Clipping Diário da CONTEC 29.10.2008 Fed pode cortar o juro pela metade; BC deve manter a taxa Diferença de atitude no Brasil e nos EUA revela benefício de ser rico e ter uma moeda forte Num momento dramático da economia mundial, mais uma vez fica evidente o fosso que separa as economias desenvolvidas das emergentes. Amanhã, terminam as reuniões de decisão da taxa de juros básica tanto nos Estados Unidos como no Brasil. Enquanto o Federal Reserve (Fed, banco central norte-americano) deve baixar os Fed Funds de 1,5% ao ano para 1% ou 0,75% (pelas projeções de contratos futuros), boa parte do mercado no Brasil aposta que o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC) manterá a Selic em 13,75%. Há até analistas que defendem o aumento de 0,50 ponto porcentual. É verdade que a economia americana já é considerada em recessão por quase todos os analistas, que estimam recuo do Produto Interno Bruto (PIB) no terceiro trimestre e no restante do ano. No Brasil, onde o PIB vinha crescendo a um ritmo de 6% ao ano até o segundo trimestre, a expectativa é que a expansão continue no segundo semestre, embora já perdendo fôlego com a freada no crédito. Ainda assim, o contraste entre a atitude de estímulo desinibido do Fed e a cautela do Copom vai além de questões conjunturais e revela os benefícios de ser rico e ter uma moeda forte. Para Ricardo Carneiro, do Instituto de Economia da Universidade de Campinas (Unicamp), há fatores estruturais e conjunturais que explicam a divergência de atitude dos BCs. Em relação aos EUA, ele observa que "não se pode querer que a moeda de reserva sofra os mesmos constrangimentos que uma moeda periférica". Segundo Carneiro, a diferença fundamental é que os Estados Unidos emitem o dólar, o principal denominador das transações e dos ativos financeiros na economia global. Ao contrário de um país emergente com circulação livre de capitais, em que a fixação dos juros têm de levar em conta a taxa de câmbio contra o dólar - uma moeda "de maior qualidade" do que o real -, os Estados Unidos decidem sua política monetária sem grandes preocupações com os juros de outros países ou considerações cambiais. Do ponto de vista conjuntural, o economista acha que o nível dos juros no Brasil é exageradamente alto em razão do que considera como a política monetária ultraortodoxa do BC ao longo dos últimos anos. Gino Olivares, economista-chefe do Opportunity Asset Management, acha que a diferença de conduta dos dois BCs deve-se, fundamentalmente, ao fato de que a crise financeira global significa um choque deflacionista nos Estados Unidos, enquanto no Brasil o choque tem impactos mais ambíguos e pode ser inflacionário. "Um país da periferia não pode descer os juros como os países ricos", ele diz, observando que é provável que o Japão corte os seus ainda nesta semana e o Banco Central Europeu (BCE) e da Grã-Bretanha façam o mesmo na próxima. O motivo básico para o possível efeito inflacionário da crise no Brasil é a disparada do câmbio, que pode ser repassada aos preços. Olivares é favorável ao aumento de 0,50 ponto porcentual na Selic nesta quarta-feira, quando termina a reunião do Copom. Mas ele acha mais provável que o BC opte pela manutenção. Edward Amadeo, economista da Gávea Investimentos, acha que a história brasileira de muita inflação e volatilidade no câmbio ainda pesa contra o espaço de manobra do BC. "A credibilidade do Banco Central no combate à inflação ainda é menor do que a do Fed", ele diz. Ainda assim, Amadeo acha que o Brasil pode estar caminhando lentamente para a situação em que, num cenário de ameaça forte de desaceleração, o BC poderia rapidamente baixar os juros. "É um processo que continua em andamento, mas, no momento, foi interrompido por esta crise", ele diz. *Estado de S.Paulo Câmara aprova MP que autoriza ajuda a bancos Texto aprovado acrescentou punição para banqueiros em caso de inadimplência e envio de relatório trimestral do BC ao Congresso A Câmara dos Deputados aprovou ontem a Medida Provisória nº 442, que autoriza o Banco Central a socorrer os bancos com operações especiais de redesconto e com garantia de empréstimos em moeda estrangeira. Uma das mudanças feitas pelos deputados no texto da MP prevê que, em caso de inadimplência nessas operações, por um período superior a 90 dias, os controladores das instituições financeiras passam a ter responsabilidade solidária e os seus bens ficarão indisponíveis. Essa punição para os banqueiros, em caso de inadimplência, foi proposta pelo deputado Paulo Renato (PSDB-SP) e acolhida pelo relator da MP, deputado Rodrigo Rocha Loures (PMDB-PR). Na justificativa da emenda, Paulo Renato observou que o objetivo da MP é restabelecer a normalidade das condições de liquidez, sobretudo das pequenas instituições financeiras, mas disse que ela "não pode estimular operações de crédito duvidoso". Outra mudança no texto original da MP, feita pelo relator e aprovada pelo plenário da Câmara, determina que o Banco Central encaminhe ao Congresso Nacional, a cada três meses, relatório sobre as operações realizadas. O BC deverá indicar, entre outras informações, o valor total trimestral e o acumulado no ano das operações de redesconto ou empréstimos realizadas, as condições financeiras médias aplicadas nessas operações, o valor total trimestral e acumulado anual de créditos adimplidos e inadimplidos, além de um demonstrativo do impacto dessas operações nos resultados da instituição. O texto aprovado pela Câmara obriga ainda o presidente do Banco Central a comparecer ao Congresso, a cada semestre, em reunião conjunta das Comissões de Finanças da Câmara e de Assuntos Econômicos do Senado, para informar e