NEUROMARKETING: INDO ALÉM DO TRADICIONAL COMPORTAMENTO DO CONSUMIDOR. Autoria: Felipe Cavalcante de Almeida, Universidade de Fortaleza Áurio Lúcio Leocádio, Universidade Fedeal do Paraná Alyne Oliveira do Vale, Universidade de Fortaleza Norton Gonzáles, Universidade Estadual do Ceará Maurício Geleilate, Universidade de Fortaleza RESUMO Apesar de ser bastante recente, o estudo da convergência entre os conhecimentos de marketing e neurociência vem possibilitando diversas descobertas, ao mesmo tempo em que gera amplas discussões sobre os limites éticos e sobre as aplicações práticas de suas análises. Essas discussões geram diversos novos conhecimentos que parecem ter sido poucamente trabalhados em direção à consolidação do arcabouço teórico da área. Este artigo tem, assim, como objetivo geral fundamentar teoricamente o neuromarketing. Para isso, buscou-se como objetivos específicos apresentar o conceito de neuromarketing, levantar o processo de evolução desse conhecimento, mapear os conceitos e técnicas mais utilizados atualmente, assim como apresentar aspectos éticos e limitantes do campo. Dessa forma, o artigo utiliza-se de uma pesquisa exploratória, coletando dados tanto da literatura mercadológica, como também de literaturas mais aprofundadas da neurociência como forma de tentar reduzir o viés da simplificação de publicações não específicas do ramo neurocientífico. Percebe-se, então, que essa nova área do marketing parece caminhar juntamente com a evolução tecnologia e da neurociência, ampliando cada vez mais o conhecimento sobre a relação do homem com o mercado. Porém é preciso cautela em sua utilização, tanto devido aos aspectos limitantes quanto aos aspectos éticos, mas sem reduzir, contudo, sua importância perante as descobertas realizadas por meio dessa nova abordagem. Palavras-chave: Neuromarketing, Neurociência, Marketing, Comportamento, Consumo. ABSTRACT Despite being quite recent, the convergence between neuroscience and marketing expertise has enabled several discoveries, while generating extensive discussions on the ethical limits and on practical applications of its analysis. Several new knowledges have been created by these discussions. However, it seems that only a few have worked toward a consolidation of a theory for this new marketing area. This article is thus intended to substantiate theoretically the neuromarketing. For this, it was sought as specific objectives to present the neuromarketing concept, raise the process of evolution of this knowledge, map the main tools and techniques used by this area around the world, as well as provide ethical aspects and limitations of the field. The article is an exploratory research, collecting data both from the marketing literature, as well as from a more in-depth literature of neuroscience as an attempt to reduce the bias of the non-specific neuro-scientific branch simplification of content. It is clear, then, that this new field of marketing seems to go along with the development of neuroscience and technology, increasingly expanding the knowledge of man's relationship with the market. It’s on the other hand use needs caution, both because of the limiting and ethical aspects. However this does not reduce its importance facing the discoveries made through this new approach. Key-words: Neuromarketing, Neuroscience, Marketing, Behavior, Consumption. VII Convibra Administração – Congresso Virtual Brasileiro de Administração – www.convibra.com.br 1. Introdução Avanços tecnológicos aliados a evolução dos estudos interdisciplinares vêm promovendo alternativas para a explicação e compreensão dos aspectos profundos e complexos que habitam no inconsciente da mente humana. Uma dessas alternativas é o Neuromarketing, proveniente da interação interdisciplinar entre a psicologia, a neurociência e o marketing, e que teve início academicamente, segundo Zaltman (2003), no fim da década de 1990, onde havia discussões por parte de acadêmicos de diferentes disciplinas sobre questões como as distorções da memória, o aprendizado e a plasticidade do cérebro, entre outros. Essas discussões acabavam também gerando insights sobre novos métodos de pesquisa, uma vez que, apesar da evolução constante dos métodos quantitativos e qualitativos, segundo Clegg et al. (1998), as atuais abordagens de pesquisa apresentam alguns problemas, de forma que, segundo Petty e Caciopo (1983), as próprias medidas comumente utilizadas nas pesquisas de marketing dependem não só da habilidade do pesquisador, mas também da vontade do respondente em conceder respostas sobre suas atitudes e comportamentos. Assim, ao se analisar as pesquisas quantitativas, por exemplo, não se deve, nem mesmo através de estudos especializados, supor ou afirmar que um tipo de manifestação verificada é consistente ou representativo de toda a cultura (CLEGG et al., 1998). O problema não se encontra, contudo, restrito à questão da generalização dos resultados, mas, também, devido ao fato de que durante as pesquisas quantitativas os respondentes podem não estar conscientes de que os valores por eles adotados podem não estar consistentemente impostos (ARGYRIS; SCHON, 1978), assim como também podem temer que a promessa do anonimato seja esquecida e, por isso, que seus empregos, por exemplo, estejam em risco. Tal fato poderá refletir em respostas enganosas, através de ilusões de consenso organizacional, e não de comportamentos reais, assim levando à geração de respostas que pareçam socialmente desejáveis ou reflitam seus atuais níveis de satisfação no trabalho com o intuito de impressionar o pesquisador. Uma alternativa seria então a geração de uma pesquisa com caráter qualitativo, mais voltada para uma análise profunda dos aspectos objetivados em um estudo. Entretanto, as pesquisas qualitativas, ainda segundo Clegg et al. (1998), podem ser uma estratégia arriscada, principalmente quando se estuda temas como cultura. Dentre os pontos criticados, argumenta-se que para realmente penetrar no território de membros culturais, por exemplo, é necessário meses ou até mesmo anos como observador/participante para perceber as coisas como elas são em sua perspectiva interna (GREGORY, 1983), além disso, existe a dificuldade de identificação e interpretação do conteúdo mental, principalmente porque noventa e cinco por cento, ou mais, da atividade cognitiva do homem pode se encontrar abaixo do nível de consciência (KAGAN, 2002). Devido a tais problemas, normalmente, as formas de mensuração utilizadas em pesquisas de marketing ficam completamente a mercê da confiança de que os respondentes darão respostas precisas de suas reais atitudes e comportamentos (PETTY; CACIOPPO, 1983). Assim, a