Carlos Capela AMINOÁCIDOS AMINOÁCIDOS ......................................................... 1 A. INTRODUÇÃO ......................................................... 4 1. DEFINIÇÃO .................................................................... 4 1.a. Aminoácidos proteicos ............................................................4 1.A.I. 1.A.II. 2. AMINOÁCIDOS PROTEICOS COMUNS ............................................... 4 AMINOÁCIDOS PROTEICOS DERIVADOS ......................................... 5 ESTRUTURA QUÍMICA GERAL ..................................... 6 2.a. Isómeros ópticos ......................................................................6 2.A.I. 3. CONFIGURAÇÃO DE FISHER ............................................................ 7 CLASSIFICAÇÃO DOS AMINOÁCIDOS ........................... 9 3.a. Segundo a Polaridade dos seus radicais “R”.........................9 3.A.I. 3.A.II. 3.A.III. AMINOÁCIDOS COM RADICAL “R” APOLAR .................................. 9 AMINOÁCIDOS COM RADICAL “R” POLAR NÃO-CARREGADO ..... 9 AMINOÁCIDOS COM RADICAL “R” POLAR CARREGADO ............ 10 3.a.iii.1. 3.a.iii.2. 3.b. “R” Carregado Positivamente ........................................................... 10 “R” Carregado Negativamente.......................................................... 10 Segundo a Natureza dos seus radicais “R”..........................11 3.B.I. ÁCIDOS MONOAMINO E MONOCARBOXÍLICOS ............................ 11 3.b.i.1. 3.b.i.2. 3.b.i.3. Aminoácidos Alifáticos Neutros ........................................................ 11 Aminoácidos Aromáticos ................................................................... 12 Aminoácidos Sulfurados.................................................................... 13 3.b.i.5. 3.b.i.6. Aminoácidos com um resíduo Amida................................................ 15 3.B.II. 3.B.III. α-Iminoácido..................................................................................... 14 ÁCIDOS MONOAMINO E DICARBOXÍLICO ..................................... 16 ÁCIDOS DIAMINO E MONOCARBOXÍLICO ..................................... 17 4. AMINOÁCIDOS EM SOLUÇÃO AQUOSA: PROPRIEDADES QUÍMICAS E ELÉCTRICAS......................... 18 Aminoácidos página 1 de 70 Carlos Capela B. METABOLISMO DOS AMINOÁCIDOS ................... 19 1. METABOLISMO GERAL .............................................. 19 1.a. 1.b. 1.c. Descarboxilação ....................................................................19 Transaminação......................................................................21 Desaminação .........................................................................23 1.C.I. 1.C.II. 1.d. 1.e. 1.f. Desamidação..........................................................................26 Transdesaminação ................................................................26 Transferência de corpos em C1 .............................................27 1.F.I. 2. A DESAMINAÇÃO OXIDANTE .......................................................... 23 DESAMINAÇÃO NÃO OXIDANTE ..................................................... 24 A TRANSMETILAÇÃO ..................................................................... 28 METABOLISMO ESPECIAL .......................................... 29 2.a. Biossíntese dos aminoácidos – Anabolismo .........................29 2.A.I. 2.A.II. 2.A.III. INTRODUÇÃO ................................................................................. 29 BIOSSÍNTESE DO ÁCIDO GLUTÂMICO ........................................... 33 BIOSSÍNTESE DA GLUTAMINA ....................................................... 34 2.a.iii.1. 2.A.IV. 2.A.V. 2.A.VI. 2.A.VII. 2.A.VIII. 2.A.IX. 2.b. Regulação do equilíbrio ácido-base................................................... 35 BIOSSÍNTESE DA ALANINA E ÁCIDO ASPÁRTICO .......................... 36 ASPARAGINA .................................................................................. 36 SERINA E GLICINA ......................................................................... 37 ARGININA, PROLINA E ORNITINA ................................................. 39 METIONINA, CISTEÍNA E CISTINA................................................. 41 FENILALANINA E TIROSINA........................................................... 44 Degradação dos Aminoácidos - Catabolismo ......................45 2.B.I. 2.B.II. 2.B.III. MECANISMO GERAL DE DEGRADAÇÃO DE AMINOÁCIDOS:......... 45 O PAPEL DO ÁCIDO GLUTÂMICO.................................................. 46 ELIMINAÇÃO DA AMÓNIA: ............................................................ 47 2.b.iii.1. 2.b.iii.2. 2.B.IV. Transporte de Amónia ao Fígado:..................................................... 47 Ciclo da Ureia ou de Krebs-Henseleit: .............................................. 48 O DESTINO DOS ESQUELETOS CARBONADOS:.............................. 52 2.b.iv.1. 2.b.iv.2. 2.b.iv.3. 2.b.iv.4. 2.b.iv.5. 2.b.iv.6. 2.b.iv.7. 2.b.iv.8. 2.b.iv.9. 2.b.iv.10. 2.b.iv.11. 2.b.iv.12. Glicina e Serina.................................................................................. 52 Alanina ............................................................................................... 53 Cisteína ............................................................................................... 53 Ácido Aspártico e Asparagina ........................................................... 53 Ácido Glutâmico, Glutamina, Prolina, Arginina e Histidina........... 54 Valina, Isoleucina e Leucina............................................................. 55 Lisina .................................................................................................. 55 Metionina ........................................................................................... 56 Treonina ............................................................................................. 56 Fenilalanina e Tirosina ..................................................................... 56 Triptofano........................................................................................... 57 Em resumo.......................................................................................... 57 Aminoácidos página 2 de 70 Carlos Capela C. DERIVADOS DE AMINOÁCIDOS ........................... 59 1. CREATINA ................................................................... 59 2. GLUTATIÃO ................................................................. 61 2.a. Ciclo do γ-Glutamilo ou de Meister .....................................63 3. NEUROTRANSMISSORES DERIVADOS DA TIROSINA .. 65 4. NEUROTRANSMISSORES DERIVADOS DO TRIPTOFANO. ..................................................................................... 66 4.a. 4.b. D. A Serotonina ..........................................................................66 A Melatonina .........................................................................67 AMINOACIDÚRIAS................................................ 68 1. A FENILCETONÚRIA ................................................... 68 2. O ALBINISMO .............................................................. 69 3. HOMOCISTINÚRIA....................................................... 69 4. A CISTINÚRIA.............................................................. 70 5. CISTINOSE ................................................................... 70 Aminoácidos página 3 de 70 Carlos Capela A. INTRODUÇÃO 1.DEFINIÇÃO Os aminoácidos são ácidos orgânicos de série saturada, cíclicos ou heterocíclicos nos quais um dos hidrogénios do átomo de carbono α está substituído por um grupo funcional amina. Os aminoácidos podem ser: • Proteicos: quando fazem parte da estrutura das proteínas; • Não proteicos: quando existem nas células e tecidos, livres ou combinados, mas nunca nas proteínas. Alguns exemplos: β-Alanina, ornitina e citrulina. 1.a. Aminoácidos proteicos São as unidades fundamentais das Proteínas. Distinguem-se em comuns e derivados. 