A Artigo Original Percepções do paciente cardiopata quanto à orientação e adesão ao tratamento dietoterápico. Percepções do paciente cardiopata quanto à orientação e adesão ao tratamento dietoterápico. Cardiac patient’s perceptions about nutrition recommendations and adherence to dietary treatment Anelise Bozzetto da Silva1 Sissi Silveira Vargas1 Denise Ruttke Dillenburg2 Sandra Mari Barbiero3 RESUMO Introdução: A mudança ou a melhora do comportamento alimentar atinge altos índices de não adesão, pela complexidade desse componente no estilo de vida e pelas características da prescrição dietoterápica. Objetivo: Descrever a associação entre a percepção de pacientes portadores de doença arterial coronariana (DAC) sobre a orientação nutricional fornecida por médicos ou nutricionistas e a adesão ao tratamento dietoterápico. Método: Estudo transversal em indivíduos adultos com DAC. Foi aplicado questionário com questões sobre a percepção do paciente quanto à orientação nutricional recebida de nutricionistas ou médicos e da percepção quanto à adesão ao tratamento dietoterápico. A classificação sobre as percepções foi definida a partir do somatório de 10 fatores importantes para uma adequada orientação nutricional e 12 fatores para adequada adesão. Considerou-se ótima percepção o paciente que atingiu oito ou mais fatores; boa percepção de cinco a sete, e má percepção quatro ou inferior. Resultados: A média do número de fatores abordados no momento da orientação nutricional no ambulatório médico foi 4,04±2,24, enquanto no de nutrição foi 5,35±1,37 (p< 0,002). Quanto à adesão, segundo a percepção dos pacientes, a média de fatores para mudança do comportamento alimentar foi 5,83±2,43 no ambulatório médico, enquanto no de nutrição foi de 8,18±2,23(p=0,000). Conclusão: Em ambos os ambulatórios, os pacientes tiveram boa orientação nutricional e boa adesão ao tratamento dietoterápico. Os pacientes do ambulatório de nutrição referiram que mais fatores foram abordados no momento da orientação nutricional e que mais modificações comportamentais ocorreram quando comparadas ao ambulatório médico. Unitermos: Doenças cardiovasculares/dietoterapia. Terapia nutricional. Cooperação do paciente. Aceitação pelo paciente de cuidados de saúde. ABSTRACT Introduction: The change or improvement of alimentary behavior reaches high non-adherence rates due to the complexity of this life-style component and due to the characteristics of the dietary prescription. Objective: To describe the association between the perception of patients suffering from coronary heart disease (CHD) about the nutrition recommendations provided by physicians or nutritionists and the adherence to the dietary treatment. Methods: Cross-sectional study in adult individuals with CHD. A questionnaire was applied with questions about the perception of the patient regarding the nutrition recommendations given by nutritionists or physicians and their adherence perception to the dietary treatment. The perception classification defined as suitable nutritional recommendations a total of 10 factors and as suitable adherence a total of 12 factors. An excellent perception was considered to consist of the patient reaching eight or more factors; good perception from five to seven, and bad perception, four or less. Results: The mean number of factors addressed at the time of nutritional recommendations at the medical office was 4.04±2.24, while at the nutritionist’s office was 5.35±1.37 (p< 0.002). As for adherence, according to patient perception, the mean number of factors for an eating behavior change was 5.83±2.43 in the medical office, while in the nutritionist’s office was 8.18±2.23 (p=0.000).Conclusion: In both offices, patients had good nutritional recommendations and good adherence to the dietary treatment. Patients in the nutritionist’s office reported that more factors were addressed at the time of nutritional recommendations and that more behavioral changes occurred when compared with the medical office. Key words: Cardiovascular diseases /diet therapy. Nutrition therapy. Patient compliance. Patient acceptance of health care. Endereço para correspondência: Anelise Bozzetto da Silva Rua Felicíssimo de Azevedo 627/401 – Higienópolis – Porto Alegre, RS, Brasil – CEP: 90540110 E-mail: [email protected] Submissão 30 de agosto de 2011 Aceito para publicação 21 de dezembro de 2011 1. 