Valor Adicionado aos Consumidores Livres de Energia Elétrica no Brasil por Contratos Flexíveis: Uma Abordagem pela Teoria das Opções Autoria: Leonardo Lima Gomes, Bruno Nogueira Silva, Jaderson Vargas de Souza, Luis Sergio Ribeiro dos Santos Resumo O processo de reestruturação do Setor Elétrico Brasileiro iniciado em 1997 propiciou o surgimento de um mercado livre de energia. Atualmente, de acordo com o decreto no 5.163 de 30 de Julho de 2004, está regulamentada a existência do Ambiente de Contratação Livre (ACL) sendo definido como o segmento do mercado no qual se realizam as operações de compra e venda por contratos bilaterais livremente negociados. Ao longo do tempo os contratos no ambiente livre ficaram mais sofisticados, passando a incorporar algumas flexibilidades como, entre outras, permitir uma faixa de escolha por parte do comprador da quantidade de energia a ser entregue, ou permitir que o comprador exerça o direito de parar ou reduzir substancialmente o consumo durante determinado intervalo pré-acordado. Este trabalho se propõe a responder o quanto podem valer estas flexibilidades embutidas nos contratos de energia elétrica no Brasil. As flexibilidades foram modeladas como opções de compra e de venda, e valoradas utilizando-se simulação dos preços mensais de energia. Foram realizadas análises de sensibilidade em relação ao tamanho das flexibilidades, aos preços contratados e às taxas de desconto. Encontrou-se que o valor conjunto das opções de escolha da quantidade e de redução pode ultrapassar 15% do valor do contrato. 1 - Introdução Até 1997 o Setor Elétrico Brasileiro (SEB) era basicamente um monopólio estatal administrado por empresas federais e estaduais. A partir do segundo semestre desse ano foram iniciadas as privatizações, e em paralelo uma forte reestruturação do setor. A partir de então, o SEB passou a experimentar um acentuado processo de mudança, iniciado nos moldes do Projeto RE-SEB, tendo como algumas das principais características: • • • • A desverticalização da produção, transmissão, distribuição, e comercialização; Os segmentos de produção e comercialização passaram a ser uma atividade competitiva com preços contratados definidos pelo mercado; O livre acesso dos geradores e comercializadores às redes de transmissão e distribuição; Criação do MAE - Mercado Atacadista de Energia hoje chamado de CCEE – Câmara de Comercialização de Energia Elétrica, o ambiente onde a livre competição deve condicionar a formação de preços; O processo de reestruturação iniciado em 1997 propiciou o surgimento de um mercado livre de energia entre, fundamentalmente, geradoras, comercializadoras e empresas com grande consumo de energia (consumidores livres), sendo o principal instrumento de negociação um contrato bilateral que estabelece basicamente as quantidades a serem entregues, por que prazo e a qual preço contratado. Atualmente, de acordo com o decreto no 5.163 de 30 de Julho de 2004, está regulamentada a existência do Ambiente de Contratação Livre (ACL) sendo definido no decreto como o segmento do mercado no qual se realizam as operações de compra e venda de energia elétrica, objeto de contratos bilaterais livremente negociados, conforme regras e procedimentos de comercialização específicos. 2 Com o passar do tempo e devido a algumas necessidades dos compradores de energia elétrica reveladas a partir da incapacidade de prever exatamente o consumo, os contratos bilaterais ficaram mais sofisticados, passando a incorporar algumas flexibilidades como, entre outras, permitir uma faixa de escolha por parte do comprador da quantidade de energia a ser entregue (opção de escolha da quantidade), ou permitir que o comprador exerça o direito de parar ou reduzir substancialmente o consumo durante determinado intervalo pré-acordado (opção de redução). Considerando as flexibilidades citadas, a questão chave que este trabalho se