1.a.i. AMINOÁCIDOS PROTEICOS COMUNS São os aminoácidos para os quais existe pelo menos um codão específico no código genético. Existem vinte aminoácidos comuns, dos quais o homem pode sintetizar 11. Os restantes cuja síntese de novo é impossível são denominados essenciais porque devem ser obtidos na alimentação. Aminoácidos página 4 de 70 Carlos Capela 1.a.ii. AMINOÁCIDOS PROTEICOS DERIVADOS São geralmente formados por uma reacção catalisada por uma enzima, a partir de um aminoácido comum, após a sua incorporação na estrutura de uma proteína. É o exemplo da cistina que resulta da oxidação das cadeias laterais de 2 cisteínas, unidas por uma ligação covalente dissulfeto. Aminoácidos página 5 de 70 Carlos Capela 2.ESTRUTURA QUÍMICA GERAL Os 20 aminoácidos possuem características estruturais em comum, tais como: • A presença de um carbono central α, quase sempre assimétrico (à excepção da glicina); • Ligados a este carbono central, um grupo Carboxilo, um grupo Amina e um átomo de hidrogénio; • O quarto ligante é um radical chamado genericamente de “R”, responsável pela diferenciação entre os 20 AA. É a cadeia lateral dos AA. É o radical “R” quem define uma série de características dos AA, tais como polaridade e grau de ionização em solução aquosa. 2.a. Isómeros ópticos A quiralidade ou assimetria do carbono α (ligação a 4 grupos diferentes) confere aos aminoácidos actividade óptica. Só o aminoácido Glicina, que têm 2 H no carbono α, não possui quiralidade. Isómeros de aminoácidos rodam a luz polarizada em direcções diferentes. O isómero que faz rodar o plano de luz polarizada no sentido dos ponteiros do relógio é designado por dextrogiro (+). Se o isómero faz rodar o plano de luz polarizada no sentido contrário ao dos ponteiros do relógio é designado por levrogiro (–). Este dado só é observado experimentalmente, através de um polarimetro. A aldotriose gliceraldeído é usada como referência para todos os aminoácidos. Um aminoácido é designado por D ou L dependendo do arranjo dos átomos rodeando o carbono α. Mas, alguns dos aminoácidos possuem mais do que um carbono quiral, o que influencia a rotação da luz polarizada. Aminoácidos de cadeia longa possuem Aminoácidos página 6 de 70 Carlos Capela grupos adicionais entre o carbono α e o carbono terminal, o que pode promover designações opostas D/L e +/–. Mas vejamos como se classifica um isómero em D ou L. 2.a.i. CONFIGURAÇÃO DE FISHER Quando utilizamos a configuração de Fisher para demonstrar a direcção no espaço do arranjo dos aminoácidos, o carbono α está no centro, o traço horizontal representa ligações acima do plano do papel e o traço vertical representa ligações para trás do plano do papel. A configuração absoluta dos aminoácidos é determinado pela estereoquimica do átomo de carbono α. Com base na posição do grupo NH2, convencionou-se que, se este se projectar à esquerda, o aminoácido tem uma configuração absoluta L. A estrutura simétrica têm uma configuração D. Moléculas que não são sobreponíveis com a sua imagem especular são conhecidas como enantiómeros. Ex: D-Alanina e L-Alanina. Os aminoácidos proteicos encontram-se todos na forma L. Ao aumentar o número de carbonos quirais, o número de isómeros possíveis aumenta. Se n é o número de carbonos quirais, o número possível de isómeros é 2n. Nos aminoácidos com 2 carbonos assimétricos, como a treonina, a configuração no segundo átomo de carbono na forma que não ocorre nas proteínas, define a forma alo, que também pode ser D ou L. Aminoácidos página 7 de 70 Carlos Capela As soluções de aminoácidos sintetizados em laboratório por vezes são opticamente inactivas. Isto significa que existe uma mistura equimolar de isómeros L e D, portanto de formas que apresentam actividade óptica complementar e portanto se anulam. Estas misturas são designadas por misturas racémicas. Aminoácidos página 8 de 70 Carlos Capela 3.CLASSIFICAÇÃO DOS AMINOÁCIDOS O radical “R” permite a classificação dos aminoácidos segundo a sua polaridade e natureza. 3.a. Segundo a Polaridade dos seus radicais “R” A polaridade do radical “R” permite a classificação dos aminoácidos em 3 classes: 3.a.i. AMINOÁCIDOS COM RADICAL “R” APOLAR Possuem radical “R” geralmente formado exclusivamente por carbono e hidrogénio – grupos alquilo. São hidrofóbicos e em número de 8: • Alanina • Valina • Leucina • Isoleucina • Prolina – Forma anel imina • Fenilalanina • Triptofano • Metionina – “R” contém enxofre 3.a.ii. AMINOÁCIDOS COM RADICAL “R” POLAR NÃO- CARREGADO São aminoácidos com radicais “R” contendo hidroxilos, sulfidrilos e grupos amida. São hidrofílicos e em número de 7: • Glicina – o mais simples dos AA • Serina – “R” com função álcool • Treonina – “R” com função álcool • Cisteína – possui um radical sulfidrilo • Tirosina – “R” com grupo fenol Aminoácidos página 9 de 70 Carlos Capela • Asparagina – “R” com função amida • Glutamina – “R” com função amida 3.a.iii. AMINOÁCIDOS COM RADICAL “R” POLAR CARREGADO 2 Subclasses: 3.a.iii.1. “R” Carregado Positivamente São AA diamino e monocarboxílicos, em número de 3: • Lisina • Arginina • Histidina 3.a.iii.2. “R” Carregado Negativamente São AA monoamino e dicarboxílicos, em número de 2: • Ácido Aspártico • Ácido Glutâmico Aminoácidos página 10 de 70 Carlos Capela 3.b. Segundo a Natureza dos seus radicais “R” 3.b.i. ÁCIDOS MONOAMINO E MONOCARBOXÍLICOS • Aminoácidos Alifáticos Neutros • Aminoácidos Aromáticos • Aminoácidos Sulfurados • Aminoácidos Álcoois • α-iminoácido • Aminoácidos com resíduo amida 3.b.i.1. Aminoácidos Alifáticos Neutros Representação Aminoácidos Alifáticos Glicina (Gly)1 Alanina (Ala) Valina (Val) Leucina (Leu) Isoleucina (Ile) [G]2 [A] [V] [L] [I] 1 Abreviação 3 letras 2 Abreviação 1 letra Aminoácidos página 11 de 70 Carlos Capela 3.b.i.2. Aminoácidos Aromáticos Representação Aminoácidos Aromáticos Fenilalanina (Phe) Tirosina (Tyr) Triptofano (Trp) [F] [Y] [W] Aminoácidos página 12 de 70 Carlos Capela 3.b.i.3. Aminoácidos Sulfurados Representação Aminoácidos Sulfurados Cisteína (Cys) Metionina (Met) [C] [M] Aminoácidos página 13 de 70 Carlos Capela 3.b.i.4. Aminoácidos Álcoois Representação Aminoácidos Álcoois Serina (Ser) Treonina (Thr) [S] [T] 3.b.i.5. α-Iminoácido Representação α-Iminoácido Prolina (Pro) [P] Aminoácidos página 14 de 70 Carlos Capela 3.b.i.6. Aminoácidos com um resíduo Amida Representação Aminoácidos Amidados Asparagina (Asn) Glutamina (Gln) [N] [Q] Aminoácidos página 15 de 70 Carlos Capela 3.b.ii. ÁCIDOS MONOAMINO E DICARBOXÍLICO Representação Aminoácidos Ácidos Ácido Aspártico (Asp) Ácido Glutâmico (Glu) [D] [E] Aminoácidos página 16 de 70 Carlos Capela 3.b.iii. ÁCIDOS DIAMINO E MONOCARBOXÍLICO Representação Aminoácidos Básicos Histidina (His) Lisina (Lys) Arginina (Arg) [H] [K] [R] Aminoácidos página 17 de 70 Carlos Capela 4.AMINOÁCIDOS EM PROPRIEDADES SOLUÇÃO AQUOSA: QUÍMICAS E ELÉCTRICAS Os aminoácidos são substâncias Anfotéricas, pois, em solução aquosa, comportamse ou como um ácido ou como uma base, formando também iões dipolares, a saber: • O grupo carboxilo ioniza-se em solução aquosa libertando protões, e adquirindo carga negativa. • O grupo amina ioniza-se em solução aquosa aceitando protões e adquirindo carga positiva. Este comportamento depende do pH do meio aquoso em que o aminoácido se encontra. Em meio ácido, os AA tendem a aceitar protões, comportando-se como base e adquirindo carga positiva – ionizam os seus radicais amina. Em meio básico, os AA tendem a doar protões, comportando-se como ácidos e adquirindo carga negativa – ionizam o seu radical carboxilo. O valor de pH onde as cargas eléctricas do aminoácido se igualam e se anulam chama-se Ponto Isoeléctrico, ou pH Isoeléctrico (pHi). No ponto isoeléctrico não há migração, em meio eléctrico nem para o eléctrodo positivo (anôdo) nem para o eléctrodo negativo (cátodo). A esse pH a forma predominante é a de ião dipolar, mas as formas catiónica e aniónica, embora em baixa concentração estão presentes equivalentemente, ou