universidade cândido mendes pós

Propaganda
UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
AVM FACULDADE INTEGRADA
CONTRIBUIÇÕES DAS NEUROCIÊNCIAS NO
PROCESSO DE ENSINO-APRENDIZAGEM: ANÁLISE
DOS DIFERENTES ESTILOS DE ENSINAR E DE
APRENDER.
Por: Mônica de Souza Panasco
Orientador
Profa. Marta Pires Relvas
Rio de Janeiro
2012
2
UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
AVM FACULDADE INTEGRADA
CONTRIBUIÇÕES DAS NEUROCIÊNCIAS NO
PROCESSO DE ENSINO-APRENDIZAGEM: ANÁLISE
DOS DIFERENTES ESTILOS DE ENSINAR E DE
APRENDER.
Apresentação de monografia à AVM Faculdade
Integrada como requisito parcial para obtenção do
grau de especialista em Neurociência Pedagógica
Por: Mônica de Souza Panasco
3
AGRADECIMENTOS
.....Ao meus queridos pais e amigos, ao
meu amor, pelo apoio, atenção e
carinho; a minha orientadora Prof
a.
Marta Relvas; ao Prof. Luíz Machado,
meu
maior
incentivador
e
grande
amigo, e a todos que contribuiram para
meu crescimento e aprimoramento.
4
DEDICATÓRIA
Aos meus pais, que me fizeram chegar
ao
alto
da
montanha;
a
minha
orientadora, dedicada e especial, Marta
Relvas; ao Professor Luíz Machado,
amigo de todas as horas; ao meu Ludo
e aos meus amigos, por entenderem
que “...eu estive fora uns dias”
5
RESUMO
Este trabalho versa sobre os avanços das Neurociências no processo
de ensino-aprendizagem, com a finalidade de auxiliar professores e
aprendentes na prática educacional diária. O objetivo maior foi o de promover
a reflexão sobre as diferentes maneiras de ensinar e aprender, considerando
o indivíduo como ser único e dotado de aparato bio-psico-neurológico singular,
o que torna o ato de aprender especial e peculiar a cada ser aprendente.
Procurou-se, também, conceituar a Neurociência Pedagógica na
tentativa de esclarecer seu papel na Educação e como esta disciplina poderá
ser de grande valor para o processo de ensino-aprendizagem, considerando a
Educação como parte de num novo tempo, com novo olhar pedagógico.
Além disso, o entendimento do desenvolvimento e funcionamento do
cérebro e suas implicações no cotidiano educacional será ferramenta
primordial para promover as condições ideais para que os educadores possam
solucionar questões da prática educativa.
O Neuropedagogo é um profissional multidisciplinar, que está apto a ser
inserido no contexto educacional de maneira intensa e profunda, pois promove
a visão integrada da biologia do cérebro com aspectos pedagógicos do ensinar
e do aprender. Assim, o presente trabalho visa contribuir para o bom
entendimento da relevância de se conhecer as bases biológicas da cognição
humana buscando oferecer dados significativos para o aprimoramento da
compreensão da relação entre o cérebro e a aprendizagem.
6
METODOLOGIA
Este trabalho teve como procedimento metodológico a leitura de livros,
periódicos correntes, revistas científicas, bem como websites específicos.
A fundamentação teórica foi baseada em referências bibliográficas
relevantes, com a finalidade de discorrer sobre o assunto em pauta com
clareza e objetivando o esclarecimento das questões propostas.
A
metodologia
utilizada
caracterizou-se
como
uma
abordagem
exploratória do tema a ser pesquisado alicerçado em pesquisa bibliográfica
que seguiu a estratégia de revisão da literatura, bem como análise e reflexão
do conteúdo explorado.
7
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO
08
CAPÍTULO I
CONSIDERAÇÕES TEÓRICAS SOBRE APRENDIZAGEM
CAPÍTULO II
11
17
NEUROBIOMECANISMOS DO APRENDER: COMPREENDENDO
O CÉREBRO NO PROCESSO DO APRENDER
CAPÍTULO III
MEMÓRIA, APRENDIZAGEM E PLASTICIDADE CEREBRAL
27
CAPÍTULO IV
41
A INTELIGÊNCIA EM EVIDÊNCIA
CAPÍTULO V
54
O PAPEL DO CÉREBRO NA APRENDIZAGEM
CONCLUSÕES FINAIS
59
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA
62
8
INTRODUÇÃO
O conhecimento sobre o funcionamento do sistema nervoso humano,
considerando o cérebro como o protagonista, creceu demasiadamente nos
últimos anos, devido, especialmente, à chamada Década do Cérebro (19901999) assim proclamada pelo Congresso Americano, e que deu grande
impulso às neurociências, ou seja, aos diversos ramso das ciências que se
dedicam ás investigações e estudos sobre o sistema nervoso. As
neurociências estudam as moléculas que constituem os neurônios, os órgãos
do sistema nervoso e suas funções específicas e o comportamento humano
resultante da atividade dessas estruturas. Os avanços das técnicas de
neuroimagem e eletrofisiologia e aqueles obtidos pela genética e pela
neurociência cognitiva possibilitaram o estudo das áreas cerebrais envolvidas
em funções cognitivas específicas e esclareceram muitos aspectos do
funcionamento do sistema nervoso (Albright et al., 2000; Geake & Cooper,
2003).
Segundo Guerra (2011), embora os processos cognitivos ainda não
sejam integralmente conhecidos, devido às limitações técnicas e éticas que o
estudo do comportamento humano impõe, grandes descobertas que
permitiram uma abordagem mais científica do processo ensino-aprendizagem,
ultrapassaram os nichos acadêmicos e se estenderam à educação. Emerge
desse cenário, graças a ávida curiosidade por parte dos profissionais de
educação, a importância de pesquisas sobre a percepção, a atenção e a
memória, e de como poderiam ser informativas para a educação (Jesen,
2000). Desta forma, educadores e gestores de políticas públicas educacionais
tomaram conhecimento do cérebro como o órgão da aprendizagem e o quanto
as neurociências poderiam contribuir para a educação. Assim, no final da
década de 2000, foi estabelecido uma interface entre as neurociências e a
educação, denominada de “mind, brain and education” ou “mente, cérebro e
educação” (OCDE, 2003; Goswani, 2005, 2004;Stern, 2005 ). Desta forma, a
partir do momento em que os cientistas reconheceram a necessidade de um
trabalho conjunto na pesquisa sobre o cérebro e a educação, torna-se de
9
grande importância entender a diferença entre conhecer os mecanismos
cerebrais, compreender os processos mentais resultantes destes e aplicá-los
na prática pedagógica.
Igualmente, compreende-se que é imprescindível a investigação,
rigorosa e científica, dos achados das neurociências aplicados à sala de aula,
antes que se estabeleça qualquer aplicação educacional, pois conhecer a
aprendizagem numa perspectiva neurobiológica pode auxiliar, em especial,
educadores e professores a abarcar alguns aspectos das dificuldades de
aprendizagem, bem como inspirar práticas educacionais cotidianas visando
não somente a construção do conhecimento, bem como a construção de
habilidades e competências individuais.
O desenvolvimento de técnicas modernas para o estudo a atividade
cerebral em crianças, adolescentes e adultos, durante a realização de tarefas
cognitivas, vem permitindo uma investigação mais precisa dos circuitos
neuronais durante o seu funcionamento. Os circutos neuronais são
responsáveis pelas funções básicas do sistema nervoso e determinam o
comportamento dos indivíduos, de acordo com as emoções vivenciadas
(prazer, medo, raiva etc). A habilidade do ser humano de pensar e armazenar
lembranças depende de atividades físico-químicas complexas que ocorrem nos
circuitos neuronais existentes no cérebro e medula espinhal, os quais
programam todos os movimentos - finos e grosseiros. Este entrelaçado de
processos neuronais também controla inúmeras funções no organismo
humano, como por exemplo, a manutenção da temperatura corporal e a
pressão sanguínea, que são controlados automaticamente. Conhecer o como
o cérebro funciona é essencial para o aprendizado e a memória dos
educandos, pois a aprendizagem e a educação estão intimamente ligadas ao
desenvolvimento do cérebro, o qual é moldável aos estímulos ambientais. Com
efeito, os estímulos do ambiente levam os neurônios a formarem novas
sinapses. Assim, entende-se que a aprendizagem é o processo pelo qual o
cérebro reage oas estímulos do ambiente, ativando sinapses, tornando-as mais
intensas. Como consequência, estas se constituem em circuitos que
processam as informações, com capacidade de armazenamento molecular.
10
O estudo da aprendizagem une educação com as neurociências,
especialmente no tocante ao estudo da neurociência cognitiva, que utiliza
vários métodos de investigação a fim de estabelecer relações entre cérebro e
cognição em áreas relevantes para a educação.
Este trabalho visa discutir a aprendizagem por intermédio de um breve
estudo das funções neurais no processamento das informações para melhor
compreender os diferentes estilos de aprendizagem sob o ponto de vista dos
avanços das neurociências, averiguando aspectos da inteligência, da memória
e das emoções.
11
CAPÍTULO I
A principal meta da educação é criar homens que sejam capazes de fazer coisas novas, não
simplesmente repetir o que outras gerações já fizeram. Homens que sejam criadores,
inventores, descobridores. A segunda meta da educação é formar mentes que estejam em
condições de criticar, verificar e não aceitar tudo que a elas se propõe."
Jean Piaget
Considerações teóricas sobre aprendizagem:
O processo de aprendizagem foi estudado por vários teóricos,
destacando-se as contribuições de Albert Bandura, Alexander Luria, Erik
Erikson, Henri Wallon, Jean Piaget, Lev Vygotsky e Urie Bronfenbrenner. Para
Bandura, os processos que compõem a aprendizagem por observação são: a
atenção, que pressupõe tanto a clareza dos estímulos quanto a motivação do
aprendiz; a retenção, que acontece por meio da codificação simbólica; a
organização cognitiva, isto é, os ensaios simbólicos e motor; a reprodução
motora, que inclui capacidades físicas, auto-observação da reprodução e
exatidão do retorno; e a motivação, que agrega o reforço externo e o individual
(Alvarez & Lemos, 2006). Bandura defendeu a teoria social cognitiva, onde a
criança interpreta ativamente os acontecimentos. Ele enfatizou a importância
da observação e da modelagem dos comportamentos, que refletem nas
atitudes e respostas emocionais.
Já Bronfenbrenner afirmou que o
desenvolvimento se dá num contexto de sistemas interligados, desde
microssistema (pais, irmãos e adultos próximos à criança), até chegar ao
macrossistema (culturas e subculturas de um povo), passando pela escola,
mídia, etc. Erikson desenvolveu a teoria psicossocial de desenvolvimento,
postulando que o desenvolvimento se dá em todas as fases da vida. Em cada
fase da vida, o indivíduo captará o mundo externo como acolhedor ou
agressivo, dependendo de como suas necessidades internas são bem ou mal
resolvidas. Se o bebê é bem alimentado pela mãe nos seus primeiros meses,
estará sempre limpo e manterá com os adultos um bom contato, desenvolverá
um sentimento de confiança básica no mundo. Desta forma, verá o mundo
como um lugar bom e acolhedor. Caso contrário, verá o mundo com reserva e
passará a sentir desconfiança básica em relação ao mundo. Assim se dão para
Erikson todas as etapas de desenvolvimento. A cada etapa um desafio a ser
12
enfrentado, e a cada sucesso, uma maior autonomia e confiança para
enfrentar novos desafios.
Segundo Luria, a dinâmica do comportamento
humano compreende a interconexão de múltiplas redes de informação
dispersas pelo corpo: periféricas (pele, músculos, articulações e vísceras) e
centrais (mielencefálicas, metencefálicas, mesencefálicas, diencefálicas e
telencefálicas), que retratam a existência de um sistema sensorial na base do
desenvolvimento e da aprendizagem. O desenvolvimento evolutivo dos seres
humanos exige a organização das sensações para fornecer ao cérebro as
informações referente às condições do corpo como universo intrassomático e
do envolvimento como universo extrassomático, com os quais produz uma
motricidade adaptativa e flexível (Luria, 1966 apud Freitas, 2006). Este mesmo
autor retrata que o processo de construção do conhecimento evoca que as
sensações devem integrar-se em esquemas de ação, o que requerer a
participação da percepção e a estruturação das representaçãoes mentais.
Desse modo, o homem tem a capacidade de agir sobre o mundo, acomodar-se
a ele, diferenciar-se qualitativamente e não apenas captá-lo passivamente. As
sensações
encontram-se
na
base
do
processo
de
construção
do
conhecimento, e são conduzidas centrípetamente ao cérebro. Desde os órgãos
internos, chamados de interoceptores; dos órgãos motores, táteis, cinestésicos
e vestibulares, designados de proprioceptores, até os órgãos captadores de
informações, como a visão e a audição, denominados de telerreceptores, todas
as informações devem ser organizadas em termos de tráfego de integração
sistêmica no cérebro. A partir daí, integram-se sistemas funcionais intra e
interneurossensoriais, que se encontram na base da aprendizagem e do
desenvolvimento (Luria, 1966 apud Freitas, 2006).
Piaget
demonstrou
que
a
aprendizagem
é
um
processo
cognitivamente ativo e interativo, que o conhecimento é algo a ser construído,
e não passivamente recepcionado. Defendendo a idéia de que a estrutura
cognitiva funciona através do movimento contínuo, onde a aprendizagem é
assimilada, filtrada e interpretada segundo a capacidade da estrutura cognitiva
interna do indivíduo. Por defender a idéia de que a inteligência é construída
pelo indivíduo, por meio da interação com o ambiente, sua teoria recebeu a
denominação de Construtivismo. A teoria piagetiana profere que uma criança
13
interage com o mundo diferentemente de um adulto, pelo simples motivo de
que suas estruturas cognitivas são qualitativamente diferentes.
