conversão de conhecimento tácito em explícito na

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1
INTRODUÇÃO
O particular interesse pelo tema: CONVERSÃO DO CONHECIMENTO TÁCITO
EM EXPLÍCITO NA COMUNIDADE VIRTUAL DE DESENVOLVIMENTO DE
SOFTWARE LIVRE “LINUX UBUNTU”, se inicia no ano de 2003 quando o autor dessa
pesquisa adota o software livre como padrão em seu computador pessoal. Desde então passou
a integrar times de desenvolvimento do sistema operacional Linux Ubuntu, nos times de:
Tradução, Bugsquad e Brainstorm Team. Ao entrar no curso de Administração na
Universidade Federal da Paraíba, o autor dessa pesquisa foi apresentado à gestão do
conhecimento nas organizações onde apresentando interesse particular em software livre e
profissional em Gestão do conhecimento chegou problemática citada anteriormente. As
exigências parciais para a obtenção do grau de Bacharel em Administração motivaram a
empreender uma pesquisa nos seguintes campos de estudo: Gestão do conhecimento e
desenvolvimento de software livre.
Logo para a investigação do fenômeno da externalização do conhecimento em
comunidades de desenvolvimento de software livre foi fixado o seguinte objetivo geral:
Analisar como os colaboradores do software livre Linux Ubuntu conseguem externalizar o
conhecimento tácito e contribuir na elaboração deste software via colaboração mediada por
computador. Visando a operacionalização desse objetivo, foram elaborados os seguintes
objetivos específicos:
•
Caracterizar a colaboração mediada por computador para o desenvolvimento de
software livre.
•
Identificar conhecimentos tácitos no desenvolvimento do Ubuntu Linux.
•
Identificar eventos de transformação de conhecimento tácito em explícito durante o
desenvolvimento de software livre.
A presente pesquisa foi conduzida sob uma estratégia netnográfica, que para Kozinets
(1998) é um método de pesquisa recomendada para a investigação de fenômenos em
ambientes virtuais e baseada exclusivamente na participação direta e imersão do pesquisador
em elementos da cultura. A partir da participação nas comunidades virtuais, foi possível
extrair o material empírico para o confronto entre o modelo teórico de externalização do
conhecimento escolhido e os discursos extraídos nas comunidades.
11
2
DELIMITAÇÃO DO TEMA E PROBLEMA DE PESQUISA
Criado como alternativa em relação ao software proprietário, o software livre tem
ganhado notoriedade em função do desenvolvimento de softwares de excelente qualidade e
aceitação pelos usuários finais. Essencialmente diferente do software proprietário e marcado
por características fundamentais de acordo com a Free Software Foundation (FSF) como
liberdade de cópia, utilização, modificação e distribuição, esse tipo de software é estritamente
produzido por sujeitos voluntários que colaboram e compartilham seus conhecimentos através
da comunicação mediada por computador (CMC), a fim de produzir ferramentas
computacionais que possam ser utilizadas e compartilhadas de forma livre.
Baseado essencialmente colaboração e no compartilhamento do conhecimento, o
software livre é expressão dissidente de uma sociedade que busca mais que a mercantilização,
tratando-se de movimento que se fundamenta no conhecimento compartilhado, na
solidariedade praticada, na inteligência coletiva, em sistemas avançados de tecnologia da
informação (TI) e na rede mundial de computadores (SILVEIRA, 2003). Dentro desse
enfoque, destaca-se a atuação de elementos essenciais para o desenvolvimento desse tipo de
software: CMC e conhecimento. “A Internet é um agente facilitador, pois conecta os
colaboradores do software livre a avançadas ferramentas de tecnologia da informação, que
possui um papel gerenciador de ideias, códigos e conhecimento” (BENKLER, 2001). Lemos
(2004) afirma que entre as principais características do software livre destacam-se a
colaboração, que se caracteriza por um sujeito ajudar outro a alcançar um objetivo e o
compartilhamento do conhecimento que é fundamental, pois o código é criado e
compartilhado.
O conhecimento tem papel fundamental na sociedade. Para Drucker (2001), que
falava de um modo genérico sobre uma “sociedade do conhecimento”, a principal fonte de
riqueza de uma sociedade e a principal matéria-prima com que se trabalha nesse momento de
desenvolvimento socioeconômico é o conhecimento. Ainda sobre conhecimento, Nonaka e
Takeuchi (1997) propõem que ele pode ser tácito ou explícito. O conhecimento tácito é
pessoal, específico ao contexto e, assim, muito difícil de ser formulado e comunicado, pois
são formados por know-how, crenças, percepções, valores e modelos mentais. Já o
conhecimento explícito refere-se a um conhecimento transmissível em linguagem formal e
sistemática, ou seja, através de fórmulas, manuais operacionais e outros meios de
comunicação interpessoal.
12
Tomando como objeto de estudo a distribuição Linux Ubuntu, que é um sistema
operacional de código aberto e gratuito, com versões lançadas semestralmente e suas
comunidades de desenvolvimento (acessibilty team – responsável por elaboração e criação de
opções de acessibilidade ao sistema, artwork team – responsável pela interface gráfica do
sistema, brainstorm team – reponsável pela introdução de novas ideias ao sistema, e
bugsquad team – responsável pela notificação e correção de erros do sistema), a presente
pesquisa visa a estudar o seguinte problema: como ocorre a conversão do conhecimento tácito
em conhecimento explícito em uma comunidade virtual de desenvolvimento de software
livre?
13
3
OBJETIVOS
3.1
Objetivo Geral
Analisar como os colaboradores do software livre Linux Ubuntu conseguem
externalizar o conhecimento tácito e contribuir na elaboração deste software via colaboração
mediada por computador.
3.2
Objetivos Específicos
 Caracterizar a colaboração mediada por computador para o desenvolvimento de
software livre.
 Identificar conhecimentos tácitos no desenvolvimento do Ubuntu Linux.
 Identificar eventos de transformação de conhecimento tácito em explícito durante o
desenvolvimento de software livre.
14
4
JUSTIFICATIVA
Em uma sociedade regida pelo conhecimento, este é o principal ativo e matéria-prima
com que se trabalha e gera riqueza (DRUCKER, 2001). Neste panorama, observa-se um
fenômeno emergente da cibercultura, o chamado “software livre”, que se caracteriza por uma
forma de produção baseada no compartilhamento do conhecimento. Mediante a colaboração
de programadores de diferentes nacionalidades, que trabalham de forma voluntária investindo
seu tempo e conhecimento em um software que poderá ser distribuído livremente, esse
fenômeno tem chamado a atenção de organizações públicas e privadas, que reconhecem as
possibilidades de excelência dos produtos dele derivados e, assim, investem e promovem
adesão a esse tipo de software.
Entre as organizações pioneiras que identificaram o potencial do software livre,
encontra-se a IBM, que investiu, entre 1996 e 2001, 1,3 bilhões de dólares em uma nova
forma de produção totalmente virtual, sendo o sistema operacional Linux seu maior
representante entre os servidores vendidos em todo o mundo (INFOPRO, 2009). Já entre os
principais investimentos governamentais em software livre, encontra-se o projeto brasileiro
liderado pelo Instituto Nacional de Tecnologia da Informação (INTI), onde é apresentado
como prioridade o incentivo ao uso do software livre em todas as suas esferas, como, por
exemplo: na capacitação para que os servidores públicos efetivem o software livre como
ferramenta padrão do governo federal, na elaboração de uma política nacional de implantação
de software livre, na disseminação da cultura do software livre em escolas e universidades, e
na ampliação significativa da oferta de serviços aos cidadãos em plataforma aberta (INTI,
2009).
Em paralelo ao fenômeno do software livre, a gestão do conhecimento tem dado às
organizações que estão em busca de resultados significativos uma série de vantagens
competitivas e uma essencial fonte de inovação em processos organizacionais baseados no
compartilhamento da informação e em pessoas que estão genuinamente interessadas em
ajudarem-se mutuamente para desenvolver novos softwares. O voluntarismo característico do
desenvolvimento do software livre de fato exige uma adesão genuína.
Portanto, diante dos exemplos citados, e entendendo que muito do desenvolvimento de
software deve-se a características inatas ou automatizadas, a pesquisa visa a investigar o
processo de conversão do conhecimento tácito em explícito em uma comunidade virtual de
desenvolvimento do software livre Linux Ubuntu, bem como discutir o papel determinante do
conhecimento tácito como principal fonte de inovação para esta categoria de software.
15
O autor da presente pesquisa é usuário e colaborador ativo do sistema operacional
Linux e outros softwares livres desde 2003, tendo a oportunidade de realizar a pesquisa nos
ambientes de desenvolvimento do projeto de software livre Ubuntu Linux. A pesquisa aborda
dois temas emergentes não somente no meio acadêmico mas também na sociedade: o software
livre e a gestão do conhecimento, que não geraram nenhum trabalho conhecido no âmbito do
curso de Administração da Universidade Federal da Paraíba, assim motivando e sendo
pertinente investigar esses fenômenos.
16
5
FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
5.1
Software Livre
Na década de 1960, fabricantes de sistemas comerciais eletrônicos, como a IBM,
vendiam computadores e entregavam a seus clientes o código-fonte dos programas, assim
podendo alterar os programas e distribuí-los livremente. Contudo, uma década mais tarde, os
números de softwares e de clientes aumentaram a tal ponto que era possível vender o software
ao invés de distribui-lo livremente. A situação se alterou ao ponto de o software ser
relativamente mais relevante do que o hardware e, portanto, os fabricantes passaram a vender
softwares sem fornecer o código-fonte e impondo severas restrições à sua redistribuição
(HESXEL, 2001).
Em 1983, Richard Stallman, na época integrante do laboratório de pesquisa sobre
inteligência artificial do Massachussets Institute of Technology (MIT), insatisfeito com o
crescente movimento no sentido de tornar proprietário e o visível aumento do controle sobre o
sistema operacional Unix e outros sistemas operacionais, decidiu iniciar o desenvolvimento
de um novo sistema operacional inspirado no Unix e que seria composto por diversos
programas e utilitários. Surge o GNU (GNU is not Unix), que começou a ser desenvolvido por
um grupo seleto de programadores (ROCHA, 2004). Para concretizar esse objetivo, em 1984
e 1985, Stallman, após pedir demissão do MIT, publicou o “Manifesto GNU”, que tinha como
objetivo convocar programadores para a elaboração do novo sistema operacional que seria
distribuído livremente. Funda-se, então, a Free Software Foundation (FSF), que tinha como
objetivos divulgar o projeto GNU e os princípios do software livre (HESXEL, 2001).
Na década de 1990, o sistema operacional GNU estava praticamente completo, mas
faltava um dos elementos mais importante: o kernel. O kernel inicial foi o HURD, que não
tinha alcançado nível de maturidade suficiente para ser integrado ao novo sistema
operacional; porém um estudante de ciência da computação de Helsink na Finlândia chamado
Linus Torvalds havia desenvolvido um bom kernel compatível com o GNU e que, após
esforços de integração, foi definitivamente integrado e gerou o software livre mais conhecido
e utilizado do mundo – o sistema operacional GNU/Linux (ROCHA, 2004).
Como visto, o software livre surge da insatisfação com o crescente controle e visível
movimento de privatização dos sistemas operacionais, que originalmente eram distribuídos de
forma livre mas, posteriormente, com o aumento de usuários de computadores, tornou-se mais
17
interessante para a indústria vender em vez de distribuir. Em consequência, foi criado o
sistema operacional GNU/Linux, que é o sistema operacional livre a ser estudado na presente
pesquisa.
Para Hesxel (2001), software livre é um software disponível com a permissão para
qualquer um usar, copiar e distribuir, seja em sua forma original ou com modificações, seja
gratuitamente ou com custo. Em especial, a possibilidade de modificações implicam que o
código-fonte esteja disponível. Se um programa é livre, potencialmente pode ser incluído em
um sistema operacional também livre.
Para Stallman (1985), o software livre se caracteriza por quatro liberdades: a liberdade
de cópia, utilização, modificação e distribuição;