2. 3. Nutricionista, Pós-Graduada em Nutrição Clínica com ênfase em Doenças Cardiovasculares, obesidade e diabetes do Instituto de Cardiologia/RS, Porto Alegre, RS, Brasil. Nutricionista, Coordenadora do Serviço de Nutrição e Dietética do ICFUC, Mestranda em Ciências da Saúde: Cardiologia, Preceptora da Residência Multiprofissional de Nutrição em Cardiologia do Instituto de Cardiologia/RS, Porto Alegre, RS, Brasil. Nutricionista, Especialista em Nutrição Clínica, Mestre em Ciências da Saúde: Cardiologia, coordenadora da Residência Multiprofissional de Nutrição em Cardiologia, Professora do Pós-Graduação em Nutrição Clínica com ênfase em Doenças Cardiovasculares, obesidade e diabetes do Instituto de Cardiologia/RS, Porto Alegre, RS, Brasil. Rev Bras Nutr Clin 2012; 27 (2): 93-9 93 Silva AB et al. INTRODUÇÃO Dessa forma, o objetivo do presente artigo é descrever a associação entre a percepção de pacientes portadores de DAC sobre a orientação nutricional fornecida por médicos ou nutricionistas e a adesão ao tratamento dietoterápico, como também a comparação das percepções dos pacientes entre ambos os profissionais. Pacientes com doenças cardiovasculares, entre as quais a doença arterial coronariana (DAC), como infarto agudo do miocárdio e angina, são influenciados por um conjunto de fatores de risco, como obesidade, diabetes, hipertensão e dislipidemias, alguns modificáveis mediante alterações no estilo de vida e com dieta adequada1. A mudança ou a melhora do comportamento alimentar atinge altos índices de não adesão, pela complexidade desse componente no estilo de vida2-5. MÉTODO Foi realizado um estudo transversal com indivíduos adultos portadores de DAC que estavam em acompanhamento no Ambulatório de Nutrição e no Ambulatório de Medicina em uma instituição especializada em cardiologia. Estudos demonstram que 75% dos pacientes que recebem recomendações médicas relacionadas às mudanças no estilo de vida, como as restrições alimentares, não as seguem6 e 95% dos obesos que iniciam uma dieta para perda de peso fracassam na manutenção de um corpo mais magro7. Segundo estudo exploratório-descritivo com 50 pacientes hipertensos, os entrevistados aderiam parcialmente ao tratamento básico higieno-dietético, pois não incorporavam as condutas integralmente8. Foram excluídos do estudo aqueles que apresentavam alguma doença em que sua dieta poderia intervir no tratamento, como pneumopatias, doenças renais, hepáticas, neoplasias, entre outras; pacientes que nunca haviam sido orientados sobre alimentação e os que estavam em primeira consulta. Esses pacientes foram separados de acordo com o ambulatório em que faziam acompanhamento: Nutrição ou Médico. Não existe ainda uma medida padrão para se estabelecer a adesão. Entretanto, pode-se utilizar o questionamento direto ao paciente e avaliação subjetiva do comportamento individual9,10. Cabe ressaltar que, como é uma avaliação subjetiva, existe uma lacuna entre o que os pacientes acreditam que podem fazer e o que realmente fazem11. Os aspectos que influenciam a adesão de um paciente a uma prescrição dietética e sua motivação para adotar um padrão desejável de comportamento alimentar devem ser analisados como um conjunto de características relacionadas ao profissional, paciente, qualidade da relação profissional-paciente, prescrição, aspectos organizacionais, pessoais, ambientais e físicos do serviço ou clínica e ambiente externo ao serviço12. Os dados foram coletados no período de fevereiro a abril de 2009, quando foi aplicado um questionário com perguntas abertas e fechadas no momento da consulta, após a assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. O questionário aplicado foi dividido em três partes. A primeira continha dados de identificação, a segunda, dados sobre a percepção do paciente quanto