seja, [COO-] = [NH3+]. Quando o pH da solução é inferior ao pHi de um dado aminoácido, este encontra-se em meio ácido, fica carregado positivamente e migra para o cátodo. Quando o pH da solução é superior ao pHi de um dado aminoácido, este encontrase em meio básico, fica carregado negativamente e migra para o ânodo. Aminoácidos página 18 de 70 Carlos Capela B. METABOLISMO DOS AMINOÁCIDOS 1.METABOLISMO GERAL 1.a. Descarboxilação A descarboxilação dos aminoácidos é catalisada pelas descarboxilases, enzimas dependentes do fosfato de piridoxal (forma activa da vitamina B6), que é um cofactor. A descarboxilação consiste na remoção do grupo carboxilo dos aminoácidos transformando-os em aminas. Aminoácidos página 19 de 70 Carlos Capela Aminas formadas por descarboxilação de aminoácidos e seu papel Aminoácido Amina Papel Ácido Aspártico α-alanina Composição das proteínas β-alanina CoA Cisteína Mercaptoetilamina CoA Ácido Glutâmico GABA (ácido γ-aminobutírico) Mediador do SNC Histidina Histamina Acção Hipotensora DOPA Dopamina Percursor da adrenalina Serina Etanolamina Fosfatidos 5-Hidroxitriptofana Serotonina Acções hormonais Tirosina Tiamina Contracção do útero e enxaquecas Ornitina Putrescina Lisina Cadaverina Ácido cisteico Taurina Ácido Cisteico- Hipotaurina Putrefacções sulfínico As aminas obtidas por descarboxilação são depois metabolizadas por intermédio das monoaminooxidases (MAO) que se encontram no fígado, rim e mucosa intestinal, formando-se um aldeído. Aminoácidos página 20 de 70 Carlos Capela 1.b. Transaminação É a reacção fundamental do metabolismo dos aminoácidos podendo fazer-se em todos excepto na prolina, lisina e treonina. Esta reacção consiste na transferência de um grupo amina de um α-aminoácido para um α-cetoácido formando-se a partir do primeiro um outro α-cetoácido e a partir do segundo um novo aminoácido, na presença de enzimas designadas aminotransferases ou transaminases. As aminotransferases são específicas e quase todas utilizam o ácido glutâmico como dador de NH3, e o ácido α-cetoglutárico, como par aminoácido-cetoácido. O ácido glutâmico é assim o principal dador de grupos amina. Aminoácidos página 21 de 70 Carlos Capela Exemplos de transaminações: 1. Ácido glutâmico + ácido oxaloacético ⇔ ácido α-cetoglutárico + ácido aspártico 2. Ácido glutâmico + ácido pirúvico ⇔ ácido α-cetoglutárico + Alanina As reacções das transaminases têm a seguinte utilidade metabólica: • Degradação de aminoácidos; • Biossíntese de aminoácidos não essenciais graças à reversibilidade da reacção; • Conversão dos aminoácidos em glúcidos mediante a transformação posterior dos α-cetoácidos (ácido pirúvico, ácido α-cetoglutárico e ácido oxaloacético); • Síntese de compostos azotados (como a ureia); • Participação, associadas às desaminações, nas reacções de transdesaminação. Em suma, a transaminação é reversível e permite degradar e sintetizar aminoácidos e interliga o metabolismo dos aminoácidos e hidratos de carbono via ácido oxaloacético, ácido α-cetoglutárico e ácido pirúvico. Aminoácidos página 22 de 70 Carlos Capela 1.c. Desaminação Pode ocorrer por um processo geral – desaminação oxidante – ou por processos particulares, específicos de determinados aminoácidos. 1.c.i. A DESAMINAÇÃO OXIDANTE Este processo decorre em várias etapas. Numa primeira fase ocorre uma desidrogenação do aminoácido a iminoácido. Os equivalentes redutores retirados ao substrato vão reduzir a coenzima. O iminoácido hidrolisa-se em α-cetoácidos e amoníaco. A coenzima reduzida é geralmente reoxidada pelo oxigénio molecular com a formação de H2O, na cadeia transportadora de electrões. No entanto, outros aceitadores de electrões podem permitir a reoxidação da coenzima. Algumas desaminases importantes: 1. D-aminoácido-oxidase (cujo coenzima é o FAD); 2. L-aminoácido-oxidase (cujo coenzima é o FMN); Aminoácidos página 23 de 70 Carlos Capela 3. Glicola oxidase que forma o ácido glioxilico; 4. Glutamato desidrogenase – muito importante pois origina o ácido αcetoglutárico, intermediário do ciclo de Krebs. Esta enzima que catalisa esta reacção reversível, utiliza o NADPH na síntese de ácido glutâmico (aminação redutora) e o NAD+ na desaminação oxidante. A interconversão entre o ácido glutâmico e o ácido α-cetoglutárico por desaminação oxidante constitui um importante ponto de contacto entre os metabolismos glucídico e proteico. 1.c.ii. DESAMINAÇÃO NÃO OXIDANTE Este processo ocorre em aminoácidos álcoois como é o caso da serina e treonina. Formam-se α-cetoácidos a partir de uma desidratação prévia seguida de uma hidratação. Por outras palavras, o oxigénio do α-cetoácido já pertencia ao aminoácido, sendo proveniente do grupo OH, o que não acontecia na desaminação oxidativa em que este elemento provinha da água. Aminoácidos página 24 de 70 Carlos Capela No caso da cisteína, o mecanismo reaccional é semelhante. A diferença consiste na perda prévia de H2S (dessulfuração). Tanto a 1ª como a 2ª reacção estão representadas de forma simplificada, pois em todas elas intervêm o grupo prostético das enzimas, o fosfato de piridoxal, que forma intermediariamente uma base de schiff com cada um dos aminoácidos. Aminoácidos página 25 de 70 Carlos Capela 1.d. Desamidação Os ácidos com um grupo amida, como é o caso da asparagina e glutamina, sofrem um processo semelhante ao da desaminação não oxidante. As enzimas asparaginase e glutaminase hidrolisam os respectivos aminoácidos, transformando-os em ácido aspártico e ácido glutâmico pela libertação do radical amida. Os aminoácidos formados serão por sua vez transaminados e transformados no αcetoácido respectivo. 1.e. Transdesaminação O contraste entre a fraca actividade das desaminases (excepto a glutamato desidrogenase) e a grande actividade das transaminases promove a reacção de transdesaminação. Assim considera-se que a maior parte dos aminoácidos são degradados por desaminação oxidante indirecta graças ao sistema transaminase/glutamato desidrogenase. Daqui resulta a transdesaminação (junção das transaminase com a glutamato desidrogenase). Aminoácidos página 26 de 70 Carlos Capela 1.f. Transferência de corpos em C1 No decorrer do metabolismo dos aminoácidos forma-se vários corpos com o carbono1 das moléculas: • Metilo CH3; • Metileno CH2; • Metenilo CH; • Formilo O=CH; • Forminino CHNH; • Anidrido carbónico CO2; O CO2 é utilizado por meio da biotina, enquanto que outros são utilizados pelo ácido tetrahidrofólico (THF). Este é um cofactor em muitas reacções de aminoácidos e um transportador de carbono que facilita a interconversão de grupos. Um exemplo de transferência em C1 é a conversão da serina em glicina pela serina hidroximetiltransferase. Os corpos em C1 transportados pelo THF são depois utilizados em reacções anabólicas, como por exemplo, a síntese de purinas, pirimidinas e na remetilação da homocisteína. Aminoácidos página 27 de 70 Carlos Capela 1.f.i. A TRANSMETILAÇÃO3 O principal dador de metilo é a metionina, que é assim classificada em aminoácido essencial. A S-Adenosil-Metionina é o principal dador de grupos CH3, pois embora o THF possa transportar um grupo metilo no seu azoto 5 ou 10, o seu potencial de transferência não é suficientemente elevado. 