Percepções do paciente cardiopata quanto à orientação e adesão

Propaganda
A
Artigo Original
Percepções do paciente cardiopata quanto à orientação e adesão ao tratamento dietoterápico.
Percepções do paciente cardiopata quanto à
orientação e adesão ao tratamento dietoterápico.
Cardiac patient’s perceptions about nutrition recommendations and adherence to dietary
treatment
Anelise Bozzetto da Silva1
Sissi Silveira Vargas1
Denise Ruttke Dillenburg2
Sandra Mari Barbiero3
RESUMO
Introdução: A mudança ou a melhora do comportamento alimentar atinge altos índices de não
adesão, pela complexidade desse componente no estilo de vida e pelas características da prescrição
dietoterápica. Objetivo: Descrever a associação entre a percepção de pacientes portadores de doença
arterial coronariana (DAC) sobre a orientação nutricional fornecida por médicos ou nutricionistas e a
adesão ao tratamento dietoterápico. Método: Estudo transversal em indivíduos adultos com DAC. Foi
aplicado questionário com questões sobre a percepção do paciente quanto à orientação nutricional
recebida de nutricionistas ou médicos e da percepção quanto à adesão ao tratamento dietoterápico. A
classificação sobre as percepções foi definida a partir do somatório de 10 fatores importantes para uma
adequada orientação nutricional e 12 fatores para adequada adesão. Considerou-se ótima percepção
o paciente que atingiu oito ou mais fatores; boa percepção de cinco a sete, e má percepção quatro ou
inferior. Resultados: A média do número de fatores abordados no momento da orientação nutricional
no ambulatório médico foi 4,04±2,24, enquanto no de nutrição foi 5,35±1,37 (p< 0,002). Quanto
à adesão, segundo a percepção dos pacientes, a média de fatores para mudança do comportamento
alimentar foi 5,83±2,43 no ambulatório médico, enquanto no de nutrição foi de 8,18±2,23(p=0,000).
Conclusão: Em ambos os ambulatórios, os pacientes tiveram boa orientação nutricional e boa adesão
ao tratamento dietoterápico. Os pacientes do ambulatório de nutrição referiram que mais fatores
foram abordados no momento da orientação nutricional e que mais modificações comportamentais
ocorreram quando comparadas ao ambulatório médico.
Unitermos:
Doenças cardiovasculares/dietoterapia. Terapia
nutricional. Cooperação do paciente. Aceitação pelo
paciente de cuidados de saúde.
ABSTRACT
Introduction: The change or improvement of alimentary behavior reaches high non-adherence
rates due to the complexity of this life-style component and due to the characteristics of the dietary
prescription. Objective: To describe the association between the perception of patients suffering
from coronary heart disease (CHD) about the nutrition recommendations provided by physicians or
nutritionists and the adherence to the dietary treatment. Methods: Cross-sectional study in adult
individuals with CHD. A questionnaire was applied with questions about the perception of the patient
regarding the nutrition recommendations given by nutritionists or physicians and their adherence
perception to the dietary treatment. The perception classification defined as suitable nutritional
recommendations a total of 10 factors and as suitable adherence a total of 12 factors. An excellent
perception was considered to consist of the patient reaching eight or more factors; good perception
from five to seven, and bad perception, four or less. Results: The mean number of factors addressed
at the time of nutritional recommendations at the medical office was 4.04±2.24, while at the
nutritionist’s office was 5.35±1.37 (p< 0.002). As for adherence, according to patient perception,
the mean number of factors for an eating behavior change was 5.83±2.43 in the medical office,
while in the nutritionist’s office was 8.18±2.23 (p=0.000).Conclusion: In both offices, patients
had good nutritional recommendations and good adherence to the dietary treatment. Patients in
the nutritionist’s office reported that more factors were addressed at the time of nutritional recommendations and that more behavioral changes occurred when compared with the medical office.
Key words:
Cardiovascular diseases /diet therapy. Nutrition
therapy. Patient compliance. Patient acceptance of
health care.
Endereço para correspondência:
Anelise Bozzetto da Silva
Rua Felicíssimo de Azevedo 627/401 – Higienópolis
– Porto Alegre, RS, Brasil – CEP: 90540110
E-mail: [email protected]
Submissão
30 de agosto de 2011
Aceito para publicação
21 de dezembro de 2011
1.
2.
3.
Nutricionista, Pós-Graduada em Nutrição Clínica com ênfase em Doenças Cardiovasculares, obesidade e diabetes do Instituto de Cardiologia/RS,
Porto Alegre, RS, Brasil.