à orientação nutricional recebida do profissional, e a terceira, dados sobre a adesão ao tratamento dietoterápico. Quanto à percepção sobre a orientação nutricional recebida, definiram-se como relevantes aqueles relacionados aos fatores culturais, regionais e econômicos do paciente; quantidade, qualidade, substituição e aquisição dos alimentos; forma de preparo, dificuldade de compreensão e necessidade de cozinhar para mais de uma pessoa. Quanto aos critérios de adesão, os pacientes foram questionados sobre a mudança dos hábitos alimentares após as orientações recebidas, isto é, aumento do consumo de água, frutas e verduras, diminuição da quantidade alimentar, de produtos industrializados, doces e sal, melhora da qualidade alimentar; prática de exercícios físicos e fracionamento das refeições. As características da prescrição têm sido citadas como um dos fatores mais importantes na adesão13. Uma adequada orientação nutricional deve contemplar questões culturais, regionais, sociais e econômicas, orientações relacionadas a seleção, quantidade, técnicas de preparo e substituições dos alimentos1. Todos esses aspectos devem ser envolvidos e analisados no momento da orientação nutricional, para promover a adesão à dieta, ou seja, após compreensão do seu plano alimentar no ambulatório, o paciente tenha condições dentre todos os fatores citados acima de seguir em casa as orientações estabelecidas14. A adesão pode ser definida como extensão do comportamento individual (seguimento de orientações dietéticas, mudanças de estilo de vida), correspondendo e concordando com as recomendações de um profissional da saúde9,15-17. A classificação sobre a percepção da orientação nutricional foi definida como ótima, boa e má percepção, a partir da somatória dos fatores. Uma ótima percepção foi considerada para o paciente que atingiu oito ou mais fatores; boa percepção, de cinco a sete, e má percepção, quatro ou inferior. Para a adesão ser considerada ótima, o paciente devia ter modificado oito ou mais fatores no seu comportamento alimentar; boa adesão, de cinco a sete, e má adesão, quatro ou menos. Visto isso é importante a implementação de ações educativas por profissionais que detenham conhecimentos técnicos de epidemiologia, nutrição, dietética e, ainda, o domínio de métodos adequados para abordar os problemas alimentares e orientar a mudança de hábitos1. Rev Bras Nutr Clin 2012; 27 (2): 93-9 94 Percepções do paciente cardiopata quanto à orientação e adesão ao tratamento dietoterápico. As informações obtidas foram armazenadas em um banco de dados elaborado especialmente para esse fim em microcomputador, por meio do programa SPSS 17,0 (Statistical Package for Social Science). Para apresentação das variáveis contínuas, foram utilizados média e desvio padrão, e para as variáveis categóricas, frequências absolutas (n) e relativas (%). Para avaliar a associação entre as variáveis qualitativas foi utilizado o Teste Qui-quadrado. Em todas as comparações, foi considerado um alfa crítico de 0,05. ambulatórios. Quanto ao restante dos pacientes (25,59%), estes responderam não apresentar resultado na dieta por não manifestarem necessidade de seguirem-na completamente ou parcialmente conforme orientados. Desses, 27,27% referiram precisar de mais orientações. Nas Tabelas 5 e 6, pode-se observar os resultados segundo classificação definida para percepção da orientação e adesão segundo a orientação do ambulatório médico e do ambulatório de nutrição. Não houve associação entre escolaridade, IMC, exercício físico, orientação nutricional e adesão. RESULTADOS Foram avaliados 86 pacientes entre 22 e 87 anos, dos quais 49 (57%) pertenciam ao ambulatório médico e 37 (43%) ao ambulatório de nutrição. A média do tempo de acompanhamento no ambulatório médico foi de 7,84±6,66 anos e, no de nutrição, 4,594±4,01 anos, com diferença significativa (p=0,007). O número de consultas ao ano foi de 2,04±1,02 vezes, em ambos os ambulatórios. A média de idade foi de 61,73±11,94 anos, sem diferença estatística entre os ambulatórios, e a média de IMC foi 29,80±6,39 kg/m2. Na Tabela 