Mimesis: tradição e ruptura Mimesis: tradition and rupture

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Anais do SEFiM, Porto Alegre, V.02 - n.2, 2016.
Mimesis: tradição e ruptura
Mimesis: tradition and rupture
Palavras-chave: Mimeses; Meios de comunicação; Educação.
Keywords: Mimesis; Mass media; Education.
Priscila Rossinetti Rufinoni
Universidade de Brasília
[email protected]
Em um grupo de estudantes de ensino médio, há sem dúvida inúmeros dados identitários
que constituem os seus subgrupos, muita vezes mediados por mídias de comunicação.
Tais objetos culturais, um docente experiente já o sabe, sempre que tematizados de modo
incauto, levam a tensões, pois atingem muito mais do que o rótulo “entretenimento” é
capaz de explicitar: atingem visões de mundo que se conformam, julgamentos compartilhados, juízos estéticos que dão forma à pequena arena pública que destinamos (ou
que os meios de comunicação possibilitam) aos jovens. O tema da mimeses, dos desafios
implicados pela exposição mimética, remontam à origem da filosofia. Desafio para o conhecimento, desafio para os filósofos, que tem na pintura, muitas vezes seu oponente, o
campo pode permitir construir, em uma sala da aula, um aparato crítico para a recepção
dos objetos de consumo cultural. Palavra fundamental para as reflexões sobre o trabalho e
as produções humanas, o termo ‘mimesis’ agrega em torno de si constelações conceituais
tensas, que a tradução pelo latim imitatio dissimula e simplifica. O mimetikós, o artífice
das “imitações”, não é necessariamente um imitador, embora também o seja em vários
textos clássicos. Não é um falsificador, mas um escultor, um pintor, um poeta, um músico, ou mesmo um dançarino, se remetermos o termo à origem etimológica mimos, danças
rituais ligadas à purificação mística ( Cf. SÖRBOM apud TAKAYMA, 2006). Há ainda a
designação “demiurgo” para o artista e o artesão, palavra ambígua, como bem explicitam
Vernant e Naquet em Trabalho e escravidão na Grécia Antiga, na qual se encontram o trabalhador “para os outros” (para os demoi) e o criador fabuloso de maravilhas. No caso de
se abordar essa perceptiva em sala de aula, o tratamento que Platão dá ao tema de início já
explicita toda a tensão semântica; o próprio Platão, ao debater a condenação da mimesis
em A república, o faz por meios bastante indiretos, pois eles mesmos, na forma do dialogo
encenado, de alguma forma miméticos. Como problema imanente ao próprio texto do
diálogo platônico, a questão reaparece deslocada e reposta em Aristóteles, na Poética. Há
várias estruturas discursivas, nem todas da ordem do verdadeiro ou falso. A mimesis, assim, toma outro espaço de debates, pois configura uma outra maneira de expor o real. A
leitura desses textos em sala de aula, sem servir à definições estanques do que significam
os termos, pode possibilitar a contextualização de vários produtos culturais tensionando
as relações entre real e poiético. De posse dessas reflexões, o professor pode retomar cenas
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de filmes, reality shows entre outros produtos encampados no universo cultural dos estudantes, trabalhando questões internas à mimesis, como as formas do discurso e a verossimilhança. Ou, como sugere Jacyntho Brandão, o professor pode pensar os espelhamentos
entre phyein e poiein, entre o trabalho da natureza, natura naturans e o da poiética, trabalho humano com suas várias interpretações desde a Antiguidade (Cf. NAQUET, cit). Tal
interpretação levará à possibilidade de refletir sobre a mimesiscomo construção, revelando
suas camadas poéticas constitutivas e, em um segundo momento, político ideológicas.
Assim, essa comunicação pretende expor possibilidades de abordagem da problemática
clássica sobre a mimeses, suas implicações político-sociais, de modo a criar uma rede de
sentidos possíveis em torno dos objetos culturais que nos rodeiam.
Referências
ARISÓTELES. Arte retórica e arte poética. São Paulo: Difusão europeia, 1964.
AUERBACH, E. Mimesis. São Paulo: Perspectivas, 1987.
BRANDÂO, Jacyntho. A invenção do romance. Brasília: Editora da UnB, 2005.
PLATÃO. A república. Belém: UFPA, 2000.
TAKAYMA, Luiz Roberto. Sobre a crítica de Platão à poesia. Dissertação (Mestrado em Filosofia),
USP, 2006.
VERNANT, J. P.; Naquet, P. V. Trabalho e escravidão na Grécia Antiga. Campinas: Papirus, 1989.
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