bolsa.
As análises realizadas neste trabalho mostram
que o percentual de acerto obtido é pequeno quando a
inspeção é realizada de maneira manual, mesmo que por
inspetores treinados. Este fato expõe a fragilidade do
processo e indica claramente a necessidade de
automatização da Inspeção Visual.
Portanto a automatização desta tarefa pode obter
resultados mais uniformes com padrões mais bem
definidos.
A metodologia de inspeção visual automática
baseada em Wavelets alcançou resultados mais precisos
com o percentual de acerto de 96% das bolsas analisadas
no primeiro banco, com o coeficiente de correlação de
0,9753 e de 98% das bolsas analisadas na linha de
produção, com o coeficiente de correlação de 0,9526.
O tempo que o sistema de Inspeção Visual
Automático levou para processar e classificar as imagens
das 48 bolsas do primeiro banco foi de aproximadamente
10 minutos, sendo que a média do tempo da inspeção
manual foi de 12 minutos para as mesmas bolsas. Ou seja,
o tempo de processamento do sistema automático, mesmo
nesta versão implementada em Matlab, foi menor,
demonstrando a viabilidade de desenvolvido em código
compilado e instalado diretamente em uma linha de
produção.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
[1] VERCEZE, A V. PEREIRA, N L., BUZZO, E. J.,
Estudo físico-químico de diferentes filmes de bolsa de
sangue visando a segurança frente ao processo
hemoterapêutico. Revista Brasileira de Hematologia e
Hemoterapia 2006, Rio de Janeiro, 2006, pág 139-143.
[2] ADORNI, C.A.; GONZAGA, A.; Da SILVA, I.N.
Detecção de Resíduos em Imagens de Bolsas para Coleta
de Sangue Utilizando um Sistema Fuzzy nos canais RGB,
X Congresso Brasileiro de Informática em Saúde CIBIS –
2006, Sociedade Brasileira de Informática em Saúde,
Joinvile, Anais p. 178-179, 2006.
[3] Marques Filho, O., Vieira neto, H.“Processamento
Digital de Imagens”, Brasport, 1999.
[4] Rafael C. Gonzalez and Paul Wintz. “Digital Image
Processing”, Addison-Wesley Pub. Co., 1987.
[5] Batchelor, B.G., Hill, .A. Hodgson, D.G. “Automated
Visual Inspection”, IFS Publi Carton Ltd, North-Holland
Pub. Co., 1985.
[6] MALLAT, S., Theory for Multiresolution Signal
Decomposition: The Representation. IEE Transaction on
Pattern Analysis and Machine Intelligence, v 11, p.674693, 1989.
[7] CASTELANO, C. R., Estudo Comparativo da
Transformada Wavelet no Reconhecimento de padrões da
Íris Humanas, Dissertação de Mestrado – Escola de
Engenharia de São Carlos - Universidade de São Paulo
2006.
[8] HAAR A., Zur Theorie der orthogonalen
Funktionensysteme, Mathematische Annalen, pp 331371, 1910.
[9] ALMEIDA, O. C. P.,Técnicas de Processamento de
Imagens para Localização e Reconhecimento de Faces,
Dissertação de Mestrado – Instituto de Ciências
Matemáticas e da Computação (ICMC-USP) –
Universidade de São Paulo, 2006.
[10] LIMA, P. C., Wavelets: Teoria, Algoritmos e
Aplicações. Departamento de matemática, UFMG, 2004.
[11] PARRAGA, A., Aplicação da Transformada Wavelet
Pocket na Análise e Classificação de vozes Patológicas,
Dissertação de Mestrado (Mestrado em Engenharia
Elétrica) - Universidade Federal do Rio Grande do Sul,
2002.
[12] MARTINS A. G., Estatística Geral Aplicada, São
Paulo: Atlas.2005.
Download