propõe a responder é: Quanto podem valer as flexibilidades (opção de escolha da quantidade e opção de redução) embutidas em contratos de energia elétrica no Brasil? No sentido de responder a esta questão, as flexibilidades foram modeladas como opções de compra e de venda, e valoradas utilizando-se simulação dos preços mensais de energia denominados atualmente de Preços de Liquidação das Diferenças – PLDs. Foram realizadas análises de sensibilidade em relação ao tamanho das flexibilidades, aos preços contratados, e às taxas de desconto. Na literatura de finanças, encontram-se trabalhos que se propuseram a avaliar opções embutidas em contratos. Um dos trabalhos precurssores foi o desenvolvido por Trigeorgis (1996) no qual ele avalia opções embutidas em contratos de Leasing. Este trabalho inicia descrevendo quais são as principais características dos contratos de energia elétrica no Brasil e como as flexibilidades podem estar embutidas. Em seguida, descreve-se como os PLDs serão simulados e como as flexibilidades serão modeladas. Depois é realizado um exemplo numérico com dados e análises de sensibilidade que se aproximam da realidade do mercado de energia elétrica atual, obtendo-se valores para as flexibilidades analisadas individualmente e em conjunto. Em seguida são feitas as conclusões deste estudo. 2 - Características dos Contratos Bilaterais de Energia Elétrica 2.1 - Principais Características A unidade básica negociada em contratos de energia elétrica é o MWh, sendo os preços negociados em R$/MWh. Um contrato deve especificar as quantidades de energia elétrica a serem entregues durante determinados intervalos de tempo. Por exemplo, seja um contrato especificado para dois meses de entrega, março e abril de 2004. O contrato determina que o fornecedor deverá entregar 74400 MWh em março e 72000 MWh em abril. Se o preço contratado for de 50 R$/MWh, o faturamento do fornecedor deverá ser de R$ 50x74400 em março e de de R$ 50x72000 em abril. No exemplo anterior, ao se dividir a quantidade de energia em MWh pelo número de horas de cada mês, encontra-se o valor de 100 MW para ambos. É bastante comum também que a quantidade negociada esteja em MW, mais especificamente em MWmédio para indicar que é uma média no período. Assim, no exemplo, a quantidade negociada de 100 MWmed para março e abril, equivale a 100x744 MWh em março e 100x720 MWh em abril. Outro item básico a ser especificado no contrato é o local de entrega. O mercado brasileiro é dividido em quatro sub-mercados, sudeste/centro-oeste, sul, nordeste e norte, originados a partir de restrições de transmissão. Dependendo da situação do armazenamento, da oferta e da demanda, cada sub-mercado pode apresentar preços bastante diferentes uns dos outros. Daí a importância da especificação do local da entrega. Exemplificando, considere um contrato com as seguintes características: Ponto de Entrega: Centro de Gravidade do Submercado Sudeste/Centro-oeste; Duração: Janeiro a Dezembro de 2005; 3 Quantidade: 50 MWmed; Preço: 60 R$/MWh. A energia será entregue no submercado sudeste/centro-oeste sem perdas de distribuição de Janeiro a Dezembro de 2005 ao preço fixo de 60 R$/MWh. As quantidades em MWh serão calculadas mensalmente pelo produto de 50 MWmed x número de horas no mês. 2.2 - Flexibilidades Embutidas nos Contratos Bilaterais de Energia Elétrica no Brasil Uma das principais flexibilidades é a permissão de uma faixa de escolha por parte do comprador da quantidade de energia a ser entregue (opção de escolha da quantidade). Normalmente, os contratos com essa flexibilidade especificam o intervalo de escolha em mais ou menos um percentual da quantidade contratada. Por exemplo, considerando uma quantidade contratada de 50 MWmed, o intervalo de escolha pode estar sendo especificado em ± 20% dessa quantidade, ou seja, entre 40 (limite inferior) e 60 MWmed (limite superior). Sendo assim, a