OS PRINCÍPIOS CONTABILÍSTICOS GERALMENTE ACEITES (POC vs. SNC) ALGUMAS DIVERGÊNCIAS DE OPINIÃO 28 Joaquim Fernando da Cunha Guimarães REVISOR OFICIAL DE CONTAS Introdução “Os ‘Princípios’ Contabilísticos – Ponto de partida de uma Normalização Contabilística”. A frase em destaque, extraída da tese de doutoramento do saudoso Professor Doutor Rogério Fernandes Ferreira1, é bem elucidativa sobre a importância do tema na normalização contabilística. A expressão “Princípios Contabilísticos Geralmente Aceites” (PCGA), traduzida de “Generally Accepted Accounting Principles” (GAAP)2, tem sido uma das mais utilizadas no vocabulário contabilístico nacional e internacional. No presente artigo pretendemos abordar alguns aspetos concetuais no âmbito do regime contabilístico anterior (Planos Oficiais de Contabilidade de 1977 e de 1989 – POC/77 e POC/89, respetivamente) e do atual (em vigor desde 1 de Janeiro de 2010) modelo contabilístico do Sistema de Normalização Contabilística (SNC), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 158/2009, de 13 de Julho. Assim, esta abordagem será efetuada com base essencialmente nas respetivas estruturas concetuais, destacando-se o seu enquadramento no macro-princípio da “Imagem Verdadeira e Apropriada” (IVA). Aproveitamos o ensejo para efetuar uma breve referência histórica ao impulso contabilístico dado pelo Código da Contribuição Industrial (CCI), aprovado pelo Decreto n.º 45103, de 1 de Julho de 1963, ao apelar, já nessa altura, ao que designava de “sãos princípios da contabilidade”. que só viria a ocorrer catorze anos mais tarde, através do DecretoLei n.º 47/77, de 7 de Fevereiro, que aprovou o primeiro POC (POC/77). O que pretendemos sublinhar é que, embora não existisse nessa altura qualquer regulamentação contabilística, já o CCI apelava à importância dos “sãos princípios de contabilidade” para efeitos de apuramento do lucro tributável nessa cédula. Sendo assim, durante aquele período de catorze anos e perante a ausência da enunciação e concetualização dos designados “são princípios de contabilidade”, a prática contabilística seguiu, expressamente ou não, os princípios contabilísticos internacionais existentes. Desde logo esta divisão nos permite aferir que a designação “princípios contabilísticos” não se refere exclusivamente aos próprios “princípios contabilísticos” mas também a outros aspetos concetuais, das quais relevam os critérios (de valorimetria) e métodos (de custeio), agora, com o SNC designados de “mensuração”. Logo no início do capítulo em análise, Rogério Fernandes Ferreira clarifica4: “As expressões princípios contabilísticos, são princípios, princípios geralmente aceites, são, de modo geral, utilizadas em sentidos que englobam não só propriamente princípios, isto é, conceitos básicos (fundamentos teóricos ou pressupostos) em que devem assentar as relevações contabilísticas, mas também convenções ou regras que tradicionalmente se consideram de adoptar.”. 2. POC/77 1. Código da Contribuição Industrial Como já referimos em artigos anteriores3, o CCI foi o verdadeiro “motor” (impulsionador) da normalização contabilística em Portugal, ao prever diversas disposições sobre a organização contabilística para efeitos de apuramento desse imposto. O primeiro POC (POC/77) foi aprovado, como já referimos, pelo Decreto-Lei n.º 47/77, de 7 de Fevereiro, enunciando os ditos princípios contabilísticos no capítulo “XII – Valorimetria” e no item “1 – Princípios contabilísticos adotados”5, como desenvolvemos no QUADRO N.º1 apresentado no item 3 seguinte. Acrescente-se que o item 10 do capítulo “I – Introdução” previa: “O lucro tributável reportar-se-á ao saldo revelado pela conta de resultados do exercício ou de ganhos e perdas, elaborada em obediência a sãos princípios de contabilidade...”. “No que respeita ao aprofundamento dos critérios valorimétricos e outros princípios e conceitos, espera-se que venham a integrarse na 3.ª fase de trabalho. Na falta, de momento, de definição clara daqueles pelas associações profissionais (e estas não o puderam fazer por circunstância de todos conhecidas – trabalho em início), são, por agora, adoptados, tanto quanto possível, os divulgados nos Institutos Superiores e Faculdades onde primordialmente se ministra o ensino extensivo da contabilidade.”. Na verdade, em 1963, não se encontrava ainda publicado qualquer diploma legal sobre a normalização contabilística em Portugal, o Note-se, ainda, que o POC/77 (Capítulo II – “Considerações Técnicas”) não apresentava qualquer definição da IVA6. No contexto do presente artigo, assume particular relevância a expressão “sãos princípios de contabilidade”, prevista no art.º 22.º do CCI, que transcrevemos: 29 CONTABILIDADE 3. POC/89 O Decreto-Lei n.º 410/89, de 21 de Novembro, aprovou o POC/89, revogando o POC/77. O Capítulo “4 - Princípios contabilísticos” designava-os de “princípios contabilísticos fundamentais”, o que na maioria das situações se considerava como uma expressão equivalente à de PCGA. No QUADRO N.º 1 seguinte apresentamos os princípios contabilísticos do POC/77 e do POC/89: QUADRO N.º 1 PRINCÍPIOS CONTABILÍSTICOS (POC/77 E POC/89) POC/77 (Capítulo XII – Valorimetria – item 11 – Princípios Contabilísticos Adotados) POC/89 (Capítulo “4 – Princípios Contabilísticos”) Da continuidade da empresa O qual significa que a empresa opera continuadamente, com duração ilimitada; Da continuidade Considera-se que a empresa opera continuadamente, com duração ilimitada. Desta forma, entende-se que a empresa não tem intenção nem necessidade de entrar em liquidação ou de reduzir significativamente o volume das suas operações. Da consistência dos exercícios Segundo o qual a empresa não altera os seus princípios de valorimetria ao longo dos exercícios; Da consistência Considera-se que a empresa não altera as suas políticas contabilísticas de um exercício para o outro. Se o fizer e a alteração tiver efeitos materialmente relevantes, esta deve ser referida de acordo com o anexo (nota 1). Da efectivação das operações Pelo qual as operações realizadas num exercício afectam os respectivos resultados, independentemente do seu recebimento ou pagamento; Da especialização (ou do acréscimo) Os proveitos e os custos são reconhecidos quando obtidos ou incorridos, independentemente do seu recebimento ou pagamento, devendo incluir-se nas demonstrações financeiras dos períodos a que respeitam. Do custo histórico O qual determina que os registos se efectuem com base numa realidade objectiva (como, por exemplo, o preço de factura), em contraste com valores aleatórios ou subjectivos; Do custo histórico Os registos contabilísticos devem basear-se em custos de aquisição ou de produção, expressos quer em unidades monetárias nominais, quer em unidades monetárias constantes. Do conservantismo O qual implica que a Contabilidade deve registar