Tratamento da Síndrome de Cushing - SBEM-RJ

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Tratamento da Síndrome de
Cushing
Giselle F. Taboada
Professora Adjunta de Endocrinologia
[email protected]
Síndrome de Cushing
Definição
• Conjunto de sinais e sintomas que refletem a exposição prolongada e
inapropriada a altos níveis de glicocorticoides nos tecidos
JCEM 2008; 93:1526-40.
Síndrome de Cushing
Etiologia
Arq Bras Endocrinol Metab 2007; 51:1199-1206.
JClin Endocrinol Metab 2008; 93:1526-40.
J Clin Endocrinol Metab 2015;100:2807-31.
1. Objetivos do tratamento da Sd de Cushing
• Objetivos do tratamento:
–
–
–
–
Tratar a causa primária
Alcançar remissão
Eliminar sinais, sintomas e comorbidades
Melhorar a qualidade de vida
• Mediana de sobrevida de pacientes não tratados de 4,6 anos
Am J Med. 1952 Nov;13(5):597-614
• Mortalidade 1,7 - 4,8 vezes a da população geral -> melhora com o
tratamento adequado
– Eucortisolismo resulta em melhora clínica e bioquímica
 Obesidade, HAS, RI, homeostase da glicose, dislipidemia, DMO,
e QOL
distúrbios psiquiátricos
JCEM 2001; 86:117-23.
JCEM 2013; 98:2277-84.
– Em crianças, tratamento resulta em melhora do crescimento e composição corporal ->
pacientes alcançam alvo-genético mas podem precisar de GH
1. Objetivos do tratamento da Sd de Cushing
– Em situações de risco de vida, diagnóstico clínico com mínimos dados
laboratoriais é suficiente para justificar tratamento imediato
– Se o diagnóstico clínico é incerto a melhor abordagem é realizar testes
adicionais
2. Tratamento adjuvante
2. Tratamento adjuvante
– Hipercortisolismo altera os fatores de coagulação até 1 ano após a cura cirúrgica e
resulta em risco aumentado de trombose especialmente nas 1as quatro semanas
após a cirurgia
Incidência cumulativa de TEP PO
Clin Endocrinol 2013; 78:481-8.
J Clin Endocrinol Metab 2002, 87:3662-6.
2. Tratamento adjuvante
3. Opções de tratamento de primeira linha
3. Opções de tratamento de primeira linha
– Adrenalectomia unilateral é curativa em ~100% dos pacientes e a tx de
complicações é baixa em mãos experientes
– Nos pacientes com incidentaloma adrenal e SC subclínica o papel da
adrenalectomia (vs tratamento clínico das comorbidades) não é bem
estabelecido – parece haver benefício nos pacientes com alterações
metabólicas
JCEM 2010; 95:2736-45.
– Pacientes com carcinoma adrenal têm prognóstico reservado -> tentar
ressecção completa
• É recomendada a cirurgia aberta para ressecção em bloco e
estadiamento + tratamento do hipercortisolismo com QT e RxT ou
mitotano
3. Opções de tratamento de primeira linha
– Na ausência de doença metastática manifesta a ressecção tumoral resulta
em 76% de cura
Surgery 1992; 112:994-1000.
3. Opções de tratamento de primeira linha
Do manejo PO cirurgia transesfenoidal...
3. Opções de tratamento de primeira linha
• Hiperplasia macronodular em geral acomete ambas adrenais mas pode se manifestar
inicialmente como nódulo unilateral
• Caracteriza-se por nódulos não pigmentados > 5 mm e ACTH indetectável.
• Patogênese ainda não esclarecida – expressão inapropriada de receptores ectópicos
para vários horm (GIP, ADH, ...)
• Mais recentemente descrita mutação no gene ARMC5 (armadillo-repeat containing 5)
em acometidos e familiares – gene supressor tumoral de função desconhecida
N Engl J Med 2013; 369:2147-9.
3. Opções de tratamento de primeira linha
• PPNAD – Hiperplasia bilateral micronodular / doença adrenal nodular
pigmentada primária
• Caracteriza-se pela presença de múltiplos nódulos pigmentados < 3 mm
• Fazer screening regular para outras manifestações do Complexo de Carney
– Lesões cutâneas pigmentadas (sardas), nevos azuis, tumor testicular de céls de Sertoli, tumor de
tireoide, somatotropinoma, Ca de mama, mixoma atrial, osteocondromixoma e schwanomas
• Adrenalectomia bilateral é o tratamento de escolha
4. Remissão e recorrência após ressecção cirúrgica
• Não existe consenso quanto ao critério de remissão após ressecção de
corticotropinoma
• Em geral é definida como Cortisol sérico < 5 µg/dL ou CLU < 10-20 µg/d nos
primeiros 7 dias de PO
• Tx de remissão em séries de adultos 73-76% em micros e ~43% em macros
4. Remissão e recorrência após ressecção cirúrgica
• Aspectos técnicos, experiência do cirurgião, tamanho do tumor e invasão
dural parecem ser os maiores determinantes
Eur J Endocrinol 2013; 168:639-48.
