Baixar este arquivo PDF - Portal de Revistas Eletrônicas da PUC

Propaganda
ALIMENTAÇÃO, ESTILO
DE VIDA E ADESÃO
AO TRATAMENTO NUTRICIONAL
NO DIABETES MELLITUS TIPO 2*
estudos, Goiânia, v. 40, n. 4, p. 541-555, out./dez. 2013.
PRISCILA LAÍS COELHO DE SOUZA, MARIANA ROSA
DE SOUZA SILVESTRE
Resumo: O Diabetes Mellitus tipo 2 (DM2) é reconhecido como problema de saúde pública em nível mundial
e nacional. O presente artigo é uma revisão da literatura
científica que busca discutir características alimentares e
de estilo de vida no diabetes, bem como a importância da
educação nutricional, aliada ao acompanhamento multiprofissional, na qualidade de vida dos pacientes.
Palavras-chave: Diabetes Mellitus tipo 2. Estilo de
vida. Educação nutricional.
O
Diabetes Mellitus tipo 2 é uma doença metabólica
crônica caracterizada por hiperglicemia. Consiste
geralmente em estado de resistência periférica à ação
da insulina e à secreção deficiente da mesma. Alguns aspectos etiológicos da doença são ainda desconhecidos, porém
estudos reconhecem a influência do ambiente e da genética
na sua manifestação. Atualmente o DM2 é reconhecido como
problema de saúde pública e representa cerca de 90% dos
casos de diabetes no Brasil, dentre todos os outros tipos da
doença (SBD, 2009).
A prevalência do DM2 se eleva vertiginosamente,
com previsão de incremento. Neste aspecto, destacam-se os
541
MATERIAL E MÉTODOS
542
Foi realizado uma revisão bibliográfica dissertativa, utilizando-se as bases de dados SciELO, LILACS e MedLINE, no
período de agosto de 2012 a maio de 2013. Para a pesquisa foram
estudos, Goiânia, v. 40, n. 4, p. 541-555, out./dez. 2013.
países em desenvolvimento, com acometimento de todas as faixas
etárias, gerando impacto negativo na qualidade de vida e nos gastos
dos sistemas de saúde (SARTORELLI; FRANCO; CARDOSO,
2006; SBD, 2009).
Em relação à alimentação como aspecto de intervenção,
observa-se que em geral os diabéticos apresentam uma alimentação inadequada para o controle da glicemia, favorecida pela falta
de conhecimento quanto à doença e suas formas de controle. Isto
pode contribuir para certa indignação do paciente quanto à sua
situação de saúde e dificultar a adesão ao tratamento (FRANCIONI; SILVA, 2007).
Para evitar maior incidência do DM2, é importante a aplicação da prevenção primária. Porém, como há elevada prevalência
da doença, é também essencial a prevenção secundária, identificando-se os casos subnotificados. Além disso, poucos diabéticos
têm acesso ao tratamento ideal para o controle da doença, sendo
fundamental ainda a prática da prevenção terciária, para que
complicações degenerativas agudas e crônicas sejam evitadas
(ZANETTI et al., 2008).
O aspecto nutricional do paciente diabético deve ser trabalhado tanto a nível preventivo quanto no tratamento da doença.
Neste sentido, é fundamental que haja a orientação do profissional
nutricionista ao paciente para que este possa seguir a dieta recomendada às suas necessidades, de acordo com seu ritmo de vida,
horários, situação financeira, preferências alimentares e demais
comorbidades. Uma alimentação balanceada contribui significativamente para o tratamento do DM2, porém deve ser associada
a outros aspectos, fazendo parte de um trabalho multiprofissional.
Diante disso, esta revisão objetiva discutir as principais características alimentares no DM2, associadas a outros aspectos de
estilo de vida, e abordar a educação nutricional como ferramenta
indispensável para melhor adesão ao tratamento, apoiado a uma
equipe multiprofissional.
empregados os descritores Diabetes Mellitus tipo 2, perfil alimentar, estilo de vida e educação nutricional. Foram utilizados artigos
internacionais dos últimos 30 anos e nacionais dos últimos 13
anos, com prioridade aos dos últimos 5 anos, além de publicações
técnico-científicas nacionais e internacionais pertinentes ao tema.