cada período de apuração (geralmente mensal), o comprador poderá escolher a quantidade que quer comprar entre 40 e 60 MWmed ao preço contratado. Supondo que o comprador tenha de fato uma necessidade de 50 MWmed, por que então ele escolheria uma quantidade de suprimento diferente? Considerando que os preços de curto prazo em um determinado mês estejam abaixo do preço do contrato, o comprador poderia escolher comprar 40 MWmed ao preço contratado, e os 10 MWmed restantes a um preço menor que o contratado, gerando uma economia. Ao contrário, considerando que os preços de curto prazo em um determinado mês estejam acima do preço do contrato, o comprador poderia escolher comprar 60 MWmed ao preço contratado, e os 10 MWmed de excesso ele venderia no mercado de curto prazo a um preço maior, gerando um ganho adicional. Observa-se então que a opção de escolha da quantidade agrega valor ao contrato. Outra flexibilidade importante embutida em alguns contratos de energia é a permissão que o comprador exerça o direito de parar ou reduzir substancialmente o consumo/a entrega durante determinado intervalo pré-acordado (opção de redução). O intervalo pré-acordado pode ser, por exemplo, todo mês de dezembro incluído no período de vigência do contrato. Se a redução permitida for parcial, o contrato também deverá especificar o tamanho, sendo em geral um percentual da energia contratada. Por exemplo, uma redução permitida de 60% de uma energia contratada de 50 MWmed, corresponderia a uma redução permitida de 30 MWmed. Um comprador exerce a opção de redução quando os preços de curto prazo são menores que o preço contratado. Os valores agregados por estas flexibilidades só existem porque há um mercado de curto prazo onde as opções podem ser exercidas. Os preços que balizam os preços de curto prazo são os estabelecidos pela Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE). A CCEE publica PLDs semanais e um preço médio mensal de referência PLD (média ponderada dos preços semanais). A seção seguinte explica como esses preços são calculados, e como podem ser simulados. Existem outras flexibilidades embutidas em contratos de energia elétrica no Brasil que não estão consideradas neste trabalho, tais como: a de extensão do período de contratação ao preço contratado, a flexibilidade de sazonalização (rearranjo das quantidades mensais contratadas mantendo-se constante a quantidade anual) e a flexibilidade de modulação (rearranjo de quantidades dentro do mês mantendo-se constante a quantidade mensal contratada). 4 3 - Formação e Simulação dos Preços de Liquidação das Diferenças (PLDs) O Brasil adotou um esquema de despacho (geração de energia elétrica) centralizado realizado por modelos acoplados de otimização (atualmente, um modelo de médio prazo que está acoplado a um de longo prazo chamado Newave) cujo objetivo é minimizar o custo total de operação do sistema hidrotérmico ao longo de um horizonte de planejamento. Esses modelos utilizam o método de programação dinâmica dual estocástica (Pereira e Pinto , 1991). A fim de conceituar melhor a formação de preço no sistema hidrotérmico brasileiro, torna-se necessária uma abordagem sobre como é feita a operação sob uma ótica econômica. As seções a seguir apresentam essa abordagem. 3.1 - Operação de um Sistema Hidrotérmico A característica mais evidente de um sistema com geração hidroelétrica é poder utilizar a energia “grátis” que está armazenada nos reservatórios para atender à demanda, evitando desta maneira gastos de combustível com as unidades térmicas. Entretanto, a disponibilidade de energia hidro está limitada pela capacidade de armazenamento nos reservatórios. Isto introduz uma dependência entre a decisão operativa de hoje e os custos operativos no futuro. Em outras palavras, se utilizarmos hoje as reservas de energia hidro, com o objetivo de minimizar os custos térmicos, e ocorre uma seca severa