. PREFEITURA MUNICIPAL DO SALVADOR Secretaria Municipal de Educação e Cultura – SMEC Coordenadoria de Ensino e Apoio Pedagógico – CENAP CONTRIBUIÇÕES TEÓRICAS DE HENRY WALLON (1789-1962)1 Angela Freire2 O médico, psicólogo e filósofo francês considera que o ser humano é organicamente social e sua estrutura orgânica supõe a intervenção da cultura para se atualizar. Nesta direção, a teoria do desenvolvimento cognitivo postulada por Wallon é centrada na psicogênese da pessoa completa. Seu método consiste em estudar as condições orgânicas e sociais de desenvolvimento da criança, que aparece descontínuo, marcado por contradições qualitativas e, através dessas contradições, constrói-se um novo plano da realidade que é o psiquismo e a personalidade. Segundo a teoria de Wallon, a evolução da espécie humana fez do homem um ser geneticamente social, desenvolvendo nele aptidões específicas. Ele considera o desenvolvimento da pessoa completa integrada ao meio em que está imersa, com os seus aspectos afetivo, cognitivo e motor também integrados. A psicologia genética walloniana estuda a gênese dos processos psíquicos, que é um fenômeno biológico e social. A criança, desde seu nascimento, é um ser simultaneamente biológico e social. As capacidades biológicas são os condicionantes da vida em sociedade, mas o meio social é o condicionante do desenvolvimento destas capacidades. Para Wallon, cada etapa do desenvolvimento está caracterizada por uma atividade preponderante. Em cada estágio existe um conflito específico que a criança deve resolver e, o seu desenvolvimento, é balizado por crises que são reestruturações do comportamento infantil. A sucessão das etapas do desenvolvimento apresenta-se de modo descontínuo, ou seja, a passagem de uma para outra não é uma simples ampliação e sim uma recomposição. A noção de estágio é entendida como uma tentativa de definir níveis funcionais, tentativa de aprofundar o conhecimento de modo organizado e as normas que tomam seus diversos comportamentos durante a evolução. O estágio não tem uma base cronológica, mas baseia-se em uma sucessão funcional. Os estágios propostos pela psicogenética walloniana são: 1° ESTÁGIO - IMPULSIVO-EMOCIONAL: abrange o primeiro ano de vida. O principal foco é a emoção, instrumento privilegiado de interação da criança com o meio. A predominância da afetividade orienta as principais ações do bebê às pessoas, as quais intermediam sua relação com o mundo físico. A afetividade é impulsiva, emocional, que se nutre pelo olhar, pelo contato físico e se expressa em gestos, mímica e posturas. 1 2° ESTÁGIO - SENSÓRIO-MOTOR ou PROJETIVO: vai até o terceiro ano de vida. O interesse da criança se volta para a exploração sensório-motora do mundo físico, ou seja, ela descobre o mundo dos objetos. Acontece nesta fase a aquisição da marcha e da preensão, que dão à ela maior autonomia na manipulação de objetos e na exploração dos espaços, assim como o desenvolvimento da função simbólica e da linguagem. A inteligência é pratica e simbólica. O termo projetivo refere-se ao fato da ação do pensamento precisar dos gestos para se exteriorizar. O ato mental "projeta-se" em atos motores. Para Wallon, o ato mental se desenvolve a partir do ato motor. 3° ESTÁGIO – PERSONALISMO: cobre a faixa dos três aos seis anos, a tarefa central é o processo de formação da personalidade. A construção da consciência de si, que se dá por meio das interações sociais, reorienta o interesse das crianças para as pessoas, definindo o retorno da predominância das relações afetivas. 4° ESTÁGIO – CATEGORIAL: acontece por volta dos seis anos, o interesse da criança dirige-se para as coisas, para o conhecimento e conquista do mundo exterior, imprimindo às suas relações com o meio. Há uma preponderância do aspecto cognitivo. 5° ESTÁGIO – PREDOMINÂNCIA FUNCIONAL: caracteriza-se pela crise da puberdade, rompendo com a tranqüilidade afetiva que caracterizou o estágio anterior e impõe a necessidade de uma nova definição dos contornos da personalidade, desestruturados devido às modificações corporais resultantes da ação hormonal. Este processo traz à tona questões pessoais, morais, existenciais, numa retomada da preponderância da afetividade. Wallon atribui à emoção um papel fundamental no processo de desenvolvimento humano. Para ele, quando nasce uma criança, todo contato estabelecido com as pessoas que cuidam dela, são feitos via emoção. A criança é constituída de corpo e emoção, e não apenas cognição. Baseou suas idéias em quatro elementos básicos que se comunicam o tempo todo: afetividade, emoções, movimento e a formação do eu. AFETIVIDADE é um dos principais elementos do desenvolvimento humano. As emoções têm papel fundamental no desenvolvimento da pessoa. É por meio delas que o ser humano exterioriza seus desejos e suas vontades. Em geral, são manifestações que expressam um universo importante e perceptível, mas pouco estimulado pelos modelos tradicionais de ensino. As transformações fisiológicas de uma criança (ou, nas palavras de Wallon, no seu sistema neurovegetativo) revelam traços importantes de caráter e personalidade. A emoção é altamente orgânica, altera a respiração, os batimentos cardíacos e até o tônus muscular, tem momentos de tensão e distensão que ajudam o ser humano a se conhecer. A raiva, a alegria, o medo, a tristeza, a alegria e os sentimentos mais profundos ganham função relevante na relação da criança com o meio. A emoção causa impacto no outro e tende a se propagar no meio social. MOVIMENTO as emoções dependem fundamentalmente da organização dos espaços para se manifestarem. A motricidade, portanto, tem caráter pedagógico tanto pela qualidade do gesto e do movimento quanto por sua representação. A escola infelizmente insiste em imobilizar a criança numa carteira, limitando justamente a fluidez das emoções e do pensamento, tão necessária para o desenvolvimento completo da pessoa. 