todas as perdas de valor e não atender aos ganhos potenciais. Da prudência Significa que é possível integrar nas contas um grau de precaução ao fazer as estimativas exigidas em condições de incerteza sem, contudo, permitir a criação de reservas ocultas ou provisões excessivas ou a deliberada quantificação de activos e proveitos por defeito ou de passivos e custos por excesso. Devem também ser reconhecidas todas as responsabilidades incorridas no período em causa ou num período anterior, mesmo que tais responsabilidades apenas se tornem patentes entre a data a que se reporta o balanço e a data em que este é elaborado. Da recuperação do custo das existências Pelo qual a empresa não deve inventariar as existências finais a um valor que não possa ser recuperado através da venda ou do Consumo; Da substância sobre a forma As operações devem ser contabilizadas atendendo à sua substância e à realidade financeira e não apenas à sua forma legal. Da materialidade As demonstrações financeiras devem evidenciar todos os elementos que sejam relevantes e que possam afectar avaliações ou decisões pelos utentes interessados. Fonte: Elaboração própria. 30 Joaquim Fernando da Cunha Guimarães / REVISOR OFICIAL DE CONTAS CONTABILIDADE Da análise comparativa do quadro realçamos o seguinte: a) A manutenção dos princípios “Do Custo Histórico”, “Da Continuidade”, “Da Consistência”, “Da Especialização (ou do Acréscimo)”, este último no POC/77 designado “Da efetivação das operações”; b) O princípio “Do custo histórico” no POC/77 era mais objetivo, ao exemplificar o “preço da fatura”, expressão entretanto eliminada no POC/89. A referência no POC/89 a “quer a unidades monetárias nominais quer a unidades monetárias constantes7...” deve ser interpretada como contemplando, nomeadamente, as designadas “reavaliações legais de âmbito fiscal”, como, aliás, foi posteriormente clarificado pela Diretriz Contabilística n.º 16 “Reavaliação de ativos imobilizados tangíveis” (DC 16), cujos itens 1.1 e 1.2 estabelecem: “1.1. Com o objetivo de obter uma imagem verdadeira e apropriada do ativo, do passivo e dos resultados das operações da empresa, os registos devem basear-se em princípios contabilísticos geralmente aceites, designadamente o do custo histórico, quer a escudos nominais, quer a escudos constantes. O fenómeno inflacionista e o crescimento económico provocam e evidenciam, entre outros efeitos, a subquantificação dos ativos não monetários, levando muitas empresas a ajustar ocasionalmente algumas rubricas do balanço. Tais ajustamentos têm expressão no capital próprio das empresas através das denominadas reservas de reavaliação, que representam, em rigor, resultados potenciais, isto é resultados não realizados. 1.2. Ao nível fiscal, os efeitos da inflação nas demonstrações financeiras têm sido parcialmente tratados, como regra, através de ajustamentos monetários ocasionais do imobilizado corpóreo efetuados nos termos autorizados pela lei.”. c) A eliminação do princípio previsto no POC/77 “Da recuperação do custo das existências”; d)A inclusão de dois novos princípios contabilísticos: O “Da substância sobre a forma”, destinado nomeadamente a enquadrar as operações de locação financeira (vulgo leasing financeiro)8 e o “Da materialidade”, este último intimamente ligado à caraterística qualitativa da relevância (item 3.2.1 do POC/89)9. Relativamente à IVA, o POC/89 (item 3.2) apresentava a seguinte definição: “Estas características, juntamente com conceitos, princípios e normas contabilísticas adequados, fazem que surjam demonstrações financeiras geralmente descritas como apresentando uma imagem verdadeira e apropriada da posição financeira e do resultado das operações da empresa.”. Ou seja, o “macro-princípio” da IVA será conseguido se se verificar uma aplicação correta de todos aqueles aspetos concetuais, tal como resumimos no ESQUEMA N.º 1 seguinte: ESQUEMA N.º 1 A IVA no POC/89 CARACTERÍSTICAS QUALITATIVAS IVA - DA POSIÇÃO FINANCEIRA CONCEITOS, PRINCÍPIOS E NORMAS CONTABILISTICAS ADEQUADAS - DO RESULTADO DAS OPERAÇÕES Fonte: Elaboração própria. Acresce ainda que o Capítulo “4 – Princípios contabilísticos” enunciava: “Com o objectivo de obter uma imagem verdadeira e apropriada da situação financeira e dos resultados das operações da empresa, indica-se seguidamente os princípios contabilísticos fundamentais.”. Desta forma, os princípios contabilísticos são uma componente muito importante da IVA. Refira-se, finalmente, que a expressão “PCGA” não foi utilizada em qualquer normativo do POC/89, com exceção da Diretriz Contabilística n.º 18 a seguir comentada. 31 CONTABILIDADE Ao contrário do POC/89, algumas Diretrizes Contabilísticas, como normas contabilísticas complementares, contemplavam referências aos PCGA. Financeiras e Princípios Contabilísticos Geralmente Aceites”, visou essencialmente complementar alguns conceitos do POC/89. No seu item 4, sob o título “Princípios Contabilísticos Geralmente Aceites”, previa o texto referido no QUADRO N.º 2 a seguir apresentado. A Diretriz Contabilística n.º 18 (DC 18), publicada no D.R. n.º 179, II Série de 5 de Agosto de 1997, intitulada “Objetivos das Demonstrações Em 2005 a DC 18 foi revista passando a contemplar algumas alterações de acordo com o mencionado 4. Nas Diretrizes Contabilísticas QUADRO N.º 2 PCGA NA DC 18 INICIAL (1997) E REVISTA (2005) DC 18 (Versão inicial – 1997) 4 – Princípios contabilísticos geralmente aceites Os profissionais da contabilidade e os membros da comunidade económica têm vindo a reconhecer a necessidade da existência de princípios, normas e procedimentos, que sejam de aplicação generalizada, apesar dos debates e críticas que suscitarem. Se bem que a CNC atenda ao vasto espectro dos organismos nela representados, baseia a normalização em pesquisa fundamentada e numa perspectiva conceptual sustentada na realidade económica. Os esforços para estabelecer essa estrutura conceptual, que actue como orientação geral, conduzem à adopção de um corpo comum de princípios, normas e procedimentos designados por Princípios Contabilísticos Geralmente Aceites. A expressão "geralmente aceites" significa que um organismo contabilístico normalizador, com autoridade e de larga representatividade, estabeleceu um princípio contabilístico numa dada área ou aceitou como apropriado determinado procedimento ou prática, atendendo à sua aplicação universalmente generalizada e ao seu enquadramento na estrutura conceptual. Os princípios contabilísticos têm vindo a ser reconhecidos em Portugal pela CNC e encontram-se vertidos no POC, nas Directrizes Contabilísticas, no caso de questões ainda não abrangidas, nas normas estabelecidas a nível internacional, como sejam as emitidas pelo Internacional Accouting Standards Committee (IASC). Por conseguinte, a adopção dos princípios contabilísticos não carece, necessariamente, que estes estejam definidos de forma expressa em diploma legal. A CNC, ao privilegiar uma perspectiva conceptual de substância económica para o relato financeiro, considera que o uso de Princípios Contabilísticos Geralmente Aceites se deve subordinar à seguinte hierarquia: 1 - Os constantes do Plano Oficial de Contabilidade; 2 - Os constantes das Directrizes Contabilísticas; 3 - Os divulgados nas normas internacionais de contabilidade emitidas pelo IASC. Embora não possam ser consideradas de aplicação generalizada, as respostas interpretativas dadas pela CNC são válidas para a entidade e para a situação concreta. DC 18 (Versão revista – 2005) IV - Princípios contabilísticos geralmente aceites no normativo contabilístico nacional 10 - Os profissionais da contabilidade e os membros da comunidade económica têm vindo a reconhecer a necessidade da existência de princípios, normas e procedimentos que sejam de aplicação generalizada, apesar dos debates e críticas que suscitarem. 