0 UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE FARMÁCIA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIA DE ALIMENTOS WELLINGTON LUIS REIS COSTA INVESTIGAÇÃO DE Staphylococcus aureus RESISTENTE À METICILINA EM ALIMENTOS CÁRNEOS DESTINADOS AO PREPARO DE DIETAS EM HOSPITAIS PÚBLICOS DO MUNICÍPIO DE SALVADOR - BA Salvador 2013 1 WELLINGTON LUIS REIS COSTA INVESTIGAÇÃO DE Staphylococcus aureus RESISTENTE À METICILINA EM ALIMENTOS CÁRNEOS DESTINADOS AO PREPARO DE DIETAS EM HOSPITAIS PÚBLICOS DO MUNICÍPIO DE SALVADOR - BA Dissertação apresentada ao Programa de PósGraduação em Ciência de Alimentos da Faculdade de Farmácia da Universidade Federal da Bahia, como requisito para obtenção do título de Mestre. Orientadora: Profa. Dra. Rogeria Comastri de Castro Almeida Salvador 2013 Sistema de Bibliotecas - UFBA Costa, Wellington Luis Reis. Investigação de Staphylococcus aureus resistente à meticilina em alimentos cárneos destinados ao preparo de dietas em hospitais públicos do município de Salvador - BA / Wellington Luis Reis Costa. - 2013. 102 f. Inclui anexos. Orientadora: Profª. Drª. Rogéria Comastri de Castro Almeida. Dissertação (mestrado) - Universidade Federal da Bahia, Faculdade de Farmácia, Salvador, 2013. 1. Staphylococcus aureus. 2. Drogas - Resistência em microorganismos. 3. Carne - Controle de qualidade. 4. Infecção hospitalar. I. Almeida, Rogéria Comastri de Castro. II. Universidade Federal da Bahia. Faculdade de Farmácia. III. Título. CDD - 616 CDU - 616 3 Mais uma vez aos meus pais, dedico. 4 AGRADECIMENTOS Como sempre faço ao iniciar meu dia e aqui não seria diferente, primeiramente, agradeço a Deus. À minha orientadora Professora Rogeria C. C. Almeida. Para mim, mais um referencial de profissional e pessoa. Agradeço aos ensinamentos, dedicação, pelas oportunidades e principalmente à confiança em mim depositada. À Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado da Bahia, FAPESB/MS-Decit/CNPq, pelo apoio financeiro a pesquisa. À Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado da Bahia, FAPESB, pela concessão da bolsa de mestrado. Ao Dr. Ernesto Hofer e Dra. Marise Dutra Asensi do Instituto Oswaldo Cruz (FIOCRUZ), Manguinhos, Rio de Janeiro, pelo fornecimento da cepa Staphylococcus aureus resistente à meticilina (MRSA). Às equipes de cada Hospital participante, Diretores, nutricionistas, Técnicos de nutrição e manipuladores por facilitarem e auxiliarem os trabalhos da equipe nas Unidades de Alimentação e Nutrição. Sem os quais esse trabalho não seria possível. Às minhas irmãs, especialmente Nita, Hildenei, Rita e Bárbara pela ajuda nos cuidados aos meus pais nos momentos mais difíceis quando me faltava concentração, embora me sobrassem força e fé. A todos os professores, funcionários e colegas do Programa de Pós-Graduação em Ciência de Alimentos. Às meninas do Laboratório de Controle de Qualidade dos Alimentos, Joelza Carvalho, Ellayne Cerqueira e Lucimara Cardoso, por me receberem e se dedicarem com responsabilidade à pesquisa. Um agradecimento especial a Jeane Ferreira, ainda, pela parceria e colaboração. Aos técnicos dos Laboratórios de Controle de Qualidade e Bioquímica dos Alimentos da Escola de Nutrição, Luís e Ayse. À doutoranda Marta Mariana Silva pela construção do mapa de distribuição de fornecedores. À doutoranda Moara Martins pelos artigos e material enviados dos Estados Unidos. 5 ―Feliz é aquele que transfere o que sabe e aprende o que ensina‖ Cora Coralina 6 COSTA, Wellington Luis Reis. Investigação de Staphylococcus aureus resistente à meticilina em alimentos cárneos destinados ao preparo de dietas em hospitais públicos do município de Salvador-BA. 102f. 2013. Dissertação (Mestrado) Faculdade de Farmácia, Universidade Federal da Bahia, Salvador, 2013. RESUMO Staphylococcus aureus resistente à meticilina (MRSA) tem provado ser um dos patógenos mais disseminados e resistentes do século vinte, comumente associado às infecções nosocomiais em hospitais e na comunidade devido à emergente multiresistência a outros antimicrobianos. Essa resistência é mediada pela presença do gen mecA que codifica a proteína PBP2a na parede celular desse microrganismo. As infecções causadas pela bactéria tornaram-se uma causa amplamente conhecida de morbi-mortalidade no mundo, por restar limitada escolha de princípios-ativos para seu controle. O isolamento de cepas de S. aureus resistente à meticilina em vários alimentos de origem animal, principalmente as carnes, tem sido relatado recentemente. Assim, o presente trabalho teve como objetivo investigar a presença de Staphylococcus aureus resistente à meticilina em produtos cárneos destinados ao preparo de dietas em hospitais públicos de Salvador- BA. Na primeira parte do estudo, foram investigadas 114 amostras de produtos cárneos crus destinados ao preparo das dietas hospitalares, englobando as carnes bovina, frango, suína e peixe e na segunda, 60 amostras de preparações prontas para o consumo a base de carnes e peixe, imediatamente antes de serem servidas aos pacientes. Para o isolamento do microrganismo foram utilizados dois meios de enriquecimento seguidos de plaqueamento direto na superfície do meio MRSA-ID. Colônias características foram confirmadas utilizando o teste de aglutinação com o reativo Slidex MRSA. O presente trabalho se encontra estruturado em dois capítulos: o primeiro deles apresenta uma Revisão de Literatura contendo os assuntos pertinentes à pesquisa e o segundo a investigação de Staphylococcus aureus resistente à meticilina nos referidos alimentos. Como resultado da investigação, constatou-se a presença de MRSA em amostras de alimentos cárneos crus e em peixes em todos os hospitais investigados, com uma porcentagem maior para as carnes de suíno. Quanto aos alimentos prontos para o consumo, 10% foram positivos para MRSA, e as porcentagens específicas foram: frango, 5,6%; suíno, 6,7%; e peixe, 26,7%. Preparações a base de carne bovina não estavam contaminadas por MRSA. Esses resultados podem ser atribuídos a presença do patógeno no animal e posterior contaminação das partes musculares em alguma etapa do abate e processamento, ou ainda, a contaminação pós-processamento através da manipulação. Palavras-chave: MRSA. Resistência antimicrobiana. Carne. Infecções nosocomiais. 7 COSTA, Wellington Luis Reis. Investigation of methicillin-resistant Staphylococcus aureus in meat and fish products destined for the preparation of meals in public hospitals in Salvador, Bahia. 102p. 2013. Dissertation (Master’s degree) - Faculdade de Farmácia, Universidade Federal da Bahia, Salvador, 2013. ABSTRACT Methicillin-resistant Staphylococcus aureus (MRSA) has proven to be one of the most widespread and resistant pathogens of the last 20th century. This pathogen is commonly associated with nosocomial and community infections due to emerging resistance to other antibiotics. This resistance is mediated by the presence of mecA gene which encodes the protein PBP2a in the cellular wall of bacteria. Infections caused by this bacterium have become a widely known cause of morbidity and mortality worldwide, due to lack of drugs to control it. Isolation of methicillin-resistant S. aureus strains in various animal products, especially meat, has been recently reported. Thus, the present study aimed to investigate the presence of methicillinresistant Staphylococcus aureus in raw and ready-to-eat meat and fish products destined for the preparation of meals in public hospitals in Salvador-BA. A total of 114 samples of raw meat and fish (chicken, n = 30; beef, n = 30; pork, n = 24; and fish, n = 30) and 60 samples of ready-to-eat meat and fish (chicken, n = 15; beef, n = 15; pork, n = 15; and fish, n = 15) were collected from 10 different kitchens in public hospitals in Salvador, BA. For isolation of MRSA two enrichment steps were used, followed by direct plating on the surface of the medium MRSA-ID. Characteristics colony were confirmed using the agglutination test with reactive SLIDEX-MRSA. This study is structured in two chapters: the first one presents a Literature Review containing pertinent subject to this research and the second one the investigation of methicillin-resistant Staphylococcus aureus in the previously mentioned samples. The results demonstrate the presence of MRSA in samples of raw meat in all investigated hospitals, with a higher percentage in pork. Regarding the samples of ready-to-eat foods, 10% were positive for MRSA, and the specific percentages were chicken, 5.6%; pork, 6.7%; and fish, 26.7%. The beef was not contaminated by MRSA. These results can be attributed to the presence of the pathogen into the animal organism and subsequent contamination of muscular parts in some stage of slaughter and processing, or post-processing contamination by handling. Keywords: MRSA. Antimicrobial resistance. Meat products. Nosocomial infections 8 LISTA DE ILUSTRAÇÕES Figura 1 Esquema representativo da metodologia aplicada na investigação de MRSA........................................................................................... 66 Figura 2 Foto representativa de tubo de PHMB+ positivo (Arquivo pessoal)... 67 Figura 3 Foto representativa de colônias de MRSA em ágar cromogênico (Arquivo pessoal)............................................................................... 67 Foto representativa de teste Slidex positivo para MRSA (Arquivo pessoal)............................................................................................. 68 Distribuição da presença de Staphylococcus aureus resistente à meticilina (MRSA) em relação ao tipo de produto cárneo cru........... 70 Mapa de localização dos produtores de carnes cruas investigadas....................................................................................... 76 Distribuição da presença de Staphylococcus aureus resistente à meticilina em relação ao tipo de alimento cárneo pronto para o consumo destinado às dietas hospitalares........................................ 80 Figura 4 Figura 5 Figura 6 Figura 7 9 LISTA DE TABELAS Tabela 1 Frequência de isolamento de MRSA em amostras de carne crua e de preparações prontas para o consumo a base de carne, provenientes de 10 hospitais públicos de Salvador-BA..................... 68 Tabela 2 Isolamento de MRSA de amostras de alimentos cárneos crus em cozinhas de hospitais públicos de Salvador-BA................................ 69 Tabela 3 Análise bivariada entre a presença de Staphylococcus aureus resistente à meticilina e o tipo de alimento cárneo............................ 70 Tabela 4 Modelo logístico (Odds ratio) da presença de Staphylococcus aureus resistentes à meticilina em relação ao tipo de alimento cárneo................................................................................................ 71 Tabela 5 Isolamento de MRSA de amostras de preparações prontas para o consumo a base de carne, em cozinhas de hospitais públicos de Salvador-BA....................................................................................... 80 Tabela 6 Análise bivariada entre a presença de Staphylococcus aureus resistente à meticilina e o tipo de preparação cárnea pronta para o consumo destinada às dietas hospitalares...................................... 81 10 LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS ANVISA Agência Nacional de Vigilância Sanitária CCIH Comissões de Controle das Infecções Hospitalares CDC Center for Disease Control and Prevention EE Enterotoxinas Estafilocócicas ECN Estafilococos Coagulase Negativa HA-MRSA Health care associated MRSA LACQ Laboratório de Controle de Qualidade de Alimentos MRSA Methicillin Resistant Staphylococcus aureus OMS Organização Mundial de Saúde OIE Organização Mundial para Saúde Animal FAO Órgão das Nações Unidas para Agricultura e Alimento OSPC Oceania South Pacific clone PBP Penicillin Binding Protein PNCRC Plano Nacional de Controle de Resíduos e Contaminantes PAMvet Programa de Análise de Resíduos de Medicamentos Veterinários em Alimentos de Origem Animal TSST-1 Tóxico Síndrome do Choque SCCmec) Staphylococcal cassette chromosome mec SAg Superantígenos de Estafilococos SWP Oceania Southwest Pacific PVL Toxina Panton-Valentine Leucocidina UAN Unidades de Nutrição e Alimentação UFBA Universidade Federal da Bahia VISA VANCOMYCIN-INTERMEDIATE S. aureus WA-MRSA Western Australian MRSA 11 SUMÁRIO INTRODUÇÃO GERAL......................................................................... 13 OBJETIVOS GERAIS E ESPECÍFICOS............................................... 16 CAPÍTULO 1: REVISÃO BIBLIOGRÁFICA.......................................... 17 1.1 Staphylococcus aureus ...................................................................... 1.2 Staphylococcus aureus E SUA IMPORTÂNCIA NAS INTOXICAÇÕES ALIMENTARES......................................................... 20 1.3 Staphylococcus aureus RESISTENTE À METICILINA EM ALIMENTOS.......................................................................................... 23 1.4 Staphylococcus aureus RESISTENTE À METICILINA E A RESISTÊNCIA ANTIMICROBIANA...................................................... 24 1.5 Staphylococcus aureus RESISTENTE À METICILINA E AS INFECÇÕES HOSPITALARES (HA-MRSA) E DETECÇÃO................ 28 1.6 Staphylococcus aureus RESISTENTE À METICILINA EM COMUNIDADES (CA-MRSA)............................................................... 32 1.7 Staphylococcus aureus RESISTENTE À METICILINA EM 35 ANIMAIS................................................................................................ 1.8 USO DE ANTIMICROBIANOS COMO PROMOTORES DE 36 CRESCIMENTO.................................................................................... REFERÊNCIAS..................................................................................... 17 40 CAPÍTULO 2: INVESTIGAÇÃO DE STAPHYLOCOCCUS AUREUS RESISTENTE À METICILINA EM ALIMENTOS CÁRNEOS CRUS E EM PREPARAÇÕES A BASE DE CARNE EM HOSPITAIS PÚBLICOS DE SALVADOR-BA........................................................... 59 RESUMO............................................................................................... 59 ABSTRACT........................................................................................... 60 1 INTRODUÇÃO....................................................................................... 61 2 MATERIAL E MÉTODOS..................................................................... 63 2.1 AMOSTRAGEM..................................................................................... 63 2.2 DESENHO DO ESTUDO....................................................................... 63 2.3 INVESTIGAÇÃO DA PRESENÇA DE Staphylococcus aureus RESISTENTE À METICILINA EM ALIMENTOS CÁRNEOS CRUS DESTINADOS A DIETAS E EM PREPARAÇÕES A BASE DE CARNE PRONTAS PARA O CONSUMO EM HOSPITAIS PÚBLICOS DE SALVADOR-BA............................................................................... 64 2.4 ANÁLISE DOS DADOS......................................................................... 66 3 RESULTADOS E DISCUSSÃO............................................................ 67 12 4 CONCLUSÕES...................................................................................... 87 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS.................................................................. 88 REFERÊNCIAS..................................................................................... 89 ANEXOS................................................................................................ 98 13 INTRODUÇÃO Staphylococcus aureus é considerado a terceira causa mais importante de toxinfecção alimentar no mundo (NORMANNO et al., 2005). Existem dois agravantes para a sua presença: a produção de toxinas e a resistência a antimicrobianos. Este patógeno é ainda considerado um excelente indicador da ineficiência do processamento térmico, condições higiênicas inadequadas do processo, ou ainda refrigeração inadequada após o preparo dos alimentos (JAY, 2005). Devido ao fato da completa erradicação do microrganismo não ser possível, o controle da transmissão deve ser o principal objetivo. O microrganismo geralmente encontra-se em baixos níveis, entretanto a manipulação do alimento pelo homem, um dos reservatórios desta bactéria, pode elevar o número de células viáveis e, por esta razão, cuidados especiais devem ser tomados para evitar a veiculação do patógeno no preparo dos alimentos. Dessa forma, a detecção de S. aureus, em alimentos é essencial para monitorar e prevenir as infecções (FRANCO; LANDGRAF, 2008; SOUZA; SANTOS, 2009) Tradicionalmente, as medidas de controle incluem a implementação de técnicas de lavagem das mãos, procedimento único considerado por vários trabalhos como mais importante na prevenção das infecções por elas veiculadas. Além de outras medidas não menos importantes, como o treinamento e conscientização dos manipuladores, aí incluídas as outras medidas de higiene pessoal, limpeza e desinfecção dos utensílios e instalações, somados a manutenção de qualidade das matérias-primas, e às temperaturas adequadas de conservação e cocção (RADDI; LEITE; MENDONÇA, 1988; SOUZA; SANTOS, 2009). Diversos estudos epidemiológicos, incluindo os da Vigilância Nacional de Infecções Nosocomiais dos Estados Unidos, tem mostrado que a incidência de infecções por S. aureus vem aumentando consideravelmente nas últimas décadas em todas as faixas etárias, incluindo recém-nascidos (ANDRADE, 2008). Nos últimos anos, tem-se observado o surgimento de cepas de S. aureus resistentes a antimicrobianos, devido ao seu genoma extremamente adaptável (RIZEK, 2010). 