no futuro, pode haver um racionamento de custo elevado. Se, por outro lado, preservamos as reservas de energia hidro através de um uso mais intenso de geração térmica, e as afluências futuras são elevadas, pode ocorrer um vertimento nos reservatórios do sistema, o que representa um desperdício de energia e, consequentemente, um aumento no custo operativo. Esta situação está ilustrada na Figura 1. Altas Ok Baixas Déficit Utilizar os Reservatórios Decisão Consequências Chuvas Altas Vertimento Baixas Ok Não Utilizar os Reservatórios Figura 1 - Processo de Decisão para Sistemas Hidrotérmicos O operador de um sistema hidrotérmico deve comparar o benefício imediato do uso da água e o benefício futuro de seu armazenamento, conforme ilustrado na Figura 2. 5 FCF FCI Volume final Figura 2 – Custo imediato e Futuro A função de custo imediato - FCI - mede os custos de geração térmica no estágio t. Observa-se que o custo imediato aumenta à medida que diminui a energia hidro disponível no estágio, isto é, à medida que aumenta o volume armazenado final. Por sua vez, a função de custo futuro - FCF - está associada ao custo esperado de geração térmica e racionamento do final do estágio t (início de t+1) até o final do período de estudo. Esta função diminui à medida que aumenta o volume armazenado final, pois haverá mais energia hidro disponível no futuro. O uso ótimo da água armazenada corresponde ao ponto que minimiza a soma dos custos imediato e futuro. Como é mostrado na Figura 3, o ponto de mínimo custo global também corresponde ao ponto onde as derivadas da FCI e da FCF com relação ao armazenamento se igualam. FCI + FCF FCI FCF Valor da água decisão ótima Volume final Figura 3 - Uso Ótimo da Água 3.2 – Cálculo do PLD Será apresentado em um pouco mais detalhe como é realizado o despacho econômico e calculado o PLD. Na formulação a seguir, estamos supondo que a função de custo futuro para cada estágio foi calculada. O problema de despacho hidrotérmico para o estágio t é formulado como: zt = Min [cj×gtj + FCF(vt+1)] sujeito às seguintes restrições operativas: • • balanço hídrico limites de armazenamento e turbinamento 6 • • limites na geração térmica atendimento à demanda A função objetivo é minimizar a soma de duas classes de custos: • custo operativo imediato - dado pelos custos térmicos {cj×gtj} no estágio t. O racionamento é representado por uma térmica fictícia de capacidade infinita e custo operativo igual ao custo de interrupção • valor esperado do custo operativo futuro - dado pela função de custo futuro FCF(vt+1). Também como discutido anteriormente, esta função depende dos volumes armazenados ao final do estágio, representados pelo vetor vt+1. O problema de otimização pode ser resolvido por um algoritmo de programação linear. Além da decisão operativa ótima, o esquema de programação calcula os multiplicadores simplex, ou preços sombra, associados a cada restrição. Em particular, o PLD do sistema é o multiplicador simplex associado à restrição de atendimento à demanda, significando o custo de produção de 1 MWh adicional no ponto ótimo de minimização de custos (em R$/MWh). É comum nos referirmos ao PLD também como o custo marginal de operação do sistema. 3.3 - Cálculo e Simulação dos PLDs Neste trabalho, para formar e simular os PLDs, foi utilizado o modelo Newave (elaborado pelo Centro de Pesquisas de Energia Elétrica – CEPEL, versão 11.2/2004) que otimiza a estratégia de geração de longo prazo de acordo com o conceito apresentado nas seções anteriores, formando preços com discretização mensal. O PLD é limitado a um piso e um teto de preço definidos pela Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL). O modelo Newave possui dois módulos. No primeiro é calculada a política ótima de operação ao longo do horizonte de planejamento, representando um “mapa de decisão” em função do que vier a ocorrer ou ser simulado em termos