11 - Se bem que a CNC atenda ao vasto espectro dos organismos nela representados, baseia a normalização em pesquisa fundamentada e numa perspectiva conceptual sustentada na realidade económica. Os esforços para estabelecer essa estrutura conceptual, que actue como orientação geral, conduzem à adopção de um corpo comum de princípios, normas e procedimentos entendidos como os princípios contabilísticos geralmente aceites no normativo contabilístico nacional. 12 - A expressão "geralmente aceites" significa que um organismo contabilístico normalizador, com autoridade e de larga representatividade, estabeleceu um princípio contabilístico numa dada área ou aceitou como apropriado determinado procedimento ou prática, atendendo à sua aplicação generalizada e ao seu enquadramento na estrutura conceptual e num dado ambiente normativo. 13 - Assim, a CNC, ao privilegiar uma perspectiva conceptual de substância económica para o relato financeiro, considera que a adopção dos princípios contabilísticos geralmente aceites no normativo contabilístico nacional se deve subordinar, em primeiro lugar, ao POC e às directrizes contabilísticas e respectivas interpretações técnicas, e, supletivamente, pela ordem indicada, às: 1.º Normas Internacionais de Contabilidade, adoptadas ao abrigo do Regulamento n.º 1606/2002, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 19 de Julho; 2.º Normas Internacionais de Contabilidade (IAS) e Normas Internacionais de Relato Financeiro (IFRS), emitidas pelo IASB, e respectivas interpretações SICIFRIC. 14 - Embora não possam ser consideradas de aplicação generalizada, as respostas interpretativas dadas pela CNC são válidas para a entidade e para a situação concreta. Fonte: Elaboração própria. 32 Joaquim Fernando da Cunha Guimarães / REVISOR OFICIAL DE CONTAS CONTABILIDADE De notar que a alteração refere-se apenas ao item 13 (DC 18 – revisão de 2005), no que tange à hierarquia da aplicação dos PCGA de acordo com as mencionadas normas contabilísticas nacionais e internacionais. Realce-se que, já antes da DC 18, a DC 16 estabelecia uma relação entre a IVA e os PCGA nos seguintes termos (item 1.1): “1.1. Com o objectivo de obter uma imagem verdadeira e apropriada do activo, do passivo e dos resultados das operações da empresa, os registos devem basear-se em princípios contabilísticos geralmente aceites, designadamente o do custo histórico, quer a escudos nominais, quer a escudos constantes.”. Esta disposição poderá induzir que a expressão PCGA abrange exclusivamente os PCGA, exemplificando o “Do custo histórico”, o que, como de seguida, veremos poderá considerar-se uma análise limitada do conceito. 5. SNC É normalmente assumido que com o SNC se registou uma melhoria significativa dos aspetos concetuais da contabilidade, traduzida, essencialmente, pela inclusão de uma “Estrutura Concetual”, passese o pleonasmo, devidamente estruturada/sistematizada. Não restam quaisquer dúvidas que uma boa prática deve basearse numa boa teoria, e vice-versa, razão pelo qual é fundamental que todo o “edifício normativo” do SNC esteja assente numa sólida estrutura concetual. Aliás, já o poeta, e auxiliar de empregado de escritório “guarda-livros”, Fernando Pessoa, sublinhou em 192610: “Toda a teoria deve ser feita para poder ser posta em prática, e toda a prática deve obedecer a uma teoria. Só os espíritos superficiais desligam a teoria da prática, não olhando a que a teoria não é senão uma teoria da prática, e a prática não é senão a prática de uma teoria...”. 33 CONTABILIDADE Também é nosso hábito sublinhar, que cada vez mais resolvemos questões práticas com recurso à teoria e aos conceitos. No que concerne aos princípios contabilísticos, a principal alteração concetual do SNC relativamente ao POC/89 refere-se à eliminação da expressão “princípios contabilísticos”, que foram “convertidos” em pressupostos subjacentes (§§ 22 e 23 da Estrutura Concetual), em caraterísticas qualitativas (§§ 22 a 46 da Estrutura Concetual) ou em bases de mensuração (custo histórico) como resumimos no ESQUEMA N.º 2 seguinte: ESQUEMA N.º 2 Princípios Contabilísticos (POC vs. SNC) Relativamente à IVA, O SNC prevê (§ 46 da Estrutura Concetual): “46 - As demonstrações financeiras são frequentemente descritas como mostrando uma imagem verdadeira e apropriada de, ou como apresentando apropriadamente, a posição financeira, o desempenho e as alterações na posição financeira de uma entidade. Se bem que esta Estrutura Conceptual não trate directamente tais conceitos, a aplicação das principais características qualitativas e das normas contabilísticas apropriadas resulta normalmente em demonstrações financeiras que transmitem o que é geralmente entendido como uma imagem verdadeira e apropriada de, ou como apresentando razoavelmente, tal informação.”. Podemos inferir que, de uma forma geral, a IVA do SNC é mais elucidativa e concetual que a do POC/89, o que é compreensível pela mencionada melhoria verificada com a estrutura concetual no SNC. No ESQUEMA N.º 3 seguinte resumimos aquele parágrafo: ESQUEMA N.º 3 A IVA no SNC CARACTERÍSTICAS QUALITATIVAS NORMAS CONTABILÍSTICAS ADEQUADAS IVA - DA POSIÇÃO FINANCEIRA - DO RESULTADO DAS OPERAÇÕES Fonte: Elaboração própria. Se compararmos este esquema com o ESQUEMA N.º 1 constatamos que se deixou de fazer referência a “conceitos” e a “princípios”. Ainda no que diz respeito aos PCGA, registamos os seguintes factos: - A demonstração financeira do Anexo prevê na nota 2.4, a expressão “PCGA anteriores” (referência ao POC/89), não fazendo nenhuma referência expressa a “PCGA atuais”, i.e., no âmbito do SNC; - O item 5.4. da NCRF-PE prevê: “5.4 – As divulgações no final do primeiro exercício após transição, devem incluir: a) Uma explicação acerca da forma como a transição dos anteriores princípios contabilísticos geralmente aceites para a NCRF-PE, afectou a sua posição financeira e o seu desempenho financeiro relatados”. * Incluído na caraterística da “Comparabilidade”. **A Estrutura Conceptual do SNC prevê também outras caraterísticas: compreensibilidade, relevância, fiabilidade, representação fidedigna, neutralidade e plenitude. - Nas NCRF define-se “políticas contabilísticas: são os princípios, bases, convenções, regras e práticas específicas aplicados por uma entidade na preparação e apresentação de demonstrações financeiras.”