A Importância da Família na Formação Social do Adolescente The

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FERRONATO, V.F.O.
A Importância da Família na Formação Social do Adolescente
The Importance of Family on the Teenager´s Social Formation
Vivian Freitas Oliviéri Ferronatoa*
Faculdade Anhanguera de Pirassununga, Curso de Pós-Graduação em Serviço Social e Gestão de Projetos Sociais, SP, Brasil
a
*E-mail: [email protected]
Resumo
Este artigo aborda a família, suas transformações ao longo dos tempos, e a sua importância, na formação social de seus adolescentes, como
primeira identidade social responsável pela proteção e socialização destes, abordando também o significado da adolescência como uma fase
peculiar de desenvolvimento. Utilizou-se para tanto a pesquisa bibliográfica para investigar o papel que família exerce na formação social dos
adolescentes. Conclui-se que é possível afirmar que é no seio da família e da comunidade que crianças e adolescentes constroem suas relações
primárias que são definidas como primordiais para seu desenvolvimento.
Palavras-chave: Adolescente. Família. Adolescência.
Abstract
This paper comprises the Family, its transformations along the time, and its importance, on the social formation of its teenagers, as the first
social identity responsible for their protection and socialization, approaching also the meaning of adolescence as a peculiar development stage.
For that, it was used bibliographic research in order to investigate the role the Family plays at the teenagers´social formation. It is concluded
that it is possible to state that it is in the Family and in the Community that children and teenagers build up their primary relationships which
are seen as essential for their development.
Keywords: Adolescent. Family. Adolescence.
1 Introdução
O presente artigo aborda a importância da família na
formação social do adolescente, pois como assistente social
do Centro de Referência Especializado de Assistência
Social - CREAS, trabalho diariamente com famílias e
seus adolescentes de classe social menos favorecida, e na
dificuldade destas famílias frente à fase de desenvolvimento
que estes adolescentes estão passando, quanto ao papel
que exercem de orientar e educar, a entrada precoce destes
adolescentes no mercado de trabalho e as políticas públicas
de apoio a estas famílias suas transformações ao longo dos
tempos e seu papel na formação de seus adolescentes.
Este trabalho tem como objetivos; investigar o papel que
família exerce na formação social dos adolescentes, pesquisar
as transformações da família ao longo dos tempos e analisar
as transformações que a adolescência provoca no individuo
como uma fase peculiar de desenvolvimento.
2 Desenvolvimento
A metodologia utilizada foi à pesquisa bibliográfica por
meio de leituras específicas da área.
2.1 Adolescência: um conceito moderno
O termo adolescência tem sua origem no Latim, sendo
composto pelo sufixo a, que indica a para mais e o prefixo
Rev. Educ., v.18, n.24, p.3-9, 2015
olescere forma incoativa de olece, crescer. Portanto, a
adolescência significa o crescimento ou o processo de
crescimento.
Para Organização Mundial da Saúde - OMS, a
adolescência corresponde à segunda década de vida que vai
dos 10 aos 19 anos.
No âmbito exclusivamente nacional, o Estatuto da
Criança e do Adolescente - ECA em seu artigo 2º estabelece
o critério etário que situa a adolescência entre 12 e 18 anos
incompletos: “considera-se criança, para os efeitos desta Lei,
a pessoa até doze anos de idade incompletos, e adolescente
aquela entre doze e dezoito anos de idade”.
No mundo ocidental o conceito de adolescência é
considerado como um espaço entre a infância e a idade adulta,
deixando as crianças de serem consideradas um adulto em
miniatura, surge no início do século XX, ganhando expressão
após a Segunda Guerra Mundial.