liberdade de executar o software para qualquer propósito (liberdade 0);

liberdade de estudar como o programa funciona e adaptá-lo para as suas
necessidades (liberdade 1); o acesso ao código-fonte é pré-requisito para esta liberdade;

liberdade de redistribuir cópias de modo que se possa ajudar o seu próximo
(liberdade 2); e

liberdade de aperfeiçoar o programa e liberar os seus aperfeiçoamentos, de modo
que toda a comunidade se beneficie (liberdade 3); o acesso ao código-fonte é pré-requisito
para esta liberdade.
Essas quatro liberdades são a base da licença GNU – General Public License
(GNU/GPL), que inaugurou uma nova forma de licenciamento, chamada copyleft. Além da
primeira licença GNU/GPL que inaugurou a forma de licenciamento copyleft, foram criadas
diversas licenças de software livre, cada uma com suas particularidades, mas todas com a
mesma essência (ROCHA, 2004). Para Williams (2002), a forma de licenciamento copyleft
garante as quatro liberdades para o usuário e perpetua de forma legítima o software livre, ao
contrário do licenciamento copyright, que restringe o uso dos softwares.
Os autores citados anteriormente demonstram, em resumo, que o software livre surgiu
da necessidade de liberdade de cópia, utilização, modificação e distribuição de softwares de
computador, e, para a concretização dessas liberdades, foi criada uma nova forma de
licenciamento – a GNU/GPL – que perpetua todas as liberdades publicadas no manifesto
GNU e garante ao usuário de softwares registrados sob essa forma de licenciamento a
legalidade das quatro liberdades essenciais.
5.2
Comunicação Mediada por Computador
18
O avanço tecnológico mudou as relações sociais profundamente, e essas passaram a
coexistir de forma tecnologizada. Com a sofisticação dos recursos tecnológicos, a amplitude
da informação foram alavancadas, agilizando o processo de difusão e recepção no tempo e no
espaço (HAYTHORNTHWAITE, 2005).
Para Machado apud Menou (1999), a comunicação mediada por computador (CMC)
oferece a oportunidade de desenvolver um novo tipo de colaboração, sustentada via rede
eletrônica e desenvolvida com pares situados em outras localizações especiais. CMC é
qualquer sistema de comunicação capaz de manter um fluxo de informações entre pessoas
através de computadores, possibilitando maior agilidade, intensidade e facilidade de acesso às
informações. Ela apresenta uma infinidade de ferramentas, que pode interligar a comunicação
entre sujeitos na forma um-para-um (privada), um-para-muitos (dispersão) e muitos-paramuitos (discussão em grupo) (HOLOHAN; GARG, 2005).
Holohan e Garg (2005) afirmam que as investigações sobre CMC tem se concentrado
sobre o desenvolvimento do software livre, pois a CMC propicia aos sujeitos um novo
modelo de comunicação baseado na discussão virtual para a concretização de algo novo,
diferente do que ocorre na computação distribuída.
Para Machado apud Menou (1999), o acesso à Internet e o aumento do uso do
computador estão possibilitando mudar padrões e propor novas formas de produzir,
armazenar e difundir a informação para atender excepcionalmente aos interesses do ser
humano. Mais especificamente, Holohan e Garg (2005) afirmam que a organização em rede
operacionaliza uma dessas novas formas, com a formação de equipes de projetos via fóruns
online e oferecendo meios para a canalização dos interesses e motivações dos sujeitos
voluntários para a concretização de projetos.
5.3
Comunidades Virtuais
Antes de tudo, é bastante relevante entender o que vem a ser “comunidade”. Segundo
Szabó (2006), o termo refere-se ao pertencimento do sujeito a um grupo de interesses
individuais que mantém laços sociais e sistemas informais de troca de recursos. Já Costa apud
Rheingold apud Szabó (2006) afirma que comunidade virtual é uma associação de indivíduos
(os membros da comunidade, participantes ou usuários) que compartilham entre si interesses,
conhecimento e objetivos, em um domínio específico, através da Internet. Já para Godoi e
19
Machado apud Szabó (2006), comunidades virtuais são entendidas como agregações sociais
que emergem da rede quando há um número suficiente de pessoas, em discussões
suficientemente longas, com suficientes emoções humanas, para formar teias de relações
pessoais em ambientes virtuais, alterando de certa forma o eu dos que nela participam.
De acordo com Henri e Pudelko apud Szabó (2006), a generalização na classificação
de comunidades virtuais é inadequada, visto que cada comunidade virtual tem um objetivo.
Para isso, ele utiliza os seguintes critérios para a classificação das comunidades virtuais:

A intenção de formação da comunidade, isto é, um objetivo relativamente
definido associado a uma atividade que irá envolver a construção de conhecimento. Essa
intenção de formação será colocada em prática através de ações de estabelecimento de metas
para o grupo, a divulgação da lista de participantes, a seleção das ferramentas de
comunicação, e a adoção de regras de conduta na comunidade.

