Retr ospectiv a da Economia etrospectiv ospectiva Brasileir asileira Br asileir a nos Últimos 45 Anos Industrialização ais Industrialização,, desen desenvvolvimento olvimento,, crises crises,, políticas neoliber neoliberais e injustiça social caracterizam a evolução da economia no país Um período de 45 anos pode ser curto para a evolução histórica, mas pode ser longo para uma sociedade como a brasileira, que vivenciou recuos e avanços políticos, profundas transformações econômicas e ganhos sociais muito aquém do necessário e desejado. De uma perspectiva econômica, ocorreram mudanças das mais significativas no país, seja em termos de estrutura econômica, seja do ponto de vista da forma de inserção da economia brasileira no mercado internacional. Após décadas de utilização de mecanismos que protegiam a produção interna contra a concorrência externa, o mercado foi aberto, eliminando-se quase todos os entraves à maior integração internacional. Maria Anita dos Anjos Economia Retrospectiva Numa retrospectiva da evolução da economia brasileira, três fatores se sobressaem: o avanço do processo de industrialização orientado e coordenado pelo Estado, os problemas advindos da insuficiente capacidade de financiamento do desenvolvimento econômico e a incapacidade de assegurar, paralelamente à performance econômica, a melhoria substantiva da situação social. 18 r e v i s t a F A E B U S I N E S S , n .4, dez. 2002 O avanço do processo de industrialização do Brasil apresentou, em curto período de tempo, um desempenho notável, pois assegurou não somente elevadas taxas de crescimento econômico até os anos de 1970, como promoveu alterações no parque industrial com a ascensão de indústrias tecnologicamente avançadas. A origem da expansão industrial brasileira data do final do século XIX, com a instalação e ampliação de indústrias produtoras de bens de consumo não duráveis como, por exemplo, indústrias alimentícia e têxtil. A importância das atividades agroexportadoras na geração da renda nacional e na oferta de emprego, como resultado de determinantes históricos, transformava a atividade industrial em atividade subordinada, ou seja, complementar à nuclear. Ação do Estado O início dos anos de 1960, marcado preliminarmente pela aceleração da inflação, queda dos investimentos, déficits nas contas externas e nas contas públicas, determinou a implementação de medidas de estabilização, o que ocorre de forma mais efetiva com o Plano de Ação Econômica do Governo (PAEG), em 1964, no governo Castelo Branco. A adoção da política de estabilização incluía reformas no sistema financeiro e tributário, cujas reestruturações ampliaram os mecanismos e recursos para financiamento dos gastos e investimentos privados e públicos. A crise econômica e política que se manifesta nos anos de 1930 abre espaço para a ascensão de uma nova proposta de desenvolvimento, baseada no fortalecimento do processo de industrialização e que encontra no Estado getulista respaldo para a transformação da proposta em um projeto nacional de desenvolvimento. Passados alguns anos de redução das taxas históricas A ação do Estado na economia foi fundamental para de crescimento, a economia retoma seu processo de assegurar o crescimento industrial após a década de 1930. recuperação no final dos anos de 1960, contribuindo, para Através da criação e fortalecimento das empresas estatais isso, as condições favoráveis externas e internas. O e da utilização da política cambial, fiscal e creditícia, o Estado crescimento do comércio mundial e a expansão das linhas criou as bases para a aceleração industrial. O processo, de crédito no mercado internacional ampliaram as contudo, foi gradual, pois foi baseado na oportunidades para o país. Internamente, proteção do mercado nacional, decorrente das foram criadas condições de maior alinhamento A ação do Estado elevadas tarifas incidentes sobre os bens a esse novo contexto como, por exemplo, os na economia foi importados, bem como no controle direto das incentivos fiscais e creditícios às exportações, fundamental para importações e na administração de o que propiciou aumento das exportações, estrangulamentos externos que impunha assegurar o inclusive de produtos manufaturados, limites estreitos à capacidade de importação crescimento ampliando a captação de recursos externos. e, conseqüentemente, ao acesso de bens de industrial após a Caracterizada pelas elevadas taxas de produção, como máquinas, equipamentos e crescimento econômico, apesar do primeiro década de 1930 matérias-primas, necessários ao crescimento choque do petróleo em 1973, a década de e modernização da produção industrial. 1970 representou um marco para a economia O principal problema da industrialização, até meados brasileira, pois encerrou um período longo de crescimento dos anos de 1950, decorria da insuficiente capacidade de iniciado no pós-guerra mundial. A década encerrou um financiamento do processo, já que o país dependia da modelo de desenvolvimento denominado de substituição de receita das exportações de bens agrícolas, em especial do importações, no qual o processo de industrialização ocorreu café, para cobertura das importações de bens motivado por estrangulamentos externos, contando com industrializados. Além disso, o capital estrangeiro, de fonte elevada proteção do mercado, seja através de controles diretos ou indiretos das importações. privada ou oficial, era escasso. A sucessão de desequilíbrios nos anos de 1980 e o No governo de Juscelino Kubitschek (1956-1960) a impacto na produção e no emprego significaram uma entrada do capital estrangeiro, na forma de empréstimos, alteração efetiva de tendência da economia. A crise da financiamentos e investimentos, garantiu a instalação de dívida externa, provocada pela elevação dos juros novas empresas, particularmente as produtoras de bens de internacionais e pelo fim do fornecimento de crédito consumo duráveis e também de máquinas e equipamentos. externo em prazos e juros atrativos, aprofundou o Os investimentos públicos realizados permitiram a ampliação desequilíbrio nas contas externas, já debilitadas pela da malha rodoviária e da oferta de energia. segunda grande elevação do preço do barril do petróleo Condições favoráveis ... 