colaboração entre o neuroimageamento - através de diversas técnicas como Imageamento por Ressonância Magnética funcional (fMRI), Eletroencefalograma (EEG), Magnetoencefalograma (MEG), Tomografia por Emissão de Pósitrons (PET) entre outros - e os pesquisadores de marketing pode, segundo Lee, Broderick e Chamberlain (2007), levar a avanços do conhecimento em diversas áreas que são pertinentes não apenas ao consumo, mas também aos fatores de interação, relacionamento e comportamento dentro dos contextos de mercado e da organização. Por isso, apesar de grande parte dos conceitos para esse novo campo de pesquisa estar focado em questões como “entender os mecanismos intrínsecos do engajamento entre VII Convibra Administração – Congresso Virtual Brasileiro de Administração – www.convibra.com.br consumidores e as diferentes marcas ou campanhas de empresas” (ASTOLFI et al., 2009, p. 01), o Neuromarketing não deve ser considerado de forma tão restrita, uma vez que também se pode defini-lo como “a aplicação de métodos neurocientíficos para analisar e entender o comportamento humano em sua relação com mercado e o marketing” (LEE; BRODERICK; CHAMBERLAIN, 2007, p. 200). Tal tipo de definição mostra que o Neuromarketing pode ser tanto realizado para interesses comerciais, como pode ser utilizado para pesquisas mais amplas, que podem envolver até mesmo estudos intra e inter-organizacionais (LEE; BRODERICK; CHAMBERLAIN, 2007). Essa definição busca também reduzir os diversos conflitos práticos, muitos dos quais ocorrem devido os neurocientistas serem mal comunicados sobre as diversas possibilidades que existem com o uso do neuromarketing que não apenas uma ferramenta com o intuito de submeter os consumidores às propagandas e produtos (PERRACHIONE; PERRACHIONE, 2008), uma vez que o próprio conceito de marketing envolve muito mais do que apenas a publicidade. Devido ao desenvolvimento desse novo conhecimento tanto no ambiente acadêmico como no ambiente corporativo (LEE; BRODERICK; CHAMBERLAIN, 2007), o presente artigo tem, portanto, como objetivo geral fundamentar teoricamente o neuromarketing. Para isso, buscou-se como objetivos específicos apresentar o conceito de neuromarketing, levantar o processo de evolução desse conhecimento, mapear os conceitos e técnicas mais utilizados atualmente, assim como apresentar aspectos éticos e limitantes do campo. Dessa forma, destaca-se a relevância deste artigo no fato de o neuromarketing ser um conhecimento recente e ainda pouco estudado no mundo (LEE; BRODERICK; CHAMBERLAIN, 2007; MEDINA, 2008), não restringindo o estudo somente às questões técnicas e conceituais, como, também, as questões históricas (ZALTMAN, 2003; LENT, 2008), éticas e limitações desse novo conhecimento (KULPAS, 2008; MEDINA, 2008). Além disso, incentiva o desenvolvimento de conhecimentos multidisciplinares como forma de possibilitar novos caminhos para a evolução da ciência, consistindo não apenas no simples agrupamento de áreas com maior desenvolvimento no ambiente atual da Ciência, Tecnologia e Inovação, mas sim na geração de um conjunto de teorias e de dispositivos completamente integrados (BAINBRIDGE; ROCO, 2006; CAVALHEIRO, 2007). Este artigo tem um caráter exploratório, sendo composto pela realização de uma coleta de dados secundários com o objetivo de fundamentar teoricamente neuromarketing. Para o levantamento de dados secundários foram utilizadas referências bibliográficas tanto do ponto de vista da literatura mercadológica (SCHIFFMAN; KANUK, 2009; LINDSTROM, 2008; ZALTMAN, 2003, SILVA, 2008; NETO e ALEXANDRE, 2007), como de literaturas mais aprofundadas do ramo da neurociência (LENT, 2008; NICOLELIS, 2008; ABI-RACHED, 2008; LOGOTHETIS, 2008; TOVINO, 2007; GAZZANIGA, IVRY, MANGUN, 2006; DOUCET, 2005; BUCKNER, LOGAN, 2001; RAICHLE, 2001), representando uma forma de tentar reduzir o viés da simplificação de publicações não específicas do ramo neurocientífico. O artigo inclui também outras fontes de dados secundários como sites e dados de órgãos empresariais. 2. Conceitos de Neuromarketing O aumento da competição no mercado e da exigência dos consumidores, juntamente com a evolução das tecnologias de informação, foi fortemente impactante no ambiente de negócios. Assim, para obter sucesso, principalmente em mercados dinâmicos, os profissionais de marketing precisam saber tudo sobre os consumidores, as influências pessoais e grupais que afetam suas decisões, e como essas decisões são tomadas, de forma que possam não apenas identificar o público-alvo, como, principalmente, saber como e onde alcançá-lo VII Convibra Administração – Congresso Virtual Brasileiro de Administração – www.convibra.com.br (SCHIFFMAN; KANUK, 2009). Assim, para Ufre (2009) é importante que para o desenvolvimento de uma boa pesquisa de mercado um trabalho interdisciplinar seja envolvido, tornando possível uma distinção adequada entre o problema de decisão gerencial e o problema de investigação de mercado. A necessidade, então, em conhecer de uma forma cada vez mais profunda o consumidor conjuntamente ao envolvimento interdisciplinar na pesquisa de mercado, tem levado a maioria das ciências sociais, segundo Lee, Broderick e Chamberlain (2007), a adotarem as técnicas de neuroimagem como uma ferramenta padrão ou mesmo como processo de pesquisa. Para Madan (2010, p. 34), “neuromarketing é uma área emergente que conecta estudos interdisciplinares da psicologia e neurociência com economia. Tem como objetivo estudar como o cérebro é fisiologicamente afetado por propagandas e estratégias de marketing”. Assim, para o autor, o estudo desse conhecimento geralmente mede a preferência entre produtos em termos de familiaridade de marcas ou preferência de produtos, de forma que a utilização de técnicas de neuroimageamento permite aos estudiosos de marketing monitorar as respostas de indivíduos tanto relacionadas com suas respostas comportamentais como relacionadas com suas ativações neurais. Astolfi et al. (2009, p. 01), conceituam, por sua vez, o neuromarketing como “uso de ferramentas de neuroimageamento para examinar o comportamento humano em jogos econômicos e tomadas de decisão entre diferentes propagandas comerciais”. Dessa forma, a questão central para esses autores é a de explicar como que a exposição à mensagens compostas por textos, imagens e áudio conseguem gerar em um indivíduo interesse, preferência, compra e recompra de determinados produtos. Estudos de grupos teste com bases na verificação da ativação neural, então, possibilitariam aos profissionais de marketing melhores níveis de confiança na efetividade de suas campanhas antes de as lançarem no mercado (ASTOLFI et al., 2009). Outro conceito ainda é o de Conejo et al.