O nível de envolvimento entre os participantes, que depende da intensidade de sua
ligação. O grupo pode apresentar maior ou menor coesão, e esse aspecto influencia
diretamente a participação na comunidade, que pode ser descrita em termos de envolvimento,
ajuda mútua, compartilhamento de significados e afirmação de uma identidade comum.

A evolução da intenção da comunidade e da integração entre os participantes. Para
os autores, o nível de atividade de uma comunidade virtual evolui quando o objetivo da
comunidade se consolida, justificando a ação coletiva em torno daquele objetivo, e quando os
participantes se tornam mais envolvidos e mais conscientes de que constituem uma entidade
social de aprendizado.
Sendo assim, Correa (2007) afirma que a evolução de uma comunidade virtual ocorre
quando se fortalecem seus processos informacionais, associados à ampliação da consciência
de seus participantes acerca da possibilidade de conhecer e agir, possibilitando a formação de
inteligência coletiva através da conexão de seus saberes e criatividades em torno de um
objetivo comum.
A partir do nível de envolvimento entre os participantes, da intenção de formação da
comunidade e os processos de aprendizado, Henri e Pudelko (2003) definiram quatro tipos de
comunidades virtuais e seus respectivos processos de aprendizado (Figura 1).
FIGURA 1
20
Figura 1: Diferentes tipos de comunidades virtuais de acordo com seus contextos de emergência
Fonte: Szabó apud Henri e Pudelko (2003, p. 476)
Correa (2007) explica que:

comunidades de interesse são um agregado de pessoas reunidas em torno de um
tema de interesse em comum;

comunidades de interesse orientadas por objetivos são comunidades que surgem
com o objetivo de realizar um determinado projeto e cujos participantes não são agregados de
forma aleatória;

comunidades educacionais são constituídas por alunos de uma mesma sala de
aula, de uma instituição ou espalhados geograficamente; o que se espera desse tipo de
comunidade virtual é o aprendizado através do relacionamento social baseado nas teorias
construtivistas; e