Os artigos científicos selecionados foram submetidos à
avaliação e análise crítica em relação aos seguintes critérios:
clareza, objetividade, coesão, coerência, lógica e pertinência
ao tema. Foram escolhidos aqueles com informações de maior
interesse e utilidade para a presente revisão. Buscou-se englobar
diversos aspectos relacionados ao tratamento e convívio do paciente com DM2, abordando ainda a postura do profissional nutricionista neste contexto, juntamente com os demais profissionais
da saúde. A amostra objeto utilizada após o processo de seleção
compreendeu 16 artigos originais, 08 de revisão, 02 publicações
técnico-científicas e 01 monografia.
estudos, Goiânia, v. 40, n. 4, p. 541-555, out./dez. 2013.
EPIDEMIOLOGIA
O progresso tecnológico, a globalização e diversos outros
aspectos do mundo moderno propiciaram a transição nutricional,
que associada à transição demográfica, trouxe um novo cenário
para o mundo em termos de morbidade e mortalidade, impactando na saúde humana. Doenças infecciosas deixaram de serem as
principais causas de mortalidade, dando lugar às Doenças Crônicas Não Transmissíveis (DCNT), dentre as quais está o DM2
(FERREIRA, 2010; SBD, 2009).
Em 1985, a estimativa era de 30 milhões de adultos com
DM no mundo; em 1995, de 135 milhões; em 2002, de 173 milhões, sendo a projeção para 2030 de 300 milhões. No Brasil, a
prevalência de DM em adultos era de 7,6% em 1980; próximo
ao ano de 2009 foi revelado que esse número já havia atingido
o valor de 12,1%. É difícil a determinação do real número de
casos de DM2, especificamente em grandes populações, pois são
necessários anos de medições periódicas de glicemia (PEIXOTO
et al., 2008; SBD, 2009).
Anteriormente, o DM2 era uma doença típica da maturidade,
e já tem se manifestado também em crianças e jovens. Porém, a
faixa etária influencia na prevalência da doença, observando-se
543
incremento de 2,7% entre 30 e 59 anos e 17,4% entre 60 e 69
anos. Essa forma correspondia de 1 a 2% dos casos de DM na
juventude. Em 2003, já representava de 8% a 45% dos casos
diagnosticados nos Estados Unidos. Inicialmente esse aumento
foi observado em certas minorias étnicas, como os índios Pima,
no Estado do Arizona (EUA). Constatou-se frequência superior
a 1% de indivíduos diabéticos com idade entre 15 e 24 anos com
maioria não dependente de insulina exógena, o que pode indicar
associação da doença com a obesidade (GABBAY; CESARINI;
DIB, 2003; PEIXOTO et al., 2008; SBD, 2009).
Observam-se elevadas taxas de obesidade na infância e na
adolescência, o que segundo os estudos de Pinhas et al., (1999)
e de Kitagawa et al., (1998) está relacionado ao sedentarismo e
mudança nos hábitos alimentares, com dietas hipercalóricas e hiperlipídicas. O aumento do índice de obesidade nessa faixa etária
propicia o acometimento desses indivíduos por outras DCNT,
como o DM2.
544
Em geral, os fatores de risco para a manifestação do DM2
estão associados às demais DCNT. O perfil alimentar da população
tem resultado em excesso de tecido adiposo, principalmente intraabdominal ou visceral, o que provoca consequências negativas à
saúde. O percentual de indivíduos com excesso de peso supera em
muito o daqueles com déficit de peso em nosso país e o cenário
epidemiológico das DCNT encontra-se acentuado. É notória a
elevação da epidemia de obesidade juntamente com o DM2 de
forma bastante preocupante em nível mundial (FERREIRA, 2010).
A carga genética exerce indiscutivelmente influência na
instalação do DM2, porém diversos outros fatores interferem na
manifestação da doença. Indivíduos com idade superior a 45 anos
apresentam maior risco de desenvolver DM2, fato provavelmente
favorecido pelo maior tempo de exposição aos fatores de risco
modificáveis, como maus hábitos alimentares e sedentarismo
(SBD, 2009).
Os hábitos de vida são fatores de risco de maior influência
para o desenvolvimento da doença. O estilo de vida inadequado
favorece o excesso de peso, que pode colaborar no aumento da
estudos, Goiânia, v. 40, n. 4, p. 541-555, out./dez. 2013.
FATORES DE RISCO
estudos, Goiânia, v. 40, n. 4, p. 541-555, out./dez. 2013.
resistência à insulina. Neste contexto, indivíduos sedentários
possuem maiores chances de apresentar sobrepeso e consequentemente maior risco de desenvolver DM2. Além disso, o estresse
também pode ocasionar o aparecimento desta doença, pois a ansiedade mental e fisiológica contribui para diminuição da tolerância
à glicose (ORTIZ; ZANETTI, 2001).
