Doutrina e prática do jejum segundo a Bíblia – Parte 03

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a esses rudimentos fracos e pobres, aos quais de
novo quereis servir?
Estai pois firmes na liberdade com que Cristo
nos libertou, e não torneis a meter-vos debaixo do
jugo da servidão" (Gál. 4:9 e 5:1).
Cremos ter sido claros dentro do estudo desse capítulo, mas sabemos, outrossim, que muitas interrogações
estão sendo feitas em relação às práticas de jejuns que são
encontradas no Novo Testamento. Por isso, vamos passar,
em seguida, para a segunda parte do nosso estudo, que
será feita no Novo Testamento, examinando-se, por conseguinte, cada caso ali encontrado.
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SEGUNDA PARTE
DOUTRINA E PRÁTICA DO
JEJUM NO NOVO TESTAMENTO
CAPÍTULO VI
FASES DOUTRINÁRIAS NO
NOVO TESTAMENTO
Até agora, limitamo-nos a estudar o jejum dentro do
Velho Testamento, com exceção do último capítulo em
que usamos textos do Novo Testamento, porém com o
objetivo de discutir o ministério expiatório de Jesus
Cristo e n | o a doutrina do jejum. Pudemos assim constatar que o jejum, como prática religiosa, teve a sua instituição e vigência dentro do período do Velho Testamento, ou mais precisamente, dentro da "Dispensação da
Lei".
Todavia, não olvidamos a prática do jejum também
no Novo Testamento e, por isso, reservamos uma parte
neste livro para tratarmos do assunto, em que vamos examinar e discutir todos os casos de jejuns registrados nesta
parte da Bíblia Sagrada.
Sempre que fazemos um estudo de práticas doutrinárias no Novo Testamento, torna-se necessário estabelecermos algumas divisões na fase doutrinária neotestamentária, sem o que, encontraremos uma série de dificuldades
para entendermos o sentido e aplicação de uma determi- 36 -
nada doutrina ou prática, correndo até mesmo o perigo
de incidirmos em erros doutrinários.
Precisamos conceber, e isso é bastante claro, que a
história do cristianismo no períodd neotestamentário passou por algumas fases distintas, destacando-se principalmente três delas. E só quando localizamos as matérias
doutrinárias dentro dos contextos dessas fases é que teremos capacidade para entendermos e aplicarmos os ensinamentos e práticas das doutrinas cristãs.
Portanto, antes de entrarmos no estudo da prática do
jejum no Novo Testamento, vamos estabelecer essas divisões e assim prepararmo-nos convenientemente para o
estudo propriamente dito da matéria.
1. O Período do Ministério Terreno de Jesus
A primeira fase, ou período, é aquele compreendido
pelo ministério terreno de Jesus, que vai desde o seu nas* ' cimento até a sua morte na cruz.
Embora esta fase da história esteja registrada no
Novo Testamento, e não poderia ser de outra forma, ela
í;; pertence realmente ao Velho Testamento, isto é, à Disq .<:> pensação da Lei. O ministério da Dispensação da Lei não
^1 ^ terminou com o nascimento de Jesus Cristo e nem com as
0"*i t,' atividades do seu ministério terreno. Em outras palavras,
^ S i a Dispensação da Graça não foi implantada com o nasci~ v.: mento de Jesus. O final da Dispensação da Lei e o início
da Dispensação da Graça aconteceram quando da morte
e ressurreição de Jesus Cristo. Portanto, até o momento
quando Jesus deu o brado de vitória, dizendo: "Está consumado", tudo transcorreu sob a lei, embora em fase de
transição. Cristo nasceu e viveu sob a lei, não há dúvida,
e não podemos esquecer esse fato sempre que estudarmos
as práticas religiosas registradas nos primeiros quatro
livros do Novo Testamento.
Paulo disse: "Mas vindo a plenitude dos tempos. Deus enviou seu Filho, nascido de mulher,
nascido sob a lei" (Gál. 4:4).
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Observem a expressão; " . . . nascido sob a lei". Ou
seja, nascido embaixo da lei, sob o domínio da lei.
Jesus Cristo, expUcando a sua missão, declarou:
"Não cuideis que vim destruir a lei ou os profetas; não vim abrogar, mas cumprir" (Mat. 5:17).
O apóstolo Paulo, exaltando a pessoa de Jesus Cristo,
afirmou:
"E, achado em forma de homem, humiIhou-se a si mesmo, sendo obediente até à morte . . ." (Fil. 2:8).