1, pode-se observar a predominância e características da amostra. Na Tabela 7, verifica-se grau de possibilidade de realização da dieta fornecida, sobre a manutenção dos novos hábitos alimentares e fatores que pudessem interferir na adesão à dieta, como possíveis fatores limitantes na adesão. A média do número de fatores que foram considerados como sendo abordados no momento da orientação nutricional, no ambulatório médico, foi 4,04±2,24, enquanto, no de nutrição, foi 5,35±1,37 (p< 0,002). Quanto à adesão, segundo a percepção dos pacientes, a média de fatores para mudança do comportamento alimentar foi 5,83±2,43 no ambulatório médico, enquanto, no de nutrição, foi de 8,18±2,23 (p=0,000). Dos 86 pacientes, 74 (86%) achavam sua alimentação saudável, pois consumiam frutas e verduras e não consumiam carnes gordurosas e sal, além de seguirem as orientações alimentares indicadas pelo médico e pelo nutricionista. A maioria, 82 pacientes (95,3%), considerava importante a orientação sobre a alimentação. Tabela 1 – Características sociodemográficas e clínicas dos pacientes. Características Na Tabela 2, observa-se a opinião dos pacientes sobre o ato de comer e o objetivo da dieta que realizavam. n=86 (%) 46 53,5 54 62,8 1° grau incompleto 35 40,7 1° grau completo 14 16,3 2° grau completo 14 16,3 Nunca frequentou 10 11,6 50 58,1 Sexo Masculino Na Tabela 3, os resultados foram separados de acordo com os ambulatórios estudados, para melhor análise das variáveis. Ocupação Aposentado A maioria dos pacientes (95,3%) referiu estar satisfeita com a orientação nutricional recebida. Da amostra, 48 (55,8%) pacientes preferiram ser orientados sempre pelo mesmo profissional. Dos que preferem ser orientados sempre pelo mesmo profissional, 85% justificaram pelo fato do profissional já conhecer o caso e ter maior acompanhamento. Dos 50 pacientes que acharam a dieta orientada muito diferente da habitual, 21 (42%) justificaram pela substituição por alimentos mais saudáveis. Escolaridade Estado civil Casado Renda 2 a 5 SM* Na Tabela 4, estão apresentadas as mudanças comportamentais consideradas relevantes para uma adequada adesão ao tratamento. 49 57 44 51,2 40 46,5 Diabetes 36 41,9 Hipertensão Arterial 65 75,6 Dislipidemias 52 60,5 Tabagismo 6 7,0 Pratica exercício físico DAC Infarto Agudo do Miocárdio As quatro mudanças alimentares que predominaram, em ambos os ambulatórios, foram maior percentual no consumo de verduras e frutas, melhora na qualidade alimentar e diminuição do consumo de sal. Doenças associadas Do total de pacientes, 64 (74,41%) referiam estar tendo resultado na dieta proposta, dos quais 72,3% eram do ambulatório médico, sem diferença significativa entre os dois *SM= salário mínimo Rev Bras Nutr Clin 2012; 27 (2): 93-9 95 Silva AB et al. Tabela 2 – Percepção do ato de comer x objetivo da dieta. Total n=86 Você acha que comer é... Uma necessidade Um prazer Uma obrigação Orientado a fazer que tipo de dieta? Para perder peso Para ganhar peso Para manter o peso Para ter uma alimentação saudável Para melhorar a saúde Para evitar complicações n 59 20 3 % 68,6 23,3 3,5 44 1 9 35 37 25 51,2 1,2 10,5 40,7 43 29,1 Tabela 3 – Percepção dos pacientes quanto aos fatores abordados no momento da orientação nutricional. Ambulatório Médico Nutrição Total n % n % n % Cultura 24 50 33 89,2 57 67,1 Fatores regionais 17 34,7 9 25 26 30,6 Sua renda familiar 13 26,5 7 18,9 20 23,3 Fato de precisar cozinhar para mais de 1 pessoa 8 16,3 7 18,9 15 17,4 Quantidade 33 67,3 37 100 70 81,4 Qualidade 45 91,8 33 89,2 78 90,7 Como preparar os alimentos 14 28,6 29 78,4 43 50 Onde adquirir (local, preço) 3 6,1 4 10,8 7 8,1 Substituições alimentares 36 73,5 36 97,3 72 83,7 Dificuldade de compreensão 5 10,2 3 8,1 8 9,3 p <0,001 0,471 0,569 0,979 <0,001 0,965 <0,001 0,697 0,008 1,000 *Associações feitas através do teste Qui-Quadrado Tabela 4 – Percepção dos pacientes quanto às modificações no seu comportamento alimentar após orientação nutricional. Médico Nutrição Total n % n % n % Consome mais água 14 28,6 23 62,2 37 43 Mais verduras 30 61,2 33 89,2 63 73,3 Mais fruta 29 59,2 