3 Ver ciclo de metilo activado Aminoácidos página 28 de 70 Carlos Capela 2.METABOLISMO ESPECIAL 2.a. Biossíntese dos aminoácidos – Anabolismo 2.a.i. INTRODUÇÃO O nitrogénio é um gás que ocorre na atmosfera na proporção aproximada de 79%. Apesar disso, não é utilizado de forma directa pelos seres vivos, com excepção de alguns microorganismos. O seu aproveitamento pela generalidade dos seres vivos está na dependência da sua fixação e posterior nitrificação. A fixação do N2 pode ser feita através de radiação ou da biofixação, sendo este último processo o mais importante. A biofixação é realizada por bactérias, cianobactérias e fungos que podem viver livres no solo ou associados a plantas. Esses organismos são os únicos que conseguem transformar o N2 atmosférico numa forma utilizável pelos seres vivos: o amoníaco (NH3) que em solução aquosa origina a amónia (NH4+). Os biofixadores que vivem associados a plantas são mais eficientes nesse processo que os de vida livre. Isto porque a planta fornece um habitat apropriado, geralmente nos nódulos das raízes, que protege esses microorganismos contra um excesso de O2 (o qual inibe a fixação do nitrogénio) e fornece energia para a realização do processo. Em troca, a planta recebe um elevado suprimento de nitrogénio sob a forma assimilável. Aminoácidos página 29 de 70 Carlos Capela A amónia produzida pelos biofixadores associados é incorporada directamente aos aminoácidos da planta onde vivem. Já a amónia produzida pelos biofixadores de vida livre é transformada em nitrito e depois em nitrato, pela acção das bactérias nitrificantes (Nitrosomonas e Nitrobacter). Essas bactérias são autotroficas quimiossinteticas, que utilizam a energia da nitrificação para a síntese das suas substâncias orgânicas O nitrato pode ser absorvido pelos vegetais e o nitrogénio nele contido é utilizado na síntese de aminoácidos, proteínas e ácidos nucleicos. Essas substâncias são transferidas directa ou indirectamente para os animais, ao longo das cadeias alimentares. Os animais, portanto, só conseguem captar o nitrogénio indispensável para a síntese das suas proteínas e ácidos nucleicos ingerindo directamente plantas ou, indirectamente, alimentando-se de outros animais da cadeia alimentar. O nitrogénio deixa o corpo dos organismos por dois processos: excreção de produtos nitrogenados e/ou decomposição dos organismos mortos. As excreções nitrogenadas: ureia e ácido úrico são transformados em amónia por bactérias e fungos decompositores. Estes organismos também degradam as substâncias nitrogenadas contidas no corpo dos organismos mortos, transformando-as em amónia. A amónia pode retornar ao ciclo sendo transformada em nitrito e nitrato pelas bactérias nitrificantes, ou em nitrogénio (N2), por bactérias desnitrificantes. O N2 volta Aminoácidos página 30 de 70 Carlos Capela para a atmosfera, podendo entrar novamente na fase biológica do ciclo através dos processos de fixação. A síntese dos aminoácidos compreende, de um modo geral, as seguintes etapas: 1. Formação do amoníaco 2. Incorporação do NH3 num composto orgânico: a. Aminação redutora do ácido α-cetoglutárico a ácido glutâmico; b. Formação de uma amida como a glutamina ou asparagina; c. Aminação do ácido fumárico e oxaloacético a ácido aspártico; d. Formação do Carbamil-fosfato. 3. Síntese do esqueleto carbonado dos aminoácidos, isto é, formação dos αcetoácidos correspondentes. Aminoácidos página 31 de 70 Carlos Capela 4. Transferência do grupo amina (NH3) do composto orgânico para o ácido αcetónico ou α-cetoácido. As plantas e outros organismos fotossintéticos sintetizam os 20 aminoácidos comuns das proteínas. Nos mamíferos, um certo número de aminoácidos não pode ser formados através dos mecanismos referidos anteriormente, quer porque os α-cetoácidos correspondentes não se encontram presentes e não podem ser sintetizados, quer porque não podem sofrer aminação ou transaminação. Estes aminoácidos são, no Homem em número de 9. São designados aminoácidos essenciais ou indispensáveis, devendo ser fornecidos pela alimentação. Aminoácidos essenciais para Aminoácidos não essenciais o organismo humano adulto Fenilalanina Alanina Histidina Arginina Isoleucina Ácido aspártico Leucina Asparagina Lisina Ácido glutâmico Metionina Glutamina Treonina Cisteína Triptofano Glicina Valina Prolina Serina Tirosina No homem, a arginina sintetizada pelo ciclo da ureia é suficiente para as necessidades do adulto, mas não para uma criança. A arginina e a histidina são essenciais à criança durante o crescimento. A cisteína e a tirosina são essenciais quando a metionina e a fenilalanina, respectivamente, são insuficientes ou estão ausentes na dieta. A tirosina só é essencial na fenilcetonúria. O esqueleto carbonado dos diferentes aminoácidos resulta de intermediários da glicólise, da via das pentoses fosfato e do ciclo de Krebs. Aminoácidos página 32 de 70 Carlos Capela 2.a.ii. BIOSSÍNTESE DO ÁCIDO GLUTÂMICO O ácido glutâmico resulta de uma aminação redutora do α-cetoácido ácido αcetoglutárico. No fígado, a amónia é incorporada como grupo amino pela glutamato desidrogenase. Esta reacção é reversível. O ácido glutâmico serve como um dador de grupos amina da maioria dos aminoácidos. O NADPH é usado como coenzima na reacção de síntese, enquanto o NAD+ é utilizado na reacção de degradação. A formação de NADH durante a reacção de desaminação oxidante é um bónus bem-vindo, uma vez que pode ser reoxidado pela cadeia respiratória, com a formação de ATP. Como se pode verificar, a reacção é reversível, mas como a amónia é tóxica para o organismo, esta reacção dá-se na direcção da formação do ácido glutâmico ao nível do intestino, enquanto no fígado é enfatizado a sua degradação para síntese dos aminoácidos. A glutamato desidrogenase é regulada alostericamente por nucleótidos púricos. Quando há necessidade de oxidação de aminoácidos para energia, a actividade é aumentada no sentido da degradação do ácido glutâmico por ADP e GDP, que são indicadores de um baixo nível de energia. GTP e ATP são indicativos de um alto nível de energia, e por isso são activadores na direcção da síntese de ácido glutâmico. Aminoácidos página 33 de 70 Carlos Capela 2.a.iii. BIOSSÍNTESE DA GLUTAMINA A amónia livre é tóxica e, é preferencialmente, transportada no sangue na forma de grupos amino ou amida. 50% dos aminoácidos circulantes são glutamina, um transportador de amónia. O grupo amida da glutamina é um importante dador de nitrogénio para as várias classes de moléculas, incluindo bases púricas e pirimídicas, e o grupo amina da citosina. Ácido glutâmico e amónia são substratos para a glutamina sintetase. ATP é necessário para tornar a reacção energeticamente favorável. A remoção do grupo amida é catalisada pela glutaminase. A reacção segue predominantemente para a direita no fígado e nos rins, e o NH3 é secretado na urina directamente ou sob a forma de ureia. A reacção segue predominantemente para a esquerda, por exemplo no cérebro, removendo o NH3, que é tóxico para as células nervosas. O principal destino da glutamina e da alanina no sangue é o fígado. Neste órgão, a amónia é libertada pela alanina aminotransferase, pela glutaminase e pela glutamato desidrogenase. A glutamato desidrogenase, como já vimos, não liberta apenas amónia, mas também produz NADH e ácido α-cetoglutárico, um intermediário glucogénico. Sob condições de necessidade de energia, esses produtos são muito benéficos. Alguma glutamina e alanina têm como destino o rim. Neste, a amónia é libertada pelas mesmas enzimas activas no fígado e excretada. Aminoácidos página 34 de 70 Carlos Capela 2.a.iii.1. Regulação do equilíbrio ácido-base A maioria da amónia, que se encontra na urina, é formada pela desaminação da glutamina, pela actividade da glutaminase da mitocôndria e da membrana do lúmen, que é dependente e independente de ATP, respectivamente. A amónia é relevante no rim no combate à acidose. A amónia difunde nos fluidos tubulares e é neutralizada pelos H+. O NH4+ é eliminado por troca com o sódio e daí resulta reabsorção de sódio e bicarbonato para o plasma. Assim é mantida a neutralidade eléctrica e a reserva alcalina. Por outro lado, quando ocorre acidose, o organismo desvia glutamina do fígado para o rim, para conservar o bicarbonato, uma vez que a formação de ureia, o principal mecanismo de excreção de NH4+, necessita de bicarbonato. Para evitar o uso e a excreção deste anião como ureia, durante a acidose, a captação de glutamina pelo fígado é suprimida e mais glutamina é transportada ao rim, para ser excretada. Aminoácidos página 35 de 70 Carlos Capela 2.a.iv. BIOSSÍNTESE DA ALANINA E ÁCIDO ASPÁRTICO Estes aminoácidos são sintetizados numa única reacção, respectivamente a partir do ácido pirúvico e do ácido oxaloacético, na presença da Alanina aminotransferase e da Aspartato aminotransferase. Como já vimos, o ácido aspártico é um percursor do nucleótidos púricos e pirimídicos, e participa na ureogénese. Por descarboxilação, que pode sofrer quer no carboxilo α quer no carboxilo β origina a α-alanina ou a β-alanina. Alguma β-alanina é formada a partir do propionil-CoA e durante a degradação das pirimidinas. Encontra-se na forma livre no plasma e tecidos ou combinada na carnosina, anserina e ácido pantoténico, componente da coenzima A. Por outro lado, o ácido aspártico pode entrar no ciclo de Krebs e na neoglicogénese, através da perda do seu grupo amina permitindo a formação de outros aminoácidos, dando origem ao ácido oxaloacético que é o ponto de partida destes ciclos. 