19 r e v i s t a F A E B U S I N E S S , n. 4, dez. 2 0 02 ao final dos anos de 1970. Com o agravamento da situação das contas externas, o governo brasileiro recorre ao Fundo Monetário Internacional (FMI) para obter novos recursos e o aval da instituição para um programa de ajuste da economia, conseguindo, assim, renegociar os débitos vencidos e a vencer com os credores internacionais e obter novas linhas de créditos comercial e interbancário. O acordo fechado com o FMI para o biênio 1983-1984 impôs uma política drástica de ajuste interno e externo, sob a responsabilidade do setor público. As metas a serem atingidas, seja na área fiscal, visando à redução do déficit público, seja na área externa, com objetivo de obter o equilíbrio no balanço de pagamento, resultaram na redução da demanda interna com sérios impactos sociais decorrentes do aumento do desemprego, da queda dos rendimentos dos trabalhadores e da aceleração da inflação. Economia Políticas de estabilização à implementação de ousadas (e criticáveis) medidas de estabilização no início do governo Collor, em março de 1990. A política de combate à inflação desse governo, assentada no tripé “ajuste fiscal provisório, congelamento de preços e salários e bloqueio dos ativos financeiros por 18 meses”, também não conseguiu assentar as bases de estabilização a longo prazo. Outras tentativas de enfrentamento da inflação sucedem-se (Plano Collor II, em 1991, e política gradualista do ministro Marcílio Marques Moreira), porém sem conseguir desarmar as condições responsáveis pelo processo inflacionário. Conseguiam-se ganhos temporários, mas a permanência da crítica situação fiscal, os choques de oferta, o grau de indexação da economia e as expectativas adversas dos agentes quanto ao comportamento da economia mantinham as elevadas pressões inflacionárias. Globalizados e pobres Apesar do êxito relativo das metas externas, negociadas A proposta de retomada de crescimento do governo com o FMI, a aceleração da inflação e a deterioração das Collor, alinhada ao ideário neoliberal, significou uma contas públicas, decorrentes do elevado peso dos encargos da dívida pública interna e externa, foram indicativos das alteração profunda na forma de inserção da economia prioridades a serem perseguidas no governo José Sarney brasileira na economia internacional, no relacionamento do setor público com o setor privado e na atuação do Estado (1985-1989) e no governo Collor de Mello (1990-1992). na economia. O início da abertura comercial, No governo Sarney as políticas de estabilização implementadas (Plano Apesar de a economia isto é, gradual redução das alíquotas incidentes nos bens importados, foi a Cruzado, Plano Bresser, ortodoxia brasileira estar entre estratégia utilizada, visando ao aumento da gradualista e Plano Verão) não as maiores do mundo competitividade da economia. Além disso, conseguiram assegurar a manutenção da e sua trajetória ter o processo de desregulamentação da estabilidade a longo prazo e, ao contrário, sido rica e complexa, economia, o programa de privatização das reforçaram as atitudes defensivas dos infelizmente há muito estatais, a abertura do mercado financeiro agentes econômicos, os quais não pouco a se falar dos desejavam mais ser surpreendidos com ao capital internacional, entre outras avanços sociais políticas heterodoxas, que significavam medidas, significou a formação das bases congelamentos dos preços e salários, para a integração da economia ao processo quebra de contratos, mudança de moeda, alteração das de globalização, um caminho sem volta para o país, regras de indexação, entre outras. considerando, ainda, o aprofundamento desta opção pelo A manutenção da inflação em elevados patamares, próximo presidente eleito: Fernando Henrique Cardoso. O Plano Real, implementado em 1994, significou uma chegando a um processo hiperinflacionário ao final do ano de 1989, e a crítica crise fiscal, com o encurtamento dos complexa engenharia de combate à inflação, baseado que prazos da dívida interna, rolada no curtíssimo prazo, levaram foi no ajuste fiscal (novamente provisório), na indexação 20 r e v i s t a F A E B U S I N E S S , n .4, dez. 2002 plena da economia a uma unidade de conta, a Unidade Real de Valor, que alinhou os preços relativos, e na reforma monetária. Além disso, também foi fundamental a aceleração do processo de abertura e a valorização do real, em relação ao dólar, no início do plano, que ampliou a oferta de bens importados, pressionando, para baixo, os preços internos. Este é um brevíssimo resumo dos principais eventos ocorridos na economia do Brasil nos últimos 45 anos. Apesar de a economia brasileira estar entre as maiores do mundo e sua trajetória ter sido rica e complexa, infelizmente há muito pouco a se falar dos avanços sociais. Conforme a afirmação tão conhecida: o Brasil é um país rico com muitos pobres e é, antes de tudo, um país injusto. Quiçá pudéssemos, nesta data, comemorar os ganhos sociais obtidos nas últimas décadas, decorrentes da melhoria da distribuição de renda, da redução dos índices de pobreza e miséria da população brasileira, da melhoria das condições de vida de grande parte da população urbana, enfim de realizações efetivas no campo social. Que este seja o momento de reflexão, de uma fé verdadeira e de uma esperança firme para a ação solidária em prol de um país socialmente mais justo a ser construído nos próximos 45 anos. Maria Anita dos Anjos é economista, mestre em História Econômica pela UFPR, doutoranda em Engenharia de Produção pela UFSC e professora da FAE Business School. E-mail: [email protected] ... 21 r e v i s t a F A E B U S I N E S S , n. 4, dez. 2 0 02