Nutricionista, Coordenadora do Serviço de Nutrição e Dietética do ICFUC, Mestranda em Ciências da Saúde: Cardiologia, Preceptora da Residência
Multiprofissional de Nutrição em Cardiologia do Instituto de Cardiologia/RS, Porto Alegre, RS, Brasil.
Nutricionista, Especialista em Nutrição Clínica, Mestre em Ciências da Saúde: Cardiologia, coordenadora da Residência Multiprofissional de Nutrição
em Cardiologia, Professora do Pós-Graduação em Nutrição Clínica com ênfase em Doenças Cardiovasculares, obesidade e diabetes do Instituto de
Cardiologia/RS, Porto Alegre, RS, Brasil.
Rev Bras Nutr Clin 2012; 27 (2): 93-9
93
Silva AB et al.
INTRODUÇÃO
Dessa forma, o objetivo do presente artigo é descrever
a associação entre a percepção de pacientes portadores de
DAC sobre a orientação nutricional fornecida por médicos ou
nutricionistas e a adesão ao tratamento dietoterápico, como
também a comparação das percepções dos pacientes entre
ambos os profissionais.
Pacientes com doenças cardiovasculares, entre as quais
a doença arterial coronariana (DAC), como infarto agudo
do miocárdio e angina, são influenciados por um conjunto
de fatores de risco, como obesidade, diabetes, hipertensão e
dislipidemias, alguns modificáveis mediante alterações no estilo
de vida e com dieta adequada1. A mudança ou a melhora do
comportamento alimentar atinge altos índices de não adesão,
pela complexidade desse componente no estilo de vida2-5.
MÉTODO
Foi realizado um estudo transversal com indivíduos adultos
portadores de DAC que estavam em acompanhamento no
Ambulatório de Nutrição e no Ambulatório de Medicina em
uma instituição especializada em cardiologia.
Estudos demonstram que 75% dos pacientes que recebem
recomendações médicas relacionadas às mudanças no estilo
de vida, como as restrições alimentares, não as seguem6
e 95% dos obesos que iniciam uma dieta para perda de
peso fracassam na manutenção de um corpo mais magro7.
Segundo estudo exploratório-descritivo com 50 pacientes
hipertensos, os entrevistados aderiam parcialmente ao tratamento básico higieno-dietético, pois não incorporavam as
condutas integralmente8.
Foram excluídos do estudo aqueles que apresentavam
alguma doença em que sua dieta poderia intervir no tratamento, como pneumopatias, doenças renais, hepáticas,
neoplasias, entre outras; pacientes que nunca haviam sido
orientados sobre alimentação e os que estavam em primeira
consulta. Esses pacientes foram separados de acordo com
o ambulatório em que faziam acompanhamento: Nutrição
ou Médico.
Não existe ainda uma medida padrão para se estabelecer
a adesão. Entretanto, pode-se utilizar o questionamento
direto ao paciente e avaliação subjetiva do comportamento
individual9,10. Cabe ressaltar que, como é uma avaliação
subjetiva, existe uma lacuna entre o que os pacientes
acreditam que podem fazer e o que realmente fazem11. Os
aspectos que influenciam a adesão de um paciente a uma
prescrição dietética e sua motivação para adotar um padrão
desejável de comportamento alimentar devem ser analisados
como um conjunto de características relacionadas ao profissional, paciente, qualidade da relação profissional-paciente,
prescrição, aspectos organizacionais, pessoais, ambientais e
físicos do serviço ou clínica e ambiente externo ao serviço12.
Os dados foram coletados no período de fevereiro a
abril de 2009, quando foi aplicado um questionário com
perguntas abertas e fechadas no momento da consulta, após
a assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.
O questionário aplicado foi dividido em três partes. A
primeira continha dados de identificação, a segunda, dados
sobre a percepção do paciente quanto à orientação nutricional recebida do profissional, e a terceira, dados sobre a
adesão ao tratamento dietoterápico. Quanto à percepção
sobre a orientação nutricional recebida, definiram-se como
relevantes aqueles relacionados aos fatores culturais, regionais e econômicos do paciente; quantidade, qualidade,
substituição e aquisição dos alimentos; forma de preparo,
dificuldade de compreensão e necessidade de cozinhar para
mais de uma pessoa. Quanto aos critérios de adesão, os
pacientes foram questionados sobre a mudança dos hábitos
alimentares após as orientações recebidas, isto é, aumento
do consumo de água, frutas e verduras, diminuição da
quantidade alimentar, de produtos industrializados, doces e
sal, melhora da qualidade alimentar; prática de exercícios
físicos e fracionamento das refeições.