de afluências (chuvas) aos reservatórios. No segundo módulo são feitas simulações do custo marginal de operação. Neste estudo, após a utilização do modelo Newave para calcular a política ótima de operação hidrotérmica ao longo de um período de planejamento, será feita uma simulação com a qual se obtêm séries de custos marginais de operação, e , aplicando-se os limites, obtêm-se séries de PLDs. A simulação será realizada mediante a geração de séries sintéticas de afluências aos reservatórios utilizando um modelo periódico autoregressivo (PAR(p)) de séries temporais (Maceira e Bezerra, 1997). É importante ressaltar que o modelo Newave é utilizado na formação dos preços de curto prazo (PLD) publicados na CCEE. 7 4 - Modelagem das Flexibilidades A opção de escolha da quantidade será modelada, para cada mês do contrato, como a soma de uma opção de compra com uma opção de venda. Considerando uma quantidade contratada de 50 MWmed com o intervalo de escolha em ± 20%, o comprador terá uma opção de compra de 10 MWmed e uma opção de venda de 10 MWmed para cada mês do contrato, sendo o preço de exercício o contratado. A Figura 4 ilustra as duas opções. Limite Energia Contratada Opção de Compra Opção de Venda Limite Inferior Figura 4 – Ilustração da Modelagem da Opção de Escolha da Quantidade O valor da opção de escolha da quantidade (OEQ0,t) em t=0 para um determinado momento t de exercício será igual à soma do valor em t=0 da opção de compra (OC0,t exercício em t) com o valor em t=0 da opção de venda (OV0,t) com momento de exercício em t. Ou seja: OEQ0,t = OC0,t + OV0,t Sendo: OC0,t = E0(OCt) / (1+k)t ; OCt = max (0, Etcompra(St - Ptc)) OV0,t = E0(OVt )/ (1+k)t ; OVt = max (0, Etvenda (Ptc - St)) Onde: Ptc – Preço contratado de energia em t Etc – Energia contratada no instante t Etcompra – Montante de energia embutido na opção de compra Etvenda – Montante de energia embutido na opção de venda St – Preço de curto prazo (pMAE) no instante t OCt – Valor da opção de compra no instante t (momento de exercício) OVt – Valor da opção de venda no instante t (momento de exercício) k – taxa de desconto O valor das opções de compra e de venda é, portanto, obtido como os valor esperado dos pagamentos simulados das opções descontado a valor presente. Este método de avaliação é usualmente empregado em finanças para avaliar opções (Hull, 2003: 493), (Pilipovic, 1997: 134), porém normalmente utilizando taxas de desconto neutras ao risco. 8 Como a flexibilidade é válida para todos os intervalos de apuração (meses) ao longo do contrato, o valor total da flexibilidade de escolha da quantidade (VOEQ0,i,T) será igual ao somatório dos valores de todas as opções de escolha da quantidade (OEQ0,t) em t=0 para t variando do instante em que o contrato inicia (t = i) até o momento em que o contrato termina (t = T). t =T VOEQ0,i,T = ∑ OEQ t =i 0, t A opção de redução, ou seja, a permissão que o comprador exerça o direito de parar ou reduzir substancialmente a quantidade de energia durante determinado intervalo pré-acordado será modelada como uma opção de venda. Supondo que o intervalo pré-acordado seja todo mês de dezembro incluído no período de vigência do contrato e que a redução permitida seja de 60% sobre uma energia contratada de 50 MWmed, um comprador terá a opção de redução de 30 MW (Etvenda) em todo mês de dezembro ao longo do contrato, exercendo esta opção quando os preços de curto prazo forem menores que o preço contratado. O valor da opção de redução (OR0,t) em t=0 para um determinado instante t de exercício será igual a: OR0,t = E0(ORt )/ (1+k)t ; ORt = max (0, Etvenda (Ptc - St)) Onde: Ptc – Preço contratado de energia em t Etvenda – Montante de energia embutido na opção de venda St – Preço de curto prazo (pMAE) no instante t ORt – Valor da opção de redução no instante t (momento de exercício) k – taxa de desconto Sendo a flexibilidade válida para