33 89,2 62 72,1 Menos produtos industrializados 14 28,6 29 78,4 43 50 Exercita-se 17 34,7 11 29,7 28 32,6 Fracionamento das refeições 7 14,3 21 56,8 28 32,6 Menos doce 23 46,9 25 67,6 48 55,8 Diminuiu a quantidade alimentar 23 46,9 26 70,3 49 57 Melhorou a qualidade alimentar 38 77,6 29 78,4 67 77,9 Menos sal 36 73,5 30 81,1 66 76,7 Sempre orientado pelo mesmo profissional 10 20,4 15 40,5 25 29,1 Dieta diferente da habitual 27 55,1 23 62,2 50 58,1 Tabela 5 – Associação entre a orientação nutricional e adesão ao tratamento dietoterápico no ambulatório médico segundo classificação. Má Boa 0,004 0,008 0,005 < 0,001 0,799 <0,001 0,091 0,052 1,000 0,569 0,546 0,663 Tabela 6 – Associação entre a orientação nutricional e adesão ao tratamento dietoterápico no ambulatório de nutrição segundo classificação. Adesão Orientação Nutricional p Adesão Ótima Orientação Nutricional Má Boa Ótima Má 12 (40%) 12 (40%) 6 (20%) Má 0 (0%) 5 (45,5%) 6 (54,5%) Boa 4 (28,6%) 8 (57,1%) 2 (14,3%) Boa 2 (9,1%) 6 (27,3%) 14 (63,6%) Ótima 0 (0%) 1 (20%) 4 (80%) Ótima 0 (0%) 1 (25%) 3 (75%) Total 16 (32,7%) 21(42,9%) 12 (24,5%) Total 2 (5,4%) 12 (32,4%) 23 (62,2%) Rev Bras Nutr Clin 2012; 27 (2): 93-9 96 Percepções do paciente cardiopata quanto à orientação e adesão ao tratamento dietoterápico. Tabela 7 – Percepção dos pacientes quanto à dieta fornecida, sobre a manutenção dos novos hábitos alimentares e fatores limitantes que interferem na adesão à dieta. Médico n=47 Nutrição n=36 Total n=83 A dieta fornecida n % n % n % Possível de ser realizada 26 55,3 28 77,8 54 65,1 Fácil durante a semana e difícil nos finais de semana 15 31,9 6 16,7 21 25,3 Difícil de ser realizada 6 12,8 2 5,6 8 9,6 Manutenção dos novos hábitos Médico n=47 Nutrição n=37 Total n=84 Sendo realizada com facilidade 20 42,6 23 62,2 43 51,2 Possível com pequenas dificuldades 17 36,2 11 29,7 28 33,3 De difícil adaptação à rotina 9 19,1 2 5,4 11 13,1 Difícil, pois perco o controle facilmente 1 2,1 0 0 1 1,2 Dificil quando tenho problemas em casa ou no trabalho 0 0 1 2,7 1 1,2 Fatores Limitantes Médico n=58 Nutrição n=27 Total n=85 Mudança do hábito alimentar 16 32,7 5 13,5 21 24,4 Trabalhar fora de casa 4 8,2 2 5,4 6 7 Ansiedade e Nervosismo 20 40,8 13 35,1 33 38,4 Desconforto físico 3 6,1 2 5,4 5 5,8 Não compreensão das orientações 0 0 0 0 0 0 Hiperfagia 0 0 1 2,7 1 1,2 Dificuldade Econômica 10 20,4 4 10,8 14 16,3 Falta de vontade para emagrecer 5 10,2 0 0 5 5,8 * alguns pacientes não responderam, porque não quiseram ou não sabiam responder. DISCUSSÃO imprescindíveis para qualquer tipo de dieta. Já os outros fatores são mais específicos de cada dieta e das características de cada indivíduo e, necessitam de profissionais que tenham conhecimento técnico e domínio de métodos adequados para considerá-los no momento da orientação nutricional. Houve diferença significativa na abordagem dos fatores culturais, quantidade, substituições alimentares e modo do preparo dos alimentos quando orientado por nutricionista comparado ao médico, provavelmente devido ao fato do nutricionista apresentar conhecimento técnico para abordar esses fatores. De acordo com Ferreira & Fernandes , a baixa adesão é frequentemente observada em situações que requerem tratamentos longos, complexos, de natureza preventiva e quando alterações no estilo de vida do paciente precisam ser realizadas, como ocorre no caso de doenças crônicas. Diante disso, a demanda por orientação nutricional tem crescido significativamente, face ao diagnóstico precoce das doenças crônicas e ao reconhecimento da influência da alimentação sobre elas, como também nos fatores de risco associados, como sobrepeso, que foi predominante na amostra desse estudo, obesidade, hipertensão, diabetes mellitus, dislipidemias, também presentes na amostra19,20. 