debater sobre os valores agregados e a taxa média praticada nas operações de redesconto em reais. O relator aproveitou para fazer uma mudança que não está diretamente relacionada ao tema da MP. Ele acolheu emenda do deputado José Carlos Araújo (PR-BA) que dispensa de qualquer outro registro público as operações de arrendamento mercantil ou qualquer outra modalidade de crédito ou financiamento de veículo automotor. Pela nova regra, a propriedade fiduciária de veículos será constituída tão somente mediante a anotação do respectivo contrato perante a repartição competente para o licenciamento do veículo (ou seja, o Detran). A MP será, agora, analisada pelo Senado. *Estado de S.Paulo Crédito imobiliário vai crescer, diz Bradesco Segundo o banco, o mercado continuará aquecido, apesar da crise financeira internacional Apesar da crise internacional, que deve provocar desaceleração do crescimento econômico no Brasil nos próximos meses, o Bradesco prevê que o crédito imobiliário continuará aquecido. "O mercado imobiliário continuará aquecido, mesmo com a desaceleração da economia. Não haverá falta de recursos, porque há a exigibilidade (obrigação de aplicar recursos da caderneta de poupança em crédito imobiliário) a ser cumprida", afirmou ontem o diretor de Relações com Investidores do Bradesco, Milton Vargas, durante teleconferência com analistas financeiros. O Bradesco separou, para este ano, R$ 5,7 bilhões para financiamento de imóveis. Até o encerramento do terceiro trimestre, R$ 4,812 bilhões já estavam comprometidos para essa finalidade. "Falta pouco para cumprirmos a meta estipulada para este ano. E acredito que não teremos dificuldade, tendo em vista os negócios que já estão em andamento", disse. Já em relação ao crédito concedido para compra de automóveis, o Bradesco admite um arrefecimento. Segundo o presidente do banco, Marcio Cypriano, as operações de empréstimo estão sendo feitas normalmente pelo Bradesco, com exceção dos financiamentos de veículos. "Já verificamos uma queda razoável nessa modalidade. O mercado se ressentiu mais com a crise e decidimos adotar algumas medidas que consideramos adequadas para o momento, como a exigência de uma entrada maior para os financiamentos e redução de prazos, que estavam muito alongados", afirmou, também durante a teleconferência. Em setembro, a posição do Bradesco em financiamento ao consumo, que inclui crédito para compra de veículos, crédito pessoal, consignado e financiamento de bens, entre outros, era de R$ 56,19 bilhões. Esse valor representa uma alta de 5,5% em relação ao final do segundo trimestre de 2008 e de 28,3% nos últimos 12 meses. INADIMPLÊNCIA O Bradesco trabalha com previsão de estabilidade nos níveis de inadimplência nos próximos meses. A taxa de inadimplência total do banco ficou em 3,5% em setembro deste ano, uma queda de 0,2 ponto porcentual em relação ao registrado no mesmo mês do ano passado, de 3,7%. "Esperamos estabilidade nos próximos trimestres, ressaltando que o comportamento da renda e do emprego serão fundamentais para que isso ocorra no segmento de pessoa física", afirmou Vargas. A equipe de análise econômica do Bradesco estima um crescimento de 3% para o Produto Interno Bruto (PIB) em 2009. Com base nessa estimativa, o banco prevê que pode alcançar uma alta de 20% no crédito no próximo ano. Para 2008, o Bradesco acredita que alcançará uma taxa de crescimento entre 29% e 30% no crédito. RESULTADOS Na segunda-feira, o Bradesco anunciou seus resultados do terceiro trimestre. O lucro, de R$ 1,91 bilhão, foi o terceiro maior resultado da história registrado entre bancos brasileiros para o período trimestral de julho a setembro. A comparação foi feita pela consultoria Economática, ajustando os dados de anos anteriores à inflação medida pelo índice IPCA. *Estado de S.Paulo Lucro do Santander sobe 1,3% e vai a R$ 2,2 bi Resultado entre janeiro e setembro já considera a incorporação do Real O lucro líquido do Grupo Santander Brasil, originado a partir da fusão dos bancos Santander e Real, cresceu 1,3% de janeiro a setembro e atingiu R$ 2,23 bilhões. A instituição não informou o resultado relativo ao terceiro trimestre porque os números não são comparáveis com os do mesmo período do exercício de 2007 - quando os dois bancos operavam separadamente. Em outubro do ano passado, o espanhol Santander comprou, em parceria com o belga Fortis e o britânico RBS, as operações do holandês ABN Amro no mundo. Aqui no Brasil, o ABN era dono do Real. A exemplo do que tem ocorrido com a maioria dos bancos de varejo que atuam no País, o resultado do grupo foi puxado pela expansão do crédito, que, no caso do Santander, chegou a 25% nos 12 meses encerrados em setembro. "Crescemos um pouco abaixo do mercado porque temos participação menor em crédito consignado e leasing", explicou o presidente do grupo, Fabio Barbosa, que também comanda a Federação Brasileira de Bancos (Febraban). Os empréstimos às pessoas físicas cresceram 23%, para R$ 57,25 bilhões, e às pessoas jurídicas, 28,9%, para R$ 67,65 bilhões. Para sustentar essa expansão, Barbosa informou que as provisões para créditos duvidosos avançaram 32% acima da própria alta da carteira de empréstimos. Segundo ele, os resultados da área de tesouraria (que aplica os recursos do próprio banco) foram negativamente impactados pela alta da taxa básica de juros (Selic) nos últimos meses. Em abril, o Banco Central (BC) iniciou um processo de aperto monetário, que levou a taxa básica de 11,25% para os atuais 13,75% ao ano. Em compensação, o executivo frisou que a crise global não afetou os números do grupo no intervalo janeiro-setembro. O efeito, porém, será sentido daqui