Segundo
Piaget,
o
processo
de
interação/construção
da
inteligência compreende a influência de quatro fatores:
·Maturação orgânica – o desenvolvimento do sistema nervoso e
suas conexões nervosas são de extrema relevância para a formação das
estruturas cognitivas, embora condição necessária, mas não suficiente.
·Experiência - as manipulações físicas e cognitivas do sujeito
sobre os objetos permitem a construção do conhecimento e a possibilidade de
operar mentalmente com ele.
·Transmissão social – as informações advindas do meio fazem a
criança e o adolescente interrogarem os acontecimentos da realidade.
·Equilibração – o desenvolvimento da inteligência caracteriza-se
pelo movimento contínuo de um estado de desequilíbrio para um estado de
equilíbrio.
Segundo o construtivismo, o conhecimento se constrói na interação do
sujeito com o objeto. As estruturas não estão pré-formadas dentro do sujeito,
mas são construídas, ocorrendo uma construção contínua de estruturas
variadas.
A aprendizagem, decorrente da interação adaptativa do sujeito com o
objeto, é construída segundo diversos estágios do desenvolvimento cognitivo:
·Senso-motor (0-24 meses) – neste estágio a criança é
desprovida de linguagem, interagindo com os objetos a partir de suas
sensações e ações motoras.
·Pré-operatório (2 a 7 anos) – a criança desenvolve a capacidade
simbólica, caracterizando-se pelo egocentrismo, onde a criança ainda não se
mostra capaz de colocar-se na perspectiva do outro.
14
·Operações concretas (7 a 11 ou 12 anos) – neste período, a
criança adquire a capacidade de estabelecer relações e coordenar pontos de
visa diferentes, próprios e do outro, e de integrá-los de modo lógico e coerente.
·Operações formais (11 ou 12 anos em diante) – nesta fase a
criança amplia as capacidades conquistadas anteriormente, conseguindo
raciocinar sobre hipóteses,na medida em que ela é capaz de formar esquemas
conceituais abstratos, e através desses esquemas, executar operações
mentais dentro de princípios da lógica formal.
De acordo com a tese piagentina, ao atingir a fase de operações
formais, o indivíduo adquire sua forma final de equilíbrio, alcançando o padrão
intelectual que persistirá durante a idade adulta, e que seu desenvolvimento
posterior consistirá numa ampliação de conhecimentos, e não na aquisição de
novos modos e funcionamento mental.
Vygotsk, pesquisador russo dos processos de aprendizagem, postulou
que aprendizagem é o processo pelo qual o indivíduo adquire informações,
habilidades, atitudes, valores, etc a partir de seu contato com a realidade, o
meio ambiente e com as outras pessoas. Segundo este teórico, é o
aprendizado que possibilita o despertar de processos internos do indivíduo,
ligando o desenvolvimento da pessoa à sua relação com o ambiente sóciocultural em que vive, e reconhece que a situação do homem como organismo
não desenvolve plenamente sem o suporte de outros indivíduos de sua
espécie. As características de cada indivíduo vão sendo formadas a partir das
inúmeras e constantes interações do indivíduo com o meio, compreendido
como contexto físico e social, que incluem as dimensões interpessoais e
culturais. Nesse processo dinâmico, ativo e singular, o indivíduo estabelece,
desde o seu nascimento e durante toda a sua vida, trocas recíprocas com o
meio, já que, ao mesmo tempo em que internaliza as formas culturais, as
transforma e intervém no universo que o cerca. Assim, as características do
funcionamento psicológico como o comportamento de cada ser humano são,
nesta perspectiva, construídos ao longo da vida do indivíduo através de um
processo de interação com o seu meio social, que possibilita a apropriação da
cultura elaborada pelas gerações precedentes.
15
Vygotsky enfatizava o processo histórico-social e o papel da linguagem
no desenvolvimento do indivíduo. Sua questão central é a aquisição de
conhecimentos pela interação do sujeito com o meio. Para Vygotsky , o sujeito
é interativo, pois adquire conhecimentos a partir de relações intra e
interpessoais e de troca com o meio, a partir de um processo denominado
mediação. Além disso, Vygotsky preconizava que não é suficiente ter todo o
aparato biológico da espécie para realizar uma tarefa se o indivíduo não
participa de ambientes e práticas específicas que propiciem a esta
aprendizagem.
A teoria desenvolvida por Vygotsky tem como base a
construção sócio-histórica ou histórica-cultural da mente humana. O seu
enfoque centrava-se na questão de como os fatores sociais e culturais
influenciavam o desenvolvimento intelectual, a aquisição de conhecimentos
pela interação do sujeito com o meio. O núcleo central de sua teoria trata de
como os indivíduos, interagindo com colegas e com instrutores, constroem e
internalizam o conhecimento.
Na concepção de Vygotsky, todo ser humano se constitui um "ser" pelas
relações que estabelece com os outros seres humanos. O sujeito é interativo,
porque forma conhecimentos e se constitui a partir de relações intra e
interpessoais. É na troca com outros sujeitos e consigo próprio que se vão
internalizando conhecimentos, papéis e funções sociais, o que permite a
formação do conhecimento e da própria consciência. A aprendizagem é o
processo pelo qual o indivíduo adquire informações, habilidades, atitudes e
valores a partir de seu contato com a realidade, com o meio ambiente e com
pessoas.
A teoria pedagógica de Wallon preconiza que o desenvolvimento
intelectual envolve muito mais do que um simples cérebro. Wallon foi o
primeiro a levar não só o corpo da criança, mas também suas emoções para
dentro da sala de aula. Fundamentou suas idéias em quatro elementos básicos
que se comunicam o tempo todo: a afetividade, o movimento, a inteligência e a
formação do eu como pessoa. Wallon considerava o desenvolvimento da
pessoa completa integrada ao meio em que está imersa, com os seus
aspectos
afetivo,
cognitivo
e
motor.
A
proposta
walloniana
põe
o
desenvolvimento intelectual dentro de uma cultura mais humanizada. A
16
abordagem é a de considerar a pessoa como um todo. Elementos como
afetividade, emoções, movimento e espaço físico se encontram num mesmo
plano. As atividades pedagógicas e os objetos, assim, devem ser trabalhados
de formas variadas.
17
CAPÍTULO II
O saber que não vem da experiência não é realmente saber.
Lev Vygotsky
Neurobiomecanismos do Aprender: compreendendo o cérebro no
processo do aprender
Aprender é um processo constante e ininterrupto, pois, ao longo da vida,
se aprende a todo o momento, a todo instante. O cérebro é descrito como
sendo um sistema dinâmico, que, no nascimento, dispõe de um estoque básico
de saber prévio, e começa, de imediato, a dirigir perguntas ao exterior. Desta
forma, o fluxo das informações provenientes dos sentidos e a interação
dinâmica e constante com o meio, determinarão como o cérebro irá se
desenvolver.
A aprendizagem não significa simplesmente absorção de conteúdos,
mas para que estes conteúdos se concretizem, é necessário a interação de
uma rede de operações neurofisiológicas e neuropsicológicas que associam,
combinam e organizam estímulos fornecidos pelo meio e
a eles dêem as
respostas mais adequadas, assimilações e fixações que possibilitem futuras
evocações. Além disso, deve-se considerar os processos cognitivos internos,
ou seja, como o indivíduo elabora os estímulos recebidos, sua capacidade de
integrar informações e processá-las, formando uma rede complexa de
representações mentais, que possibilite a resolução de problemas; a aquisição
de conceitos novos e a interpretação de símbolos (Alvarez & Lemos, 2006).
Em conssonância com a neurociência cognitiva, cujo foco de atenção é
a compreensão das atividades cerebrais e dos processos cognitivos, a
aprendizagem humana não decorre de um simples armazenamento de dados
perceptuais, mas sim do processamento e elaboração das informações
oriundas das percepções no cérebro (Carvalho, 2011). Neste sentido,
processos de aprendizagem modelam o cérebro dotado de conexões neurais
em constante reorganização, mediante o fortalecimento ou enfraquecimento de
sinapses. No cérebro, há neurônios prontos para a estimulação, pois tudo o
que é aprendido altera a rede neuronal. A atividade mental estimula a
18
reconstrução de conjuntos neurais, processando experiências vivenciais, num
fluxo e refluxo de informações. A multiplicação dos estímulos exteriores
detrermina qual será a complexidade de ligações entre as células nervosas e
como elas se comunicarão entre si. É somente quando o desenvolvimento do
cérebro é determinado por aquilo que se aprendeu e experimentou que a
adaptação do cérebro ao meio ambiente se dá de forma ideal (Prigenzi, 2009;
Carvalho, 2011). A aprendizagem, portanto, é o processo em virtude do qual se
associam coisas ou eventos no mundo, graças a qual adiquirimos novos
conhecimentos. Nos seres humanos, a percepção do mundo está relacionada
à interpretação de fenômenos que envolvem os sentidos e a memória. Os
processos de aprendizagem e memória modificam o cérebro e a conduta do
ser que os experimenta (Mora, 2004). A memória envolve não somente as
percepções, ações e objetivos, com também sentimentos, imaginação e
trajetória do pensamento. As experiências sensoriais deixam traços no cérebro
ao alterar a eficácia dos contatos sinápticos entre neurônios, fortalecendo a
estrutura das redes neuronais.
De fato, quanto mais recursos forem empregados na transmissão de
uma informação, tanto melhor esta informação será fixada na memória, que é
responsável pelo amazenamento de informações e pela evocação daquilo que
está armazenado. A aprendizagem requer competências para lidar de forma
organizada com as informações novas, ou com aquelas previamente
armazenadas no cérebro, a fim de realizar novas ações. Segundo Lent (2001),
é através do processo de aquisição de novas informações que o homem é
capaz de orientar o comportamento e o pensamento. Para Maturana e Varela
(2001), a aprendizagem surge de um acoplamento estrutural: as informações
recípocras entre o indivíduo e o meio fazem surgir mudanças estruturais na
organização do ser vivo e do contexto que está inserido; perante as
informações, o organiosmo opera com propriedades emergentes, a fim de se
adaptar às condições presentes no processo do conhecer. Além disso, deve-se
ressaltar que as emoções desempenham um papel determinante na
aprendizagem.
A neurobiologia mostra que se aprende melhor quando o
objeto do aprendizado tem um conteúdo emocional. São as emoções que
orientam a aprendizagem. Neste sentido, o sistema límbico, formado pelo
19
tálamo, hipotálamo, giro cingulado, amígdala e hipocampo, exerce papel
fundamental na avaliação as informações, decidindo que estímulos devem ser
mantidos ou descartados, dependendo da retenção da informação no cérebro
e da intensidade da impressão provocada nele. A consciência da experiência
vivenciada é atingida quando, ao passar pelo córtex cerebral, compara-se a
experiência com reflexões anteriores. Desta forma, quando se estabelece uma
ligação entre a informação nova e a memória preexistente, alguns
neurotransmissores como a acetilcolina e a dopamina são liberados
amentando o sentimento de satisfação. É deste modo, então, que a emoção e
a motivação influenciam na aprendizagem. (Carvalho, 2011). As emoções são,
portanto, componentes essenciais ao funcionamento cognitivo e à aquisição de
conhecimento.
2.1 – Funcionamento do sistema nervoso humano no processo de
aprendizagem.
Aprende-se desde o útero materno e se tem a capacidade de aprender
sempre porque o cérebro humano se adapta, estabelecendo novas conexões
neuronais a cada nova aprendizagem. Atuamente é sabido que o feto com 27
semanas se acostuma a sons, tonalidades e entonação da língua materna. O
feto ouve, no útero da mãe, não só o bater de seu coração, os sons de seus
órgãos em funcionamento, mas também a voz da mãe. Os outros sons do
ambiente, no progresso da gestação, vão passar a se incorporar aos
conteúdos que o feto pode ouvir. Aos quatro dias de nascido, o bebê pode não
só reconhecer a voz de sua mãe, como também demonstra preferência em
ouvir a língua materna, talvez pelo fato de que esta já lhe ser familiar (Alvarez
& Lemos, 2006).
O sistema nervoso possibilita que os organismos percebam, se adaptem
e interajam com o mundo. Entre as diversas estruturas que o compõem, o
cérebro é o mais bem investigado, pois é por seu intermédio que recebemos e
processamos a informação ambiental e respondemos a ela. Uma das questões
mais
importantes
no
processo
da
organização
cerebral
é
a
da
neuroplasticidade, ou seja, propriedade do sistema nervoso de alterar a sua
20
função ou a sua estrutura, em resposta às influências ambientais que o
atingem (Lent, 2008). Autores como Le Doux (2002) e Ridley (2004), defendem
que a neuroplasticidade é uma característica determinada inatamente. Isso
significa que, se o sistema pode codificar experiências, só o faz porque possui
uma capacidade inata para formar sinapses capazes de gravar e armazenar
informações. Na verdade, o sistema nervoso é “construído” durante o
desenvolvimento embrionário e pós-natal obedecendo a regras básicas
expressas pelo genoma de cada espécie, mas de modo extremamente
suscetível a modulações por parte do ambiente. Essa interação entre as
informações do genoma e as informações do ambiente resulta na plasticidade
ontogenética, possivelmente a fonte mais importante de variabilidade individual
nos animais, extremamente significativa na espécie humana. De certa forma,
toda aprendizagem depende de operações de capacidades programadas
geneticamente para aprender (Lent, 2008; Otta & Yamamoto, 2009). Aprender
coisas novas, ligar as informações novas com as já guardadas na memória,
relacionar umas às outras, elaborar conclusões, tudo isso só é possível graças
à capacidade de memorização e de interface entre informações, o que ocorre
por um processo neurobioquímico, sináptico, no sistema nervoso do ser
humano.