comunidades de prática são comunidades de interesse orientadas por objetivos que
conseguem concluir o projeto planejado.
Sendo de fundamental importância para a realização do projeto de pesquisa, as
comunidades de prática serão descritas detalhadamente no tópico a seguir.
5.4
Comunidades Virtuais de Práticas
21
Em sintonia com o objetivo do projeto de pesquisa, aqui se apresenta de forma
detalhada o conceito de comunidades virtuais de prática, sua lógica de colaboração e o
conhecimento gerado e compartilhado dentro delas.
Para Szabó (2006), comunidades virtuais de prática são comunidades mediadas por
computador ou comunidades virtuais de prática extra-organizacionais focadas na prática. São
compostas por membros que, em geral, não se conhecem; portanto, as comunidades de prática
são bons exemplos de comunidades de fato virtuais.
Três laços principais caracterizam as comunidades de prática: um compromisso mútuo
assumido entre os membros, um empreendimento comum e um repertório comum de rotinas e
regras de conduta constituído através de aprendizado. Assim se formam, nas estruturas
formais da organização, diversas comunidades de prática informais (Wenger, 1998).
Correa (2007) diz que as comunidades de prática surgem no ciberespaço a partir de
interação de pessoas que, no mundo real, já realizam as mesmas atividades profissionais ou
compartilham as mesmas condições de trabalho e que encontram na comunidade de prática
uma forma de aperfeiçoar suas práticas, reafirmando sua identidade profissional e
contribuindo para a própria comunidade. Para esse autor, as comunidades de prática não
possuem tempo de vida ou objetivos definidos e apresentam uma imensa capacidade de atrair
novos participantes.
As comunidades de prática e comunidades virtuais de prática são grupos de pessoas
reunidas informalmente em torno de um interesse em comum, nos quais indivíduos trabalham
em problemas similares, auto-organizando-se para ajudarem-se mutuamente e compartilharem
perspectivas sobre práticas de trabalho (SZABÓ, 2006; WENGER, 2008; BROWN;
DUGUID, 1991). Wenger (1998) aponta possíveis indicadores da formação dessas
comunidades (Quadro 1).
QUADRO 1
22
Quadro 1: Indicadores de formação de comunidades práticas
Fonte: Wenger (1998, p.125)
5.4.1 Comunidades Virtuais de Prática e a Colaboração na Internet
Para Lehman (2004), as comunidades de prática são verdadeiros espaços de produção,
constituídos essencialmente por voluntários que colaboram entre si. Seus projetos são
iniciados por indivíduos com o intuito de resolver problemas específicos ou simplesmente
pela vontade de desenvolver algum tipo de bem específico, como um software.
Em um estudo realizado por Kollock (1999) sobre economia da cooperação na
Internet, apresentam-se exemplos que demonstram que determinados bens de domínio público
são gerados através da interação coletiva das comunidades virtuais de prática, com uma
significativa redução no custo de produção. Para aquele autor, o Linux é o maior dos
exemplos, um bem digital de domínio público resultante do objetivo de desenvolver um
23
sistema operacional gratuito e de código aberto por meio de trabalho de engenheiros de
sistemas e programadores de todo o mundo.
Os projetos crescem na medida em que conseguem atrair mais colaboradores e
usuários para a comunidade virtual, havendo projetos muito pequenos e projetos com milhares
de colaboradores. Dependendo do tamanho da comunidade virtual de prática e o número de
colaboradores, pode haver formas de organização mais flexíveis e mais formais, existindo em
alguns casos processos formais de eleição de líderes. De modo geral, a alocação e a
distribuição de projetos em comunidades virtuais práticas são baseadas na reputação, sendo
muito usada a meritocracia: usuários que participam mais ativamente no desenvolvimento de
projetos, contribuindo com qualidade e frequência tem acesso a repositórios onde está
armazenado o código-fonte e pode armazenar uma modificação ou um novo código no
repositório, sendo assim considerado um colaborador “oficial” (RAYMOND, 2000).
Contudo, Lehman (2004) conclui que não existe um padrão organizacional para o
desenvolvimento de projetos nas comunidades virtuais práticas, sendo a organização fruto de
acontecimentos, convenções e negociação.
5.4.2 Comunidades Virtuais de Prática e Tecnologias de Informação e Comunicação
Para Correa (2007), a tecnologia exerce um papel fundamental na vida das
comunidades virtuais de prática. Com as tecnologias de informação e comunicação
disponíveis atualmente, tais comunidades alcançam distâncias antes impossíveis de serem
atingido, o que faz com que não haja limites para as suas fronteiras. As referidas tecnologias
permitem, ainda, que a participação seja rica e significativa, apesar da limitação tempoespaço.
Para Wenger (1998) uma boa tecnologia em si não faz uma comunidade, mas a má
tecnologia pode fazer a vida da comunidade difícil o bastante para arruiná-la.
Complementando, Harasin (1989) acrescenta que o ambiente encontrado nos meios
eletrônicos de interação é especialmente apropriado para abordagens de aprendizado
colaborativo que enfatizem a interação grupal.
Porém Wenger (1998) informa que há peculiaridades no funcionamento de uma
comunidade virtual de prática que fazem com que haja uma interseção entre esta e a
tecnologia. A respeito dessa interseção, a existência da comunidade depende da ocorrência de
uma experiência contínua conjunta que se estende no tempo e no espaço. Szabó (2006) diz
24
que uma das funções mais importantes da tecnologia para as comunidades é, então, garantir
recursos para promover a reunião dos seus membros de modo contínuo, apesar da separação
de tempo e espaço. A tecnologia deve ser capaz de apoiar a sociabilidade, a identidade e a
união dos membros ao longo do tempo.
O grande desafio das ferramentas de tecnologia de informação e comunicação é a
reunião dos membros para ser realizado o processo de interação. Na Figura 2, mostra-se que a
interação está distribuída em quatro quadrantes, conforme as situações de geografia e tempo
em que são possíveis as interações: (1) mesmo tempo/mesmo local, (2) mesmo tempo/local
diferente, (3) mesmo local/tempo diferente e (4) local diferente/tempo diferente (WENGER,
1998).
FIGURA 1
Figura 1: Processo de interação de acordo com a situação geográfica e o tempo através da tecnologia da
informação e comunicação.
Fonte: Wenger et al. (1998, p. 4)
Wenger e outros (1998) observam que a maior parte das tecnologias usadas pelas
comunidades virtuais práticas executa uma simples função por ferramenta, fazendo com que
as pessoas tenham que ficar alternando entre ferramentas de acordo com a necessidade de
25
cada interação e improvisem modos próprios de superar gaps deixados pelo conjunto básico
de ferramentas usadas.
Szabó (2006) sintetiza que as tecnologias da informação e comunicação oferecidas
atualmente atendem a demanda das comunidades virtuais práticas. Para a autora, de acordo
com a Figura 3, encontram-se os três tipos gerais de atividades exercidas pela comunidade:
interações síncronas, interações assíncronas, publicação e suas respectivas ferramentas de
apoio. No centro, encontram-se as ferramentas de suporte à construção das comunidades,
mostrando-se aquelas de apoio à participação individual na esquerda, e, na direita, as de apoio
à manutenção da união da comunidade.
FIGURA 2
26
Figura 3: Tecnologias de suporte as atividades da comunidades virtuais práticas.
Fonte: Wenger et al. (1998)
27
Ainda para Szabó (2006), cada tecnologia online suporta um tipo de interação em
particular, mas que provoca efeitos substanciais no resultado em que foi produzido; logo,
pode-se dividir as ferramentas utilizadas pela a comunidade quanto à forma de comunicação
permitida e ferramentas síncronas e assíncronas.
Ferramentas assíncronas são aquelas que permitem a interação em partes e momentos
distintos, ou seja, cada participante da comunidade virtual prática envia a mensagem
independente de os destinatários estarem ou não conectados. Uma resposta pode ocorrer
minutos após o envio da resposta, ou até meses e anos depois. Um ponto positivo desta forma
de comunicação é que um grupo de participantes pode interagir sem que todos estejam online;
como consequência, pessoas de diferentes fusos-horários e regiões podem interagir. Em
síntese, a maior parte das comunidades de prática virtual utiliza ferramentas assíncronas,
sendo as principais o correio eletrônico, as listas de discussão e os fóruns ou quadros de
discussão e newsgroups (DAVENPORT; PRUSAK, 1998).
FIGURA 3
Figura 4: Funcionamento das ferramentas assíncronas.
Fonte: Oliveira (2006, p. 1) apud Szabó (2006)
Szabó (2006) complementa que existe um outro grupo de ferramentas assíncronas que
não são baseadas em trocas de mensagens e estão classificadas aqui como ferramentas de
publicação, uma vez que, através dessas, informações são publicadas ou armazenadas para
posterior consulta e uso pelos membros da comunidade. Entre estas estão as FAQs
(Frequently Asked Questions), os wikis, os repositórios de falhas (Bug Database) e os portais
da comunidade.
Ferramentas síncronas são aquelas que permitem a comunicação em tempo real
(Figura 5). As principais ferramentas síncronas de comunicação utilizadas pelas comunidades
virtuais de prática são os ambientes de conversação online e os chats.
28
FIGURA 4
Figura 5: Funcionamento das ferramentas síncronas
Fonte: OLIVEIRA (2006, p. 1) apud Szabó (2006)
Szabó (2006) diz que é inegável a imprescindibilidade da tecnologia para a
constituição e o funcionamento das comunidades virtuais de prática, mas acrescenta que a
tecnologia não é suficiente para que os indivíduos se disponham a compartilhar o
conhecimento. Como também dizem Davenport e Prusak (1998), ela é apenas um meio de
distribuição, armazenamento e intercâmbio de conhecimento e, desta forma, não cria nem
garante a geração de conhecimento.
5.4.3 Comunidades Virtuais de Prática e o Conhecimento
A perspectiva de comunidade virtual prática encara o conhecimento como um bem
público que é socialmente criado, mantido e compartilhado dentro da comunidade. O
conhecimento é visto como recurso intangível que pode ser disseminado sem perder o seu
valor no processo de transferência (BROWN; DUGUID. 1991, LAVE; WENGER, 1991
apud SZABÓ 2006).
Para Szabó (2006), o conhecimento como fruto da criação coletiva se dá através das
discussões e colaboração, facilitado pela dinâmica das idéias. Para isso, o papel da tecnologia
da informação e comunicação é fundamental, assumindo relevância para o suporte das
comunidades virtuais de prática.
A respeito de criação, acumulação e difusão do conhecimento na organização, as
comunidades de prática, segundo Wenger (1998), exercem as seguintes funções:

São pontos de troca e interpretação de informação – na medida em que seus
membros compartilham significados, eles são capazes de organizar as informações da forma
mais adequada possível à sua utilização. Assim, uma comunidade de prática ativa é um meio
29
ideal de circulação de informações do tipo boas práticas, dicas e feedbacks, entre as diversas
fronteiras organizacionais.

Retêm conhecimento “ao vivo” – diferentemente do que ocorrem com formas
estáticas de armazenamento de conhecimento, como manuais e bancos de dados, as
comunidades de prática concentram uma espécie de conhecimento “ao vivo”. Ainda que
rotinizem processos ou tarefas, elas o fazem de um modo que os adaptam às circunstâncias
locais, sendo, desta forma, bastante útil para os praticantes especialmente, se iniciantes. “As
comunidades de prática preservam o caráter tácito do conhecimento que sistemas formais não
são capazes de capturar” (WENGER, 1998).

Podem direcionar competências de modo a manter as organizações no estado da
arte – membros das comunidades virtuais de prática discutem idéias inovadoras, trabalham
juntos na resolução de problemas e se mantêm atualizados com novos desenvolvimentos
internos e externos à sua organização. Quando fazendo parte de comunidades de visão
avançada, que se situam à frente em suas áreas de interesse, os membros distribuem entre si a
responsabilidade por manter e fomentar novas contribuições, de forma que cada participação é
de alto valor para a comunidade.