(2007, p. 72), em que se tem o neuromarketing como “a mais recente forma de estudo e prática de marketing, é o estudo da resposta cerebral a propagandas e a todas as mensagens e imagens associadas a esta por meio do uso de Imageamento por Ressonância Magnética funcional”. Essa conceituação assume, por tanto, que o cérebro humano tem áreas funcionais distintas, sendo o comportamento de consumo fortemente presente no subconsciente humano (CONEJO et al., 2007). Lee, Broderick e Chamberlain (2007, p. 200), porém, defendem um conceito mais amplo de neuromarketing, o qual pode ser definido como “a aplicação de métodos neurocientíficos para analisar e compreender o comportamento humano em relação ás trocas de mercado e de marketing”. Para os autores, essa definição leva em consideração a amplitude de possibilidades de pesquisa que podem ser realizadas pela área. Assim, tal conceito busca fugir do aspecto puramente comercial, assim como do aspecto que abrange apenas o comportamento do consumidor, buscando incluir fatores intra e inter-organizacionais, os quais são comuns nas pesquisas de marketing. O Neuromarketing surge, assim, como uma nova área do marketing proveniente da interdisciplinaridade entre conhecimentos da psicologia, neurociência, economia e marketing, utilizando-se de técnicas de imageamento cerebral e biometria para, através do estudo da atividade neural, buscar entender o comportamento humano em suas relações com o mercado. Portanto, o neuromarketing vai além do conceito de utilização do neuroimageamento unicamente para fins comerciais e do seu uso apenas para compreensão do comportamento do consumidor (LEE; BRODERICK; CHAMBERLAIN, 2007) assim como leva em consideração a interdisciplinaridade (MADAN, 2010), e outras técnicas de análise da VII Convibra Administração – Congresso Virtual Brasileiro de Administração – www.convibra.com.br atividade neural que não apenas a técnica de Imageamento por Ressonância Magnética funcional (fMRI). 3. A Evolução do Neuromarketing O Neuromarketing por ser um conhecimento que utiliza técnicas de identificação de processos cerebrais para compreensão do comportamento do consumidor (CONEJO et al., 2007), ressalta também o conhecimento da evolução da neurociência, uma vez que a tentativa de buscar explicar como a cognição e a consciência humana nascem da atividade do cérebro é o objetivo mais ambicioso da neurociência, estando presente desde sua infância (LENT, 2008). A crença em que o sistema nervoso desempenha algum papel na consciência e na cognição teve início no Egito com Herophilus (335-280 a.C.) e Erasistratus (310-250 a.C.), os quais foram os primeiros a realizar estudos anatômicos do cérebro dissecando cadáveres, e forneceram as primeiras descrições mais detalhadas do cérebro humano. Entretanto, até o início do século XIX, as principais teorias sobre a mente e a consciência, consideravam-nas como manifestações de espíritos de animais atuando através do cérebro (LENT, 2008). Para muitos neurocientistas, principalmente os anglo-saxões, a etapa mais moderna da Neurociência teve seu início a partir dos trabalhos de Ramón y Cajal (1853-1934) e Camilo Golgi (1843-1926), em que Cajal utilizou a técnica de Golgi para realizar uma detalhada análise neuromorfológica do sistema nervoso (GIMÉNEZ-AMAYA; MURILLO, 2007). Os estudos de Cajal levaram à criação de uma teoria, a Teoria Neuronal, a qual enxergava cada neurônio como uma unidade independente, especializadas segundo a região do cérebro, e organizadas ordenadamente em um sistema complexo (LENT, 2008 & GAZZANIGA; IVRY; MANGUN, 2006). É importante, entretanto, saber que, apesar do quase um centenário de estudo sobre como os neurônios operam singularmente e sobre a fisiologia das células também em uma forma singular, os neurocientistas perceberam nas últimas duas décadas que para se obter comportamentos, o cérebro necessita recrutar conjuntos de neurônios, os quais se localizam em diferentes regiões e que são ativados durante certo momento para gerar um resultado (NICOLELIS, 2008). No início da década de 1930, os cientistas Clinton Woolsey, Philip Bard entre outros começaram a catalogar em “mapas” as regiões sensoriais e motores do encéfalo (GAZZANIGA; IVRY; MANGUN, 2006), entretanto, somente a partir do final da década de 1940 que se iniciou a utilização de técnicas de visualização do funcionamento cerebral através da relação entre aumento do consumo de oxigênio e de glicose pelos neurônios, a qual foi possível de ser investigada devido à descoberta de que se poderia rastrear a radioatividade de um isótopo pelo cientista húngaro George de Hevesy (TOVINO, 2007), possibilitando detectar moléculas de glicose radioativa concentrada nos locais em que ocorria a maior atividade cerebral, ou seja, o maior metabolismo (LENT, 2008). Entretanto, apesar da evolução da neurociência e de suas técnicas, as primeiras experiências com Neuromarketing só tiveram início em 1991, as quais, inicialmente, foram realizadas confidencialmente em laboratórios especializados contratados por grandes empresas como Coca-Cola, Levis-Strauss, Ford, Delta Airlines e outras (BORICEAN, 2009). Em 1990, uma pesquisa realizada por Seiji Ogawa propôs o imageamento anatômico através da utilização da ressonância magnética para captar mudanças de oxigenação no cérebro (LENT, 2008). Essa nova técnica possibilitou uma avançada forma de mapeamento cerebral, a qual foi utilizada no fim da mesma década para realização na Universidade de Havard dos primeiros estudos acadêmicos de Neuromarketing (ZALTMAN, 2003). O pionerismo desses estudos, para alguns, são creditados ao cientista Gerald Zaltman, pelos seus experimentos que uniam as tecnologias de neuro-imageamento e os conhecimentos de marketing em um só estudo (WILSON; GAINES; HILL, 2008), enquanto outros creditam a “paternidade” do VII Convibra Administração – Congresso Virtual Brasileiro de Administração – www.convibra.com.br Neuromarketing ao cientista Ale Smidts, ganhador do Prêmio Nobel de Economia em 2002, e responsável pela patente do termo (BORICEAN, 2009). Em 2001, a empresa norte-americana BrightHouse abriu a primeira divisão especializada em Neuromarketing, atraindo a atenção da ciência, do mercado e da mídia (WILSON; GAINES; HILL, 2008). Atualmente, um crescente número empresas especializadas na aplicação do mapeamento cerebral com intuitos de pesquisas mercadológicas vem surgindo ao redor do mundo, a exemplo da BrightHouse, Neurofocus (a qual em 2010 realizou a contratação do ganhador do Prêmio Nobel de Medicina Eric R. Kandel), Sands Research, Mind Sign e Buyology (todas essas nos Estados Unidos), da Neurosense e Neuroco (Inglaterra) e a Forebrain, incubadora brasileira ligada a UFRJ e primeira do país a trabalhar com Neuromarketing. Paralelamente ao crescimento de empresas especializadas na área, é possível notar também o atual crescimento de estudos científicos da ciência social que se utilizam da análise da atividade cortical, apesar de a maioria dessas ciências ainda não ter adotado as técnicas de neuroimageamento como ferramentas comuns de pesquisa (LEE; BRODERICK; CHAMBERLAIN, 2007). Os estudos realizados por neuroeconomistas, por exemplo, possuem grandes similaridades com alguns dos objetivos de marketing (KENNING; PLASSMAN, 2005; DEPPE et al., 2005), o que demonstra que a amplitude de campos de pesquisa vai além apenas da influência de compra de um produto (LEE; BRODERICK; CHAMBERLAIN, 2007). Com o passar do tempo, porém, diversos estudos foram sendo realizados, buscando tanto a utilização de diferentes técnicas de imageamento cerebral assim como a utilização de diferentes objetos de estudo. Como meio de identificar algumas dessas pesquisas, montou-se, assim, o quadro abaixo (QUADRO 1), o qual é composto, em ordem cronológica, por autoria, ano de realização, técnica de imageamento utilizada e objeto de estudo escolhido para ser pesquisado. O quadro foi montado também com o intuito de permitir a visualização das técnicas mais utilizadas cronologicamente, mas, principalmente, com o intuito de visualizar a amplitude de temas pesquisados e a evolução do objeto de estudo dos mesmos com o decorrer do tempo. Autoria Zaltma,G. Ano 1997 Blood,A.J. et al. 1999 Técnica fMRI e FDOT PET Knutson, B. et al. 2000 fMRI Ioannides et al 2000 MEG Ambler et al. 2000 MEG Rossiter et al. 2001 EEG Mccabe et al. 2001 fMRI Aharon et al. 2001 fMRI Braeutigam et al. 2001 MEG Objeto de Estudo Sobre a multidisciplinaridade e as novas técnicas de pesquisa de mercado. Examinar as mudanças no Fluxo Sanguíneo Cerebral relacionadas às respostas afetivas a música. Examinar a atividade cerebral durante tarefas de recompensas monetárias. Examinar a atividade cerebral em diferentes centros corticais durante a exibição de propagandas. Examinar a atividade cerebral em diferentes centros corticais durante a exibição de propagandas. Analisar através do imageamento cerebral a influência de comerciais de TV em determinadas cenas na memória de longo-termo. Estudo do processo de cooperação recíproco entre duas pessoas através do imageamento funcional. Imageamento funcional na verificação da ativação das regiões de recompensa por estímulos visuais de beleza facial. A ativação de áres cerebrais relacionadas com as diferenças entre escolhas premeditadas e não-premeditadas no processo de decisão do consumidor. VII Convibra Administração – Congresso Virtual Brasileiro de Administração – www.convibra.com.br Autoria Young, C. Ano 2002 Técnica EEG Rilling et al. 2002 fMRI Erk et al. 2002 fMRI Gottfried; O’Doherty; Dolan Zaltman, G. 2002 fMRI 2003 Senior, C. 2003 fMRI, FDOT fMRI O’Doherty et al. 2003 fMRI Braeutigam et al. 2004 MEG McClure et al. 2004 fMRI McClure et al. 2004 fMRI Yoon et al. 2006 fMRI Lindstrom, M. 2008 fMRI, TEE Stallen et al. 2009 fMRI Astolfi et al. 2009 EEG (HR) fMRI Objeto de Estudo Analisar se momentos específicos de propagandas são primordialmente responsáveis pelo desenvolvimento e conhecimento de marca. Identificação da cooperação social e sua relação com a ativação das áreas de recompensa do cérebro. Análise das regiões de recompensa moduladas por objetos culturais (carros). Imageamento funcional e a identificação de cheiros agradáveis e desagradáveis ao homem. Uso de metáforas e propagandas como forma de identificar emoções, processos de memorização e ativação cerebral. Imageamento funcional na verificação da ativação das regiões de recompensa por estímulos visuais de beleza facial. Imageamento funcional na verificação da ativação das regiões de recompensa e diferenças de modelos temporais na percepção de beleza. A ativação de áres cerebrais relacionadas com as diferenças do processo de decisão de consumidores do sexo masculino e feminino. Como a influência cultural pode modificar as preferências primárias no consumo de bebidas (refrigerantes). Imageamento funcional no sistemas cerebrais de valor imediato e as expectativas de atraso nas recompensas financeiras. Imageamento funcional na verificação de similaridade dos processos de julgamento de pessoas e marcas. Análise da atividade cerebral e a exposição de imagens sensuais; análise da atividade cerebral e a exposição das mensagens antitabagismo nas embalagens de cigarro. Imageamento funcional na análise do efeito da fama na memória do produto e na intenção de compra. Análise da atividade cerebral através de eletroencefalograma de alta resolução durante observação de comerciais de TV. Imageamento funcional na análise dos mecanismos de persuasão através do “poder dos especialistas”. Klucharev; 2010 Smidts; Fernandez Quadro 1: Lista de alguns experimentos de neuromarketing. Fonte: criado pelo autor. Entretanto, apesar do crescimento e diversificação de estudos relativos à área, notou-se possível, por meio da análise do Quadro 1 (acima), categorizar as pesquisas realizadas até o presente momento. Essa organização por categorias se deu por meio dos objetos de estudo, levando à geração de um novo quadro (QUADRO 2), o qual possibilita analisar a evolução das pesquisas de neuromarketing com relação à diversificação de temas abordados, assim como permite identificar as áreas que possivelmente possuem maior e menor concentração de estudos. Categorias Recompensa Autores Knutson, B. et al. Aharon et al. Erk et al. Senior, C. O’Doherty et al. McClure et al. Objeto de Estudo Recompensas monetárias. Recompensa por estímulos visuais de beleza facial. Recompensa moduladas por objetos culturais (carros). Recompensa por estímulos visuais de beleza facial. Recompensa por percepção de beleza Recompensas financeiras e fatores temporais. VII Convibra Administração – Congresso Virtual Brasileiro de Administração – www.convibra.com.br Categorias Cooperação Social Autores Mccabe et al. Rilling et al. Braeutigam et al. Braeutigam et al. McClure et al. Processo de Decisão Yoon et al. Lindstrom, M. Stallen et al. Resposta afetiva sensorial Memória Blood,A.J. et al. Gottfried; O’Doherty; Dolan Ioannides et al Ambler et al. Rossiter et al. Young, C. Zaltman, G. Astolfi et al. Objeto de Estudo Processo de cooperação recíproco entre duas pessoas. Cooperação social e sua relação com a ativação das áreas de recompensa. Diferenças entre escolhas premeditadas e não premeditadas no processo de decisão do consumidor. Diferenças do processo de decisão de consumidores do sexo masculino