2 INTELIGÊNCIA o desenvolvimento da inteligência depende essencialmente de como cada uma faz as diferenciações com a realidade exterior. É na solução dos confrontos que a inteligência evolui. Wallon diz que o sincretismo (mistura de idéias num mesmo plano), é fator determinante para o desenvolvimento intelectual. O EU E O OUTRO a construção do eu na teoria de Wallon depende essencialmente do outro. Seja para ser referência, seja para ser negado. Principalmente a partir do instante em que a criança começa a viver a chamada crise de oposição, em que a negação do outro funciona como uma espécie de instrumento de descoberta de si própria. Isso se dá aos três anos de idade, a hora de saber que "eu" sou. Manipulação, sedução e imitação do outro são características comuns nessa fase. A preocupação pedagógica é presença forte na teoria walloniana. Tendo por objeto a psicogênese da pessoa concreta, esta teoria se utilizada como ferramenta para reflexão pedagógica, suscita uma prática que atenda as necessidades da criança nos planos afetivo, cognitivo e motor e promova o seu desenvolvimento em todos os níveis. A pedagogia inspirada na psicogenética walloniana não considera o desenvolvimento intelectual como meta máxima e exclusiva da educação, ao contrário, considera como meta maior o desenvolvimento da pessoa, a inteligência tem status de parte no todo constituído pela pessoa. Os recursos intelectuais enriquecem as possibilidades do eu, ampliando-o e flexibilizando-o. A pedagogia inspirada na psicogenética walloniana não foca meramente o conteúdo e não se limita a propiciar a passiva incorporação de elementos da cultura pelo sujeito, como propõe a tradição intelectualista. Ao contrário, resulta de uma prática em que a dimensão estética da realidade é valorizada e a expressividade do sujeito ocupa lugar de destaque. Expressar-se significa exteriorizar-se, colocar-se em confronto com o outro, organizar-se. Na escola, o movimento de exteriorização do eu pode ser propiciado por atividades de arte, visto que favorece a expressão de estados e vivencias subjetivas. Esta instituição deve visar à autoconstrução do sujeito, oferecendo-lhe oportunidades de aquisição e expressão, nas quais alterne a predominância das dimensões objetivas e subjetivas. No que concerne ao currículo, essa oferta se reflete na integração entre a arte e a ciência. Wallon propõe uma escola engajada, inserida na sociedade e na cultura, ao mesmo tempo, comdesempenha o desenvolvimento dos sujeitos, prática integre a dimensão social Ocomprometida ambiente escolar um decisivo papel na numa promoção do que desenvolvimento da criança, e individual. O planejamento das atividades escolares não deve se restringir à seleção de conteúdos, mas também atingir varias dimensões que compõe o meio. Deve incluir uma reflexão acerca do espaço em que será realizada a atividade, decidindo sobre aspectos como a área ocupada, os materiais utilizados, os objetos colocados ao alcance das crianças, a disposição dos mobiliários, etc. Deve fazer uma reflexão sobre as oportunidades de interações sociais, definindo como deverá ser as atividades e os papéis exercidos. Ao assumir papéis diferenciados, a criança obtém uma noção mais objetiva de si própria. Quanto maior a diversidade de grupos a que participar, mais numerosos serão os parâmetros de relações sociais, o que tende a enriquece a sua personalidade. É bom lembrar que a escola desempenha um importante papel na formação da personalidade da criança. 3 Na análise de Wallon, o/a professor/a deve ter uma atitude crítica-reflexiva e de permanente investigação sobre sua prática cotidiana, levando sempre em consideração a sua ação humana e pedagógica sobre o/a aluno/a e seu desenvolvimento pessoal. Diante dos conflitos, ele/a deve buscar compreender o sentido e o significado dos acontecimentos, desvelando a complexa trama dos fatores que os condicionaram. REFERENCIA GALVÃO, IZABEL. Henry Wallon: uma Concepção Dialética do Desenvolvimento Infantil. Petrópolis, Rio de Janeiro: Vozes, 1995. NOTA 1 O texto aborda alguns conceitos da Teoria de Henry Wallon, que é um dos referencias que dão sustentação teórica ao CEB. Tem a finalidade de subsidiar o saber-fazer pedagógico do/a professor/a para que ele/a possa promover ações educativas reais e significativas, à luz dos constructos teóricos. 2 Texto elaborado e sistematizado por Angela Freire, Pedagoga graduada pela UCSAL, Psicopedagoga (UFBA) e Coordenadora Pedagógica lotada na Coordenação de Ensino e Apoio Pedagógico (CENAP) / Núcleo de Tecnologia Educacional (NET-17), na Fábrica do Saber. 4