As características da prescrição têm sido citadas como um
dos fatores mais importantes na adesão13. Uma adequada
orientação nutricional deve contemplar questões culturais,
regionais, sociais e econômicas, orientações relacionadas
a seleção, quantidade, técnicas de preparo e substituições
dos alimentos1. Todos esses aspectos devem ser envolvidos
e analisados no momento da orientação nutricional, para
promover a adesão à dieta, ou seja, após compreensão
do seu plano alimentar no ambulatório, o paciente tenha
condições dentre todos os fatores citados acima de seguir
em casa as orientações estabelecidas14. A adesão pode ser
definida como extensão do comportamento individual (seguimento de orientações dietéticas, mudanças de estilo de vida),
correspondendo e concordando com as recomendações de
um profissional da saúde9,15-17.
A classificação sobre a percepção da orientação nutricional foi definida como ótima, boa e má percepção, a
partir da somatória dos fatores. Uma ótima percepção
foi considerada para o paciente que atingiu oito ou mais
fatores; boa percepção, de cinco a sete, e má percepção,
quatro ou inferior. Para a adesão ser considerada ótima, o
paciente devia ter modificado oito ou mais fatores no seu
comportamento alimentar; boa adesão, de cinco a sete, e
má adesão, quatro ou menos.
Visto isso é importante a implementação de ações educativas por profissionais que detenham conhecimentos técnicos
de epidemiologia, nutrição, dietética e, ainda, o domínio de
métodos adequados para abordar os problemas alimentares
e orientar a mudança de hábitos1.
Rev Bras Nutr Clin 2012; 27 (2): 93-9
94
Percepções do paciente cardiopata quanto à orientação e adesão ao tratamento dietoterápico.
As informações obtidas foram armazenadas em um banco
de dados elaborado especialmente para esse fim em microcomputador, por meio do programa SPSS 17,0 (Statistical
Package for Social Science). Para apresentação das variáveis
contínuas, foram utilizados média e desvio padrão, e para as
variáveis categóricas, frequências absolutas (n) e relativas (%).
Para avaliar a associação entre as variáveis qualitativas foi
utilizado o Teste Qui-quadrado. Em todas as comparações,
foi considerado um alfa crítico de 0,05.
ambulatórios. Quanto ao restante dos pacientes (25,59%),
estes responderam não apresentar resultado na dieta por não
manifestarem necessidade de seguirem-na completamente ou
parcialmente conforme orientados. Desses, 27,27% referiram
precisar de mais orientações.
Nas Tabelas 5 e 6, pode-se observar os resultados
segundo classificação definida para percepção da orientação
e adesão segundo a orientação do ambulatório médico e
do ambulatório de nutrição.
Não houve associação entre escolaridade, IMC, exercício
físico, orientação nutricional e adesão.
RESULTADOS
Foram avaliados 86 pacientes entre 22 e 87 anos, dos
quais 49 (57%) pertenciam ao ambulatório médico e 37 (43%)
ao ambulatório de nutrição. A média do tempo de acompanhamento no ambulatório médico foi de 7,84±6,66 anos e,
no de nutrição, 4,594±4,01 anos, com diferença significativa
(p=0,007). O número de consultas ao ano foi de 2,04±1,02
vezes, em ambos os ambulatórios. A média de idade foi de
61,73±11,94 anos, sem diferença estatística entre os ambulatórios, e a média de IMC foi 29,80±6,39 kg/m2. Na Tabela 1,
pode-se observar a predominância e características da amostra.
Na Tabela 7, verifica-se grau de possibilidade de realização da dieta fornecida, sobre a manutenção dos novos
hábitos alimentares e fatores que pudessem interferir na
adesão à dieta, como possíveis fatores limitantes na adesão.
A média do número de fatores que foram considerados
como sendo abordados no momento da orientação nutricional, no ambulatório médico, foi 4,04±2,24, enquanto, no
de nutrição, foi 5,35±1,37 (p< 0,002). Quanto à adesão,
segundo a percepção dos pacientes, a média de fatores
para mudança do comportamento alimentar foi 5,83±2,43
no ambulatório médico, enquanto, no de nutrição, foi de
8,18±2,23 (p=0,000).
Dos 86 pacientes, 74 (86%) achavam sua alimentação
saudável, pois consumiam frutas e verduras e não consumiam
carnes gordurosas e sal, além de seguirem as orientações
alimentares indicadas pelo médico e pelo nutricionista.
A maioria, 82 pacientes (95,3%), considerava importante
a orientação sobre a alimentação.
Tabela 1 – Características sociodemográficas e clínicas dos pacientes.