A respeito desse processo, os historiadores das
mentalidades, segundo Reis e Zioni (2007), até o Século
XVIII, a escola organizava-se de maneira bastante diferente da
atual era mais abrigo de estudantes pobres do que instituições
de ensino. Contudo, as exigências do Século XVIII inspiraram
um movimento disciplinador, cuja extensão transformou a
escola da época em um colégio encarregado do ensino, da
vigilância e enquadramento da juventude. O primeiro passo
3
A Importância da Família na Formação Social do Adolescente
desse movimento foi separar as crianças menores das mais
velhas, permitindo a identificação da fase cronologicamente
posterior à infância (a adolescência) de preparação à vida
adulta. Utilizando-se de processo semelhante ocorrido
entre oficiais no exército do Século XVIII. Daí em diante, a
adolescência se expandiria, empurrando a infância para trás e
a maturidade para frente. Portanto, a adolescência, do século
XIX e início XX, teve na escola e no exército seus elementos
concretos de formação. De maneira mais precisa, foi através
da observação das experiências dessas duas instituições
que a sociedade moderna pôde compor uma nova realidade
psicológica, a adolescência.
Esse conceito, no entanto, veio acompanhado de diversos
estereótipos, fazendo com que acreditássemos que existe uma
adolescência única.
Observa Frota (2007, p.148) que nessa perspectiva,
a adolescência se configura como um momento em que,
naturalmente, o indivíduo torna-se alguém muito chato, difícil de
se lidar e que está sempre criando confusão e vivendo crises. Deste
modo, existe uma leitura de senso comum que costuma colocar a
criança vivendo o melhor momento da vida e o adolescente, uma
fase difícil para ele e para quem convive com ele.
Na realidade a adolescência surge, nas sociedades
ocidentais, diz Silva (1999, p.16),
[...] enquanto uma categoria especifica, como consequência
do desenvolvimento do capitalismo, mais particularmente no
momento em que crianças e jovens começam a deixar o trabalho
nas industrias. Esse momento decorre do excesso de mão de obra,
ocasionando pelo intenso processo de urbanização das cidades, o
qual acompanha a industrialização. Ainda com a necessidade de
especificação da força de trabalho, impetrada pela modernização
cada vez maior das relações de produção capitalista, a
escolarização um status crucial, sendo o ensino obrigatório
prolongado cada vez mais. Consequentemente, a entrada do
jovem no mundo do trabalho vai sendo adiada, configurando-se
um espaço entre a infância e a vida adulta, ou seja, entre a fase
economicamente não produtiva e a produtiva do ser humano.
O processo de constituição da adolescência no Brasil foi
lento, por estar atrelado a sua formação social escravocrata,
onde crianças e adolescentes deviam obediência ao trabalho
escravo e tinham escasso tempo de vida.
Os filhos dos senhores de engenho até os 10 anos
exercitavam-se através de jogos brutais, enquanto os filhos
dos escravos trabalhavam nas cozinhas das casas grandes e a
partir dos 10 e 12 anos entravam para a vida adulta.
As mulheres brancas casavam-se por volta dos 12 e 13
anos, a educação era dispensada a elas fazendo com que
desconhecessem a instituição escolar, e eram criadas em um
ambiente patriarcal vivendo na dura tirania dos pais depois
substituída pela tirania dos maridos.
A menina escrava iniciava a sua vida sexual precocemente,
pois eram vistas pelos aristocratas com o um ventre criador,
sendo assim envelheciam rapidamente devido à higiene
escassa, alimentação desequilibrada, maternidade precoce e
desassistida, impostas pelo sistema social escravocrata.
Para Reis e Zioni (2007), tanto no conceito brasileiro
quanto europeu,
[...] o conceito de adolescência pode ser entendido como
‘masculino’ porque se constituiu a partir de experiências históricas
concretas das quais as mulheres encontravam-se excluídas.
No Brasil, a inclusão feminina no âmbito de experiências
socialmente valorizadas e, consequentemente, dotadas de
visibilidade, foi inaugurada pelo movimento higieniza que
criou condições-pelo menos parciais- para que, posteriormente,
o conceito de adolescência fosse estendido ao mundo das
mulheres. A contribuição dos higienistas para essa extensão- que
não significou desmasculinização do conceito- deve-se ao fato de
que foram eles que tematizaram a situação social da mulher, ao se
encarregarem de promover a transformação do modelo familiar
brasileiro, principalmente em sua versão urbana.