2.a.v. ASPARAGINA O ácido aspártico pode ser aminado a Asparagina. O grupo amida da asparagina vem da glutamina, e não da amónia livre como na síntese da glutamina. Aminoácidos página 36 de 70 Carlos Capela O ATP é necessário para activar o grupo carboxilo receptor. A enzima responsável pela síntese é a asparagina sintetase. A molécula de ácido glutâmico regressa ao ciclo glutamina sintetase para incorporar mais amoníaco. A enzima responsável pela degradação é a asparaginase. 2.a.vi. SERINA E GLICINA A serina e a glicina são 2 aminoácidos interconvertíveis. No entanto, a glicina que é o mais simples, é sintetizada posteriormente. A Serina resulta do ácido 3-fosfoglicérico, um intermediário da glicólise. Uma desidrogenase NADH-dependente converte o ácido 3-fosfoglicérico a um α-cetoácido, o ácido 3-fosfopirúvico, capaz de subsequente transaminação. A actividade de uma aminotransferase com o ácido glutâmico como dador produz 3-fosfoserina, a qual é convertida a serina pela fosfoserina fosfatase. Aminoácidos página 37 de 70 Carlos Capela A grande via de síntese de glicina é uma reacção catalisada pela serina hidroximetilltransferase. Esta reacção envolve a transferência do grupo hidroximetil da serina para o cofactor tetrahidrofolato (THF), produzindo N5,N10-metileno-THF. Na realidade, a reacção serina-glicina é a principal fonte de unidades monocarbonadas na forma N5,N10-metileno-THF. Aminoácidos página 38 de 70 Carlos Capela A Glicina está envolvida em muitas reacções anabólicas incluindo a síntese de nucleótidos de purina, heme, glutatião, creatina e serina. 2.a.vii. ARGININA, PROLINA E ORNITINA A ornitina (percursora da citrulina e Arginina) e a Prolina são ambas sintetizadas a partir do ácido glutâmico e degradadas por uma via levemente diferente, novamente a ácido glutâmico. A síntese destes dois aminoácidos, a ornitina e a prolina, começa a partir do ácido glutâmico, com uma reacção compartilhada que utiliza ATP e NADH, e forma o γ-semialdeído glutâmico. Este, espontaneamente cicliza-se formando uma base de Schiff – ácido pirrolidina-5-carboxílico – entre o aldeído e o grupo amina. O ácido pirrolidina-5-carboxílico é então reduzido pelo NADPH ou NADH, originando a Prolina. O γ-semialdeído glutâmico pode submeter-se à transaminação do grupo aldeído, evitando a ciclização e produzindo a Ornitina. A produção de Arginina para síntese proteica e não como intermediário do ciclo da ureia, ocorre no rim, que não possui arginase (e por isso não produz ureia). O principal local de síntese da citrulina para ser usada como percursora da arginina é a mucosa intestinal que possui todas as enzimas necessárias para converter o ácido glutâmico, via ornitina, a citrulina, que é então transportada para o rim a fim de produzir arginina. Aminoácidos página 39 de 70 Carlos Capela Aminoácidos página 40 de 70 Carlos Capela 2.a.viii. METIONINA, CISTEÍNA E CISTINA Existem 3 aminoácidos sulfurados, a Metionina, a Cisteína e a Cistina. Os 2 últimos são facilmente inconvertíveis por oxidação-redução. A cistina é bastante importante na estabilização da estrutura das proteínas, uma vez que é responsável pela formação das pontes dissulfeto. A metionina é um aminoácido essencial, o que não acontece com a cisteína. Contudo, quando se fornece cisteína, as necessidades de metionina diminuem. Além da sua importância como aminoácido constituinte das proteínas e iniciador da biossíntese proteica, a metionina, é sobretudo um fornecedor de grupos metilo. Mas para actuar como tal, tem de ser activada pelo ATP a S-Adenosil-Metionina (SAM), que é o composto activado que participa nos processos de transmetilação. A S-Adenosil-Metionina é, assim, sintetizada pela transferência de um grupo Adenosilo do ATP para o átomo de enxofre da metionina. É a carga positiva adquirida pelo enxofre que torna este grupo metilo muito mais reactivo que o ácido N5-metilTHF. Note-se que nesta reacção são hidrolisadas todas as ligações de elevado potencial energético do ATP (visto que o pirofosfato também será hidrolisado). A S-Adenosil-Metionina pode ceder o seu metilo a compostos diversos, passando a S-Adenosil-Homocisteína. Este mecanismo intervém, por exemplo, na síntese da colina, da creatina, da adrenalina, etc. A S-Adenosil-Metionina é seguidamente hidrolisada em homocisteína e adenosina. A homocisteína é agressiva para o endotélio. Esta pode ser eliminada por remetilação Aminoácidos página 41 de 70 Carlos Capela (transferência de um grupo metilo) do ácido N5-metil-THF, formando Metionina. Se a homocisteína for fornecida na alimentação, pode-se formar Metionina. O conjunto de reacções aqui descrito constitui o Ciclo do Metilo activado. A homocisteína, formada pela desmetilação da metionina, além de ser um percursor da metionina no ciclo do metilo activado, pode ser eliminada através da síntese de cisteína. Esta reacção catalisada pela Cistationina sintetase e Cistationina Liase, tratase de uma transulfuração. No Homem é irreversível, daí não podermos sintetizar Metionina através da cisteína, e somente cisteína a partir da Metionina. Aminoácidos página 42 de 70 Carlos Capela Aminoácidos página 43 de 70 Carlos Capela 2.a.ix. FENILALANINA E TIROSINA A fenilalanina e tirosina são discutidas juntas, uma vez que a tirosina resulta da hidroxilação da fenilalanina. A maior parte da fenilalanina é utilizada na síntese de proteínas e Tirosina nos indivíduos normais. ¾ da fenilalanina ingerida é metabolizada a tirosina. O metabolismo da fenilalanina inicia-se pela conversão irreversível a tirosina, catalisada pela fenilalanina-4-monooxigenase ou fenilalanina-4-hidroxilase, na presença de oxigénio molecular e tetrahidrobiopterina (THP). O NADPH é o dador de H+ na hidroxilação e mantém a biopterina na forma de tetrahidrobiopterina. A dihidropteridina redutase permite a reutilização da coenzima, cuja função é transferir equivalentes redutores do NADPH para o oxigénio. A tetrahidrobiopterina é um composto ácido fólico – “like”, mas raramente é utilizada como transportador de electrões. Aminoácidos página 44 de 70 Carlos Capela 2.b. Degradação dos Aminoácidos - Catabolismo É o conjunto complexo de vias de degradação dos aminoácidos para produção de energia. Não há uma via catabólica comum a todos os 20 aminoácidos; existem grupos de aminoácidos que possuem vias de degradação distintas. Os aminoácidos são obtidos a partir da hidrólise das proteínas, e a sua utilização como fonte de energia ocorre em 3 situações metabólicas principais: • Na dinâmica normal de renovação das proteínas; • No jejum prolongado; • Na “diabetes mellitus”. 