Outro fator de risco relevante é a dieta inadequada, caracterizada principalmente pelo aumento da ingestão calórica e consumo
de nutrientes em proporções desfavoráveis à saúde. Observa-se
a substituição de alimentos in natura, ricos em fibras, vitaminas
e minerais, por produtos industrializados, ricos em gorduras
saturadas e açúcares. No estudo de Ferreira et al., (1996) que
pesquisou a presença de DM2 entre japoneses, população com
baixa prevalência da doença, foi observado aumento significativo
do número de indivíduos afetados nas famílias que migraram para
países do ocidente, e que consequentemente adotaram o estilo de
vida ocidental, observado também na população brasileira.
O Brasil se encontra em uma fase avançada da transição
nutricional, na qual existe aumento do consumo de açúcares, gorduras, alimentos de origem animal e de alimentos processados,
somado a um salto em tecnologia no trabalho e lazer, o que favorece o sedentarismo, obesidade, problemas de densidade óssea e
aumento geral das incapacidades (FERREIRA, 2010).
Observa-se ainda como fator de risco o consumo de bebidas
alcoólicas. No trabalho de Martinez; Latorre (2006) que objetivou
avaliar os fatores relacionados à hipertensão arterial e DM, em
trabalhadores de empresa metalúrgica e siderúrgica nas cidades de
São Paulo e Rio de Janeiro, detectaram que o aumento do risco para
o desenvolvimento de DM acompanhou a elevação do consumo
de álcool. Os trabalhadores com uso esporádico apresentavam
1,1 vezes a chance de alteração da glicemia, e os com consumo
frequente, 2,5 vezes em relação aos que não faziam uso de álcool.
Além disso, o álcool contribui para o ganho de peso, pois fornece
ao indivíduo ’calorias vazias’ em relação a nutrientes.
Tanto o estilo de vida quanto os hábitos alimentares inadequados, contribuem para outros aspectos que são apresentados
como fatores de risco para o DM2, tais como HDL-c baixo ou
triglicérides elevadas e hipertensão arterial. Deve-se atentar ainda a
fatores como DM gestacional prévios; macrossomia ou história de
545
abortos de repetição ou mortalidade perinatal; e uso de medicação
hiperglicemiante (corticosteroides, tiazídicos, betabloqueadores),
os quais podem favorecer a instalação da doença (SBD, 2009).
546
O perfil alimentar do paciente com DM2 deve ser adaptado
em relação a vários aspectos, tais como: periodicidade das refeições, fracionamento, tipos de alimentos ingeridos e combinações.
Recomenda-se o fracionamento dos alimentos, distribuídos em três
refeições básicas e duas intermediárias complementares, e a refeição noturna deve ser preferencialmente composta por alimentos
fontes de carboidratos complexos, com contribuições no controle
glicêmico (BARSAGLINI; CANESQUI, 2010).
Em relação aos carboidratos é indicado que estes representem
de 50 a 60% do Valor Calórico Total (VCT) da dieta, com preferência ao consumo de alimentos com menor Índice Glicêmico (IG),
o que corresponde a uma absorção mais lenta da glicose e menor
demanda de insulina, com efeitos positivos no controle da glicemia
do paciente diabético (SARTORELLI; CARDOSO, 2006).
O IG representa a qualidade de uma quantidade fixa de
carboidrato disponível no alimento, comparado a um alimento
padrão (pão branco ou glicose). O IG dos alimentos é classificado
de acordo com seu potencial em aumentar a glicemia. Analisa-se
a curva glicêmica produzida por 50 g de carboidrato do alimento
teste em relação à curva de 50 g de carboidrato do alimento padrão.
Diversos fatores interferem na resposta glicêmica dos alimentos,
como a sua procedência, tipo de cultivo, forma de processamento e
cocção, consistência e teor de fibras. É vantajoso para o diabético
consumir alimentos de baixo IG para que sejam evitados picos de
hiperglicemia (SBD, 2009).
Recomenda-se restrição de açúcares simples e preferência
a alimentos ricos em fibras. A fibra alimentar promove aumento
da sensibilidade muscular à insulina, com redução da hiperglicemia, e favorece menor absorção de gorduras e o aumento da
saciedade, com auxílio no controle de peso (MIRA; GRAF;
CÂNDIDO, 2008).