para frente. A expansão da carteira de crédito, por exemplo, deve ocorrer em um ritmo menor. segundo Barbosa. Neste ano, o executivo estima um crescimento de 25%. Para 2009, a expectativa é de algo entre 15% e 20%. "Mais para 15%", disse Barbosa. Ele ressaltou que os números referentes a 2009 não são exclusivos do Santander, mas tomam por base a expectativa média do mercado. "Falar em 15% é algo excepcional, se levarmos em conta que não deve haver expansão no resto do mundo." DERIVATIVOS E COMPULSÓRIO O grupo Santander informou que sua exposição às operações de derivativos de câmbio, que provocaram perdas milionárias a empresas como Sadia, Aracruz e Votorantim, é de R$ 1,42 bilhão (considerando-se uma taxa de câmbio de R$ 2,25 por dólar). O número de clientes é de 60. "Havia um pouco de fantasmas sobre isso", disse Barbosa. "Achamos positivo que outros bancos abriram seus números e decidimos divulgar também." Sobre a compra de carteiras de crédito de instituições menores - operação estimulada pelo BC por meio da redução dos depósitos compulsórios -, Barbosa informou que 10 já foram compradas. Outras seis estão em fase de finalização e há, ainda, 11 em negociação. O total investido no negócio pode alcançar entre R$ 2 bilhões e R$ 2,5 bilhões. NÚMEROS 25% foi o crescimento da carteira de crédito do Grupo Santander nos 12 meses encerrados em setembro 28,9% foi a expansão da carteira de empréstimos para empresas, que atingiu R$ 67,6 bilhões R$ 1,42 bilhão é a exposição do banco a derivativos de câmbio, que causaram perdas a várias empresas, com dólar a R$ 2,25 *Estado de S.Paulo Lula defende que o Estado passe a regular o sistema financeiro Em Salvador, presidente afirma que vê a crise com duração e conseqüências imprevisíveis Quando a nona Cúpula Brasil-Portugal foi agendada, a pauta do encontro entre chefes de governo e ministros dos dois países girava em torno de temas amenos, como a uniformização da língua portuguesa e as possibilidades de ampliação do comércio bilateral entre os países. O que se viu ontem, em Salvador, porém, foi uma discussão intensa em torno das possibilidades de ação do Estado sobre a economia. "Chegou a hora da política", bradou Lula, em seu pronunciamento, no qual reconheceu que crise financeira global "tem duração e conseqüências imprevisíveis". "O que estou defendendo não é o Estado se intrometer na economia, mas é o Estado que tenha força política para regular o sistema financeiro", argumentou. "Está na hora de os políticos entrarem em ação para que o sistema financeiro tenha a obrigação de ganhar sobre a produção, sobre a geração de postos de trabalho, juntando dinheiro como faz qualquer trabalhador que quer comprar uma TV, não com a especulação, com a troca de papéis, para de uma vez por todas abolirmos o cassino que se transformou o sistema financeiro internacional." O primeiro-ministro português, José Sócrates Pinto de Sousa, diz concordar que, com a crise, ficou demonstrado que o Estado tem de estar mais presente na economia. "Não temos o direito moral de deixar o sistema financeiro atuando como atuava antes da crise", afirma. "Estamos vivendo uma crise que se vive uma vez na vida - e ela não é justa. Todo mundo vai pagar um preço. Mas a crise mostra como estava errado quem seguia o pensamento único do mercado." Segundo Lula, o Brasil reunia condições para não ser tão afetado pela crise, mas foi afetado por uma suposta ganância excessiva. "Batalhamos honestamente por seis anos para tornar a economia brasileira respeitável, sólida. As empresas brasileiras ganharam, nos últimos anos, muito mais do que vinham ganhando", argumenta. "E por que estamos vendo sinais da crise? Porque algumas empresas resolveram investir em uma coisa chamada derivativo para ganhar um pouco mais. Neste país, ninguém tinha o direito de tentar, de forma quase ilícita, conseguir mais do que o mercado dava." Para o presidente, este é um momento de reflexão para os países. "As economias emergentes não podem seguir sendo vítimas de um receituário financeiro que nunca foi seguido pelos países ricos", acredita. "Por isso, é preciso investir no comércio, nos acordos da rodada de Doha, em desemperrar as negociações entre o Mercosul e a União Européia." Além das discussões sobre a crise mundial, os chefes de governo assinaram memorandos de entendimento nas áreas de biocombustíveis, gás natural e energia elétrica. Um dos acordos firmados envolve a Petrobras Biocombustível, a empresa petrolífera portuguesa Galp e o Governo da Bahia e visa ao desenvolvimento de estudos para a implantação de um pólo produtor de biocombustíveis feitos de dendê e girassol em território baiano. *Estado de S.Paulo Crédito chega ao consumidor, diz Febraban Entidade nega que instituições estejam segurando os empréstimos O presidente da Federação Brasileira de Bancos (Febraban), Fabio Barbosa, negou ontem que as instituições financeiras estejam segurando o dinheiro dos depósitos compulsórios liberados pelo Banco Central (BC). "Não faz sentido captarmos dinheiro no mercado pagando 102% do CDI (taxa de juro que de referência do mercado interbancário) e recebermos 100% do CDI aplicando em títulos públicos", argumentou. Ele ressaltou que os bancos não têm "posição antagônica à do presidente Lula" no que se refere à ampliação do crédito. Barbosa explicou que alguns fatores ainda colaboram para a escassez de empréstimos. O primeiro é a diminuição de linhas externas de financiamento. O segundo é o fato de que algumas medidas do governo para aliviar a crise de liquidez ainda não fizeram todo o efeito. Ele comparou o processo à abertura de uma torneira de água quente - demora um tempo entre a abertura da