2.b.i. MECANISMO GERAL DE DEGRADAÇÃO DE AMINOÁCIDOS: Apesar de cada grupo de aminoácidos possuir um caminho metabólico próprio de degradação, há um mecanismo comum de remoção do nitrogénio da molécula, através da acção das transaminases. AA ⇒ esqueleto carbonado + amónia O esqueleto carbonado do AA é dirigido para a oxidação, geralmente como intermediário do Ciclo de Krebs, e a amónia, por ser muito tóxica, é eliminada do organismo. Alguns aminoácidos são desaminados por vias especiais, onde a reacção não é catalizada por transaminases. Aminoácidos página 45 de 70 Carlos Capela 2.b.ii. O PAPEL DO ÁCIDO GLUTÂMICO O ácido glutâmico é um intermediário que funciona como um reservatório temporário de grupos amina de vários aminoácidos. Ele é formado pela acção das transaminases, que removem o grupo amina do AA e o doam para o ácido α-cetoglutárico: AA + ácido α-Cetoglutárico ⇒ α-Cetoácido + Ácido Glutâmico Ex: na reacção catalizada pela Alanina-Transaminase (ALT): Alanina + ácido α-Cetoglutárico ⇒ Ácido Pirúvico + Ácido Glutâmico O Ácido Glutâmico formado reage com o ácido oxaloacético para formar novamente o ácido α-Cetoglutárico e o ácido Aspártico, sendo assim consumido e deslocando para a direita o equilíbrio da reacção acima. O ácido Aspártico também é utilizado na síntese da ureia, a forma de eliminação do grupo amina libertado como amónia nas reacções de desaminação: Ácido Glutâmico + ácido oxaloacético ⇒ ácido α-Cetoglutárico + ácido Aspártico A reacção é catalizada pela Aspartato-Transaminase (AST), a transaminase mais activa dos tecidos de mamíferos. Aminoácidos página 46 de 70 Carlos Capela 2.b.iii. ELIMINAÇÃO DA AMÓNIA: A amónia que se forma no catabolismo das proteínas e aminoácidos será biotransformada no fígado a ureia, um composto menos tóxico que pode ser levado pela corrente sanguínea aos rins, onde será filtrada e eliminada. O processo envolve: • O transporte de amónia ao fígado; • A biotransformação no Ciclo da Ureia. 2.b.iii.1. Transporte de Amónia ao Fígado: A amónia é transportada ao fígado de 2 formas principais: como Glutamina e como Alanina. 2.b.iii.1.a. Transporte de amónia como Glutamina Ocorre na remoção da amónia de muitos tecidos periféricos (glutamina sintetase) ATP + NH4+ + ácido Glutâmico ⇒ ADP + Pi + Glutamina + H+ A glutamina, no fígado, é convertida por hidrólise em ácido glutâmico (glutaminase), libertando a amónia para biotransformação. Glutamina + H2O ⇒ Ácido Glutâmico + NH4+ 2.b.iii.1.b. Transporte de Amónia como Alanina: A alanina faz o transporte da amónia do músculo ao fígado para biotransformação. Este transporte depende da formação do ácido glutâmico a partir do ácido αCetoglutárico, e da posterior formação da alanina através da reacção da AlaninaTransaminase, já descrita. A reacção inversa ocorre quando a alanina chega ao fígado. Aminoácidos página 47 de 70 Carlos Capela 2.b.iii.2. Ciclo da Ureia ou de Krebs-Henseleit: O ciclo da ureia é uma via metabólica cíclica também descrita por Krebs, e que transforma 2 moléculas de amónia e 1 molécula de gás carbónico numa molécula de ureia. Possui várias e complexas etapas enzimáticas, e gasta 3 ATPs para cada ureia sintetizada. Compostos como o ácido fumárico, o ácido aspártico, o ácido glutâmico e o ácido α-Cetoglutárico participam no processo, que envolve também 2 enzimas mitocôndriais e 3 citosólicas. 2.b.iii.2.a. Formação de Carbamil-fosfato A 1ª etapa, consiste na condensação de CO2, amoníaco e ATP para formar o Carbamil-fosfato (uma forma activada de azoto), através de uma reacção catalisada pela Carbamil fosfato sintetase, tendo como coenzima a Biotina. Esta enzima tem como factor alostérico positivo o ácido-N-acetil-glutâmico e negativo a Arginina. 2.b.iii.2.b. Formação de Citrulina Na 2ª etapa, o Carbamil-fosfato é transferido para a Ornitina formando a Citrulina, sendo esta reacção catalisada pela Ornitina Transcarbamilase. A ornitina e a citrulina são dois aminoácidos não proteicos ou livres. Aminoácidos página 48 de 70 Carlos Capela Estas duas primeiras reacções ocorrem no interior da mitocôndria. A citrulina é então transferida para o citoplasma, onde ocorre o resto do ciclo, através da citrulina translocase. 2.b.iii.2.c. Formação do Ácido Arginosuccínico Já no citoplasma, dá-se a 3ª reacção do ciclo, que consiste, na condensação da citrulina com o ácido aspártico. Esta reacção é catalisada pela arginosuccinato sintetase, na presença de ATP e Mg2+, e dá formação ao Ácido Arginosuccínico. Nesta reacção o ATP é hidrolisado a AMP, em vez de ADP (como acontece normalmente). Como o AMP pode receber um fosfato do ATP, dando origem a 2 ADP, hidrolisar ATP a AMP é equivalente a hidrolisar 2 ATP a 2 ADP. 2.b.iii.2.d. Cisão do Ácido Argininosuccínico Na 4ª etapa, o ácido Arginosuccínico cinde-se em Arginina e Ácido Fumárico, pela acção da Arginosuccinase. Aminoácidos página 49 de 70 Carlos Capela O ácido fumárico é convertido em ácido málico e este em ácido oxaloacético pelo ciclo de Krebs. O ácido oxaloacético reage com uma molécula de NH3 proveniente do ácido glutâmico e regenera o ácido aspártico que, por sua vez, dá origem ao ácido arginosuccínico por acção da arginosucinato sintetase. 2.b.iii.2.e. Formação da ureia A arginina é hidrolisada pela Arginase, enzima que se encontra principalmente no fígado, dando origem à ureia, regenerando a Ornitina. O rim não possui esta enzima, mas possui as restantes, daí que seja o principal local de síntese do aminoácido arginina. Aminoácidos página 50 de 70 Carlos Capela Diagrama-resumo do Ciclo da Ureia Ureia Arginase Carbamil-P L-Ornitina L-Arginina Sintetase Ornitina Transcarbamilase Carbamil-P Citrulina Translocase Arginosuccinase Ácido Fumárico Arginosuccinato Sintetase L-Citrulina Ácido Arginosuccínico L-Ácido aspártico Aminoácidos página 51 de 70 Carlos Capela 2.b.iv. O DESTINO DOS ESQUELETOS CARBONADOS: Os α-Cetoácidos formados pela desaminação dos aminoácidos podem ser convertido a ácido Pirúvico, Acetil-CoA ou intermediários do Ciclo de Krebs, para serem oxidados com produção de energia. Consoante os compostos que originam por degradação, os aminoácidos são classificados em 2 grupos: • Glicogénicos ou Glicoformadores: se originam ácido pirúvico ou intermediários do ciclo de Krebs; • Cetogénicos ou Cetoformadores: se originam compostos cetónicos. Glicogénicos Cetogénicos Ácido aspártico Ácido glutâmico Leucina Asparagina Glutamina Lisina Alanina Arginina Treonina Prolina Cisteína Histidina Glicina Metionina Serina Valina Glicogénicos e Cetogénicos Isoleucina Fenilalanina Triptofano Tirosina 2.b.iv.1. Glicina e Serina A glicina pode ser convertida reversivelmente em serina pela intervenção de 2 coenzimas: o fosfato de piridoxal e o ácido tetrahidrofólico (THF). A serina é catabolisada directamente a ácido pirúvico por desaminação não oxidativa, catabolisada pela serina desidratase, que elimina o NH3 e requer fosfato de piridoxal. Aminoácidos página 52 de 70 Carlos Capela 2.b.iv.2. Alanina A sua transaminação origina directamente ácido pirúvico. 2.b.iv.3. Cisteína A cisteína sofre uma desaminação não oxidativa originando ácido pirúvico com libertação de NH3. 2.b.iv.4. Ácido Aspártico e Asparagina O ácido aspártico pode ser transaminado directamente a ácido oxaloacético. O ácido aspártico pode também ser convertido em ácido fumárico pelo ciclo da ureia. A asparagina é hidrolisada pela asparaginase a ácido aspártico e NH3. Aminoácidos página 53 de 70 Carlos Capela 2.b.iv.5. Ácido Glutâmico, Glutamina, Prolina, Arginina e Histidina A glutamina origina ácido glutâmico e NH3 por acção da glutaminase. A prolina e a arginina são convertidas em γ-semialdeido glutâmico, o qual é oxidado a ácido glutâmico. A histidina é um aminoácido essencial percursor do ácido glutâmico, por isso, é um aminoácido glucogénico. Aminoácidos página 54 de 70 Carlos Capela O ácido glutâmico através de uma desaminação oxidante, catalisada pela glutamato desidrogenase, origina ácido α-cetoglutárico. 