. Fonte: Elaboração própria. Como podemos verificar, o princípio “Do custo histórico” não é enunciado nem como pressuposto subjacente nem como característica qualitativa, sendo uma base de mensuração §§ 97 a 99 da Estrutura Concetual, nomeadamente quando se utiliza o método do custo. 34 6. Uma Análise Mais Ampla dos “Pcga” Embora, como vimos nos itens anteriores, os PCGA estejam íntima e essencialmente ligados aos denominados princípios contabilísticos (POC/77 e POC/89), e, com o SNC, aos pressupostos subjacentes e Joaquim Fernando da Cunha Guimarães / REVISOR OFICIAL DE CONTAS CONTABILIDADE às caraterísticas qualitativas, os mesmos podem (ou devem) ser interpretados com uma maior amplitude quando, nomeadamente, se alude aos referenciais contabilísticos, como nos casos dos USGAAP e dos UK-GAAP. De notar que nesta divisão o Professor também incluiu os métodos de custeio das saídas no capítulo dos princípios contabilísticos. Neste contexto, parece-nos que a referência aos PCGA poderá ser interpretada como um “referencial genérico” subjacente ao modelo contabilístico utilizado, embora no caso português não nos pareça muito curial referir a expressão “PT-PCGA” ou “UE-PCGA”11. 7. Conclusões Leonor Fernandes Ferreira12 referiu: “Os GAAP são um conjunto de conceitos relacionados entre si que definem o âmbito, a natureza, o objecto, e a finalidade do relato financeiro. A existência de GAAP justifica-se como forma de reduzir práticas inconsistentes, delimitar interferência política, possibilita melhor compreensão das exigências de relato financeiro, torna-se mais simples a comunicação entre os utilizadores da informação financeira. Os princípios contabilísticos podem entender-se como um guia para operacionalizar a escolha entre as alternativas que conduzem à melhor situação possível perante um objectivo. Podem ver-se como uma defesa contra a interferência política na neutralidade dos relatórios financeiros (Solomom). Mas podemos também admitir que os GAAP se baseiam em interesses profissionais de certos grupos, reflectindo talvez a política do grupo dominante. No presente artigo apenas pretendemos desenvolver alguns aspetos concetuais dos dois modelos contabilísticos em confronto (POC e SNC). O CCI foi o impulsionador dos princípios contabilísticos, ao prever (art.º 22.º) os denominados “sãos princípios de contabilidade”. A expressão “PCGA” abrange, de uma forma geral, os princípios contabilísticos previstos nos dois POC (POC/77 e POC/89), que, com o SNC, passaram a ser identificados como “pressupostos subjacentes” ou como “caraterísticas qualitativas”. Os princípios contabilísticos (POC/77 e POC/89) e os pressupostos subjacentes/caraterísticas qualitativas (SNC) constituem uma componente muito importante da estrutura concetual e, em particular, da IVA, i.e., a sua correta aplicação conduz à IVA da entidade. No entanto, os PCGA podem ser analisados numa perspetiva mais ampla do que a dos próprios princípios contabilísticos, nomeadamente quando se pretende fazer alusão a um referencial contabilístico internacional como nos casos dos US-GAAP e dos UK-GAAP. (redigido conforme o novo acordo ortográfico) São bases comummente seguidas ou em que acreditam e com aceitação generalizada um grupo profissional. Podem basearse em uso, costumes, experiência, razão. Podemos encará-los como convenções, regras e procedimentos necessários para definir práticas em determinado contexto e tempo. São um guia para a preparação do relato financeiro e para a escolha contabilística.”. No mesmo contexto, e como já referimos, Rogério Fernandes Ferreira, dedicou na sua tese de doutoramento atrás mencionada um capítulo (IV) os princípios contabilísticos tendo o dividido da seguinte forma: 1. Introdução 1.1. Conceitos básicos 1.1.1. Expressão monetária 1.1.2. A empresa como entidade própria 1.1.3. Continuidade da empresa 1.1.4. Relevação ao custo histórico (ou a partir do valor de aquisição) 1.2. Convenções contabilísticas 1.2.1. Uniformidade 1.2.2. Prudência 1.2.3. Relevância 2. Princípios, convenções, critérios (de valorimetria) e métodos (de custeio) prescritos no POC 2.1. Princípios contabilísticos adoptados13 2.2. Critérios e métodos específicos14 (de valorimetria) no POC 3. Reflexões e observações finais - Princípio da especialização dos exercícios - Princípio da atribuição funcional do lucro - Princípio da realização do lucro - Princípio (convenção) do ajustamento monetário - Princípio contabilísticos da 4.ª Directiva da CEE. 1 Sob o título “Normalização Contabilística”, apresentada em 1983 e publicada em livro no ano seguinte, pela editora Livraria Arnado, Lda. A frase corresponde ao título do capítulo IV da tese. 2 Os GAAP mais vulgarmente referidos na literatura contabilística são os dos Estados Unidos da América (USA-GAAP) e os do Reino Unido (UK-GAAP). 3 Em especial o intitulado “História da Normalização Contabilística em Portugal”, publicado no nosso livro “Estudos sobre a Normalização Contabilística em Portugal”, ed. Vida Económica, Maio de 2011, pp. 11-62 e disponível para download no nosso Portal INFOCONTAB nos menus “Actividades Pessoais/Artigos (Download)/Por Título/N.º 294” e “Normalização Contabilística/Sistema de Normalização Contabilística”. 4 Ob. cit. p. 59. 5 O capítulo da “Valorimetria” incluía também o item “2 – Critérios e métodos específicos”, definidos para as contas/rubricas do ativo. 6 Sobre a IVA elaborámos os seguintes artigos: O TOC perante a “Imagem Verdadeira e Apropriada”, publicado na revista Eurocontas n.º 51, de Julho de 1999, pp. 38-39 e no Semanário Económico n.º 658, de Agosto de 1999, p. 12 e disponível para download no Portal INFOCONTAB no menu “Atividades Pessoais/Artigos (Download)/Por Título/N.º 36”. A "IVA" na Contabilidade, publicado na Revista de Contabilidade e Finanças n.º 80, de Janeiro/Março de 2005, pp. 5-6 e disponível para download no Portal INFOCONTAB no menu “Atividades Pessoais/Artigos (Download)/Por Título/N.º 138”. A “IVA” não é a mulher do “IVA”, disponível para download no Portal INFOCONTAB no menu “Atividades Pessoais/Artigos (Download)/Por Título/N.º 298”. 7 Na redação inicial referia-se “escudos nominais”, sendo que a alteração para “unidades monetárias” ocorreu nos termos do Decreto-Lei n.º 35/2005, de 17 de Fevereiro. 8 No nosso artigo sob o título “A “Substância Sobre a Forma” – Do POC ao SNC”, publicado na revista Fiscal n.