Características
Na Tabela 2, observa-se a opinião dos pacientes sobre o
ato de comer e o objetivo da dieta que realizavam.
n=86
(%)
46
53,5
54
62,8
1° grau incompleto
35
40,7
1° grau completo
14
16,3
2° grau completo
14
16,3
Nunca frequentou
10
11,6
50
58,1
Sexo
Masculino
Na Tabela 3, os resultados foram separados de acordo com
os ambulatórios estudados, para melhor análise das variáveis.
Ocupação
Aposentado
A maioria dos pacientes (95,3%) referiu estar satisfeita com
a orientação nutricional recebida. Da amostra, 48 (55,8%)
pacientes preferiram ser orientados sempre pelo mesmo
profissional. Dos que preferem ser orientados sempre pelo
mesmo profissional, 85% justificaram pelo fato do profissional
já conhecer o caso e ter maior acompanhamento. Dos 50
pacientes que acharam a dieta orientada muito diferente da
habitual, 21 (42%) justificaram pela substituição por alimentos
mais saudáveis.
Escolaridade
Estado civil
Casado
Renda
2 a 5 SM*
Na Tabela 4, estão apresentadas as mudanças comportamentais consideradas relevantes para uma adequada adesão
ao tratamento.
49
57
44
51,2
40
46,5
Diabetes
36
41,9
Hipertensão Arterial
65
75,6
Dislipidemias
52
60,5
Tabagismo
6
7,0
Pratica exercício físico
DAC
Infarto Agudo do Miocárdio
As quatro mudanças alimentares que predominaram, em
ambos os ambulatórios, foram maior percentual no consumo
de verduras e frutas, melhora na qualidade alimentar e diminuição do consumo de sal.
Doenças associadas
Do total de pacientes, 64 (74,41%) referiam estar tendo
resultado na dieta proposta, dos quais 72,3% eram do
ambulatório médico, sem diferença significativa entre os dois
*SM= salário mínimo
Rev Bras Nutr Clin 2012; 27 (2): 93-9
95
Silva AB et al.
Tabela 2 – Percepção do ato de comer x objetivo da dieta.
Total n=86
Você acha que comer é...
Uma necessidade
Um prazer
Uma obrigação
Orientado a fazer que tipo de dieta?
Para perder peso
Para ganhar peso
Para manter o peso
Para ter uma alimentação saudável
Para melhorar a saúde
Para evitar complicações
n
59
20
3
%
68,6
23,3
3,5
44
1
9
35
37
25
51,2
1,2
10,5
40,7
43
29,1
Tabela 3 – Percepção dos pacientes quanto aos fatores abordados no momento da orientação nutricional.
Ambulatório
Médico
Nutrição
Total
n
%
n
%
n
%
Cultura
24
50
33
89,2
57
67,1
Fatores regionais
17
34,7
9
25
26
30,6
Sua renda familiar
13
26,5
7
18,9
20
23,3
Fato de precisar cozinhar para mais de 1 pessoa
8
16,3
7
18,9
15
17,4
Quantidade
33
67,3
37
100
70
81,4
Qualidade
45
91,8
33
89,2
78
90,7
Como preparar os alimentos
14
28,6
29
78,4
43
50
Onde adquirir (local, preço)
3
6,1
4
10,8
7
8,1
Substituições alimentares
36
73,5
36
97,3
72
83,7
Dificuldade de compreensão
5
10,2
3
8,1
8
9,3
p
<0,001
0,471
0,569
0,979
<0,001
0,965
<0,001
0,697
0,008
1,000
*Associações feitas através do teste Qui-Quadrado
Tabela 4 – Percepção dos pacientes quanto às modificações no seu comportamento alimentar após orientação nutricional.
Médico
Nutrição
Total
n
%
n
%
n
%
Consome mais água
14
28,6
23
62,2
37
43
Mais verduras
30
61,2
33
89,2
63
73,3
Mais fruta
29
59,2
33
89,2
62
72,1
Menos produtos industrializados
14
28,6
29
78,4
43
50
Exercita-se
17
34,7
11
29,7
28
32,6
Fracionamento das refeições
7
14,3
21
56,8
28
32,6
Menos doce
23
46,9
25
67,6
48
55,8
Diminuiu a quantidade alimentar
23
46,9
26
70,3
49
57
Melhorou a qualidade alimentar
38
77,6
29
78,4
67
77,9
Menos sal
36
73,5
30
81,1
66
76,7
Sempre orientado pelo mesmo profissional
10
20,4
15
40,5
25
29,1
Dieta diferente da habitual
27
55,1
23
62,2
50
58,1
Tabela 5 – Associação entre a orientação nutricional e adesão ao tratamento dietoterápico no ambulatório médico segundo classificação.