Através do Movimento Higienista1, é que a adolescência
foi estendida ao mundo das mulheres no Brasil, pois este
movimento veio disseminando novos valores na busca da
conservação da saúde. Pretendia-se com este movimento uma
maior higienização das residências. As escravas que até esse
período eram as responsáveis pela limpeza e higienização
das casas, foram avaliadas como incapazes para o exercício
deste trabalho nas residências dos aristocratas. Sendo assim
esse processo passou a ser exercido por suas esposas, as quais
passaram a ser mais valorizadas e reconhecidas, passando a
responsabilizarem-se pelo universo familiar, pela disciplina
doméstica e pelos cuidados dos filhos e dos maridos.
Avançando no tempo, constatamos que enquanto
construção da modernidade, a adolescência contemporânea
foi engendrada a partir de um contexto de crises e
contestação social. Esse fenômeno facilitou que se plasmasse
tal caracterização como a característica própria dos jovens. É
possível vermos que a virada para o século XX traz consigo
a invenção de uma adolescência representada como uma
fase de tempestades e tormentas e germe de transformações.
O movimento hippie, da década de 60, e o juvenil, de 1968,
contribuíram para formar um discurso sobre o que é ser
adolescente, instituindo o modelo masculino, da classe média,
como o estalão privilegiado. Por toda a década de 70, o
movimento de ampliação da contracultura juvenil continuou
se expandindo. Mas a história não para e, na década de 80,
acontece uma fragmentação nos movimentos juvenis. Grandes
mudanças surgem no plano político, o mesmo acontece no
espectro público da juventude brasileira (FROTA, 2007).
Observamos que em função dos índices de fertilidade
registrados nos anos de 1980, vivemos no Brasil uma onda
adolescente entre 1995 e 2005. Isto significa que em 1995,
tínhamos 15,8 milhões de adolescentes entre 15 e 19 anos
(10,4% da população brasileira). O censo demográfico de
2000 mostra que existem 84,3 milhões de pessoas na faixa
etária de 0 a 24 anos-crianças adolescentes e jovens, sendo
1O Movimento Higienista surgiu no fim do século XIX e inicio do século XX, e propunha-se educar a população, ensinando novos hábitos de vida, com
o desejo de melhorar as condições de saúde coletiva da população.
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Rev. Educ., v.18, n.24, p.3-9, 2015
FERRONATO, V.F.O.
25.001.851 adolescentes, entre 12 e 18 anos (IBGE, 2001).
Nos dias atuais o período da adolescência é visto como uma
época especial do desenvolvimento humano, caracterizado
através de processos de socialização diversos em relação às
fases da vida adulta e da infância.
Na visão de Frota (2007, p.157), a adolescência
[...]deve ser pensada para além da idade cronológica, da
puberdade e transformações físicas que ela acarreta, dos ritos de
passagem, ou de elementos determinados aprioristicamente ou
de modo natural. A adolescência deve ser pensada como uma
categoria que se constrói, se exercita e se re-constrói dentro de
uma história e tempo específicos.
Assim, para a compreensão da adolescência, é necessário
levar em conta as transformações ocorridas na sociedade
contemporânea.
2.2 A adolescência como fase peculiar de desenvolvimento
A adolescência é caracterizada como um momento de
transição na história do homem, e é vista como uma fase de
maturação dos corpos, aquisição de novos valores.
Observa Frota (2007, p.155) que,
para a maior parte dos estudiosos do desenvolvimento humano,
ser adolescente é viver um período de mudanças físicas,
cognitivas e sociais que, juntas, ajudam a traçar o perfil desta
população. Atualmente, fala-se da adolescência como uma fase
do desenvolvimento humano que faz uma ponte entre a infância
e a idade adulta. Nessa perspectiva de ligação, a adolescência
é compreendida como um período atravessado por crises, que
encaminham o jovem na construção de sua subjetividade. Porém,
a adolescência não pode ser compreendida somente como uma
fase de transição. Na verdade, ela é bem mais do que isso.
É um período peculiar de desenvolvimento, não apenas
o momento da puberdade do individuo, mas um momento de
desenvolvimento sócio histórico ligados diretamente a fatores
biológicos, psicológicos, sociais e jurídicos.
