REVISÃO Moduladores seletivos dos receptores da progesterona: revisão da literatura Selective modulators of progesterone receptors: literature review Ana Carolina Japur de Sá Rosa e Silva1 Lucia Alves da Silva Lara2 Palavras-chave Receptores de progesterona Progesterona Aborto Keywords Receptors, progesterone Progesterone Abortion Resumo Os moduladores seletivos dos receptores da progesterona (MSRP) são substâncias sintéticas derivadas dos esteroides que têm a capacidade de ocupar os receptores da progesterona e passam a ter ação como antagonista, agonista-antagonista ou agonista desse hormônio, dependendo do tecido alvo. Essas variedades de ações favorecem a utilização dessas substâncias para o tratamento da miomatose uterina, endometriose, entre outros, tendo também importante aplicação na anticoncepção e na reprodução assistida. O mecanismo de ação dos MSRP não está completamente elucidado, uma vez que intercalam efeitos sinérgicos e antagônicos aos da progesterona. Entretanto, sabe-se que têm efeito antiproliferativo, antiangiogênico, aumentam os índices de apoptose celular e promovem uma diminuição do aporte sanguíneo das artérias uterinas e dos vasos espiralados do endométrio. O tempo de utilização dessas drogas é restrito devido aos seus efeitos adversos relacionados, principalmente, alterações endometriais, propriedades abortivas de alguns compostos e efeitos adversos associados com a dose e a utilização em longo prazo. Abstract The selective modulators of progesterone receptors (MSRP) are synthetic compounds derived from steroids that have the ability to bind the progesterone receptor. These substances can act as an antagonist, agonist-antagonist or agonist of the progesterone, and these effects are specific for each target tissue. These properties favor the use of these substances for the treatment of uterine fibroids and endometriosis. These componds can also be used in assisted reproduction and contraception. The precise mechanism by which MSRP acts is not fully understood. However, it is known that these componds have antiproliferative and antiangiogenic effects. Also, MSRP promotes an increase in the rates of apoptosis and decreased blood supply of uterine arteries and vessels of the endometrium. The time of use of these drugs is restricted due to its adverse effects mainly related to endometrial changes, its abortion properties, and adverse effects associated with dose and long-term use. Professora do Departamento de Ginecologia e Obstetrícia da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (FMRP/USP) – Ribeirão Preto (SP), Brasil. Médica Assistente do Departamento de Ginecologia e Obstetrícia da FMRP/USP – Ribeirão Preto (SP), Brasil. Endereço para correspondência: Ana Carolina Japur de Sá Rosa e Silva – Avenida Bandeirantes, 3900 – Vista Alegre – CEP: 14049-900 – Ribeirão Preto (SP), Brasil – E-mail: [email protected] Conflito de interesse: não há 1 2 Silva ACJSR, Lara LAS Introdução Os moduladores seletivos dos receptores da progesterona (MSRP) também chamados mesoprogestinas ou agonista-antagonistas parciais da progesterona são substâncias sintéticas derivadas dos esteroides que, embora sejam estruturalmente diferentes da progesterona endógena, têm a capacidade de ocupar os mesmos receptores desse hormônio. Ao se ligarem ao receptor da progesterona (RP), esses compostos passam a ter ação como antagonista, agonista-antagonista ou agonista, que são ações específicas para cada tecido alvo. O mesmo complexo agente-receptor pode atuar como agonista em um órgão e como antagonista em outro. Sob condições in vitro, um antagonista pode ser convertido em um agonista dependendo do tipo de modelo ligante, do contexto celular, da dose e da duração da exposição ao ligante1 (B). Essas propriedades favorecem a utilização dessas substâncias para o tratamento de condições patológicas, tais como a miomatose uterina e a endometriose, tendo também importante aplicação na anticoncepção e na reprodução assistida. A ação da progesterona se faz através dos seus receptores A (RP-A) e B (RP-B), os quais são codificados por um único gene. A cadeia do RP contém domínios funcionais bem definidos, sendo um domínio N-terminal de trancrição, um domínio central de ligação ao DNA e um domínio de ligação C-terminal. As duas isoformas RP-A e RP-B formam homo e heterodímeros (AA, BB, AB) no processo de ativação da transcrição, que se ligam a elementos de resposta da progesterona na região promotora do gene da progesterona2 (B). Esses receptores apresentam grande similaridade na cadeia principal, porém apresentam conformação espacial diferente e se distribuem diferentemente pelos tecidos. Essas duas isoformas têm, também, ações distintas dependentes do tecido alvo3 (B), sendo que, na maioria das vezes, o RP-B funciona como um ativador (agonista), ao passo que o RP-A funciona como um frenador (antagonista) da transcrição do gene da progesterona. Em geral, o RP-B tem um poder transcricional maior que o RP-A. Em determinados tecidos e, a depender do ciclo menstrual, o RP-A pode não exercer nenhuma ação direta, mas pode funcionar como repressor do RP-B, bem como dos receptores androgênicos e estrogênicos e também dos receptores de mineralocorticoide e glicocorticoide4 (B). Esse efeito ode ser observado no estroma e no epitélio das glândulas endometriais. Esses dois sítios apresentam ambas as isoformas, mas a expressão variável ao longo do ciclo menstrual. A isoforma RP-A está presente ao longo de todo o ciclo menstrual, com predominância no componente glandular ou estromal, dependendo se a fase é a folicular ou a lútea tardia, respectivamente. Já o RP-B está mais expresso na fase lútea5 (B). 544 FEMINA | Dezembro 2011 | vol 39 | nº 12 Fisiologicamente, a progesterona é um hormônio que tem um papel modulador na pulsatilidade do GnRH (em sinergismo com outros reguladores), além de uma ação secretora de gonadotrofinas, enquanto, o estrogênio tem ação, principalmente, na produção hipofisária desses hormônios. Com a proximidade da ovulação, ao final da fase folicular, e após o acúmulo de gonadotrofinas hipofisárias por ação do estradiol ovariano, ocorre uma elevação súbita, efêmera e discreta da progesterona, a qual é responsável pela liberação do hormônio folículo estimulante (FSH) e hormônio luteinizante (LH) acumulado, o que corresponde ao pico pré-ovulatório dessas gonadotrofinas, as quais são imprenscindíveis para a ocorrência da ovulação. Além disso, a progesterona tem função importante na diferenciação do endométrio para a ocorrência da implantação do blastocisto e a manutenção da gravidez. Há uma interdependência entre trofoblasto e corpo lúteo, da qual depende o sucesso de uma gestação inicial, onde a gonadotrofiana coriônica humana (hCG) produzida pelo trofoblasto assume o papel de manutanção do corpo lúteo, que por sua vez produz progesterona, a qual mantém a estabilidade endometrial que permite a manutenção da gestação até o final da 12a semana gestacional, a partir da qual a placenta assume sua autonomia. A progesterona tem também outras funções na gestação inicial, como a inibição das contrações uterinas e a maturação do epitélio mamário. Todas essas ações podem ser bloqueadas ou facilitadas pela ação dos MSRP. Fora do período gestacional, a progesterona tem efeito antiproliferativo sobre o endométrio, por inibição da ação do estrogênio, reduzindo a expressão de seus receptores. O uso clínico dos MSRP parece ser promissor para o tratamento de algumas patologias, como a endometriose e a miomatose uterina, entre outros; entretanto, devido ao potencial abortivo dessas substâncias, esses produtos ainda não possuem registro na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), não sendo, por hora, comercializados no Brasil. Este trabalho propõe verificar “o estado da arte” relativo às aplicações mais relevantes de alguns dos primcipais MSRP em outros países. Para esta revisão foi realizada uma busca nas bases de dados PubMed e Literatura Latino Americana e do Caribe e Ciências da Saúde (LILACS) a procura de trials, estudos de corte tranversal, coortes, ensaios