4. Remissão e recorrência após ressecção cirúrgica
• Pacientes com SC leve ou cíclica ou aqueles com tratamento clínico préoperatório e normalização dos níveis de cortisol podem não apresentar
supressão dos corticotrofos no PO
• Cortisol sérico e CLU podem ser normais -> avaliar ritmo do cortisol com nível
sérico ou salivar noturno
• Após adrenalectomia bilateral são esperados níveis indetectáveis de cortisol
sérico e ACTH 200 – 500 g/mL
4. Remissão e recorrência após ressecção cirúrgica
• Recorrência em 23% dos adultos com micro e 33% daqueles com
macroadenomas após remissão inicial
• Tx de recorrência de 15-66% em 5-10 anos após cirurgia inicialmente bem
sucedida
• Pacientes com DC com recuperação do eixo HHA devem ser avaliados para
recorrência e depois anualmente ou antes caso apresentem sintomas
• Recuperação precoce (< 6 meses) pode indicar risco aumentado de recorrência
• Os achados laboratoriais mais precoces parecem ser elevação do cortisol
noturno (sérico ou salivar)
4. Remissão e recorrência após ressecção cirúrgica
• Outros testes (CRH, DDAVP,...) para avaliar o risco de recorrência não têm
boa acurácia diagnóstica
• Raramente pode haver crescimento de tecido adrenal remanescente no
leito cirúrgico ou gônadas pelo estímulo do ACTH elevado
• Recorrência após ressecção de tumor ectópico secretor de ACTH em geral
indica a presença de metástases
5. Reposição de glicocorticoide e retirada
• Recuperação do eixo HHA ocorre 6-12 meses após ressecção de tumores
produtores de ACTH e cerca de 18 meses após adrenalectomia unilateral
• Alguns pacientes podem ter sintomas de retirada de glicocorticoide a despeito
de reposição fisiológica – anorexia, náuseas, perda de peso, cansaço,
artralgias... Recuperação pode levar até mais de 1 ano!
•
Esta síndrome pode persistir mesmo após recuperação do eixo HHA e a
fisiopatologia não é bem estabelecida
• Os pacientes melhoram com aumento temporário da dose de glicocorticoide
• Pode haver benefício do uso de inibidores de recaptação de serotonina
5. Reposição de glicocorticoide e retirada
• Fornecer instruções por escrito sobre “dose de estresse” e identificação do
paciente em caso de urgências
• Alguns grupos utilizam doses suprafisiológicas de glicocorticoides no PO
imediato entretanto não há estudos para avaliar se isso minimiza a síndrome de
retirada – outros grupos utilizam doses fisiológicas para evitar o
hipercortisolismo continuado
• Existem vários esquemas de retirada mas nenhum foi sistematicamente
estudado
CARTEIRA DE IDENTIFICAÇÃO
NOME: ___________________________________
Tenho deficiência da produção de corticóides. Se eu estiver desmaiado(a) ou
tiver sofrido um acidente, queimadura grave, estiver com febre alta ou apresentar
vômitos com tonteira, leve-me até um hospital para poder receber glicocorticóide
injetável.
Telefone de contato: _______________________
Telefone da minha família: ___________________
5. Reposição de glicocorticoide e retirada
• Pode ser avaliado o cortisol matinal antes da tomada do dia a cada 3 meses
seguido de teste de estímulo quando cortisol basal > 8 µg/dL
• Considera-se recuperação do eixo com cortisol basal ou estimulado > 18 µg/dL
5. Reposição de glicocorticoide e retirada
• Pode ocorrer disfunção dos eixos tireo e gonadotróficos no pré-op de qualquer
etiologia de hipercortisolismo
• Em geral resolve em 6 meses mas alguns pacientes podem necessitar reposição
hormonal prolongada
• DGH é frequente no hipercortisolismo e persiste em mais de 50% das crianças
nos primeiros 12 meses após cura
• Alguns centros advogam teste de estímulo do GH após 3 meses e tratamento
com GH e agonista GnRH para alcançar maior altura final
• Em adultos aguardar 12 meses após resolução do hipercortisolismo para
avaliar o eixo somatotrófico
6. Opções terapêuticas de 2ª linha
• A escolha do tratamento de 2ª linha deve levar em consideração objetivos do
tratamento, preferência do paciente, tamanho e localização do tumor residual,
urgência do tratamento, uso de outras medicações (interações), história do
paciente, custo da medicação, idade, gênero e disponibilidade de outros
tratamentos
6. Opções terapêuticas de 2ª linha
• Após adrenalectomia bilateral por DC, 21% dos adultos desenvolvem Sd de
Nelson e progressão tumoral sem as demais características da Sd em 50%
• Sd de Nelson é menos provável em pacientes sem lesão visível no momento da
adrenalectomia. Papel da RxT na prevenção ainda controverso.