Do ponto de vista biológico é a fase em que o individuo
passa por transformações hormonais, físicas, já possui os
caracteres sexuais secundários e atinge a fase de maturação
sexual.
Durante a adolescência ocorrem significativas mudanças
hormonais, que acabam influenciando diretamente no
comportamento dos adolescentes. Em geral há alterações
no estado do humor, no comportamento, na agressividade,
na alternância de períodos de tristeza, felicidade e agitação,
sendo características comuns a essa fase de desenvolvimento.
Nesse período os processos psicológicos e as formas
de identificação passam da fase infantil para a fase adulta,
fazendo com que o adolescente passe por uma transição de
dependência econômica total para um estado de relativa
independência.
Segundo Bock, Furtado e Teixeira (1999, p.106)
No aspecto afetivo, o adolescente vive conflitos, deseja libertar-se
do adulto, mas ainda depende dele. Deseja ser aceito pelos amigos
e pelos adultos, o grupo de amigos é um importante referencial
para o jovem, determinando o vocabulário, as vestimentas e
outros aspectos do seu comportamento. Começa a estabelecer
sua moral individual, que é referenciada à moral do grupo, os
Rev. Educ., v.18, n.24, p.3-9, 2015
interesses do adolescente são diversos e mutáveis, sendo que a
estabilidade chega com a proximidade da idade adulta.
Uma marca comum na maioria dos adolescentes é a
necessidade de fazer parte de um grupo. Essa necessidade
está relacionada à importância atribuída as amizades, as quais
possibilitam a integração a um grupo de interesses comuns.
O grupo exerce influências sobre suas escolhas, gostos,
comportamentos e atitudes.
Outro aspecto de suma importância é a construção da
identidade, que acontece durante toda, ou grande parte da vida
do individuo, pois desde o nascimento o homem inicia uma
longa interação com o meio em que está inserido, a partir da
qual constituirá não só a sua identidade, como sua inteligência,
suas emoções, seus medos e sua personalidade.
De acordo com Erickson (1972, p.21),
a formação da identidade emprega um processo de reflexão e
observação simultâneas, um processo que ocorre em todos os
níveis do funcionamento mental, pelo qual o individuo se julga a
si próprio à luz daquilo que percebe ser a maneira como os outros
o julgam, em comparação com eles próprios e com uma tipologia
que é significativa para eles; enquanto que ele julga a maneira
como eles o julgam, a luz do modo como se percebe a si próprio
em comparação com os demais e com os tipos que se tornam
importantes para ele.
Romamelli e Watarai (2005) acrescentam que nessa
fase, paralelamente ao surgimento de novas formas de
sociabilidade e com a emergência de mudanças corporais e
o início de manifestações de sexualidade, os adolescentes
vivem sentimentos conflitantes enquanto buscam conquistar
independência financeira e autonomia em relação aos pais e
aos adultos em geral. Trata-se de um processo marcado por
novas descobertas, que são vividas de modo intenso na busca
de construção da identidade.
Erickson (1972, p.21) enfatiza “[...]que a identidade não
deve ser vista como algo estático e imutável, como se fosse
uma armadura para a personalidade, mas como algo em
constante desenvolvimento”.
Portanto, entre os aspectos importantes no desenvolvimento
da identidade, estão as fases ou períodos da vida que o
individuo atravessa até chegar a idade adulta, desta forma, o
grande conflito da adolescência é a crise da identidade e esta
fase só terminará quando a identidade do individuo estiver
encontrado uma forma que determinará, a vida ulterior.
Cabe ressaltar que o termo crise adotado por Erickson não
é sinônimo de catástrofe ou desajustamento, mas de mudança;
de um momento crucial no desenvolvimento no qual há a
necessidade de se optar por uma ou outra direção mobilizando
recursos que levam ao crescimento.
A construção da identidade é pessoal e social, pois acontece
de forma interativa por meio de trocas entre o individuo e o
meio e está intimamente relacionada, com a cultura, com os
valores e a sociedade e o contexto social em que está inserido.