As fibras são classificadas em insolúveis e solúveis, de
acordo com seus efeitos fisiológicos e solubilidade. As insolú-
estudos, Goiânia, v. 40, n. 4, p. 541-555, out./dez. 2013.
TRATAMENTO NUTRICIONAL
estudos, Goiânia, v. 40, n. 4, p. 541-555, out./dez. 2013.
veis promovem aumento do bolo fecal e diminuição do tempo
de trânsito intestinal. Já as solúveis se destacam quanto ao controle glicêmico; confere viscosidade ao conteúdo luminal, o que
favorece a redução do colesterol sérico. Além disso, retardam
o esvaziamento gástrico e a absorção de glicose, o que reduz a
glicemia pós-prandial (CHANDALIA, 2000 apud MIRA; GRAF;
CÂNDIDO, 2008).
Para contribuir no aporte de fibras na alimentação do paciente diabético, recomenda-se o consumo diário de alimentos
integrais, além de duas a quatro porções de frutas e três a cinco
porções de hortaliças, com efeitos positivos também no conteúdo
de vitaminas e minerais da dieta. É importante que o consumo de
carboidratos seja diário e constante (SBD, 2009).
O consumo de álcool deve ser moderado, no máximo duas
vezes por semana, limitando-se a dois copos de vinho, uma lata de
cerveja ou uma dose de 40 ml de uísque, sempre acompanhados
de alimento, para evitar oscilações glicêmicas (SBD, 2009).
A velocidade de absorção dos carboidratos é influenciada
diretamente por outros componentes da dieta, como lipídeos,
proteínas e fibras. O alto teor de lipídeos retarda o esvaziamento
gástrico e a velocidade de liberação dos nutrientes para a corrente
sanguínea. Desta forma, o pico hiperglicêmico pós-prandial imediato é reduzido (COLLIER; O´DEA, 1983 apud SARTORELLI;
CARDOSO, 2006).
As gorduras devem representar menos de 30% do VCT da
dieta, as saturadas correspondendo a no máximo 10% do VCT. Para
pacientes com LDL-c acima de 100 mg/dl recomenda-se menos de
7%. Existem situações em que é aconselhável o aumento da quantidade de gorduras mono ou poli-insaturadas associados à redução
da oferta de carboidratos, como nos casos de hipertrigliceridemia
ou baixo HDL-c (MOLENA-FERNANDES et al., 2005).
A oferta de proteínas deve corresponder de 0,8 a 1g/Kg de
peso desejado por dia, o que garante a reparação do tecido corporal,
formação de enzimas, hormônios e anticorpos, transporte de triglicérides, colesterol e de vitaminas pelo organismo, e o fornecimento
de energia. Segundo Wolever et al., (1991) uma dieta adequada em
proteínas age diretamente na hipersecreção de insulina, atenuando
a elevação da glicemia após as refeições. Entretanto, sugere-se
que este efeito seja dependente da fonte proteica consumida. Em
547
ADESÃO A NOVOS HÁBITOS
548
O primeiro foco de modificação em relação ao paciente
diabético é o alcance e manutenção de um bom estado nutricional.
Estudo realizado por Francioni; Silva (2006) com um grupo de
estudos, Goiânia, v. 40, n. 4, p. 541-555, out./dez. 2013.
animais, observou-se maior secreção de insulina após consumo de
proteínas de laticínios como queijos magros, que são rapidamente
digeridos. Por outro lado, este resultado não foi observado quando
a fonte proteica avaliada foi albumina de ovos crus, que possui
digestibilidade mais lenta.
É importante lembrar ainda a associação do DM2 com o
sobrepeso e a obesidade, que estão presentes entre 80 e 90% dos
casos. O tratamento dietético, visando redução de peso corporal
e melhora de níveis glicêmicos e lipídicos, possui significativo
efeito positivo sobre a morbimortalidade quanto a esta doença e
comorbidades associadas (SARTORELLI; FRANCO, 2003; SBD,
2009). Para pacientes obesos, a dieta deve ser hipocalórica, com
redução de 500 a 1000 Kcal diários, visando perdas ponderais de
0,5 Kg a 1 Kg por semana (SCHEEN; LEFÈBVRE, 1999 apud
MOLENA-FERNANDES et al., 2005).
Os pacientes diabéticos possuem ainda como recurso, para
não se privarem completamente do consumo de determinadas
preparações, a opção de ingerir produtos diet e light. Os diet
isentos de sacarose podem ser destinados a pacientes diabéticos.