torneira e a vazão. Por fim, Barbosa lembrou que a própria demanda do consumidor caiu após o aprofundamento da crise. Ontem de manhã, o presidente da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq), Luiz Aubert Neto, criticou as decisões do governo para dar liquidez ao mercado e disse que elas "ajudam a dar sangue ao vampiro". Aubert Neto afirmou que, além de segurar os recursos que estão sendo liberados pelo BC, os bancos estariam aumentando absurdamente as taxas de juros. No fim da tarde, a Febraban divulgou uma nota na qual afirma que os bancos "estão fazendo com que os recursos cheguem" às empresas e aos consumidores. A entidade cita dados do BC para mostrar que os números do crédito prosseguem em evolução. Mesmo diante da turbulência econômica mundial, a soma total alcançou em setembro R$ 1,15 trilhão, com acréscimo de 34% em 12 meses e de 3,5% no mês. O comunicado diz, ainda, que o total de crédito no País atingiu o recorde de 39,1% do Produto Interno Bruto (PIB), "indicando a continuidade da expansão dos financiamentos na economia brasileira". Segundo a Febraban, os grandes bancos privados também têm comprado carteiras de crédito, "no empenho de injetar recursos na economia e melhorar as condições de liquidez do sistema". Até anteontem, informou a federação, as principais instituições financeiras haviam comprado 53 carteiras de diferentes empresas - o equivalente a cerca de R$ 4,8 bilhões. *Estado de S.Paulo Governos já gastaram 11% do PIB global para salvar bancos Relatório do BC britânico prevê mais perdas com a contaminação dos mercados emergentes Os governos já gastaram mais de 11% do Produto Interno Bruto (PIB) global para dar liquidez e salvar os bancos desde abril, o equivalente a mais de quatro vezes o tamanho da economia brasileira. Mas a crise fará com que os bancos em todo o mundo acumulem perdas equivalentes a dois "Brasis", cerca de US$ 2,8 trilhões. E o próximo capítulo da turbulência mundial pode ser justamente a contaminação dos mercados emergentes, o que ampliaria as perdas dos bancos nos países ricos. A avaliação é do Banco da Inglaterra, o BC britânico, que vê a instabilidade das últimas semanas como a pior da história. O banco ainda teme pela saúde das economias emergentes, que não conseguiram evitar a crise criada nos países ricos. Numa nova etapa da turbulência, a instabilidade nos emergentes - que acreditavam estar imunes - pode alimentar ainda mais os prejuízos no sistema. Segundo os ingleses, o volume do prejuízo deve ser duas vezes maior do que calculava há cerca de um mês o Fundo Monetário Internacional (FMI). O pior, segundo a análise dos britânicos, é que a crise ainda não chegou ao fim e mais prejuízos podem ocorrer, mesmo com a ajuda dos governos. Segundo os cálculos, as perdas equivalem a 5% do PIB mundial. O maior prejuízo ficará com os americanos: US$ 1,57 trilhão apenas nos bancos, o dobro do que se imaginava. Na zona do euro, serão 784,6 bilhões. Só no Reino Unido, os bancos perderão quase US$ 300 bilhões, contra uma previsão inicial de US$ 130 bilhões. "O sistema bancário global enfrentou seu episódio de maior instabilidade desde o início da Primeira Guerra Mundial", disse o relatório mensal do BC britânico. O vicepresidente do banco, John Gieve, foi além e afirmou que é a "pior crise de que se tem lembrança". Para Gieve, a turbulência pode continuar, mesmo com mais de US$ 6,8 trilhões injetados no sistema pelos governos desde abril. Só os pacotes dos governos para salvar seus bancos e economias nas últimas semanas somaram US$ 4 trilhões. Em perdas de valores das ações nos mercados globais, a queda já equivale a US$ 27 trilhões desde o início do ano. A comparação com outras crises é inevitável. Para solucionar os problemas de mudanças climáticas, o mundo precisaria investir entre 1% e 2% do PIB. Para acabar com a fome, apenas metade do que foi dado aos bancos ingleses, US$ 30 bilhões. Para lutar contra a aids, apenas US$ 10 bilhões por ano. Para o BC inglês, porém, os riscos ainda prevalecem no sistema e bancos de todo o mundo terão de ajustar seus balanços e modelos de financiamento. "O crescimento dos empréstimos levará tempo para se recuperar", diz o relatório. "A instabilidade no sistema financeiro global nas últimas semanas foi a mais severa de que se tem memória. Com uma desaceleração econômica mundial a caminho, o sistema financeiro continua ameaçado", disse Gieve, que destaca o papel dos governos. Para o BC inglês, novos mecanismos de controle de riscos são necessários. Dos US$ 6,8 trilhões usados, US$ 600 bilhões serão destinados a recapitalizar os bancos, além de outros US$ 600 bilhões para comprar ações tóxicas. Já as garantias para os correntistas custarão US$ 3 trilhões, e mais US$ 1,1 trilhão para dar liquidez entre os bancos e nacionalizações. Ainda assim, isso é apenas parte do que o BC inglês estima que existam de ações podres dos bancos, num total de US$ 14,5 trilhões. "Os riscos continuam." EMERGENTES Uma nova etapa da crise poderia ser a contaminação dos países emergentes, que já dão sinais de fraqueza. A queda nas bolsas de vários mercados, como Brasil, Argentina, Rússia e Índia são exemplos de que essas economias não estão isoladas do problema. "Há sinais crescentes de stress em muitas economias emergentes", disse o BC inglês no relatório. Para os europeus, um dos riscos agora é de que os bancos que estão expostos aos mercados emergentes voltem a perder com a volatilidade nessas economias. "Desenvolvimentos negativos nas economias emergentes poderia adicionar um novo problema ao sistema financeiro", diz o relatório. "Grandes bancos em economias desenvolvidas, por exemplo, com operações