todos intervalos pré-acordados ao longo do contrato, o valor total das opções de redução (VOR0,t1,tn) será igual ao somatório dos valores de todas as opções de redução (OR0,t) em t=0 considerando todos os n possíveis momentos de exercício (t = t1 a t = tn). t =tn VOR0,t1,tn = ∑ OR t =t1 0, t 5 - Exemplo Numérico Será estudado um contrato sendo negociado em fevereiro/2004 (t=0) com as seguintes características (caso base): Ponto de Entrega: Centro de Gravidade do Submercado Sudeste/Centro-oeste; Duração: Julho/2004 (t=i=5) a Dezembro/2006 (t=T=34); Quantidade: 50 MWmed; Preço: 60 R$/MWh; Opção de Escolha da Quantidade: ± 10%; Opção de Redução: Redução total nos meses de dezembro. 9 Os preços de curto prazo foram simulados (2000 séries) para o horizonte do contrato a partir do modelo Newave. Foram utilizados os dados de entrada empregados no programa mensal de operação de fevereiro/2004 coordenado pelo Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS). Foram considerados um piso de preço de 18,59 R$/MWh e um teto de 452,00 R$/MWh regulados pela ANEEL a partir da audiência pública AP046/2003. Considerando os preços simulados, o gráfico a seguir apresenta os valores médios mensais, assim como alguns percentis variando de 10 a 90%. Comparando-se estes valores, observa-se que as distribuições de densidade de probabilidade mensais são bastante assimétricas atribuindo probabilidades mais altas a intervalos de preços menores. As médias mensais chegam a ser superiores aos percentis 70% pela maior parte do tempo. 160,00 140,00 R$/MWh 120,00 100,00 80,00 60,00 40,00 20,00 Média Percentil (90%) Percentil (70%) Mediana Percentil (30%) percentil (10%) out/07 jul/07 abr/07 jan/07 out/06 jul/06 abr/06 jan/06 out/05 jul/05 abr/05 jan/05 out/04 jul/04 0,00 Figura 5 – Evolução de Algumas Estatísticas Mensais Complementando a figura anterior, o gráfico a seguir apresenta distribuições de probabilidade mês a mês para quatro intervalos de preços. Observa-se grande probabilidade de preços baixos. A probabilidade dos preços estarem entre o piso e 20 R$/MWh é de aproximadamente 60%, e dos preços estarem abaixo de 50 R$/MWh encontra-se em torno de 80%. 10 100% 90% Probabilidade Classes 80% 70% 60% 50% 40% 30% 20% 10% ju l /0 4 se t/0 no 4 v/ 04 ja n/ 0 m 5 ar /0 m 5 ai /0 5 ju l/0 5 se t/0 no 5 v/ 05 ja n/ 0 m 6 ar /0 m 6 ai /0 6 ju l/0 6 se t/0 no 6 v/ 06 0% piso / abaixo de 20 20 a 50 50 a 100 100 a 200 acima de 200 Figura 6 – Distribuições de Probabilidade Mensais (Preços em R$/MWh) Cada opção será analisada separadamente em relação a algumas variáveis chave para a formação de valor. Para facilitar comparações dos valores das opções com os preços contratados, os valores serão calculados em R$/MWh obtidos pela divisão dos valores originais das opções em R$ pela quantidade de energia nominalmente contratada em MWh. Será obtido também o valor conjunto das opções, pois nem sempre o valor conjunto das opções é igual à soma dos valores individuais de cada uma delas (Trigeorgis, 1993). Isto será verificado neste trabalho. Foram feitas análises de sensibilidade em relação ao tamanho da flexibilidade, ao preço contratado, e à taxa real de desconto. Em cada análise de sensibilidade, as premissas do caso base são mantidas excetuando-se a variável que está sendo analisada. A taxa de desconto real (k) utilizada no caso base é de 10% ao ano. Da teoria de finanças, ao se valorar um ativo derivativo de um ativo base, se for possível montar uma carteira livre de risco com ambos, a taxa de desconto apropriada para valorar o derivativo é a taxa livre de risco (Dixit e Pindyck, 1994: 114). Neste trabalho, sendo o mercado de energia brasileiro insipiente, optou-se por assumir que não é possível montar carteiras livres de risco. Assim, a taxa de desconto é considerada uma taxa ajustada ao risco que na verdade não se sabe exatamente qual é, mas se conhece bem em que