Para Violante (1984) ao ser introduzido no mundo
objetivo da sociedade, o individuo aprende a realidade ao
mesmo tempo em que adquire identidade, sendo a identidade
5
A Importância da Família na Formação Social do Adolescente
elemento chave da realidade subjetiva, elo entre o individuo e
a estrutura social.
Para os adolescentes oriundos de classes sociais mais
favorecidas, criam-se expectativas para que quando o
jovem adentrar para o mundo adulto, termine os estudos,
saia da família de origem, constitua outra família e tenha
um emprego estável, já para as famílias empobrecidas
preocupa-se com a luta diária pela garantia e manutenção da
sobrevivência.
Nestas circunstâncias diz Losacco (2007, p.72),
das diferenças nas condições concretas de vida em
sociedade, a adolescência, mais do que uma fase peculiar de
desenvolvimento, tem seus contornos definidos e é delimitada
pela realidade sócio histórica em que está inserida.
[...] dos jovens de classes menos favorecidas e dos segmentos
mais pobres da sociedade, exige-se a entrada precoce no mundo
do trabalho. Sem a possibilidade da preparação necessária
(escolaridade formal, cultural e técnica) para o desempenho
de um papel profissional especializado, vemos cada vez mais
dificultada a conquista de emprego e ampliada a exploração de
sua mão de obra, exploração, esta concretizada pelos baixos
salários e o acúmulo de jornadas de trabalho para garantia de sua
manutenção.
a célula do organismo social que fundamenta uma sociedade. Lócus
nascendi das histórias pessoais, é a instância predominantemente
responsável pela sobrevivência de seus componentes; lugar de
pertencimento, de questionamentos; instituição responsável
pela socialização, pela introjeção de valores e pela formação
de identidade; espaço privado que se relaciona com o espaço
público.
Sendo assim, os jovens oriundos de classes menos
favorecidas, chegam ao mundo adulto com diversas
dificuldades, com poucas condições para refletir sobre as
condições a que se encontra, seus conflitos familiares e
com a sociedade como um todo, tendo que por muitas vezes
preocupar-se primordialmente em conseguir o básico: roupa,
comida e quem sabe algumas vezes conseguir a diversão.
Nesta perspectiva Coimbra (2005, p.22) afirma que
A família no capitalismo, deixou de ser uma ‘unidade de
produção’ na medida em que esse sistema separou a produção,
como esfera pública, da família, que se tornou a esfera privada
da vida social. Em termos de sua funcionalidade econômica, a
família passou, então, a constituir uma ‘unidade de consumo’.
Para a razão instrumental, a organização da vida material, a
sobrevivência para os pobres é concebida como a razão da
constituição da família.
[...]para o jovem ser pobre e residir na periferia é condição
intransponível e determinante de uma categoria, pois as
oportunidades de ascensão social ou de acesso aos direitos
básicos são escassos ou quase inexistentes. Isso pode gerar
atitude de revolta, frustração e desesperança, pois ele não acredita
na possibilidade de mudar o curso de sua história.
Já os adolescentes de classes sociais mais favorecidas têm
acesso a boas escolas, se alimentam bem, usam roupas boas,
residem em bairros com boa infraestrutura, em sua grande
maioria possuem planos de saúde e atividades de lazer.
Aos adolescentes de classes menos favorecidas a
realidade apresenta-se de uma forma bastante perversa,
sendo que um grande número é forçado a iniciar no mundo
do trabalho precocemente, o que acarreta nestes jovens sérias
consequências em seu desenvolvimento físico, emocional e
social.
Independentemente da classe social a que pertença,
o adolescente provoca uma verdadeira revolução em seu meio
familiar e social, e isto cria um problema de gerações nem
sempre bem resolvido. Enquanto ele passa por uma adaptação
para a fase adulta, seus pais vivem a ruptura do equilíbrio do
desempenho do papel de pais de criança, para adquirirem,
também, com mais ou menos esforço e sofrimento, um novo
papel, o de pais de adolescente, situação que lhes exigirá novas
respostas (LOSACCO, 2007, p.69).