Porém, podem conter elevado valor calórico ou maior quantidade
de lipídeos em relação ao produto convencional. Os light possuem
valor calórico reduzido, no mínimo 25% comparado aos alimentos
convencionais. Estes produtos podem oferecer benefícios aos pacientes diabéticos, porém devem ser consumidos com moderação,
considerando-se seu conteúdo calórico e nutricional (MOLENAFERNANDES et al., 2005).
Edulcorantes também podem ser utilizados, levando-se
em conta seu valor calórico e os substitutos da glicose utilizados
em sua formulação. A frutose, por exemplo, tem o mesmo valor
calórico da glicose; já o aspartame, ciclamato, sacarina, acessulfame K e a sucralose são praticamente isentos de calorias. Apesar
disso, estes componentes devem ser consumidos em quantidades
adequadas aos limites seguros (BANTLE, et al., 2008).
estudos, Goiânia, v. 40, n. 4, p. 541-555, out./dez. 2013.
diabéticos com maioria de idade entre 44 e 56 anos, em Florianópolis-SC, revelou baixo segmento dos pacientes à dieta recomendada
em um primeiro momento. Observou-se que isso pode acontecer
devido a uma percepção negativa quanto ao tratamento dietético
para controle da doença, associando-o com a condenação a se privar de prazeres. Assim, o paciente se nega a seguir o tratamento,
com consequente piora do estado de saúde.
No caso de adolescentes, público também atualmente
acometido pelo DM2, existe grande resistência em relação a
mudanças de hábitos. Isso é favorecido por possuírem um padrão
comportamental estabelecido quanto à alimentação e atividade
física, somado às características próprias da idade e ao fato de não
se sentirem doentes, o que resulta em baixa adesão ao tratamento
(GABBAY; CESARINI; DIB, 2003).
A saúde e alimentação do paciente diabético também são
influenciadas pelos hábitos de vida da família. Assim, a abordagem
familiar para o cuidado da doença crônica é também um importante
acréscimo às estratégias de tratamento da doença. A família deve
ser informada a respeito da doença e seu manejo, para que as modificações necessárias ocorram de forma natural na rotina de vida do
paciente, evitando-se complicações da doença e o desencadeamento
de novos casos. Isto é uma oportunidade de influenciar a aquisição de
bons hábitos alimentares e de vida por todos os membros da família
(ZANETTI et al., 2008).
A possibilidade de ser saudável com DM2 se dá com a
realização correta do tratamento e também pelo convívio consciente do paciente com a sua condição de saúde. Neste sentido,
a educação nutricional bem aplicada viabiliza melhor adesão ao
tratamento, evitando-se modificações traumáticas de estilo de
vida, principalmente quanto ao amplo ato de comer, que não é
apenas a ingestão de nutrientes, mas também envolve emoções e
valores culturais (FRANCIONI; SILVA, 2006; PÉRES; FRANCO;
SANTOS, 2006).
Neste contexto, o estudo de Péres; Franco; Santos (2006)
discute que o ato de comer é complexo, pois são transferidos para
a alimentação aspectos como nervosismo, frustrações e ansiedades.
Nota-se ainda a dificuldade de resistência a desejos alimentares,
além de aspectos financeiros, que segundo alguns pacientes, dificultam o seguimento da dieta. Porém, estes fatores devem ser
549
550
estudos, Goiânia, v. 40, n. 4, p. 541-555, out./dez. 2013.
desmistificados, pois uma alimentação saudável para o diabético
não corresponde necessariamente a uma alimentação totalmente
restritiva e que exija grandes gastos.
A dificuldade em se adequar a alimentação do público
diabético é também resultante de uma cultura sem preocupações
quanto à adoção de hábitos saudáveis regulares. Somado a isto,
em muitos casos o paciente diabético comete erros alimentares
por falta de informação, o que pode inclusive provocar no paciente certa indignação em relação a sua doença, dificultando
a adesão ao tratamento. Diante disso, destaca-se a importância
da educação nutricional na conduta do profissional de saúde
(LIMA, 2004).