e feminino. Influência cultural na modificação das preferências primárias de consumo. Similaridade dos processos de julgamento de pessoas e marcas. Influência da decisão de consumo por exposição de imagens sensuais e mensagens antitabagismo. Efeito da fama na memória do produto e na intenção de compra. Respostas afetivas a música. Identificação de cheiros agradáveis e desagradáveis ao homem. Exibição de propagandas. Exibição de propagandas. Influência de comerciais de TV na memória de longo-termo Momentos específicos de propagandas no desenvolvimento e conhecimento de marca. Metáforas e propagandas como forma de identificar emoções, processos de memorização. Observação de comerciais de TV. Mecanismos de persuasão através do “poder dos especialistas”. Klucharev; Smidts; Fernandez Quadro 2: Categorização por meio de objeto de estudo de alguns experimentos de neuromarketing. Fonte: criado pelo autor. Persuasão Através do quadro acima é possível, portanto, verificar a amplitude de áreas abrangentes pelo neuromarketing, sendo, contudo, os estudos relativos à memória, recompensa e processo de decisão como as áreas atualmente mais estudas. Verifica-se, também, que os estudos voltados cooperação social e respostas sensoriais possuem menor representatividade no momento. Entretanto, objetos de estudo não diretamente voltados para o consumo do produto em si podem significar uma tendência para novas pesquisas, visto, por exemplo, na pesquisa realizada por Klucharev, Smidts e Fernandez (2010), voltada para a análise por imageamento funcional do poder de persuasão de especialistas. A divulgação e o crescimento desse novo método de pesquisa de mercado fizeram com que grandes empresas como, por exemplo, ESPN (KULPAS, 2008), Unilever (LEE; BRODERICK; CHAMBERLAIN, 2007), DaimlerChrysler (ERK et al., 2002), GlaxoSmithKline (LINDSTROM, 2008), Procter&Gamble, Motorola, Buick e Delta Airlines (BORICEAN, 2009) criassem interesse no tema e buscassem utilizar os conhecimentos da neurociência em suas pesquisas de marketing, objetivando compreender mais a fundo as necessidades e desejos dos seus consumidores. 4. Métodos e Técnicas Desde o tempo de Broca (1824-1880) e Wernicke (1848-1905) os cientistas vêm aprendendo bastante sobre as ligações entre a anatomia cerebral e o comportamento. Entretanto, a utilização de técnicas de fotografias fixas como raio-x e outras não conseguiam VII Convibra Administração – Congresso Virtual Brasileiro de Administração – www.convibra.com.br revelar o funcionamento interno do cérebro, o que só foi possível com tecnologias posteriores como a Tomografia por Emissão de Pósitrons (Positron Emission Tomography – PET scan) (TOVINO, 2007), o Imageamento por Ressonância Magnética funcional (functional Magnetic Resonance Imaging – fMRI) (REIMANN, 2009), a Tomografia Ótica Difusa Funcional (Functional Difuse Optic Tomography – FDOT) (ZALTMAN, 2003), a Eletroencefalografia de Alta Resolução (High Resolution Electroencephalography – High Resolution EEG) (NUNEZ, 1995), o Magnetoencefalograma (Magnetoencephalography – MEG) (MOORE, 2005) e o método de Resposta Galvânica da Pele (Galvanic Skin Response – GSR) (LEE; BRODERICK; CHAMBERLAIN, 2007) . Apesar da história do PET se iniciar na década de 1940, com George de Hevesy e sua descoberta de rastreamento de moléculas de glicose radioativas, apenas em 1973, na Universidade de St. Louis, é que foi criado o primeiro aparelho PET scanner (TOVINO, 2007). Nessa técnica átomos de determinados isótopos emissores de pósitrons são usados para identificar as moléculas de interesse, sendo injetados na corrente sanguínea do organismo (TOVINO, 2007) para rastrear tanto o metabolismo como o fluxo sanguíneo (GAZZANIGA; IVRY; MANGUN, 2006). No caso do metabolismo, injeta-se uma substância radioativa chamada 18F-desoxiglicose, a qual se comporta como desoxiglicose (importante substância metabólica), fazendo com que o organismo a absorva rapidamente, levando-a ao cérebro onde serão consumidas pelos neurônios ativos (SAPER; IVERSEN; FRACKOWIACK, 2000). No caso da medida do fluxo sanguíneo cerebral, atualmente mais utilizada que a medida metabólica, utiliza-se radiofármacos (H215O) que possuem meia-vida curta (média de 123 segundos), possibilitam medir o fluxo cerebral rapidamente (menos de 1 minuto) e cada indivíduo pode ser estudado várias vezes, possibilitando medidas cognitivas complexas (GAZZANIGA; IVRY; MANGUN, 2006). Dessa forma, durante o processo de imageamento por meio do PET, ambas as substâncias (desoxiglicose ou radiofármacos) emitem elétrons carregados positivamente (pósitrons), esses pósitrons irão colidir com elétrons de forma que as partículas se anulem mutuamente, emitindo dois raios gamas em oposições contrárias. O aparelho PET, por sua vez, contém um detector de raios gama circular, o qual irá detectar os raios gama provenientes da anulação do choque entre o elétron e o pósitron (FIGURA 1) (SAPER; IVERSEN; FRACKOWIACK, 2000). Figura 1: Gamma ray detection. Fonte: Saper; Iversen; Frackowiack (2000, p. 326) Já o Imageamento por Ressonância Magnética funcional, atualmente a técnica de imageamento cerebral mais popular nas pesquisas dos neurocientistas cognitivos e nas pesquisas com consumidores (SHIV et al., 2005), tem seu funcionamento baseado em descobertas químicas de Linus Pauling, em que a quantidade de oxigênio carregada pela VII Convibra Administração – Congresso Virtual Brasileiro de Administração – www.convibra.com.br hemoglobina muda o grau pelo qual a hemoglobina pertuba o campo magnético (RAICHLE, 2001; GAZZANIGA; IVRY; MANGUN, 2006). O sinal gerado por essa mudança ficou conhecido pelo nome de “sinal dependente do nível sanguíneo de oxigênio” (blood oxygen level dependent – BOLD), tornando-se a base para a grande maioria das pesquisas com imageamento cerebral (FIGURA 2) (GAZZANIGA; IVRY; MANGUN, 2006). Figura 2: Neural Correlates of Preference for Anonymous Coke and Pepsi Delivery in 3-Trial and 15-Trial Anonymous Taste Tasks in fMRI. Fonte: McClure et al., 2004, p.382. De acordo com Dobbs (2009), apesar de serem as duas técnicas mais utilizadas atualmente, a fMRI e a PET possuem diferenças. Dentre elas está o fato de que um corte transversal no cérebro pode ser escaneado pelo primeiro em menos de dois segundos, o que permite o mapeamento da maior parte do cérebro em um ou dois minutos. Além disso, a fMRI possui uma capacidade de resolução mais acurada, de 1 a 5mm, na prática voxels (união da medida de volume e pixel), enquanto através do método PET a resolução é de 3 a 5mm (PERRACHIONE; PERRACHIONE, 2008). Outro importante fator é a não necessidade de ingestão de substâncias radioativas (necessário no