º 5, de Julho/Agosto de 2010, pp. 13-8 e disponível para download no Portal INFOCONTAB no menu “Atividades Pessoais/Artigos (Download)/Por Título/N.º 301”, apresentámos alguns dos principais aspetos conceituais deste princípio. Na vigência do POC/89 foram publicadas duas Diretrizes Contabilísticas (n.os 10 e 25) sobre a locação financeira. 9 O POC/89 previa no capítulo “3 – Características Qualitativas” três caraterísticas: relevância, fiabilidade e comparabilidade. 10 Em artigo sob o título “Palavras Iniciais”, publicado na Revista de Comércio e Contabilidade n.º 1, 1926, p. 5. 11 A abreviatura “PT” refere-se a “Portugal” e a abreviatura “UE” refere-se a “União Europeia”. 12 Em e-mail de 29 de Junho de 2011, em resposta a um nosso pedido de comentário sobre o tema. 13 O Professor elenca e comenta os princípios contabilísticos do POC/77. 14 Desenvolve os critérios de valorimetria das disponibilidades, créditos e débitos, existências, imobilizações financeiras, imobilizações corpóreas e imobilizações incorpóreas. 35 ALGUNS ASPECTOS DA APLICAÇÃO DO MÉTODO DA EQUIVALÊNCIA PATRIMONIAL - II 36 José Rodrigues de Jesus Susana Rodrigues de Jesus 1. Na sequência do trabalho publicado, com análogo título, no recente número 54, Julho-Setembro, da Revista Revisores _ Auditores, o presente artigo tem por objecto o tratamento contabilístico das designadas “transacções ascendentes “ e “transacções descendentes” em relação com a aplicação do método da equivalência patrimonial e no que se refere a empresas participantes e suas subsidiárias e associadas. 2. No anterior artigo observa-se, de passagem e sem significado para a substancial proximidade entre a consolidação e o MEP nas Normas de Contabilidade e Relato Financeiro (NCRF), uma diferença no tratamento dos resultados de transacções que ficam incluídos nos “stocks”: enquanto no parágrafo 15 da NCRF 15 são totalmente excluídos (como na consolidação), no parágrafo 46 da NCRF 13, não se opta pela exclusão total daqueles resultados. O presente trabalho é dedicado a esta questão: a mensuração dos resultados dos exercícios abrangidos pelas operações, por efeito da periodização. REVISORES OFICIAIS DE CONTAS 3. Nas Normas Internacionais de Relato Financeiro (NIRF) o método da equivalência patrimonial (MEP) não é apresentado a propósito da contabilização das subsidiárias. De facto, da NIC 27 – “Demonstrações Financeiras Consolidadas e Separadas” apenas constam os procedimentos da consolidação (junção da empresa-mãe e das subsidiárias) e do modo de apresentação nas contas separadas dos investimentos em subsidiárias, entidades conjuntamente controladas e associadas (cf. números 1 e 3). Em conformidade com aquela NIC, na preparação das demonstrações financeiras separadas os investimentos em subsidiárias e em associadas são registados pelo custo ou de acordo com a NIC 39 – “Instrumentos Financeiros – Reconhecimento e Mensuração” (cf. número 38), não se aplicando, pois, em qualquer caso, o MEP. Ainda em conformidade com a NIC 27, o tratamento nas demonstrações financeiras consolidadas das participações em associadas é efectuado de acordo com a NIC 28 – “Investimentos em Associadas” (cf. número 5 da NIC 27, sendo aplicado, relativamente às associadas, o MEP). Aproveita-se a oportunidade para estudar o modo de registo daqueles resultados. Nos casos em que uma empresa detém apenas participações em associadas, é aplicável a NIC 28, excepto em algumas circunstâncias (cf. números 1 e 5). A exposição será apoiada por exemplos e servida pela apresentação de alguns quadros. Parece, deste modo, poder concluir-se que, no âmbito das NIRF, se uma empresa tiver a característica de empresa-mãe tem 37 CONTABILIDADE demonstrações financeiras consolidadas, nas quais as associadas são tratadas pelo MEP, e se uma empresa não for uma empresamãe e tiver participações em associadas aplica o MEP relativamente a estas. Tanto num caso como no outro pode haver demonstrações financeiras separadas, onde não é aplicado o MEP – a característica destas demonstrações é, exactamente, a de não conterem a aplicação do MEP. No domínio das NCRF, o processo é análogo no que respeita às contas consolidadas (cf. NCRF 15 – “Investimentos em Subsidiárias e Consolidação”), mas acresce o facto de o próprio MEP ser usado nas demonstrações financeiras chamadas individuais (também designadas, por vezes, estatutárias) - inclusivamente no que respeita ao registo contabilístico das subsidiárias, neste caso complementado nos termos que vão ser explanados (cf. números 8 e, por remissão deste, 14 e 15). No caso do Quadro I, a empresa A é titular da totalidade das acções representativas do capital social da empresa B (não havendo, pois, interesses que não controlam). No ano X, A debita juros a B no montante de 1 000 u.m., não sendo estes juros capitalizados em B (não são, por exemplo, incluídos nos custos dos inventários ou dos activos fixos tangíveis). O resultado consolidado é nulo (o rendimento compensa-se integralmente com o gasto) e é também nulo o resultado com a aplicação do MEP, já que ao rendimento de 1 000 u.m. das contas de A se contrapõe, nas mesmas contas, o resultado negativo do mesmo montante do MEP, correspondente ao prejuízo da subsidiária. 4. Nos termos da NIC 27 e da NCRF 15, os procedimentos de consolidação determinam que nas transacções intragrupo os rendimentos e gastos devem ser eliminados por inteiro, incluindo os lucros e prejuízos que sejam reconhecidos nos activos (cf. números 20 e 21 da NIC 27 e 14 e 15 da NCRF 15). Os rendimentos e gastos que tenham sido reconhecidos nos activos e que tenham sido inicialmente eliminados são, naturalmente, reconhecidos como resultados aquando da saída daqueles activos (por exemplo, por venda ou depreciação). Para simplificar a leitura, usar-se-á no texto a expressão “operações com “stocks”” ou idêntica para significar as operações em que “os lucros ou prejuízos sejam reconhecidos nos activos” mencionados nas NIC 27 e NCRF 15. Sem entrar em pormenores, deve anotar-se que a hipótese de perdas nas vendas da participante à participada de bens que ficam em “stock” terá ou poderá ter tratamento diferente do que é dado no caso de ganhos (em termos simples: se a vendedora-participante aliena com prejuízo, este deve ser imediatamente assumido). Neste trabalho, por comodidade, apenas de estuda a questão na vertente de ganhos nas transacções que determinam “stocks”. Ver-se-á que, no âmbito das NCRF, os procedimentos adoptados na elaboração das demonstrações financeiras individuais conduzem a um resultado que é idêntico ao resultado apropriado pelos sócios da empresa-mãe nas contas consolidadas. 