2.b.iv.6. Valina, Isoleucina e Leucina O catabolismo da valina, isoleucina e leucina é comum no 1º e 2º passos e envolve a transaminação aos correspondentes α-cetoácidos, seguida de descarboxilação oxidativa a ésteres de CoA. Assim, a leucina é exclusivamente cetogénico (acetil-CoA e ácido acetoacético), enquanto a Valina é glucogénico (propionil-CoA) e a Isoleucina é simultaneamente, glucogénico e cetogénico (acetil-CoA e propionil-CoA). O propionil-CoA é metabolisado a succinil-CoA. 2.b.iv.7. Lisina A lisina é catabolisada a ácido acetoacético (cetogénico). A carnitina deriva da lisina. Esta é fundamental no transporte de ácidos gordos de cadeia longa activados através da membrana interna da mitocôndria, local onde são oxidados. Aminoácidos página 55 de 70 Carlos Capela 2.b.iv.8. Metionina A metionina é catabolisada a cisteína e a ácido α-cetobutírico. Este último dá origem ao propionil-CoA que entra no ciclo de Krebs como Succinil-CoA. 2.b.iv.9. Treonina A treonina é geralmente catabolisada a ácido pirúvico. Um intermediário desta via pode sofrer tiólise com a CoA e dar origem a Acetil-CoA e glicina. Outra via alternativa, converte a treonina em ácido α-cetobutírico e este em propionil-CoA. 2.b.iv.10. Fenilalanina e Tirosina A degradação da tirosina acompanha a da fenilalanina, uma vez que esta é hidroxilada a tirosina pela fenilalanina hidroxilase. A via principal do metabolismo da tirosina é a formação do ácido acetoacético e ácido fumárico, por isso é simultaneamente, um aminoácido cetogénico e glucogénico. Aminoácidos página 56 de 70 Carlos Capela 2.b.iv.11. Triptofano O catabolismo do triptofano tem muitos pontos de ramificação. O triptofano é simultaneamente, glucogénico e cetogénico, dado que são formados Alanina e acetoacetil-CoA, respectivamente. 2.b.iv.12. Em resumo 2.b.iv.12.a. Os aminoácidos que são convertidos a ácido pirúvico são: • Alanina • Triptofano • Cisteína • Serina • Glicina • Treonina 2.b.iv.12.b. Os aminoácidos que são convertidos em ácido α-Cetoglutárico: • Ácido Glutâmico • Glutamina • Prolina • Arginina • Histidina 2.b.iv.12.c. Aminoácidos que são convertidos a ácido Oxaloacético: • Ácido Aspártico • Asparagina 2.b.iv.12.d. Aminoácidos que são convertidos a Ácido Fumárico: • Tirosina • Fenilalanina Aminoácidos página 57 de 70 Carlos Capela 2.b.iv.12.e. Aminoácidos que são convertidos a Succinil-CoA: • Valina • Isoleucina • Treonina 2.b.iv.12.f.Aminoácidos que são convertidos a Acetil-CoA • Leucina • Triptofano • Lisina Aminoácidos página 58 de 70 Carlos Capela C. DERIVADOS DE AMINOÁCIDOS 1.CREATINA A Creatina é sintetizada no fígado a partir da metilação do ácido Guanidinoacético, sendo este processo catalisado pela enzima Guanidinoacetato metiltransferase que utiliza a S-Adenosil-Metionina como dador do grupo metilo. O ácido Guanidinoacético é formado no rim a partir dos aminoácidos arginina e glicina, reacção catalisada pela Glicina amidinotransferase. Glicina amidinotransferase no Rim Ácido Guanidinoacético Glicina Ornitina Guanidinoacetato S-Adenosil metiltransferase Metionina no Fígado S-Adenosil Arginina Homocisteina Creatina Não enzimática Creatina Fosfocinase Creatinina Creatina Fosfato Aminoácidos página 59 de 70 Carlos Capela A creatina é usada como armazenador de energia. O fosfato do ATP é transferido para a creatina, gerando creatina fosfato, através da acção da Creatina fosfocinase (CPK). Esta reacção é reversível, daí que quando é necessário energia (ex: contracção muscular), a creatina fosfato doa o seu fosfato ao ADP para formar ATP. Tanto a creatina como a creatina fosfato são encontradas no músculo, cérebro e sangue. Cerca de 1-2% da creatina fosfato pré-existente é ciclada não enzimaticamente a creatinina com a perda do fosfato e de uma molécula de água. A creatinina é excretada na urina, e nova creatina é sintetizada para a substituir. A quantidade de creatina excretada por um indivíduo é, portanto constante de um dia para outro, e está relacionada com a massa muscular. Assim o nível de creatinina excretada (Creatinina clearance rate) é uma medida da função renal. Aminoácidos página 60 de 70 Carlos Capela 2.GLUTATIÃO O glutatião, o tripéptido γ-glutamilcisteinilglicina (abreviação GSH), tem várias funções importantes no organismo: • É um redutor; • É conjugado com fármacos para torná-los mais solúveis em água; • Está envolvido no transporte de aminoácidos através da membrana celular (o ciclo do γ-Glutamilo); • É parte da estrutura de alguns leucotrienos; • É um cofactor para algumas reacções enzimáticas; • É um auxiliar no rearranjo de pontes dissulfeto das proteínas. O glutatião é sintetizado a partir de três aminoácidos. É sintetizado pela formação do dipéptido γ-glutamilcisteína e adição subsequente de glicina. Ambas as reacções requerem a activação dos grupos carboxilo pelo ATP. A síntese do glutatião é amplamente regulada pela disponibilidade de cisteína. Ácido Glutâmico Cisteína γ-Glutamilcisteína Glicina γ-Glutamilcisteinilglicina ou Glutatião Aminoácidos página 61 de 70 Carlos Capela Como redutor é muito importante na manutenção da estabilidade das membranas eritrocitárias. O seu grupo sulfidrilo pode ser usado para reduzir os peróxidos formados durante o transporte de oxigénio (glutatião peroxidase). A forma oxidada do glutatião consiste em 2 moléculas unidas por uma ponte dissulfeto. Esta forma é reduzida pela glutatião reductase a 2 moléculas de glutatião à custa de NADPH. Como vemos a via das pentoses fosfato é muito importante nos eritrócitos, para a produção de NADPH, necessário à glutatião reductase. De facto, 10% do consumo da glicose, pelos eritrócitos, é na via da pentoses-fosfato. NADP+ NADPH + H+ Glutatião Reductase Glutatião Peroxidase H2O2 2 Glutatião (GSH) 2 H2 O Glutatião dissulfeto (GSSG) A conjugação de fármacos com o glutatião, depois de uma reacção pré-eliminar catalisada pelo citocromo P450, torna-os mais polares e portanto mais solúveis em água. Aminoácidos página 62 de 70 Carlos Capela 2.a. Ciclo do γ-Glutamilo ou de Meister O teor em aminoácidos do “pool” plasmático circulante depende do equilíbrio que se estabelece entre os processos que adicionam aminoácidos (dieta, degradação das proteínas endógenas e síntese de novo), e os que retiram aminoácidos (síntese de proteínas, síntese de compostos nitrogenados) e a perda na urina. Os aminoácidos do “pool” plasmático são transportados, rapidamente, através da membrana plasmática para o interior da célula, tendo sido evidenciados pelo menos sete transportadores diferentes. Sistemas transportadores dos aminoácidos na membrana da célula dos mamíferos Transportador Sistema A Aminoácidos Ala, Gly, Met, Pro e Ser Sistema ASCP Ala, Cys, Pro e Ser Sistema L Phe, Ile, Leu, Met, Trp, Tyr e Val Sistema Ly Arg, His, Lys e Orn Sistema dos Asp e Glu dicarboxílicos Sistema β β-alanina e taurina Sistema N Asn, Gln e His Todavia, a especificidade não é absoluta, sendo influenciada por múltiplos factores, em particular a concentração dos aminoácidos. O ciclo do γ-glutamilo é um sistema de transporte diferente dos anteriores. Foi proposto por Alton Meister e opera, fundamentalmente, nas células hepáticas e renais. Inicia-se com a transpeptização (transferência) de um resíduo do glutatião (γ-Glu-CysGly) para o grupo α-amina do aminoácido candidato ao transporte, catalisada pela γ- Aminoácidos página 63 de 70 Carlos Capela glutamiltransferase ou γ-glutamiltranspeptidase da superfície externa da membrana plasmática. O γ-Glu-aminoácido (γ-glutamilaminoácido) é transportado para o citosol e, posteriormente, clivado pela γ-glutamilciclotransferase, que liberta o aminoácido e cicliza o grupo γ-glutamilo a 5-oxoprolina ou ácido piroglutâmico. A Cys-Gly (cisteinilglicina) do citosol é hidrolisada por uma dipeptidase a Cys e Gly. Para regenerar o glutatião, o ácido glutâmico é regenerado a partir da 5-oxoprolina pela 5-oxoprolinase com gasto de ATP, e assim o glutatião é novamente sintetizado a partir dos seus 3 componentes. 