intervalo está. Nas análises de sensibilidade será utilizado o intervalo entre 5 e 15% a.a. de taxas reais. Começando pela opção de escolha da quantidade, observa-se pela Figura 7 que seu valor total sobe até em torno de 7,0 R$/MWh (corresponde a mais que 10% do preço contratado) para uma flexibilidade de ± 20%. O ganho de valor a cada ± 1 % de flexibilidade adicional é de aproximadamente 0,35 R$/MWh. Observa-se também que o valor das opções de venda é superior ao valor das opções de compra. Isto ocorre devido aos preços simulados apresentarem probabilidade bem maior de ficarem perto do piso e bem abaixo do preço de contrato. 11 Valor da Opção de Escolha da Quantidade Valor das Opções (R$/MWh) 7,00 6,00 5,00 4,00 3,00 2,00 1,00 0,00 0% 2% 4% 6% 8% 10% 12% 14% 16% 18% 20% Variação % do Intervalo (para mais/menos) Valor Opções de Compra Valor Opções de Venda Total Figura 7 – Valor da Opção de Escolha da Quantidade x Flexibilidade (%) Em relação ao preço contratado, observa-se pela Figura 8 que o valor total da opção varia aproximadamente entre 3,0 e 4,1 R$/MWh para preços contratados de 50 a 70 R$/MWh respectivamente. Observa-se também que, aumentando-se o preço contratado (preço de exercício) o valor das opções de venda cresce a uma taxa maior que a taxa de decrescimento do valor das opções de compra. Ressalta-se que a linearidade ocorre porque a sensibilidade é feita sobre o preço de exercício. É amplamente conhecido que o valor de opções varia de forma não linear quando calculado em função do preço do ativo objeto (aqui os PLDs). Valor da Opção de Escolha da Quantidade Valor das Opções (R$/MWh) 7,00 6,00 5,00 4,00 3,00 2,00 1,00 0,00 50 52 54 56 58 60 62 64 66 68 70 Preço Contratado (R$/MWh) Valor Opções de Compra Valor Opções de Venda Total Figura 8 – Valor da Opção de Escolha da Quantidade x Preço Contratado 12 Em relação à taxa de desconto ajustada ao risco, observa-se pela Figura 9 que se segue que o valor total da opção varia entre em torno de 3,8 a 3,3 R$/MWh para taxas de desconto entre 5 e 15% respectivamente. Portanto, apesar de não se conhecer com precisão a taxa de desconto, sabe-se que o valor da opção de escolha da quantidade varia pouco com as taxas de desconto comparando-se com as sensibilidades em relação às outras variáveis estudadas. Valor da Opção de Escolha da Quantidade Valor das Opções (R$/MWh) 7,00 6,00 5,00 4,00 3,00 2,00 1,00 0,00 5% 6% 7% 8% 9% 10% 11% 12% 13% 14% 15% Taxa de Desconto Real (% a.a.) Valor Opções de Compra Valor Opções de Venda Total Figura 9 – Valor da Opção de Escolha da Quantidade x Taxa de Desconto Ajustada ao Risco Considerando agora a opção de redução, observa-se pela Figura 10 que seu valor varia entre em torno de 1,3 a 2,5 R$/MWh para reduções permitidas de 50 a 100%, ou seja, chegando a quase 5% do preço contratado. Valor da Opção de Redução Valor da Opção (R$/MWh) 3,50 3,00 2,50 2,00 1,50 1,00 0,50 0,00 50% 55% 60% 65% 70% 75% 80% 85% 90% 95% 100% Redução Permitida (%) Figura 10 - Valor da Opção de Redução x Tamanho da Redução (%) 13 Em relação ao preço contratado, a Figura 11 mostra que o valor total da opção varia aproximadamente entre 1,8 e 3,3 R$/MWh para preços contratados de 50 a 70 R$/MWh. Como era de se esperar o valor da opção de venda aumenta com o preço de exercício. Valor da Opção de Redução Valor da Opção (R$/MWh) 3,50 3,00 2,50 2,00 1,50 1,00 0,50 0,00 50 52 54 56 58 60 62 64 66 68 70 Preço de Contratação (R$/MWh) Figura 11 - Valor da Opção de Redução x Preço de Contratação Em relação à taxa de desconto ajustada ao risco, observa-se pela Figura 12 que o valor total da opção varia entre em torno de 2,8 a 2,4 R$/MWh para taxas de desconto entre 5 e 15% respectivamente. Portanto, como citado anteriormente, apesar de não se conhecer com precisão a taxa de desconto, sabe-se que o valor da opção de redução varia pouco com as taxas de desconto comparando-se com as