14 A emergência e rápida disseminação deste microrganismo tem levado a importantes mudanças na prevenção da infecção em serviços de controle em hospitais e outros setores de tratamento de saúde. Estudos recentes sugerem que a infecção devido ao Staphylococcus aureus resistente à meticilina (MRSA) não é adquirida apenas em hospitais, mas também em comunidades (SALMENLINNA; LYYTIKÄINEN; VUOPIO-VARKILA, 2002). Desde 1917, mesmo antes da aplicação clínica de antimicrobianos, já se relatava que microrganismos apresentavam a habilidade de se defender mostrando a resistência à terapia como um processo natural das bactérias. Inicialmente este processo não causou grande alarde à saúde publica dada a quantidade de componentes disponíveis, porém após o surgimento de resistência a penicilinas sintéticas e a conhecida capacidade de transmissão dessa resistência via plasmídios e outros elementos móveis o problema se tornou preocupante (GARCÍA CATELLANOS et al., 2004; UENO; JORGE, 2001). Infelizmente, o desenvolvimento de resistência é mais rápido que a capacidade da indústria para produzir novas drogas. No tocante aos S. aureus, a resistência a vários tipos de drogas antimicrobianas apresentada por certas linhagens, torna difícil o controle das infecções causadas por estes patógenos (STURMER, 2008). A resistência à meticilina pelo S. aureus é mediada pela presença do gene mecA, que codifica a proteína 2a (PBP2a), que se encontra na parede celular do microrganismo (CHAMBERS, 1997). A detecção de fontes de MRSA, como os alimentos, é fundamental para prevenção e acompanhamento das infecções. Em adição, o interesse por hospitais associados a infecções por MRSA e comunidades com infecções causadas por MRSA vem aumentando nos últimos anos (LOPES, 2005; GELATTI et al., 2009). Segundo Kluytmans (2010), o uso indiscriminado de antimicrobianos aliado a medidas insuficientes de controle das infecções é a principal causa da pandemia de resistência antimicrobiana em patógenos humanos. O uso dessas drogas em prescrições inadequadas ou em tratamento sem diagnósticos pré-estabelecidos, automedicação, descarte incorreto no meio ambiente, ou utilização indevida na pecuária, também contribuem para a disseminação, pois genes de resistência podem ser transmitidos do animal para o homem através da cadeia alimentar (TAVARES, 2000). 15 Embora a infecção por MRSA não tenha sido relacionada ainda ao consumo de carnes contaminadas, o microrganismo tem entrado na cadeia produtiva e estudos recentes confirmam a detecção de MRSA em carnes cruas, incluindo carnes bovina, suína, frango e de outros animais (FREITAS et al., 2004; RAPINI et al., 2004; HUIJSDENS et al., 2006; MOURA et al., 2006; NORMANNO et al., 2007; VAN LOO et al., 2007; DE BOER et al., 2009; LOZANO et al., 2009). Considerando os ambientes hospitalares, as refeições preparadas nesses locais devem receber atenção especial porque esses alimentos são destinados a população de alto risco, susceptível ao desenvolvimento de várias doenças. 16 OBJETIVOS GERAIS E ESPECÍFICOS Objetivo Geral Investigar a presença de Staphylococcus aureus resistente à meticilina (MRSA) em produtos cárneos destinados a dietas hospitalares. Objetivos Específicos: 1 Investigar a presença de Staphylococcus aureus resistente à meticilina MRSA em alimentos cárneos crus destinados ao preparo de dietas hospitalares; 2 Investigar a presença de Staphylococcus aureus resistente à meticilina MRSA em alimentos à base de carnes e peixes prontos para o consumo destinados a dietas hospitalares; 3 Associar a presença de MRSA e os tipos de alimentos cárneos e peixe investigados. 17 CAPÍTULO 1 1 REVISÃO BIBLIOGRÁFICA 1.1 Staphylococcus aureus O gênero Staphylococcus pertence à família Staphylococcaceae. Apresenta-se em forma de cocos Gram positivos, com 0,5 a 1,5 μm de diâmetro, imóveis, ocorre na forma de células isoladas, em pares, tétrades e cadeias curtas, porém é encontrado predominantemente formando grupos semelhantes a cachos de uva, devido à sua divisão ocorrer de maneira aleatória e em vários planos. Os estafilococos não esporulam e são aeróbios ou anaeróbios facultativos, exceto as espécies S. aureus subespécie anaerobius e S. saccharolyticus, que são anaeróbios estritos, catalase negativos e não formam gases a partir de carboidratos. Formam colônias relativamente grandes, com 1 a 2 mm de diâmetro, opacas, convexas, cremosas e suas cores variam do branco a vários tons de amarelo, dependendo da espécie e do meio de cultivo. Em meio de ágar sangue, algumas cepas produzem βhemólise (KONEMAN et al., 2008), são catalase positiva e oxidase-negativa, fermentam glicose em anaerobiose e possuem o ácido teicóico como constituinte de sua parede celular (ANDRADE, 2008). Os estafilococos são microrganismos mesófilos, apresentando temperatura de crescimento na faixa de 4 °C a 46 °C, sendo a temperatura ótima de 35 °C a 37 °C e são tolerantes a concentrações de 10% a 20% de cloreto de sódio (FRAZIER; WESHOFF, 2000). Apresentam capacidade de crescer dentro de uma escala compreendida entre os valores de pH 4,0 e 9,8, sendo o pH ótimo para crescimento compreendido entre 6,0 e 7,0. Somente as espécies S. aureus, S. intermedius e S. hyicus são coagulase positiva (FRANCO; LANDGRAF, 2008). Staphylococcus é, ainda, reconhecido como patógeno capaz de sobreviver em alimentos refrigerados (FREITAS et al., 2004). 18 O gênero Staphylococcus abrange 35 espécies diferentes, sendo 17 associadas a uma ampla variedade de infecções em seres humanos e animais (KONEMAN et al., 2008). Em patologias humanas, as principais espécies envolvidas são: S. aureus, S. epidermidis e S. saprophyticus (TRABULSI; ALTERTHUM, 2005). S. aureus é o patógeno humano mais importante entre os estafilococos. É encontrado no ambiente externo e cerca de 20 a 40% dos humanos são portadores dessa bactéria, cujo habitat principal é a membrana mucosa da nasofaringe, e a sua frequência é mais elevada entre pessoas que trabalham em hospitais (TRABULSI; ALTERTHUM, 2005; BANIA et al., 2006). O microrganismo também é comumente encontrado na mucosa bucal e auricular, na garganta, intestino e na pele humana (TRABULSI; ALTERTHUM, 2005). Outros locais de colonização do microrganismo incluem as pregas cutâneas intertriginosas, o períneo, as axilas e a vagina. Apesar de fazer parte da microbiota humana normal, ele pode produzir infecções oportunistas em condições apropriadas (KONEMAN et al., 2008). Além disso, as infecções estafilocócicas podem ser causadas por bactérias de outros doentes ou de portadores sadios, sendo veiculadas por contato direto ou indireto (TRABULSI; ALTERTHUM, 2005). A espécie se multiplica sob condições de alta pressão osmótica e pouca umidade, o que explica a sua sobrevivência nas secreções nasais e na pele. Está geralmente envolvida em infecções humanas, tanto de origem comunitária quanto hospitalar, sendo, consequentemente, a mais extensivamente estudada. Uma imensa gama de problemas médicos, incluindo infecções de pele e tecidos moles, como foliculite, furunculose, carbunculose, impetigo, além de infecções de sítios cirúrgicos, endocardites e bacteremias adquiridas em hospitais são causadas por S. aureus (CASEY; LAMBERT; ELLIOTT, 2007). Dentre os fatores que predispõem a infecções por este patógeno, destaca-se a administração de antimicrobianos (KONEMAN et al., 2008). Uma série de fatores de virulência é observada para o S. aureus tendo sido registradas mais de quarenta diferentes toxinas extracelulares, enzimas e proteínas de superfície (ARVIDSON; TEGMARK, 2001). Com base em suas atividades biológicas, três categorias funcionais são elencadas: mediação da adesão bacteriana às células ou tecidos do hospedeiro; promoção do dano tecidual com 19 consequente disseminação e proteção da bactéria contra o sistema imune (DEGO; VAN DIJK; NEDERBRAGT, 2002). Esses fatores de virulência incluem a produção de cápsulas, que impede sua fagocitose por leucócitos polimorfonucleares, contribuindo para sua permanência em espécimes clínicos (OLIVEIRA; TOMASZ; LENCASTRE, 2002). Produzem também algumas enzimas, destacando-se a catalase, a termonuclease e a coagulase que aumentam ainda mais sua patogenicidade. A produção da enzima coagulase resulta no acúmulo de fibrina ao redor da bactéria, isolando a área infectada, dificultando a ação dos mecanismos de defesa do hospedeiro (SILVA; GANDRA, 2004). Além disso, estas bactérias conseguem produzir vários outros fatores de virulência como desoxirribonuclease (DNAse) e nuclease termoestável, adesinas, fibrinolisinas, hialuronidases, hemolisinas e lipases (TRABULSI; ALTERTHUM, 2005), além de grande número de proteínas extracelulares, como a produção de citotoxinas e exoenzimas. Outras, como a proteína A e adesinas, são aderidas à parede celular e, juntas, estas proteínas possibilitam a invasão das defesas, adesão às células do hospedeiro e à matriz celular, invasão e destruição das células e sua disseminação pelos tecidos (VOJTOV; ROSS; NOVICK, 2002). As principais exotoxinas produzidas pelos estafilococos são as enterotoxinas estafilocócicas (EE), responsáveis pela intoxicação alimentar estafilocócica no homem (ORWIN et al., 2001; CARMO et al., 2002; LETERTRE et al., 2003; LOIR; BARON; GAUTIER, 2003; ORWIN et al., 2003); a toxina da Síndrome do Choque Tóxico (TSST-1) (BERGDOLL et al., 1981; TRABULSI; ALTERTHUM, 2005) e as toxinas esfoliativas, responsáveis pela Síndrome Estafilocócica da Pele Escaldada (LEE et al., 1987; SATO et al., 1994; YAMAGUCHI et al., 2002). S. aureus pode ainda produzir biofilmes de múltiplas camadas, incorporado dentro de uma matriz de glicocálice formado predominantemente por ácido teicóico (80%) e proteínas do próprio microrganismo e do hospedeiro (ARCHER et al., 2011). Uma vez estabelecidos, os biofilmes do S. aureus servem como uma barreira para os tratamentos antimicrobianos e a resposta imune do hospedeiro, e, por esta razão este tem se estabelecido como patógeno de infecções recorrentes (JONES et al., 2001). 20 1.2 Staphylococcus aureus E SUA IMPORTÂNCIA NAS INTOXICAÇÕES ALIMENTARES Uma variedade de microrganismos pode contaminar os alimentos, veiculando doenças cujas manifestações clínicas são fruto da interação do próprio microrganismo ou de suas toxinas com o organismo do hospedeiro (STAMFORD et al., 2006). S. aureus é um dos agentes etiológicos mais comuns, responsável por surtos de intoxicação alimentar. Está largamente distribuído na natureza, sendo veiculado aos alimentos por manipuladores, na maioria, portadores assintomáticos, e pelos animais (BALABAN; RASOOLY, 2000; SIMON; SANJEEV, 2007; STAMFORD et al., 2006). Segundo Silva e Gandra, (2004) durante muito tempo a espécie S. aureus foi considerada a única capaz de sintetizar enterotoxinas e a enzima coagulase. Quando então as espécies S. intermedius e S. hyicus, foram identificadas também como produtoras de enterotoxinas e de coagulase, e incriminadas em surtos de intoxicação alimentar, a legislação brasileira passou a estabelecer a pesquisa e enumeração de estafilococos coagulase positiva, recomendando o uso de testes de coagulase como marcadores para virulência separando as espécies. A legislação brasileira através da RDC n° 12, de 02 de janeiro de 2001 da Agência Nacional de Vigilância Sanitária - ANVISA (BRASIL, 2001), estabelece a tolerância máxima para estafilococos coagulase positiva em carnes embaladas a vácuo não maturadas de até 3x103 UFC/g (unidades formadoras de colônias por grama), além de coliformes a 45°C de até 104 UFC/g e ausência de Salmonella spp. em 25g. Para carne resfriada ou congelada in natura existem apenas parâmetros estabelecidos para ausência de Salmonella spp. em 25g de carne de bovinos, suínos e outros mamíferos e de 104 UFC/g de coliformes a 45°C para carne de aves (BRASIL, 2001). Como principal representante do grupo dos estafilococos coagulase positiva, a bactéria é de grande importância nos alimentos, sobretudo processados, como é o caso dos alimentos cárneos cozidos. Sua presença pode indicar deficiência no processamento ou condições higiênicas inadequadas, além da produção de enterotoxinas que, uma vez formadas, são capazes de resistir aos tratamentos 21 térmicos descritos anteriormente (FAGUNDES; OLIVEIRA, 2004; SILVA; GANDRA, 2004). Sabe-se que a célula microbiana é sensível ao calor, sendo eliminada em temperatura em torno de 65 °C, porém a toxina produzida por ela é resistente à temperatura de 121°C por um período de 3 a 8 minutos (SILVA et al., 2007) ou 100°C por 30 minutos (MURRAY; ROSENTHAL; PFALLER, 2010), baixo pH (ARGUDÍN; MENDOZA; RODICIO, 2010) e às enzimas proteolíticas, portanto mantendo sua atividade no trato gastrintestinal, levando aos quadros de gastrenterites após ingestão do alimento contaminado (LE LOIR; BARON; GAUTIER, 2003; BANIA et al., 2006). As intoxicações de origem alimentar provocadas por S. aureus são de curso muito rápido e não muito grave e geralmente não necessitam de atendimento médico, sendo a maioria dos casos não notificados. No entanto, segundo os dados do Ministério da Saúde, o S. aureus é considerado o segundo agente mais comum envolvido em surtos de toxinfecção alimentar no Brasil (BRASIL, 2011). Os principais sintomas são: náuseas, vômitos, dores abdominais, com ou sem diarréia, sudorese, desidratação por conta da perda de líquidos e cefaléia, geralmente não acompanhada de estado febril e hipotensão (BALABAN; RASOOLY, 2000; RODRIGUES et al., 2004; KLUYTMANS, 2010). A doença é auto-limitante e geralmente resolve-se após 24-48h do início dos sintomas (MURRAY, 2005; KLUYTMANS, 2010; ARGUDÍN; MENDOZA; RODICIO, 2010). Entretanto, o desencadeamento da síndrome varia de acordo com o grau de susceptibilidade do indivíduo, com a concentração da toxina no alimento e a quantidade que foi ingerida que, no caso do S. aureus, 105 células por alimento já é o suficiente para que seja produzida e acumulada toxina em níveis capazes de provocar a intoxicação. Concentrações bacterianas inferiores não são de importância para saúde pública (ESR, 2001). As Enterotoxinas Estafilocócicas (EE) são a principal causa de intoxicação de origem alimentar que ocorre após ingestão de alimentos contaminados com a toxina produzida pelo microrganismo devido ao manuseio impróprio e subsequente manutenção a elevadas temperaturas (FOOD..., 1992; EFUNTOYE; ADETOSOYE, 2003). Pertencem à família das toxinas pirogênicas superântigeno (superantigens SAg) e são designadas como tal devido aos seus efeitos sobre o sistema imune, e 22 muitas vezes está envolvida na síndrome do choque tóxico (TSST-1). No entanto, elas foram originalmente classificadas como EE em 1989 devido à sua atividade emética quando ingerida através de alimentos contaminados (BERGDOLL, 1989). Recentemente, outros tipos de EE têm sido relatadas baseadas em sua similaridade sequencial com as toxinas clássicas EE (LINA et al., 2004; OMOE et al., 2005; ARGUDÍN; MENDOZA; RODICIO, 2010). O Comitê Internacional para Nomenclatura dos Superantígenos de Estafilococos (SAg) propuseram que apenas os SAg que induzam vômito após administração oral em um modelo primata pode ser designado como Enterotoxina Estafilocócica. Outras SAg que não induzam êmese, devem ser classificadas como Enterotoxina Estafilocócica similar (Staphylococcal Enterotoxin-like - SEl) (LINA et al., 2004). Tanto o S. aureus como os outros membros do grupo coagulase positiva são reconhecidos pela sua capacidade de produzirem as EE (LINA et al., 2004). Ao todo, o número de SAg produzidas por S. aureus compreende 22 membros: as clássicas SEA, SEB, SEC (com as SEC1, SEC2 e SEC3, as SEC variantes de ovinos e bovinos), SED e SEE, e as novas SEG, SEH, SEI, SER, SES, SET e SEls (SElJ, SElK, SElL, SElM, SElN, SElO, SElP, SElQ, SElU, SElU2, e SElV) e a SEF antes designada como TSST-1, mas que perdeu atividade emética (BERGDOLL, 1989; ARGUDÍN; MENDOZA; RODICIO, 2010; PERILLO et al., 2012). Quantidades menores que 1µg (0,00001g) da toxina é capaz de causar intoxicação em humanos. São os manipuladores, portadores assintomáticos, os principais responsáveis pela contaminação dos alimentos, apresentando o patógeno como parte da microbiota normal do nariz ou lesões das mãos, como furúnculos (PELCZAR JR.; CHAN; KRIEG, 1997), aliados ao controle inadequado de tempo e temperatura (PIRAGINE, 2005; AMSON, HARACEMIV; MASSON, 2006). A pele das mãos apresenta uma população diferenciada de microrganismos, que pode ser classificada em microbiota residente e microbiota transitória. Anteriormente sugeria-se que essa microbiota poderia ser reduzida com a simples lavagem das mãos com água e sabão ou água e detergente (RADDI; LEITE; MENDONÇA, 1988). No entanto, hoje se sabe que os microrganismos residentes são encontrados nas camadas mais profundas da pele, não sendo, portanto facilmente removidos por fricção mecânica. A maior parte desta microbiota (85%) é 23 constituída por estafilococos coagulase negativa, o Staphylococcus epidermidis e a menor parte (5-25%) por S. aureus (coagulase positiva) e outros microrganismos dos gêneros Corynebacterium, Propionibacterium e Acinetobacter. Já a microbiota transitória da pele é representada pelos microrganismos que o indivíduo teve contato, os quais não se multiplicam na pele, mas permanecem nela, podendo contaminar outras superfícies e alimentos; entre eles estão as enterobactérias, como a Escherichia coli e Salmonella spp. e ainda os vírus, fungos e parasitos (AYCIÇEK. et al., 2004). 