Portanto, as diferenças e semelhanças existentes entre
os adolescentes de diferentes classes sociais, explicam as
diversas formas de ver, de reagir e de inteirar-se com o mundo,
com padrões de comportamentos singulares.
Na realidade é necessário reconhecer que em razão
6
2.3 Família e adolescente
A família, ao longo do tempo, tem sofrido várias
transformações, contudo figura como maior agente de
socialização e desenvolvimento de seus membros.
Na concepção de Losacco (2007, p.64) a família é
Para Sarti (2003, p.42),
Fazendo um retrocesso histórico, percebemos que nas
sociedades primitivas não existia uma organização familiar.
Sakamoto (2007), relata que nesse estágio ainda não se
podia falar em organização familiar, uma vez que homens e
mulheres viviam em estado total liberdade social e sexual,
com uniões múltiplas no interior do grupo e sem demarcação
de parentesco.
Segundo Piana (2007) foi somente em meados do século
XVII que a família começou a delimitar uma área maior
de vida particular e os costumes contemporâneos foram
fortemente influenciados pelo sentimento de família que se
desenvolveu na Europa a partir do século XVI, especialmente
nas classes mais abastadas.
Para Sakamoto (2007) a família transformou-se com o
passar dos anos, na mesma proporção ao que ocorreu ao próprio
individuo. O conceito de família veio sendo constituído desde
os primórdios da civilização e, em nenhuma época a família se
mostrou igual a uma outra.
Na contemporaneidade, com as novas formações
societárias também ocorreu transformações no modo de se
organizar das famílias, com novos arranjos familiares.
Segundo Minuchim (1990) a família, ao sofrer influências
da sociedade muda, se adapta e se reestrutura às circunstancias
históricas, de maneira a manter a continuidade e a intensificar
o crescimento psicossocial de cada membro.
Esclarece Romanelli (2003), que pesquisas sobre família
no Brasil demonstram a diversidade na sua organização,
tanto na composição quanto nas formas de sociabilidade que
vigoram em seu interior.
Cabe ressaltar que hoje vemos a família constituída de
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FERRONATO, V.F.O.
diferentes maneiras, seja pelo casamento civil ou religioso,
pela união estável, por grupos formados pelos pais ou
ascendentes e seus filhos, sobrinhos ou netos, mães e pais
solteiros e uniões homossexuais, deixando a família de ser
vista só como aquela formada unicamente pelo casamento
formal. Essas novas configurações são baseadas mais no
afeto do que nas relações de consanguinidade, parentesco ou
casamento.
No debate contemporâneo, segundo Losacco (2007) não
é mais possível falar de família (no singular). A partir das
diversidades e das complexidades apontadas, além de outras
aqui não exploradas, o eixo do discurso deve ser famílias (em
sua pluralidade).
Genofre afirma (2003, p.102) “que na constituição da
família, o segmento mais vulnerável é o da criança e do
adolescente, pois, é neste ambiente que eles vivenciam o
contato com a vida social”.
A esse respeito Szymanski (2003, p.23) complementa que
desde de Freud, a família, em especial, a relação mãe-filho,
[...] tem aparecido como referencial explicativo para o
desenvolvimento emocional da criança. A descoberta de que
os anos iniciais de vida são cruciais para o desenvolvimento
emocional posterior focalizou a família como o lócus
potencialmente produtor de pessoas saudáveis, emocionalmente
estáveis, felizes e equilibradas, ou como o núcleo gerador
de inseguranças, desequilíbrios e toda sorte de desvios de
comportamento.
A família figura ainda como fonte de segurança e em
referencial para o adolescente uma vez que,
este vivencia intensamente o processo de construção de sua
identidade, sendo fundamental a experiência vivida em família
e a convivência com os pais, irmãos, avós e outras pessoas
significativas. Uma atitude de oposição a seu modelo familiar
e aos pais é parte inerente do processo de diferenciação
em relação a estes e de construção de seu próprio eu. O
desenvolvimento da autonomia se dará de modo crescente,
mas o adolescente, em diversos momentos, precisará recorrer
tanto a fontes sociais que lhe sirvam de referência (educadores,
colegas e outras) quanto à referência e à segurança do ambiente
familiar (PNCFC, 2006, p.31).