Alojam e preservam identidades – na medida em que não são temporárias como
os times de trabalho e, diferentemente das unidades funcionais de negócios, elas se organizam
espontaneamente em torno do domínio que interessa aos seus membros. Os indivíduos se
agrupam por haver algum tipo de identificação entre eles, o que potencializa as situações de
aprendizagem em situações concretas. A identidade é importante porque ajuda a direcionar o
foco da aprendizagem. Manter a identidade é um aspecto crucial para o desenvolvimento da
criatividade e a aprendizagem nas organizações.
Para Wenger (1998), as comunidades de prática elevam o potencial de aprendizagem
de uma organização de dois modos: através do conhecimento que desenvolvem em torno de
seu tema e através das interações de suas fronteiras, sendo importante manter a interação das
duas formas; logo, as comunidades de prática se tornam verdadeiros ativos organizacionais,
quando a produção interna e as suas fronteiras se complementam.
Brown e Duguid (2001) observam que as comunidades de prática não são grupos
mutuamente excludentes, havendo sobreposição entre elas. De acordo com os autores, pessoas
que estão em suas intersecções possuem um importante papel de intermediar o conhecimento
entre comunidades. Essas pessoas são conhecidas como expansores, conectores de
conhecimento ou brokers. As comunidades de prática desenvolvem-se e evoluem porque, em
muitas situações, as demandas por conhecimentos ultrapassam o conhecimento codificado
disponível aos indivíduos. Conhecimentos adquiridos em treinamentos formais ou em
30
documentação existente são, normalmente, teóricos e descontextualizados. Assim, é
importante uma ação orientada para a prática que permita que a aprendizagem ocorra a partir
da experiência de outros indivíduos e do acesso ao know-how distribuído. Nas comunidades
de prática, o conhecimento é criado, compartilhado, organizado, revisado, sendo, na prática,
“possuído” por tais comunidades.
Por o conceito de “conhecimento” ser de extrema relevância para a execução da
presente pesquisa, ele será tratado mais profundamente no próximo tópico.
5.5
Abordagens sobre o Conhecimento
Nonaka e Takeuchi (1997) comentam que, desde a Grécia clássica, existe uma busca
infrutífera em direção à obtenção do significado efetivo do conhecimento, sendo inúmeras as
definições atualmente existentes. Apesar disso, o conhecimento tem se constituído uma
questão fundamental para todas as sociedades, principalmente com a expansão informacional.
Como afirma Drucker (2001), ele passou a ser tratado como recurso essencial pelas
organizações, já que é a principal matéria-prima com que se trabalha, gerando vantagem
competitiva e sustentável para as organizações.
Nonaka e Takeuchi (1997) definem conhecimento como uma crença verdadeira
e justificada, e explicam que envolve um processo humano dinâmico de justificar a crença
pessoal com relação à "verdade". Existem também várias categorizações do conhecimento, a
maioria das quais reflete uma visão de conhecimento em termos de; muitas dessas
categorizações se referem a uma diferenciação de conhecimento em uma visão dicotômica
entre conhecimento tácito e explícito (POLANYI, 1967). O conhecimento tácito é aquele que
existe mas que não pode ser verbalizado, pois está internalizado no inconsciente dos
indivíduos, isto é, é inacessível à consciência, ou, nas palavras do autor: “we can know more
than we can tell” – “nós sabemos mais do que podemos verbalizar”. Ainda na visão de
Polanyi (1967), o conhecimento tácito não pode ser codificado em artefatos nem ser
comunicado. Já o conhecimento explícito é aquele formal e sistemático, fácil de ser
transmitido a outras pessoas através de fórmulas, diagramas e manuais operacionais, entre
outros meios de comunicação interpessoal.
O conhecimento tácito está profundamente enraizado na ação e é dependente do
contexto em que o indivíduo está inserido, sendo constituído, em parte, de elementos técnicos,
tais como habilidades e técnicas, e, em parte, de elementos cognitivos centrados em “modelos
31
mentais” que incluem esquemas, paradigmas, crenças e perspectivas do indivíduo, os quais o
ajudam a perceber e a definir o mundo. O conhecimento explícito, ao contrário do tácito, é
facilmente expressado, capturado, armazenado e reutilizado, podendo ser registrado em
manuais, livros, mensagens e bancos de dados. O conhecimento explícito pode ser codificado,
explicado ou entendido, daí a maior possibilidade de ser comunicado e compartilhado
(NONAKA E TAKEUCHI, 1997).
Resultando do desdobramento dessa dicotomia conceitual relacionada à natureza do
conhecimento, Nonaka e Takeuchi (1997) sugerem quatro modos de conversão para a criação
do conhecimento no âmbito das organizações:
a) do tácito para o tácito (socialização): um indivíduo pode adquirir conhecimento
tácito diretamente com outro, através da observação, da imitação e da prática, sem
necessariamente usar a linguagem verbal como veículo de comunicação; é um processo de
compartilhamento de experiência;
b) do tácito para o explícito (externalização): é trazer à tona o que estava implícito,
através de recursos como metáforas, analogias e modelos;
c) do explícito para o explícito (combinação): os indivíduos trocam e combinam
conhecimentos através de meios como documentos, reuniões, conversas informais, mensagens
eletrônicas, etc.; e
d) do explícito para o tácito (internalização): ocorre quando as pessoas internalizam o
conhecimento explícito que, misturado à experiência destas, pode ensejar novas combinações
teórico-práticas.
Baseando-se no modelo teórico de Nonaka e Takeuchi (1997), é possível chegar a uma
categorização de causas e facilitadores da externalização do conhecimento, sendo divididas
em causas positivas e negativas, como pode ser visto a seguir:
 O fator dedução é caracterizado como causa positiva à externalização do
conhecimento, pois é toda interferência que parte do universal para o particular
utilizando confrontação de preposições para extrair conclusões.
 O fator indução é caracterizado como causa positiva à externalização do
conhecimento, porque consiste em afirmar, a partir de várias suposições, algo que foi
encontrado em alguns casos; ou seja, parte-se do princípio da generalização de ideias.
 O fator analogia é caracterizado como causa positiva à externalização do
conhecimento, pois analisa a relação de equivalência entre duas ou mais relações;
portanto, no processo de externalização do conhecimento, faz a comparação entre
partes para chegar a um consenso entre as partes em comum.
32
 O fator metáfora, caracterizado como efeito positivo da externalização do
conhecimento, é utilizado no processo de externalização quando não é encontrada uma
imagem adequada através dos métodos analíticos de dedução ou indução, sendo este
um método não analítico. O uso de uma metáfora é muito atraente no processo
criativo, pois estimula o processo de externalização e criação. Por fim, o