clínicos randomizados e não randomizados, revisão sistemática, metanálise, caso controle sobre o tema. O período das publicações não constituiu critério relevante para a pesquisa. Para a busca dos artigos foram empregados os termos: (selective progesterone receptor modulators) and [(contraception) or (reproduction) or (myoma) or (endometriosis) or (abortion)], os quais resultaram na recuperação de 72 trabalhos. Dentre esses, aqueles com alto grau de recomendação e força de evidência, Moduladores seletivos dos receptores da progesterona: revisão da literatura como metanálise, revisões sistemáticas, ensaios clínicos randomizados, não randomizados, estudos observacionais e caso controle foram privilegiados, sendo, então, selecionados 38 artigos, cujos resultados serviram de base para a construção do presente trabalho. Os demais artigos foram descartados por não estarem diretamente relacionados com o tema. Ação dos moduladores seletivos dos receptores da progesterona O mecanismo de ação dos MSRP não está completamente elucidado, uma vez que intercalam efeitos sinérgicos e antagônicos aos da progesterona. Sabe-se que, assim como a progesterona, têm efeito antiproliferativo possivelmente devido à inibição da expressão gênica do receptor estrogênico6 (B) e pela supressão de fatores de crescimento, da angiogênese e também por promoverem a apoptose7 (C). Além disso, essas substâncias promovem a diminuição do aporte sanguíneo das artérias uterinas e dos vasos espiralados do endométrio, ao contrário do que ocorre com a progesterona8 (B). Quando um composto MSRP entra em contato com o receptor da progesterona, o complexo resultante pode favorecer (ação agonista) ou inibir (ação antagonista) a transcrição de genes podendo, ainda, apresentar as duas propriedades. Essas diferentes ações dependem do tipo de ligação entre o receptor e a substância, do tipo de conformação espacial do complexo resultante e do tipo de tecido no qual está agindo. Além disso, essas ações agonista e antagonista são dependentes da dose utilizada e da afinidade da droga por substâncias coativadoras e correpressoras, cuja distribuição pode ser diferente em diferentes tipos celulares. Em tecidos onde a concentração de coativadores é maior do que a de correpressores, o excesso de coativadores pode conduzir o equilíbrio na direção agonista9 (B). Quando utilizados por longo tempo e em doses mais elevadas, os MSRP podem exibir também efeito estrogênio like, com espessamento do endométrio detectável pelo ultrassom, por mecanismo ainda desconhecido10 (D). As alterações associadas são a dilatação glandular cística e os efeitos no epitélio glandular, compatível com ação estrogênica (mitótica) e progestagênica (secretória); entretanto, essas alterações não representam hiperplasia endometrial. Outros efeitos adversos por longo tempo de uso, com doses elevadas, incluem fadiga, ondas de calor, mastalgia, amenorreia e diminuição do desejo sexual. Até o momento, os estudos indicam que o uso dos MSRP não deve ultrapassar de 3 a 4 meses, para o melhor controle dos efeitos adversos. Substâncias MSRP mais comuns A Tabela 1 evidencia algumas substâncias MSRP sobre as quais existem mais evidências sobre o mecanismo de ação, seus efeitos e aplicações clínicas. Acetato de ulipristal O ulipristal foi o primeiro MSRP a ser utilizado como contraceptivo nos Estados Unidos. Esse composto é um derivado da 19-norprogesterona que funciona como um modulador seletivo do RP, com efeitos tanto agonista quanto antagonista, os quais variam de acordo com a dose empregada e com Tabela 1 - Características de alguns compostos moduladores seletivos dos receptores da progesterona Agente Ulipristal Denominações Nomes fantasia CDB-2914 Ella® Ellaone® Mifepristone RU486 Mifegyne® Mifeprin 200® Mifeprex® Onapristone ZK 98 299 Promegestone R5020 Asoprisnil J867 Acetato de telapristone CDB-4124 Proellex® Progenta® Ação Agonista/antagonista da progesterona Inibe a ruptura folicular Efeito antiproliferativo sobre o endométrio Induz à apoptose Induz ao aborto