O BANCO DE MOLÉCULAS DA AMAZÔNIA E SUA APLICAÇÃO

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O BANCO DE MOLÉCULAS DA AMAZÔNIA E SUA APLICAÇÃO CONTRA O ALVO
ENZIMÁTICO DA DOENÇA DE CHAGAS
Isabella Menezes QUEIROZ1; [email protected]
Ana Alice Farias da COSTA1; [email protected]
Krisnna Mariana Aranda ALVES1; [email protected]
Jaqueline Bianca Carvalho DUARTE2; [email protected]
Fábio José Bonfim CARDOSO1; [email protected]
Ana Paula da Silva FONSECA1; [email protected]
Fábio Alberto de MOLFETTA1; [email protected]
1
Faculdade de Química, ICEN, Universidade Federal do Pará
Instituto de Tecnologia (ITEC), Universidade Federal do Pará.
2
RESUMO: Estimam-se que existam de 6 a 7 milhões de pessoas infectadas em todo o mundo pela doença de
Chagas, sendo que os fármacos disponíveis no mercado, o Nifurtimox e Benzonidazol, apresentam elevada
toxidez e ineficácia na fase crônica da doença. A enzima cruzaína foi escolhida para ser utilizada como alvo
biológico, para produção de novos fármacos, pois está envolvida em todo o ciclo de vida do parasito. O Banco
de Moléculas da Amazônia (BMA), criado pelo Laboratório de Modelagem Molecular da UFPA, com
compostos obtidos de produtos naturais da região amazônica. O método de docagem molecular foi feito
utilizando as estruturas do BMA, para assim selecionar moléculas potencialmente ativas contra a cruzaína. Os
cálculos de docagem foram realizados com os programas AutoDock Vina 1.1.0 e DOCK 6.3. Com base nos
valores de energias e análise consensual foram selecionadas 20 estruturas. Sendo feita a verificação da presença
de grupos tóxicos nas moléculas. E por fim foi verificado as possíveis interações com o alvo biológico. Com
isso foi selecionada a estrutura (-)-Anonaina, que apresentou duas importantes ligações de hidrogênio com os
resíduos de aminoácido Trp26 e Cys25. Estes resíduos pertencem ao sítio ativo da cruzaína. Com isso a
estrutura selecionada foi submetida à dinâmica molecular, através do programa fDynamo, onde foram
calculados 5.000 picosegundos, e foi comprovada a estabilidade da estrutura selecionada com a enzima
cruzaína, uma vez que seus valores de RMSD estabilizaram durante a simulação. Com isso, a (-)-anonaina,
mostra-se promissora para o tratamento da doença de Chagas.
Palavras-chave: Cruzaina, Docagem, Dinâmica Molecular.
1. INTRODUÇÃO
As doenças infecciosas parasitárias afetam milhões de pessoas nas diferentes regiões geográficas
mais pobres do planeta e representam uma crescente ameaça mundial. As doenças parasitárias
continuam sendo um obstáculo para o desenvolvimento social e econômico dos países mais pobres,
sendo que a maioria absoluta das mortes devido às doenças parasitárias ocorre em regiões situadas
abaixo da linha do Equador (DIAS et al., 2009).
A doença de Chagas ou tripanossomíase americana é uma infecção causada pelo protozoário
flagelado Trypanosoma cruzi (T. cruzi). Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), a doença
atinge aproximadamente 6 a 7 milhões de pessoas em todo o mundo, no qual a América Latina é
região endêmica da doença, onde atualmente mais de 25 milhões de indivíduos vivem em áreas de
risco de infecção, causando cerca de 10.000 mortes por ano. Tal doença na sua fase crônica causa
deficiências significativas, tendo um alto impacto social e econômico, incluindo desemprego e
diminuição de capacidade produtiva. (DIAS e DESSOY et al., 2013; VALDÉZ et al., 2012; OMS,
2015; ESPERANDIM et al., 2013; DNDi América Latina, 2014).
A propagação da parasitose coincide com a distribuição dos vetores triatomíneos, que se estende
do sul dos Estados Unidos da América (EUA) a Patagônia Argentina. No entanto, a principal área
endêmica da doença de Chagas abrange cerca de 20 países da América Latina (do México até o norte
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da Argentina) e um número significativo de casos de infecção por vetores foi relatado no sul dos EUA
(DORN e cols, 2007). Apesar disso, milhares de pessoas atingidas podem estar vivendo na América
do Norte, Europa e em outros países, como resultado da migração de pessoas infectadas para essas
áreas (COURA E VIÑAS, 2010).