fator confusão entre dedução, indução e analogia é caracterizado como causa
negativa e ocorre quando os sujeitos não conseguem identificar a diferença entre eles,
cabendo ao moderador das discussões reiniciar o processo de externalização do
conhecimento, para que os mesmos passem a compreender.
Ainda para Nonaka e Takeuchi (1997) o processo de externalização do conhecimento é
dinâmico e essencialmente estigado a externalização a partir de discussões em grupo,
passando por um processo de validação de causas e modelos mentais identificados, onde os
não identificados ou reconhecidos pelo grupo são excluídos.
Na presente pesquisa, optou-se pelo uso do modo de conversão do conhecimento
tácito em explícito (externalização) dos autores Nonaka e Takeuchi (1997) como marco
teórico para a coleta e a análise dos dados.
33
6
PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
6.1
Natureza da Pesquisa
A presente pesquisa é de natureza qualitativa, que, para Vieira e Zouain (2007), é
definida de acordo com o axioma de crenças do investigador, atribuindo importância
fundamental à descrição detalhada dos fenômenos e dos elementos que envolvem os
depoimentos dos atores sociais envolvidos, os discursos, os significados e os contextos. A
pesquisa é, ainda, do tipo exploratório, pois avança apenas inicialmente sobre os fenômenos
de interesse com o objetivo de familiarizar-se sendo investigado, de modo que a pesquisa
subsequente possa ser concebida com uma maior compreensão e precisão.
6.2
Procedimentos
A presente pesquisa foi conduzida sob uma estratégia netnográfica, que, para Rocha e
Montardo (2005), é um método de pesquisa derivado da etnografia desenvolvida na
antropologia e que estuda a complexidade das experiências de uma sociedade digital. A
estratégia foi aplicada na comunidade virtual de desenvolvimento do software livre Linux
Ubuntu classificado como classe de desenvolvimento e programação geral do sistema, mais
especificamente junto aos colaboradores e focando o processo de conversão do conhecimento
tácito em explícito (externalização). Aborda-se o desenvolvimento do software, a sistemática
de colaboração dos desenvolvedores, os recursos utilizados para levar à tona o conhecimento
tácito dos desenvolvedores e a influência do conhecimento tácito para a efetividade do
processo.
6.3
Técnicas de pesquisa
A etnografia é uma metodologia de pesquisa originária da antropologia, intimamente
relacionada com a cultura. Sua origem remonta a fins de século XIX e começo do século XX,
34
e, embora os trabalhos iniciais fossem em alguns aspectos divergentes do que hoje se
considera um estudo etnográfico, sua essência permanece: o estudo cultural através de uma
imersão profunda do pesquisador no grupo humano em foco, uma reconstrução analítica de
cenários e grupos culturais que evidencia as crenças, práticas, artefatos e conhecimentos
compartilhados pela cultura que está sendo estudada (GOETZ; LECOMPTE, 1988).
Para Montardo e Passerino (2006), com o surgimento do ciberespaço que para Gibson
(1984) é um espaço de comunicação em que não é necessária a presença física do homem
para constituir a comunicação como fonte de relacionamento, dando ênfase ao ato da
imaginação, necessária para a criação de uma imagem anônima, que terá comunhão com os
demais. É o espaço virtual para a comunicação disposto pelo meio de tecnologia, tornou-se
premente o uso e aplicação de metodologias de pesquisa que permitissem observar a essência
dos fenômenos presentes no mesmo. Porém a aplicação de metodologias de pesquisa já
existentes, principalmente de caráter qualitativo como a etnografia, não pode ser realizada de
forma automática sem adaptações e análise das possibilidades e limites.
Godoi e Machado (2009) consideram a comunicação virtual como ato simbólico e
cultural, um fenômeno produzido coletivamente e a ser investigado em profundidade. Abre-se
a possibilidade de estudar o imaginário virtual e seus atores através da investigação
qualitativa, especificamente etnográfica. A etnografia é, de fato, um método que enfatiza a
análise cultural e, por isso, desempenha papel chave no entendimento dos sistemas simbólicos
que articulam os objetos da comunicação e a vida cotidiana dos atores sociais na cultura
contemporânea (MENOU, 1999).
De acordo com Tedlock (2000), a etnografia envolve tanto o processo quanto o
produto, de tal forma que etnógrafos atravessam tanto as fronteiras territoriais quanto
semânticas. Para adquirir a linguagem e o comportamento do grupo, o pesquisador torna-se
um outsider vestido de insider. O objetivo do etnógrafo reside em compreender o ponto de
vista dos nativos, o que gera a expectativa de que a observação participante pode levar à
compreensão dos significados por meio de ver, pensar, sentir e, por vezes, comportar-se como
um nativo.
É postulada a possibilidade de aplicação do método etnográfico, característico da
antropologia, na área da comunicação online. O processo múltiplo de coleta de dados e a
imersão do pesquisador em campo através da observação participante associada às entrevistas
em profundidade, que formavam a prática da pesquisa etnográfica, aliam-se a uma complexa
visão do que seja o comportamento humano – o processo simbólico cultural visto como
instaurador da vida em sociedade (GODOI; MACHADO, 2009).
35
Para Kozinets (1998), a netnografia observa e recontextualiza conversações mediadas
por computador: elas são públicas, geradas por texto escrito e os participantes são muito mais
difíceis de serem individualizados. Dessa forma, está-se muito mais limitado do que o
etnógrafo, justamente pelas peculiaridades do ambiente virtual. É importante ao pesquisador
estar atento à falta de segurança quanto à identidade dos membros do grupo. Neste ponto,
destaca-se a importância de uma interpretação metafórica e simbólica do contexto, mais do
que uma simples classificação e decodificação.
6.4
Instrumentos de pesquisa
Partindo da orientação de Kozinets (1998), esta monografia, centrada em comunidades
virtuais, é baseada exclusiva e fundamentalmente na participação direta e imersão do
pesquisador em elementos de cultura. Seguindo as recomendações de Godoi e Machado
(2009), a pesquisa foi norteada pelos seguintes procedimentos:
a. seleção de comunidade virtual: a comunidade virtual escolhida foi a de
desenvolvimento do software livre Linux Ubuntu, pelo motivo de o pesquisador ter livre
acesso ao seu ambiente de desenvolvimento.
b. ingresso cultural: o pesquisador investigou sistematicamente a comunidade virtual,
visitando fóruns, websites e outros locais de desenvolvimento do software, visando à
investigação da conversão do conhecimento tácito em explícito. O objetivo desta fase foi
aprender a linguagem, os valores e conceitos principais do grupo, a lógica da colaboração, o
processo de desenvolvimento do software, a sistemática de colaboração dos desenvolvedores,
os recursos utilizados para levar à tona o conhecimento tácito dos desenvolvedores, e a
influência do conhecimento tácito.
c. coleta de dados: nessa fase, as comunicações da comunidade foram lidas,
selecionadas e realizadas reflexões e anotações, procurando adquirir uma perspectiva cultural
mais profunda sobre o grupo estudado.
d. realização de cyber interview: esta etapa, recomendada, não foi realizada, devido ao
fato de que as perguntas já se encontravam disponíveis nos fóruns da comunidades virtuais,
não sendo mais necessárias para a obtenção das evidências de interesse da presente pesquisa.
e. Usenets: nessa fase, o pesquisador participou como membro do grupo estudado,
participando do processo de desenvolvimento do software e de debates no ambiente virtual.
36
6.5
Sujeitos da pesquisa
Os dados foram coletados de 10 de Dezembro de 2009 á 4 de Abril de 2010, nas
respectivas comunidades citadas anteriormente os sujeitos desta pesquisa são os
colaboradores e desenvolvedores da distribuição Linux Ubuntu, que se encontram na
comunidade virtual de desenvolvimento em todas as áreas: acessibility, artwork team,
brainstorm team e bugsquad team.
6.5.1 Seleção das Comunidades Virtuais
Foram selecionadas cinco comunidades virtuais práticas de desenvolvimento Linux
Ubuntu, encontradas no site The Ubuntu Community. Neste rol de desenvolvimento de
software livre estão envolvidas todas as partes necessárias para o lançamento de uma nova
versão do software. Nesse estudo, utilizou-se uma amostra de quatro comunidades e dez
fóruns. A escolha amostral se deu em virtude de representar todas as partes do
desenvolvimento do software, levando em consideração a qualidade e a quantidade das
participações dos colaboradores na comunidade.
Comunidade
Fóruns
Endereço
Acessebility
Assistive techonology and acessebility
http://migre.me/GtJQ
Artwork team
Besigi
http://migre.me/GtDb
Brainstorm team
Idea sandbox
Popular ideas
http://migre.me/GtxZ
Idea development
37
Implemented ideas
Bug Squad team
Sistema
http://migre.me/GtwK
Internet rede e segurança
http://migre.me/Gtx6
Hardware e periféricos
http://migre.me/Gtxg
Instalação e atualização
http://migre.me/Gtxy
Quadro 2: Comunidades estudadas.
Fonte: Elaboração própria.
6.6
Tratamento dos Dados
A análise do material empírico foi conduzida nas seguintes etapas:
a) sistematização do material discursivo;
b) leitura do material visando à construção de categorias analíticas; e
c) retorno aos pesquisados para validação dos discursos nas respectivas comunidades
Para Vieira e Zouain (2007), a pesquisa qualitativa considera a existência de uma
relação dinâmica entre mundo real e sujeito. Portanto, o aspecto qualitativo é essencial ao
presente trabalho, devendo ser identificadas todas as diferentes percepções acerca das
questões apresentadas pelo material empírico levantado pelo estudo netnográfico.
38
7
RESULTADOS
7.1
Material discursivo
A partir da participação nas comunidades virtuais selecionadas, o material discursivo
foi obtido e utilizado nas análises. A análise do material empírico foi conduzida nas seguintes
etapas:
a) transcrição literal do material coletado;
b) validação dos discursos pelos membros da comunidade
Baseando-se no confronto entre a teoria acerca dos e a análise dos discursos, foram
elaboradas categorias analíticas prévias, compostas pelos seguintes causas:
Positivas à externalização do conhecimento: Que facilitam a externalização do
conhecimento: metáfora, dedução, indução e analogia. Segue a descrição das categorias,
assim como os fatores construídos no interior de cada categoria.
 Fator dedução, caracterizado como causa positiva à externalização do
conhecimento, pois toda interferência que parte do universal para o particular utilizando a
confrontação de proposições para extrair conclusões, logo os colaboradores que participam do
desenvolvimento do software livre Linux Ubuntu convergem de um aspecto geral de várias
conclusões para uma mesma premissa, identificando uma característica particular dos
elementos analisados os conduzindo a um único resultado. Exemplo: “Partimos do princípio
de que todos somos usuários e não programadores”.