O profissional nutricionista é o principal responsável pela
educação nutricional, que favorece a mudanças de hábitos, com
contribuições na saúde do paciente. Os cuidados recomendados
preconizam a normalização da glicemia; diminuição dos fatores
de risco cardiovasculares; fornecimento suficiente de calorias para
obtenção e/ou manutenção do peso corporal desejável; prevenção
de complicações agudas e crônicas; e promoção do crescimento e
desenvolvimento adequados, no caso de crianças. Para alcançar tais
objetivos é essencial que este profissional se aproxime do paciente
ao repassar informações, o que estimula o interesse do mesmo
pelo tratamento e a consciência de segui-lo. Neste contexto, é
necessária que a dieta seja individualizada, de acordo com a idade,
sexo, estado nutricional, fisiológico e metabólico, atividade física,
doenças intercorrentes, hábitos socioculturais, situação econômica,
disponibilidade de alimentos, dentre outros. Isto contribui para que
o tratamento se torne parte da rotina do indivíduo de uma forma
menos sacrificante (FERRAZ et al., 2000).
Além da dietoterapia, deve ser inserido ao contexto sociocultural do paciente a prática de exercícios físicos regulares, a automonitorização da glicemia e o uso adequado de medicamentos, fatores
que juntos proporcionam o adequado gerenciamento do DM2. Todos
os profissionais de saúde contribuem com a educação em diabetes
para obtenção de um bom controle metabólico do paciente, que deve
ser instruído quanto à prevenção e tratamento das complicações,
acompanhado psicologicamente e avaliado em relação aos resultados do tratamento (TAVARES; MATOS; GONÇALVES, 2005;
BARSAGLINI; CANESQUI, 2010).
estudos, Goiânia, v. 40, n. 4, p. 541-555, out./dez. 2013.
A importância da perspectiva interdisciplinar é reconhecida
no trabalho em saúde, tanto no que diz respeito à satisfação e motivação do profissional, quanto para uma assistência de qualidade aos
pacientes. Tavares; Matos; Gonçalves (2005) realizaram um estudo
no Grupo Multiprofissional de Atendimento ao Diabético, que funciona no Hospital Universitário da Universidade Federal de Santa
Catarina. O estudo objetivou pontuar a eficiência do atendimento
deste grupo para compreender a multi/interdisciplinaridade e suas
implicações na organização do processo assistencial ao paciente
diabético. Como resultado, revelou um atendimento cooperativo,
participativo, com diálogo aberto e igualitário, caracterizando a
prática interdisciplinar e comprovando sua eficácia.
O trabalho multiprofissional se torna indispensável em todos os campos do conhecimento, devido à prática extremamente
fragmentada que foi adotada pela ciência. No campo da saúde,
a especialização exagerada pode levar a uma não compreensão
global do ser humano e do processo saúde-doença. Torna-se essencial, portanto, no atendimento e acompanhamento dos pacientes
diabéticos, a presença de médicos, enfermeiros, nutricionistas,
psicólogos e, assistentes sociais, dentre outros profissionais. Entre
esta equipe deve haver grande integração, para que sejam identificadas estratégias que motivem o autocuidado, com contribuições
no controle da doença e no cuidado integral do paciente (FERRAZ
et al., 2000; TAVARES; MATOS; GONÇALVES, 2005).
CONCLUSÃO
O Diabetes Mellitus tipo 2 tem elevada prevalência, ocorrendo não apenas na maturidade, mas também em outras faixas
etárias, como reflexo de um estilo de vida sedentário e hábitos
alimentares inadequados. Esta realidade, na qual produtos industrializados ricos em gorduras saturadas e açúcares substituem
alimentos in natura, que possuem fibras, vitaminas e minerais,
influencia também o agravamento da condição de saúde dos indivíduos já acometidos pela doença. Pois estes possuem o mesmo
perfil alimentar identificados nos não diabéticos.
O tratamento nutricional é importante para que o paciente
diabético tenha o controle da doença e melhor qualidade de vida.
Porém, tal tratamento deve ser inserido na rotina do paciente, de
551
maneira que ele tenha uma vida tão normal quanto possível. Afinal,
o ato de comer envolve aspectos além do fisiológico, principalmente relacionados ao convívio social e a prazeres. Neste contexto,
o profissional nutricionista deve trabalhar a educação nutricional
para que o diabético não tenha grandes dificuldades, compreenda
que sua colaboração é fundamental e queira cooperar com seu
tratamento, obtendo assim melhores resultados.
O tratamento nutricional deve ser associado ao tratamento
medicamentoso e à prática de atividade física, bem como a um
acompanhamento integrado de profissionais de saúde, atuando
em suas áreas específicas. Isto ressalta a eficácia de uma equipe
multiprofissional no cuidado integral do paciente diabético, com
contribuições no controle da doença e na qualidade de vida.