As formas de transmissão são por via oral, transfusão sanguínea, transplante de órgãos,
congênita e a mais conhecida, e também responsável pela maior parte dos casos de infecção em seres
humanos e outros vertebrados, ocorre via fezes ou urina do inseto triatomíneo hematófago infectado,
conhecido vulgarmente como “barbeiro”, que pode ser inoculada dentro da pele pela picada do inseto
ou através de feridas ou escoriações causadas pelo ato de coçar (ESPERANDIM, 2010). O ciclo
biológico do T. cruzi que envolve um hospedeiro vertebrado, humanos e outros mamíferos, e um
invertebrado, geralmente os triatomíneos, que pode ser encontrado nas seguintes formas: amastigotas,
epimastigotas e tripomastigotas, onde esta última é a forma infectante da doença (TEIXEIRA et al.,
2012).
Para o tratamento da doença há apenas dois fármacos disponíveis: Nifurtimox e Benzonidazol,
comercializados com os nomes de Lampit® e Rochagan®, respectivamente (COURA, 2005). Estes
dois fármacos desenvolvidos na década de 1970, são eficazes em curar a infecção principalmente na
fase aguda, no qual apresenta cura para esta fase em torno de até 80%, mas são quase ineficazes em
pacientes cronicamente infectados. Além disso, devido aos seus efeitos colaterais, como elevada
toxidez, o Nifurtimox não é mais comercializado na maioria dos países latino-americano (COURA E
DE CASTRO, 2002). Além dos efeitos colaterais graves da quimioterapia disponível, tem sido
observado resistência em algumas cepas dos tripanossomatídeos (URBINA E DOCAMPO, 2003).
Assim, é de extrema importância o investimento em programas de pesquisa e desenvolvimento (P&D)
para a descoberta de novos medicamentos mais seguros e eficazes no tratamento da doença de Chagas.
(WIGGERS et al., 2013).
A cruzaína (ou cruzipaína) é uma enzima importante e está envolvida na infecção das células
hospedeiras no processo de replicação e no metabolismo de todo o ciclo de vida do parasito. A
inibição seletiva desta enzima bloqueia a replicação, diferenciação e o crescimento do organismo,
além de ser fundamental dentro das células para o seu desenvolvimento e sobrevivência (GIAROLLA
E FERREIRA, et al., 2013; WIGGERS et al., 2011).
A enzima cruzaína é um alvo validado e por esse motivo uma grande busca por inibidores foi
realizada por vários grupos de pesquisa em todo o mundo nos últimos vinte anos. Assim, a enzima
cruzaína torna-se um alvo interessante para o desenvolvimento de inibidores enzimáticos com
elevado potencial de desenvolvimento clínico (WIGGERS et al., 2011; LOZANO et al., 2012). Por
esse motivo, o alvo biológico utilizado foi a enzima cruzaína, principal cisteíno protease presente no
T. cruzi.
O sítio ativo dessa enzima possui quatro subsítios de ligação, denominados S1, S2, S3 e S4
(Figura 1). O subsítio S1 é onde se localiza a tríade catalítica da enzima, o S2 é o principal responsável
pela especificidade da enzima, sendo que esse subsítio é delimitado pelas cadeias laterais dos resíduos
hidrofóbicos LEU67, MET68, ALA133, LEU157, GLY160 e GLU205, que é essencial para a
especificidade da enzima (BOURGUIGNON et al., 2011), e os subsítios S3 e S4 são mais superficiais
e possuem também características hidrofóbicas (WIGGERS et al., 2011).
Figura 1. Subsítios da enzima Cruzaína. Fonte: WIGGERS et al., 2011.
745
O processo de descoberta de novos fármacos é fundamentado no conhecimento da estrutura e
das propriedades de fármacos ativos contra um alvo biológico (SÁNCHEZ-QUITIAN, 2010). Neste
trabalho, foram utilizados os métodos de docagem molecular, pois este é frequentemente aplicado na
busca de novos fármacos, no qual reduz o número de moléculas a serem submetidas a testes
experimentais, se tornando um método chave na química computacional (PATIL, 2013).