21
2. 2 – A trajetória da evolução do cérebro
O cérebro evoluiu de baixo para cima. O modelo do cérebro triuno
proposto por Paul Mclean em 1967 sugere que o cérebro humano, ao
desenvolver-se, conservou as áreas dos cérebros dos predecessores. Através
do processo de mutação aleatória e de sobrevivência dos mais aptos, a
evolução fez alguns retoques nos que havia anteriormente para chegar ao
mais adaptativo mecanismo existente no universo. A base do cérebro,
chamado cérebro reptiliano (complexo R ou formação reticular), é o local onde
estão localizados os centros de comando para a vida. Eles controlam o sono e
a vigília; a respiração e a regulação da temperatura; os movimentos
automáticos básicos, e funcionam como subestações intermediárias para a
transmissão da informação (input) sensorial. Esta estrutura cerebral está
diretamente
relacionada
aos
instintos
primitivos
e
agressivos
do
comportamento humano, os quais precisam ser educados, pois do contrário,
prevalecerão.
O cérebro intermediário é a unidade cerebral responsável pelas
emoções dos velhos mamíferos, o cérebro paleomamífero, formado pelas
estruturas do sistema límbico e corresponde ao cérebro dos mamíferos
inferiores. Promove a sobrevivência, refina, emenda e coordena os
movimentos. Além disso, é o local do desenvolvimento dos aparelhos para a
memória e as emoções, os quais melhoram e realçam ainda mais a regulação
interna do corpo, ao mesmo tempo em que começam a interagir com o mundo
social. É com esse cérebro que aprendemos a cuidar das crias, com relação
afetiva.
O cérebro superior ou cérebro racional ou cérebro do neomamífero é a
unidade cerebral responsável pelas tarefas intelectuais dos novos mamíferos,
e compreende a maior parte dos hemisférios cerebrais. Esta área é
responsável pela rigorosa afinação das funções inferiores, pelas associações,
pelo pensamento abstrato e capacidade de planejamento. É o cérebro dos
mamíferos superiores, incluindo os primatas, e consequentemente, o homem
moderno Homo sapiens (Ratey, 2001; Relvas, 2010).
22
Modelo esquemático do Cérebro Triuno de Paul
MacLean.
Fonte: http://www.igooh.com/notas/teoria-del-cerebro-triuno-de-paul-maclean/
Fig 1. Modelo do Cérebro Triuno propsoto por Paul MacLean.
Fonte: http://dericbownds.net/bom99/Ch03/Ch03.html
2.3 – Componentes anatômicos envolvidos na aprendizagem
Os aspectos anatômicos ou estruturais do sistema nervoso central
envolvidos na aprendizagem são importantes para o entendimento do ato de
aprender, tanto em condições normais como patológicas.
O sistema nervoso
humano é formado por uma estrutura tubular que tem uma porção dilatada, o
encéfalo ou cérebro, ou sistema nervoso superior, que continua num cilindro
formando a medula espinhal. O sistema nervoso é um sistema integrativo por
excelência, portanto, funciona com a cooperação integrada de todos os seus
elementos celulares – os neurônios e os gliócitos. Estes tipos celulares se
comunicam extensamente, formando uma rede morfológica e funcional de alta
complexidade, capaz de gerar sinais, conduzí-los localmente e a distância,
transmití-los simultaneamente a milhares de outras células e modificá-los de
inúmeras maneiras, em um complexo processo de integração de informações.
De fato, neurônios são células especializadas que processam
informações, sendo capazes de gerar sinais bioelétricos de cominicação, os
23
chamados potenciais de ação, que representam a unidade de informação
(Lent, 2001). Neurônios são células que desencadeiam informações sobre o
estado interno do organismo e seu ambiente externo, avaliam estas
informações
e
coordenam
atividades
apropriadas
à
situação
e
às
necessidades dos indivíduos (Relvas, 2009). Apesar da garnde variação em
tamanho e formato nas diferentes partes do sistema nervoso, todos os
neurônios possuem a mesma estrutura básica. O neurônio consiste em um
grande corpo celular, ou soma, que contém a maquinaria metabólica que o
mantém. Os componentes da maquinaria incluem um núcleo, retículo
endoplasmático, ribossomos, mitocôndria, aparelho de Golgi, dentre outras
organelas. Além do corpo celular, os neurônios tmabém possuem processos
especializados, o axônio e um ou mais dendritos. Os dendritos são
prolongamentos altamente ramificados, semelhantes a arborizações, que
recebem aferências de outros neurônios em locais denominados sinapses. Em
geral, os dendritos funcionam como os sítios principais de entrada de
informações (recepção de estímulos) no neurônio (Young et al, 2007;
Gazzaniga et al, 2006). Cada neurônio possui um axônio, que representa a via
de saída do neurônio, através do qual os sinais elétricos podem se propagar
aos terminais axonais, onde se localizam as sinapses.
Além dos neurônios, o sistema nervoso apresenta-se constituído de
células gliais cuja função é dar sustentação aos neurônios e auxiliar o seu
funcionamento. Embora não sejam capazes de transmitir sinais elétricos,
possuem uma grande importância no funcionamento do sistema nervoso. As
células gliais são responsáveis por toda a “infra-estrutura” de funcionamento do
sistema nervoso. Estas células são capazes de fornecer suporte, nutrição,
excreção, bem como de uma série de processos homeostáticos necessários à
sobrevivência dos neurônios. A Neuroglia é responsável também pela
formação da mielina. De fato, os gliócitos possuem diversas funções. Tais
funções derivam da forma que as células assumem, assim como o tipo de
função que exercem: astrócitos e oligodendrócitos atuam no sistema
nervoso central enquanto que as células de Schwann e as células satélites
atuam no sistema nervoso periférico. As células microgliais atuam tanto no
sistema nervoso central como no sistema nervoso periférico.
24
Fig 2. Neurônio - estrutura básica
Fonte: http://www.portalsaofrancisco.com.br/alfa/corpo-humano-sistema-nervoso/neuronios-1.php
Fig3. Células da Glia
http://www.infoescola.com/citologia/celulas-da-glia/
Em uma visão neurobiológica da aprendizagem, deve-se considerar
que, no caso dos humanos, o lobo pré-frontal é responsável tanto pela
intercomunicação cerebral como pelo que se tem de humano, como:
comportamento, julgamento, planejamento e execuções complexas. Quando
ocorre ativação de uma área cortical, determinada por um estímulo, há
alteração em outras áreas cerebrais, visto que o cérebro funciona de modo
global, pois existem diversas vias de associação organizadas de tal forma a
garantir a comunicação nas várias áreas corticais.
25
Segundo Relvas (2010), as associações recípocras entre as
diversas áreas corticais asseguram a coordenação entre a
chegada de impulsos sensitivos, sua decodificação e
associação, até a atividade motora resposta, a qual
denomina-se
de
funções
nervosas
superiores,
desempemhadas pelo córtex cerebral.
Lobo frontal - o córtex pré-frontal está relacionado com as
funções superiores representadas por diversos aspectos do
comportamento humano. É a região que recebe impulsos
nervosos dos lobos parietal e temporal por meio de feixes de
longas fibras de associações situadas no giro cingulado. O
córtex pré-frontal é responsável por algumas funções como:
fala, escrita, função motora e psicomotora, memória imediata,
seriação, ordenação, planificação, programação, mudança de
atividade mental, controle emocional, motivação, estruturação
espacial e temporal.
Lobo temporal – o lobo temporal posterior está relacionado
com a recepção e decodificação de estímulos auditivos, que
se coordenam com impulsos visuais; a porção anterior está
relacionada com a atividade motora visceral (olfação e
gustação) e com alguns aspectos de comportamentos
isntintivos. O lobo temporal é responsável por algumas
funções como: estímulos auditivos, não-verbal e verbal,
percepção
auditiva-verbal
interpretação
pictural,
e
visual,
interpretação
memória
auditiva,
espaço-temporal,
discriminação e sequenciação auditiva e integração rítmica.
Lobo parietal – relacionado à interpretação, à integração de
informações visuais e à somatossensitivas, principalmente o
tato. O lobo parietal é responsável por algumas funções
como: registro tátil, imagem do corpo, reconhecimento tátil de
formas
e
objetos,
direcionalidade,
processamento espacial.
leitura,
imagem
e
26
Lobo occipital – esta região realiza a integração visula a
partir da recepção dos estímulos que ocorrem nas áreas
primárias. Leva informações para serem apreciadas e
decodificadas nas áreas secundárias e de associação visual.
Estes centros visuais são conectados por fibras intrahemisféricas ao córtex parietal do mesmo lado, bem como a
outras áreas corticais, tais como ao lobo temporal, para
outras atividades integradoras. O lobo occipital é responsável
por algumas funções como: estimulação visual, percepção
visual, sequenciação visual, rotação e perseguição visual.
Tronco encefálico – responsável pela atenção, vigilância,
integração neurossensorial motora, integração vestibular,
integração tônica.
Cerebelo – coordena os movimentos automáticos e
voluntários, segurança, proprioceptividade e regulação de
padrões motores.
Na escala evolutiva, o homem, entre os mamíferos, é o ser que mais
desenvolveu o lobo pré-frontal, indicando que nossa evolução se estabeceu (e
estabelece) pela necessidade de novas aprendizagens. Ao longo de sua
evolução, o homem humanizou-se, transformou-se em um ser que lança mão
do pensamento e, na medida em que começou a interagir cuturalmente com
mundo, encontrou formas mais eficazes de adaptação. Tudo isso só foi
possível graças a capacidade do homem de aprender, de acumular
conhecimentos, e de utilizar esses conhecimentos apreendidos para
desenvolver técnicas que o auxiliam no enfrentamento das adversidades.
Pedagogicamente, a motivação, o envolvimento entre o aprendiz, o
professor e o conteúdo, a compreensão do funcionamento cerebral, são
fundamentais para que se garanta uma aprendizagem ágil e eficiente.
27
CAPÍTULO III
MEMÓRIA, APRENDIZAGEM E PLASTICIDADE CEREBRAL
“A mente do homem, uma vez expandida por uma nova idéia, nunca recupera suas dimensões originais”.
Oliver Wendell Holmes, Jr.
3.1 - Memória
Memória é o processo de aquisição, formação, conservação e evocação
de informações. A fase de aquisição é também chamada de aprendizagem. A
evocação é também chamada de recordação, lembrança, recuperação (Lent,
2008; Izquierdo, 2002). A memória envolve não somente percepções, ações e
objetivos, como também sentimentos, imaginação e trajetória do pensamento.
A memória de um indivíduo constitui o conjunto de experiências acumuladas
no cérebro, o que, em última análise, irá constituir a identidade. Lent (2001)
acrescenta que a memória ativada através das linguagens perceptivas (as
quais desempenham papel fundamental na aprendizagem), caracterizam
estratégias mentais de retenção e evocação das memórias, sendo utilizadas
para gravar, classificar, relacionar, criar e recuperar pensamentos, idéias e
experiências.
Pesquisas recentes na área de aprendizagem e memória postulam que
o sistema nervoso atua em bloco para alcançar o aprendizado e a memória, e
lesões corticais produzem déficits cognitivos que aumentam em gravidade a
depender do tamanho da lesão. Atualmente, parece claro que tipos específicos
de tarefas são aprendidos dentro de regiões cerebrais específicas. Essa visão
surgiu a partir do estudo de indivíduos com lesões cerebrais muito delimitadas,
acompanhadas por déficits de memória muito característicos – trabalho que
tem sido confirmado em experimentos com animais. Os primeiros estudos se
concentraram no papel do hipocampo para o aprendizado e a memória. As
lesões do hipocampo impedem o surgimento de novas memórias de um tipo
específico, o tipo de memória que utilizamos para aprender novos fatos ou
eventos. Surpreendentemente, outros tipos de memória permaneceram
Intactas, o que motivou pesquisadores a proporem duas grandes formas de
28
memória: a memória para fatos e evento, chamada de memória declarativa
(explícita) e a não-declarativa ou memória implícita, pois resulta
diretamente da experiência.
As memórias explícitas são aquelas sobre as quais podemos falar,
como o jantar de ontem à noite ou a data de um acontecimento histórico. Tais
memórias envolvem o pensamento consciente. Sabe-se que o hipocampo é
necessário para a aquisição desses tipos de memórias, pois as lesões nessa
região impedem os indivíduos de estabelecerem novas memórias explícitas.
Memórias implícitas são, normalmente, memórias de procedimentos ou
associativas em sua natureza e freqüentemente são adquiridas de forma
inconsciente ( Bear et al, 2008; Lombroso, 2004).
3.1.2 Classificação dos tipos de Memórias
1.
Memória
declarativa
(explícita),
referente
aoconhecimento
evocado conscientemente por meio de imagens ou proposições. Está
subdividida em: memória para fatos – relativa ao conhecimento semântico
sobre informações gerais; memória para eventos – relativa a episódios
específicos temporal e espacialmente localizados.
2. Memória não-declarativa (implícita), pela qual o conhecimento é
manifesto por meio do desempenho, sem que o sujeito tenha consciência de
possuí-lo. Está subdividida em: memória associativa – memória motora para
habilidades, alteração de desempenho (pré-ativação) e condicionamento
clássico; memória não-associativa (habituação e sensibilização).
Os processos associativos foram inicialmente estudados com
procedimentos de laboratório conhecidos como condicionamento clássico e
condicionamento operante (Kandel,1991). Os estudos com condicionamento
clássico tiveram início em 1902, com Ivan Pavlov (Sá & Medalha, 2001 apud
Millenson,1967). A partir de seus estudos sabe-se que a base do
condicionamento clássico é a associação entre dois estímulos. Em condições
29
experimentais, a apresentação de um alimento (estímulo incondicionado) a um
animal provoca salivação (resposta incondicionada). O condicionamento ocorre
quando um estímulo neutro (somou luz, por exemplo), denominado estímulo
condicionado, é emparelhado com o estímulo incondicionado. Então, quando o
estímulo condicionado é apresentado antes do estímulo incondicionado a
resposta condicionada é gerada durante a vigência do estímulo condicionado.