PET) para a realização do exame de fMRI (DOBBS, 2009), devido este computar as diferenças nos níveis de oxigênio do cérebro (FRISTON, 1997). Todos esses fatores tornam a fMRI a ferramenta mais cotada em relação à visualização espacial de tal forma que, segundo Lent (2008), apesar de estar se tornando uma verdadeira apologia à teoria do localizacionismo, ao mesmo tempo mostra que diversas outras áreas também são ativadas, além das áreas esperadas. Outra técnica que está sendo cada vez mais utilizada, uma vez que é um equipamento mais acessível, pode ter alta resolução temporal (LEE; BRODERICK; CHAMBERLAIN, 2007) e possível de ser transportado (MADAN, 2010), é o Eletroencefalograma (EEG). Segundo Pradeep (2007), a descoberta dessa técnica se deu ainda no século 19, sendo Hans Berger o primeiro cientista a utilizá-la em humanos. O Eletroencefalograma consiste na mensuração na atividade cerebral através da captação da atividade elétrica por eletrodos colocados no escalpo, formando um tipo de rede de captação elétrica (MADAN, 2010). Em sua utilização é necessário que sejam definidos no mínimo dois pontos no escalpo, uma vez que o equipamento toma como referência pontos no espaço, onde serão posicionados eletrodos (atualmente sendo utilizado de 64 a 128 eletrodos normalmente) que podem chegar a tamanhos milimétricos (PRADEEP, 2007), mas para uma melhor visualização espacial, alguns cientistas já estão utilizando os chamados Eletroencefalogramas de Alta Resolução (High Definition EEG), que contém cerca de 64 a 256 eletrodos (ASTOLFI, 2009). A técnica de Magnetoencefalograma (Magnetoencephalogram – MEG) é, por sua vez, um pouco similar ao EEG devido à sua acurada resolução temporal, chegando a captar milisegundos de atividade cerebral, e devido ao fato de captar a atividade neuronal de forma VII Convibra Administração – Congresso Virtual Brasileiro de Administração – www.convibra.com.br continua (SHIV et al., 2005). Seu funcionamento ocorre por meio da mensuração do cérebro por campos magnéticos (PRADEEP, 2007), mas apesar de sua alta capacidade temporal, tanto MEG quanto EEG ainda não possibilitam uma boa resolução espacial (BUCKNER; LOGAN, 2001), são limitados na resolução em 3-dimensões devido captarem sinais apenas na superfície da cabeça. Apesar da limitação na captação de imagens tridimensionais, é possível solucionar esse problema por meio de coleta de dados para geração de imagem tri-dimensionais (SHIV et al., 2005). Isso porque recentes desenvolvimentos tecnológicos possibilitam o monitoramento de todo o cérebro por meio da alocação de múltiplos sensores, os quais irão gerar medições que serão utilizadas para reconstruir as imagens do cérebro e da ativação cerebral no córtex. Porém, a tecnologia atual aplicada no MEG, assim como nos equipamentos de fMRI, ainda impossibilita qualquer movimento durante a análise, pois pode comprometer toda a sua eficiência (PRADEEP, 2007). Apesar das técnicas citadas serem as mais utilizadas atualmente, outras técnicas também são utilizadas pelos cientistas em suas pesquisas de Neuromarketing. Cada uma delas, entretanto, tem suas características próprias (QUADRO 3) que determinam qual sua melhor funcionalidade para um determinado objetivo de estudo. Essa variedade de tecnologias permite que, mesmo quando não se tem acesso a equipamentos como PET, fMRI ou MEG, é possível partir para experimentos mais acessíveis através de técnicas como EEG e GSR (LEE; BRODERICK; CHAMBERLAIN, 2007). Técnica Sigla Medida física Aplicação da Medição Resolução Temporal Resolução Espacial Imageamento por Ressonância Magnética funcional fMRI Nível de oxigenação do cérebro Atividade metabólica Segundos 1-5 mm 2-Desoxiglicose Radioativa Atividade Metabólica Segundos 3-5 mm Tomografia por Emissão de Pósitrons PET Radiofármacos Fluxo Sanguíneo cerebral MagnetoenceMEG Campos magnéticos Atividade neural Milisegundos Centímetros falograma Resposta Frações de Sem GSR Resistência Elétrica “Excitação” Galvânica da Pele segundos aplicação EletroencefaloAtividade EEG Ondas Elétricas Milisegundos Centímetros grama Cortical Quadro 3:Características gerais das técnicas predominates de imageamento aplicadas no Neuromarketing. Fonte: Adaptado pelo autor (PERRACHIONE; PERRACHIONE, 2008, p. 307). Assim, apesar da técnica mais utilizada pelo neuromarketing ser o Imageamento por Ressonância Magnética funcional (fMRI) (SMIDTS, 2002), outras diferentes tecnologias também podem ser utilizadas (CONEJO et al., 2007) possibilitando a adaptabilidade cada vez maior de pesquisas com o decorrer do desenvolvimento tecnológico, onde, segundo Pradeep (2007), tanto o aspecto técnico como aspectos de tempo, custo e precisão são levados em consideração. 5. Questões Éticas Assim como muitos outros avanços tecnológicos e científicos que já levantaram questões polêmicas de cunho social, ético e legal, o campo do neuromarketing está atualmente VII Convibra Administração – Congresso Virtual Brasileiro de Administração – www.convibra.com.br gerando diversas discussões sobre a implicação das práticas dessa nova área de pesquisa de mercado (TOVINO, 2005). Para alguns neurocientistas, a ética nos estudos neurais – neuroética – pode aprender bastante com o ramo da genética e, suas respectivas discussões éticas, a qual pode oferecer conhecimento para vários aspectos diferentes, até mesmo sobre o contexto de desenvolvimento e as formas mais apropriadas e éticas de aplicação de suas técnicas (DOUCET, 2005). Tal discussão sobre o campo ético, econômico, social e político das ciências neurais da atualidade, vêm possibilitando, assim, bases para novas plataformas interdisciplinares (ABIRACHED, 2008), mas que, entretanto, vêm tentando ser passadas de forma cautelosa pelos neurocientistas, os quais muitas vezes se deparam com notícias nos meios de comunicação não-científicos que necessitam de outros padrões de entendimento, tornando os pesquisadores amplamente responsáveis pela divulgação de resultados de suas pesquisas na mídia impressa (RACINE, 2005). Porém, o problema ético mais discutido no campo do neuroimageamento e, consequentemente, do neuromarketing está relacionado às questões de invasão de privacidade e livre-escolha, devido à obtenção de informações individuais (FARAH, 2008; BURNS, 2007), uma vez que muitos profissionais de marketing buscam meios cada vez mais eficientes de influenciar a escolha do consumidor sem que seja requisitada sua permissão para tal (WILSON, 2008). A questão é que se sabe que a biologia de cada indivíduo tem um impacto nas decisões tomadas por esse, o que, por sua vez, leva a buscar a ativação das áreas cerebrais como forma de compreender como se dá tal comportamento, algo