Má
Boa
0,004
0,008
0,005
< 0,001
0,799
<0,001
0,091
0,052
1,000
0,569
0,546
0,663
Tabela 6 – Associação entre a orientação nutricional e adesão ao tratamento dietoterápico no ambulatório de nutrição segundo classificação.
Adesão
Orientação Nutricional
p
Adesão
Ótima
Orientação Nutricional
Má
Boa
Ótima
Má
12 (40%)
12 (40%)
6 (20%)
Má
0 (0%)
5 (45,5%)
6 (54,5%)
Boa
4 (28,6%)
8 (57,1%)
2 (14,3%)
Boa
2 (9,1%)
6 (27,3%)
14 (63,6%)
Ótima
0 (0%)
1 (20%)
4 (80%)
Ótima
0 (0%)
1 (25%)
3 (75%)
Total
16 (32,7%)
21(42,9%)
12 (24,5%)
Total
2 (5,4%)
12 (32,4%)
23 (62,2%)
Rev Bras Nutr Clin 2012; 27 (2): 93-9
96
Percepções do paciente cardiopata quanto à orientação e adesão ao tratamento dietoterápico.
Tabela 7 – Percepção dos pacientes quanto à dieta fornecida, sobre a manutenção dos novos hábitos alimentares e fatores limitantes que
interferem na adesão à dieta.
Médico n=47
Nutrição n=36
Total n=83
A dieta fornecida
n
%
n
%
n
%
Possível de ser realizada
26
55,3
28
77,8
54
65,1
Fácil durante a semana e difícil nos finais de semana
15
31,9
6
16,7
21
25,3
Difícil de ser realizada
6
12,8
2
5,6
8
9,6
Manutenção dos novos hábitos
Médico n=47
Nutrição n=37
Total n=84
Sendo realizada com facilidade
20
42,6
23
62,2
43
51,2
Possível com pequenas dificuldades
17
36,2
11
29,7
28
33,3
De difícil adaptação à rotina
9
19,1
2
5,4
11
13,1
Difícil, pois perco o controle facilmente
1
2,1
0
0
1
1,2
Dificil quando tenho problemas em casa ou no trabalho
0
0
1
2,7
1
1,2
Fatores Limitantes
Médico n=58
Nutrição n=27
Total n=85
Mudança do hábito alimentar
16
32,7
5
13,5
21
24,4
Trabalhar fora de casa
4
8,2
2
5,4
6
7
Ansiedade e Nervosismo
20
40,8
13
35,1
33
38,4
Desconforto físico
3
6,1
2
5,4
5
5,8
Não compreensão das orientações
0
0
0
0
0
0
Hiperfagia
0
0
1
2,7
1
1,2
Dificuldade Econômica
10
20,4
4
10,8
14
16,3
Falta de vontade para emagrecer
5
10,2
0
0
5
5,8
* alguns pacientes não responderam, porque não quiseram ou não sabiam responder.
DISCUSSÃO
imprescindíveis para qualquer tipo de dieta. Já os outros
fatores são mais específicos de cada dieta e das características de cada indivíduo e, necessitam de profissionais
que tenham conhecimento técnico e domínio de métodos
adequados para considerá-los no momento da orientação
nutricional. Houve diferença significativa na abordagem
dos fatores culturais, quantidade, substituições alimentares
e modo do preparo dos alimentos quando orientado por
nutricionista comparado ao médico, provavelmente devido
ao fato do nutricionista apresentar conhecimento técnico
para abordar esses fatores.
De acordo com Ferreira & Fernandes , a baixa adesão
é frequentemente observada em situações que requerem
tratamentos longos, complexos, de natureza preventiva e
quando alterações no estilo de vida do paciente precisam
ser realizadas, como ocorre no caso de doenças crônicas.
Diante disso, a demanda por orientação nutricional tem
crescido significativamente, face ao diagnóstico precoce
das doenças crônicas e ao reconhecimento da influência
da alimentação sobre elas, como também nos fatores de
risco associados, como sobrepeso, que foi predominante
na amostra desse estudo, obesidade, hipertensão, diabetes
mellitus, dislipidemias, também presentes na amostra19,20.
18
Segundo Boog1, a dificuldade que os profissionais
médicos e enfermeiros encontram para lidar com as questões
de alimentação decorrem da complexidade do problema em
si. Um dos fatores é a especificidade técnica, que diz respeito
ao preparo que o profissional deve ter para lidar com o
problema alimentar, o que envolve conhecimentos de antropologia e sociologia, para analisar não só o hábito alimentar
em si, mas também compreender o universo alimentar do
paciente, de psicologia e pedagogia para propor métodos
de intervenção e obviamente de Nutrição, Dietética, Técnica
Dietética e Dietoterapia. Segundo Boog1, nada impede que
outros profissionais também orientem sobre alimentação e
nutrição, desde que haja preparo adequado dos profissionais
de saúde em relação ao assunto para abordar os problemas
alimentares e orientar a mudança de hábitos. Os fatores mais
abordados, como a qualidade do alimento, substituições
alimentares e, principalmente, a quantidade, também estão
relacionados ao fato da maioria dos pacientes fazer dieta
para perder peso, devido o estado nutricional predominante
ser sobrepeso, e apresentarem fatores de risco associados.