6. Opções terapêuticas de 2ª linha
Arq Bras Endocrinol Metab 2007;51:1355-61.
6. Opções terapêuticas de 2ª linha
6. Opções terapêuticas de 2ª linha
• RxT convencional resulta em remissão em até 83% dos pac em 6-60 meses
• Em crianças a resposta parece ser mais rápida – 78% de indivíduos em
remissão após 9-18 meses
• Radiocirurgia parece ter menor risco e promover resposta mais rápida mas isto
ainda não foi bem estabelecido
• Alguns especialistas recomendam radiocirurgia apenas se houver lesão visível
na RM x outros recomendam irradiação da sela e adjacências sem
comprometimento do quiasma
Curr Opin Endocrinol Diabetes Obes 2010; 17:356-64.
N Engl J Med 1997; 336:172-7.
6. Opções terapêuticas de 2ª linha
Atentar para interações medicamentosas: estímulo ou inibição do CYP3A4 e
prolongamento do QT
Disponíveis no Brasil
Observação
• Cetoconazol e metirapona são aprovados pela EMeA para tratamento da SC
• Mitotano é aprovado pelo FDA para tratamento de Carcinoma adrenal
• Pasireotide é aprovado pelo FDA e EMeA para tratamento de DC
• Mifepristone é aprovado pelo FDA para tratamento da SC
Cetoconazol
Mitotano
Etomidato
Cetoconazol
Metirapona
Etomidato
Cetoconazol
6. Opções terapêuticas de 2ª linha
Cetoconazol
• Derivado imidazólico antifúngico – inibe esteroidogênese adrenal e gonadal /
enzimas: clivagem de cadeia lateral; 17,20 liase e 11hidroxilase
• Em doses de 400-1200 mg/dia normalizou CLU de 25-93% dos pacientes,
independente de dose ou duração de tratamento
• Redução de mais de 50% do CLU em 75% dos pacientes (n=200) com melhora
clínica de DM, HAS e hipocalemia
• Na EAS a eficácia é menor – 44% de eucortisolismo
• Hepatite fulminante em 1:15000; idiosincrática
• Elevações assintomáticas das transaminases em 10-15% dos casos após início
do tratamento ou titulação de dose
• Elevações de até 3x das transaminases são toleradas
6. Opções terapêuticas de 2ª linha
Metirapona
• Inibe a 11 hidroxilase
• Meia-vida de 2h -> 3-4 tomadas por dia
• Metabolismo  por fenitoina e fenobarbital;  por estrógenos
• Controla hipercortisolismo em 50-75% dos pacientes
• Não é liberada para uso na gestação mas há relatos de uso sem intercorrências
materno-fetais
• Ef colat gastrintestinais – administrar com as refeições ou leite para minimizar
• Tratamento crônico pode resultar em acúmulo de precursores androgênicos e
mineralocorticoides – piora de hirsutismo, acne, hipocalemia, edema e HAS –
monitorar!
6. Opções terapêuticas de 2ª linha
Mitotano
• Inibe CYP11A1 (enzima de clivagem da cadeia lateral) + atividade citotóxica
direta no córtex adrenal
• Induz CYP3A4 – atenção para interações medicamentosas
• Meia vida longa por estoque em tec adiposo – é teratogênico e gestação deve
ser evitada anos após interrupção da medicação
• Titular dose semanalmente – normalização do CLU pode levar 6 meses
• Nos pacientes com DC a dose é menor do que nos pacientes com carcinoma
adrenal – menos efeito adrenolítico na Z glomerulosa nestas doses
• Na DC usado quando tratamento cirúrgico não é possível ou após RxT -> 7282% de remissão do hipercortisolismo
• Determina aumento da CBG -> aumento do cortisol plasmático
• Monitorar tratamento com CLU ou salivar
6. Opções terapêuticas de 2ª linha
Mifepristone
• Antagonista do receptor glicocorticoide
• Melhora da HAS e/ou DM em 40 e 60% dos pacientes em um estudo (n=34)
• Determina elevação do ACTH nos pacientes com DC
• Em um estudo 3 macroadenomas apresentaram aumento de tamanho e 1
regrediu
• Ajuste de dose por parâmetros clínicos (glicemia, redução de peso,...)