5. Da eliminação por inteiro dos rendimentos e gastos que não implicam “stocks” com reconhecimento de lucros ou prejuízos, decorre que nos “interesses que não controlam” (designação que, nas NIRF, substituiu a de “interesses minoritários”) é imediatamente reconhecida a parcela dos resultados correspondente àqueles rendimentos e gastos, naturalmente na proporção da participação, o mesmo acontecendo no resultado reconhecido para os efeitos dos titulares do capital da empresa-mãe. Vejam-se os exemplos dos Quadro I e II, apresentados ao diante, sendo o primeiro apresentado por mera ordem metodológica. 38 O exemplo do Quadro II é em tudo análogo ao anterior, excepto quanto ao facto de, agora, A participar no capital social de B em apenas 70%. Nas contas consolidadas compensam-se os rendimentos e os gastos, mas, no seio do resultado agregado nulo, emerge um resultado negativo atribuído aos interesses que não controlam – interesses minoritários (IQNC-IM) de 300 u.m. e um resultado positivo do mesmo montante de que são titulares os sócios de A (na prática, os sócios de A emprestaram 30% do montante total a B e recebem dos IQNC-IM de B 30% dos juros). Nas contas individuais, segundo o MEP, a situação é análoga – há um resultado de 300 u.m. em A, determinado pela diferença entre o rendimento de 1 000 u.m. e o resultado negativo de 700 u.m. advindo pelo MEP (70% do resultado negativo, de 1 000 u.m., nas contas de B). José Rodrigues de Jesus / Susana Rodrigues de Jesus / REVISORES OFICIAIS DE CONTAS CONTABILIDADE A expressão de acordo com o MEP é idêntica – ainda neste caso de operações sem “stocks” - nas contas consolidadas no que respeita às participações em associadas e nas contas individuais, quer quanto a subsidiárias como a associadas. 6. Passemos, agora, às situações em que há “stocks”, que podem ser formados na participada, em consequência de transacções descendentes, ou na participante, por efeito de transacções ascendentes. Anote-se, antes de mais, um pormenor terminológico. Quando as NIRF e as NCRF definem o MEP, referem-se aos resultados da participada que são incorporados pela participante (cf., por exemplo, a definição inserida no número 2 da NIC 28). Ora, nas transacções descendentes que determinam a formação de “stocks” na participada não há, aquando do reconhecimento do “stock”, a formação de resultados nesta (não podendo, assim, haver qualquer resultado da participada que a participante possa colher), pelo que não parece integralmente correcto referir, a este propósito, a aplicação do MEP. Pelo menos por mera comodidade de apresentação, usar-se-á a expressão MEP para abranger também os casos das transacções descendentes. Há duas questões centrais no uso do MEP na hipótese de existência de “stocks” – a quantificação e a expressão dos resultados e das participações financeiras. É importante referir a diferença de tratamento quando a relação é com uma subsidiária (eliminação por inteiro do resultado, tanto nas 39 CONTABILIDADE contas consolidadas como nas contas individuais segundo o MEP) ou com uma associada (eliminação na proporção da participação). Na circunstância da relação de grupo, a NCRF 15 determina que, nas contas individuais, se aplique o MEP e, além disso, se proceda à cativação dos resultados não realizados no grupo e que permanecem em “stock”: “8. Nas demonstrações financeiras individuais de uma empresa-mãe, a valorização dos investimentos em subsidiárias deve ser efectuada de acordo com o método de equivalência patrimonial, aplicando-se, ainda, o disposto nos parágrafos 14 e 15”. O segundo período do número 15 daquela NCRF – “Os resultados provenientes de transacções intragrupo que sejam reconhecidos nos activos, tais como inventários e activos fixos, são eliminados por inteiro” – quer exactamente significar que os resultados da participante apenas são nesta realizados após a venda pela participada. A expressão, no número 8 da norma, “aplicando-se, ainda” implica que não se usa apenas o MEP, mas este e o complemento do número 15. Pretendeu-se, afinal, com esta disposição que, na participante, os resultados nas contas individuais fossem os mesmos que figuram nas contas consolidadas. De mencionar, também, que, nos citados números 14 e 15, quando referidos às contas individuais, a referência à eliminação, de saldos, transacções, rendimentos e ganhos e gastos e perdas intragrupo só pode ser entendida, rigorosamente, quando se tenha querido, na base, adoptar a mesma metodologia da consolidação de contas – não pretende significar que, nas contas individuais, se façam aquelas eliminações (o que não tem sentido), mas fica claro que se pretende, no fim, ter o resultado das contas individuais idêntico ao das contas consolidadas. A NIC 28 especifica, naturalmente, no seu número 20, que “muitos dos procedimentos apropriados para a aplicação do método da equivalência patrimonial são semelhantes aos procedimentos de consolidação”, o que é repetido no número 57 da NCRF 13. Os resultados provenientes das transacções ascendentes e descendentes são, porém, agora, tratados de modo diferente do que consta relativamente à consolidação. Na verdade, é estabelecido no número 22 da NIC 28 e no número 46 da NCRF 13 que, na relação com as associadas, os resultados provenientes daquelas transacções são reconhecidos nas contas da participante “somente na medida em que correspondam aos interesses de outros investidores na associada, não relacionados com o investidor” (redacção da NIC 28) ou, “apenas até ao ponto dos interesses não relacionados da investidora na associada” (texto da NCRF 13). Em ambas aquelas normas se completa afirmando que a parte da participada nos resultados da associada resultante daquelas transacções é eliminada. Não existe, assim, qualquer diferença no tratamento das associadas nas contas consolidadas e nas contas individuais – sempre se aplica o MEP e não há diferenças na sua aplicação. Como se afirmou, no caso das transacções sem “stocks” o resultado, pelo simples jogo das contas, é o correspondente à participação de 40 terceiros na participada – isso mesmo foi evidenciado logo nos exemplos iniciais: por exemplo, a conjugação dos juros debitados por uma empresa à outra (e registados como rendimentos e gastos de juros nas respectivas contas) com o resultado segundo o MEP (e contabilizado como tal na participante) implica que, finalmente, o resultado da participada seja o montante dos resultados (positivos ou negativos) inerentes à transacção com os terceiros. Nos casos das vendas com “Stock” também acontece isso mesmo, mas de modo diferido – o resultado na participante apenas é reconhecido aquando da venda dos inventários, ou, no caso de outros activos, pela venda ou amortização. De sublinhar ainda uma gradação das dificuldades na aplicação do MEP quando se trata de uma subsidiária ou de uma associada. No caso da subsidiária, há o domínio da participada e, consequentemente, o pressuposto da minuciosa informação requerida (para a consolidação e para o MEP). Na hipótese da associada o conhecimento