O ambulatório médico apresentou maior tempo de acompanhamento em relação ao de nutrição. Segundo Pinkus21,
nota-se valorização do atendimento médico após o descobrimento da doença. É importante ressaltar que maior tempo de
consulta está associado a melhor qualidade do atendimento:
como melhor anamnese, melhor explicação do problema e
dos procedimentos diagnósticos e terapêuticos, assim como
verificação do médico sobre a compreensão e a participação
do paciente na consulta22.
Nesse estudo, a média do número de consultas (2,04/ano)
foi inferior aos dados da Pesquisa Nacional por Amostra de
Domicílio (PNAD) 2003, em que a média per capita no Brasil foi
de 4,0 consultas ao ano, em indivíduos maiores de 64 anos23.
Os fatores mais abordados no momento da orientação
nutricional, em ambos os ambulatórios, foram: qualidade,
quantidade alimentar e substituições alimentares, possivelmente devido a esses três fatores serem orientações
Rev Bras Nutr Clin 2012; 27 (2): 93-9
97
Silva AB et al.
Houve diferença significativa entre os ambulatórios nas
mudanças alimentares, demonstrando que os pacientes
que foram orientados pelo nutricionista consumiram
mais verduras, frutas, menos produtos industrializados e
fracionaram as refeições. Segundo estudo com pacientes
hipertensos, 17% referiram mudanças nos hábitos alimentares, como evitar sal e embutidos (42%), gordura (37%)
e álcool (21%)11.
instruídos sobre a doença e o tratamento necessário para seu
controle. Entretanto, a literatura tem indicado que apenas o
conheci­mento das instruções envolvidas no tratamento não
garante a adesão do paciente27,28.
CONCLUSÃO
Por meio deste estudo verificou-se que, quanto melhor a
orientação nutricional fornecida, melhor a adesão ao tratamento dietoterápico.
Segundo as percepções dos pacientes, a dieta fornecida era
possível de ser realizada e a manutenção dos novos hábitos
estava sendo realizada com facilidade. No estudo realizado por
Koehnlein et al.24, 64,44% dos pacientes responderam que o
plano alimentar também era possível de ser realizado.No estudo
de Match et al.25, os fatores limitantes para o sucesso da dieta
foram nervosismo, ansiedade, mudança do hábito alimentar
e dificuldade econômica. A ansiedade e os resultados lentos
foram apontados como maiores desmotivadores da reeducação
alimentar, também comprometendo a adesão do paciente ao
tratamento, uma vez que os pacientes ficam mais susceptíveis a
episódios de compulsão alimentar, como mecanismo compensatório em situações de depressão, tristeza, nervosismo e raiva. A
mudança drástica dos hábitos alimentares e o aspecto financeiro
também foram as maiores dificuldades encontradas por Chiment
et al.26. Além disso, pode-se perceber que os pacientes buscam
mudanças de comportamento alimentar por tempo determinado
e resultados rápidos.
No ambulatório de nutrição, foi abordado um número
maior de orientações para mudança alimentar e houve mais
modificações alimentares pelos pacientes quando comparado
ao ambulatório médico.
A falta de adesão ao tratamento nutricional é frequente,
porém, neste estudo, segundo a auto-avaliação dos
pacientes, foi considerada boa e ótima adesão.
Alguns pacientes referiram ter tido má orientação, porém
ótima adesão ao tratamento. Pode-se inferir que talvez esses
pacientes já tivessem algum conhecimento sobre reeducação alimentar devido a mídia, ou já estavam a muito
tempo fazendo o tratamento dietoterápico com o mesmo
profissional, ou até já tivessem outras experiências devido
diferentes tentativas com outros profissionais.
A mudança do comportamento alimentar é o foco principal dos profissionais da área da saúde, e também um
dos mais difíceis, uma vez que envolve todas as ações com
relação ao alimento, inclusive o contexto familiar e social,
exposição a um determinado alimento, preço, religião,
geografia, crenças, aspectos sensoriais, neurofisiológicos e,
ainda, aspectos emocionais e simbólicos12,29.
Ao serem questionados sobre como vêem o ato de comer,
a maioria considerou uma necessidade, demonstrando
que o comer está acima do prazer, ou seja, é visto como
uma necessidade fisiológica, indispensável à sobrevivência.