internacionais podem ficar expostos a uma significativa perda de créditos", acrescentou. Líderes de vários países, inclusive o Brasil, passaram semanas acusando os países ricos pelos problemas. Mas agora os ricos temem que a instabilidade nos emergentes faça a crise se prolongar. Hedge funds e outras entidades são as que ofereceriam maior risco. *Estado de S.Paulo Brasil perde fundos argentinos Governo Cristina Kirchner manda que o saldo das aplicações seja repatriado até sextafeira O governo da presidente Cristina Kirchner determinou ontem que os fundos de pensões, conhecidos na Argentina pela sigla AFJPs, devem repatriar, nesta semana, os US$ 600 milhões que investiram em ações no Brasil. Nesta quarta-feira, as AFJPs deverão levar para a Argentina 33% dos seus investimentos no Brasil; na quinta-feira, outros 33%, e na sexta-feira, o restante. A resolução foi assinada por Amado Boudou, superintendente das AFJPs e diretorexecutivo da Anses, a Previdência estatal, organismo que absorverá as aposentadorias privadas. Recentemente, o governo anunciou o plano de reestatizar o sistema privado de aposentadorias e, assim, levar os filiados das AFJPs para a Previdência estatal. Com a medida, que começou ontem a ser debatida numa comissão do Parlamento, em 2009 o governo arrecadará mais de US$ 5 bilhões em contribuições. Também terá o controle de US$ 30 bilhões em ações de 25 grandes empresas, hoje em mãos das AFJPs, além de bônus da dívida pública. Por trás da decisão de obrigar os fundos de pensões a repatriar o dinheiro investido no Brasil, afirmam os analistas, está o temor do governo de que essas entidades liquidem essas ações antes de concretizada a reestatização. Ontem, Sergio Chodos, gerente-geral da Superintendência das AFJPs, disse que, embora os fundos investidos no Brasil devam voltar para a Argentina, não há nenhum destino especificado para eles. Ele recomendou que o dinheiro seja investido em renda fixa. "É a opção mais razoável por causa da volatilidade nos mercados." Chodos não descarta a hipótese de a repatriação dos fundos ter efeitos na Bolsa de São Paulo. A repatriação tem precedentes. Em 2007, o governo ordenou a redução de 10% para 2%, a o longo de um ano, das carteiras de investimentos que as AFJPs tinham nos países do Mercosul. O processo ainda foi concluído, pois as AFJPs atualmente podiam ter até 4% dos fundos nos países do bloco. FUGA DA CRISE Assustados com os possíveis efeitos da crise financeira internacional, os argentinos estão tirando o dinheiro do país. Segundo dados do Banco Central, no terceiro trimestre deste ano saíram US$ 5,8 bilhões, valor superior ao saldo comercial do período, de US$ 5,4 bilhões. Para os analistas, o volume será muito superior quando for contabilizada a fuga de divisas ocorrida em outubro. O dinheiro está saindo dos bancos locais para ser guardado em contas no exterior, caixas de segurança dentro e fora do país e nos mais variados esconderijos domésticos, como o colchão. Como ocorreu durante a crise econômica de 2001-2002, os bancos no Uruguai, localizados a apenas uma hora (na cidade uruguaia de Colonia) ou três (no caso dos bancos em Montevidéu) de navio da capital argentina, estão sendo o refúgio dos preocupados argentinos. Antes da crise da virada do século, a presença de argentinos no sistema financeiro privado uruguaio era de 54%, alcançando US$ 6,1 bilhões. Depois, caiu para US$ 1,09 bilhão em 2003. Mas a desconfiança em manter o dinheiro na Argentina levou os habitantes do país a aumentar novamente a presença no Uruguai. Atualmente, os depósitos de argentinos no sistema privado do outro lado do Rio da Prata alcançam US$ 2,13 bilhões. Em setembro os depósitos de estrangeiros no Uruguai aumentaram US$ 100 milhões, a maior alta dos últimos sete anos. "Os argentinos estão chegando com malas cheias de dinheiro e alugam caixas de segurança", disse José Amorim Batlle, deputado e pré-candidato presidencial do Partido Colorado e sobrinho do ex-presidente Jorge Batlle. Segundo o parlamentar, muitos argentinos "estão raciocinando da seguinte forma: se o governo pegou os depósitos dos fundos de pensões, porque não fariam a mesma coisa com os depósitos das pessoas nos bancos?". A fuga de capitais já havia começado há meses, por causa do conflito da presidente Cristina com os ruralistas. Desde janeiro, US$ 12,23 bilhões saíram do sistema financeiro local. *Estado de S.Paulo Nova linha de crédito à construção terá R$ 3 bi Indústria em geral também poderá ter medida semelhante e governo ainda avalia o alongamento do prazo de recolhimento de impostos Preocupado em proteger o País dos efeitos da freada na economia global, o governo anuncia hoje uma linha de crédito de capital de giro de R$ 3 bilhões para a construção civil. A indústria em geral poderá ser beneficiada com medida semelhante. Existe ainda a possibilidade de os prazos de recolhimento de impostos serem alongados para aliviar as empresas. Essas medidas foram anunciadas ontem pelo ministro da Fazenda, Guido Mantega, durante o 3º Encontro Nacional da Indústria, promovido pela Confederação Nacional da Indústria (CNI). Segundo Mantega, o socorro às construtoras virá da Caixa Econômica Federal, mas não sairá do FGTS. A taxa de juros ainda será definida. O setor pede que a nova linha de crédito não custe mais que a Taxa Referencial (TR) mais 9% ao ano. O dinheiro pode ser usado para operações de fusão entre construtoras, segundo informou o presidente da Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC), Paulo Safady Simão. Poderá ser usado também para adiantar fluxo de caixa a construtoras que venderam a prazo, numa operação chamada compra de recebíveis. As