3 ATPs são usados na regeneração do glutatião, um na formação do ácido glutâmico a partir da 5-oxoprolina e 2 na formação das ligações peptídicas. Apesar de ser energeticamente dispendioso é um ciclo bastante rápido. É graças a este ciclo que todos os aminoácidos (excepto a prolina) e pequenos péptidos podem ser transportados para dentro da célula. Aminoácidos página 64 de 70 Carlos Capela 3.NEUROTRANSMISSORES DERIVADOS DA TIROSINA Parte da tirosina é usada como percursora das catecolaminas. O destino metabólico eventual dos carbonos da tirosina é determinado pelo primeiro passo da via. A síntese de catecolaminas começa com a tirosina hidroxilase, que, como a fenilalanina e a triptofano hidroxilase, é dependente de Tetraidrobiopterina. A tirosina hidroxilase produz diidroxifenilalanina, também conhecido como DOPA. Na substância cinzenta e em algumas partes do cérebro, esta é a ultima enzima da via. A medula da supra-renal converte a Dopamina em norepinefrina e epinefrina (também designada adrenalina). O grupo metil da epinefrina é derivado da S-AdenosilMetionina. As catecolaminas são metabolizadas pela monoamina oxidase. Tirosina Tirosina Hidroxilase Tetraidrobiopterina + O2 Diidrobiopterina + H2O Epinefrina S-adenosilHomocisteina S-adenosilmetionina Feniletanolamina N-metiltransferase Norepinefrina DOPA DOPA Dopamina Descarboxilase β-Hidroxilase 3,4-Diidroxifenilalanina Dopamina Aminoácidos página 65 de 70 Carlos Capela 4.NEUROTRANSMISSORES DERIVADOS DO TRIPTOFANO O Triptofano é um percursor para a síntese de Serotonina (5-hidroxitriptamina, 5HT) e Melatonina (N-acetil-5-metoxitriptamina). 4.a. A Serotonina A serotonina (5-hidroxitriptamina) resulta da hidroxilação do triptofano por uma enzima dependente de tetraidrobiopterina e da descarboxilação por uma enzima que contêm fosfato de piridoxal. É um neurotransmissor no cérebro e causa a contracção da musculatura lisa das arteríolas e bronquíolos. É amplamente distribuída no corpo e deve possuir outros papéis fisiológicos. Aminoácidos página 66 de 70 Carlos Capela 4.b. A Melatonina A Melatonina (N-acetil-5-metoxitriptamina) é uma molécula indutora do sono. A Acetiltransferase necessária para a sua síntese encontra-se na glândula pineal e na retina. A melatonina está envolvida na regulação do ritmo circadiano, sendo sintetizada principalmente durante a noite. Parece funcionar através da inibição da síntese e da secreção de outros neurotransmissores, como a dopamina e o GABA. A libertação de melatonina pela glândula pineal é um exemplo de um biorritmo. O sinal interno é fornecido por um neurotransmissor, neste caso a norepinefrina produzida por um neurónio adrenérgico. Neste sistema, o controlo é exercido pela luz que entra nos olhos e é transmitida à glândula pineal através do SNC. O neurónio adrenérgico que enerva o pinealócito é inibido pela luz transmitida através dos olhos. A norepinefrina, libertada como neurotransmissor no escuro, estimula a formação de cAMP através de um receptor β na membrana celular do pinealócito, que leva à síntese aumentada de Acetiltransferase. A actividade aumentada desta enzima causa a conversão de serotonina a Nacetilserotonina e a hidroxiindol-O-metiltransferase (HIOMT) catalisa a conversão da N-acetilserotonina em melatonina, que é secretada nas horas de escuro, mas não nas horas de claridade. A melatonina circula até às células que contem receptores, gerando efeitos sobre funções reprodutivas e outras. Demonstrou-se que a melatonina exerce um efeito antigonadotrófico. Aminoácidos página 67 de 70 Carlos Capela D. AMINOACIDÚRIAS As Aminoacidúrias são doenças raras do metabolismo dos aminoácidos, quase sempre associadas ao catabolismo. As aminoacidúrias primárias são autossómicas recessivas, e são devidas à ausência ou diminuição da actividade das enzimas. Afectam normalmente um aminoácido. As aminoacidúrias secundárias estão, geralmente, associadas à elevada concentração dos aminoácidos no plasma, ou à deficiência nos mecanismos de transporte dos aminoácidos, e afectam, simultaneamente vários aminoácidos. A desnutrição proteica, lesões em órgãos ou disfunção tubular generalizada estão na origem das aminoacidúrias secundárias. 1.A FENILCETONÚRIA A fenilcetonúria ou oligofrenia fenilpirúvica é a aminoacidúria mais comum e estudada. Resulta da deficiência autossómica recessiva da fenilalanina-4- monoxigenase/fenilalanina-4-hidroxilase ou, mais raramente, da tetrahidrobiopteridina, fundamental à conversão de fenilalanina em tirosina. Na fenilcetonúria clássica, a deficiência da fenilalanina hidroxilase é total em 50% dos casos, ou a actividade é baixa por diminuição da síntese ou por alteração da enzima. Devido a esta deficiência, a fenilalanina é metabolizada por uma via alternativa, e os metabólitos (ácido fenilacético e ácido fenil-láctico) são acumulados nos fluidos biológicos. Estes metabólitos são inibidores competitivos do transporte dos aminoácidos na célula e podem alterar o metabolismo das aminas biogéneas. São, ainda responsáveis, por lesões progressivas e irreversíveis do cérebro nos primeiros meses de vida, que conduzem a anormalidades neurológicas e a atraso mental. Outra característica é a cor clara da pele e dos olhos devido à falta de pigmentação, cujo motivo é a falta de tirosina. O tratamento convencional é uma dieta pobre em fenilalanina, mas contendo tirosina (que passa a ser uma aminoácido essencial pois não é formado a partir da fenilalanina) é extremamente eficaz, por isso o diagnóstico precoce é fundamental. Por Aminoácidos página 68 de 70 Carlos Capela isso o teste de triagem de rotina “o teste do pezinho” é obrigatório em muitos países do mundo. A fenilalanina não deve ser completamente retirada por ser necessária ao crescimento e desenvolvimento normal do organismo, pois não nos esqueçamos que se trata de um aminoácido essencial. A deficiência em tetrahidrobiopteridina, por deficiência, quer da dihidrobiopteridina sintetase, quer da dihidrobiopteridina redutase, pode ocorrer em 1-3% dos recém nascidos com fenilcetonúria clássica. A tetrahidrobiopteridina não é somente coenzima da fenilalanina hidroxilase, mas também da tirosina hidroxilase e triptofano hidroxilase, ou seja, é necessária à síntese da dopamina, nor-adrenalina e serotonina (neurotransmissores) e, a deficiência causa doença neurológica progressiva grave, que não é prevenida pela dieta. Contudo, a terapêutica com percursores dos neurotransmissores tem relevado algum benefício clínico. 2.O ALBINISMO O albinismo deve-se à deficiência da tirosinase necessária à síntese de melanina. A melanina é responsável pela pigmentação da pele, cabelo e olhos, por isso, os albinos são muito susceptíveis a queimaduras solares, carcinomas da pele e fotofobia. 3.HOMOCISTINÚRIA A homocistinúria mais comum é devida à deficiência da cistationina sintetase, que resulta num aumento de homocisteína e a sua remetilação origina elevados níveis de metionina. A sua deficiência é hereditária. O excesso de homocisteína no sangue (hiperhomocisteinémia), pode formar um tiolactona, a homocisteína tiolactona, um intermediário altamente reactivo no qual o grupo amino tiolato livre, provoca a oxidação das LDL (lipoproteínas de baixa densidade), o que faz com elas se agreguem e sejam endocitadas por macrófagos. Os depósitos excessivos de lípidos na parede das artérias formam ateromas. A Aminoácidos página 69 de 70 Carlos Capela homocisteína e a sua lactona, podem ter outros efeitos, incluindo a lipoperoxidação e agregação plaquetária, que por sua vez levam a fibrose e calcificação das placas ateroscleróticas. Cerca de ¼ dos pacientes com aterosclerose que não apresentam nenhum dos outros factores de risco (hábito de fumar e terapia contraceptiva oral) têm mostrado serem deficientes na actividade da cistationina sintetase. 4.A CISTINÚRIA A cistinúria é um defeito no transporte de membrana de cistina e aminoácidos básicos (lisina, arginina e ornitina), que resulta na sua excreção renal aumentada. A baixa solubilidade da cistina, resulta em cristais e formação de cálculos, uma característica desta doença. O tratamento é limitado à remoção dos cálculos, à prevenção da precipitação pela ingestão de grandes quantidades de água, à alcalinização da urina para solubilizar a cistina ou à formação de derivados solúveis pela conjugação com fármacos. 5.CISTINOSE É mais grave que a cistinúria, pois a cistina acumula-se no lisossomas. A cistina forma cristais em muitas células, com a perda séria da função dos rins, normalmente causando insuficiência renal em 10 anos. O defeito encontra-se no transporte da cistina na membrana dos lisossomas. Aminoácidos página 70 de 70