1.3 Staphylococcus aureus RESISTENTE À METICILINA EM ALIMENTOS As bactérias resistentes a antimicrobianos presentes nos alimentos preocupam, uma vez que podem ser transmitidas ao homem pela ingestão desses alimentos contaminados. Witte (2000) afirmou que no trato gastrintestinal tais bactérias podem transferir genes que conferem a resistência antimicrobiana a outras bactérias, da própria espécie ou de espécies não relacionadas, patogênicas ou não. Dentre as bactérias resistentes a antimicrobianos, destaca-se o Staphylococcus aureus resistente à meticilina (MRSA). No tocante a sua presença em alimentos, suspeita-se do contato com os manipuladores de alimentos bem como a sua presença na matéria-prima de origem animal como, peixes, carnes e leite (IARIA; FURLANETTO; CAMPOS, 1980; JAY, 2005; MOURA, 2006; BOER et al., 2009; LOZANO et al., 2009; JONGE; VERDIER; HAVELAAR, 2010; RIZEK, 2010; KAMAL; BAYOUMI; ABD EL AAL, 2013). O isolamento da cepa de MRSA ST398 demonstra a disseminação entre homens e animais na Holanda (HUIJSDENS et al., 2006). A cepa é considerada específica de suínos e foi primeiramente descrita na Europa onde foi encontrada colonizando suínos e seus tratadores na Holanda e França, e cães, suínos, cavalos e humanos na Alemanha e Áustria (ARMAND-LEFVRE; RUIMY; ANDREMONT, 2005; VOSS et al., 2005; HUIJSDENS et al., 2006; WITTE et al., 2007), e mais recentemente em suínos e tratadores no Canadá (KHANNA et al., 2008). Hoje nas 24 fazendas da Holanda, os suínos e seus tratadores são considerados portadores de MRSA. Cerca de 20 a 80% desses animais carreiam o patógeno em seu corpo sem desenvolverem infecções (GARDNER, 2010). Durante o abate de animais portadores de MRSA, a contaminação das carcaças e do ambiente pode ocorrer e consequentemente a carne desses animais pode tornar-se contaminada (VAN DUIJKEREN et al., 2009). Entretanto, a principal preocupação, segundo Kluytmans e colaboradores (1995), são os manipuladores de alimentos que ao m3anipularem essas carnes contaminadas com MRSA, colonizam suas mãos ou membranas mucosas e levam através da contaminação cruzada estes microrganismos a causarem infecções em outros seres humanos. Kluytmans e colaboradores (1995) relatam que o primeiro caso de infecção por MRSA através de alimentos ocorreu em 1995, em um hospital da Holanda, e resultou em um surto alimentar no hospital, com a ocorrência de óbito. Nesse estudo, o microrganismo foi isolado da orofaringe do manipulador de alimentos e do alimento servido. 1.4 Staphylococcus aureus RESISTENTE À METICILINA E A RESISTÊNCIA ANTIMICROBIANA As infecções estafilocócicas são comuns em indivíduos hospitalizados e muitas vezes provocam severas consequências (YZERMAN et al., 1996), tornando o controle dessas infecções cada vez mais importante (KLUYTMANS; BELKUM; VERBRUGH, 1997). A resistência antimicrobiana é definida como a capacidade de alguns microrganismos resistirem à ação de agentes antimicrobianos, que pode ocorrer por mecanismos específicos presentes nas bactérias ou pelo fato de concentrações da droga correspondente, normalmente alcançada no sangue ou tecido, não serem capazes de inibirem os microrganismos envolvidos na infecção (MOTA et al., 2005; WHO, 2012). 25 Este fenômeno é considerado um fator natural e inevitável (ANTÔNIO et al., 2009). Classifica-se em ativa ou passiva; a primeira ocorre como resultado de pressão seletiva específica para adaptar-se a um ataque. Já a resistência passiva ocorre como consequência de processos adaptativos gerais, não relacionados a uma classe de antimicrobianos (WRIGHT, 2005). A inativação enzimática, a alteração de transporte do fármaco por mudanças na bomba de efluxo, na permeabilidade externa da membrana e alteração de receptores, são os principais mecanismos de resistência conhecidos (SOUZA JÚNIOR; FERREIRA; CONCEIÇÃO, 2004). O início do uso clínico dos antimicrobianos começou nas décadas de 1940 e 1950, com o objetivo de controlar doenças infecciosas trazendo notável progresso no tratamento das mesmas (GURGEL; CARVALHO, 2008). Antes da utilização de antimicrobianos nos tratamentos de infecções por S. aureus, as mortes eram superiores a 80% (SKINNER; KEEFER, 1941). Somente em 1942 as penicilinas começaram a ser utilizadas no controle dessas infecções e rapidamente reduziu a taxa de mortalidade de 80% para 35% (MAYHALL, 1996), coincidindo com o rápido surgimento de resistência a essas drogas, o que representou importância considerável a saúde pública na época (KHAN et al., 2000). O potencial patogênico do S. aureus está relacionado com sua grande capacidade de mutação para formas mais resistentes frente aos antimicrobianos mais largamente utilizados. O surgimento dessas cepas resistentes levou ao desenvolvimento de novas drogas antimicrobianas e reavaliações periódicas do perfil de susceptibilidade deste patógeno (MARTINS et al., 2009). Hoje, todas as cepas de S. aureus são virtualmente resistentes às penicilinas naturais (RICE, 2006). A resistência a essas drogas ocorre devido à presença de genes localizados no cromossomo ou nos plasmídios do microrganismo (NOVICK, 1989), que codificam enzimas capazes de inativá-las, enzimas essas inicialmente chamadas de penicilinases e atualmente β-lactamases (RICE, 2006). Essas enzimas são capazes de hidrolisar o anel betalactâmico, transformando os antibióticos em produtos inativos (CHAMBERS; HARTMAN; TOMASZ, 1985). Em 1960 foi desenvolvida a meticilina, uma penicilina semi-sintética que no mesmo ano foi introduzida na Europa e, em 1961 nos Estados Unidos, sendo 26 posteriormente substituída por uma congênere, a oxacilina. O primeiro caso de infecção causado por cepas de Staphylococcus aureus resistente à meticilina (Methicillin Resistant Staphylococcus aureus – MRSA) foi relatado no Reino Unido neste mesmo ano e logo após em outros países da Europa, Japão e Austrália (LOPES, 2005; RICE, 2006), sendo a bactéria reconhecida como um patógeno significante em infecções hospitalares (AIRES DE SOUSA et al., 1998; JAFFE et al., 2000). Entretanto, o mecanismo de resistência a meticilina não havia sido elucidado até 1981, quando Hartman e Tomasz (1981) descobriram um tipo diferente de proteína no MRSA que teria uma reduzida afinidade por todos betalactâmicos até então disponíveis. Sabe-se que os antimicrobianos betalactâmicos, por exemplo, penicilinas e cefalosporinas atuam sobre a bactéria inativando as proteínas chamadas, Penicillin Binding Protein (PBP), enzimas que são essenciais na construção da parede celular. Quatro PBP nativas são encontradas nos estafilococos e todas as quatro podem ser inativadas pelos antimicrobianos mencionados (HARTMAN; TOMASZ, 1981). Como resultado do enfraquecimento da parede celular, as bactérias atingidas se tornam frágeis osmoticamente e são facilmente lisadas. Como já foi mencionado anteriormente, a enzima bectalactamase, que cliva a estrutura betalactâmica (anel) dos antimicrobianos, confere resistência à penicilina, mas não às penicilinas semisintéticas como as meticilinas, oxacilinas e cloxacilina (PINHO; DE LENCASTRE; TOMASZ, 2001). Por outro lado, a presença do gene mecA, que codifica uma forma diferente de PBP, a PBP2a na parede celular do microrganismo confere completa resistência a todos os antimicrobianos betalactâmicos, inclusive às penicilinas semi-sintéticas (PINHO; DE LENCASTRE; TOMASZ, 2001; WEESE et al., 2005). Esta resistência surgiu devido à integração de um elemento genético móvel, denominado Staphylococcal cassette chromosome mec (SCCmec), em sítio específico do genoma bacteriano (TIZOTTI, 2010). Estudos de isolados de MRSA mostraram que o componente genético chave responsável pela resistência, o gen mecA, não é nativo do genoma do S. aureus. O SCCmec tem sido caracterizado como um elemento de resistência móvel que difere dos transposons e dos bacteriófagos (BERGER-BACHI; ROHRER, 2002). Sabe-se que os genes de resistência podem ser transferidos entre as cepas diferentes de S. 27 aureus e entre outras espécies de Staphylococcus. Os Estafilococos Coagulase Negativa (ECN), por exemplo, têm sido considerados como reservatório para resistência a meticilina em S. aureus. Isso se deve ao fato de que, por razões desconhecidas, os ECN carreiam mais genes de resistência à meticilina que os S. aureus (WIELDERS et al., 2001). Os estafilococos apresentam uma extensiva variabilidade genômica, com mais de 20% do seu genoma dedicado a regiões dispensáveis, que podem codificar fatores de virulência ou proteínas mediadoras de resistências antimicrobianas (FITZGERALD et al., 2001). O SCCmec é um desses elementos e tem um tamanho que pode variar de 21 a 67kb. Existem cinco tipos de SCCmec (tipos I a V). Os menores, os tipos I, IV e V codificam apenas genes recombinantes e genes de resistência a meticilina, não possuindo genes transponíveis e genes de resistência a antimicrobianos não betalactâmicos (APPELBAUM, 2007). Os tipos I, II, e III estão associados às infecções hospitalares (HA-MRSA) e os tipos IV e V às infecções comunitárias (CA-MRSA) (HIRAMATSU et al., 2001; APPELBAUM, 2007). Segundo Tavares (2000), a existência e a disseminação de microrganismos resistentes a antimicrobianos são resultados da pressão selecionadora imposta pelo homem, pela prescrição desnecessária de drogas, pelo uso incorreto em tratamentos sem diagnóstico, automedicação, descarte de restos de antimicrobianos no meio ambiente, ou ainda o uso destes na pecuária como promotores de crescimento. A adaptação das bactérias à exposição de agentes químicos potentes é uma expressão natural da evolução adaptativa genética de organismos a modificações presentes no seu meio ambiente (GUIMARÃES; MOMESSO; PUPO, 2010; SILVEIRA et al., 2006). De acordo com a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), cerca de 50% das prescrições médicas desses fármacos são feitas de forma inadequada e, diante disso, uma das metas da Organização Mundial de Saúde (OMS) para o século XXI, é o uso consciente de agentes antimicrobianos, evitando com isso, o aparecimento e a seleção de cepas resistentes (BRASIL, 2007). Atualmente, cepas de bactérias multiresistentes são responsáveis por diversos surtos em todo o mundo e o arsenal terapêutico tem se tornado cada vez mais escasso (SANTOS et al., 2008). Isso porque o desenvolvimento de resistência por certas bactérias patogênicas é mais rápido que a capacidade da indústria para 28 produzir novas drogas. O S. aureus, um poderoso agente de infecção hospitalar, representa muito bem este aspecto (SOUZA, 1998). Segundo Mota e colaboradores (2005), somente 50% dos antimicrobianos produzidos é utilizado na terapia humana, a outra metade é empregada na profilaxia, tratamento, ou como promotores de crescimento animal, e no extermínio de pragas na agricultura. Na criação animal, o aparecimento de microrganismos resistentes pode ocorrer também pela utilização de antimicrobianos na ração (YATES et al., 2004). Durante os últimos 70 anos, o uso abusivo de antimicrobianos na medicina humana e na criação de animais, levou a um aumento constante de microrganismos resistentes a esses medicamentos (WHO, 2012). 1.5 Staphylococcus aureus RESISTENTE À METICILINA: INFECÇÕES HOSPITALARES (HA-MRSA) E DETECÇÃO Uma das maiores preocupações na área de saúde é a alta incidência de infecção hospitalar ou nosocomial, isto é, infecção adquirida em ambientes hospitalares durante a internação ou após a alta do paciente, quando este esteve hospitalizado, ou passou por procedimentos médicos (BRASIL, 2004b), ou ainda uma infecção ocorrida em um paciente em um hospital ou outra unidade de saúde, em cuja infecção não estava presente ou incubada no momento de sua admissão. Isso inclui infecção adquirida no hospital, porém manifestada depois da alta, e também infecções ocupacionais entre funcionários dessas instituições (WHO, 2002). A infecção hospitalar é uma realidade no Brasil e no mundo e representa um grande ônus sócio-econômico às instituições, em decorrência dos custos hospitalares, e em relação ao paciente pelo prolongamento do período de afastamento de suas atividades profissionais e familiares. Um paciente que evolui para uma infecção pode levar a um gasto de até três vezes o valor comparado ao paciente que não teve infecção. A infecção nosocomial é um dos maiores problemas enfrentados pelos profissionais de saúde em unidades de terapia intensiva, sendo que sua incidência atinge de 5 a 10% dos pacientes hospitalizados (RATTI; SOUSA, 2009). 29 O MRSA é uma causa importante dessas infecções adquiridas em comunidade e hospitais; são principalmente do tipo nosocomial e são cada vez mais relatados em vários países do mundo (TIEMERSMA et al., 2004). Este aumento de infecções por Staphylococcus pode ser compreendido pela habilidade do microrganismo em processos de adaptação às mudanças ambientais contínuas (RATTI; SOUSA, 2009). O MRSA desencadeia infecções tão invasivas quanto às causadas por S. aureus sensível à meticilina (MSSA), como por exemplo, as infecções em feridas, queimaduras e úlceras (AYLIFFE, 1997). Entretanto, a resistência a vários antimicrobianos limita as opções terapêuticas e prolonga o tempo de tratamento dessas infecções (KLUYTMANS; BELKUM; VERBRUGH, 1997; FARIA et al., 2005). O microrganismo é considerado o maior causador de infecções no mundo. E essas infecções estão associadas com aumento de morbidade e mortalidade em comparação com (APPELBAUM, infecções provocadas por outras 2007). As infecções causadas por cepas de este S. aureus patógeno são reconhecidamente graves em pacientes hospitalizados ou não. Um paciente infectado por MRSA pode apresentar probabilidade de morte cinco vezes maior que os não infectados (FERREIRA et al., 2009). Em trabalho realizado por Wyllie, Crook e Peto (2006) em dois hospitais em Oxfordshire – Inglaterra, os autores detectaram uma taxa de mortalidade de 34% em 30 dias para indivíduos infectados por MRSA, enquanto que para aqueles que foram infectados por MSSA a taxa foi de 27%. O aparecimento de cepas similares com resistência a outros antimicrobianos diferentes da meticilina surgiu em vários países praticamente ao mesmo tempo. Cepas neomicina-resistente e gentamicina resistente apareceram em vários países 10 anos após a introdução dessas drogas (LOWBURY et al., 1964; STORRS; COURVALIN; FOSTER, 1988). Devido à rápida disseminação do MRSA, o tratamento tradicional das infecções por HA-MRSA (Health care associated MRSA), nas últimas décadas, foi substituído por substâncias do grupo dos glicopeptídeos, principalmente a vancomicina (MIMICA; MENDES, 2007; UNAKAL; KALIWAL, 2012). O aumento do seu uso e consequentemente o aumento da pressão seletiva levou ao surgimento de outras cepas de S. aureus com susceptibilidade reduzida a vancomicina (UNAKAL; KALIWAL, 2012). Em 1997 foi identificado no Japão, o primeiro isolado de S. aureus 30 com susceptibilidade reduzida a vancomicina, o Staphylococcus intermediário à vancomicina (VANCOMYCIN-INTERMEDIATE S. aureus - VISA). Essa linhagem também vem sendo observada na Europa, Ásia, Estados Unidos e Brasil. (APPELBAUM, 2006; MIMICA; MENDES, 2007). Historicamente as infecções por HA-MRSA têm sido causadas por clones internacionalmente disseminados, incluindo os cinco maiores deles designados como, ibérico, brasileiro, húngaro, Nova Iorque/japonês e pediátrico, todos identificados através de técnicas moleculares (GORDON; LOWY, 2008). Esses clones multiresistentes se disseminaram mundialmente e são responsáveis pela maioria das infecções nosocomiais (OLIVEIRA; TOMASZ; DE LENCASTRE, 2002). O clone brasileiro, por exemplo, que já foi encontrado em diferentes hospitais de norte a sul do País (SOARES et al., 2001), tem sido também detectado em outros países incluindo Argentina, Uruguai, Paraguai, Chile, Portugal, Itália e República Tcheca (STURMER, 2008). O clone brasileiro foi responsável pela maioria das infecções estafilocócicas invasivas em um Hospital Universitário na cidade de Belém do Pará na década de 90, e também é reconhecido por ser a cepa que mais produz biofilmes (GORDON; LOWY, 2008). A prevalência de cepas MRSA associadas aos serviços de saúde, também denominadas HA-MRSA (HEALTH CARE ASSOCIATED- MRSA) pode variar conforme o país, instituição ou setor hospitalar (MIMICA; MENDES, 2007). Aproximadamente 29% (78,9 milhões) e 1,5% (4,1 milhões) de pessoas nos Estados Unidos foram colonizadas em suas narinas por S. aureus e MRSA, respectivamente, entre os anos de 2003-2004. Em 2005, estima-se que houve 478 mil hospitalizações com diagnóstico de infecções por S. aureus nos hospitais dos Estados Unidos, e destes, aproximadamente 28 mil foram provocadas por MRSA (CDC, 2011). Em estudo retrospectivo realizado por Dulon e colaboradores (2011), abordando a prevalência de infecções causadas por MRSA em serviços de saúde da Europa entre 2000 e 2010, foi observado que entre os pacientes a porcentagem de infecções por MRSA variava de 1% a 24%. Estudo anterior conduzido por Vaz (1995), em hospitais de Portugal, demonstrou um índice de 31,6% de isolados de S. aureus resistente à meticilina. Na Itália, em diferentes hospitais, no período de 1990 a 2007, os pesquisadores encontraram um aumento da prevalência do clone italiano de 29 para 57% (CAMPANILE et al., 2009). 