construtoras em melhores condições poderão recorrer a essa linha de crédito para comprar empreendimentos de concorrentes. A contabilidade é feita de forma segregada: cada empreendimento é comercializado e construído por meio de uma Sociedade de Propósito Específica (SPE). Essa SPE poderá ser vendida de uma construtora para outra. Segundo Simão, o montante prometido por Mantega é suficiente para evitar a paralisação imediata do setor, cujo crescimento projetado para este ano é de 8,5%. "No ano que vem, deveremos ter uma desaceleração e estamos justamente batalhando para que a queda não seja muito grande." O mesmo ocorre no setor de infra-estrutura. O presidente da Associação Brasileira de Infra-Estrutura e Indústrias de Base (Abdib), Paulo Godoy, passou os últimos dias em romaria pela área econômica do governo em busca de apoio para sua proposta de um fundo específico para financiar a infra-estrutura. Os bancos oficiais e fundos de pensão poderiam comprar cotas desse fundo, de cerca de R$ 10 bilhões, e assim garantir que os R$ 100 bilhões em projetos de infra-estrutura já contratados não parem. FORTE IMPACTO É fato, porém, que a economia real brasileira já começa a sentir o baque da crise mundial, segundo o presidente da CNI, Armando Monteiro Neto. "O tranco na liquidez tem-se refletido e se traduz em redução do nível de atividade." "Vamos ter forte impacto na economia real", afirmou Mantega, sem rodeios. "O mundo todo vai desacelerar e o travamento do crédito se transmitiu rapidamente para o nível de atividade." Ele ressalvou que os efeitos serão menos sentidos pelos países emergentes, não porque acredite no descolamento entre as economias avançadas e os países em desenvolvimento, mas porque esse último grupo está em melhor posição para enfrentar as turbulências, até pelo fato de ter sofrido mais duramente os efeitos de crises anteriores. O ministro reconheceu que os bancos têm adotado uma posição de comedimento e precaução diante da crise, o que tornou as linhas de crédito mais escassas e caras. Essa atitude, disse ele, é "natural" no atual cenário econômico. Mantega observou, ainda, que as medidas anunciadas pelo governo levam algum tempo para surtir efeito. No caso da nova modalidade de redesconto - com a possibilidade de o Banco Central emprestar a bancos tendo como garantia suas carteiras de crédito - havia até um empecilho legal, o que levou o governo a editar uma medida provisória. Ainda assim, os técnicos são cautelosos. "Todos têm medo, mas o redesconto vai começar a funcionar", disse o ministro. *Estado de S.Paulo Empresários e economistas criticam reação do governo Empresários e economistas criticaram ontem a atuação do governo diante da crise. Mesmo considerando que as medidas estão na direção correta, a avaliação no 3º Encontro Nacional da Indústria é que o governo erra ao manter um nível elevado de despesas. Errou, também, ao não dar impulso às reformas econômicas. Até a forma de o ministro da Fazenda, Guido Mantega, se comunicar com a sociedade foi atacada. Além disso, houve muitas queixas ao fato de os bancos continuarem emprestando pouco, apesar de o governo já haver injetado na economia cerca de R$ 150 bilhões que estavam nos depósitos compulsórios do Banco Central. "O governo está dando sangue aos vampiros", disse o presidente da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq), Luiz Aubert Neto. Para o ex-presidente do Banco Central Carlos Geraldo Langoni, o Brasil construiu uma arquitetura financeira eficiente para enfrentar uma crise. Porém, poderia ser melhor se houvesse mais espaço no orçamento para aumentar os investimentos em períodos de retração econômica. "O Estado não tem recursos para realizar um contraponto à desaceleração." A mesma crítica foi feita pelo empresário Jorge Gerdau Johannpeter. Enquanto pregava enfaticamente que o governo pode reduzir custos apenas com melhorias na gestão, Gerdau foi surpreendido por um desafio do senador Aloizio Mercadante (PT-SP): assumir o Ministério da Previdência. Gerdau recusou, afirmando ser mais útil fora do que dentro do governo. COMUNICAÇÃO Diante da platéia, o senador Tasso Jereissati (PSDB-CE), disse ao ministro Guido Mantega que, em vez de acalmar a sociedade, sua forma de comunicar-se está criando mais nervosismo. "O governo tem agido bem, mas falha na comunicação do ministro Mantega, que deixa a sociedade um pouco insegura." O problema, disse, é que o governo insistiu num discurso otimista, segundo o qual o Brasil sentiria apenas, como disse o presidente Lula, uma marolinha da crise, e no dia seguinte baixou medidas drásticas, autorizando inclusive o BC a comprar carteiras de bancos. "Aceito suas críticas, vamos olhar melhor essa questão", disse Mantega. O ministro não aceitou, porém, as ressalvas à política de gastos do governo. Ele ressaltou que as despesas de custeio estão em queda e os resultados das contas públicas têm batido recordes positivos. *Estado de S.Paulo Governo já fala em novo plano do clima Documento atual, que ainda não está pronto, é defasado e não tem metas; para secretária, texto é "obra em progresso". Segundo Ministério do Meio Ambiente, segunda versão ficará para 2009; ONGs apresentam hoje propostas de redução de CO2 Antes mesmo de conseguir concluir o Plano Nacional de Mudança Climática, o governo federal já prevê a montagem de outro documento, oito meses após o término do primeiro. O texto atual, em fase de consulta pública, foi tachado de frouxo por ambientalistas. A principal crítica é o fato de ele não apresentar metas de redução de emissões de gasesestufa -ou, em alguns casos, não determinar o prazo em que deverá ser cumprido o objetivo. Segundo a