FOOD, LIFESTYLE AND ACCESSION TO THE NUTRITIONAL
TREATMENT IN TYPE 2 DIABETES MELLITUS
Keywords: Type 2 Diabetes Mellitus. Nutritional education.
Food lifestyle.
Referências
BARSAGLINI, R. A.; CANESQUI, A. M. A alimentação e
a dieta alimentar no gerenciamento da condição crônica do
diabetes. Saúde e Sociedade, São Paulo, v. 19, n. 4 p. 919-932,
abr. 2010.
BANTLE, J. P. et al., Nutrition recommendations and
interventions for diabetes: a position statement of the American
Diabetes Association. Diabetes Care, v. 31, Suppl. 1, p.
S61-S78, 2008.
552
CHANDALIA, M. Dietary treatment of Diabetes Mellitus. New
England Journal of Medicine, v. 342, p. 1392-1398, may, 2000.
estudos, Goiânia, v. 40, n. 4, p. 541-555, out./dez. 2013.
Abstract: type 2 diabetes mellitus is recognized as a public
health problem in national and global scale. This work is a scientific literature review on this subject, analyzing characteristics and
food lifestyle on diabetes and the nutritional education importance,
coupled with a multidisciplinary care, in the patients quality of life.
COLLIER, G.; O’DEA, K. The effect of co-ingestion of fat on
the glucose, insulin and gastric inhibitory polypeptide responses
to carbohydrate and protein. American Journal of Clinical
Nutrition, v. 37, p. 941-944, jun. 1983.
FERRAZ, A. E. P. et al., Atendimento multiprofissional ao
paciente com Diabetes Mellitus no ambulatório de diabetes do
HCFMRO-USP. Ponto de Vista, Ribeirão Preto, v. 33, p. 170175, abr./jun. 2000.
FERREIRA, S. R. G. Alimentação, nutrição e saúde: avanços e
conflitos da modernidade. Ciência Cultura, São Paulo, v. 62, n.
4, p. 31-33, out. 2010.
FERREIRA, S. R. G. et al., Japanese-Brazilians Diabetes
Study Group. Disturbances of glucose and lipid metabolism in
first and second generation of Japanese-Brazilians. Diabetes
Research and Clinical Pracicet, v. 34, p. 59-63, oct. 1996.
estudos, Goiânia, v. 40, n. 4, p. 541-555, out./dez. 2013.
FRANCIONI, F. F.; SILVA, D. G. V. O processo de viver
saudável de pessoas com Diabetes Mellitus através de um grupo
de convivência. Texto Contexto Enfermagem, Florianópolis, v.
16, n. 1, p. 105-111, jan./mar. 2007.
GABBAY, M.; CESARINI, P. R.; DIB, S. A. Diabetes Mellitus
do tipo 2 na infância e adolescência: revisão da literatura.
Jornal de Pediatria, v. 79, n. 3, p. 201-208, 2003.
KITAGAWA, T. et al., Increased incidence of non-insulin
dependent Diabetes Mellitus among Japanese school children
correlates with an increased intake of animal proteins and fat.
Clinical Pediatrics, v. 37 p. 111-115, 1998.
LIMA, K. A. Análise do processo de construção do
conhecimento dietoterápico de pacientes diabéticos atendidos
no programa saúde da família no município de Araras
- São Paulo. 2004. (Trabalho de Conclusão de Curso Pósgraduação em alimento e nutrição) – Faculdade de Ciências
Farmacêuticas, Universidade Estadual Paulista Júlio de
Mesquita Filho, 2004.
LYRA, R. et al., Prevenção do Diabetes Mellitus tipo 2. Arquivo
Brasileiro Endocrinologia Metabologia, São Paulo, v. 50, n. 2,
p. 239-249, abr. 2006.
553
MARTINEZ, M. C.; LATORRE, M. R. D. O. Fatores de risco
para hipertensão arterial e diabete melito em trabalhadores
de empresa metalúrgica e siderúrgica. Arquivo Brasileiro de
Cardiologia, São Paulo, v. 87, p. 471-479, 2006.
MIRA, G. S.; GRAF, H.; CÂNDIDO, L. M. B. Visão
retrospectiva em fibras alimentares com ênfase em betaglucanas no tratamento do diabetes. Brazilian Journal of
Pharmaceutical Sciences, São Paulo, v. 45, n. 1, p. 11-20, jan./
mar. 2009.