De acordo com Romanelli (2003) a forma de organização
da família é um elemento relevante no modo como ela conduz
o processo de socialização dos imaturos, transmitindolhes valores, normas e modelos de conduta e orientando-os
no sentido de tornarem-se sujeitos de direitos e deveres no
universo doméstico e no domínio público.
No cenário brasileiro, tanto na Constituição Federal
de 1988 (BRASIL, 1988), quanto no Estatuto da Criança e
do Adolescente (BRASIL, 1990) a família, a criança e o
adolescente ganham centralidade - expressas basicamente em
dois artigos da CF: art. 226 a família, base da sociedade, tem
especial proteção do Estado e art. 227 que estabelece:
é dever da família, da sociedade e do Estado assegurar a criança
e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à
saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização,
à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e a convivência
familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma
Rev. Educ., v.18, n.24, p.3-9, 2015
de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e
opressão (BRASIL, 1988).
As demais legislações produzidas ao longo da década
de 1990 e 2000, reafirmam os princípios constitucionais
e ressaltam a importância da família no desenvolvimento
psicossocial de crianças e adolescentes, uma vez que, é no
seio da família e da comunidade que são construídas as
relações primárias.
De acordo com Guimarães (2007, p. 131):
O Estado deve ser o maior responsável e a sociedade no seu
conjunto, co-responsável, na execução de uma política global
de família com especial atenção para com seus membros mais
vulneráveis e mais desprotegidos. Devendo ser proporcionados
às famílias, os meios e recursos necessários para que deles
possam cuidar, tendo como primazia a manutenção dos vínculos
familiares, independente da situação de vulnerabilidade social.
Segundo Guimarães (2007) a Política Nacional de
Assistência Social vem estabelecer efetivamente a assistência
social como política de Estado, determinando ao Estado a
responsabilidade na universalização da cobertura e na garantia
de direitos e de acesso a serviços, programas e projetos a
serem assegurados aos brasileiros, através do Sistema Único
da Assistência Social - SUAS.
Já o SUAS constitui-se na regulação e organização em
todo território nacional da rede de serviços sócio assistenciais,
vindo materializar o conteúdo da Lei Orgânica da Assistência
Social - LOAS, promulgada em 7 de dezembro de 1993 (Lei n°
8.742), que regulamenta os artigos 203 e 204 da Constituição,
estabelecendo o sistema de proteção social para os grupos
mais vulneráveis da população, por meio de benefícios,
serviços, programas e projetos.
Em seu art. 2°, estabelece que a assistência social tem por
objetivo dentre outros: I) a proteção à família, à infância e a
adolescência; II) o amparo às crianças e adolescentes carentes.
Vale salientar que as ações de assistência social não se
dirigem ao universo, a população infanto-juvenil, mas a um
segmento especifico que delas necessita por se encontrar em
estado de carência, exclusão ou risco pessoal e social.
Constatamos assim, que a legislação brasileira vigente
reconhece e preconiza a família, enquanto estrutura vital,
lugar essencial à humanização e à socialização da criança
e do adolescente, espaço ideal e privilegiado para o
desenvolvimento integral dos indivíduos. Contudo, a história
social das crianças, dos adolescentes e das famílias revela que
estas encontraram e ainda encontram inúmeras dificuldades
para proteger e educar seus filhos. Tais dificuldades foram
traduzidas pelo Estado em um discurso sobre uma pretensa
‘incapacidade’ da família de orientar os seus filhos. Ao longo
de muitas décadas, este foi o argumento ideológico que
possibilitou Poder Público o desenvolvimento de políticas
paternalistas voltadas para o controle e a contenção social,
principalmente para a população mais pobre, com total
descaso pela preservação de seus vínculos familiares.