não é, eventualmente, tão fluído, havendo, pois, limitações apreciáveis no acesso à informação que, certamente, careceria de indiscutível fiabilidade (por exemplo, conhecimento da existência de “stocks” na participada, nas transacções descendentes, e das margens de lucro na participada, nas transacções ascendentes). Nos números seguintes procurar-se-á estudar, com quatro exemplos, este tema. 7. Comecemos por referir o tratamento das associadas, relativamente às quais podemos encontrar, com actualidade prática, informações, sugestões ou recomendações nos livros da Ernst & Young, KPMG e Deloitte de que nos socorremos: Ernst & Young, International GAAP 2011, General Accepted Accounting Practice under International Financial Reporting Standards, Willey, 2011, páginas 685 e seguintes, KPMG, Insights into IFRS, KPMG´s practical guide to International Financial Reporting Standards, 8th edition, 2011/2012, Sweet & Maxwell, 2011, páginas 391 e seguintes, e Deloitte, iGAP 2011, A guide to IFRS reporting, Lexis Nexis, 2010, páginas 2602 e seguintes. Em todos estes textos é assinalado que a norma internacional não fornece uma regra ou a indicação de modo de registo das operações, no quadro do MEP. 8. No que refere às transacções descendentes aqueles textos fazem reflectir a cativação (ou suspensão, ou adiamento, ou diferimento) dos resultados (na parte proporcional) nas contas de vendas e de custo das vendas (Ernst & Young e KPMG), apenas na conta de custo das vendas (Ernst & Young), ou na conta de vendas (KPMG), sendo sempre aqueles resultados registados, em contrapartida, na conta do activo da participação financeira. Será esta a melhor solução, designadamente no nosso contexto? Será útil, especialmente, alterar os valores das contas de vendas e custo das vendas? Ter-se-á reduzido o valor da participação pela venda de bens que ficaram em “stock” na participada? José Rodrigues de Jesus / Susana Rodrigues de Jesus / REVISORES OFICIAIS DE CONTAS CONTABILIDADE Ou será preferível deixar que os registos nas contas de vendas e de custos das vendas sigam o seu curso normal e que, à parte, se cative o resultado não realizado das vendas como um proveito diferido (ou suspenso ou cativo), debitando conta autónoma apropriada de resultados? Propendemos a crer que este último procedimento será o mais apropriado. Desta forma, não se perturbariam os valores das contas de vendas e de custos das vendas, com as inerentes vantagens de controlo corrente e de compatibilidade com os montantes fiscalmente relevantes. apresentados na demonstração da posição financeira quer tomando o subsídio como rendimento diferido, …” (cf. número 24 da NIC 20). Se for entendido que não pode ser um passivo o ganho diferido das vendas descendentes, parece que a solução deva ser a de subtrair tal ganho na conta do activo da participação financeira – salientando, todavia, que existe alguma incongruência, uma vez que a participação não sofreu qualquer perda. Deve assinalar-se que nesta solução pode acontecer que a quantia do resultado positivo suspenso seja superior ao valor contabilístico da participação, o que determina considerações adicionais, como é descrito nas citadas publicações e que aqui nos dispensamos de transcrever. O que dizer do uso da conta das participações financeiras como contrapartida do débito da conta autónoma de resultados? Refira-se, ainda, que a utilização de uma conta do passivo para o ganho diferido pode, em alguns casos, influenciar de forma material os rácios da situação financeira. Esta questão envolve a concepção do rendimento ou ganho diferido na estrutura do balanço. Em qualquer caso, terá de ser efectuada a necessária divulgação, que deverá mencionar todas as quantias relevantes (vendas, custo das vendas, inventários, resultados). É certo que no SNC existem as contas “28 – Diferimentos”, com as subcontas “281 – Gastos a reconhecer” e “282 – Rendimentos a reconhecer”, que conduzem às contas de “Diferimentos” que se encontram no balanço, tendo aquela conta geral a anotação de que “compreende os gastos e os rendimentos que devam ser reconhecidos nos períodos seguintes”. Constituirá, porém, o rendimento diferido por efeito da venda descendente descrita um passivo (cuja característica essencial é a de que a empresa tenha uma obrigação presente (cf. Estrutura Conceptual, número 59, do SNC)? De notar que, tanto nas NIRF como nas NCRF podemos encontrar no passivo elementos que, se bem se pensa, não constituem obrigações presentes. Por exemplo, os ganhos diferidos que ficam no passivo nas transacções de venda seguida de locação, são diferidos e amortizados durante o prazo da locação (número 59 da NIC 17 e número 52 da NCRF 9). Outro exemplo é o da consideração como passivo dos subsídios recebidos relacionados com activos, que nas NIRF “devem ser 9. Quanto às transacções ascendentes, nas citadas publicações recomenda-se que seja deduzido ao valor dos inventários (Ernst & Young e Deloitte) ou ao valor dos inventários ou ao da participação financeira (KPMG) a parte proporcional (à participação) do lucro registado na participada, por contrapartida de igual redução do lucro obtido directamente segundo o MEP, na prática neutralizando esse mesmo lucro. Pode haver, pelo menos, três soluções: - aumentar o valor da participação financeira por contrapartida de rendimentos de MEP e, simultaneamente, reduzir os inventários por débito desta mesma conta ou de uma conta específica de gastos que neutralize o rendimento de MEP (a primeira hipótese seria idêntica a simplesmente aumentar a participação financeira e reduzir os inventários); - aumentar o valor da participação financeira por contrapartida de rendimentos diferidos; - não efectuar qualquer registo. 41 CONTABILIDADE Pensamos que será preferível nada registar na conta de inventários (e na conta de custo das vendas que é subsequentemente movimentada aquando das posteriores vendas), deixando que aquela, pelas razões de controlo e fiscais já invocadas, mantenha o trato corrente. Não afectar, também, a conta da participação financeira parece natural: se, em conformidade com o MEP, a participante não reconhece o lucro da venda que a participada lhe fez, também o valor da participação financeira não deve ser aumentado por tal montante. É certo que, deste modo, o valor da participação financeira não fica em consonância com a parcela do capital próprio da participada registada após a aquisição da participação – mas, julgamos, a necessária divulgação, que, em qualquer caso terá de haver, completará um melhor entendimento das contas na hipótese preferida. Deve, igualmente, referir-se que, no contexto do MEP, se a participada distribuir à participante o lucro que esta ainda não considerou reconhecido, o que estará a acontecer, na prática, é, do ponto de vista da participante, uma distribuição de resultados da participada préexistentes e, no limite, do capital da participada pré-existente à própria aquisição. O registo numa conta de rendimentos diferidos tem os inconvenientes conceptuais e práticos já analisados. 