Ao instituir a Ceia, Jesus ensinou: "Este cálice é o
Novo Testamento no meu sangue, que é derramado por
vós" (Luc. 22:20). Esta afirmação de Jesus deixa claro que
o Novo Testamento, a Dispensação da Graça, seria instituído com o seu sangue.
Jesus Cristo em todo o seu ministério terreno procurou andar e viver de acordo com os preceitos sagrados do
Velho Testamento, sem no entanto, é lógico, enveredarse pelos extremos das tradições religiosas da sua época,
sendo, por isso, taxado de transgressor da lei. Ele foi obediente a Deus e aos seus estatutos até a morte.
Assim é, que vamos encontrar Jesus observando as
festas cerimoniais do Velho Testamento, principalmente a
Páscoa, vamos encontrá-lo guardando o Sábado, no bom
sentido do termo, indo nas sinagogas e observando outros
preceitos da lei, bem como ensinando o povo sobre a
maneira certa de praticar os preceitos da lei, em contraposição à maneira errada dos fariseus e saduceus.
Também encontramos, neste período, homens e
mulheres, servos piedosos de Deus, praticando com sinceridade as obras da lei e sendo assim instruídos por Jesus
como seus seguidores.
2) O Batismo de Cornélio (At. 11:1-18): Lendo-se
este texto, observamos que Deus teve que falar de uma
maneira especial com Pedro, para que ele entendesse a
extensão da salvação aos gentios, pois do contrário, Cornélio não teria sido bãtizado. Sendo batizado, Pedro precisou com muito jeito explicar o acontecimento ao grupo
apostólico, para evitar que Cornélio não fosse aceito
como salvo. É que até aquela data, eles, os apóstolos,
ainda não tinham entendido que o Evangelho era extensivo a todo o mundo, inclusive aos gentios. Apesar de
terem estado tanto tempo com Jesus, aprendendo as doutrinas cristãs, e de ouvirem o seu mandado: "Ide por todo
o mundo e pregai o Evagelho a toda a criatura, quem crer
e for batizado será salvo", ainda entendiam que o Evangelho de Jesus Cristo era apenas para os judeus.
2. O Período Inicial das Igrejas Primitivas
O segundo período, é aquele compreendido pelos
prímeiros anos do cristianismo, começando com a
ascenção de Jesus. Não temos nos registros do Novo Testamento uma linha divisória nítida do seu término, mas
podemos constatar com clareza a existência desse
período.
Constatamos que os nossos irmãos cristãos, na fase
inicial da igreja primitiva, não tinham muita firmeza doutrinária. Isso é bastante admissível, quando consideramos
os fatos á luz das diversas circunstancias da época, tais
como a falta de uma literatura cristã, pois o Novo Testamento e nenhum outro livro ainda haviam sido escritos, e
as dificuldades de comunicação, tudo agravado ainda
mais com a falta de firmeza doutrinária do próprio grupo
apostólico e das intromissões de outros grupos religiosos
que começaram a surgir, principalmente os chamados
"judaizantes", que queriam fazer uma mistura de doutrinas cristãs com preceitos judaicos da lei.
Os fatos acima são deduzidos facilmente quando
fazemos um estudo cuidadoso dos primeiros capítulos de
Atos dos Apóstolos e de algumas das epístolas, principalmente as paulinas. Como exemplo, vamos observar alguns
fatos que destacamos dentre outros existentes:
1) A Primeira Comunidade Cristã (At. 2:44-47): Percebe-se, por este fato, que os crentes estavam sendo ensi-,
nados que Jesus iria voltar por aqueles dias, fruto de uma
má interpretação dos ensinos de Jesus Cristo sobre a sua
volta, e daí passaram a vender as suas propriedades e tudo
o que tinham, passando a viver em conjunto, orando,
comendo, estudando sobre as doutrinas e preparando-se,
dessa forma, para o reencontro com Cristo por aqueles
dias. Hoje praticamente ninguém mais defende uma
comunidade assim para os crentes, aqui na terra, mas fizeram isso no começo; está registrado no Novo Testamento.
É bíblico, poder-se-ia dizer.
4) Paulo e Pedro (Gál. 2:11-21): Nesse texto, Paulo
relata os problemas acontecidos em Antioquia, tendo
como principal personagem o apóstolo Pedro, com quem
Paulo diz ter discutido e resistido na cara, porque era
repreensível. No mesmo texto, Paulo cita outros judeus
que também estavam na mesma situação, incluindo Barnabé que, conforme se referiu, " . . . não andavam bem e
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3) Os Problemas com a Igreja de Antioquia (At.