31 No Brasil, os índices encontrados são, em média, bastante elevados (40% a 80%) especialmente entre as cepas isoladas em unidades de terapia intensiva (UTI). Os fatores de risco relacionados a infecções por HA-MRSA incluem, geralmente, idade superior a 60 anos, uso de corticóides, uso prévio de antimicrobianos, internação prolongada e presença de dispositivos médicos invasivos (TIZOTTI et al., 2010). Em linhas gerais, a disseminação das infecções se previne pela eliminação das condições necessárias para transmissão do microrganismo de um portador para um hospedeiro susceptível. Isso pode ser evitado por ações de controle nos ambientes hospitalares, como: identificação e isolamento do contato com os pacientes, a desinfecção nasal e cutânea, principalmente das mãos e a limpeza adequada e desinfecção das áreas clínicas (SEXTON et al., 2006; CME, 2010). Quanto ao diagnóstico laboratorial para MRSA, apesar das várias recomendações disponíveis na literatura, sabe-se que ainda não existe consenso sobre qual o método a utilizar. Diversos métodos estão disponíveis, no entanto, principalmente devido à variação na resistência das cepas, essa detecção muitas vezes pode ser difícil ou de baixa sensibilidade. Os métodos historicamente mais usados baseiam-se em modificações na tentativa de aumentar a expressão da resistência à oxacilina, como a adição de cloreto de sódio ao meio de cultura. Dentre os métodos tradicionais destacam-se os testes de disco-difusão, incluindo o disco de cefoxitina, o teste com placa de screening com oxacilina, o teste para determinação da concentração inibitória mínima, os métodos automatizados como o Vitek e o MicroScan e a utilização de meios cromogênicos (O’BRIEN et al., 2012; BOER et al., 2009). As técnicas tradicionais de cultura para a detecção de MRSA, representadas pela inoculação em placas de agar sangue ou de agar com meio seletivo (ATYAH; ZAMRI-SAAD; ZAHRAH, 2010), seguido de confirmação das colônias características tem sido amplamente utilizadas. O método mais utilizado para detecção de estirpes MRSA nos alimentos é o teste disco-difusão somado a confirmação através de Reação da Polimerase em Cadeia (PCR) para detecção do gene mecA (CRAGO et al., 2012; LIM et al., 2010). O teste de aglutinação em látex com confirmação através de PCR também tem sido utilizado (FESSLER et al., 2011; HANSON et al., 2011), enquanto a técnica de PCR isoladamente para identificação do microrganismo 32 também tem sido utilizada (DIAS et al., 2011; NORMANO et al., 2007), embora alguns desses estudos demonstrem a realização de teste de susceptibilidade antimicrobiana, como análise complementar dos isolados. Ainda, grande parte dos estudos tem utilizado a tipificação molecular dos isolados de MRSA como análise complementar, que incluíram tipagem por sequenciamento do multilocus (MLST) (LIM et al., 2010) e sequenciamento da região polimórfica X do gene da proteína A estafilocócica (spa-tipagem) (NAM et al., 2011). Como mencionado, alguns trabalhos buscaram avaliar a exatidão desses métodos e todos utilizaram como padrão ouro a presença de gene mecA (MINICA; MENDES, 2007). 1.6 Staphylococcus aureus RESISTENTE À METICILINA EM COMUNIDADES (CAMRSA) Um número crescente de relatos tem demonstrado o surgimento de um novo tipo de MRSA nos últimos anos. Este patógeno que até então era considerado de origem hospitalar, passa a se apresentar em casos de infecções em pacientes da comunidade, sem os fatores de risco para aquisição do patógeno (LOPES, 2005; REMONATTO et al., 2007). Esses fatores incluem internações recentes ou cirurgias, internações em unidades de terapia intensiva, diálise, doenças crônicas de fígado, pulmão e vasculares, afecções malignas, utilização de cateteres, ou exposição prolongada a antimicrobianos (HEROLD et al., 1998; VANDENESCH et al., 2003). Além desses fatores de risco, para ser considerado CA-MRSA, a cultura obtida da infecção deve ter sido adquirida em até 72 horas do internamento do paciente ou em uma consulta ambulatorial (HEROLD et al., 1998; KING et al., 2006). O curioso é que para ser considerado CA-MRSA também é preciso que o paciente apresente determinados fatores predisponentes para tal infecção. A maioria dessas infecções tem ocorrido em indivíduos com esses fatores, principalmente em adultos. O contato recente com ambientes hospitalares ou abuso de substância parenteral são exemplos. No entanto, algumas infecções deste tipo têm sido frequentemente relatadas por acontecerem sem nenhum destes fatores (SARAVOLATZ et al., 1982; MORENO et al., 1995). Estudos relatam a presença de 33 CA-MRSA em crianças, todas sem os fatores predisponentes para sua aquisição (HEROLD, et al., 1998; CREECH et al., 2005). O primeiro relato de infecções causadas por cepas de Staphylococcus aureus resistente à meticilina de origem comunitária (CA-MRSA) ocorreu em 1993 na Austrália, detectado em populações indígenas locais (TONG et al, 2009). Posteriormente, outros casos ganharam atenção em outras regiões do mundo. Nos Estados Unidos no ano de 2002, atletas em Los Angeles apresentaram surtos de infecções cutâneas (GELATTI et al., 2009), e um ano depois em Missouri, jogadores de futebol americano apresentaram MRSA em lesões da pele (KASAKOVA et al., 2005). Com a tipagem molecular foi possível agrupar epidemiologicamente as cepas de CA-MRSA que circulam em diferentes regiões do mundo em diferentes períodos. Observou-se que essas cepas têm uma estrutura molecular conservada e que contam um número reduzido de clones com capacidade de disseminação global (GELATTI et al., 2009). Aqueles primeiros isolados de CA-MRSA, detectados na Austrália, causando infecções em populações indígenas foram chamados de WAMRSA (Western Australian MRSA) (UDO; PEARMAN; GRUBB, 1993). Logo depois duas outras linhagens surgiram na Austrália e Nova Zelândia, o clone ―Queensland‖ (MUNCKHOF et al., 2003) e o clone SWP (Oceania Southwest Pacific), também conhecido como: OSPC (Oceania South Pacific clone) (NIMMO et al., 2000), além do EMRSA (Reino unido) e CMRSA (Canadá) (MEDIAVILLA et al., 2012). Nos Estados Unidos os clones mais comumente associados a surtos são o USA100, USA200, USA300 e USA400 (MEDIAVILLA et al., 2012). O clone USA400, é comum em infecções neonatais e puerperais, e o clone USA 300 é relatado principalmente em infecções de peles de atletas e presidiários. Ambos também são conhecidos por terem sido isolados de infecções de pele e tecidos moles, sendo o US300 mais frequentemente isolado que o US400 (MAREE et al., 2007; GELATTI et al., 2009). No Brasil, os primeiros isolados de CA-MRSA eram semelhantes ao OSPC, provenientes da região Sul do País e, posteriormente, foi relatada a presença deste mesmo clone na região Sudeste, na cidade do Rio de Janeiro (RIBEIRO et al., 2005). Como mencionado anteriormente, diferente do MRSA de origem hospitalar, que carreiam o SCCmec I, II e III, os CA-MRSA carregam preferencialmente o SCCmec 34 do tipo IV e V (VANDENESCH et al., 2003; LOPES, 2005). O cassete tipo IV é pequeno em tamanho e por esta razão perde genes de resistência a vários antimicrobianos não-betalactâmicos, daí a sua sensibilidade a esses agentes. Além disso, o CA-MRSA contém ainda os genes lukS-PV e lukF-PV, responsáveis pela codificação da toxina Panton-Valentine Leucocidina (PVL). Esta é capaz de destruir leucócitos humanos e produzir graves danos teciduais, estando relacionada com lesões necróticas e grave pneumonia necrotizante, em crianças ou adultos (LOPES, 2005). Em muitos centros urbanos, ao redor do mundo, as infecções causadas por CA-MRSA acontecem em grandes proporções e em muitas comunidades, correspondendo a mais de 50% das infecções (MAREE et al., 2007), e parecem ser um fenômeno emergente em todo mundo (VANDENESCH et al., 2003). O lócus PVL representa um marcador genético destas cepas de CA-MRSA, o que explica a frequência de infecções primarias de pele e ocasionalmente as pneumonias necrotizantes (NAIMI et al., 2001). Para Cookson (2000), o MRSA de origem comunitária é importante por várias razões. Dentre elas, auxiliar os clínicos gerais com dados relevantes de vigilância que auxiliem no tratamento e prevenção de infecções em seus pacientes. Segundo o autor, estes dados são importantes para a implantação de ―eventos sentinela‖, que podem ser definidos, segundo Rutstein e colaboradores (1983), como a detecção de doença previsível, incapacidade, ou morte inesperada, cuja ocorrência serve como um sinal de alerta de que a qualidade da terapêutica ou prevenção deve ser questionada, como observado recentemente nos Estados Unidos, motivada pela morte de quatro crianças por infecções causadas por CA-MRSA (CDC, 1999). Assim, toda vez que se detecta evento desta natureza, o sistema de vigilância deve ser acionado, para que as medidas indicadas possam ser rapidamente instituídas (BRASIL, 2009a). Gelatti e colaboradores (2009) relatam que a escassez de estudos de prevalência é um fator limitante do conhecimento da epidemiologia local relacionada ao CA-MRSA. Pacientes ambulatoriais nos quais seja isolado MRSA apresentando susceptibilidade a vários antimicrobianos, devem ser considerados para o diagnóstico de uma possível infecção por CA-MRSA. Para facilitar o rastreamento dessas cepas podem ser feitas análises laboratoriais como cultivo celular de pele e 35 tecidos moles em pacientes atendidos em atendimento primário como em unidades de emergência. 1.7 Staphylococcus aureus RESISTENTE À METICILINA EM ANIMAIS A ocorrência de MRSA em animais foi primeiramente relatada em 1972, quando a linhagem foi isolada de leite de vacas com mastite na Bélgica (DEVRIESE; HOMES, 1975). Desde então, vários outros estudos relataram a presença de MRSA em diversas espécies de animais domésticos e animais silvestres, como cães e gatos caprinos, ovinos, equinos, frangos, focas, psitacídeos, tartarugas e outros (WALTHER et al., 2008; GARDNER, 2010; ALZOHAIRY, 2011; WALTHER, 2012). A descoberta de que os animais podem ser colonizados por cepas de MRSA levou à constatação de um potencial zoonótico importante (ALZOHAIRY, 2011), embora se sugira que seja mais provável que o MRSA seja transmitido do homem para os animais (SELEHA; ZUNITA, 2010). O surgimento de cepas associadas a animais (LIVESTOCK-ASSOCIATED MRSA – LA-MRSA) como a ST398 vem confirmar que o MRSA representa um fenômeno emergente continuamente conduzido por interações multifatoriais entre a clássica tríade, hospedeiro, ambiente e patógeno (MEDIAVILLA et al., 2012). Tratadores e também seus familiares envolvidos com manejo de suínos e em menor escala com manejo de bovinos, têm uma grande probabilidade de serem colonizados por MRSA. Na Holanda, estima-se que 23% dos tratadores de suínos tenham MRSA colonizados em suas narinas. A incidência destes patógenos nos tratadores de suínos neste País é 760 vezes maior que em uma população normal. Rotineiramente, os tratadores são avaliados quanto à presença de MRSA nos hospitais da Holanda (MORGAN, 2008). Van Duijkeren e colaboradores (2007) relatam que em um surto de epidermite exudativa em suínos holandeses (uma doença causada normalmente por Staphylococcus hyicus), os animais foram tratados com antimicrobianos como a 36 cefalosporina, mas o tratamento não apresentou resultado, isso porque o agente etiológico era uma cepa ST398 de MRSA. 1.8 USO DE ANTIMICROBIANOS COMO PROMOTORES DE CRESCIMENTO Existem várias hipóteses que tentam explicar o efeito estimulador do crescimento que esses medicamentos exercem sobre os animais (HAESE; SILVA, 2004). No entanto, o mecanismo de ação dos promotores de crescimento ainda não está completamente elucidado; sabe-se apenas que sua atuação ocorre sobre a microbiota intestinal dos animais (FARIA et al., 2009). Os antimicrobianos usados como promotores de crescimento são utilizados em doses subterapêuticas para aumento da eficiência alimentar e das taxas de crescimento em animais de diferentes espécies, e tem como modo de ação mais aceito o controle de infecções subclínicas. A exposição contínua a ambiente hostil propicia o desenvolvimento de microrganismos que causam doenças subclínicas. Ao fornecer antimicrobianos, ocorre redução da população de microrganismos patogênicos, propiciando ao animal expressar o máximo do seu potencial genético (HAESE; SILVA, 2004; RUTZ; LIMA, 2013). Se a população microbiana pode ser mais bem controlada, é possível que a energia perdida seja empenhada no crescimento (JENSEN, 1998). Importante ressaltar que o mecanismo de ação deve ser focado no intestino, isso porque muito desses antimicrobianos não são absorvidos, fato comprovado em estudo realizado com animais livres de patógenos (DIBNER; RICHARDS, 2005). Quando se fala de contaminação por antimicrobianos devem-se considerar dois pontos chave: os possíveis efeitos de contato de resíduos dessa droga com a microbiota do trato gastrintestinal humano (colonização) e o aparecimento de cepas de bactérias resistentes aos antimicrobianos em alimentos derivados de animais tratados com o mesmo (contaminação) (HAESE; SILVA, 2004). Suspeitas sobre a segurança da utilização dos antimicrobianos na forma de promotor de crescimento existem desde o seu descobrimento. A principal dúvida está em saber se o uso de antimicrobianos nas dietas dos animais contribui para a 37 resistência de bactérias entéricas, capazes de transferir a sua resistência para bactérias patogênicas, como os S. aureus, causando assim, riscos do ponto de vista da saúde pública (RUTZ; LIMA, 2013). De acordo com Smith (1974), é possível que os resíduos de antimicrobianos em produtos animais possam ser veiculados a pessoas que os consumam, produzindo efeitos de toxicidade ou reações alérgicas em indivíduos previamente sensibilizados, além de favorecer o aparecimento de bactérias resistentes. Bactérias comensais constituem um potencial reservatório de genes de resistência para bactérias patogênicas. Seu nível de resistência é considerado um bom indicador da pressão de seleção pelo uso de antimicrobianos e para possíveis problemas de resistência em patógenos. As bactérias comensais podem contaminar produtos alimentares de origem animal como o leite e carne e assim alcançar o trato intestinal humano. O monitoramento da prevalência de resistência em bactérias indicadoras, como Escherichia coli e enterococos, em diferentes populações, como animais, pacientes e pessoas saudáveis, torna possível comparar a prevalência de resistência, bem como detectar a transferência de bactérias resistentes, ou genes de resistência dos animais aos humanos, e vice versa (VAN DEN BOGAARD; STOBBERINGH, 2000; HAESE; SILVA, 2004). No tocante à resistência bacteriana veiculada a partir de alimentos de origem animal, a resistência mais preocupante é a resistência denominada adquirida, pondo em destaque a espécies Enterococcus faecalis e Enterococcus faecium. Após adquirirem resistência aos antimicrobianos glicopeptídeos (enterococo resistente à vancomicina), os microrganismos ganharam importância na área médica, podendo assim provocar surtos de infecção hospitalar de difícil controle. Estudos preliminares mostraram que o emprego de avoparcina (antimicrobiano estruturalmente semelhante à vancomicina) pode selecionar essas bactérias em aves e suínos. Então, a grande preocupação é que essas bactérias, que ao longo do tempo estão sendo selecionadas pelo uso de antimicrobianos como promotor de crescimento, estão se tornando um contaminante, não