18 Segundo Boog1, a dificuldade que os profissionais médicos e enfermeiros encontram para lidar com as questões de alimentação decorrem da complexidade do problema em si. Um dos fatores é a especificidade técnica, que diz respeito ao preparo que o profissional deve ter para lidar com o problema alimentar, o que envolve conhecimentos de antropologia e sociologia, para analisar não só o hábito alimentar em si, mas também compreender o universo alimentar do paciente, de psicologia e pedagogia para propor métodos de intervenção e obviamente de Nutrição, Dietética, Técnica Dietética e Dietoterapia. Segundo Boog1, nada impede que outros profissionais também orientem sobre alimentação e nutrição, desde que haja preparo adequado dos profissionais de saúde em relação ao assunto para abordar os problemas alimentares e orientar a mudança de hábitos. Os fatores mais abordados, como a qualidade do alimento, substituições alimentares e, principalmente, a quantidade, também estão relacionados ao fato da maioria dos pacientes fazer dieta para perder peso, devido o estado nutricional predominante ser sobrepeso, e apresentarem fatores de risco associados. O ambulatório médico apresentou maior tempo de acompanhamento em relação ao de nutrição. Segundo Pinkus21, nota-se valorização do atendimento médico após o descobrimento da doença. É importante ressaltar que maior tempo de consulta está associado a melhor qualidade do atendimento: como melhor anamnese, melhor explicação do problema e dos procedimentos diagnósticos e terapêuticos, assim como verificação do médico sobre a compreensão e a participação do paciente na consulta22. Nesse estudo, a média do número de consultas (2,04/ano) foi inferior aos dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (PNAD) 2003, em que a média per capita no Brasil foi de 4,0 consultas ao ano, em indivíduos maiores de 64 anos23. Os fatores mais abordados no momento da orientação nutricional, em ambos os ambulatórios, foram: qualidade, quantidade alimentar e substituições alimentares, possivelmente devido a esses três fatores serem orientações Rev Bras Nutr Clin 2012; 27 (2): 93-9 97 Silva AB et al. Houve diferença significativa entre os ambulatórios nas mudanças alimentares, demonstrando que os pacientes que foram orientados pelo nutricionista consumiram mais verduras, frutas, menos produtos industrializados e fracionaram as refeições. Segundo estudo com pacientes hipertensos, 17% referiram mudanças nos hábitos alimentares, como evitar sal e embutidos (42%), gordura (37%) e álcool (21%)11. instruídos sobre a doença e o tratamento necessário para seu controle. Entretanto, a literatura tem indicado que apenas o conheci­mento das instruções envolvidas no tratamento não garante a adesão do paciente27,28. CONCLUSÃO Por meio deste estudo verificou-se que, quanto melhor a orientação nutricional fornecida, melhor a adesão ao tratamento dietoterápico. Segundo as percepções dos pacientes, a dieta fornecida era possível de ser realizada e a manutenção dos novos hábitos estava sendo realizada com facilidade. No estudo realizado por Koehnlein et al.24, 64,44% dos pacientes responderam que o plano alimentar também era possível de ser realizado.No estudo de Match et al.25, os fatores limitantes para o sucesso da dieta foram nervosismo, ansiedade, mudança do hábito alimentar e dificuldade econômica. A ansiedade e os resultados lentos foram apontados como maiores desmotivadores da reeducação alimentar, também comprometendo a adesão do paciente ao tratamento, uma vez que os pacientes ficam mais susceptíveis a episódios de compulsão alimentar, como mecanismo compensatório em situações de depressão, tristeza, nervosismo e raiva. A mudança drástica dos hábitos alimentares e o aspecto financeiro também foram as maiores dificuldades encontradas por Chiment et al.26. Além disso, pode-se perceber que os pacientes buscam mudanças de comportamento alimentar por tempo determinado e resultados rápidos. No ambulatório de nutrição, foi abordado um número maior de orientações para mudança alimentar e houve mais modificações alimentares pelos pacientes quando comparado ao ambulatório médico. A falta de adesão ao tratamento nutricional é frequente, porém, neste estudo, segundo a auto-avaliação dos pacientes, foi considerada boa e ótima adesão. Alguns pacientes referiram ter tido má orientação, porém ótima adesão ao tratamento. Pode-se inferir que talvez