Do mesmo modo, Skinner desenvolveu condições experimentais para
o condicionamento operante ou instrumental (Sá & Medalha, 2001 apud
Millenson,1967. Os animais eram colocados em um compartimento de onde
podiam pressionar uma barra a fim de receberem uma recompensa. O
condicionamento operante baseia-se na probabilidade de ocorrência futura de
uma resposta, quando ela é seguida por um reforço. A habituação e a
sensibilização são duas formas de aprendizagem não-associativas. Na
habituação ocorre a redução da força de uma reposta a um estímulo inócuo. A
sensibilização é o aumento da força da resposta a uma variedade de estímulos
seguidos por um outro estímulo intenso (Sá & Medalha, 2001 apud Kandel,
1995). A maior parte do progresso no estudo celular da forma de
aprendizagem implícita vem do estudo do sistema nervoso de invertebrados e
vertebrados
simples,
que
apresentam
modificações
comportamentais
(habituação, sensibilização, condicionamento clássico e operante). A maioria
dessas alterações envolve modificações nas conexões sinápticas. Esse tipo de
análise foi inicialmente feito utilizando a
Aplysia californica como sujeito
experimental. Esse animal foi considerado um bom sujeito experimental por
possuir um sistema nervoso simples para se estudar a mediação neural dos
reflexos em nível celular. Atualemte se conhecem várias das alterações no
sistema nervoso decorrentes da relação dos organismos com o meio ambiente,
ou seja, da aquisição da experiência pelo processo de aprendizagem. Com o
estímulo do sistema nervoso ocorrem inicialmente alterações neuroquímicas,
tais como o aumento da produção e liberação de neurotransmissores e o
aumento da sensibilidade dos receptores pós-sinápticos. Os mecanismos
cerebrais de memória e aprendiza gem estão ligados aos processos neurais
responsáveis pela atenção, motivação e outros processos neuropsicológicos,
30
de forma que perturbações nos mesmos afetam de alguma maneira a
aprendizagem e a memória.
Outro conceito que surgiu das pesquisas sobre o aprendizado e a
memória é que a formação das memórias de longo prazo necessita de
modificações estruturais e outras modificações funcionais nos neurônios. Uma
série de achados críticos mostrou que o aprendizado necessita de alterações
morfológicas em pontos especializados dos contatos neuronais, as sinapses.
Há evidências que as sinapses se alteram com o aprendizado – novas
sinapses são formadas e antigas se fortalecem. Esse fenômeno, denominado
plasticidade sináptica, é observado em todas as regiões do cérebro. Além
disso, sinais elétricos denominados potenciais de ação trafegam através do
processo axonal do neurônio para atingir a sinapse. Ao chegar ao final do
axônio, denominado terminal pré-sináptico, vesículas microscópicas rompemse e liberam neurotransmissores na fenda sináptica (o espaço entre dois
processos neuronais). Estes se difundem através da estreita fenda sináptica e
se ligam aos receptores específicos no lado oposto, o sítio pós-sináptico. Os
neurônios se comunicam entre si dessa maneira e a forma como esse sinal é
processado a seguir pode ocasionar alterações sinápticas de longa duração,
resultando em plasticidade sináptica induzida pela experiência.
Uma série de eventos intracelulares é necessária para que ocorram as
modificações estruturais da sinapse requeridas para o aprendizado. Quando os
sinais chegam ao sítio pós-sináptico, a liberação do neurotransmissor ativa as
vias de sinalização intracelular na célula pós-sináptica, o que determina a
produção de novas proteínas utilizadas nas modificações sinápticas. Um
elemento-chave nesses eventos é uma via de transdução desinal, conhecida
como a via da proteína-quinase MAP (do Inglês, Mitogen-Activated Protein).
As proteínas-quinases ativadas por mitógenos (MAPK, sigla em Inglês para
Mitogen-activated protein kinase) são proteínas sinalizadoras importantes
ativadas pelos neurotransmissores e por vários fatores de crescimento. Um
membro dessa família é a quinase regulada por sinais extracelulares (ERK,
sigla em Inglês para Extracellular signal-regulated kinases). A cascata ERK é
utilizada em todas as regiões cerebrais em que a plasticidade sináptica ocorre
31
e sua ativação é requerida para a formação denovas memórias (Lombroso,
2004).
Em nível celular, o processo de codificação envolve alterações
dependentes da atividade celular, modificando a força da conexão sináptica.
Um mecanismo bastante estudado é a potenciação a longo prazo (PLP), que é
um aumento na força da sinapse, que pode ser induzida por uma pequena
atividade neural. Esse tipo de modificação sináptica participa na codificação da
informação e do processo de recuperação das informações.
A potenciação a longo prazo foi bastante estudada no hipocampo,
principalmente nas fibras colaterais de Schaffer, fibras que conectam as
regiões CA3 e CA1 (Fig 4).
Para se produzir PLP é necessário usar um
estímulo forte que ative muitas fibras aferentes juntas. É crítico, para indução
do PLP, que a célula pós-sináptica seja adequadamente despolarizada.
Requer-se disparo simultâneo nos neurônios pré e pós-sinápticos. Esses
achados confirmaram a teoria de Hebb que afirma que quando um axônio A
excita o axônio B e dispara repetidamente e persistentemente, algum processo
de crescimento ou uma alteração metabólica ocorre em uma ou em ambas as
células,
tanto
que
a eficiência da A em disparar B aumenta. O
neurotransmissor usado nesse processo é o glutamato. O glutamato liga-se a
receptores NMDA e não-NMDA nas células da região CA1. Numa transmissão
sináptica normal, os receptores não-NMDA (N-metil-D-aspartato) dominam,
pois os NMDAs estão bloqueados por íons magnésio (Mg2+). Esses receptores
são desbloqueados quando as células pós-sinápticas estão adequadamente
despolarizadas por um forte estímulo de muitos neurônios pré-sinápticos. Essa
despolarização causa a saída do Mg2+, permitindo a passagem da sódio (Na+)
e cálcio (Ca2+) para dentro da célula. O influxo de Ca2+ é o sinal para o PLP.
O canal se torna funcional somente quando o glutamato liga-se a receptores e
a membrana é despolarizada. O Ca2+ ativa proteínas quinase dependentes de
Ca2+, proteína quinase C e tirosina quinase. Esses mensageiros, tornando-se
constantemente ativos, levam ao aumento da transmissão sináptica. Então,
para que se induza um PLP, é preciso um evento pós-sináptico, como o
desbloqueio dos receptores NMDA e o influxo de Ca2+, sendo a manutenção
32
do PLP dependente de um evento pré-sináptico, como o aumento da liberação
de glutamato (Sá & Medalha, 2001).
Fig 4.: Anatomia do Hipocampo: o hipocampo consiste em duas camadas finas de neurônios,
dobradas uma sobre a outra. O termo “hipocampo” é comumente utilizado para descrever
conjuntamente duas regiões interligadas: o giro denteado e o hipocampo propriamente dito ,
chamado de Corno de Amon , do latim cornu Ammonis, CA. Ambos possuem uma organização
interna trilaminada, composta por dois tipos de células principais: as células granulares do giro
denteado e as células piramidais do Corno de Amon, sendo estas divididas nos setores de CA1, CA2
e CA3.
Fonte: http://lasse.med.br/mat_didatico/lasse1/textos/alexandre01.html
33
3.2 – Aprendizagem
Aprendizagem é um processo de aquisição que depende de fatores
internos e externos; é uma modificação biológica na comunicação entre os
neurônios, formando uma rede de interligações que podem ser evocadas e
retomadas com relativa facilidade e rapidez. Todas as áreas cerebrais estão
envolvidas no processo de aprendizagem (Relvas, 2010). A maneira que o
cérebro vai receber, usar, armazenar, repassar e expressar a informação é
modulada por fatores intrínsecos (genéticos) e extrínsecos (experiências), o
que gera modificações funcionais e comportamentais no indivíduo. A
aprendizagem pode ser definida como um processo que se cumpre no sistema
nervoso central, em que se produzem modificações mais ou menos
permanentes, que se traduzem por uma modificação funcional ou conductual,
permitindo uma melhor adaptação do indivíduoao seu meio como resposta a
uma solicitação interna ou externa. Uma vez que um dado estímulo é
conhecido do sistema nervoso central, desencadeia uma lembrança; quando o
estímulo é novo, desencadeia uma mudança. Sabe-se que a aprendizagem se
processa no sistema nervoso central cujo funcionamento pode ser entendido
de muitas formas ou níveis, começando pelo nível anatômico ou macroscópico;
passando pelo nível microscópico, como o da organização dos tecidos; pelo
nível histológico das células e organelas subcelulares – nível celular; e até
pelas estruturas bem menores, tais como as moléculas, que constituem o nível
molecular ou bioquímico. Os aspectos anatômicos ou estruturais do sistema
nervoso central envolvidos na aprendizagem são importantes para o
entendimento do ato de aprender, pois a função de aprender envolve
principalmente as atividades superiores, sediadas nas áreas corticais, inter e
multirrelacionadas, não só entre elas, mas com as estruturas subcorticais
importantes no recebimento da informação e na resposta elaborada pelo
cérebro. Para que a função de aprender seja adequada, é necessário o
envolvimento do tono muscular, da noção de esquema corporal, da emoção e
do afeto.
34
A aprendizagem, de um ponto de vista neuropsicológico, como resultado
da recepção e troca de informações entre o meio ambiente e diferentes centros
nervosos (Corso, apud Romanelli, 2003):
“(...) o ato de aprender exige sempre um estímulo externo –
informação – que é captado pelos órgãos dos sentidos habilitados
a transformar esse estímulo de natureza físico-química em impulso
nervoso de natureza fisiológica”.
O impulso (em que foi transformado o estímulo externo pelos órgãos dos
sentidos) chega até a área do córtex cerebral correspondente ao sentido
estimulado. Desta forma, o estímulo visual termina no lobo occipital; o auditivo,
no lobo temporal; o tátil ou somestésico, no lobo parietal. A sensação se forma,
portanto, nas áreas onde estão projetados os estímulos, chamadas áreas de
projeção, ou primárias. Entretanto, com as sensações não há ainda elaboração
de significado, que decorre da percepção, desencadeada com a ativação das
áreas secundárias (Corso, apud Romanelli, 2003):
“Neurônios associativos fazem a ligação das áreas primárias com as
secundárias, onde vai acontecer a percepção, que consiste na formação de
imagens ensoriais correspondentes ao estímulo. Trata-se de imagens com
significado.
Das áreas secundárias, a informação passa às áreas terciárias ou de
integração, onde ocorre a integração de todos os aspectos do estímulo, de
modo a formar uma percepção mais global. O estímulo recebido pelo cérebro
pode ser externo ou interno, podendo ter origem na própria atividade cerebral.
Relvas(2010),
ressalta
que
o
processo
de
aprendizagem
é
desencadeado a partir da motivação, e que esse processo se dá no interior no
indivíduo. Além disso, descreve o caminho percorrido pelos estímulos da
seguinte maneira:
- O córtex cerebral, nas áreas do lobo temporal, recebe, integra e
organiza as percepções auditivas.
- Nas áreas do lobo occipital, o córtex recebe, integra e organiza
as percepções visuais.
- As área temporal e occipital se ligam às áreas do lobo frontal,
situadas na terceira circunvolução frontal, responsável pela articulação das
35
palavras. A articulação frontal ascendente é responsável pela expressão da
escrita (grafia).
-
As área parietotemporoccipital é responsável pela integração
gnóstica, e as áreas pré-frontais, pela integração práxica, desde
que essas funções sejam moduladas pelo afeto e pelas
condições cognitivas de cada um.
As funções perceptivas e motoras, além das funções cognitivas do ato
de aprender são ativadas e produzem modificações no sistema nervoso
central. De fato, o processo de recepção e troca com o meio presente em
todas as etapas do desenvolvimento cognitivo é, em última análise, um
processo neuronal, que envolve neurônios sensitivos, motores e de
associação. Os neurônios são células excitáveis que se comunicam entre si e
com outras células efetuadoras (como células musculares e secretoras). A
comunicação interneural é basicamente elétrica, ou seja, por meio da
modificação do potencial de membrana. Na verdade, Riesgo (2006) explica
que há dois tipos de neurotransmissão: a elétrica e a química. Elas atuam
praticamente ao mesmo tempo, mas há diferenças: a elétrica está mais
relacionada ao desenvolvimento neuropsicomotor, enquanto a química está
mais ligada ao aprendizado em si. Assim, há uma ontogenia até no tipo de
transmissão, sendo que a mais antiga é a elétrica, que é bidirecional e é muito
importante do ponto de vista neuromaturacional. A neurotransmissão química é
mais
recente,
é
unidirecional,
envolve
vários
eventos
e
diferentes
neurotransmissores. A neurotransmissão mais comum entre os neurônios é
mista. Também há um trânsito intraneural, em que ocorre troca de informações
entre o núcleo e o citoplasma do neurônio. A membrana celular delimita cada
neurônio e mantém diferenças nos íons e nas cargas elétricas dentro e fora da
célula. Com efeito, a compreensão da sinapse, ou das conexões entre os
neurônios, é central para o entendimento do processo de aprendizagem. As
conexões entre os neurônios podem se processar em série ou em paralelo,
havendo, também conexões não-fixas. O uso faz aumentar o número de
conexões, enquanto que o desuso faz diminuir a quantidade de botões
sinápticos (Riesgo, 2006). O conhecimento da transmissão sináptica é a chave
para compreender a base neural do aprendizado e da memória (Corso, 2009
36
apud Ohlweiler, 2006). O conceito de sinapse está muito ligado ao conceito de
engrama, que caracteriza uma modificação estrutural do sistema nervoso,
decorrente da sinapse, sendo que o engrama poderia localizar-se no neurônio
ou nos circuitos formados pelas conexões entre os neurônios. A aprendizagem
supõe uma etapa de aquisição e outra de consolidação. Esta última conduz o
indivíduo de volta à noção de engrama: “Quando um estímulo novo chega ao
cérebro, se produz um padrão diferente de descargas, provocando uma
modificação que persiste. A retenção dessa modificação se relaciona com a
memória ou engramas”(Corso, 2009 apud Ohlweiler, 2006). Na etapa de
aquisição da aprendizagem ocorre o surgimento de novas sinapses, mas
provavelmente há uma modificação nas existentes. Na etapa de consolidação,
ocorrem modificações bioquímicas e moleculares nos potenciais pós-sinápticos
que se referem à memória.