somente pelo fato de sua resistência adquirida, mas também pelo seu potencial de transmitir tal característica às suas proles (HAESE; SILVA, 2004). Os principais antimicrobianos, utilizados em medicina veterinária, de interesse no que diz respeito à resistência, tem sido a penicilina e as tetraciclinas, uma vez 38 que também são utilizadas na medicina humana. Bactérias de resistência simples ou múltipla, que são patogênicas para humanos, podem ser transferidas de animais ou produtos animais para o homem. Além disso, plasmídios-R (fatores de transferência de resistência a drogas) podem ser transferidos da bactéria E. coli para patógenos humanos produzindo patógenos resistentes a antimicrobianos, como aconteceu com o S. aureus, por exemplo (RUTZ; LIMA, 2013). No Brasil, antimicrobianos de todas as classes estão disponíveis, com exceção de cloranfenicol, furazolidona e nitrofurazona. O uso destes três produtos é proibido em preparações farmacêuticas de uso veterinário, em rações e como aditivo alimentar para animais, cujos produtos sejam destinados à alimentação humana (BRITO, 2003). O decreto de lei sobre o uso de antimicrobianos no Brasil foi revogado no dia 22 de abril de 2004, estando em discussão as novas normas para o mesmo. Até então eram liberados pelo Ministério da Agricultura Pecuária e Abastecimento (MAPA), 17 antimicrobianos como promotores de crescimento (BRASIL, 2004c). Algumas nações, voluntariamente, resolveram controlar o uso de antimicrobianos como promotores de crescimento (DIBNER; RICHARDS, 2005). O primeiro país da União Européia a eliminar seu uso foi a Suécia em 1986 (AARESTRUP, 2003). Os Estados Unidos ainda estão em vigorosa discussão a respeito do uso de antimicrobianos como promotores de crescimento (DIBNER; RICHARDS, 2005). A OMS juntamente com o Órgão das Nações Unidas para Agricultura e Alimento (FAO) e a Organização Mundial para Saúde Animal (OIE) articularam em um encontro a discussão a respeito da não utilização de antimicrobianos de uso em humanos na pecuária e resistência microbiana. Como resultado, surgiu a recomendação à OMS de princípios globais para contenção de resistência antimicrobiana em animais destinados a alimentação e ainda a implementação a nível nacional de estudos de avaliação de risco e o estabelecimento de programas de vigilância no monitoramento do uso de antimicrobianos como promotores de crescimento e o surgimento de resistência antimicrobiana em bactérias oriundas de produtos de origem animal (WHO, 2004). No Brasil, entidades governamentais controlam o uso de antimicrobianos em alimentos de origem animal através do Plano Nacional de Controle de Resíduos e 39 Contaminantes (PNCRC) do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, e do Programa de Análise de Resíduos de Medicamentos Veterinários em Alimentos de Origem Animal (PAMvet) da ANVISA. O PNCRC e o PAMvet tem como um dos objetivos, garantir a qualidade e segurança de produtos de origem animal, através do controle da presença de resíduos de medicamentos veterinários e contaminantes nos limites máximos estabelecidos (BRASIL, 2003; BRASIL, 2009b). Um bom exemplo disso, é que no País, antimicrobianos betalactâmicos; benzilpenicilâmicos e cefalosporinas são de uso exclusivo em produto antimicrobiano de uso veterinário, sendo vedada sua utilização na pecuária como aditivos zootécnicos com a finalidade de melhorar o desempenho, ou como conservantes de alimentos para animais (BRASIL, 2009c). Magalhães (1998) defende a utilização dos antimicrobianos a partir da constatação de que, com exceção das penicilinas, cloranfenicol e estreptomicina, os demais antimicrobianos são termolábeis, sendo, portanto, destruídos pelo tratamento pelo calor, ou ainda pelo congelamento, e que seus metabolitos dificilmente produzirão efeitos negativos, embora sua toxicidade seja desconhecida. (HAESE; SILVA, 2004). Existem ainda muitas discussões a respeito do uso de antimicrobianos como promotores de crescimento. Enquanto alguns querem banir o seu uso, outros o defendem, justificando que se utilizados corretamente o seu nível de contaminação seria desprezível (HAESE; SILVA, 2004). 40 REFERÊNCIAS AARESTRUP, F. M. Effects of termination of AGP use on antimicrobial resistance in food animals. In: WORLD HEALTH ORGANIZATION. Working papers for the WHO international review panel’s evaluation: Document WHO/CDS/CPE/ZFK/2003. Geneva: World Health Organization, 2003. p. 6-11. AIRES DE SOUSA, M. et al. Intercontinental spread of a multidrug-resistant methicillin-resistant Staphylococcus aureus clone. Journal of Clinical Microbiology, Washington, v. 36, p. 2590-2596, 1998. ALZOHAIRY, M. A. Colonization and antibiotic susceptibility pattern of methicillin resistance Staphylococcus aureus (MRSA) among farm animals in Saudi Arabia. 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O presente estudo teve por objetivo investigar a presença de MRSA em produtos cárneos destinados ao preparo de dietas de hospitais públicos de Salvador-BA. Para tanto, foram colhidas 114 amostras de carnes cruas destinadas ao preparo das dietas, englobando as carnes bovina, frango, suína e peixe, em três repetições distintas, observando lotes diferentes, e 60 amostras de preparações prontas para o consumo à base de carne. Para o isolamento do microrganismo foram utilizados dois meios de enriquecimento seguidos de plaqueamento direto na superfície do meio MRSA-ID. Após a purificação das colônias características, as mesmas foram confirmadas utilizando o teste de aglutinação com o reativo Slidex MRSA. Das 114 amostras de carne crua investigadas, 28,07% foram positivas para MRSA. Considerando cada espécie animal, a porcentagem de amostras positivas foi: carne bovina, 23,3%; frango, 23,3%; carne suína, 37,5% e peixe, 30,0%. Com relação às preparações prontas à base de carne, 9,4% apresentaram resultados positivos para MRSA. Considerando cada tipo de carne, a porcentagem de amostras positivas foi: frango, 5,5%; suína, 6,4% e peixe, 26,7%. O microrganismo não foi isolado das preparações à base de carne bovina prontas para o consumo. Dados da literatura corroboram com este resultado, demonstrando a importância do controle de qualidade na seleção de fornecedores de produtos de origem animal, alertando sobre o uso de antimicrobianos na pecuária. A contaminação de dietas preparadas com carne nos hospitais públicos de Salvador-BA por MRSA é um dado preocupante, apontando para a necessidade de monitoramento e ações de correção pelas autoridades de saúde pública e Centros de Controles de Infecções hospitalares. Palavras chave: MRSA. Resistência antimicrobiana. Infecção hospitalar. Alimentos cárneos. 60 CHAPTER 2 INVESTIGATION OF METHICILLIN-RESISTANT Staphylococcus aureus IN RAW MEAT AND FISH AND MEAT PREPARATION IN PUBLIC HOSPITALS OF SALVADOR-BA ABSTRACT Staphylococcus aureus is a pathogen commonly associated with nosocomial infections. Recently it has been reported the isolation of Methicillin Resistant Staphylococcus aureus (MRSA) in various animals products. Meals prepared in hospitals should receive special attention, because it is destined for patients, a population at high risk for developing various diseases. The present study aimed to investigate the presence of MRSA in meat products destined to meals in public hospitals in Salvador-BA. We investigated 114 samples of raw meat used for the preparation of meals and 60 samples of meals ready to eat in 10 public hospitals, consisting of beef, chicken, pork and fish. For isolation of MRSA two enrichment steps were used, followed by direct plating on the surface of the medium MRSA-ID. Characteristics colony were confirmed using the agglutination test with reactive SLIDEX-MRSA. Out of 114 samples of raw meat investigated, 28.6% were positive for MRSA. Considering each animal product, the percentages of positive samples were: beef, 23.3%, chicken, 23.3%, pork, 37.5% and fish, 30,0%. In regard to foods ready to eat, 9.4% were positive for MRSA. Considering each animal product, the percentage of positive samples was: chicken, 5.5%, pork, 6.4% and fish, 26.7%. Beef was not contaminated by MRSA. Literature data corroborate with these results, demonstrating the importance of quality control in the selection of meat products suppliers, warning them against the indiscriminate use of antibiotics in animal health treatment. The contamination of meals prepared with meat in public hospitals of Salvador-BA for MRSA is concerning, and monitoring and corrections actions should be implemented by public health authorities and Hospital Infection Control Center. Keywords: MRSA. Antimicrobial resistance. Nosocomial infection. Meat product. 61 1 INTRODUÇÃO As dietas hospitalares têm um importante papel na recuperação e bem-estar do paciente, devendo ser indicada por nutricionista (SOUSA; GLÓRIA; CARDOSO, 2011). Essas dietas são elaboradas considerando-se o estado nutricional e fisiológico das pessoas, e em situações hospitalares, devem estar adequadas ao estado clínico das mesmas, além de proporcionar melhoria na sua qualidade de vida (ISOSAKI; CARDOSO; OLIVEIRA, 2009). Em atendimento a essas premissas, as dietas hospitalares garantem o aporte de nutrientes ao paciente internado e preserva seu estado nutricional, por ter um papel co-terapêutico em doenças crônicas e agudas (GARCIA, 2006) ou ainda, atuando como coadjuvante para retirada de um estado patológico (AUGUSTO, 2005). Por esta razão, estas refeições devem receber uma atenção especial, considerando também o risco de estarem contaminadas por microrganismos patogênicos. A principal fonte de alimentação utilizada pelo homem é a carne, rica em proteína de alto valor biológico (ROÇA, 2013). A carne caracteriza-se pela natureza das proteínas que a compõem, tanto do ponto de vista quantitativo como qualitativo, além de sua riqueza em aminoácidos essenciais, gordura, vitaminas, glicídios e sais minerais como elementos nutritivos complementares (PARDI, 1993). Essa riqueza nutricional aliado a elevada atividade de água fazem do alimento de origem animal, principalmente a carne, um excelente meio de cultura para a multiplicação microbiana, podendo a mesma estar envolvida na disseminação de microrganismos patogênicos causadores de enfermidades ao homem e a outros animais (GIL, 2000; PELCZAR JÚNIOR, CHAN; KRIEG,1997). Muitos animais produtores de alimentos abrigam em seu organismo diversos microrganismos conhecidos como saprófitos, ou seja, incapazes de causar-lhes enfermidades. No entanto, muitos desses microrganismos podem apresentar-se com um importante grau de patogenicidade quando transmitidos aos seres humanos. A alimentação fornecida a esses animais e o uso indevido de produtos veterinários pode contribuir para a contaminação de alimentos de origem animal, como carne, leite e ovos, assim como também não é raro que essa contaminação ocorra durante 62 suas etapas de processamento (PEREIRA, 1995; MESQUITA; DANIEL; SACCOL, 2006). Dentre os microrganismos patogênicos, destacam-se os estafilococos coagulase positiva, patógenos comumente relacionados a surtos de intoxicações alimentares (JAY, 2005) especialmente o Staphylococcus aureus, uma causa importante destas contaminações comumente associado a doenças hospitalares, e por este motivo considerado um problema de saúde pública (PEREIRA et al., 2009). Embora se tenha conhecimento de que a maioria dos animais é infectada por S. aureus, apenas recentemente linhagens MRSA foram isoladas de alimentos de origem animal, incluindo carne de suíno, bovino, frango e outros animais (FREITAS et al., 2004; RAPINI et al., 2004; MOURA et al., 2006; HUIJSDENS et al., 2006; NORMANNO et al., 2007; VAN LOO et al., 2007; BOER et al., 2009). Através da ingestão de alimentos contaminados, a resistência a antimicrobianos pode ser transmitida ao homem e, além disso, existe a possibilidade de transferência genética no trato gastrintestinal de genes que conferem a resistência antimicrobiana a outras bactérias (WITTE, 2000) da própria espécie ou de espécies não relacionadas (COSTA; LOUREIRO; MATOS, 2013). Com base na importância da carne nas dietas dos pacientes e na frequência de isolamento de cepas de microrganismos multiresistentes, como MRSA e seu envolvimento nos quadros de infecções hospitalares, é importante destacar a necessidade da adoção de medidas de controle destas infecções. Ainda, é importante considerar a hipótese de que os alimentos cárneos oferecidos como parte das dietas nestas instituições podem representar uma fonte de contaminação por MRSA e contribuir para a disseminação do patógeno na comunidade. Os objetivos deste estudo foram investigar a presença de Staphylococcus aureus resistente à meticilina em alimentos cárneos crus destinados ao preparo de dietas e em alimentos cárneos prontos para o consumo em hospitais públicos de SalvadorBA, e investigar a associação entre as frequências de isolados nos diferentes tipos de carne. 63 2 MATERIAL E MÉTODOS 2.1 AMOSTRAGEM Para a realização do presente estudo foi colhido, durante os meses de julho de 2011 a outubro de 2012, um total de 114 amostras de carne crua destinados ao preparo de dietas e 60 preparações prontas para o consumo a base de carne em 10 hospitais públicos de Salvador, sob a administração direta ou indireta da Secretaria Estadual da Saúde do município de Salvador-BA (SESAB). Esses hospitais foram escolhidos em estudo prévio envolvendo manipuladores de alimentos, considerando a aceitação dos mesmos em participar da pesquisa. Essa amostragem atingiu 70% dos hospitais, considerando-se que dos 14 hospitais públicos de Salvador-Ba, 10 participaram do estudo. Durante a aquisição das amostras, as especificações de cada uma delas foram devidamente registradas em formulários específicos (ANEXO A). 2.2 DESENHO DO ESTUDO Trata-se de um estudo de corte transversal de caráter exploratório e experimental. Inicialmente foi realizado o contato com o Serviço de Nutrição de cada unidade hospitalar, com o objetivo de apresentar a proposta do estudo e sua metodologia. Solicitou-se ao Responsável Técnico do Serviço de Nutrição a elaboração de um parecer ―a favor ou não‖ do estudo e o encaminhamento do mesmo com cópia do projeto para a aprovação pela direção do hospital. Em alguns hospitais a análise do projeto foi realizada pela Diretoria de Ensino e Pesquisa. 64 2.3 INVESTIGAÇÃO DA PRESENÇA DE Staphylococcus aureus RESISTENTE À METICILINA EM ALIMENTOS CÁRNEOS CRUS DESTINADOS A DIETAS E EM PREPARAÇÕES A BASE DE CARNE PRONTAS PARA O CONSUMO EM HOSPITAIS PÚBLICOS DE SALVADOR-BA Cepa de referência: Staphylococcus aureus ATCC 29213; Staphylococcus aureus ATCC 43300; Staphylococcus aureus resistente à Meticilina (MRSA) ATCC33591. Meios de cultura: Os seguintes meios de cultura foram utilizados: caldo Mueller– Hinton com 6,5% de cloreto de sódio (MHB+6,5% NaCl), ágar MRSA ID (bioMérieux), caldo vermelho de fenol manitol contendo cefoxitina (5 μg/ml) e aztreonam (PHMB) (75µg/ml) e ágar Tríptico de Soja (TSA). Amostras: Amostras de alimentos crus: Foram colhidas 03 (três) amostras de cada alimento cárneo cru, de diferentes lotes, (carne bovina, carne suína, carne de frango e carne de peixe), em diferentes ocasiões, em cada hospital a ser investigado, totalizando 114 amostras (hospitais B e C não utilizavam carne de suíno em seus cardápios). Os lotes dos alimentos foram adotados como controle de cada amostra. Amostras de preparações prontas para o consumo: A partir dos resultados encontrados na investigação das amostras de carnes cruas, foram definidos os alimentos prontos para o consumo que seriam investigados, ou seja, preparações a base daquela carne que apresentassem positividade para a presença de MRSA, de acordo com cada hospital. Dessa forma, foram colhidas 03 (três) amostras de diferentes preparações a base da carne crua previamente confirmada como contaminada, não importando se apenas uma ou mais das três repetições de carne crua investigadas apresentassem resultado positivo, totalizando 60 amostras. Estas foram colhidas em dias diferentes de acordo com o cardápio da Unidade de Nutrição de cada hospital. 