Antagonista puro e agonista parcial da progesterona Effeito antagonista glicocorticoide Ação estrogênio like induzindo a hiperplasia endometrial Bloqueio da ovulação Descolamento placentário Redução do sangramento uterino Antagonista puro. Nenhuma ação agonista. Efeito antiproliferativo; porém, tem alta toxicidade hepática Comportamento agonista. Inibe a conversão do sulfato de estrona em estradiol Ação agonista-antagonista Reduz a expressão dos fatores de crescimento EGF, TGF, IGF-I. Reduz a expressão dos receptores IGF-IR alfa e TGF RII nos miomas uterinos Incremento dos índices da apoptose celular Inibe a proliferação celular Inibe os receptores estrogênicos por ação indireta Aplicação clínica Contracepção de emergência, coadjuvante no tratamento do câncer ovariano e tratamento da miomatose uterina Prevenção e interrupção da gravidez Tratamento da leiomatose uterina Tratamento do mioma uterino Eficaz no tratamento do câncer de mama Prevenção do câncer de mama Tratamento da leiomiomatose uterina Tratamento da endometriose Tratamento do mioma uterino e endometrioses Prevenção e tratamento do câncer de mama EGF: epidermal growth factor; TGF: transforming growth factor; IGF-I: insulin-like growth factor-I. FEMINA | Dezembro 2011 | vol 39 | nº 12 545 Silva ACJSR, Lara LAS a fase do ciclo menstrual em que está sendo instituido11 (D). Um aspecto positivo dessa substância é que ela parece ser um antagonista relativamente fraco dos glicocorticoides, portanto, com menor efeito sobre o metabolismo glicídico. Essa droga apresenta efeito antiproliferativo sobre o endométrio promovendo a diminuição da sua espessura12 (D). Entretanto, suas ações mais relevantes incluem a sua capacidade de inibir a ovulação e de bloquear a implantação endometrial do óvulo fertilizado13 (D) com efeito abortivo. Os efeitos sobre a ovulação estão vinculados à capacidade dessa droga de retardar o aparecimento ou manter o pico de LH por tempo maior, caso ele já tenha se iniciado. É também conhecido que o ulipristal pode inibir a ruptura folicular, quando administrado na fase folicular. Essas propriedades possibilitam a utilização dessa substância na anticoncepção. De fato, esse composto, na dose de 30 mg pode inibir a ovulação, quando tomado até 120 h (5 dias) após a relação sexual14 (A), com eficácia comparável ao levonorgestrel, podendo ser utilizado para a contracepção de emergência15 (A). Devido a sua capacidade de induzir a apoptose pela fragmentação do DNA16 (D), esse composto tem importante aplicação no tratamento do câncer ovariano. Tem aplicação, também, no tratamento do mioma uterino, por um mecanismo ainda não totalmente elucidado, uma vez que seu efeito apoptótico se mostra restrito em cultura de células de mioma. Os efeitos adversos mais comuns relacionados com essa droga são a cefaleia, náuseas, mastalgia e dor abdominal. Mifepristone O mifepristone tem efeito antiprogestagênico forte (antagonista puro) e um efeito antiglicocorticoide mais fraco, mas pode induzir um incremento nas concentrações do hormônio adrenocorticotrófico (ACTH), do cortisol, da androstenediona e da testosterona. Tem várias aplicações clínicas, as quais são dose dependente. O bloqueio da ovulação é possível com doses de 1 a 2 mg/dia e, em doses mais elevadas (25–50 mg) administradas semanalmente, não ocorre o bloqueio da ovulação, mas as modificações fisiológicas do endométrio são bloqueadas. Essa propriedade confere a essa droga um potencial contraceptivo17 (A). Já, em doses altas, como 200 mg, administradas 48 h após o pico do LH, o mifepristone também apresenta uma ação contraceptiva. Outra importante ação dessa substância está associada às doses superiores a 200 mg, utilizadas por períodos longos (4–6 meses). Nessa condição, o mifepristone pode exibir ação estrogênio like, induzindo a hiperplasia endometrial. Mas, outros estudos evidenciam que, mesmo em mulheres tratadas com 546 FEMINA | Dezembro 2011 | vol 39 | nº 12 doses bastante reduzidas (1 a 10 mg/dia), por um período de 5 a 6 meses, um terço delas também apresentaram