secretária nacional de Mudança Climática, Suzana Kahn Ribeiro, o plano é uma "obra em progresso" -título inspirado em um show de Caetano Veloso. "Não vejo esse plano como um pacote fechado", disse. Segundo ela, esta é uma "fase intermediária", em que precisa ser feito um diagnóstico do país. É essa "fase intermediária" do plano que detalha como o Brasil pretende agir contra o aquecimento global que será apresentada em dezembro na conferência do clima de Poznan, Polônia. O encontro inicia as negociações oficiais do acordo climático pósKyoto. "Não adianta colocar metas ou objetivos muito audaciosos se não há meios de implementá-los", afirmou. De acordo com a secretária, é fundamental a aprovação do Fundo Clima, que está no Congresso. Ele permitiria usar parte do lucro do petróleo no combate às mudanças climáticas. Outro problema apontado no plano são os dados defasados. Em vista disso, o Ministério do Meio Ambiente disse que vai atualizar o inventário de emissões de gases-estufa para "complementar" o plano em 2009. "Hoje nós usamos [dados] de 1994. O novo inventário terá data-base de 2005, portanto vamos estar com algo mais próximo da realidade para podermos acertar nossas estratégias", disse o ministro Carlos Minc anteontem. A secretária afirmou que o plano precisa ser consenso no governo. No caso das metas de redução de emissão, a situação é mais delicada. "[Elas] passam até por um outro nível de decisão, tem que haver talvez uma orientação do próprio presidente [Lula]." O prazo da consulta pública ao plano terminaria nesta sexta-feira. Entretanto, a pedido dos ambientalistas, Minc decidiu prorrogá-lo por dez dias. Entidades entregarão hoje no ministério um manifesto com sugestões ao plano. O texto, articulado pelo Observatório do Clima, garante que a definição de metas "proporciona oportunidade de soluções tecnológicas inovadoras" e a competitividade da economia brasileira. O Greenpeace também levará um documento em que faz propostas para reduzir emissões nas áreas de floresta, energia, agronegócio e oceanos. *Folha de S.Paulo Nova medida do compulsório custará R$ 825 mi ao governo Uso do FGC é a 1ª mudança contra a crise que terá impacto nas contas públicas. BC anunciou anteontem a liberação de R$ 6 bilhões aos pequenos bancos por meio do fundo que garante depósitos de correntistas A decisão tomada pelo BC (Banco Central) anteontem de liberar mais R$ 6 bilhões aos bancos pequenos, terá um custo de aproximadamente R$ 825 milhões por ano aos cofres públicos. Esse é o valor potencial dos juros que o governo passará a pagar sobre os R$ 6 bilhões que até então ficavam parados nos cofres federais sem qualquer remuneração e agora serão despejados na economia. É a primeira medida para tentar debelar a crise que tem impacto sobre as contas públicas. A estimativa foi feita levando em conta a taxa de juros atual, de 13,75% ao ano, que os bancos usem todo o limite disponibilizado pelo Banco Central e que esse dinheiro fique em circulação na economia por pelo menos um ano. O gasto adicional com juros tem origem no tipo de recurso que o Banco Central permitiu que os bancos saquem. Se as instituições financeiras anteciparem o equivalente a cinco anos de contribuições que têm que fazer ao FGC, fundo que garante os depósitos em caso de quebra ou falência de bancos, poderão abater esse valor do chamado compulsório sobre depósitos à vista. Esse compulsório, equivalente a 42% dos depósitos captados pelos bancos, tem que ser transferido ao BC, que não paga juros nenhum na operação. Na prática, isso quer dizer que o governo consegue tirar dinheiro da economia para calibrar os juros sem ter custo algum. À medida que esses recursos saem do BC e são injetados na economia, o total de dinheiro em circulação aumenta. Quando isso acontece, a tendência é de queda dos juros. Para evitar que isso aconteça e a taxa fique abaixo da Selic fixada pelo BC, a autoridade monetária vende títulos públicos ao mercado financeiro e recolhe o excesso de moeda em circulação. Com um aumento de R$ 6 bilhões na quantidade de dinheiro na economia, a tendência é que o BC seja obrigado a vender mais títulos públicos para regular a quantidade da moeda em mercado. É por meio dessas operações que ocorrerá o impacto fiscal da medida anunciada na segunda-feira. Os papéis colocados para enxugar essa liquidez adicional -termo técnico que define a intervenção do Banco Central- pagarão juros. Portanto, o governo está trocando uma situação em que retirava dinheiro da economia de graça, por uma em que paga juros. Até então, todos os recursos que o BC havia liberado aos bancos para enfrentar a crise faziam parte da parcela dos depósitos compulsórios que já são remunerados pela taxa Selic. Ou seja, o dinheiro ia parar no BC mas os bancos recebiam juros sobre o que ficava depositado. Dessa forma, o gasto de juros continuava o mesmo. Sem risco A liberação do depósito à vista é justificada pela necessidade de o BC socorrer os bancos pequenos que têm dificuldades para fechar seus caixas. O dinheiro antecipado ao FGC pelas instituições financeiras que liberarem seus compulsórios será usado para comprar títulos desses bancos, especialmente carteiras de crédito. Mas a medida também é uma maneira de os grandes bancos nacionais fecharem essas operações, consideradas essenciais pelo governo para a retomada do crédito na economia, sem correrem o risco de fazer um mal negócio. Como o comprado dessas carteiras será o FGC, se houver inadimplência, por exemplo, o prejuízo será do fundo e não aparecerá no balanço de nenhum dos bancos. *Folha de S.Paulo Consumidores já reduzem compras e ida a restaurante Vendas à vista caem 4,5% em SP; movimento