esses pacientes já tivessem algum conhecimento sobre reeducação alimentar devido a mídia, ou já estavam a muito tempo fazendo o tratamento dietoterápico com o mesmo profissional, ou até já tivessem outras experiências devido diferentes tentativas com outros profissionais. A mudança do comportamento alimentar é o foco principal dos profissionais da área da saúde, e também um dos mais difíceis, uma vez que envolve todas as ações com relação ao alimento, inclusive o contexto familiar e social, exposição a um determinado alimento, preço, religião, geografia, crenças, aspectos sensoriais, neurofisiológicos e, ainda, aspectos emocionais e simbólicos12,29. Ao serem questionados sobre como vêem o ato de comer, a maioria considerou uma necessidade, demonstrando que o comer está acima do prazer, ou seja, é visto como uma necessidade fisiológica, indispensável à sobrevivência. Interessante também a justificativa de estarem seguindo as orientações alimentares, pois parece que o fato de estarem fazendo acompanhamento já é necessário para terem uma alimentação saudável, mas vale lembrar que, por ser uma resposta subjetiva, existe uma lacuna entre o que os pacientes acreditam que podem fazer e o que realmente fazem11. A maioria dos pacientes mostrou consciência quanto à importância da alimentação para sua saúde, ao responderem achar necessária a orientação nutricional. É necessária a construção de estratégias conjuntas com o paciente, a fim de que sejam alcançados melhores resultados na adesão12,29. A adesão do cliente é possibilitada mediante a conscientização deste, e por meio da educação em saúde desenvolvida de forma articulada pela equipe multiprofissional28,30. A adesão do cliente ao tratamento integra o comparecimento às consultas, o uso regular do esquema terapêutico, a adoção de estilo de vida saudável, sobretudo o compromisso deste com a própria saúde, atuando como sujeito da ação, e não como objeto. Enfim, a adesão do cliente é resultante do seu engajamento efetivo nas atividades de autocuidado, tornando-se agente de autocuidado e multiplicador desses atividades na família e na comunidade8. Foi demonstrado que, quanto melhor a percepção da orientação nutricional, melhor foi a percepção da adesão às modificações alimentares, em ambos os ambulatórios. Os pacientes que foram orientados por nutricionistas tiveram maior número de fatores abordados no momento da orientação em relação àqueles atendidos pelo médico, como também no número de fatores para modificações alimentares. Cabe destacar que grande parte achou estar tendo resultado na dieta como também a maioria referiu ter tido uma boa e ótima adesão. Ainda restam questões a serem comprovadas sobre os reais motivos da dificuldade de mudar o comportamento alimentar. Estudos comparativos poderiam igualmente contribuir para uma melhor compreensão dos fatores que interferem na adesão e sua relação com a orientação nutricional. De igual forma, deve-se estudar e implementar ações que favoreçam a aderência ao tratamento nutricional em pacientes com sobrepeso. Um dos recursos mais utilizados para promover a adesão ao tratamento do diabetes tem sido o oferecimento de progra­mas educacionais, nos quais os participantes são Rev Bras Nutr Clin 2012; 27 (2): 93-9 98 Percepções do paciente cardiopata quanto à orientação e adesão ao tratamento dietoterápico. 15.Carvalho CV, Duarte DB, Merchán-Hamann E, Bicudo E, Laguardia J. Determinantes da aderência à terapia anti-retroviral combinada em Brasília, Distrito Federal, Brasil, 1999-2000. Cad Saúde Pública. 2003;19(2):593-604. 16.Natal S. Revisão bibliográfica – tratamento da tuberculose: causas da não-aderência. Bol Pneum Sanit. 1997;5(1):50-70. 17.Sackett DL, Haynes RB. Compliance with therapeutic regimens. Baltimore:John Hopkins University Press;1976. 18.Ferreira EAP, Fernandes AL. Treino em auto-observação e adesão à dieta em adulto com diabetes tipo 2. Psic Teor Pesq. 2009;25(4):629-36. 19.World Health Organization. Study group on diet, nutrition and prevention of non-communicable diseases. 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