O mesmo processo é descrito da seguinte forma por Riesgo (2006):
Aprendizado e memória podem se confundir do seguinte modo:
quando chega ao SNC uma informação conhecida, ela gera uma lembrança,
que nada mais é do que uma memória; quando chega ao SNC uma
informação inteiramente nova, ela nada evoca, e sim produz uma mudança isso é aprendizado - do ponto de vista estritamente neurobiológico.
O principio básico das neurociências preconiza que o ambiente físico e
social determina a atividade de células neurais, cuja função, por sua vez,
determina o comportamento.
Segundo
Ferrari
e
colaboradores
(2001),
o
ambiente
fornece
estímulos/informações que são captados por receptores sensoriais e
convertidos em impulsos elétricos, que são analisados e utilizados pelo
sistema nervoso central para o controle de respostas vegetativas, motoras e
cognitivas. Essas respostas constituem os padrões comportamentais que
atuam sobre e modificam esse ambiente. Do mesmo modo que o
comportamento altera a probabilidade de outros comportamentos (Catania,
1999), a atividade neural altera a probabilidade das funções neurais. Uma
das evidências para este fato é que tanto as situações de mera exposição à
estimulação ambiental quanto às situações de treinamento sistemático em
aprendizagem resultam em alterações no comportamento e nos circuitos
37
neurais (Rosenzweig, 1996). Desse modo, verifica-se que os
processos
comportamentais e os processos deplasticidade neural possuem relações
mais estreitas e complexas do que se supôs durante muito tempo.
Em resumo, considera-se que tal como o ambiente diferencia e modela
a forma e função das respostas de um organismo, a interação organismoambiente também diferencia e molda circuitos e redes neurais. E porque a
plasticidade baseia-se na aprendizagem, nós podemos aprender em
qualquer fase da vida; contudo a forma como fazemos o aprendizado segue
caminhos diferentes que varia com a idade.
Um dos aspectos fundamentais envolvidos com a aprendizagem é a
valorização dos processos neurais, além do fato de diferentes formas de
aprendizagem envolver não só circuitos neurais diferentes, mas diversos
mecanismos fundamentais.
O processo de aprendizagem exige certo nível de ativação e atenção,
de vigilância e seleção das informações. A ativação, por meio da vigilância,
conecta-se com a atenção no sentido da capacidade de focalização da
atividade. De fato, esses são elementos fundamentais de toda atividade
neuropsicológica, essenciais para manter as atividades cognitivas, inibindo o
efeito de muitos neurônios que não interessam à situação. Se não houver
uma organização cerebral integrada,
não é possível uma aprendizagem
normal. Os processos de codificação e decodificação são de extrema
importância, quando se abordam problemas de aprendizagem. A linguagem,
oral e escrita, receptiva ou expressiva, faz parte com toda sua
especificidade, do sistema cognitivo. Distinguindo a dimensão de percepção
e gnose, como sendo o reconhecimento modal específico por meio de
analisadores
visuais,
auditivos
e
somestésicos
do
processamento
conceptual e ação, como pensamento e resposta (verbal ou não-verbal), a
linguagem é um dos componentes fundamentais na organização cognitiva e
nos processos complexos da aprendizagem. Os componentes cognitivos e
as regiões cerebrais, que os processam, constituem um todo interconexo
(Paula et al, 2006 apud Tabaquim, 2003).
A aprendizagem resulta da recepção e da troca de informações entre o
meio ambiente e os diferentes centros nervosos. Desta forma, a
38
aprendizagem inicia com um estímulo de natureza físico-química advindo do
ambiente que é transformado em impulso nervoso pelos órgãos dos
sentidos (Romanelli, 2003).
Prestar atenção, compreender, aceitar, reter, transferir e agir são alguns
dos componentes principais da aprendizagem. Assim, a informação captada
é submetida a contínuo processamento e elaboração, que funciona em
níveis cada vez mais complexos e profundos, desde a extração das
características sensoriais, a interpretação do significado até, finalmente, a
emissão da resposta (Paula et al, 2006 apud Ciasca, 2003).
As áreas de projeção estão relacionadas com a sensibilidade, a
motricidade, e as áreas de associação e de sobreposição estão
relacionadas com funções psíquicas complexas: gnosias, linguagem,
esquema corporal, memória, emoções, etc (Machado, 2002).
O aprender implica em certas integridades básicas, que devem estar
presentes, quando oportunidades são oferecidas para a realização da
aprendizagem. Essas integridades são caracterizadas em três níveis:
•
Funções psicodinâmicas - à medida que o organismo internaliza o
observado ou o experienciado, começa a assimilar hierarquicamente,
pelos processos psíquicos, devendo, portanto, existir controle e
integridade psicoemocional para que ocorra a aprendizagem;
•
Funções do sistema nervoso periférico - responsáveis pelos
receptores sensoriais, que são canais principais para aprendizagem
simbólica. Uma subcarga sensorial implicaria em privação do cérebro de
estimulação básica, para o crescimento e amadurecimento dos
processos psicológicos;
•
Funções
do
sistema
nervoso
central
-
responsável
pelo
armazenamento, elaboração e processamento da informação, resultante
da resposta apropriada do organismo(Paula et al, 2006 apud Ascoaga,
1972).
39
3.3- Plasticidade cerebral
Considera-se a plasticidade cerebral como a capacidade do sistema
nervoso central de modificar a sua organização estrutural própria e o seu
funcionamento, processo que ocorre principalmente nos primeiros anos, mas
que se reflete por toda vida. A plasticidade cerebral é um elemento decisivo
para o processo de aprendizagem, no que tange aos aspectos afetivos e
cognitivos. Considerando o fato do ser humano ter o seu desenvolvimento em
boa parte completado após o nascimento, o bebê possui a caixa craniana
ainda incompleta, com estruturas cartilaginosas e com aberturas denominadas
fontanelas, o que possibilita um pronunciado desenvolvimento cerebral pósnatal. Sabe-se, ainda, que a maioria dos neurônios é formada no final do
segundo trimestre da vida pré-natal, entretanto, 90% dos neurônios formados
durante a vida fetal são destruídos após o nascimento. Tão importante quanto
o número de neurônios é a formação de conexões entre eles, por intermédio
das sinapses, que permitem a transmissão do estímulo de neurônio a neurônio
e,
consequentemente,
da
informação
através
do
sistema
nervoso.
Considerando que o volume cerebral atinge 95% do tamanho adulto quando a
criança atinge os cinco anos de idade, há mais sinapses no cérebro aos seis
anos de idade do que em qualquer outro período da vida, devido ao intenso
processo da formação dessas conexões, desde
o nascimento, sendo os
estímulos recebidos pela criança nesse período de fundamental importância
para o seu desenvolvimento.
Após o volume cerebral atingir 95% do tamanho adulto, ocorrem dois
momentos importantes de renovação neuronal, o primeiro entre cinco e dez
anos de idade e, o segundo, na adolescência. Nesses casos, a eliminação
competitiva e a reestruturação cerebral, denominada de poda, fazem com que
cerca de metade das conexões sinápticas sejam destruídas. Nesse período,
embora os neurônios não aumentem de número, há um aumento do peso
cerebral pelo ao aumento da demanda metabólica em razão de maior gasto
energético, ocorrendo aumento do volume cerebral. Há, também, um aumento
da espessura do córtex nas regiões mais utilizadas por terem recebido mais
estímulos, bem como uma diminuição das regiões não utilizadas. “A inatividade
40
pode causar a poda da sinapses não utilizadas, e é provável que cause a
destruição apopótica* de neurônios inteiros . Os fatores causais desse
processo residem na estimulação decorrente do meio familiar e social,
incluindo vivências, exigências, limites impostos, referências e aprendizado
cognitivo associados a aspectos neurotróficos como a nutrição e a
mielinização. Tais fatores “aumentam conexões” ou “eliminam conexões”, que
são os “substratos para as atividades motoras, para a cognição e para a
maturidade emocional”. A formação de novas sinapses ocorre durante toda a
vida, assim como a perda delas, permitindo que o aprendizado também ocorra.
As alterações no cérebro, portanto, ocorrerão na razão direta desses fatores e,
concomitante ao desenvolvimento do sistema nervoso como estrutura
morfológica, ocorre o desenvolvimento do ser humano em relação aos
aspectos psicológicos, repercutindo sobre a vida do indivíduo (Dal-Farra, 2008
apud Stahl, 2002).
*Apoptose: morte celular programada. É um tipo de autodestruição celular que ocorre de
forma ordenada e demanda energia para a sua execução. Está relacionada com a
manutenção da homeostase e com a regulação fisiológica do tamanho dos tecidos, mas
pode também ser causada por um estímulo patológico. (Kierszenbaum, 2004)
41
CAPÍTULO IV
A inteligência é uma faculdade que pode ser desenvolvida e não
algo que vem pronto com o nascimento.
Luíz Machado
A INTELIGÊNCIA EM EVIDÊNCIA
A investigação dos processos cognitivos, afetivos e sociais na
aprendizagem de qualquer área de estudo, conduz pesquisadores e psicólogos
cognitivos, ao questionamento sobre a validade de testes que alegam medir a
inteligência, especificamente o do Quociente de Inteligência (QI). Nestes, os
princípios e teorias das mudanças cognitivas não são reconhecidos, pois existe
uma tendência em ignorar diferenças individuais e focalizar dados de grupos
de indivíduos que completam tarefas. As hipóteses são derivadas de produtos
e não de processos. Luíz Machado em seu livro Q.I. Não é Inteligência: a
destruição de um mito faz uma crítica aos testes de Q.I. afirmando que “ Os
testes de Q.I. tentaram medir o que ninguém sabia e ainda não sabe: o que é
inteligência.” Segundo Machado (2010), esses testes estão voltados para um
aspecto da inteligência, algumas funções cognitivas apenas, de tal modo que
pode-se dizer que eles medem a capacidade de uma pessoa resolver os
testes.
As variáveis cognitivas, afetivas e sociais que influenciam o aprender
tornam difícil o desenvolvimento de um instrumento padrão avaliativo confiável
e válido. As variáveis cognitivas são em parte governadas pela inteligência, a
memória e a capacidade de raciocinar, analisar, reconhecer, conceituar,
organizar avaliar, armazenar e recuperar informações.
As variáveis afetivas que dizem respeito às atitudes (confiança),
emoções (auto-estima, inibição, ansiedade) motivação, personalidade e idade,
incluem também as crenças dos alunos sobre a aprendizagem as quais podem
interferir bloqueando o progresso do desenvolvimento da inteligência.
As variáveis sociais tais como nível socioeconômico, sexo e diversidade
cultural, deveriam ser igualmente consideradas para poder triangular dados
pertinentes na determinação dos supostos graus de inteligência.
42
A inteligência tem sido, por muito tempo, enfocada a partir da tecnologia
de testes mentais e de seu conjunto de métodos estatísticos (psicometria). As
primeiras formas de medição foram elaboradas por Alfred Binet e Simon
Théodore, na França entre 1904 e 1911. Estes dois pesquisadores as
organizaram com a finalidade inicial de identificar quais crianças teriam
sucesso na escola e quais fracassariam. O entusiasmo que surgiu a partir dos
resultados deste tipo de testagem fez com que seu uso extrapolasse os limites
escolares e regionais, tornando-se uma forma cientificamente aceita como um
meio de mensurar o grau de inteligência dos indivíduos.
As pesquisas sobre as diferenças individuais tratam, entre outros
tópicos, das diferentes estratégias de aprendizagem empregadas pelos
estudantes e dos fatores gerais. A idade, aptidão, motivação e, acrescente-se,
a inteligência, classificam-se como fatores gerais e são diferenciados conforme
a possibilidade que se tem de modificá-los. A idade, por exemplo, é definida
como um fator geral estável, pois não pode ser modificada, alterada e
tampouco influenciada por fatores externos ou internos.
A inteligência tem sido pesquisada como uma capacidade individual
estável e não passível de modificações. A inalterabilidade e imutabilidade da
inteligência são defendidas por Burt e Jensen (FONSECA,1998), entre outros,
por acreditarem na idéia
de que esta capacidade é essencialmente
hereditária, portanto, não modificável seja por meio da educação ou outras
formas de intervenção. Por outro lado, passa a ser discutida, por
pesquisadores
cognitivos
atuais,
como
uma
capacidade
mutável
e
desenvolvimental.
Gardner (1994) e Sternberg (2000) apresentam uma visão de
inteligência que, além de valorizar os estudos advindos da psicométrica, não
ignora a influência que o meio circundante exerce nesta capacidade que, além
de sua carga genética, está sujeita às modificações causadas por influências
externas.
O ponto principal dessa questão, ao levantar tais diferenças de
opiniões, é o de reforçar a idéia de que as diferentes formas de ensinar que
podem contribuir muito para desenvolver os potenciais e/ou inteligências dos
aprendizes, principalmente, se os processos de ensino refletirem os processos
43
de aprendizagem considerando que cada indivíduo tem seu ritmo própro de
aprender e apreender.