que está cada vez mais desenvolvido devido à rápida evolução dos equipamentos das tecnologias de neuroimageamento modernas (WILSON, 2008). A utilização dessas tecnologias, entretanto, precisa ser mais discutida e estudada, não somente com relação à busca por equipamentos com resoluções cada vez mais acuradas, mas também com relação à forma de interpretação dos dados fornecidos pelos mesmo. Segundo Abi-Rached (2008), considerar a utilização desses equipamentos para detecção de “verdades escondidas” pode ser algo bastante perigoso, principalmente quando esse tipo de interpretação poderá decidir se uma pessoa poderá ser julgada como culpada ou não de crimes aos quais é julgada pela lei. Portanto, assim como julgar uma pessoa utilizando o imageamento cerebral é uma tarefa que necessita cautela, talvez também seja necessária uma maior reflexão sobre as afirmações de empresas de neuromarketing que clamam encontrar os desejos mais intrínsecos dos consumidores (ABI-RACHED, 2008). O fato da disseminação do conhecimento neurocientífico por outras pessoas não pertencentes à tal área do conhecimento, é, por sua vez, julgado por alguns como possível de gerar profundas implicações, as quais devem ser discutidas pelos próprios neurocientístas (RACINE; BAR-LLAN; ILLES, 2005). Isso porque, muitas empresas, apesar de estarem buscando o desenvolvimento de ferramentas neurocientíficas para compreensão do comportamento do consumidor, muitas vezes não buscam igualmente investir no desenvolvimento ético, médico e legal desses fatores (ABI-RACHED, 2008). Para Brammer (2004), existe também o fato de que ao se trabalhar para o meio privado e não, como em muitos laboratórios, por meio de recebimento de fundos, as pesquisas acabam tendo que se tornar ainda mais exigentes, seja na realização dos projetos ou na sua parte ética. Portanto, o rigor e o cuidado ético devem ser discutidos em relação ao uso de qualquer nova tecnologia, mas que isso não deve estar voltado apenas para o ramo comercial, mas sim para todos que se utilizem dessa área da ciência. Para Logothetis (2008), tal tipo de discussão poderá desmitificar crenças disseminadas no meio público e até mesmo no meio científico, como, por exemplo, a crença de que os equipamentos de fMRI possuem a capacidade de ler a mente das pessoas. É importante salientar que tais equipamentos não possuem a capacidade VII Convibra Administração – Congresso Virtual Brasileiro de Administração – www.convibra.com.br de ler os desejos e a mente das pessoas, mas de forma alguma isso os torna inúteis (LOGOTHETIS, 2008), sendo necessário apenas que as empresas sejam um pouco mais céticas com relação às promessas que podem ser disseminadas na mídia popular com relação aos resultados e interpretações que se pode obter através do neuroimageamento, seja devido à dificuldade de interpretação ou devido às próprias limitações de conhecimento e dos equipamentos (DOBBS, 2009; MEDINA, 2008). As empresas, porém, defendem-se afirmando que apesar de terem um caráter de organização comercial, isso não faz com que suas atividades estejam fora do interesse científico ou mesmo que o simples fato de ser uma empresa de caráter comercial possa representar que seus projetos são mal formulados (BRAMMER, 2004). Além disso, a realização de pesquisas com consumidores adultos para avaliação dos efeitos visuais de campanhas de marketing pode revelar importantes informações sobre os limites éticos de campanhas direcionadas para crianças, uma vez que a plasticidade cerebral ligada à questão visual está intensamente relacionada às experiências vividas na fase da infância (PERRACHIONE; PERRACHIONE, 2008). 6. Limitações do uso do Neuromarketing Apesar de utilizar tecnologias bastante avançadas de neurociência, o neuromarketing, como qualquer outra nova área de conhecimento ainda tem muito a ser desenvolvida, para que possa se consolidar e descobrir quais os reais benefícios que o recente desenvolvimento do estudo cerebral poderá propiciar ao mundo dos negócios (MEDINA, 2008). E não somente o desenvolvimento das técnicas ou do conhecimento científico que precisam de mais tempo para um desenvolvimento mais sólido, mas também os aspectos éticos e profissionais da aplicação dessas técnicas precisam ser melhor discutidas (KULPAS, 2008). No atual estágio em que se encontra, a eficiência da aplicação do Neuromarketing talvez ainda possa ser contestável, isso porque não necessariamente as regiões esperadas para se obter certo resultado indicarão ou não se uma campanha ou ação terá sucesso certo (MADAN, 2010). De acordo com Medina (2008), a fascinação pelo entendimento mais aprofundado do funcionamento do cérebro deve ser acompanhada com certo cuidado em relação aos resultados achados, isso devido ao fato de que os próprios cientistas sabem ainda muito pouco sobre como aplicar esses conhecimentos às questões do mundo real. Ainda segundo Medina (2008), pessoas fora da comunidade científica tem certamente menos conhecimento sobre o assunto, e, por isso, é preciso que se tenha um pouco de ceticismo no mundo dos negócios para com materiais lido na mídia impressa popular. É preciso ressaltar a importância de utilização com cautela desse tipo de pesquisa, buscando formatar um projeto consistente e com uma criteriosa interpretação, checando, por exemplo, estudos similares já realizados que se utilizaram de outros métodos (DOBBS, 2009). Isso porque o neuromarketing gera uma nova visão para as teorias de marketing através da mensuração da atividade do córtex, entretanto, não se deve esquecer que a interpretação dos seus resultados ainda são altamente subjetivos e não podem ainda comprovar uma relação diretamente positiva com os conhecimentos atuais de marketing (LEE; BRODERICK; CHAMBERLAIN, 2007). Uma pessoa que não realize uma pesquisa séria e de análise ampla poderá tirar resultados pobres de uma pesquisa desse gênero, em que até as pesquisas sérias e bem elaboradas podem ter suas falhas devido a problemas que venham a acontecer na realização do projeto, como, por exemplo, os problemas com a manipulação de imagens que podem gerar diferentes resultados durante as análises (DOBBS, 2009). Além disso, existe o fato do cérebro humano ser bastante maleável (MEDINA, 2008; KULPAS, 2008), o que torna improvável a utilização do mapa cerebral de um indivíduo para a geração de regras universais VII Convibra Administração – Congresso Virtual Brasileiro de Administração – www.convibra.com.br (KULPAS, 2008). Para Medina (2008), ainda é muito cedo para afirmar como a evolução do conhecimento neurocientífico poderá afetar as tradicionais teorias de mercado. Os próprios cientistas cognitivos parecem não explorar