10. Exposta, assim, a questão relativamente às associadas, passemos ao caso das subsidiárias. Como este tema não é tratado nas NIRF, apenas podemos admitir que seria esperado dos autores citados tratamento idêntico ao mencionado quanto às associadas – sendo, também, igual o modo de expressão para que nos inclinamos a propósito das mesmas associadas. Há, porém, na relação com as subsidiárias uma questão nova – nas NCRF os resultados são eliminados por inteiro na aplicação do MEP, tal como nas contas consolidadas. Assim, nas transacções descendentes é cativado o inteiro resultado da venda, ainda que a participante não seja titular da totalidade do capital da participada e nas transacções ascendentes a participante não reconhece qualquer parcela do resultado da venda da participante. Em suma, o resultado nas contas individuais da participante é igual ao resultado apurado na consolidação – foi isto mesmo que se quis na NCRF 15, mediante os seus números 8, 14 e 15. 11. Os exemplos dos quadros seguintes procuram ilustrar as soluções que sugerimos, usando-se, para as contas não convencionais, designações cuja letra esteja próxima do objecto a retratar (e que, obviamente, teriam de ser simplificadas, no caso de adopção destas sugestões de registo). Independentemente do acerto da solução, usa-se, nestes exemplos, uma conta do passivo para albergar os rendimentos ou ganhos diferidos. Comecemos pelo exemplo do Quadro III, em que A detém 70% do capital de B e no ano X1 vende mercadorias a B, por 2 000 u.m. e 42 com o CMV de 1600 u.m., tendo B conservado no termo daquele ano a totalidade das mercadorias adquiridas a A e vendido integralmente as mesmas em X2. O resultado consolidado no ano X1 é nulo, mesmo sendo a participação apenas de 70%, pois as mercadorias não chegaram, nem parcialmente, a sair do grupo e, assim, não é possível reconhecer qualquer resultado agregado. Também nas contas individuais de A do ano X1 o resultado é nulo, podendo acrescentar-se que é também nulo o resultado em B, que limitou a adquirir as mercadorias. O resultado suspenso, de 400 u.m., fica registado a débito na conta de resultados “Gastos e perdas por diferimento de ganhos com subsidiárias diferidos” (que compensa os valores das contas de vendas e de custo das vendas) por contrapartida do registo a crédito na conta de rendimentos diferidos “Diferimentos-ganhos e perdas em operações com subsidiárias diferidos”. José Rodrigues de Jesus / Susana Rodrigues de Jesus / REVISORES OFICIAIS DE CONTAS CONTABILIDADE Em X2, o resultado é reconhecido nas contas de A, tanto consolidadas como individuais – nestas por reversão, digamos assim, dos registos da suspensão do ano anterior: daí um registo de 400 u.m. a crédito da conta “Diferimentos - ganhos e perdas em operações com subsidiárias diferidos” e outro a crédito, do mesmo valor, numa conta de rendimentos com a designação, por exemplo, de “Reversão de gastos e perdas por diferimento de ganhos em operações com subsidiárias”. 12. A reversão do diferimento ou reconhecimento final do resultado em X2 expressa-se de forma análoga à indicada no número anterior. 13. Este número e o seguinte têm por objecto transacções ascendentes – para não alongar o texto, supõe-se, no primeiro exemplo a mesma relação societária enunciada no número 11, mas em que a venda se realiza de B para A. O quadro V, seguinte, ilustra a expressão contabilística. Admitindo, agora, o mesmo exemplo do número anterior, mas usando uma participação de A em B de 20%, a expressão é em tudo idêntica, sendo o valor da suspensão apenas de 20% do resultado, como se expõe no quadro IV, seguinte. 43 CONTABILIDADE 14. Sendo, agora, a relação com uma associada e usando os dados do número 12, com a venda, porém, formulada de B para A, apresentase a solução no quadro VI seguinte. Em X2, quando as mercadorias são vendidas em A, na contabilidade desta é realizado o lucro suspenso de 80, debitando a conta do passivo “Diferimentos - ganhos e perdas em operações com associadas diferidos” por contrapartida de um crédito em Ganhos do MEP. 15. É tempo de terminar, sublinhando, a título de conclusão, a diversidade de situações nas relações entre participantes e participadas e o respectivo cruzamento com os métodos utilizados na elaboração das contas, tanto consolidadas como individuais. A alternativa, como de indicou, seria não registar o valor de 280 u.m. – nem no activo, nem no passivo. No ano X2, com a realização das vendas por A, o resultado de 280 torna-se reconhecido nas contas de A consolidadas e de A individuais segundo o MEP, por reversão ou realização do diferimento de 280 u.m. do ano anterior; nas contas consolidadas emerge, também, o valor de IM de 120 u.m. que não podia ser expresso no ano X1, dado que a transacção tinha sido completamente eliminada, tanto para os interesses de A como para os IQNC-IM, em B. Há uma observação evidente: o ganho total na venda em B (que está nos resultados de B) está no valor dos inventários em A - na prática ter-se-á efectuado uma reavaliação das mercadorias no interior do grupo. O modo como está resolvida a questão no Quadro V corresponde a assumir essa reavaliação na conta da Participação Financeira (debitando-a pelo ganho) e a creditar, pelo mesmo valor, uma conta do passivo de diferimentos – “Diferimentos - ganhos e perdas em operações com subsidiárias diferidos”. Como ficou assinalado, há outras soluções e não se pretende afirmar que esta seja preferível. 44 Aquela diversidade é, de resto, compatível com diferentes apresentações ou modos de expressar os resultados, merecendo particular estudo os casos em que, com ou sem IQNC-IM, existem ganhos incluídos nos activos fixos tangíveis e nos inventários. O Sistema de Normalização Contabilística não mostra as soluções práticas, designadamente com a atribuição de contas específicas para albergar as soluções dos diferentes problemas. Julga-se, aliás, conveniente que a CNC nem sequer venha a esmiuçar quaisquer soluções a estes propósitos. De facto, sendo muito diversas as situações e com diferentes graus de materialidade, é desejável que se deixe aos preparadores e auditores das contas a escolha do modo que de forma mais transparente e eficiente mostre a realidade. Em muitos casos o efectivo tratamento fino destes temas, sobretudo na relação com as associadas e em que não haja materialidade, apenas servirá para reduzir a compreensão das contas. O presente estudo não pretende, obviamente, ser mais do que um contributo para o estudo destas questões. São temas miúdos, com a particularidade de versarem, muitas vezes, quantias imateriais - isto não impede que os devamos ter presentes.