Neste estudo, os cálculos de docagem molecular usaram o Banco de Moléculas da Amazônia
(BMA), este banco possui atualmente 866 compostos provenientes de produtos naturais extraídos de
espécies vegetais da Região Amazônica, área detentora da mais rica biodiversidade no mundo e
importante fonte de componentes terapeuticamente eficazes (CALDERON et al., 2009). Dessa forma,
o Laboratório de Modelagem Molecular (LMM) da Universidade Federal do Pará criou em 2009 e
vem implementando este banco, com a finalidade de reunir compostos orgânicos oriundos da região,
para realizar triagens virtuais de moléculas que possam apresentar atividade inibitória em doenças
negligenciadas, tais como a doença de Chagas, Malária e Leishmaniose. Com as estruturas melhores
pontuadas no ensaio virtual, foram efetuados cálculos de dinâmica molecular para selecionar
estruturas mais promissoras em inibir a enzima cruzaína. Desta forma, contribuir com o
desenvolvimento de novos fármacos que auxiliem na terapia contra a doença de Chagas.
2. OBJETIVO
 Selecionar compostos oriundos do BMA que sejam seletivos contra a enzima cruzaína da
Doença de Chagas;
 Realizar cálculos de Dinâmica Molecular com a estrutura selecionada através do programa
computacional fDynamo;
 Avaliar os resultados das interações dos resíduos da enzima com a molécula selecionada
através da dinâmica molecular observando os valores de RMSD.
3. METODOLOGIA
3.1.
Banco de moléculas da Amazônia
O Brasil possui uma biodiversidade extremamente rica no qual reúne aproximadamente 20%
de todas as espécies do planeta. A Amazônia tem um enorme potencial para a produção de
conhecimentos e de produtos com valor agregado, incluindo medicamentos naturais ou derivados,
suplementos alimentares, cosméticos e materiais para controle de pragas e parasitas agrícolas
(VALLI, 2013).
A região Amazônica possui grande potencial como fonte de novos fármacos, devido sua
enorme biodiversidade ou quimiodiversidade (PAZ-Y-MIÑO et al., 2012), no qual os produtos
naturais são importantes fontes de compostos biologicamente ativos e muitos deles constituem
modelos para síntese de vários fármacos (VALLI, 2013).
O BMA dispõem de uma diversidade química baseada nas diferentes classes de compostos,
como quinonas, flavonóides, alcalóides e outras classes. Atualmente, o BMA possui 866 moléculas
de produtos naturais da Amazônia. Neste estudo o programa Instant JChem 6.1 (ChemAxon, 2013)
foi utilizado para a construção do BMA, uma vez que este viabiliza o armazenamento e posterior
recuperação das estruturas. Deste modo, a partir dessas informações é possível verificar a
possibilidade da síntese de estruturas para futuros testes biológicos.
3.2.
Docagem Molecular
Os métodos de docagem molecular receptor-ligante são métodos computacionais para a
identificação do modo de ligação de moléculas candidatas a fármacos, no sítio ativo de proteínas
consideradas como alvos moleculares para o tratamento quimioterápico de doenças. Estes métodos
são importantes no planejamento de fármacos baseados em estruturas e possuem grande potencial
para auxiliar na descoberta de novos medicamentos (MAGALHÃES, 2006)
746
A docagem molecular é uma importante ferramenta computacional na triagem in silico para a
descoberta de novos fármacos, uma vez que auxilia na seleção de compostos promissores como
ligantes de alvos terapêuticos de interesse, sejam eles agonistas ou antagonistas de receptores, ou
ainda inibidores enzimáticos (WINK, 2012; RODRIGUES, 2012). Os protocolos de docagem são
descritos como a combinação de duas componentes: as funções de pontuação e de busca. As funções
de pontuação são usadas para prever o encaixe, ou seja, a afinidades de ligação dos ligantes com a
proteína, enquanto que as funções de busca geram as possíveis conformações dos ligantes
(RODRIGUES et al., 2012). Porém, os resultados obtidos podem variar de acordo com as
características do receptor e do programa escolhido (FREITAS, 2009).
3.3.
Dinâmica Molecular
As simulações de dinâmica molecular são ferramentas importantes para uma melhor
compreensão da flexibilidade da enzima e amostras conformacionais relevantes para planejamento
de fármacos (DURRANT et al., 2009).
O método de dinâmica molecular utilizado neste trabalho é dividido em três partes, uma região
tratada com mecânica quântica (QM), uma região tratada como mecânica molecular (MM), mediante
os campos de força da mecânica molecular clássica, e a outra região de contorno, que corresponde a
um conjunto de restrições a serem aplicadas. Com isso, as simulações de dinâmica molecular
combinada com o método híbrido QM/MM tem sido muito utilizadas para estudos de interação
inibidores/proteínas e de mecanismo catalítico enzimático (CARNEIRO et al., 2011).
Para realização das simulações de dinâmica molecular foi utilizada a livraria computacional
fDynamo (FIELD, 2000), esta livraria aplica os potenciais híbridos da mecânica quântica (QM) e
mecânica molecular (MM).