hiperplasia endometrial simples. Esse efeito “estrogênico” do mifepristone no aumento da espessura endometrial, visto ao ultrassom, não está completamente elucidado, mas, provavelmente, implica numa ação antagonista no receptor de estrogênio Entretanto, o padrão histológico desse endométrio não corresponde de fato a uma hiperplasia18 (A) e reverte com a suspensão da droga. A ação do mifepristone além de ser dose dependente é, também, dependente da condição hormonal da mulher. Em mulheres na fase reprodutiva, doses baixas têm um efeito antiproliferativo no endométrio, enquanto doses mais altas resultam em vários graus de espessamento endometrial. Em estudo recente, foi evidenciado que baixas doses do mifepristone, iniciadas no 15º dia do ciclo e administradas diariamente, são efetivas para diminuir a receptividade do endométrio sem induzir seu espessamento19 (D). O mifepristone também tem outras aplicações importantes no controle dos sintomas relacionados com a miomatose uterina e a endometriose; essa substância promove a redução da dor, do sangramento e do tamanho dos miomas por um mecanismo ainda não totalmente esclarecido. Em mulheres portadoras de endometriose, também ocorre redução da dor associada a essa doença. O mecanismo de ação ainda não está bem elucidado, porém com a administração desse composto há manutenção de níveis estrogêncos correspondentes aqueles da fase folicular incial, não sendo o hipoestrogenismo o mecanismo responsável por esses efeitos20,21 (B). Asoprisnil (J867) O asoprisnil é um agonista da progesterona com alta afinidade para o seu receptor, que também apresenta afinidade moderada para os receptores de glicocorticoides e baixa para os receptores androgênicos22 (D). Em contrapartida, não apresenta nenhuma afinidade para os receptores mineralocorticoides e nem para os receptores estrogênicos, promovendo um efeito antiestrogênico fraco com ação antagonista menor do que a do mifepristone; dessa forma, a ação dessa substância não altera as concentrações séricas do estradiol23 (A). Essa substância tem um efeito frenador sobre a expressão dos fatores de crescimento EGF (epidermal growth factor), TGF (transforming growth factor), IGF-I (insulin-like growth factor-I), e dos receptores IGF-IR alfa e TGF-RII nos miomas uterinos, e promove um incremento nos índices de apoptose24 (B). O asoprisnil aplicado no endométrio de coelhas comporta-se como um agonista-antagonista da progesterona promovendo mucificação da vagina e redução do volume uterino. Esse efeito sobre o útero possivelmente ocorre por redução na síntese do Moduladores seletivos dos receptores da progesterona: revisão da literatura colágeno, e consequentemente redução da deposição desse nos fibromas, o que leva a uma diminuição do seu volume25 (B). Ainda nos miomas, o asoprisnil promove um incremento nos índices de apoptose, também por seus efeitos negativos sobre o retículo endoplasmático26 (B). Em uma dose de 25 mg/dia durante 12 semanas, esse composto é efetivo para controlar os sintomas de sangramento e dor relacionados com a presença do mioma uterino. Essa ação está associada a um substancial incremento nos índices de pulsatilidade e resistência da artéria uterina27 (B). Mas, também é efetivo para promover a atrofia endometrial com redução do sangramento associado à miomatose uterina. O asoprisnil tem efeito discreto sobre o útero gravídico sendo ineficaz para a indução do parto; entretanto, a depender da dose utilizada, pode promover a supressão da menstruação independente dos efeitos sobre a ovulação22 (D). Já, em células tumorais da mama tem um efeito antagonista ao se ligar ao RP-B. Embora tenha a mesma ação do mifepristone, as vias de recrutamento dos coativadores e correpressores das duas substâncias são diferentes28 (B). Acetato telapristone Esse composto é um antagonista da progesterona utilizado para a prevenção e tratamento do câncer de mama, para o tratamento da endometriose e da miomatose uterina. Promove uma diminuição nos índices de proliferação celular (inbição das fases