6. Opções terapêuticas de 2ª linha
Etomidato
•
•
•
•
Única medicação disponível para pacientes críticos com hipercortisolismo
Derivado imidazólico usado em indução anestésica
Inibição da enzima de clivagem de cadeia lateral e 11hidroxilase
Doses subhipnóticas rapidamente reduzem a esteroidogênese em 12-24h
• Infusão contínua IV – necessitam monitorização em UTI
• Não determina sedação nessas doses
• Monitorar níveis de cortisol a cada 4-6 h – titular para manter entre 10-20
mcg/dL
SC
Indução anestésica
Ataque (mg)
3-5
7 – 28
Manutenção (mg/h)
2,1 – 7
30 – 60
6. Opções terapêuticas de 2ª linha
Cabergolina
• Agonista dopaminérgico com grande afinidade pelo DR2
• 30-40% dos pacientes responderam e mantiveram níveis normais de CLU após
2-3 anos de tratamento
• Em 29% dos respondedores iniciais o efeito não foi mantido
• Doses 3,5 – 7 mg/sem
• Melhora da PA e glicemia
• Redução ou estabilização da massa tumoral em pequeno número de pacientes
Em DC combinações estudadas:
• 12 pacientes após CTE – monoterapia -> normalização do CLU em 3 pacientes
• Adição de cetoconazol resultou em normalização em 6 dos 9 não
respondedores
• Adição ao pasireotide resultou em normalização do CLU em 4 pacientes não
controlados com monoterapia
N Engl J Med 2010; 362:1846-8.
Pituitary 2010; 13:123-9.
6. Opções terapêuticas de 2ª linha
Pasireotide
• Análogo da somatostatina com grande afinidade pelo SST1 e SST5
• Corticotropinomas têm elevada expressão de SST5
• Estudo fase 3 em 162 pacientes com dose de 600-900 mcg/dia
N Engl J Med 2012;366:914-24.
6. Opções terapêuticas de 2ª linha
Pasireotide
• Em 6 meses, 20% tiveram normalização do CLU
6. Opções terapêuticas de 2ª linha
Pasireotide
• Com a dose de 900 mcg/dia, redução de 44% do volume tumoral em 75
pacientes
• 73% dos pacientes evoluíram com hiperglicemia
• Risco de alargamento do QT
6. Opções terapêuticas de 2ª linha
Terapias direcionadas para EAS
• Tumores geralmente expressam SST2 e DR2
• Relatos de casos de eficácia de octreotide em controlar secreção de ACTH e
cortisol em curto-médio prazo com pouca ou nenhuma ação sobre a massa
tumoral
• Relatos ocasionais de eficácia da cabergolina em monoterapia ou associada
com análogo de SST2
• Relatos de uso de inibidores de tirosina-quinase (vandetinib e sorafenib) em
Ca medular metastático secretor de ACTH
Thyroid 2014; 24:1062-6.
N Engl J Med 2013; 369:584-6.
J Clin Endocrinol Metab 2014; 99:3055-9.
7. Seguimento a longo prazo
• Após remissão da SC alguns pacientes podem apresentar recorrência ou
desenvolver doenças inflamatórias ou auto-imunes
• Melhora dos parâmetros da sd metabólica até 1 ano após remissão
• Sobrepeso e HAS podem persistir em até 25% dos pacientes, especialmente
com hipercortisolismo de longa duração
• Melhora do metabolismo glicídico e lipídico entretanto persiste prevalência
aumentada de DM e dislipidemia quando comparados com controles
pareados para IMC
• Risco aumentado persistente para IAM
7. Seguimento a longo prazo
• Mesmo após cura, há aumento da prevalência de ansiedade, depressão e
outras psicopatologias
Osteoporose
• Efeito direto do cortisol no osso
• Efeito indireto: hipogonadismo 2ário, hiperparatireoidismo 2ário, defic de GH e
miopatia
• Prevalência de fraturas desconhecida
• Melhora da DMO após cura da SC que pode levar 4-5 anos
7. Seguimento a longo prazo
8. Populações e considerações especiais
• O tratamento imediato do hipercortisolismo é mandatório nestas situações,
mesmo que o diagnóstico não esteja completo
• São recomendados tratamento específico de cada condição (tromboprofilaxia
e profilaxia para Pneumocystis jiroveci) especialmente em pacientes acamados
ou com dificuldade de locomoção e CLU > 5x
8. Populações e considerações especiais
• Adrenalectomia bilateral pode ser necessária em situação de risco de vida,
apesar de existirem poucos dados sobre este procedimento
• Se tratamento clínico não for suficiente para restaurar o eucortisolismo a
cirurgia deve ser considerada mesmo em pacientes de alto risco cirúrgico
• Inibidores da esteroidogênese (cetoconazol, metirapona, mitotano...)
podem ser usados mas em geral são necessárias combinações de
medicações
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