o nível frustrante do debate econômico entre os políticos brasileiros

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CARTA ECONÔMICA
Junho de 2010
Por George Bezerra
O NÍVEL FRUSTRANTE DO DEBATE ECONÔMICO ENTRE OS POLÍTICOS BRASILEIROS
Para que deveriam servir a campanha eleitoral e os debates entre os candidatos, numa democracia? Supostamente,
para que cada um pudesse dar a conhecer aos eleitores seu diagnóstico sobre os problemas enfrentados pelo país e
as propostas para superá-los. No Brasil, em particular, não é isso que tem ocorrido em eleições passadas e - nem o que
parece que vai acontecer agora.
Tomemos, por exemplo, o debate em torno da taxa de juros. Tecnicamente, o assunto pode ser resumido como segue:
1. inflação elevada e volátil é algo que prejudica os investimentos, o crescimento econômico, a criação de
empregos e a distribuição de renda. Por isso, é de fundamental importância em qualquer economia moderna
que a inflação seja mantida sob controle;
2. dadas as demais condições relevantes, a elevação da taxa real de juros contribui para reduzir a inflação (e
vice-versa);
3. ao banco central é atribuída, pelo governo, a responsabilidade de manter a inflação sob controle. Mas este
órgão precisa de algum instrumento para desempenhar esta função. E o instrumento, de longe, mais
importante, concedido ao banco central, é a autonomia operacional no manejo da taxa de juros básica;
4. uma política econômica eficiente permite manter a inflação sob controle com o menor nível possível de taxa
real de juros. Pois somente este tipo de política permite que a inflação seja mantida sob controle, ao mesmo
tempo em que o crescimento econômico é maximizado;
5. ocorre que esta política globalmente eficiente envolve vários instrumentos e atitudes que estão inteiramente
fora de controle do banco central;
6. portanto, a eficiência de um banco central não pode ser medida apenas pelo nível de taxa de juros que
ele pratica para manter a inflação sob controle. Mas sim qual a taxa de juros que ele pratica para manter
a inflação sob controle levando-se em conta a forma como outras áreas do governo manejam outros
instrumentos relevantes de política econômica;
7. vale dizer, isoladamente um banco central operacionalmente autônomo dispõe dos instrumentos
necessários para manter a inflação sob controle. Mas somente uma política econômica globalmente
eficiente, que envolva um grau ótimo de colaboração entre todos os órgãos do governo, pode assegurar,
simultaneamente, a manutenção de uma inflação controlada e um crescimento econômico satisfatório e
sustentável.
Entre 1995 e 2005 a taxa média real de juros (medida como o excesso do juro básico sobre a inflação, ambos
aposteriori) foi de 14,7%. Nenhum outro país do mundo manteve taxas reais de juros tão elevadas, por tanto tempo.
E apesar dos enormes avanços conquistados na luta contra a inflação e outros desequilíbrios econômicos, desde o
lançamento do Plano Real, esta taxa ainda se mantém em patamares inconvenientemente elevados.
Em princípio, existiriam duas explicações para este fenômeno: 1ª) o banco central tem sido extremamente
incompetente ao longo de todos estes anos; e/ou 2ª) a condução da política econômica em áreas relevantes sobre as
quais o banco central não tem influência tem sido de muito má qualidade.
Destaque-se que o grau de influência do banco central sobre outras áreas do governo que também manejam
instrumentos importantes de política econômica é limitado, mesmo em países onde existe um bom entendimento e
coordenação entre estas diversas áreas. No caso do Brasil, onde esta coordenação não pode ser considerada satisfatória,
esta influência tem sido ainda menor.
CARTA ECONÔMICA
Junho de 2010
É certo que há divergências, mesmo entre os economistas, acerca da importância atribuída a cada uma destas
explicações. De fato, muitos consideram que o banco central brasileiro tem trabalhado com uma elevada dose de
eficiência, ao longo das últimas décadas, enquanto outros pensam de maneira bem diferente. Parece-nos, no entanto, que
nem mesmo os críticos mais radicais do banco central, entre os economistas profissionais, defendem o ponto de vista
de que a principal causa de taxas reais de juros tão elevadas no Brasil durante tanto tempo tem sido a incompetência do
banco central.
Na verdade, atribuir toda a culpa desta distorção ao banco central é algo que não merece respeito. Ao longo das
últimas décadas, a falta de credibilidade da política econômica, as freqüentes mudanças de regras, o descontrole do gasto
público, a reduzida taxa de poupança, a vulnerabilidade do balanço de pagamentos, as políticas de crédito subsidiadas
dirigidas a alguns setores, etc, têm sido os principais motivos pelos quais a taxa de juros que o banco central tem que
praticar para manter a inflação sob controle tem sido tão elevada. É fato que desde o lançamento do Plano Real têm
ocorrido mudanças para melhor na maioria destas áreas. Mas é exatamente por este motivo que a taxa real de juros
também tem caído substancialmente, ao longo dos últimos anos.
Se a taxa real de juros neutra no Brasil (aquela taxa que não contribui nem para a alta nem para a queda da inflação)
ainda é muito elevada para padrões internacionais, é porque ainda existem distorções na política econômica que precisam
ser corrigidas, reformas estruturais que foram abandonadas. E estas correções são também indispensáveis para que
o Brasil possa fazer a sua parte no estabelecimento das condições que lhe permita crescer a uma taxa sustentável
e satisfatória. Portanto, são estas distorções e a as propostas para corrigi-las que deveriam merecer a atenção dos
candidatos e ser objeto dos debates eleitorais.
Infelizmente, nem os políticos, nem a mídia especializada têm debatido a distorção da taxa de juros no Brasil da forma
adequada. Pois as críticas e cobranças sobre o banco central superam de muito o interesse demonstrado em apontar
as verdadeiras causas desta distorção e a forma de superá-las. O que é lamentável, pois, desta maneira, o desempenho
econômico do país, no médio e longo prazo, se mantém muito abaixo do que poderia ser, impondo a toda a sociedade –
especialmente aos mais pobres – um ônus pesado e desnecessário.
INCERTEZAS SOBRE A POLÍTICA ECONÔMICA NO PRÓXIMO GOVERNO
Todos os candidatos apontam com clareza a elevada taxa real de juros que ainda é praticada no Brasil como uma
grave e inconveniente distorção. Muito menos claras, porém, são as propostas destinadas a corrigi-la. .
Por exemplo, a nítida tendência de aumento dos gastos públicos correntes é algo que continuará dificultando a
redução da taxa de juros. E mesmo que este aumento de gastos venha a ser financiado pela continuidade do aumento da
carga tributária, o impacto negativo sobre o crescimento potencial da economia será, da mesma forma, inevitável.
Por outro lado, lidar com a distorção da taxa de juros reduzindo o grau de autonomia operacional do banco central
seria um tiro pela culatra. Numa economia moderna, nenhum presidente da república, por melhor economista que seja,
deveria chamar para si a responsabilidade de avaliar tecnicamente qual a melhor forma de manejar os instrumentos de
política monetária. Afinal, é primordialmente para realizar este trabalho que existem bancos centrais bem equipados em
todas as economias modernas do mundo.
Muitas vezes os candidatos têm suas razões de natureza eleitoral para não exporem com clareza o diagnóstico e
as propostas de soluções para os problemas da economia. Esperemos, para o bem do Brasil, que as medidas a serem
efetivamente adotadas por qualquer um deles venham a ser melhores que as idéias apresentadas durante a campanha.
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