Fator indução, caracterizado como causa positiva à externalização do
conhecimento, porque consiste em afirmar de várias suposições algo que foi encontrado em
alguns, ou seja, parte do principio da generalização. Partindo de conceitos refletidos a partir
de “viagens conceituais”, que se constituem em experiências dos colaboradores de
desenvolvimento de software livre Linux Ubuntu sobre versões anteriores e outros projetos
em paralelo de que estes participam. Exemplo: “Não queremos copiar ninguém, mas vejamos
experiências de softwares proprietários de sucesso, eles são fáceis de usar”.

Fator analogia, caracterizado como uma causa positiva à externalização do
conhecimento, pois analisa a relação de equivalência entre duas ou mais relações; portanto, no
processo de externalização do conhecimento, faz a comparação entre as partes, para levantar
39
um consenso entre as partes em comum. Exemplo: “Todas as distribuições Linux foram feitas
para programadores; a nossa é feita para usuários normais, que querem escutar uma música,
ler um livro”.

Fator metáfora, caracterizado como causa positiva à externalização do
conhecimento, é utilizado no processo de externalização quando não é encontrada uma
imagem adequada através dos métodos analíticos de dedução ou indução, sendo este um
método não analítico. O uso de uma metáfora é muito atraente no processo criativo,
estimulando todo o processo. Exemplo: “Linux para humanos, esse vai ser o slogan do novo
sistema, daí vamos pensar em facilidades”.
7.2
Confronto entre Categorias e Material Empírico
O Quadro 4 se refere à tipologia de impactos encontrados entre os membros ativos da
comunidade analisada. O quadro trata de especificar os tipos de fatores encontrados.
Fatores
Discursos (exemplos)
Dedução (D)
“Partimos
do
princípio
de
que
todos
somos
usuários
e
não
programadores.”
“O sistema operacional Linux, precisa ser desmitificado como um sistema
operacional difícil, sem interface gráfica, algo quase robótico por que não
usar o slogan.”
“Pensemos em outras distribuições, sempre sérias porque não mudar para
algo feliz, descontraído com o slogan: “Melhor, engraçado e fácil para o
uso.”
“Tendência de mercado sistemas e o que eles focam ema maioria dos
40
usuários novatos de Desktop vai esperar o trabalho seguinte função
corretamente: filmes, músicas e configurações de vídeos.”
“Reduzir a utilização do terminal o máximo possível”.
Indução (I)
“Não queremos copiar ninguém, mas vejamos experiências de softwares
livre de sucesso, eles são simpáticos e fáceis de se usar.”
“Por que não fazer uma distribuição diferente? De outras distribuições
Linux e também de outros sistemas operacionais, temos que mudar já.”
“Linux para humanos, precisamos integrar o novo Kernel o mais raído
possível, ele vem trazendo novidades como, melhor integração hardware
que propicia maior conforto gráfico e multimídia.”
“A comunidade adotou o slogan e vamos bota-lo em prática: novo orca,
novo kernel e o novo código de estruturação do grub tem que ser
implantados de imediato.”
Analogia (A)
“Esse novo tema visual é muito “MAC” assim como o outro era muito
“Windows”, por favor, resgatem a nossa identidade “Linux.”
“Em muitos casos, um computador tem apenas um usuário”. Antes de
entrar, você tem que pressionar Enter para selecionar o seu nome de
usuário, mesmo se você for o único usuário do computador. Não é que um
grande problema, mas seria bom se o usuário é automaticamente
selecionado para o login para que você possa de imediato começar a digitar
sua senha, facilitaria bastante como acontece em outros sistemas rotulados
como fáceis.”
“Todas as distribuições Linux foram feitas para programadores, a nossa é
feita para usuários normais, que querem escutar uma música, ler um livro.”
41
“O Windows, temos um sistema monolítico, e monocrático, mas com 99 %
de suporte, pois quase tudo no mundo de informática pessoal se resume a
ele. As comunidades Linux aprenderam com os erros e tornam o sistema
ainda mais pessoal principalmente nossa distribuição, contudo a integração
com redes sociais ainda é básico Gwibber e uma piada.”
Metáfora (M)
“Linux para humanos, esse vai ser o slogan do novo sistema, dai vamos
pensar em facilidades.”
“Facilidade em interface gráfica: Pensem como um MAC.”
“Ubuntu nas nuvens, o primeiro sistema Linux com computação nas
nuvens.”
“O Ubuntu é uma grande rede social, portanto vamos integra-lo as redes.”
Quadro 3: Discussões e fatores
Fonte: Pesquisa própria
Como é possível observar nos fragmentos de diálogos retirados da comunidade de
desenvolvimento do Ubuntu Linux, destacam-se induções, deduções, analogias e metáforas
classificadas pelos programadores do sistema como necessidade da integração do sistema com
redes sociais, facilidade de uso ao usuário doméstico comum e recursos de acessibilidade no
sistema (Quadro 4).
42
Problema
Redes Sociais
Diálogo
Solução Proposta
“O Ubuntu é uma grande “Sabíamos que precisávamos
rede social, portanto vamos integrar mas não entendia
integrá-lo às redes.”
como agora posso enxergar:
que
temos
Gwibber
integrar
(Programa
o
de
código aberto que integra
todas as redes sociais em
uma
única
janela)
a
instalação padrão do sistema
“Ubuntu
nas
nuvens,
o na versão 10.04 do sistema.”
primeiro sistema Linux com
computação nas nuvens.”
“O Gwibber seja a solução
para os problemas, temos a
possibilidade de integrar a
janelas pop-up, fazendo que
ele não necessite estar aberto
para
vermos
atualizações.”
as
43
Facilidades
de
uso
ao “Partimos do princípio que “Dificil expressar mas a
usuário doméstico comum
todos somos usuários e não
solução é esta: Como padrão
duas
barras
inferior
programas em execução e
superior ícones e menus, um
mix de MAC e PC.”
“É
algo
vamos
subjetivo
mudar
as
mas,
cores
padrões do sistema em busca
de uma identidade para o
sistema
e
torná-lo
mais
bonito.”
“Por padrão na versão 10.04
já teremos a nova versão do
canal
de
software
aposentando de certa forma
o terminal para instalação e
desinstalação do sistema.”
44
programadores.”
“Reduzir a utilização do
terminal o máximo possível.”
“Facilidade
em
interface
gráfica: Pensem como um
MAC.”
“Não
queremos
ninguém,
copiar
mas
vejamos
de
softwares
experiências
livre de sucesso, eles são
simpáticos.”
Recursos de acessibilidade “Em
ao sistema
muitos
casos,
um “Essa modificação faremos
computador tem apenas um em parceria com o GNOME
usuário”. Antes de entrar, PROJECT, já que este é um
você tem que pressionar problema
de
várias
Enter para selecionar o seu distribuições que usam a
nome de usuário, mesmo se mesma interface gráfica.”
você for o único usuário do
computador. Não é que um
grande problema, mas seria
bom
se
o
usuário
é
automaticamente
selecionado para o login
45
para que você possa de
imediato começar a digitar
sua
senha,
facilitaria
bastante como acontece em
outros
sistemas
rotulados
como fáceis.”
Quadro 4: Solução proposta e externalização do conhecimento
Fonte: Pesquisa própria
No Quadro 4, pode-se observar a partir dos fragmentos dos diálogos uma solução
proposta pelos programadores do sistema. É possível observar que nem todos os
questionamentos feitos no Quadro 4 foram respondidos, pois os próprios programadores e
colaboradores do sistema apagam os tópicos nos quais eles entendem que não precisam
necessariamente ser respondidos pelos mesmos. Retomando Nonaka e Takeuchi (1997) a
exclusão de fragmentos de diálogos no processo de externalização do conhecimento é um
processo de validação das causas feitas pelo grupo. Voltando ao Quadro 4, vê-se uma