A esse respeito Guimarães (2007, p.133) acrescenta que
a família
7
A Importância da Família na Formação Social do Adolescente
constitui uma realidade dinâmica e em permanente evolução,
sendo essencial desenvolver medidas concretas e adequadas que
correspondam às necessidades próprias das diferentes fases do
ciclo de vida familiar, que contribuam e proporcionem melhores
condições educativas, econômicas, laborais, sociais e culturais,
que facilitem a formação e a realização da pessoa humana no seio
da família, a manutenção de unidade familiar e a sua estabilidade
ao longo do tempo.
Face a está realidade, o assistente social tem que pensar
em formas interventivas eficazes para auxiliar as famílias
frente aos desafios colocados nesta fase da adolescência, além
de cobrar do poder público políticas públicas voltadas a este
segmento.
Contudo, as famílias em situação de pobreza e frente a não
oferta ou oferta irregular de políticas públicas, como elucida
Coimbra (2005, p.23),
BOCK, A.M.B.; FURTADO, O.; TEIXEIRA, M.LT. Psicologias:
uma introdução ao estudo de psicologia. São Paulo: Saraiva,
1999.
[...] são obrigadas a criar suas estratégias de sobrevivência
levando seus filhos a contribuírem com o sustento da família,
privando-os do tempo que deveriam se dedicar à escola, ao
esporte e ao lazer. Estas por sua vez, expostas às vivências de
rua, entram em contato com as drogas, com a prostituição, e com
a infração em geral.
BRASIL. Presidência da República. Ministério do
Desenvolvimento Social e Combate a Fome. Plano Nacional da
Assistência Social / Secretaria Nacional da Assistência Social.
Brasília: MDS, 2006
Referências
BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República
Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal, 1998.
Nessa perspectiva entendemos que, para que a proteção
especial a família ocorra, dada a sua reconhecida importância
no desenvolvimento da criança e do adolescente, são
necessários requisitos, ou compromissos a serem assumidos
necessariamente pelo Estado e pela sociedade civil
(GUIMARÃES, 2007). Através da concepção, fomento,
desenvolvimento e integração de políticas adequadas, que
efetivamente potencialize as suas funções específicas como
agente socializador.
BRASIL. Presidência da República. Secretaria Especial dos
Direitos Humanos. Conselho Nacional dos Direitos da Criança e
do Adolescente. Plano Nacional de Promoção, Proteção e Defesa
do Direito de Crianças e Adolescentes à Convivência Familiar
e Comunitária / Secretaria Especial dos Direitos Humanos.
Brasília: Conanda, 2006.
3 Conclusão
COIMBRA, M.I.A.M. A perspectiva do adolescente que cumpre
medida socioeducativa no município de Franca/SP. (Dissertação
de Mestrado em Serviço Social) - Universidade Estadual Paulista
Júlio de Mesquita Filho, Franca, 2005.
Ao abordarmos a importância da família na formação
social do adolescente, devemos ressaltar que o conceito de
adolescência é recente, surgindo no mundo ocidental no início
do século XX, ganhando visibilidade após a segunda guerra
mundial.
A fase da adolescência é vista como uma fase de
inquietações e contestações, sendo de extrema importância
para o adolescente à influência de grupos de amigos, e de ser
aceito neste grupo. Nessa fase também se dá a construção
da sua identidade, a qual acontece durante toda a vida do
indivíduo, as transformações corporais e a aquisição de novos
valores.
Embora as modificações psicológicas, físicas e corporais
assemelham-se entre esses jovens de todas as classes sociais,
as condições de sobrevivência são determinadas de diferentes
maneiras, onde os jovens oriundos das classes sociais mais
favorecidas preocupam-se em terminar seus estudos e
conseguir um emprego estável, e os jovens oriundos de
famílias empobrecidas preocupam-se com a luta diária pela
sobrevivência.
Consideramos assim que a adolescência seja mais que
uma fase peculiar de desenvolvimento, tendo seus contornos
definidos e sendo delimitada pela realidade sócio-histórica a
qual está inserida.
Podemos afirmar ainda que é no seio da família e da
comunidade que crianças e adolescentes constroem suas
relações primárias que são definidas como primordiais para
seu desenvolvimento.
8
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