O programa fDynamo permite realizar cálculos AM1, usar o campo de força OPLS-AA e o
modelo de solvatação explicito TIP3, ele realiza cálculos de energia, otimização de geometrias e
pesquisa de estruturas de transição. Além disso, utiliza o método híbrido QM/MM. Para visualização
das estruturas foi utilizado o programa VMD (HUMPHREY et al, 1996) pois este possui uma boa
interface gráfica.
4. RESULTADOS E DISCUSSÃO
A partir do BMA foi feita a triagem virtual no qual as estruturas foram submetidas à docagem
molecular nos programas AutoDock Vina 1.1.0, e Dock 6.3. Estes programas apresentam métodos
diferentes na abordagem dos ligantes, com diferentes funções de busca e pontuação. Após a realização
da análise consensual baseados nos valores de energia foram selecionadas 20 estruturas do BMA.
Foram encontradas nove estruturas com massa molar acima de 500 Daltons, e segundo a regra
de Lipinski e colaboradores (Regra dos Cinco) (LIPINSKI et al. 1997) um fármaco ativo de
administração oral não deve violar essa condição. Dessa forma, essas estruturas foram excluídas dos
compostos selecionados.
Também foi analisada a toxidez das moléculas selecionadas por meio do servidor OChem
(SUSHKO, 2012). Esse servidor faz a análise se uma determinada estrutura apresenta grupos tóxicos.
A análise de toxidez se faz necessário, pois muitos compostos são excluídos durante o processo de
descoberta e desenvolvimento de fármacos devido a efeitos indesejados ou de toxidez apresentados
por essas estruturas (DINGERMANN et al, 2004).
Os compostos que não apresentaram grupos tóxicos segundo o programa foram submetidos a
análise através da ferramenta computacional LigPlus 1.4.5 para verificação de interações com os
resíduos chave da enzima Cruzaína. Com isso, foram selecionadas duas estruturas, os compostos 314
e 383.
Em seguida, realizou-se a docagem com os dois ligantes selecionados, usando o AutoDock
Vina 1.1.0 e o DOCK 6.3, na Catepsina L (código PDB 1MHW), que é a enzima homóloga humana,
como forma de testar se os ligantes apresentavam atividade contra tal enzima. Após a docagem na
Catepsina L, verificou-se através do programa LigPlus, que o ligante 314 não fez interações de
hidrogênio com tal enzima, onde o mesmo não ocorreu com o ligante 383, ocasionando no descarte
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deste último ligante. Desta forma, foi selecionado o ligante 314 que apresentou interações com a
enzima cruzaína (Figura 2) e não com a homóloga humana, a Catepsina L.
Um dos representantes mais importantes das classes cisteíno-proteases, são as catepsinas. A
cruzaína, uma cisteíno-protease da família de catepsina L, é considerada a protease mais abundante
em T. cruzi, sendo expressa em todos os estágios do parasito e apresenta ampla especificidade
catalítica (MOURA, 2011). A partir disto, busca-se um composto no qual não apresente interação
com a Catepsina L, para que não ocorra sua inibição e prejudique suas atividades benéficas para o ser
humano, tais como a perda da sua ação no sistema imunológico.
Figura 2: Ligações de hidrogênio (em verde) entre o ligante 314 com a enzima 1ME3, no qual o
ligante faz ligações de hidrogênio com os resíduos de Trp26 e Cys25. Figura obtida através do
programa LigPlus [PETTERSEN, et al, 2004].
A estrutura selecionada (ligante 314) foi analisada através do programa LigPlus 1.4.5
(LASKOWSKI, 2011) para verificar as possíveis interações de hidrogênio entre receptor-ligante.
Através dos resultados obtidos foram observadas duas importantes ligações de hidrogênio com os
resíduos de aminoácidos Trp26 e Cys25 localizado no subsítio S1, que pertence ao sítio ativo da
enzima cruzaína (Figura 2).
Segundo Moreira e colaboradores estes resíduos mostram-se importantes para estabilização
do ligante no sítio da cruzaína, por pertencerem ao subsítio S1, região no qual se encontra a tríade
catalítica da enzima (MOREIRA et al. 2014).
Além disso, pesquisas revelam que o ligante selecionado 314 o (-)-Anonaina apresenta
atividade como antidepressivo, antioxidante, antifúngico, além da ação sobre o Plasmodium
falciparum (HSING-TAN LI et al.,2013) que nos abre a possibilidade que ele possa atuar com ação
tripanossomicida através da enzima cruzaína.