em churrascarias diminui 10%.Receosos com os efeitos da crise levam os consumidores a ficarem mais cautelosos com gastos supérfluos, segundo associações Os consumidores estão mais cautelosos com os gastos neste mês, como efeito da crise financeira internacional. As vendas à vista caíram 4,5% em São Paulo, o movimento nas churrascarias diminuiu 10% e, em restaurantes, 30%, segundo levantamento realizado por associações desses setores. "As pessoas estão economizando porque estão com medo do que pode acontecer com a economia daqui para a frente", afirma Emílio Alfieri, economista da Associação Comercial de São Paulo (ACSP). As vendas à vista (medidas pelo número de consultas ao Usecheque), que cresceram 5,6% de janeiro a setembro, caíram 4,5% do dia 1º a 27 deste mês em relação a igual período do ano passado. As consultas ao SPC, indicador das vendas à prazo, registraram aumento de 1,4% no mesmo período, após alta de 8,3% acumulada de janeiro a setembro deste ano sobre igual período do ano passado. "Não há dúvida, houve desaceleração de consumo em outubro. Agora a grande dúvida é: o problema é falta de crédito ou o consumidor perdeu a confiança na economia e no emprego? Se for falta de confiança, vai demorar para as vendas voltarem a crescer", diz Alfieri. Levantamento da Federação de Hotéis, Restaurantes, Bares e Similares do Estado de São Paulo constatou queda de cerca de 35% no movimento de restaurantes e bares neste mês em São Paulo e de 30%, em média, no país. "A lei seca [que pune quem dirige após ingerir bebidas alcóolicas] já tinha afetado os negócios do setor. Com a crise financeira, a situação piorou ainda mais. A gente sente que o consumidor quer economizar", afirma Nelson de Abreu Pinto, presidente da federação. As churrascarias paulistas atribuem à crise queda de 10% no movimento neste mês na comparação com outubro do ano passado. "O consumidor sente pessimismo no ar ao ouvir tantas notícias ruins sobre efeitos da crise e, por isso, deixa de sair para comer fora", afirma Wanderley Mantovani, presidente da Achuesp, associação das churrascarias paulistas. Os fabricantes de refrigerantes também sentiram o consumidor mais retraído. "Ainda não temos números fechados para este mês, mas, com certeza, o consumo de refrigerantes caiu e poderia ter caído ainda mais se a indústria tivesse repassado todo o aumento de custos para os preços", afirma Fernando Bairros, presidente da Afrebras, associação que representa fabricantes regionais de refrigerantes. Segundo ele, os preços de algumas matérias-primas, como conservantes e edulcorantes, subiram até 40% após a alta do dólar. Levantamento da Fecomercio divulgado ontem mostra preocupação do consumidor com a crise -81% dos paulistanos consultados acreditam que a crise vai afetar o Brasil, o que pode resultar em desemprego, aumento de endividamento e da inflação, principalmente. "Não há dúvida que estamos passando por um período de esfriamento do consumo. O consumidor está com receio de gastar neste momento porque teme a perda do emprego e também aumento de dívidas", afirma Valdemir Colleone, diretor da Lojas Cem. Segundo ele, os produtos supérfluos, como câmaras digitais e televisores de LCD e plasma, são mais atingidos pela crise neste mês. "O consumidor está comprando somente o que é necessário", diz. Por conta disso, a Lojas Cem, que previa faturar 12% mais neste mês em relação a igual período do ano passado, prevê faturar 3% mais. *Folha de S.Paulo Argentina manda fundo tirar dinheiro do Brasil Governo Kirchner ordena a volta dos investimentos O governo argentino determinou que os fundos de pensão privados devem repatriar cerca de US$ 550 milhões investidos no Brasil. A Argentina anunciou a estatização da previdência na semana passada, mas o projeto de lei ainda deve ser aprovado pelo Congresso. A repatriação dos investimentos alocados no país vizinho visa dar mais liquidez ao mercado argentino e tentar conter a disparada do dólar, que subiu 12 centavos desde o anúncio da estatização da previdência e fechou ontem a 3,36 pesos. Ao pedido de repatriação do governo, os fundos de pensão responderam que é preciso uma resolução ditando a norma para impedir futuras reclamações de seus afiliados, já que esses investimentos brasileiros seriam vendidos a valores muito baixos por causa das perdas dos ativos na crise atual. O valor investido no Brasil teria rendido boa parte dos lucros obtidos pelos fundos nos últimos dois anos. Segundo o novo gerente da Superintendência das Administradoras, Sergio Chodos, o dinheiro aplicado no Brasil poderia voltar à Argentina até o fim desta semana. "Calculo que efeito [no Brasil] vai haver com certeza. Vai depender de se eles estão em alta ou em baixa, mas isso é um problema deles, que não me corresponde avaliar", afirmou Chodos à imprensa local. O governo também determinou que as administradoras não podem comprar dólares nem vender títulos da dívida pública argentina para reduzir a especulação no mercado local. Além disso, colocou observadores em cada um dos fundos de previdência para assegurar que estão seguindo as regras. O Congresso argentino começou a discutir ontem o projeto de lei que determina a estatização da previdência privada. Para promover a medida, o governo argumenta que os fundos privados tiveram perdas de até 40% nos últimos meses devido à crise financeira internacional. A oposição, no entanto, acredita que o governo quer buscar recursos para pagar os vencimentos da dívida no próximo ano e deve criar empecilhos à aprovação do projeto. Com a estatização, o governo absorveria US$ 30 bilhões dos fundos privados, além de outros US$ 5 bilhões anuais. *Folha de S.Paulo