Interessante também a justificativa de estarem seguindo as
orientações alimentares, pois parece que o fato de estarem
fazendo acompanhamento já é necessário para terem uma
alimentação saudável, mas vale lembrar que, por ser uma
resposta subjetiva, existe uma lacuna entre o que os pacientes
acreditam que podem fazer e o que realmente fazem11. A
maioria dos pacientes mostrou consciência quanto à importância da alimentação para sua saúde, ao responderem
achar necessária a orientação nutricional.
É necessária a construção de estratégias conjuntas com o
paciente, a fim de que sejam alcançados melhores resultados
na adesão12,29. A adesão do cliente é possibilitada mediante a
conscientização deste, e por meio da educação em saúde desenvolvida de forma articulada pela equipe multiprofissional28,30.
A adesão do cliente ao tratamento integra o comparecimento às consultas, o uso regular do esquema terapêutico, a
adoção de estilo de vida saudável, sobretudo o compromisso
deste com a própria saúde, atuando como sujeito da ação,
e não como objeto. Enfim, a adesão do cliente é resultante
do seu engajamento efetivo nas atividades de autocuidado,
tornando-se agente de autocuidado e multiplicador desses
atividades na família e na comunidade8.
Foi demonstrado que, quanto melhor a percepção da orientação nutricional, melhor foi a percepção da adesão às modificações alimentares, em ambos os ambulatórios. Os pacientes
que foram orientados por nutricionistas tiveram maior número
de fatores abordados no momento da orientação em relação
àqueles atendidos pelo médico, como também no número
de fatores para modificações alimentares. Cabe destacar que
grande parte achou estar tendo resultado na dieta como também
a maioria referiu ter tido uma boa e ótima adesão.
Ainda restam questões a serem comprovadas sobre os reais
motivos da dificuldade de mudar o comportamento alimentar.
Estudos comparativos poderiam igualmente contribuir para uma
melhor compreensão dos fatores que interferem na adesão e sua
relação com a orientação nutricional. De igual forma, deve-se
estudar e implementar ações que favoreçam a aderência ao
tratamento nutricional em pacientes com sobrepeso.
Um dos recursos mais utilizados para promover a adesão
ao tratamento do diabetes tem sido o oferecimento de
progra­mas educacionais, nos quais os participantes são
Rev Bras Nutr Clin 2012; 27 (2): 93-9
98
Percepções do paciente cardiopata quanto à orientação e adesão ao tratamento dietoterápico.
15.Carvalho CV, Duarte DB, Merchán-Hamann E, Bicudo E,
Laguardia J. Determinantes da aderência à terapia anti-retroviral
combinada em Brasília, Distrito Federal, Brasil, 1999-2000. Cad
Saúde Pública. 2003;19(2):593-604.
16.Natal S. Revisão bibliográfica – tratamento da tuberculose: causas
da não-aderência. Bol Pneum Sanit. 1997;5(1):50-70.
17.Sackett DL, Haynes RB. Compliance with therapeutic regimens.
Baltimore:John Hopkins University Press;1976.
18.Ferreira EAP, Fernandes AL. Treino em auto-observação e
adesão à dieta em adulto com diabetes tipo 2. Psic Teor Pesq.
2009;25(4):629-36.
19.World Health Organization. Study group on diet, nutrition and
prevention of non-communicable diseases. Technical Report
Series, 797. Geneve:World Health Organization;1989. 102p.
20.Meisler JG, Jeor SS. Forward. Am J Clin Nutr. 1996;63(3
Suppl):409-11.
21.Pinkus L. Psicologia do doente. São Paulo:Edições Paulinas;1988.
146p.
22.Caprara A, Rodrigues J. A relação assimétrica médico-paciente:
repensando o vínculo terapêutico. Ciênc Saúde Coletiva.
2004;9(1):139-46.
23.Pesquisa nacional por amostra de domicílios do IBGE: PNAD
– Saúde; Painel de Indicadores do SUS. Brasília:Ministério da
Saúde;2003.
24.Koehnlein EA, Salado GA, Yamada NA. Adesão à reeducação
alimentar para a perda de peso: determinantes, resultados e a
percepção do paciente. Rev Bras Nutr Clin. 2008;23(1):56-65.
25.Match M, Gerer J, Ellgring H. Emotions in overweight and
normal-weight women, immediately alter Ealing foods differing
in energy. Phys Behav. 2003;80(2-3):367-74.
26.Chiment BM, Bruno MLM, Nakasato M, Isosaki M. Estudo sobre
adesão: fatores intervenientes na dieta hipocalórica de coronariopatas internados em um hospital público de São Paulo. Rev
Bras Nutr Clin. 2006;21(3):204-10.