Embora não haja um consenso sobre a existência de uma inteligência
verbal lingüística ou individual nos estudos da aptidão, há um indício de que o
tipo de inteligência, que envolve o indivíduo não é único, mas pressupõe a
existência de mais de uma inteligência. Segundo Fernandes-Boëchat (2005b)
deve-se dar mais importância à inteligência emocional dos aprendizes do que à
inteligência na perspectiva psicométrica, haja vista que a inteligência
emocional não é levada em consideração quando os aprendizes são
submetidos a testes de QI. As variações desta inteligência podem influir nos
resultados. Analisando possíveis interferências no processo de aprendizagem,
através de testes de fluência em sala de aula, Fernandes-Boechät confirmou a
existência de mais uma inteligência que vai além dos testes de QI, a
inteligência intuitiva. É importante ressaltar que intuição, sexto sentido e
instinto são conceitos diferentes sendo que a intuição é a conclusão que parte
da organização das informações captadas pelo inconsciente.
Em razão das possibilidades de interpretações sobre a inteligência,
abre-se espaço para que novas idéias surjam procurando contemplar aspectos
relevantes como o ambiente, a cultura e a experiência. Neste sentido, a teoria
das Inteligências Múltiplas proposta por Gardner (1994), vem contribuir para
uma nova compreensão desta capacidade, pois segundo ele, a inteligência é
um potencial biopsicológico para solucionar problemas ou criar produtos
importantes para a sociedade circundante cujos testes não conseguem captar
toda a sua complexidade. Em sua teoria, o ambiente, a cultura e a
possibilidade
desenvolvimental
da
inteligência
assumem
um
papel
fundamental. Para Gardner, não existe uma inteligência geral, hereditária e
única que responde pelos atos inteligentes dos indivíduos, mas pelo menos
nove formas diferentes de sua representação que, apesar de interagirem entre
si, apresentam procedimentos e localizações específicas. (GARDNER et al,
1998; STERNBERG, 2000). Sua afirmação embasa-se num exame criterioso
desta
capacidade
humana
nos
indivíduos
prodígios
–
aqueles
com
desenvolvimento extraordinário num determinado talento –idiotas sábios –
indivíduos com problema mental, mas com precocidade em determinada área
44
(GARDNER,
1993),
crianças
autistas,
crianças
com
dificuldades
de
aprendizagem e através de informações relevantes a respeito de indivíduos
que sofreram lesão cerebral. (ANTUNES, 2001; GARDNER et al , 1998). Estes
potenciais,
representados
pelas
inteligências
verbal-lingüística,
lógica-
matemática, musical, espacial, corporal cinestésica, interpessoal, intrapessoal,
naturalistae existencialista reiniciam a discussão sobre o impacto desta
capacidade no ambiente escolar trazendo novas possibilidades de ensino para
todos os estudantes, independenteda suposta quantidade de inteligência que
cada um possa ter. As localizações destas inteligências no cérebro humano,
chamadas por Gardner como ficções úteis, servem para compreender as
relações entre as pesquisas realizadas com os testes de QI e os estudos sobre
os hemisférios cerebrais. Segundo Gardner, a inteligência verbal-lingüística,
por exemplo, está localizada no hemisfério esquerdo. A partir destas
informações é possível fazer comparações, pois os testes de QI apontam os
indivíduos com altas pontuações como receptivos a uma instrução sistemática
e estrutural quando envolvidos com a leitura, vocabulário e gramática. Uma vez
que a inteligência verbal-lingüística é processada no hemisfério esquerdo, e
que este processa as informações de forma sistemática e estrutural, presumese que os indivíduos com predominância desta inteligência apresentarão um
melhor desempenho em testes de QI enquanto os indivíduos que,
hipoteticamente, apresentam as inteligências musical ou espacial, como mais
predominante, utilizarão o hemisfério direito como uma espécie de ponte para
a aprendizagem, sendo, portanto, menos receptivos a uma instrução
sistemática e estrutural. Em vista disso, o impacto da teoria no ensino dá-se
pela valorização dos conjuntos individuais de inteligências e pela observação
das
potencialidades
dos
aprendentes
permeados por atividades que
promovam, de forma especial, as inteligências de cada um dos envolvidos no
processo educacional.
Machado (2010), considerando que a inteligência parece estar fundada
no cérebro e que esta seria resultado da eficiência neural, postula que ela é
uma função tornada possível pela estruturação do organismo como um todo e,
especialmente,
a
rede
neuronal,
com
o
propósito
de
promover
a
45
autopreservação e a preservação da espécie, quer pelo aprendizado na própria
vida, quer pela experiência (Machado, 2010).
Nas palavras de Machado:
O maior objetivo da natureza é a preservação
das espécies. E para atingí-lo, ela equipou os
seres com um mecanismo biológico que gera a
inteligência natural ou nativa, uma virtualidade
para que os seres, animais e vegetais, possam
conseguir a preservação dos indivíduos,
promovendo meios de defesa, de ataque, de
adaptação; em suma, do que veio a se chamar
“inteligência” (Machado, 2010 p.30).
Machado (2010) preconiza que a inteligência é um recurso da natureza
para adaptação, portanto ela é “nativa” ou “natural”, o que chama também de a
“grande inteligência”. Nos seres humanos, o mecanismo biológico responsável
pela inteligência nativa é o sistema de autopreservação e reservação da
espécie (SAPE), formado pelo sistema das emoções (sistema límbico) e o
sistema endócrino, o que leva os seres a agir pela ação dos hormônios. Com a
grande
inteligência
está
diretamente
relacionada
ao
SAPE,
com
o
envolvimento do sistema glandular endócrino, diretamente ligado às emoçõesenergia, ela pode ser chamada de inteligência emocional. A grande inteligência
é inata, podendo ser estimulada.
Por outro lado, Machado (2010) outro aspecto da inteligência, que ele
chama de “inteligência racional” ou “pequena inteligência”. Segundo ele, esta
seria a inteligência do intelecto, da lógica formal ou aristotélica, tornada
possível pela mobilização das funções cognitivas. Para ele, o desenvolvimento
simultâneo da “inteligência natural” e da “inteligência racional” produz a
superinteligência (Machado, 2010).
46
A inteligência que se mede pelos testes de Q.I. é a
pequena inteligência, que nada mais é do que um recurso
da grande inteligência para ajudar na solução de
problemas, na necessidade de adaptação, no
enfrentamento de dificuldades, de adversidades e no
atingimento de objetivos, vale dizer, de aprendizagem,
que, afinal, é adaptação....todo processo de ativaçãoe
desenvolvimento da inteligência deve começar desde o
berço pela estimulação sensorial, continuar na primeira
infância com estímulos adequados, prosseguir no ensino
fundamental e médio, ir pelo ensino superior (Machado,
2010).
O papel da inteligência, na atualidade, apresenta uma perspectiva
desenvolvimental que pode ser trabalhada nas mais diversas disciplinas escolares,
porém antes de qualquer aplicação é imprescindível que o educador
possa
repensar sobre a valorização dos potenciais dos estudantes e perceber que cada
aluno é um ser humano complexo, com necessidades peculiares. Inteligência e
aprendizagem não estão ligadas à quantidade, mas ao reconhecimento e
desenvolvimento dos vários tipos de inteligências que definem os potenciais de
cada indivíduo, bem como sua exploração para o sucesso na aprendizagem de
qualquer conteúdo.
47
4.1 - TIPOS DE APRENDIZAGEM
O cérebro humano é um sistema complexo que estabelece relações
com o mundo que o rodeia por meio de fatores significativos como: a
especificidade das vias neuronais, que da periferia levam ao córtex
informações provenientes do mundo exterior; e, a especificidade dos
neurônios, que permite determinar áreas motoras, sensoriais, auditivas,
ópticas, olfativas, etc. Estas áreas estabelecem inter-relações funcionais
improtantes para o aprendizado.
A aprendizagem é um processo contínuo que opera sobre todos os
dados
que
alcançam
um
umbral
de
significação,
dependendo,
fundamentalmente, da memória e da atenção. A capacidade de especialização
cerebral em armazenar dadospara sua utilização posterior permite mediante a
memória, codificar e decodificar informação. Atenção permite focalizar
atividades conscientes dependentes de sistemas e subsistemas anátomofuncionais, que trabalham como redes em paraleleo, permitindo uma atuação
simultânea e interativa nas tarefas cognitivas. De fato, o processo de
aprendizagem exige certo nível de ativação e atenção, de vigilância e seleção
das informações. A ativação, por meio da vigilância, conecta-se com a atenção
no sentido da capacidade de focalização da atividade. Sem uma organização
integrada,
intra e interneurossensorial, não é possível uma aprendizagem
normal. Os processos de codificação e decodificação são de extrema
importância, quando se abordam problemas de aprendizagem. A linguagem,
oral e escrita, receptiva ou expressiva, faz parte do sistema cognitivo e constitui
um dos componentes essenciais na organização cognitiva e nos processos
complexos da aprendizagem.
O ato de prestar atenção, comprender, aceitar, reter, transferir e agir
são alguns dos componentes principais da aprendizagem. Assim, a informação
captada é submetida a contínuo processamento e elaboração, que funciona
em níveis cada vez mais complexos e profundos, desde a extração das
48
características sensoriais, a interpretação do significado até, a emissão da
resposta.
O aprender implica em certas integridades básicas que devem estra
presentes quando oportunidades são oferecidas para a realização da
aprendizagem. Essas integridades são caracterizadas por três níveis:
- Funções psicodinâmicas - à medida que o organismo
internaliza
o
observado
ou
o
experienciado,
começa
a
assimilar
hierarquicamente, pelos processos psíquicos, devendo, protanto, existir
controle e integridade psicoemocional para que ocorra a aprendizagem;
- Funções do sistema nervoso periférico – responsáveis pelos
receptores sensoriais, que são canais principais para a aprendizagem
simbólica. Uma subcarga sensorial implicaria em privação do cérebro de
estimulação básica, para o crescimento e amadurecimento dos processos
psicológicos;
- Funções do sistema nervoso central – responsável pelo
armazenamento, elaboração e processamento da informação, resultante da
respsota apropriada do organismo.
4.1.1 - Aprendizagem significativa
4.1.1.2 - Aprendizagem significativa segundo Ausubel
A teoria da aprendizagem de Ausubel baseia-se no pressuposto de que
existe uma estrutura na qual se processa a organização e a integração da
informação a aprender. Trata-se da estrutura cognitiva entendida como o
“conteúdo total organizado das ideias de um indivíduo; ou, no contexto da
aprendizagem de uma matéria de ensino, o conteúdo e organização das idéias
numa área particular de conhecimentos” (Moreira & Masini,1982).
Na
aprendizagem significativa as novas idéias e informações interagem com um
conhecimento prévio existente na estrutura cognitiva do indivíduo. Em última
análise, só se aprende a partir do que já se conhece. Portanto, para promover
a aprendizagem significativa é preciso averiguar o conhecimento prévio e
ensinar de acordo.
Na aprendizagem significativa, o aprendiz não é um
49
receptor passivo. É importante que o indivíduo faça uso dos significados que já
internalizou, de maneira substantiva e não arbitrária, para poder captar os
significados dos materiais educativos. Nesse processo, ao mesmo tempo em
que está progressivamente diferenciando sua estrutura cognitiva, está também
fazendo a reconciliação integradora de modo a identificar semelhanças e
diferenças e reorganizar seu conhecimento, ou seja, aprendiz constrói seu
conhecimento.
Aprendizagem significativa é, de fato, o processo através do qual uma
nova informação (um novo conhecimento) se relaciona de maneira não
arbitrária e substantiva (não-literal) à estrutura cognitiva do aprendiz. É no
curso da aprendizagem significativa que o significado lógico do material de
aprendizagem se transforma em significado psicológico para o sujeito.
Caracteriza-se pela interação cognitiva entre o novo conhecimento e o
conhecimento prévio. Nesse processo, que é não-literal e não-arbitrário,
conforme já mencionado, o novo conhecimento adquire significados para o
aprendiz e o conhecimento prévio fica mais rico, mais diferenciado, mais
elaborado em termos de significados, e adquire mais estabilidade. (Moreira et
all, 1997 apud Masini, 1982, 2006; Moreira, 1999, 2000, 2006; Masini e
Moreira, 2008; Valadares e Moreira, 2009).
Para Ausubel (Moreira et al, 1997 apud Ausubel 1963), a aprendizagem
significativa é o mecanismo humano, por excelência, para adquirir e armazenar
a vasta quantidade de idéias e informações representadas em qualquer campo
de conhecimento.
A teoria de Ausubel tem o seu enfoque, principalmente, na
aprendizagem cognitiva, segundo a qual as informações são armazenadas de
um modo organizado, na mente do indivíduo que aprende, sendo esse
complexo organizado - a estrutura cognitiva. A base da sua teoria é que a
aprendizagem deve ser significativa, isto é, o sujeito aprende e está aberto a
aprender quando integra a nova informação nos conhecimentos previamente
adquiridos.
√ Aprendizagem por recepção - tipo de aprendizagem através do
qual o conteúdo a ser aprendido é apresentado de uma forma mais ou menos
50
final. Trata-se de um processo automático, mas que também deve revestir-se
de carácter significativo.
√ Aprendizagem por descoberta - a característica essencial é que o
conteúdo principal do que vai ser aprendido não é dado, mas deve ser
descoberto pelo aluno antes que possa ser incorporado, significativamente, à
sua estrutura cognitiva. É o tipo de aprendizagem própria das fases iniciais do
desenvolvimento cognitivo e dos problemas do quotidiano.
