A ECONOMIA DO MAR, ORDENAMENTO, GESTÃO DO ESPAÇO MARÍTIMO E LICENCIAMENTO: OPORTUNIDADES E IMPLICAÇÕES PARA OS MUNICÍPIOS COLÓQUIO | 9 de abril de 2015 | Universidade Católica Portuguesa Painel 1: ORDENAMENTO, GESTÃO E LICENCIAMENTO NO ESPAÇO MARÍTIMO Abertura do painel António Cortês (Universidade Católica /MARE STARTUP) Com a Lei de Bases da Política de Ordenamento e de Gestão do Espaço Marítimo Nacional (a Lei n.º 17/2014, de 10 de abril), de que se comemora amanhã um ano sobre o dia da sua aprovação, e com o recente Decreto-Lei n.º 38/2015, de 12 de Março, que a desenvolve e regulamenta, assiste-se, poderemos dizê-lo, ao culminar de uma série de passos percursores de lançamento uma estratégia nacional de redescoberta do mar. Simultaneamente, esta nova legislação marca o início de uma nova decisiva etapa não apenas ao nível do ordenamento jurídico e legislativo português, mas também a nível das perspetivas abertas para o futuro económico, social e ambiental do País. Não se pode dizer que os diplomas sejam isentos de qualquer reparo. Ainda assim, os mencionados diplomas podem por certo considerar-se uma importante -1- base de trabalho a partir da qual é possível progredir com maior segurança, reduzindo a complexidade dos problemas a enfrentar. Depois de décadas de afastamento progressivo do mar, parece que Portugal, que em tempos mais remotos através do mar uniu os quatro cantos do mundo e que tem emblematicamente na sua bandeira a esfera armilar alusiva aos Descobrimentos, se volta cada vez mais decisivamente para o mar, um mar que – se nos é permitida a invocação poética - parece inscrito no destino da alma portuguesa. É certo que a redescoberta do mar não será agora no século XXI como foi antes nos séculos XV e XVI. A aventura marítima é nova, é agora diferente. Já não se trata tanto de descobrir novas terras e caminhos marítimos. Trata-se mais, agora, de com o apoio da ciência e da tecnologia aproveitar de forma sofisticada as potencialidades económicas do mar, quer nas zonas costeiras quer no mar profundo, preservando simultaneamente os bens naturais que aí se encontram e a ecologia que aí se salvaguarda. Está em causa, numa palavra, a aventura projetada de um novo modelo de desenvolvimento. A Lei de Bases fala, no seu artigo 1.º, em “desenvolvimento sustentável do País” - um desígnio que terá certamente de se cumprir a partir da interação entre a iniciativa empresarial e a dinâmica das entidades públicas, com as suas competências planificadoras, licenciadoras, contratuais e comunicacionais. Está em causa um objetivo que tem aliás expressão em duas disposições da Constituição da República Portuguesa. Uma refere-se ao aumento do “bem-estar social e económico e da qualidade de vida das pessoas, em especial das mais -2- desfavorecidas” (artigo 81.º), a outra exige a defesa de “um ambiente de vida humano, sadio e ecologicamente equilibrado” (artigo 66.º). E assim se convoca, também, sem dúvida, a chamada Agenda 21 adotada na Conferência das Nações Unidas sobre Ambiente e Desenvolvimento, realizada no Rio de Janeiro em 1992, que tem em Portugal expressão nas Agendas 21 locais. Se quisermos dar um outro nome à finalidade do desenvolvimento sustentável explicitada na Lei de Bases de Ordenamento e Gestão do Espaço Marítimo diríamos: “crescimento azul”. Aquilo que em última análise se pretende com toda a legislação relativa ao ordenamento e gestão do espaço marítimo é criar as condições para uma nova “economia azul” em que todas as entidades públicas e privadas são chamadas respetivamente no domínio das suas competências ou da sua liberdade a participar. Podemos dizer que a ideia que mais rapidamente ocorre com a designação “economia azul” é a de uma empresarialidade eficiente ligada ao mar, através da múltiplas atividades que este potencia: pesca, aquicultura, biotecnologia marinha, produção de energia, extração de recursos minerais, recreio, desporto e atividades turísticas costeiras, investigação científica, transporte de mercadorias etc.. Mas a economia azul é uma economia que simultaneamente salvaguarda o aproveitamento racional dos recursos naturais do mar e que preserva os diversos serviços ecossistémicos que este presta bem como o valor económico e social que estes incorporam. Na economia azul não há verdadeira cisão entre produtividade económica e criação de emprego, por um lado, e gestão racional dos recursos naturais e -3- preservação do ambiente, por outro lado. O aumento do PIB é apenas uma das muitas variáveis do desenvolvimento, a par de todos os outros índices do desenvolvimento social, e o própria ecologia tem valor económico, ainda que por vezes apenas indireto. O que temos é uma aliança, uma coesão, entre três dimensões – a económica, a social e a ecológica - de um mesmo processo de desenvolvimento, uma aliança selada pelo conhecimento científico que lhe dá consistência e, em última instância, pela lei e pelo Direito, que salvaguardam os objetivos do crescimento azul. O azul é a cor do mar porque este espelha o céu, símbolo de um mundo melhor. E se não é de esperar que do desenvolvimento económico, social e ecologicamente sustentado, que o mar potencia, surja o paraíso na terra, podem pelo menos esperar-se novas oportunidades de uma melhor sociedade, que, no respeito pelos equilíbrios dos ecossistemas, proporcione simultaneamente mais alternativas económicas e melhor qualidade de vida a todos. Vamos hoje falar precisamente de duas formas de cumprir, por mediação da lei e do Direito, os desígnios do “crescimento azul” que a todos nos responsabiliza. O Prof. Doutor José Guerreiro irá falar-nos dos «Planos de ordenamento do espaço marítimo na sua relação com a nova Lei de bases dos solos, ordenamento e urbanismo». Posteriormente, o Prof. Doutor Luís Fábrica falará da questão dos «licenciamentos de atividades económicas marítimas» que frequentemente terão conexões com o que se passa aquém mar, nas zonas costeiras e não costeiras. -4-