sensibilidades em relação às outras variáveis estudadas. Valor da Opção de Redução Valor da Opção (R$/MWh) 3,50 3,00 2,50 2,00 1,50 1,00 0,50 0,00 5% 6% 7% 8% 9% 10% 11% 12% 13% 14% 15% Taxa de Desconto Real (% a.a.) Figura 12 - Valor da Opção de Redução x Taxa de Desconto Ajustada ao Risco 14 O valor conjunto das opções não é simplesmente o resultado da soma dos valores individuais. Isto ocorre porque, considerando ambas as opções no mesmo contrato, há uma superposição de flexibilidades. Nos meses de exercício da opção de redução, como já existe uma flexibilidade de redução por parte da opção de escolha da quantidade, na verdade, o valor agregado pela opção de redução só pode ser associado à possibilidade de redução complementar gerada por esta opção. Por exemplo, seja a flexibilidade de escolha da quantidade de ± 10% e a flexibilidade de redução de 50%. Como já existe a possibilidade de redução de 10% na primeira opção, o valor adicionado pela segunda opção se refere à diferença, ou seja, 40%, e não aos 50% descritos no contrato. A Tabela 1 apresenta valores mostrando o efeito da interação entre as opções. Tabela 1 – Valor Conjunto x Soma dos Valores Individuais das Opções Valor Individual da Opção de Escolha da Quantidade Valor da Opção 10% Valor Individual da Opção de Redução Flexibilidade Redução (%) 50% 60% 70% 80% Valor Opção (R$/MWh) 1,27 1,52 1,77 2,03 Soma Valores (R$/MWh) 4,77 5,02 5,27 5,53 Valor Conjunto (R$/MWh) 3,75 4,77 5,02 5,27 Flexibilidade Valor Individual da Opção de Escolha da Quantidade Valor da Opção 20% Valor Individual da Opção de Redução Flexibilidade Redução (%) 50% 60% 70% 80% Valor Opção (R$/MWh) 1,27 1,52 1,77 2,03 Soma Valores (R$/MWh) 8,27 8,52 8,77 9,03 Valor Conjunto (R$/MWh) 7,77 8,02 8,27 8,52 Flexibilidade 3,50 R$/MWh 90% 2,28 5,78 5,53 100% 2,53 6,03 5,78 7,00 R$/MWh 90% 2,28 9,28 8,77 100% 2,53 9,53 9,03 Verifica-se que o valor conjunto das opções quando a flexibilidade da opção de escolha da quantidade é de 10% é menor que a soma dos valores individuais das opções em 0,25 R$/MWh. Para um valor de flexibilidade da opção de escolha da quantidade de 20%, o valor conjunto das opções é 0,50 R$/MWh menor que a soma dos valores individuais. O valor conjunto das opções pode chegar a 9,03 R$/MWh o que corresponde a 15% do preço contratado de 60 R$/MWh. 6 - Conclusão A principal conclusão obtida com este estudo é a de que o valor conjunto das opções de escolha da quantidade e de redução pode ultrapassar 15% do valor do contrato. Este resultado pode ser bastante relevante em negociações de energia elétrica no mercado livre brasileiro. Atualmente, grandes empresas (consumidores livres) podem comprar energia no mercado livre obtendo descontos em relação às tarifas reguladas. Adicionalmente, poderão estar tirando grande proveito das flexibilidades embutidas nos contratos negociados no mercado livre, conhecendo o quanto podem valer estas flexibilidades. Observou-se pelas análises de sensibilidade que o efeito da taxa de desconto no valor das opções é consideravelmente menor que o efeito da variação dos preços de contratação de energia e do tamanho das flexibilidades. Conclui-se também que o valor conjunto das opções de escolha da quantidade e de redução é um pouco menor que a soma dos valores individuais das opções. 15 Referências Bibliográficas COOPERS & LYBRAND. Projeto RE-SEB, Relatório Final, Ministério de Minas e Energia (www.mme.gov.br) , Dezembro de 1997. DIXIT, A. , PINDYCK R. S.. Investment Under Uncertanty, Princeton University Press, 1994. HULL J. C.. Options Futures and Other Derivatives, Fifth Edition, Prentice Hall, 2003. MACEIRA M.E.P, BEZERRA C.V.. Stochastic Stream flow Model for Hydroelectric Systems, Proceedings of PMAPS, 1997. MACEIRA M.E.P, MERCIO C.B., GORENSTIN B.G., CUNHA S.H.F; SUANNO C., SACRAMENTO M.C., KLIGERMAN A.. 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