√ Aprendizagem mecânica, ou repetitiva -"Aquisição de informações
com pouca ou nenhuma intersecção com conceitos ou proposições relevantes
existentes na estrutura cognitiva” (Moreira & Masini, 1982). Deste modo, o
conhecimento é armazenado de forma arbitrária, não estabelecendo ligações
com conceitos prévios. Este tipo de aprendizagem ocorre quando o indivíduo
memoriza a informação para um determinado propósito, que posteriormente é
frequentemente perdida logo que esse propósito tenha sido cumprido.
√ Aprendizagem significativa - "Aquisição de novos significados;
pressupõe a existência de conceitos e preposições relevantes na estrutura
cognitiva, uma predisposição para aprender e uma tarefa de aprendizagem
potencialmente significativo” (Moreira & Masini, 1982).
Segundo Ausubel, quer a aprendizagem por recepção quer a
aprendizagem por descoberta, podem ser significativas, desde que a nova
informação se incorpore de um modo não arbitrário e literal às estruturas
cognitivas. Para Ausubel, aprendizagem significativa “é um processo pelo qual
a nova informação se relaciona com um aspecto relevante da estrutura de
conhecimento do indivíduo” (Moreira & Masini, 1982). Ausubel refere que a
aprendizagem significativa é um mecanismo humano, porexcelência, para
adquirir
e
armazenar
a
vasta
quantidade
de
ideias
e
informações
representadas em qualquer campo de conhecimento (Moreira,1997).
Ausubel descreve três tipos de aprendizagem significativa:
(1) representacional, (2) de conceitos e (3) proposicional.
1. O tipo mais básico de aprendizagem significativa, do qual os outros
dois tipos dependem. É a aprendizagem representacional. É aprendizagem dos
51
símbolos individuais (geralmente palavras) ou do que eles representam. Ocorre
quando se estabelece uma equivalência entre os símbolos arbitrários e os seus
referentes correspondentes (objectos, exemplos, conceitos), passando a
remeter o indivíduo ao mesmo significado. Trata-se de um tipo de
aprendizagem significativa na medida em que as proposições de equivalência
proposicional podem ser relacionadas, enquanto exemplos, generalizações
que aparecem, nos primeiros anos de vida, na estrutura cognitiva do
indivíduo—tudo tem um nome e o nome significa aquilo que o seu referente
significa para uma determinada pessoa.
2. A aprendizagem de conceitos é de certa forma, um caso especial
da aprendizagem representacional. Tal fato resulta de os conceitos, as idéias
genéricas ou as categorias serem também representadas por símbolos
individuais e arbitrários. É a aprendizagem do que significam os conceitos,
objetos e acontecimentos que, por sua vez, se representam por nomes ou
palavras.
3. A essência da aprendizagem proposicional não é aprender significativamente o que representam as palavras isoladas ou combinadas. A tarefa
deste tipo de aprendizagem significativa consiste em aprender os significados
das ideias expressas por grupos de palavras (geralmente representando
conceitos) combinadas em proposições ou sentenças. Ou seja, a tarefa é
prender o significado que está para além da soma dos significados das
palavras ou conceitos que compõe a proposição (Moreira & Masini, 1982).
52
4.2 - Aprendizagem Significativa, Emoções e Sentimentos.
As emoções e os sentimentos são aspectos das interações aos
quais não tem sido dado ênfase suficiente no Ensino, apesar de tacitamente
todos reconhecerem a importância das emoções na interação professor-aluno.
Segundo António Damásio, as emoções têm função social e papel decisivo
no processo da interação. As emoções são adaptações singulares que
integram
o mecanismo
com
o qual os organismos
regulam
sua
sobrevivência orgânica e social. Em um nível básico, as emoções são partes
da regulação homeostática e constituem-se como um poderoso mecanismo
de aprendizagem. Ao longo do desenvolvimento, “as emoções acabam por
ajudar a ligar a regulação homeostática e os ‘valores’ de sobrevivência a
muitos eventos e objetos de nossa experiência autobiográfica” (Damásio,
2000). As emoções fornecem aos indivíduos comportamentos voltados
para a sobrevivência e são inseparáveis de nossas idéias e sentimentos
relacionados
a
recompensa ou punição, prazer ou dor,
aproximação ou
afastamento, vantagem ou desvantagem pessoal etc. No entanto, definir o
que são as emoções não é uma tarefa simples. As dificuldades nascem
da diversidade dos tipos de manifestações emocionais e da diversidade
de teorias divergentes nos vários domínios da pesquisa psicológica que, a
partir de estudos experimentais, enfocam o tema das emoções.
53
4.3 - Modelo de Níveis Emocionais
Damásio (1996, 2000) discute três níveis de emoção: primário,
secundário e de fundo.
As
emoções
primárias,
que
denominaremos
emoções básicas, são aquelas tratadas pelos trabalhos de Darwin e de
seus seguidores, a saber: alegria, tristeza, medo, raiva, surpresa e
repugnância.
As
emoções
secundárias
ou
sociais
incluem embaraço,
ciúme, culpa, orgulho etc. E, finalmente, há o que Damásio (2000) denomina
“emoções de fundo como bem-estar ou mal-estar, calma ou tensão. O rótulo
de ‘emoção’ também foi aplicado a impulsos e motivações e a estados
de dor e prazer”. Essa classificação nos parece apropriada para a
análise
do
ocorrência
processo
dessas
de significação
emoções
e
aprendizagem
que
integram
os
A
básicas constitui, ao longo do tempo, os
sentimentos que permeiam as interações em aula.
adaptações
significativa.
As emoções são
mecanismos pelos quais osorganismos
regulam a vida, quer numa reação específica a uma situação quer na
regulação
do
estado
interno
do
indivíduo.
Emoções
são
conjuntos
complexos de reações químicas e neurais, formando um padrão; todas as
emoções têm algum tipo de papel regulador a desempenhar, levando, de
um modo ou de outro, à criação de circunstâncias vantajosas para o
organismo em que o fenômeno se manifesta; as emoções estão ligadas
à vida de um organismo, ao seu corpo, para ser exato, e seu papel é
auxiliar o organismo a conservar a vida (Damásio, 2000).
O aprendizado e a cultura alteram a expressão das emoções e
lhes conferemnovos significados. Assim temos, por um lado, os processos
biológicos determinantes das emoções e, por outro, os aspectos sócioculturais. Existem reações emocionais universais que são o resultado da
evolução biológica, mas em pessoas adultas elas são subsumidas às reações
mais complexas que refletem a cultura e o desenvolvimento individual.
Nessa abordagem heterogênea (Griffithis, 1997) encontra-se a conjugação
dos aspectos individuais e dos aspectos sócio-culturais das emoções.
54
CAPÍTULO V
Nossa singularidade repousa no nosso cérebro.
A.Damásio
O PAPEL DO CÉREBRO NA APRENDIZAGEM
O cérebro é o órgão onde se forma a cognição, que emerge deste
porque
nele
ocorrem
determinadas
condições
bio-psico-sociais
ou
bioantropológicas dinâmicas e evolutivas que permitem ao ser humano revelarse como um ser auto-eco-organizador (Fonseca, 2009 apud Morin, 1996).
Quando o indivíduo aprende algo, há um processo de informação entre o
sujeito aprendente (o aluno) e a tarefa, seja ela a escrita ou a leitura, por
exemplo. Para perceber o que é aprendizagem, isto é, uma mudança de
comportamento provocada pela experiência, entre um momento inicial, em que
a tarefa não é dominada, e um momento final, onde a tarefa passa a ser
dominada e automatizada, há de se encarar ambos os componentes: o sujeito
aprendente e a tarefa. No ser aprendente, a aprendizagem envolve o cérebro
(órgão da aprendizagem), que tem de processar informação para que ela se
verifique. Quando se aprende, o cérebro necessita de processar o material a
ser aprendido, independentemente de cada sujeito o realizar de forma
diferente, de acordo com a preferência do seu estilo de aprendizagem. A
leitura, por exemplo, implica processar letras que têm categorizações
fonológicas específicas parea serem decodificadas e compreendidas. De um
processo de captação visual, o cérebro tem em seguida de categorizar formas
de letras com sons, por meio de processos auditivos complexos a fim de inferir
significações cognitivas contidas em palavras que compôem um texto.
Segundo Fonseca, 2009, a informação uma vez integrada, depois de
devidamente decodificada, terá de ser retirada e armazenada, a fim de gerar a
compreensão, o nexo e a sequencia de eventos da informação escrita. A
criança para ler terá de envolver o seu cérebro em funções psíquicas
superiores , tais como a atenção e a concentração; a discriminação, a análise
e síntese de letras e sons; a compreensão do sentido do texto; a
55
rememorização das suas conexões e elações narrativas, a recordação das
personagens, dos locais referidos, etc (Fonseca, 2009).
Fonseca (2009) considera que a aprendizagem compreende um processo
funcional dinâmicoque integra quatro componentes cognitivos básicos, a saber:
• Input (auditivo, visual, tátil-cinestésico);
•
Cognição
(atenção,
memória,
integração,
processamento simultâneo e sequencial, compreensão,
planificação, etc.);
• Output (falar, discutir, desenhar, observar, ler, escrever,
contar, resolver problemas, etc.);
• Retroalimentação (repetir, organizar, controlar, regular,
realizar, etc.)
PROCESSAMENTO DE INFORMAÇÃO
INTERAÇÃO
Tarefa
Leitura / escrita
Sujeito
MATERIAIS
Processo, experiência, fases , automatização
Processo, experiência, fases , automatização
USO INTEGRAL DAS APTIDÕES CEREBRAIS NO APRENDIZADO
O processo de ensino-aprendizagem requer por parte, especialmente,
dos profissionais da educação, o entendimento de como funcionam os
Livros, fichas,
INPUT (auditivo, visual...)
jogos, letras...
COGNIÇÃO (atenção, memória, integração...)
OUTPUT (ler, escrever...)
Modelo de processamento de informação, segundo Fonseca, 2009
56
5.1 - USO INTEGRAL DAS APTIDÕES CEREBRAIS
NO APRENDIZADO
O processo de ensino-aprendizagem requer por parte, especialmente,
dos profissionais da educação, o entendimento de como funcionam os
mecanismos de recepção e emissão do sistema nervoso central do homem,
bem como dos mecanismos periféricos desse sistema. Do mesmo modo, saber
como estes sistemas evoluíram e evoluem é essencial para a compreensão de
como se comportam diferentemente, de aprendente para aprendente. Em
virtude das diferenças de polaridade cerebral dominante, o modo específico
como cada pessoa aprende é peculiar, bem como o modo específico como
cada pessoa interpreta o que é transmitido e o que é recebido é peculiar.
Cada aluno/aprendente aquisitará melhor conhecendo, compreendendo e
administrando os sistemas de recepção e aprendizado. Ademais, os
educadores ensinarão melhor identificando os sistemas de recepção preferidos
dos seus aprendizes, ao mesmo tempo em que conhece, compreende e
admisnistra seus melhores sistemas de transmissão e recepção (feedback),
identificando, acessando e desenvolvendo seus sistemas secundários para
aprender a ensinar de uma forma global e holística (Miranda, 1997).
Não existem dois seres humanos fisiológica ou psicologicamente
idênticos. Cada indivíduo é único em sua maneira de ver o mundo, de ser, de
pensar, de agir. O psicólogo Abraham Maslow propôs que todos os seres
humanos sentem, em determinadas medidas, um conjunto de necessidades
básicas, classificadas da seguinte maneira: fisiológicas, de segurança,
associação, estima e autorealização (Miranda, 1997). Este mesmo autor
preconizava que a maior parte dos comportamentos de caad pessoa tende a
ser ditada pelo desejo de satisfazer sua necessidade mais intensa.
Considerando-se
a
hierarquia
das necessidades segundo Maslow, e
analisando-a à luz da multipolaridade cerebral e do desenvolvimento
sequencial das aptidões cerebrais, entende-se melhor a os processos
57
acionadores das diferentes necessidades sentidas pelo ser humano. Segundo
descreve Miranda (1997):
- No pólo corporal/visceral predominam as necessidades fisiológicas
básicas, cuja tentativa de solução dar-se-á através de ações voltada para a
sobrevivência imediata; são capacidades fisiológicas inatas (instintivas) e
cultiváveis de acionar os órgãos motores e os sentidos (visão, audição, tato,
olfato e paladar) para a realização de movimentos e interações essenciais à
preservação da vida.
O aprendizado através do pólo visceral é eminentemente tátil. Baseado
em experiência individual marcante vivida na prática: o fogo queima, o
cachorro morde.
É um conhecimento referendado pela certeza. Todas as
disciplinas cuja prática exige atividade física são, em geral, aprendidas através
do pólo visceral. Um bom exemplo é a atividade esportiva em geral.
- No pólo preventivo/organizacional o aprendizado é eminentemente
visual, baseado na observação das coisas e das experiências vividas ou
relatadas por outros. Este indivíduo aprenderá melhor vendo do que ouvindo.
Portanto, é o leitor por excelência, aquele que conserva informações obtidas
através de textos e imagens sequenciais, quadros, gráficos e tabelas.
- No pólo emotivo/relacional o aprendizado é essencialmente
sensitivo, baseado na confiança e na empatia do aluno em relação ao
professor e/ou à matéria. A eficácia do aprendizado no pólo emotivo/relacional
está diretamente relacionada à figura do professor, do companheiro de estudos
ou de imagens e histórias que toquem o coração e os sentimentos do aprendiz.
Este tipo de aluno aprenderá confortavelmente através de gravações sonoras
nas quais a velocidade, ritmo, modulação e entonação da voz sejam bem
explorados.
- No pólo analítico/fatual o aprendizado é fundamentalmente
arquitetural, construído geometricamente em ciam da apreciação e análise de
fatos e dados, colocados mais visualmente do que auditivamente. As figuras e
imagens precisam retratar a realidade. Demonstrações, provas e experiências
práticas são essenciais para seu processo de aprendizagem.