todas as possibilidades que as inovações técnicas das metodologias de ressonância magnética podem proporcionar. Pois cerca de 70% dos estudos mais conhecidos já realizados utilizam scanners de baixo campo de força magnético (1.5T), 20% utilizam scanners de força média (3T) e a grande minoria utiliza os equipamentos de força superior (4T) (LOGOTHETIS, 2008). Ainda de acordo com Logothetis (2008), 87% de todos os estudos ainda utilizam métodos tradicionais de imageamento chamados de Imageamento Ecoplanar Eco-gradiente (Gradient-echo Echoplanar Imaging – GE-EPI), e essa combinação de métodos convencionais com equipamentos de baixo campo magnético podem gerar vários erros de localização durantes as análises, e, consequentemente, erros nas interpretações dos resultados. Outra limitação está também na questão financeira do neuromarketing, o qual, diferentemente das outras formas de pesquisa comportamental, utiliza-se das formas de imageamento cerebral, principalmente fMRI, as quais têm um alto custo (com exceção do EEG), chegando a cerca de 500 dólares por hora de análise (PERRACHIONE; PERRACHIONE, 2008), com projetos chegando a custar cerca de US$150.000,00 (dólares) (GROSE, 2006). Esse alto custo exige também que as empresas que utilizam equipamentos de imageamento funcional, possuam uma estrutura bastante desenvolvida para possuir não somente o equipamento (o qual precisa de uma intensa manutenção que inclui a troca contínua de hélio líquido para resfriar o equipamento), mas como também para empregar uma equipe de físicos e radiologistas os quais ficarão responsáveis pela manutenção dos equipamentos e supervisão das pesquisas (PERRACHIONE; PERRACHIONE, 2008). Por enquanto, as limitações financeiras podem ter alternativas tanto através de parcerias entre empresas e núcleos de pesquisas de universidades, ou mesmo, caso não se tenha acesso a equipamentos como PET, fMRI e MEG, outras tecnologias mais acessíveis como EEG e GSR podem ser utilizadas, apesar de não reconhecidas como as formas mais precisas de exploração do cérebro (LEE; BRODERICK; CHAMBERLAIN, 2007). Acreditase, porém, que a futura popularidade e desenvolvimento do neuromarketing irá gerar uma maior demanda por pesquisas (científicas e de mercado) nessa área e, por isso, irá torná-la mais barata e acessível para outras empresas (LINDSTROM, 2008), o que possibilitará, também, a geração de equipamentos de resolução mais acurada. 7. CONCLUSÃO Mesmo com o recente crescimento teórico e prático do neuromarketing muitos pontos desse conhecimento estão ainda passíveis de uma discussão mais profunda. Este artigo mostrou, assim, de forma geral os principais tópicos dessa discussão, iniciando pelo conceito de neuromarketing citado como: uma nova área do marketing proveniente da interdisciplinaridade entre conhecimentos da psicologia, neurociência, economia e marketing, utilizando-se de técnicas de imageamento cerebral e biometria para, através do estudo da atividade neural, buscar entender o comportamento humano em suas relações com o mercado. Ao abordar também os aspectos sobre a evolução do neuromarketing, percebe-se a sua relação com a história da neurociência, assim como a formação de categorias de objeto de estudo (Recompensa, Cooperação Social, Processo de Decisão, Resposta afetiva sensorial, Memória, Persuasão) das pesquisas de neuromarketing realizadas desde o seu início até a atualidade, permitindo analisar tanto a amplitude de áreas pesquisadas como a evolução e concentração dos temas de pesquisa. Essas pesquisas, contudo, buscaram utilizar não somente o conhecimento da neurociência, como também das tecnologias utilizadas para o imageamento da ativação VII Convibra Administração – Congresso Virtual Brasileiro de Administração – www.convibra.com.br cerebral como o Eletroencefalograma (EEG), o Magnetoencefalograma (MEG), a Tomografia por Emissão de Pósitrons (PET) e, principalmente, com a Ressonância Magnética por Imageamento funcional (fMRI). Portanto, devido essa interdisciplinaridade com os aspectos técnicos da neurociência, é necessário que a utilização das tecnologias e a interpretação dos resultados das pesquisas sejam feitas com cautela (DOBBS, 2009; MEDINA, 2008), devido a aspectos como a complexidade do cérebro e a improbabilidade de criação de modelos mentais (MEDINA, 2008). Apesar da existência de limitações, algumas descobertas têm um grande potencial prático (MADAN, 2010; MEDINA, 2008), isso porque o neuromarketing proporciona mais e melhores observações e mensurações objetivas, que, por sua vez, permitem entender cada vez melhor a resposta dos consumidores aos estímulos provocados pelo marketing e pelo mercado (LEE; BRODERICK; CHAMBERLAIN, 2007). Descobertas da neurociência sobre o stress, por exemplo, podem ter grande impacto na forma como pode ser desenvolvida a criatividade, o conhecimento e a produtividade dos trabalhadores, e, dessa forma, gerar alternativas para a melhoria da capacidade competitiva de uma empresa (MEDINA, 2008). Assim, caso os profissionais de marketing venham a buscar conhecimento nos mais diversos estudos já realizados pelos neurocientistas e psicólogos, é muito mais provável de se obter um maior sucesso de longo-prazo tanto com relação à imagem que os consumidores têm dessa nova área de conhecimento como serão posíveis de desenvolver suas performaces (MADAN, 2010). Esse desenvolvimento, também irá possibilitar o uso de equipamentos com resoluções mais acuradas (atualmente verifica-se o crescimento no número de estudos que utilizam equipamentos de média força de campo magnético) (LOGOTHETIS, 2008) e mais confortáveis para as pessoas que se submetem às análises, tornando mais compreensível até mesmo as relações entre a complexidade do pensamento humano e da emoção com a atividade neuronal (DOBBS, 2009). Assim, outros estudos relativos ao tema que abordem mais profundamente aspectos éticos ou limitantes dessa abordagem no Brasil e no mundo podem ser relevantes para o avanço nas discussões sobre o tema. Além disso, a possibilidade futura de mais pesquisas com a utilização das técnicas de imageamento cerebral sobre aspectos como persuasão e influência nos consumidores ou mesmo dentro das organizações, permitirá ampliar o conhecimento do neuromarketing ainda mais, abordando aspectos outros aspectos do comportamento humano em suas relações com o mercado. REFERÊNCIAS ABI-RACHED, Joelle M.. The Implications of the new brain sciences. European Molecular Biology Organization Reports, Vol. 9, No. 12, 2008. ARGYRIS, C.; SCHON, D.. Organizational Learning: a theory of action perspective. Reading, MA: Addison-Wesley, 1978. 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