G0-G1/S), e um incremento nos índices de apoptose. Não afeta os níveis de estradiol, embora promova a inibição das expressões das proteínas estimuladoras da divisão celular, cinases (CDK) 2 e 4, que estão relacionados com a expressão do receptor estrogênico nos tecidos29 (B). Por outro lado, outros estudos sugerem que o efeito apoptótico dessa substância é insignificante30 (B). Promegestone Essa substância comporta-se como um agonista da progesterona e tem a ação de inibir a conversão do sulfato de estrona em estradiol. Por esse efeito antiestrogênico, é utilizado como coadjuvante na prevenção do câncer de mama31 (B). Aplicação dos MSRP Os moduladores seletivos dos receptores da progesterona têm aplicações clínicas importantes como, por exemplo, no tratamento dos meningiomas não operáveis32 (C), os quais expressam receptores de progesterona. Já, as principais aplicações ginecológicas desses compostos incluem o tratamento de miomas uterinos e endometriose, bem como a contracepção, contracepção de emergência, abolição da atividade miometrial durante a gestação, eliminação do feto morto, indução do parto, controle do sangramento uterino, entre outros. Os MSRP com ação agonista-antagonista podem ter um efeito mínimo sobre a interrupção da gravidez em animais, enquanto os antagonistas puros como o mifepristone exibem um potente efeito abortivo. Eles são importantes para o amadurecimento do colo uterino no processo de resolução de gravidezes que terminam em morte embrionária e fetal, para o tratamento da gravidez ectópica e para a indução do parto a termo33 (D). No tratamento da endometriose, seus benefícios estão vinculados ao potencial antiproliferativo que esses compostos apresentam, bem como a indução da apoptose levando a redução dos focos de endometriose. Esses efeitos estão também associados a diminuição do volume dos miomas uterinos. Com relação aos miomas, os MSRP, mesmo em baixas doses, promovem uma melhora substancial do sangramento e da dor, apesar de ter efeito modesto sobre o tamanho do mioma, com a vantagem de não promover a hiperplasia endometrial34,35 (A). O CP8947 apresenta um potente efeito agonista da progesterona, tanto no endométrio, como nas células miomatosas, nas quais tem um efeito antiproliferativo sem interferir na célula miometrial normal36 (D). O asoprisnil reduz a intensidade e duração do sangramento em uma dose de 10 a 25 mg/dia por 4–8 semanas37 (A), tem efeito antiproliferativo sobre a célula miomatosa, acelera o processo de apoptose nessas células, também sem apresentar efeitos adversos sobre a célula miometrial normal38 (B). Os MSRP apresentam importante ação como contraceptivos de emergência. O ulipristal foi considerado efetivo como um contraceptivo de emergência até cinco dias após a relação sexual desprotegida, tendo como principal efeito adverso a cefaleia15 (A). Embora essas substâncias tenham aplicações clínicas importantes, o desenvolvimento de efeitos colaterais, tais como espessamento do endométrio tem limitado a sua administração para não mais de 3–4 meses. Conclusão Os MSRP são substâncias que apresentam diversas aplicações clínicas importantes, mas são utilizados de forma restrita devido às propriedades abortivas de alguns compostos e aos efeitos adversos associados a utilização em longo prazo. Novas pesquisas são necessárias para elucidar o mecanismo de ação de cada uma dessas drogas e identificar a menor dose efetiva para o controle dos efeitos adversos a elas relacionados. Isso pode ampliar a utilização de alguns desses compostos para a prevenção do câncer de mama e para o tratamento de patologias como a miomatose uterina e a endometriose. A aplicação na indução do trabalho de parto normal é mais restrita devido ao desconhecimento do mecanismo de ação e efeitos sobre o concepto. FEMINA | Dezembro 2011 | vol 39 | nº 12 547 Silva ACJSR, Lara LAS Leituras suplementares 1. 2. 3. 4. 5. 6. 7. 8. 9. 10. 11. 12. 13. 14. 15. 16. 17. 18. 19. 20. 21. 548 Kahmann S, Vassen L, Klein-Hitpass L. 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