58
- No pólo intuitivo/conceitual o aprendizado é eminentemente holístico
e especulativo. A informação é capturada através da linguagem escrita ou
falada, bem como através de imagens metafóricas, figuras ou ilustrações
representativas de idéias ou conceitos. Este tipo de aprendiz tem interesse
maior no quadro global, e não nos detalhes. Além disso, tem a necessidade de
processar as informações que recebe “passeando” sua imaginação ao redor
delas. Ao ler um trecho de um livro que contenha informação digna de
processamento, ele interromperá a leitura, fechará os olhos e ficará pensando
a respeito do assunto por alguns instantes antes de retomar a leitura.
59
CONCLUSÕES FINAIS
ESTRATÉGIAS PARA ALCANÇAR UMA PRÁTICA PEDAGÓGICA VOLTADA
PARA O SÉCULO XXI
Um dos aspectos mais relevantes em Neurociências é a importância de
perceber que a missão da escola mudou. Há necessidade de despertar para o
fato
que,
em
vez
de
atender
a
uma
massa
amorfa
de
alunos
despersonalizados, é preciso focalizar o indivíduo, aquele sujeito original
singular, diferente e único, dotado de habilidades múltiplas, que possui
diferentes estilos de aprendizagem e, conseqüentemente, diferentes maneiras
de resolver problemas. É fundamental reconhecer a importância de refletir
sobre o processo de aprendizagens relevantes, mais até do que a instrução e a
transmissão de conteúdos. É necessário levar o indivíduo a aprender a
aprender, que se manifesta pela capacidade de refletir, analisar e tomar
consciência do que sabe; dispor-se a mudar os próprios conceitos; buscar
novas informações; substituir verdades antigas e enraizadas por teorias
transitórias; adquirir os novos conhecimentos que vêm sendo requeridos pelas
alterações existentes no mundo, resultantes da rápida evolução das
tecnologias da informação.
Aprender a agir e pensar a partir de um novo referencial teórico é uma
tarefa, por vezes, difícil e incômoda. Atuar e inovar pedagogicamente em
novas bases envolve uma profunda mudança de mentalidade. O aprendiz do
século XXI é o indivíduo que constrói o conhecimento, a partir de situações
concretas vivenciadas. O professor para assimilar os novos conhecimentos
implícitos na nova abordagem, requer tempo para poder comparar, estabelecer
as conexões, compreender as diferenças e integrar o conhecimento. É um
tempo para assimilação e acomodação de novas práticas em suas estruturas
mentais.
60
A Neurociência Pedagógica propõe abandonar uma abordagem
pedagógica
tradicional, que enfatiza a transmissão
de conteúdos e
informações que são passados diretamente do professor para o aluno,
mediante um processo reprodutivo, possa criar uma nova situação educacional
que enfatiza a construção realizada pelo indivíduo, através de uma pedagogia
criativa, dinâmica, encorajadora, apoiada na pesquisa, na investigação e no
diálogo.
Os novos conhecimentos proporcionam ao educador saber que há
predominantemente
três
tipos
de
aprendizes,
conforme
já
discutido
anteriormente. O reconhecimento de que existem, minimamente, aprendizes
visuais (que prestarão mais atenção às informações visuais, incluindo texto);
aprendizes auditivos (para quem as informações tornam-se mais assimiláveis
pela discussão) e aprendizes cinestésicos ou táteis (que aprendem melhor
quando envolvem diretamente o corpo) e que esses necessitam satisfazer
suas necessidades básicas para aprender melhor e mais rápido, torna o
profissional da educação em um estudioso do comportamento humano. Em
lugar de uma educação que reforça a separação de realidades inseparáveis,
que vê a mente separada do corpo, os educadores promovem um novo diálogo
entre mente e corpo.
O professor do século XXI tem compromisso com o futuro, no presente
da sala de aula.
Ele constrói
uma nova relação com os alunos, mais
horizontal, recíproca, dialética e mais verdadeira, onde o professor além de
ensinar, aprende,
e o educando além de aprender, ensina. Em vez de
enfatizar conteúdos, resultados, quantidade de noções, informações e
conceitos a serem memorizados, repetidos e copiados, reconhecemos a
importância do processo, de uma metodologia voltada para a qualidade do
processo de aprendizagem que valoriza a pesquisa e os trabalhos em grupo, o
que implica programas e currículos mais flexíveis e adaptáveis às condições
dos alunos, respeitando-se o ritmo individual e o processo de assimilação do
conhecimento.
Contrariamente a uma metodologia que valoriza a dependência
intelectual do aluno em relação ao professor, a Neuropedagigia busca uma
61
nova construção que da autonomia intelectual, que deixa o aluno propor os
seus projetos e os problemas que deseja resolver.
Ao utilizar uma metodologia que leva o indivíduo a aprender a aprender,
a aprender a pensar, utilizando técnicas adequadas que permitem o estudo de
alternativas e tomadas de decisão, significa preparar o indivíduo para aprender
a investigar, aprender a aprender rápido, aprender a gostar de aprender e
dominar diferentes formas de acesso às informações. A possibilidade de um
trabalho interdisciplinar fecundo depende de uma visão geral do modo pelo
qual as disciplinas se articulam entre si.
Neste contexto, os avanços das neurociências proporcionam não só o
entendimento do funcionamento do cérebro, mas também a grande
possibilidade de os educadores transformarem as formas de pensar,
comunicar e reencantar a educação. Estimular os alunos a buscar novas
práticas de ensino-aprendizagem, novos meios de desenvolver a inteligência e
a criatividade será uma oportunidade única e original para as aquisições
cognitivas.
62
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA
ALBRIGHT,T.D.;KANDEL,E.R.;POSNER, M.I. Cognitive neuroscience. Current
Opinion in Neurobiology, 10(5):612-624, 2000.
ALVAREZ, A. & LEMOS,I.C. Os neurobiomecanismos do aprender: a aplicação
de novos conceitps nop dia-a-dia escolar e terapêutico.Rev.
Psicopedagogia,23(71):181-90,2006.
ANTUNES, C. As inteligências múltiplas e seus estímulos. 7.ed. São Paulo:
Papirus,1998.
BEAR, M. F.; CONNORS, B. W.; PARADISO, M. A. Neurociências
Desvendando o Sistema Nervoso. Porto Alegre, RS, Artmed, 20 edição, 2002,
857.
BOËCHAT-FERNANDES,M.H. ;BÜHRER, E.A.C. A Inteligência no processo
ensino/aprendizagem de línguas estrangeiras. ANALECTA. Vol.6(2):21-31,
2005.
CARVALHO, F.A.H. Neurociências e Educação:uma articulação necessária na
formação docente. Trab.Educ.Saude, 8(3): 537-550, 2011.
DAMÁSIO, A R. O Erro de Descartes. São Paulo: Cia das Letras, 1996.
FONSECA, V. Aprender a Aprender: a educatibilidade cognitiva. Porto Alegre:
Artmed, 1998.
63
FREITAS,N.K. Desenvolvimento humano, organização funcional do cérebro e
aprendizagem no pensamento de Luria e de Vygotsky.Ciencias & Cognição, 9:
91-96, 2006.
GARDNER, H. Inteligências múltiplas: A teoria na prática. A teoria das
inteligências múltiplas.Porto Alegre: Artes Médicas Sul, 1993.
_____. Estruturas da mente. A teoria das Inteligências Múltiplas. Porto Alegre:
Artes Médicas Sul, 1994.
GARDNER. H.; KORNHABER, M.; WARREN. K. Inteligência: múltiplas
perspectivas.Veronese, M. A.V. Porto Alegre: Artmed, 1998.
GAZZANIGA,M.S.; IVRY,R.B.; MANGUN,G.R. Neurociência Cognitiva: A Biologia
da Mente. Editora Artmed, 20 edição, 206, 767.
GEAKE,J., COOPER,P. Cognitive neuroscience and education: implications for
education? Westmister Studies in Education, 26(1):720, 2003.
GOSWAMI, U. Neuroscience and Education. British Journal of Education and
Psychology, 74(1): 1-14, 2004.
GOSWAMI, U. The brain in the classroom? The state of the art.
Developmental Science, 8( 6): 467-469, 2005.
GUERRA.L.B. O diálogo entre a neurociência e a educação:da euforia aos
desafios e possibilidades. Revista Interlocução, vol.4(4): 3-12, 2011.
IZQUIERDO, I. Memória. Porto Alegre: Artmed, 2002.
64
JENSEN, E. Brain based learning: the new science of teaching & training.
Thousand Oaks, CA, Corwin Press, 2000.
KANDEL, ER;SCHWARTZ JH. Principles of neural science. New York,
Elsevier, 1991.
KANDEL,ER; SCHWARTZ,JH; JESSEL,TM. Essentials of neural science and
behavior. Nova Jersey, Appleton & Lange, 1995.
LOMBROSO, P. Aprendizado e memória. Rev. Bras. Psiquiatr. 26(3): 207-210,
2004.
LENT,R. Cem Bilhões de Neurônios: conceitos fundamentais da
neurociência. Editora Atheneu, Rio de Janeiro, 2001, 698 pp.
LENT,R. Neurociência da Mente e do Comportamento. Editora Guanabara
Koogan, Rio de Janeiro, 2008, 356 pp.
MACHADO,L. Descubra e Use a sua Inteligência Emocional.Edição Cidade do
Cérebro, 1997.
MACHADO,L. Q.I. não é inteligência: a destruição de um mito.Qualitymark
Editora, Rio de Janeiro, 2010, 79pp.
MATURANA, H. e VARELA, F. A árvore do conhecimento. Campinas, SP: Ed.
Psy II, 1995.
MIRANDA, R.L. Além da Inteligência Emocional: uso integral das aptidões
cerebrais no aprendizado, no trabalho e na vida. Editora Campus, 1997,
213pp.
MORA F. Como funciona o cérebro. Porto Alegre: Artmed,2004.
65
MOREIRA, M.A; MASINI, E.A.F.S. Aprendizagem significativa: a teoria de
David Ausubel. São Paulo, Editora Moraes, 1982.
MOREIRA, M.A., CABALLERO, M.C. e RODRÍGUEZ, M.L. (orgs.). Actas del
Encuentro Internacional sobre el Aprendizaje Significativo. Burgos, España. pp.
19-44, 1997.
OCDE - Organização de Cooperação e Desenvolvimento Econômicos.
Compreendendo o cérebro: rumo a uma nova ciência da aprendizagem. São
Paulo: Editora SENAC, 2003.
OTTA,E.; YAMAMOTO,M.E. Psicologia Evolucionista. Editora Guanabara
Koogan, 2009, 219p.
PRIGENZI,L. Compreendendo o Processo do Aprender Disponível em:
http://www.webartigos.com/artigos/compreendendo-o-processo-doaprender/16373/
RELVAS, M.P. Neurociência e Educação - potencialidades dos gêneros
humanos na sala de aula. Editora Wak, Rio de Janeiro, 2009, 160pp.
RELVAS, M.P. Fundamentos Biológicos da Educação. Despertando
inteligências e afetividade no processo de aprendizagem. Editora Wak, Rio de
Janeiro, 2010, 134pp.
RIESGO, R.S. Anatomia da aprendizagem. In: ROTTA, Newra;OHLWEILER,
Lygia; RIESGO, Rudimar. Transtornos da aprendizagem : Abordagem
neurobiológica e multidisciplinar. Porto Alegre: Artmed, 2006.
ROGERS, C. Liberdade para aprender. Belo Horizonte: Interlivros, 1967.
66
ROMANELLI, E.J.. Neuropsicologia aplicada aos distúrbios de aprendizagem
“prevenção e terapia”. Temas em Educação II – Jornadas 2003.
SÁ,C.S.C.; MEDALHA,C.C. Aprendizagem e Memória – contexto motor.Rev
Neurociências, 9( 3 ) : 1 0 3 - 11 0 , 2 0 01.
STERN, E. Pedagogy meets Neuroscience. Science, 310: 745, 2005.
STERNBERG. R. Psicologia cognitiva. Porto Alegre: Artes Médicas Sul, 2000.
STERNBERG, R. J. & GRIGORENKO, E. L. Inteligência Plena: ensinando e
incentivando a aprendizagem e a realização dos alunos. Porto Alegre:
ARTMED, 2003.
VYGOTSKY, L.S. A Formação social da mente. Trad. José Cipólio Neto et
al. São Paulo: 1991.
67
ÍNDICE
FOLHA DE ROSTO
2
AGRADECIMENTO
3
DEDICATÓRIA
4
RESUMO
5
METODOLOGIA
6
SUMÁRIO
7
INTRODUÇÃO
8
CAPÍTULO I
11
Considerações teóricas sobre aprendizagem.
17
CAPÍTULO II
Neurobiomecanismos do Aprender: compreendendo
o cérebro no processo do aprender
.
2.1– Funcionamento do sistema nervoso humano
19
no processo de aprendizagem.
2. 2 – A trajetória da evolução do cérebro.
2.3 – Componentes anatômicos envolvidos
na aprendizagem.
21
22
CAPÍTULO III
Memória, Aprendizagem e Plasticidade Cerebral
27
3.1 – Memória
3.1.2 Classificação dos tipos de Memórias
27
3.2 – Aprendizagem
28
3.3- Plasticidade cerebral
33
68
40
CAPÍTULO IV
A Inteligência em Evidência
41
4.1 - Tipos de Aprendizagem
4.1.1 - Aprendizagem significativa
4.1.1.2 - Aprendizagem significativa segundo Ausubel
47
48
48
4.2 - Aprendizagem Significativa, Emoções e Sentimentos
4.3 - Modelo de Níveis Emocionais
52
CAPÍTULO V
53
O Papel do Cérebro na Aprendizagem
5.1 - Uso Integral das Aptidões Cerebrais
no Aprendizado
54
56
CONCLUSÃO
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA
59
ÍNDICE
62
67
Download