espontânea manifestação de um conhecimento tácito em forma de solução para o problema
apresentado conduzido partir de um modelo mental produzido através de uma indução,
dedução, analogia e metáfora. Nos diálogos a seguir, pode-se observar que os moderadores
entendiam as necessidades, mas somente conseguiram encontrar uma solução a partir dos
modelos mentais induzidos pela a indução, dedução, analogia e metáforas:
“Sabíamos que precisávamos integrar mas não entendíamos como agora posso enxergar:
que temos integrar o Gwibber (Programa de código aberto que integra todas as redes sociais
em uma única janela) a instalação padrão do sistema na versão 10.04 do sistema.”
“Dificil expressar mas a solução é esta: Como padrão duas barras inferior programas em
execução e superior ícones e menus, um mix de MAC e PC.”
“É algo subjetivo, mas vamos mudar as cores padrões do sistema em busca de uma
identidade para o sistema e torná-lo mais bonito.”
46
É possível constatar a dificuldade em expressar as soluções propostas pelos
moderadores nos diálogos citados anteriormente. Contudo, resgatando Nonaka e Takeuchi
(1997), que afirmam que o conhecimento tácito é muito mais que aquilo que podemos
expressar e que por muito entendemos como subjetivo é intrínseco e pessoal. O processo de
validação da externalização do conhecimento foi identificado nas comunidades virtuais de
desenvolvimento do Ubuntu Linux pelos seus colaboradores a partir da classificação feita por
eles em três problemas principais encontrados no sistema: redes sociais, facilidades de uso ao
usuário doméstico comum e recursos de acessibilidade do sistema confirmando o dinamismo
e a seleção de causas e modelos mentais identificados pelo grupo no processo de
externalização do conhecimento. Logo é confirmado o modelo teórico de externalização do
conhecimento de Nonaka e Takeuchi (1997) caracterizado como a conversão de um
conhecimento tácito em explícito, no caso da comunidade de desenvolvimento do Ubuntu
Linux essa externalização vem em forma de soluções para os problemas encontrados no
desenvolvimento da distribuição Ubuntu Linux.
47
8
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O projeto de software livre Ubuntu apresenta alto grau de complexidade. Se, por um
lado, existe uma organização formal – a Canonical Foundation – com papéis bem-definidos,
por outro lado há uma comunidade virtual de prática com pessoas com diferentes níveis de
comprometimento que utilizam as redes de comunicação online como cenário de discussão e
produção de software, colaborando de forma espontânea em processos totalmente mantidos
em ambientes virtuais de comunicação.
A presente pesquisa netnográfica se adequou à estratégia de pesquisa em comunidades
virtuais, pois promoveu a necessária imersão do pesquisador em comunidades virtuais, de
modo a lhe permitir observar manifestações do conhecimento tácito e as possibilidades de sua
transformação em conhecimento explícito. Seguindo a orientação teórica do modelo
conceitual escolhido para entender a explicitação do conhecimento tácito, identificaram-se
causas a externalização do conhecimento a dedução, a indução, analogia e metáfora.
Com relação às causas para a externalização do conhecimento, foi possível constatar
em trechos de discursos uma reflexão coletiva sobre determinados assuntos de interesse dos
membros da comunidade. Os recursos utilizados para a externalização do conhecimento
como: dedução, indução e analogia são amplamente usadas pelos membros da comunidade
para traçar objetivos para uma possível modificação ou adaptação do sistema por novas
demandas ou recursos no sistema. Também foi possível observar, confirmando a literatura,
que a causa metáfora somente emerge nos discursos quando os membros sentem a
necessidade de entender intuitivamente uma coisa imaginando outra simbolicamente, então
usada para a criação de conceitos mais radicais (NONAKA; TAKEUCHI, 1997). Logo,
constatou-se que o recurso da metáfora é suficientemente utilizado para a criação de novos
conceitos e diretrizes a serem alcançados pelos membros da comunidade virtual.
Em conformidade com Nonaka e Takeuchi (1997), é possível observar que as
contradições inerentes a uma metáfora são harmonizadas muitas vezes por uma analogia,
destacando o carácter em comum entre as partes; contudo, muitas vezes a analogia e a
metáfora se confundem.
Neste estudo, foi possível observar que todas as causas à externalização do
conhecimento foram constatadas entre os vários diálogos e discussões dos membros
desenvolvedores e colaboradores da distribuição Linux Ubuntu. Combinando indução,
dedução, analogia e metáfora, os membros dessa comunidade virtual demonstraram que o
48
ambiente virtual mediado pela comunicação online é um ambiente propício ao processo de
externalização do conhecimento.
O conhecimento tem papel essencial no desenvolvimento do software livre via CMC,
sendo observado nessa pesquisa através do surgimento de novas propostas e soluções para o
desenvolvimento do sistema Ubuntu Linux. Partindo para um panorama gerencial o
conhecimento tem papel essencial para o desenvolvimento das organizações, sendo um
diferencial de criação e desenvolvimento de soluções encontradas em um mercado dinâmico,
sendo de fundamental importância a adoção de práticas gerenciais compatíveis com a criação
e aprendizado individual bem como a coordenação sistêmica de esforços em vários planos:
organizacional e individual, estratégico e operacional para a difusão do conhecimento em toda
organização.
8.1 Limitações da pesquisa e propostas de pesquisas futuras
Uma pesquisa mais completa deve usar todas as ferramentas indicadas por Kozinets
(1998); no caso da presente pesquisa, não foi realizada, por exemplo, a cyber interview,
devido ao fato de que as perguntas já se encontravam disponíveis nos fóruns da comunidade
virtual, não sendo mais necessárias para a obtenção das evidências de interesse da presente
pesquisa. Nessa pesquisa somente foi observado o processo de externalização do
conhecimento em ambientes virtuais, sendo desconsiderados os fóruns e congressos de
software livre presencial que acontecem com grande regularidade em diversos locais no
mundo, portanto é uma importante fonte para pesquisa futura sobre software livre e o
conhecimento no desenvolvimento de software. O leque de pesquisas futuras é imenso,
contudo o que mais chama a atenção é o voluntarismo e a motivação característico do
desenvolvimento do software livre que, de fato, exige uma adesão genuína dos colaboradores,
assim constituindo um ótimo tema a ser estudado futuramente.
49
REFERÊNCIAS
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<http://www.yale.edu/yalelj/112/BenklerWEB.pdf>.Acesso em: 13 de agosto de 2009.
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prática. UFBA: Núcleo de Pós-Graduação em Administração, 2007.
DA COSTA, R. Por um novo conceito de comunidade: redes sociais, comunidades pessoais,
inteligência coletiva. Programa de Pós-Graduação em Comunicação e Semiótica, Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo (PUCSP), 2007.
DRUCKER, P.F. Sociedade pós-capitalista. 7. ed. São Paulo: Thomson Learning, 2001.
Gibson, William. Neuromancer. New York: Ace; 1984.
GODOI, C.K.; MACHADO, V.V. Impactos Físicos, Cognitivos e Sociais do Uso da Internet
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2009.
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HENRI, F.; PUDELKO, B. Understanding and analyzing activity and learning in virtual
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