27.American Association of Diabetes Educators - AADE. AADE
Guidelines for the practice of diabetes self-management education and training (DSME/T). Diabetes Educ. 2009;35:85S-107S.
28.Van der Wal MH, Jaarsma T, Moser DK, Veeger NJ, van
Gilst WH, van Veldhuisen DJ. Compliance in heart failure
patients: the importance of knowledge and beliefs. Eur Heart J.
2006;27(4):434-40.
29.Dunker KLL, Philippi ST. Hábitos e comportamentos alimentares
de adolescentes com sintomas de anorexia nervosa. Rev Nutr.
2003;16(1):51-60. 30.Ni H, Nauman D, Burgess D, Wise K, Crispell K, Hershberger
RE. Factors influencing knowledge of and adherence to selfcare among patients with heart failure. Arch Intern Med.
1999;159(14):1613-9.
31.Monteiro CA, Mondini L, Souza ALM, Popkin BM. Da desnutrição para a obesidade: a transição nutricional no Brasil. In:
Monteiro CA, ed. Velhos e novos males da saúde no Brasil:
a evolução do país e de suas doenças. 2ª ed. São Paulo:
Hucitec;1995. p.247-55.
Constata-se a necessidade de investir tanto na prevenção
quanto no controle desses fatores por meio da alimentação,
visto que a inadequação alimentar da dieta predispõe a essas
doenças. Por essa razão, Monteiro et al.31 recomendam que
se reserve “lugar de destaque a ações de educação em
alimentação e nutrição, que alcancem de modo eficaz todos
os estratos econômicos da população”.
REFERÊNCIAS
1.Boog MCF. Dificuldades encontradas por médicos e enfermeiros na abordagem de problemas alimentares. Rev Nutr.
1999;12(3):261-72.
2.Koehnlein EA, Salado GA, Yamada AN. Adesão à reeducação
alimentar para perda de peso: determinantes, resultados e a
percepção do paciente. Rev Bras Nutr Clin. 2008;23(1):56-65.
3.Bernardi F, Cicherelo C, Vitolo MR. Comportamento de restrição
alimentar e obesidade. Rev Nutr. 2005;15(1):85-93.
4.Fisberg RM, Slater B, Marchioni DMB, Martini LA. Inquéritos
alimentares: métodos e bases científicos. Barueri:Manole;2005.
p.53-70.
5.Chimenti BM, Bruno MLM, Nakasato M, Isosaki M. Estudo
sobre adesão: fatores intervenientes na dieta hipocalórica de
coronariopatas internados em um hospital público de São Paulo.
Rev Bras Nutr Clin. 2006;21(3):204-1.
6.DiMatteo MR. Enhancing patient adherence to medical recommendations. J Am Med Assoc. 1994;271(1):79-83.
7.World Health Organization. Obesity: preventing and managing
the global epidemic. WHO Obesity Technical Report Series 894.
Geneva:World Health Organization;2000. 253p.
8.Santos ZMSA, Frota MA, Cruz DM, Holanda SDO. Adesão do
cliente hipertenso ao tratamento: análise com abordagem interdisciplinar. Texto Contexto Enferm. 2005;14(3):332-40.
9.World Health Organization. Adherence to long term therapies.
evidence for action. Geneva:World Health Organization;2003.
209p.
10.Vitolins MZ, Rand CS, Rapp SR, Ribisl PM, Sevick MA. Measuring adherence to behavioral and medical interventions. Control
Clin Trials 2000 21(5 suppl.):188S-94S.
11.Peres DS, Magna JM, Viana LA. Portador de hipertensão arterial: atitudes, crenças, percepções, pensamentos e práticas. Rev
Saúde Pública. 2003;37(5):635-42.
12.Assis MAA, Nahas MV. Aspectos motivacionais em
programas de mudança de comportamento alimentar. R Nutr
PUCCAMP.1999;12(1):33-41.
13.Coyne T, Olson M, Bradham K, Garcon M, Gregory P, Scherch
L. Dietary satisfaction correlated with adherence in the Modification of Diet in Renal Disease Study. J Am Diet Assoc.
1995;95(11):1301-6.
14.Nahas MV. O pentágono do bem-estar. Boletim do NuPAF.
1996;2(7):1.
Local de realização do trabalho: Ambulatório de Nutrição e Ambulatório Geral de Medicina do Instituto de Cardiologia Rio
Grande do Sul - Fundação Universitária de Cardiologia, Porto Alegre, RS, Brasil.
Rev Bras Nutr Clin 2012; 27 (2): 93-9
99
Download