MOLENA-FERNANDES, C. A.; JUNIOR, et. al. A
importância da associação de dieta e de atividade física
na prevenção e controle do Diabetes Mellitus tipo 2. Acta
Scientiarum. Health Science, Maringá, v. 27, n. 2, p. 195-205,
nov. 2005.
PEIXOTO, M. R. G.; MONEGO, E. T.; ALEXANDRE, V.
P.; SOUZA, R. G. M.; MOURA, E. C. Monitoramento por
entrevistas telefônicas de fatores de risco para doenças crônicas:
experiência de Goiânia. Cadernos de Saúde Pública, Rio de
Janeiro, v. 24, n. 5, p. 1323-1333, jun. 2008.
PÉRES, D. S.; FRANCO, L. J.; SANTOS, M. A.
Comportamento alimentar em mulheres portadoras de diabetes
tipo 2. Revista Saúde Pública, v. 40, n. 2, p. 310-317, 2006.
PINHAS-HAMIEL, O.; STANDIFORD, D.; DOLAN, L. M.
The type 2 family. A setting for development and treatment of
adolescent type 2 Diabetes Mellitus. Archives of Pediatrics &
Adolescent Medicine, v. 153, p. 1063-1067, 1999.
SARTORELLI, D. S.; CARDOSO, M. A. Associação entre
Carboidratos da Dieta Habitual e Diabetes Mellitus Tipo 2:
evidências epidemiológicas. Arquivo Brasileiro Endocrinologia
Metabologia, Ribeirão Preto, v. 50, n. 3, p. 415-426, jun. 2006.
554
SARTORELLI, D. S.; FRANCO, L. J. Tendências do
Diabetes Mellitus no Brasil: o papel da transição nutricional.
estudos, Goiânia, v. 40, n. 4, p. 541-555, out./dez. 2013.
ORTIZ, M. C. A.; ZANETTI, M. L. Levantamento dos fatores
de risco para Diabetes Mellitus tipo 2 em uma instituição
de ensino superior. Revista Latino-Americana Enfermagem,
Ribeirão Preto, v. 9, n. 3, p.58-63, mai. 2001.
Cadernos de Saúde Pública, Rio de Janeiro, v. 19, n. 1, p.
29-36, 2003.
SARTORELLI, D. S.; FRANCO, L. J.; CARDOSO, M. A.
Intervenção nutricional e prevenção primária do Diabetes
Mellitus tipo 2. Cadernos de Saúde Pública, Rio de Janeiro, v.
22, n. 1, p. 7-18, jan. 2006.
SBD - SOCIEDADE BRASILEIRA DE DIABETES. Diretrizes
da Sociedade Brasileira de Diabetes. Itapevi, São Paulo, 2009.
400p.
SCHEEN, A. J.; LEFÈBVRE, P. J. Management of the obese
diabetic patient. Diabetes Reviews, Alexandria, v. 7, n. 2, p. 7793, 1999.
TAVARES, C. M. A.; MATOS, E.; GONÇALVES, L. Grupo
multiprofissional de atendimento ao diabético: uma perspectiva
de atenção interdisciplinar a saúde. Texto e Contexto.
Enfermagem, v. 14, n. 2, p. 213-221, maio, 2005.
estudos, Goiânia, v. 40, n. 4, p. 541-555, out./dez. 2013.
WOLVER, T. M. S. et al., The glycemic index: methodology
and clinical implications. American Journal of Clinical
Nutrition, v. 54, p. 846-854, 1991.
ZANETTI, M. L. et al., O cuidado à pessoa diabética e as
repercussões na família. Revista Brasileira de Enfermagem,
Ribeirão Preto, v. 61, n. 2, p. 186-192, mar./abr. 2008.
* Recebido em: 03.09.2013. Aprovado em: 18.07.2013.
PRISCILA LAÍS COELHO DE SOUZA, Mestre em Nutrição e
Saúde pela Faculdade de Nutrição da Universidade Federal de Goiás
(UFG); Profª. Msc. Docente do Curso de Nutrição da Pontifícia
Universidade Católica de Goiás (PUC Goiás) Goiânia, GO. E-mail:
[email protected]
MARIANA ROSA DE SOUZA SILVESTRE, Graduada do Curso de
Nutrição da Pontifícia Universidade Católica de Goiás (PUC Goiás),
Goiânia, GO. E-mail: [email protected]
555
Download