65 Foram colhidos os seguintes tipos de pratos prontos para consumo: Carne bovina: isca de carne bovina; ensopado de carne; carne assada; bife de panela; bife a rolê; bife a milanesa; picadinho de carne com legumes. Frango: frango assado; frango ensopado; frango grelhado; frango a Cubana; serrinha de frango; estrogonofe, frango embalado, frango espeto. Suíno: pernil ao molho de hortelã; pernil ao molho agridoce; bisteca grelhada; pernil suíno ao molho; pernil suíno assado, carré grelhado com limão, pernil assado desfiado, pernil ao vinagrete, pernil ao vinho. Peixe: peixe ensopado; escabeche de peixe; filé de merluza grelhado; filé de peixe ao molho; peixe a Gomes de Sá; isca de frango; mexidinho de peixe; peixe ao Bráz, filé de peixe ao molho, mexidinho de peixe, mexidinho de peixe sem sal. Colheita e transporte das amostras: Porções de aproximadamente 250g da amostra foram colhidas diretamente das embalagens contendo os cortes de carne resfriadas ou congeladas, sem nenhuma manipulação. Foi observada a integridade física das mesmas, quanto a rasgos ou perfurações, bem como o lote, data de fabricação e prazo de validade descrito no rótulo dos produtos. Para tanto, utilizou-se utensílio previamente esterilizado e as mesmas foram acondicionadas em saco plástico estéril de uso único. Já as preparações prontas para o consumo foram colhidas com auxilio do próprio utensílio utilizado para distribuição destas dietas, após o fechamento do último recipiente destinado aos pacientes. Em seguida, as amostras foram acondicionadas em recipientes isotérmicos com gelo reciclável e encaminhadas imediatamente ao Laboratório de Controle de Qualidade de Alimentos (LACQ), vinculado à Escola de Nutrição da Universidade Federal da Bahia (UFBA), onde foram processadas, conforme descrito a seguir. Detecção do microrganismo: Aproximadamente 25 g do alimento foram pesados em cabine de fluxo laminar ( Labconco modelo 36210 classe BII; Labconco, Kansas City, MO, USA) e homogeneizado em 225 mL de caldo de enriquecimento MHB + 6,5% de NaCl em homogeneizador de amostras do tipo stomacher por 2 minutos (ITR modelo 1204, série 126, Esteio, RS, Brasil, 240bpm). A suspensão obtida foi incubada a 37 °C por 16 a 20 horas. Alíquota de 1 mL do caldo de MHB + 6,5% de NaCl foi adicionada a 9 mL de PHMB seguido de incubação por 16-20h a 37 °C. Da 66 cultura obtida em PHMB, uma alçada (aproximadamente 10 µl) foi transferida para a superfície do meio MRSA-ID. As placas foram incubadas a 37 °C por 24-48 horas. Para confirmação, um número máximo de cinco colônias típicas por placa foi subcultivado em TSA. Colônias típicas foram testadas com ―Slidex MRSA (Detection bioMérieux), um rápido e sensitivo teste látex de aglutinação para detecção da resistência à meticilina em Staphylococcus aureus baseado na produção de proteína de baixa afinidade, PBP2a, que é codificada pelo gene mecA (Figura 1) (adaptado de BOER et al., 2009). Figura 1: Esquema representativo da metodologia aplicada na investigação de MRSA. 2.4 ANÁLISE DOS DADOS Os dados obtidos foram tabulados e analisados através de análise descritiva e testes de associação qui-quadrado de Pearson (X2), considerando-se um nível de confiança de 0,95 (SPSS 17.0 for Windows). 67 3 RESULTADOS E DISCUSSÃO O método aplicado para investigação da frequência de MRSA nas amostras de carne foi qualitativo, ou seja, objetivando-se a presença ou ausência do microrganismo em 25 g da amostra. O uso do caldo Mueller Hinton contendo NaCl é recomendado em testes que visam determinar a susceptibilidade de cepas de Staphylococcus a β-lactâmicos semi-sintéticos como a meticilina, e tem efeito inibitório no crescimento de outras bactérias, exceto as do gênero Staphylococcus (CAMPOS et al., 1986), que toleram altas concentrações de NaCl (FRAZIER; WESHOFF, 2000). Logo, a adição de 6,5% do sal, favorece o crescimento deste microrganismo em comparação com outros acompanhantes. Como enriquecimento secundário foi utilizado o caldo manitol vermelho de fenol suplementado com os antimicrobianos cefoxitina e aztreonam (PHMB+). A viragem do meio para amarelo indica reação positiva, podendo ser dado seguimento a metodologia. O meio PHMB + é considerado um eficiente e sensível teste para detecção de cepas de MRSA, inclusive de amostras clínicas (WERTHEIM et al., 2001). O meio MRSA-ID possui um substrato cromogênico catalisado pela α-glucosidase e cefoxitina, como agentes seletivos (BOER et al., 2009). Das 114 amostras de carne crua investigadas, 108 apresentaram reação positiva no caldo manitol vermelho de fenol e destas, 100 apresentaram colônias verdes azuladas características de MRSA no meio cromogênico (figuras 2 e 3). Figura 2: Foto representativa de tubo + de PHMB positivo (Arquivo pessoal). Figura 3: Foto representativa de colônias de MRSA em ágar cromogênico (Arquivo pessoal). 68 De cada amostra processada foram coletadas um máximo de cinco colônias verdes azuladas, características de MRSA, e cada uma dessas colônias foram subcultivadas em ágar TSA, e posteriormente submetidas ao teste Slidex MRSA. As cepas que apresentaram aglutinação foram confirmadas como MRSA positivas (Figura 4). Figura 4: Foto representativa de teste Slidex positivo para MRSA (Arquivo pessoal). Um total de 451 isolados foi obtido a partir das 114 amostras de carne crua colhidas nos hospitais do presente estudo. Destes, 98 (21,7%) foram identificados como positivos para MRSA. Com base nos resultados obtidos nessa primeira investigação posteriormente foram colhidas amostras de preparações à base de carne prontas para o consumo que eram destinadas aos pacientes dos hospitais. De um total de 60 preparações investigadas, foram obtidos 92 isolados com 13 desses positivos para MRSA (Tabela 1). Tabela 1: Frequência de isolamento de MRSA em amostras de carne crua e de preparações prontas para o consumo a base de carne, provenientes de 10 hospitais públicos de Salvador-BA Tipo de produto Carne crua Preparações Carne bovina Carne de frango Carne suína Peixe Total Isolados n MRSA n (%) Isolados n MRSA n (%) 101 116 96 138 451 16 (15,8) 22 (18,7) 26 (27,1) 34 (24,6) 98 (21,7) 15 10 34 33 92 0 (0) 3 (30) 2 (5,9) 8 (24,2) 13 (14,1) 69 Os 98 isolados confirmados são representativos de 32 (28,07%) amostras de carne crua. As amostras de carne suína dos Hospitais B e C não foram colhidas, devido ao fato destes hospitais não oferecerem a carne suína em seus cardápios. Ainda na Tabela 1, é possível verificar o percentual de isolados de MRSA em preparações à base de carne, os 13 isolados são representativos de seis (10%) das amostras. Tabela 2: Isolamento de MRSA de amostras de alimentos cárneos crus em cozinhas de hospitais públicos de Salvador – BA. Hospital A B C D E F G H I J TOTAL/M RSA + (+) Positivo Espécie animal Frango Suína Bovina (-) (-) (+) (-) (+) (-) (-) (-) (-) (-) 30/ 7 (-) (-) (+) (-) (-) (-) (-) (-) (-) (-) (-) (+) (+) (+) (-) (-) (-) (+) (-) (-) (-) Negativo (-) (-) (-) (-) (+) (-) (-) (+) (-) (+) 30/ 7 (-) (-) (-) (-) (-) (-) (-) (-) (+) (-) (-) (+) (-) (-) (+) (-) (-) (-) (-) (+) (-) NA NA (-) (+) (+) (-) (-) (-) (+) 24/ 9 (-) NA NA (+) (-) (+) (-) (-) (+) (-) Pescado (-) NA NA (+) (+) (+) (-) (-) (-) (-) (-) (-) (-) (-) (-) (-) (+) (+) (+) (-) 30/ 9 (+) (-) (-) (-) (-) (+) (-) (-) (+) (+) (+) (-) (-) (-) (-) (-) (-) (-) (+) (-) TOTAL/ MRSA + 12/2 9/2 9/3 12/3 12/5 12/4 12/1 12/3 12/5 12/4 114/ 32 (NA) Não Aplicável Verifica-se na Tabela 2 que todos os hospitais apresentaram alimentos crus contaminados com MRSA, em pelo menos um tipo de carne. A menor frequência foi encontrada no Hospital G, que apresentou apenas uma (8,3%) amostra de peixe contaminada pelo microrganismo e as maiores frequências foram encontradas nos hospitais E e I com 5 (41,7%) amostras positivas em cada um deles (Tabela 2). Considerando cada carne separadamente, os percentuais de amostras positivas para MRSA em carne bovina, carne de frango, carne suína e carne de peixe foram de 23,3% (7/30), 23,3% (7/30), 37,5% (9/24) e 30,0% (9/30) respectivamente (Tabela 3). Da análise da Figura 5, pode-se observar que a carne suína e a de peixe foram as que apresentaram uma frequência maior de contaminação por MRSA, sendo que as carne bovina e frango apresentaram frequências de contaminação iguais. Número de amostras 70 Figura 5: Distribuição da presença de Staphylococcus aureus resistente à meticilina (MRSA) em relação ao tipo de produto cárneo cru. A Tabela 3 demonstra o percentual da presença de MRSA em relação ao tipo de produto cárneo e a existência de associação entre as duas variáveis. Verifica-se que o alimento à base de carne suína foi o que apresentou a maior frequência de isolamento de MRSA. Entretanto, pela análise estatística, verifica-se também que a presença de MRSA não está associada ao tipo de produto cárneo (P>0,05), não rejeitando a hipótese nula de que não existe associação entre presença de MRSA e o tipo de produto cárneo cru. Tabela 3: Análise bivariada entre a presença de Staphylococcus aureus resistente à meticilina e o tipo de alimento cárneo cru. Presença de MRSA Tipo de produto Negativo Positivo P-valor1 n (%) n (%) Carne Bovina 23 (76,7) 7 (23,3) 0.619 Frango 23 (76,7) 7 (23,3) Peixe 21 (70,0) 9 (30,0) Suíno 15 (62,5) 9 (37,5) 1 2 Valor de p do teste Qui-quadrado de associação (χ ). Estes resultados corroboram com Boer e colaboradores (2009), que também não encontraram correlação entre as diferentes carnes cruas de diferentes espécies analisadas na Holanda. Neste mesmo estudo foi encontrada menor frequência de amostras positivas em carnes cruas de frango, mais uma vez concordando o presente estudo. 71 Com objetivo de testar a hipótese de existência de associação entre o tipo de produto cárneo e a presença de MRSA foi ajustado um modelo logístico simples contendo como variável resposta à presença do patógeno e como variável independente o tipo de produto cárneo. Avaliando a magnitude da associação foi observado que, no caso em questão, a chance da carne de peixe apresentar MRSA é 1,40 vezes maior que a da carne bovina ou frango, enquanto que para a carne suína apresentar essa chance é 1,97 vezes maior que a da carne bovina ou frango (Tabela 4). Tabela 4: Modelo logístico (Odds ratio) da presença de Staphylococcus aureus resistente à meticilina em relação ao tipo de alimento cárneo cru. Presença de MRSA Tipo de produto OR (IC) [Positivo] Carne Bovina 1 Frango 1,01 (0,30; 3,31) Peixe 1,40 (0,45; 4,45) Suíno 1,97 (0,60; 6,43) Em estudo realizado pela Voedsel en Waren Autoiteit (VWA) na Holanda, a análise de alimentos cárneos crus para presença de MRSA indicou que das 1300 amostras investigadas, 31% das carnes de peru, 27% das carnes de frango, 17% de vitela, 10% de carnes suínas e de bovinas e 6% de cordeiro estavam contaminadas com o microrganismo. A maioria das cepas isoladas foi do tipo ‖não tipificada‖. Quando tal fato acontece preconiza-se que as cepas pertencem ao grupo ST398, considerada de origem animal (VWA, 2008). Similarmente ao estudo de Febler e colaboradores (2011), no presente estudo foi encontrado um percentual elevado de amostras de frango contaminadas com MRSA. Esses autores ao investigarem a contaminação por MRSA em 86 amostras de carne de frango e de peru cruas na Alemanha detectaram um percentual de 37,2%, 25% em carne de frango e 50% em carne de peru. Na Dinamarca, Agerso e colaboradores (2012) investigaram 865 amostras de carnes suína, bovina e de frango, incluindo carnes produzidas no próprio país e importadas de outros países e demonstraram que o maior percentual foi encontrado nas carnes importadas, com destaque para carne de frango com 18%. Resultado semelhante foi encontrado por Boer e colaboradores (2009), ou seja, 16% das amostras de frango cruas estavam contaminadas por MRSA. 72 Em conclusão os resultados das referidas pesquisas corroboram com os dados da presente pesquisa que também detectou um alto percentual de MRSA em carne de frango (23,3%). Em estudo realizado por Freitas e colaboradores (2004), foi verificada a resistência antimicrobiana de 90 cepas de Staphylococcus spp., isoladas de carcaças de frango in natura e resfriadas, comercializadas no Recife-PE. Os autores identificaram 51 cepas como S. aureus e 39 como Staphylococcus coagulase negativa, e observaram um percentual de 37,8% de resistência das mesmas à oxacilina. Os resultados observados nesta pesquisa estão de acordo com os do presente estudo onde 22 dos 116 isolados (18,7%) foram identificados como cepas resistentes à oxacilina ou MRSA (Tabela 1). Embora a maioria dos trabalhos relate percentuais menores de MRSA em carnes suínas, (VAN LOO et al., 2007; BOER et al., 2009; WEESE; AVERY; REIDSMITH, 2010; BHARGAVA et al., 2011; WATERS et al., 2011; HANSON et al., 2011; AGERSO et al., 2012) e nos outros tipos de carne: frango(LEE, 2006; KITAI et al., 2005; WEESE; AVERY; REID-SMITH, 2010), bovina, (VAN LOO et al., 2007; BOER et al, 2009; BHARGAVA et al., 2011; WATERS et al., 2011; AGERSO et al., 2012), sabe-se que muitos animais podem ser colonizados por S. aureus veiculando-os aos alimentos (WALTHER et al., 2008; GARDNER, 2010; ALZOHAIRY, 2011; WALTHER, 2012), e o estudo de Crago e colaboradores (2012) comprova que estes patógenos podem ser transmitidos aos humanos através dos alimentos. Uma alta prevalência de MRSA em suínos foi encontrada na Holanda, a partir de uma investigação com 540 suínos destinados ao abate em nove diferentes matadouros. Destes, 209 (39%) foram detectados como colonizadores de MRSA. As amostras foram colhidas logo após o atordoamento, onde nenhuma outra etapa do abate, que poderia ter potencial de contaminação, como esfola e lavagem de carcaças, havia sido executada (DE NEELING et al., 2007). Pesquisa semelhante foi conduzida por Agerso e colaboradores (2012) investigando amostras de suabes nasais de suínos destinados ao abate em várias fases de produção. Os autores encontraram uma frequência de até 20,9% de MRSA nos animais. Uma possível fonte do gene mecA para esses patógenos são os Staphylococcus coagulase negativa, justamente por estes fazerem parte da microbiota dos suínos, podendo 73 transferir os genes de resistência ao Staphylococcus aureus susceptível à meticilina (DE NEELING et al., 2007). Persoons e colaboradores (2009), analisando um total de 125 frangos representados por 75 frangos de corte e 50 de postura, em 14 fazendas na Bélgica, encontraram animais colonizando a bactéria em 10,7% dos frangos de corte; em uma das fazendas 100% dos animais colonizavam a bactéria. Ainda se observou que nenhuma ave de postura colonizava MRSA, possivelmente por conta do limitado uso de antimicrobianos em aves deste sistema de criação em comparação com frangos de corte. Dada a importância do S. aureus como um dos causadores de mastite em bovinos e o uso disseminado de antimicrobianos intramamário, não é surpresa que maioria dos isolados de MRSA em bovinos esteja relacionado com o leite, principalmente os isolados de vacas com a inflamação glandular (ARAÚJO, 1998; LEONARD; MARKEY, 2008; ZAFALON et al., 2008; SASIDHARAN; PREMA; YOGA LATHA, 2011). Na Coréia, por exemplo, em fazendas leiteiras que passaram por problemas de mastite em seus rebanhos observa-se o uso de antimicrobianos, incluindo os membros da família das penicilinas, como ampicilina e penicilinas Esses antimicrobianos são largamente usados no tratamento de vacas secas (fora da fase de lactação), embora os semi-sintéticos como a oxacilina não sejam usados em produção animal. Essa terapêutica pode contribuir para o aumento da incidência de MRSA em vacas (LEE, 2006). O uso de antimicrobianos como promotor de crescimento é feito na grande maioria dos casos empregando-se doses menores, por longo período de tempo e pela via oral; estas três condições são frequentemente tidas como favoráveis ao aparecimento de resistência em bactérias patogênicas, e têm maior possibilidade de gerar resíduos nos tecidos e produtos derivados dos animais tratados. (LIPSITCH; SINGER; LEVIN, 2002). Assim, esses tratamentos, pelos riscos que poderiam causar ao consumidor dos produtos derivados dos animais tratados e por outros que poderiam ocasionar ao meio ambiente, têm sido muito discutidos, questionados e criticados nos dias atuais por autoridades de defesa do consumidor no Brasil e em outros países (PALERMO-NETO et al., 2011). Considerando que, os beta-lactâmicos são antimicrobianos muito utilizados no tratamento de enfermidades animais, é de se esperar que haja uma grande pressão 74 seletiva sobre os microrganismos. Como no presente estudo as cepas foram isoladas de produtos de origem animal, talvez isso possa explicar o elevado percentual de MRSA (BRADFORD, 2001). Verifica-se também dificuldades em se obter informações precisas a respeito do uso de agentes antimicrobianos como medicamentos ou como promotores de crescimento. Números exatos são raros e estimativas estão disponíveis em apenas alguns paises (AARESTRUP, 2005). Segundo Andreotti e Nicodemo (2004), em bovinos de corte criados em sistema extensivo, o uso de antimicrobianos em bezerros, no tratamento de diarréias e pneumonias, ou mesmo em animais que apresentam febre ou lesões específicas é realizado com baixo nível de controle e/ou monitoramento. Para Palermo-Neto e colaboradores (2011) a antibioticoterapia utilizada no tratamento de doenças, como medidas profiláticas e metafiláticas, ou na promoção do crescimento, contribui para o sucesso da suinocultura aliado ao melhoramento animal, sanidade, manejo e nutrição animal. Segundo o autor, o emprego dos antimicrobianos vem contribuindo de maneira decisiva para o impressionante aumento de produtividade dos plantéis suinícolas brasileiros. Lipsitch, Singer e Levin (2002) afirmam que ao ingerir carne contaminada o indivíduo pode ser