Após a seleção da estrutura 314, foi feito o estudo in silico do comportamento da enzima e do
ligante no meio biológico, por meio de dinâmica molecular. Por esse método, é possível simular a
dinâmica do complexo enzima-ligante em solução, e verificar se as interações de hidrogênio com os
resíduos de aminoácidos observadas pelo método de docagem molecular são conservadas e fortes o
suficiente para manter a pequena molécula complexada na macromolécula em uma situação estável
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no sistema. Além disso, permite observar possíveis modificações conformacionais na presença do
ligante complexado (SARTORI, 2012).
Após cálculos de dinâmica molecular a análise do RMSD (Root Mean Square Desviation) foi
realizada a partir do ligante selecionado, cujo período de simulação foi equivalente a 5000
picosegundos, como mostrado na Figura 3.
Figura 3: Gráfico de RMSD para o sistema, enzima Cruzaína complexada com o ligante 314, a (-)Anonaina.
Ligante 314
A Figura 3 mostra dos valores de RMSD para o ligante 314 (-)-anonaina, onde pode-se
acompanhar o aumento gradual até a estabilização do ligante no sitio ativo da enzima cruzaína, que
ocorre a partir de 2500 picosegundos.
Através dos resultados do gráfico de interação por resíduo, observa-se a preservação da
ligação com o resíduo de aminoácido Cys25 obtido através da docagem, como pode-se ver na Figura
4.
Figura 4: Contribuição individual dos resíduos de aminoácidos para o ligante 314, (-)-anonaina,
pelo método híbrido QM/MM, onde os valores apresentados estão em kJ/mol.
A Figura 4 apresenta a contribuição individual de cada resíduo para energia de interação total
enzima-inibidor durante os últimos 500 picosegundos de simulação. A partir desse gráfico pode-se
observar que o resíduo Asp158 apresentou valor positivo, ocasionando repulsão, enquanto que o
resíduo Cys25 apresentou valor negativo, o que indica interação.
De acordo com a literatura, a Cys25 é um importante resíduo para estabilização da molécula,
fixando o inibidor no sitio ativo da enzima, pois faz parte do subsítio S1, onde se encontra a tríade
catalítica da enzima cruzaína (WIGGERS et al., 2011).
Segundo Chen, o resíduo de aminoácido Asp158 está localizado no subsítio S2, onde há a
presença de doadores e aceptores de hidrogênio entre os subsítios S1 e S2 (CHEN, 2008). O subsítio
749
S2 é o principal responsável pela especificidade da enzima cruzaína, sendo pouco exposto ao solvente
e é delimitado pelas cadeias laterais dos resíduos hidrofóbicos, conferindo assim a este subsítio
especificidades por grupos hidrofóbicos (SOUZA, 2012).
Assim, pode-se concluir que estrutura selecionada na docagem realizou interação com um
resíduo importante, pertencente ao sítio ativo da enzima cruzaína, e se manteve estável durante a
dinâmica molecular, mostrando que a (-)-anonaina pode possuir atividade contra a enzima, ou seja,
essa interação com o resíduo encontrado nos cálculos de dinâmica permitirá o planejamento de novos
inibidores para o alvo biológico em estudo.
5. CONCLUSÃO
A partir dos cálculos de docagem molecular realizadas através dos programas AutoDock Vina
1.1.0 e Dock 6.3, e através da analise consensual baseado na avaliação das energias foram
selecionados 20 estruturas. Posteriormente, foram avaliadas as interações com resíduos chave do sítio
ativo e a toxidez, e desta forma, foram selecionados duas estruturas. Estas estruturas foram docadas
com os programas supracitados e verificou-se que apenas o composto 314, a (-)-Anonaina, não
apresentou interação com a enzima homóloga humana, a Catepsina L.
Pode-se destacar que a estrutura selecionada para a dinâmica molecular já apresenta resultados na
literatura com outras atividades, o que a torna uma molécula promissora para futuros estudos contra
a cruzaína do T. cruzi.
A simulação de dinâmica molecular acoplada ao método hibrido QM/MM mostraram a
estabilidade do composto selecionado no sítio ativo da enzima e a partir dos resultados da
contribuição individual de resíduos para a energia de interação, juntamente com as interações
observadas nas conformações preditas pela docagem molecular, foi verificada interação com o
resíduo Cys25 que faz parte da tríade catalítica da enzima sendo importante para a estabilização. Com
isso a estrutura selecionada, a (-)-anonaina, mostra-se promissora para o tratamento da doença de
Chagas.
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