infectado por bactérias que sejam patogênicas e resistentes a uma ou mais drogas que, por ventura, pudessem ser usadas no seu combate. Um bom exemplo disso é a gastrenterite causada por Campylobacter jejuni resistente à fluoroquinolona. Dentre suas indicações, esta droga pode ser usada no tratamento de infecções pelo Campylobacter spp. em frangos. Segundo os autores, isso levou ao surgimento de cepas resistentes a droga na carne crua. Por esta razão, o consumo de carne de frango passou a ser fator de risco para aquisição de infecções pelo patógeno em alguns países. De acordo com Salyers, Gupta e Wang (2004), bactérias do trato intestinal de humanos não só compartilham genes de resistência entre si, como também podem adquirir e/ou doar genes de resistência para bactérias que estejam apenas de passagem pelo intestino. Assim, se um alimento não é eficientemente cozido, uma bactéria resistente a antimicrobiano ganha o trato intestinal e tem a oportunidade de interagir com bactérias comensais (SULLIVAN; EDLUND; NORD, 2001). Como o S. aureus é encontrado normalmente na cavidade nasal e até mesmo na garganta de humanos pode facilmente chegar ao intestino. Aliado a isso, estudos relatam que 75 este patógeno pode além de transitar, colonizar o cólon de humanos temporariamente, especialmente em pacientes hospitalizados (SALYERS; GUPTA E WANG, 2004). Norton (2000) atribui a polêmica sobre a utilização de antimicrobianos como promotores de crescimento à propagação de publicações sem evidência científica e a resumos utilizados por alguns cientistas como evidências seguras de que o uso destes agentes na produção animal é a principal causa do surgimento de resistência microbiana em humanos. Um experimento evidenciando a transmissão de resistência entre bactérias em humanos poderia determinar se realmente os genes carreados por determinadas bactérias poderiam ser transmitidos a outras. No entanto, essa abordagem não pode ser alcançada por duas razões óbvias. Primeiro em muitos países um experimento como este envolveria questões éticas e segundo, poderia ser proibitivamente caro (MOUBARECK et al., 2003). No Brasil, a resistência à penicilina varia de 20% a 100%, mas a porcentagem de resistência aos outros antimicrobianos é mais baixa (ANDREOTTI; NICODEMO, 2004). Por ser um dos agentes mais frequentemente isolados, S. aureus tem sido objeto de numerosos estudos de resistência a antimicrobianos nos últimos 20 anos. Estudos de larga escala, realizados em diversos países, mostram que a resistência à penicilina está em torno de 60%. A avaliação da suscetibilidade de S. aureus de 11 países mostrou que a prevalência de amostras resistentes a diversos antibacterianos, usados rotineiramente para tratamento da mastite, foi, em geral, baixa, independente do país de origem (ERSKINE et al., 2002). Lozano e colaboradores (2009), ao analisarem 318 amostras de carnes de animais de produção e animais silvestres, encontraram 5 amostras positivas quanto à presença de MRSA, quatro em animais de açougue e uma em animal silvestre. No trabalho realizado por Boer e colaboradores (2009), a porcentagem de MRSA em carne de animais criados sem confinamento, foi menor que a porcentagem encontrada em animais criados em sistemas de produção confinados, como perus, frangos e vitelos. Ambos os trabalhos sugerem uma suposta associação entre o uso de antimicrobianos e a ocorrência de MRSA. 76 Infelizmente, no presente estudo não foi possível investigar a associação entre a utilização de antimicrobianos na produção animal e a presença de MRSA nos alimentos investigados, pois nenhum dos fabricantes/produtores aceitou participar da referida etapa, o que limitou a compreensão de um fator importante da disseminação do patógeno na cadeia alimentar. No entanto, baseado nos dados contidos nos rótulos das amostras foi possível construir um mapa da localização delimitando a região de origem das carnes analisadas (Figura 6). Figura 6: Mapa de localização dos produtores de carnes cruas investigadas. É importante considerar que embora as amostras de carne crua tenham sido colhidas de forma asséptica e diretamente da embalagem original, sabe-se que as carcaças dos animais que deram origem a essas carnes poderiam estar contaminadas por microrganismos do próprio animal (pele, pêlos, patas, conteúdo gastrintestinal), do ambiente de produção (água de lavagem das carcaças, equipamentos e ar) ou de manipuladores portadores assintomáticos (cavidades nasais, mãos, e roupas) (BHALLA; ARON; DONSKEY, 2007; ROÇA, 2008; BOER et al., 2009). 77 Fazem parte desta microbiota as bactérias das famílias Enterobacteriaceae, Bacillaceae e Staphylococcaceae. Muitas dessas espécies são específicas, ou seja, elas são isoladas apenas de carnes, matadouro ou de instalações e equipamentos necessários para o processamento. Então, é de se esperar que bactérias potencialmente patogênicas possam estar presentes na carne, mesmo que sejam aplicadas as boas práticas de produção seguidas das condições higiênico-sanitárias satisfatórias durante o abate e a evisceração dos animais. Entretanto, o crescimento dessas bactérias pode ser inibido pelas condições de estocagem e, sobretudo, pela redução da temperatura (SARANTÓPOULOS, SOLER, 1983; GIL, 2000). É necessário o conhecimento das prováveis fontes de contaminação e dos diferentes meios de difusão para o controle do crescimento de microrganismos patogênicos (RIEDEL, 1992; FRANCO; LANDGRAF, 2008). Nesse contexto, verificase que na massa muscular profunda dos animais abatidos o número de microrganismos é muito reduzido podendo variar de 0,1 a 100 por grama. No entanto, pode ocorrer a contaminação tissular profunda a partir de três formas: a) invasão ante-mortem, que geralmente ocorre através de lesões no animal, principalmente em nível de mucosas, e pode ser contida pelos mecanismos imunológicos do próprio animal; b) invasão agonal ou invasão no momento do abate que ocorre através de penetração de bactérias do trato gastrintestinal para o sangue no momento da morte, em condições normais, porém, os microrganismos podem atingir a circulação sanguínea através de instrumentos utilizados no atordoamento como a pistola de dardo cativo, ou na etapa da sangria e; c) invasão post-mortem que ocorre quando, por problemas mecânicos ou elétricos, o abate é interrompido e o animal não é esfolado ou eviscerado após a sangria (ROÇA, 2008). Voltando aos resultados do presente estudo, observa-se que a partir das amostras de peixe investigadas foi obtido um total de 138 isolados, dos quais 34 (24,6%) foram positivos para MRSA, representando nove (30%) amostras. Seis hospitais apresentaram resultado positivo para MRSA e em um deles o microrganismo foi detectado nas três amostras colhidas. Atyah, Zamri-Saad e Zahrah (2010) ao investigarem a presença de MRSA em tilápias criadas em sistema intensivo de produção (cativeiro), isolaram 98 (50%) cepas de MRSA. Percentuais menores foram encontrados por Ezzeldeen, Mansour e Ahmed (2011) no Egito em amostras de peixe salgado, por Hammad e colaboradores (2012) em amostras de 78 peixe cru prontas para o consumo no Japão, e por Rizek (2010) em amostras de peixe cru. Nessa presente investigação, observou-se que 86,7% das amostras de peixe foram adquiridas pelas Unidades de Alimentação e Nutrição (UAN) dos hospitais em forma de filés de panga (Pterogymnus laniarius) e merluza (Merluccius), provenientes de sistemas de cultivo em tanques. No Brasil, os diferentes sistemas de cultivo de peixes utilizam tanques de alvenaria ou terra. O uso de tanques de alvenaria pode reduzir a contaminação do pescado, visto que o solo apresenta grande diversidade de microrganismos que podem levar à elevada densidade de populações bacterianas presentes no ambiente de cultivo. Entretanto, esse tipo de tanque eleva a dureza da água e, por isso, são menos utilizados (CARNEIRO et al., 2007). O pescado possui bactérias e outros microrganismos que se concentram basicamente na superfície externa (pele) e nas vísceras. A quantidade e tipos desses microrganismos vão depender das características do meio ambiente em que o pescado se encontra, podendo variar de zero a vários milhões por cento/cm 2. A microbiota difere dependendo da temperatura da água, variando de bactérias do grupo psicrófilos em águas frias a mesófilos em águas quentes (TONONI, 2013). No ambiente aquático as bactérias do gênero Staphylococcus não são comuns, porém vários são os fatores que podem contribuir para o desenvolvimento destas bactérias nos sistemas de cultivo do pescado, como a utilização de dejetos de animais para adubação e promoção do plâncton que serve de alimento natural para os peixes, reduzindo os custos de produção. Os excrementos de animais podem carrear tanto resíduos de antimicrobianos quanto bactérias resistentes a essas drogas para o ambiente aquícola (OSTRENSKY; BOEGER, 1998; PETERSEN et al., 2002). Nessa linha, Miranda e Zemelman (2002) afirmam que a presença de resíduos de antimicrobianos favorece a seleção de bactérias resistentes que podem se inserir na cadeia alimentar humana por meio do pescado contaminado e transferir genes de resistência às bactérias da microbiota indígena ou potencialmente patogênicas para seres humanos. Além do uso de antimicrobianos, outro fator importante no que diz respeito à segurança da carne é a sua manipulação desde a planta de processamento até a 79 mesa do consumidor (NRDC, 2011). Esta afirmação é corroborada pelo fato de que a maioria das amostras investigadas nesse estudo passaram pelo processo de filetagem (86,7%) e todas as amostras positivas para MRSA neste tipo de carne foram provenientes de filés. No Japão, ao investigar a presença de MRSA em 444 amostras de carne e miúdos de frango, representados por 165 partes musculares do peito e coxa, 148 asas, 94 fígados, 31 moelas, 03 corações e 03 ovários, Kitai e colaboradores (2005) encontraram baixa prevalência da bactéria. As duas cepas, ambas isoladas das partes musculares da coxa, foram identificadas como pertencentes ao biovar humano, sugerindo que as mesmas tenham sido transmitidas acidentalmente ao alimento por manipuladores. Outro trabalho no Brasil relata a presença de MRSA em peixes comercializados em feiras livres e em manipuladores deste pescado no Ceará, demonstrando que 4 entre as 12 cepas isoladas apresentaram multiresistência a vários antimicrobianos, dentre eles a oxacilina (ALBUQUERQUE et al., 2007). Outras pesquisas têm sido conduzidas para investigar a presença de MRSA em profissionais que trabalham com carne crua diariamente, mas que não têm contato direto com os animais que deram origem às carnes (DE JONGE; VERDIER; HAVELAAR, 2010). Dentre estes, funcionários de dois hospitais, e manipuladores de três estabelecimentos de processamento de carne resfriada onde as mesmas são porcionadas para o consumo. Os autores também investigaram a presença do patógeno nas carnes manipuladas pelos funcionários. Resultados dessa pesquisa indicaram ausência do MRSA nas amostras clínicas, porém cinco (14,3%) amostras de carnes cruas estavam contaminadas. Os autores justificam a ausência de MRSA nas amostras clínicas e a baixa prevalência em amostras dos alimentos devido ao baixo número de amostras investigadas. Como pode ser observado na Tabela 5, foi investigado um total de 60 amostras de preparações prontas para o consumo à base de carnes, nos 10 hospitais públicos e apenas 4 dos hospitais, D, G, I e J, apresentaram amostras positivas para MRSA. As frequências observadas foram as seguintes: 16,7%, 33,3%, 11,1% e 33,3% respectivamente. 80 Tabela 5: Isolamento de MRSA de amostras de preparações prontas para o consumo a base de carne, em cozinhas de hospitais públicos de Salvador – BA. Espécie animal Hospital Bovina Frango Suína Pescado TOTAL/ MRSA + A NA NA NA NA NA NA NA NA NA (-) (-) (-) 3/0 B (-) (-) (-) (-) (-) (-) NA NA NA NA NA N 6/0 A C (-) (-) (-) NA NA NA NA NA NA NA NA N 3/0 A D (-) (-) (-) NA NA NA (-) (+) (-) NA NA N 6/1 A E (-) (-) (-) (-) (-) (-) (-) (-) (-) NA NA N 9/0 A F NA NA NA NA NA NA (-) (-) (-) (-) (-) (-) 6/0 G NA NA NA NA NA NA NA NA NA (-) (-) (+) 3/1 H (-) (-) (-) (-) (-) (-) NA NA NA NA NA N 6/0 A I NA NA NA (-) (-) (-) (-) (-) (-) (-) (+) (-) 9/1 J NA NA NA (-) (-) (+) (-) (-) (-) (-) (+) (+) 9/3 TOTAL/ 15/ 15/ 15/ 15/ 60/ MRSA + 0 1 1 4 6 (+) Positivo (-) Negativo (NA) Não Aplicável Sob a ótica das preparações prontas para o consumo a base de carne, destinadas a dietas hospitalares, observou-se com base na Figura 7 que os produtos a base de peixes foram os que apresentaram uma frequência maior de contaminação pela presença de MRSA, não sendo observada contaminação pelo Número de amostras patógeno nos alimentos prontos para o consumo a base de carne bovina. Figura 7: Distribuição da presença de Staphylococcus aureus resistente à meticilina em relação ao tipo de alimento cárneo pronto para o consumo destinado às dietas hospitalares. 81 Pode-se também, a partir da análise da Tabela 6, verificar que o maior percentual da presença de MRSA, 26,7%, está relacionado às preparações a base de peixe. Além disso, tem-se que a presença de MRSA não está associada ao tipo de alimento preparado (P > 0.05), não rejeitando a hipótese nula de que não existe associação entre a presença de MRSA e o tipo de produto cárneo preparado (Tabela 6). Tabela 6: Análise bivariada entre a presença de Staphylococcus aureus resistente à meticilina e o tipo de preparação cárnea pronta para o consumo destinada às dietas hospitalares. Presença MRSA Alimentos Negativo Positivo preparados P-valor1 n (%) n (%) Carne Bovina 15 (100.0) 0 (0.0) 0.104 Frango 17 (94.4) 1 (5.6) Peixe 11 (73.3) 4 (26.7) Suíno 14 (93.3) 1 (6.7) 1 Valor de p do teste Exato de Fisher. Em trabalho realizado por Rizek (2010) para a pesquisa do gene de resistência mecA e teste de sensibilidade a oxacilina a partir de cepas de Staphylococcus aureus isoladas de 57 amostras de alimentos, dentre elas peixe cru, sushi/sashimi e preparação a base de peixe ou outra carne, arroz e legumes (―bento‖), o autor verificou resultado positivo em 3 (5,2%) amostras de sushi/sashimi e em 1 (1,8%) de ―bento‖, enquanto nenhuma das cepas isoladas de peixe cru apresentaram o gene mecA. Quanto ao teste de sensibilidade à oxacilina, 1 (1,8%) amostra de peixe cru e 2 (3,5%) amostras de sushi/sashimi apresentaram cepas resistentes. A baixa prevalência de MRSA em amostras das preparações acima mencionadas pode ser explicada pelos métodos utilizados pelo autor, diferente do presente trabalho, onde foram utilizados dois métodos de enriquecimento, com ênfase no segundo enriquecimento utilizando vermelho de fenol contendo cefoxitina e aztreonam, meio que apresenta alta sensibilidade e seletividade para MRSA, plaqueamento em meio cromogênico específico e, finalmente a confirmação por teste de aglutinação especifico para detecção de MRSA (BOER et al., 2009). Muitas vezes a frequência de MRSA em alimentos é pequena devido ao S. aureus ser um competidor fraco em relação a outros microrganismos. Diferentemente, o MRSA pode ser transmitido a um alimento e consequentemente 82 se multiplicar quando o alimento é aquecido a determinadas temperaturas seguido de armazenamento impróprio (BOER et al., 2009). Segundo a legislação brasileira, através da RDC 216 (BRASIL, 2004), após serem submetidos à cocção, os alimentos preparados devem ser mantidos em condições de tempo e de temperatura que não favoreçam a multiplicação microbiana. Para conservação a quente, os alimentos devem ser submetidos à temperatura superior a 60ºC por, no máximo, seis horas. Para conservação sob refrigeração ou congelamento, os alimentos devem ser previamente submetidos ao processo de resfriamento minimizando os riscos de contaminação cruzada e evitando a multiplicação microbiana. Assim, o alimento preparado deve ter sua temperatura reduzida a 10°C em até duas horas, seguido de conservação sob refrigeração a temperaturas inferiores a 5°C (± 1°C) ou congelamento a temperatura igual ou inferior a -18°C (BRASIL, 2004). A importância da contaminação por cepas de MRSA em alimentos permanece incerta. Se a carne ou outro alimento for eficientemente cozido, as células de MRSA serão destruídas, mas o gene mecA resiste, podendo ser transferido para outra cepa viável. Isso porque o DNA resiste bem ao calor, temperaturas de 100C não são capazes de destruí-lo (DOLINSKY et al. 2007). Em indivíduos submetidos à terapia com antimicrobianos, como é o caso de muitos pacientes hospitalizados, o MRSA proveniente de alimentos pontos para o consumo, incluindo aqueles a base de carne, queijo, ou produtos frescos, podem causar enterocolítes estafilocócicas. Vale lembrar que muitas vezes o manipulador pode ser infectado por MRSA provenientes dos alimentos, causando ou potencializando infecções cutâneas nestes profissionais, levando à disseminação do microrganismo para outros alimentos (DOYLE; HARTMANN; WONG, 2011). É importante lembrar que o S. aureus é relativamente susceptível ao calor. Então, pode-se considerar que o alimento que passa por processamento térmico tem um baixo risco de veicular uma intoxicação de origem alimentar. Além disso, assume-se que este patógeno encontra-se presente na superfície da carne. No entanto o risco aumenta quando se manipula a carne crua, justamente pelo perigo de contaminação cruzada (DE JONGE; VERDIER; HAVELAAR, 2010). Em se tratando de alimentos prontos para o consumo, ou seja, que não sofrerão mais nenhum tipo de tratamento, as mãos de manipuladores de alimentos 83 podem desempenhar o papel de veículos de microrganismos patogênicos, devido a procedimentos inadequados de higiene, possibilitando assim a contaminação cruzada. Por exemplo, estes podem carrear microrganismos das carnes cruas para as saladas. No ambiente hospitalar onde muitos pacientes encontram-se debilitados e, portanto susceptíveis a infecções, a consequência da contaminação dos alimentos com bactérias patogênicas pode ser muito séria (AYÇIÇEK et al., 2004). A presença de cepas de S. aureus nas mãos de manipuladores de alimentos em hospitais é preocupante principalmente pelo fato dessas refeições serem finalizadas por estas mãos contaminadas (LOWBURY et al., 1964), e mais preocupante ainda se estes forem resistentes a antimicrobianos. Em medicina humana, anti-sepsia das mãos é uma parte integrante da prevenção da disseminação de MRSA entre animais e entre homens e animais. A lavagem das mãos e descontaminação de superfícies e equipamentos devem ser administradas pelo cuidado aos pacientes. Recipientes disponibilizados nos consultórios, próximos aos vestiários ajudam a lembrar a equipe da necessidade de higienização das mãos (LEONARD; MARKEY, 2008). Contudo, a realidade nos hospitais parece ser diferente. Em estudo recente realizado por Ferreira (2012) nas Unidades de Nutrição e Alimentação (UAN) dos mesmos hospitais públicos que participaram do presente estudo, a investigação da presença de estafilococos coagulase positiva resistente à meticilina em fossas nasais e mãos de 140 manipuladores de alimentos demonstrou que, embora 100% dos manipuladores afirmassem que higienizavam as mãos durante o preparo das dietas, 70% das amostras foram positivas para a presença de estafilococos coagulase positiva e, destas, 28,6% foram positivas para a presença de MRSA. Estas cepas foram isoladas em sua maioria das mãos e fossas nasais das copeiras dietistas, funcionárias diretamente envolvidas com a distribuição das dietas aos pacientes. Vários outros trabalhos, incluindo o realizado por Boer e colaboradrores (2009) detectam alta prevalência de cepas especificas de humanos, o que pode indicar uma possível fonte de contaminação. A FDA (FOOD AND DRUG ADMINISTRATION) estima que os manipuladores de alimentos infectados sejam responsáveis por 20% das doenças bacterianas de 84 origem alimentar (FOOD..., 2000). Além disso, as doenças causadas pelo consumo de alimentos contaminados por MRSA têm sido bem documentadas, demonstrando o impacto deste microrganismo para saúde pública (KLUYTMANS et al., 1995; JONES et al., 2002). O primeiro surto de origem alimentar provocado por MRSA aconteceu no Hospital Universitário de Roterdã na Holanda. Neste surto, 27 pacientes desenvolveram infecção pelo patógeno sendo que cinco deles foram a óbito; o primeiro paciente foi identificado no setor de hematologia de onde o microrganismo foi disseminado pelo centro cirúrgico e outros. Com a investigação, foi possível detectar que uma banana estava contaminada por MRSA e que esta, por sua vez, havia sido contaminada por um profissional que preparava as refeições do setor de hematologia, ao descascá-la. Estudos posteriores revelaram que as cepas do paciente, do profissional do setor de nutrição e do alimento incriminado eram idênticas genotipicamente (KLUYTMANS et al., 1995). Ainda, nos Estados Unidos, três adultos de uma família apresentaram sintomas de gastrenterite, como náuseas vômitos e dores abdominais, 3 a 4 horas após o consumo de churrasco de carne suína, adquirida em supermercado. Após a investigação das amostras da carne suína e de coleslow (uma salada a base de repolho e maionese), bem como dos pacientes e dos manipuladores, observou-se a presença de MRSA na amostra da salada, dos pacientes e dos manipuladores que prepararam ambas as refeições, sugerindo a ocorrência de contaminação cruzada (JONES et al., 2002). Outro fator coadjuvante no que diz respeito à contaminação no ambiente de produção é a formação de biofilme pelo S. aureus. Biofilmes são estruturas que se destacam pela capacidade de se formar em vários tipos de ambientes, sejam eles bióticos ou abióticos. Pesquisas sobre sua formação em superfícies de material utilizado em ambiente de produção de alimentos, como aço-inoxidável, vêm recebendo destaque, principalmente no que diz respeito a seu impacto sobre os perigos de sua presença. Uma vez formados, os biofilmes agem como pontos de contaminação constante, liberando células de microrganismos patogênicos e/ou deterioradores, comprometendo a qualidade microbiológica da matéria-prima ou produtos acabados (BOARI et al., 2009). Patógenos como o S. aureus sobrevivem nas mãos, roupas e utensílios por horas ou dias depois do contato inicial com o 85 microrganismo (FUSTER-VALLS et al., 2008). Nesse contexto, estudos relatam a habilidade do MRSA em produzir biofilmes, ressaltando sua capacidade de resistir a tratamento com antimicrobianos comumente usados, como a vancomicina e a rifampicina (JONES et al., 2001; ARCHER et al., 2011). Em estudos a respeito da caracterização de MRSA isolados de alimentos de origem animal na Alemanha, Febler e colaboradores (2011) identificaram que todos os isolados MRSA positivos (37,2%) também possuíam genes hla e hld, os quais estão envolvidos na produção de biofilme. Embora não existam trabalhos a respeito da presença de MRSA em temperos, sabe-se que S. aureus é conhecido pela sua capacidade de tolerar altas concentrações de sal (FRAZIER; WESHOFF, 2000), o que, em última análise, aponta para a possibilidade dos temperos serem fatores coadjuvantes na disseminação de MRSA nos alimentos já preparados. De fato, no estudo realizado por Hoffmann e colaboradores (1991) com temperos prontos para uso em produtos de carne, foi possível encontrar resultados variando de 1,0 x 10 3 a 2,7 x 105 UFC/g para mesófilos, indicando uma qualidade sanitária deficiente. Resultados semelhantes foram encontrados por Furlaneto e Mendes (2004), onde a contagem total de mesófilos apresentou valores entre 4,1 x 10 3 a > 106 UFC/g em especiarias comercializadas em feiras livres e de 1,0 x 103 a > 106 UFC/g nas amostras comercializadas em hipermercados. Ainda, em relação aos resultados do presente estudo, verificou-se que as amostras de preparações prontas para o consumo contaminadas por MRSA foram originadas de alimentos, cujas dimensões dos cortes eram relativamente grandes, ou de preparações espessas como estrogonofe e bifes. Embora estas amostras tenham sido submetidas a altas temperaturas no momento da cocção, a velocidade de penetração de calor também deve ser considerada. Segundo a teoria da difusidade térmica, a velocidade de penetração de calor no interior do alimento vai depender de fatores como composição, temperatura, umidade e porosidade da amostra (CARBONERA et al., 2003). Assumindo que o S. aureus é relativamente susceptível ao calor, a proteção do alimento seria alcançada através da submissão do mesmo a temperaturas acima de 65 °C. A limitação da transferência de calor no processamento de alimentos sólidos é muitas vezes observada, pois para atingir o ponto frio do alimento é necessário 86 que a parte mais externa do alimento seja cozida em excesso (FRYER; ROBBINS, 2005). Em contrapartida, o tratamento térmico pode comprometer as qualidades nutricionais e sensoriais do alimento e, portanto, deve-se buscar uma solução de compromisso entre a letalidade microbiológica alvo e a manutenção dos outros atributos de qualidade do alimento (ALVES, 2005). Esta pesquisa revelou que as carnes cruas destinadas ao preparo das dietas e as preparações prontas para o consumo a base destas carnes nos hospitais públicos de Salvador-BA estão contaminadas com cepas de S. aureus resistente à meticilina. A alta porcentagem de isolados pode ser atribuída ao uso indiscriminado de antimicrobianos no tratamento de doenças em homens e animais, ou seja, sem prescrição ou orientações profissionais, ou ainda como promotores de crescimento na produção animal, acrescido das prováveis contaminações advindas do ambiente de produção e/ou através de manipuladores portadores assintomáticos. Infecções bacterianas pelo consumo de alimentos contaminados é um fato comum no mundo todo e se cuidados não forem tomados durante o preparo das refeições, essas bactérias resistentes podem encontrar meios de se adaptarem ao organismo humano desencadeando doenças, muitas vezes de difícil tratamento (OMBUI; KIMOTHO; NDUHIU, 2000). 87 4 CONCLUSÕES Dos resultados obtidos no presente estudo e de acordo com as condições experimentais da investigação, pode-se concluir que todos os hospitais apresentaram amostras de alimentos contaminadas com MRSA em maior ou menor grau, tanto na matéria-prima quanto no produto pronto para o consumo. A maior frequência de Staphylococcus aureus resistente à meticilina em determinados tipos de carne sugere que exista um risco maior pelo consumo de um tipo de carne em relação a outro, apesar de não ter sido demonstrada diferença estatística significativa entre os diferentes tipos de produtos cárneos e a presença de MRSA. Esta maior frequência de isolamento de MRSA também sugere uma possível contaminação por microrganismo do próprio animal ou por etapas do processamento, reforçando a importância do uso adequado e monitorado de antimicrobianos na saúde animal e atenção as Boas práticas de Fabricação. Dos resultados da investigação das preparações prontas para o consumo pode-se concluir que, ou o processamento térmico não se mostrou eficiente na eliminação do microrganismo, ou houve contaminação após a preparação das mesmas por manipuladores portadores assintomáticos ou ainda por utensílios utilizados na distribuição das refeições. Os dados observados na presente pesquisa comprovam que S. aureus permanece como um dos patógenos mais comuns em alimentos, podendo representar sérios riscos a saúde pública, caso medidas corretivas desde o campo até a mesa do consumidor não sejam devidamente adotadas. 88 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS Este estudo representa um perfil específico da qualidade sanitária das carnes destinadas ao consumo em hospitais de Salvador-BA. No entanto, a observação de 28,1% de amostras destas carnes contaminadas com MRSA é um dado preocupante, se considerarmos principalmente o tipo de clientela a que essas dietas são destinadas. Futuras investigações, considerando toda a cadeia produtiva ―da fazenda a mesa‖, são necessárias para esclarecer a origem da contaminação e traçar medidas adequadas para seu controle. Ainda, estudos adicionais devem ser realizados no intuito de identificar genotipicamente os isolados de MRSA em alimentos cárneos consumidos em dietas nos hospitais públicos de Salvador- BA, com o propósito de rastrear e identificar a possível fonte de contaminação. No Brasil, observa-se que as doenças veiculadas por alimentos (DVA) são subnotificadas e, todavia, aquelas motivadas por S. aureus e MRSA, provavelmente são subestimadas. Nesse contexto, é necessário que a vigilância de patógenos de importância em DVA seja contínua, e o monitoramento de cepas resistentes a antimicrobianos como MRSA em alimentos seja requisito essencial para saúde pública, devendo ser incluído nos programas das CCIH - Comissões de Controle das Infecções Hospitalares. Por fim, as medidas de prevenção devem ser tomadas com o objetivo de se evitar contaminações por patógenos na produção de alimentos. Nessa linha, sobressai o atendimento às Boas Práticas de Fabricação, com maior atenção ao desenvolvimento de hábitos adequados de higiene pelos funcionários envolvidos na preparação dos alimentos, mecanismos estes essenciais no gerenciamento da segurança alimentar. 89 REFERÊNCIAS AARESTRUP, F. M. Veterinary Drug Usage and Antimicrobial Resistance in Bacteria of Animal Origin. Basic & Clinical Pharmacology & Toxicology, Oxford, v. 96, p. 271-281, 2005. AGERSO, Y. et al. Study of methicillin resistant Staphylococcus aureus (MRSA) in Danish pigs at slaughter and in imported retail meat reveals a novel MRSA type in slaughter pigs. Veterinary Microbiology, Amsterdã, v. 157, n. 1-2, p. 246-250, 2012. ALBUQUERQUE, W. F. et al. Multiple drug resistant Staphylococcus aureus strains isolated from a fish market and from fish handlers. Brazilian Journal of Microbiology, São Paulo, v. 38, p.131-134, 2007. ALVES, V. A. O. 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S ( ) N( ) Quais (descrever grupo, família ou nome do medicamento, especialmente atibióticos:_________________________________________________________________ __________________________________________________________________________ ______________________________________________________________ Faz uso de antibiótico como promotores de crescimento? S ( ) N ( ) Quais: _________________________________________________________________ 100 ANEXO C – Termo de livre consentimento TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E PRÉ-ESCLARECIDO FORNECEDOR DE ALIMENTOS Prezado(a) Sr(a), Você está sendo convidado(a) para participar, como voluntário(a), em uma pesquisa. Após ser esclarecido(a) sobre as informações a seguir, caso aceite fazer parte do estudo, assine ao final deste documento, que está apresentado em duas vias. Uma delas é sua e a outra é do pesquisador responsável. Em caso de recusa você não será penalizado(a) de forma alguma. INFORMAÇÕES SOBRE A PESQUISA: Nome do Projeto: Investigação de Staphylococcus aureus resistente à meticilina em alimentos cárneos destinados ao preparo de dietas em hospitais públicos do município de Salvador- BA Em caso de dúvidas e esclarecimentos procurar os pesquisadores e/ou o Comitê de Ética em Pesquisa da Escola de Nutrição: Pesquisador Responsável: Profa. Dra. Rogeria C. de Castro Almeida Telefone para contato: (71) 88917577 Email: [email protected] Pesquisador participante: Wellington Luis Reis Costa Telefone para contato: (71) 87453196/91312724 Email: [email protected] Comitê de Ética e Pesquisa da Escola de Nutrição- CEPNUT Avenida Araújo Pinho, N° 32- Campus Universitário do Canela Tefefone: (71) 3283-7704 Email: [email protected] Esse trabalho tem como objetivo Investigar a presença de Staphylococcus aureus resistente à meticilina (MRSA) em alimentos cárneos destinados a dietas em hospitais públicos de Salvador-BA. Nos alimentos o S. aureus é mais conhecido por produzir toxinas termoestáveis que demonstram atividade emética. Já o MRSA é uma variação diferente deste patógeno que resiste a antimicrobianos β-lactâmicos, como penicilinas e cefalosporinas e por esta razão é considerado uma causa importante de infecções adquiridas em comunidade e hospitais; são principalmente do tipo nosocomial e são cada vez mais relatados em vários países do mundo, suspeita-se do contato com os 101 manipuladores de alimentos bem como a sua presença na matéria-prima de origem animal como, peixes, carnes e leite. Os achados dessa pesquisa permitirão entender de que maneira o manejo animal bem como as Boas Práticas Agropecuárias e de Fabricação podem contribuir para presença deste patógeno nos alimentos cárneos que servem de dietas nos hospitais públicos de Salvador-BA. Os Produtores de alimentos que aceitarem participar do estudo deverão responder ao formulário semi-estruturado do tipo check-list com o objetivo de avaliar o manejo animal no pré e pós-abate. Não será exposta a identidade do consumidor durante a apresentação dos resultados. ____________________________________ Nome e Assinatura do pesquisador CONSENTIMENTO DA PARTICIPAÇÃO DA PESSOA COMO SUJEITO Eu,____________________________________________________________, RG______________________________, abaixo assinado, concordo em participar do estudo ―Investigação de Staphylococcus aureus resistente à meticilina em alimentos cárneos destinados ao preparo de dietas em hospitais públicos do município de Salvador- BA‖. Como sujeito. Fui devidamente informado e esclarecido pelo pesquisador ______________________________ sobre a pesquisa, os procedimentos nela envolvidos, assim como os possíveis riscos e benefícios decorrentes de minha participação. Foi-me garantido que posso retirar meu consentimento a qualquer momento, sem que isto leve a qualquer penalidade. Local e data ___________________, ________/________/_______ Nome: ____________________________________ ____________________________________ Assinatura do sujeito ou responsável