15:1-34): Observamos que a Igreja de Antioquia estava
em problemas doutrinários. Uns ensinavam uma coisa,
sobre uma determinada doutrina, outros ensinavam outra
coisa, e ninguém sabia o que estava realmente certo.
Foram para Jerusalém, a fim de consultar o grupo apostólico e resolver o problema, ou problemas doutrinários,
todavia observamos que os apóstolos também não estavam muito aptos para dar a solução cabível ao impasse
criado, tendo havido até mesmo um certo desentendimento entre eles em relação ao caso. No versículo 7 está
registrado que houve uma "grande contenda" entre eles.
Precisou Pedro falar, depois Tiago e, então conseguiram
chegar a um acordo.
direitamente conforme a verdade do Evangelho . .
(Gál. 2:14).
5) O Problema da ressurreição em Tessalônica (I Tes.
4:13-18 e II Tes. 2:1-3): Paulo estava enfrentando alguns
problemas com respeito à doutrina da ressurreição dos
mortos e da vinda de Senhor na Igreja cristã de Tessalônica. Parece-nos que alguns irmãos estavam espalhando
algumas doutrinas heréticas sobre o assunto, trazendo dúvidas doutrinárias para aqueles irmãos. O apóstolo procurou mostrar a verdade e doutrinar corretamenle aquela
Igreja.
Pelos fatos apresentados acima, e outros que encontramos no Novo Testamento, podemos nos aperceber de
que o período inicial das igrejas cristãs foi caracterizado
por instabilidade e dúvidas doutrinárias, em que o próprio
mimigo se aproveitava para espalhar o seu joio, não sendo
difícil, por conseguinte, encontrarmos muitos crentes praticando certos costumes e ritos da antiga dispensação,
bem como não tendo um conhecimento perfeito e correio
de muitas doutrinas e princípios cristãos.
3. O Período da Maturidade Doutrinária
A terceira fase, nesse contexto histórico das igrejas
primitivas, é aquela em que vamos encontrar as igrejas e
os crentes, consequentemente, atingindo a maturidade
espiritual e doutrinária na fé cristã. Algum tempo, não
sabemos quanto, foi necessário para que isso acontecesse.
A conversão de Paulo e a sua chamada para o ministério
apostólico, vindo a se tornar um dos maiores teólogos e
grande expositor das doutrinas cristãs; não só expositor,
mas defensor, também. As suas viagens missionárias, as
suas epístolas que até hoje se constituem como grandes
depositárias das doutrinas e verdades cristãs, as experiências pessoais dos apóstolos e dos demais crentes e das
igrejas são fatores incontestáveis que muito contribuíram para que o cristianismo alcançasse a sua maturidade
no conhecimento das doutrinas fundamentais do Evange-
lho de Cristo e consequentemente a sua estabilidade espiritual.
A partir de então, nós podemos vislumbrar já nas págmas do Novo Testamento a firmeza doutrinária das igrejas e a inexistência de práticas doutrinárias ultrapassadas.
Aí podemos ver a simplicidade e a pureza das doutrinas
evangélicas, assim como devem ser recebidas e praticadas
pelos crentes em Jesus Cristo.
Com esses fatos em mente, e sem nunca perdê-los de
vista, e que devemos estudar a questão da prática do
jejum no Novo Testamento. Só assim estaremos aptos
para por as coisas no seu devido lugar, sem o perigo de
promovermos uma mistura doutrinária de resultados
negativos para a vida cristã. Não basta apenas citar que
uma determinada prática está registrada no Novo Testamento para já a incluirmos no corpo doutrinário evangélico. Precisamos saber, antes de tudo, por que e em que
circunstancia foi ali registrado. Senão, teremos que
incluir em nossas doutrinas não só o jejum, mas muitas
outras práticas, tais como o lava-pés, a páscoa com o cordeiro pascoal, a comunidade cristã nos moldes de Atos
dos Apóstolos, o uso do véu nas mulheres, e outras que
encontramos através do Novo Testamento.
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Não poderíamos começar esta parte do estudo da
doutrina e prática do jejum de modo melhor a não ser
estudando primeiramente a sua relação com Jesus Cristo;
com o ministério terreno de Jesus. Ele é o nosso Mestre
por excelência e assim o mais autorizado no que diz respeito à ministração das doutrinas evangélicas, pois Ele é
particularmente o seu autor. Temos muito mesmo para
aprender com o nosso Mestre sobre a prática do jejum
no Novo Testamento.
O pouco que temos sobre Jesus relacionado com o
jejum, é o bastante e suficiente para descobrirmos e
entendermos o seu ponto-de-vista e o seu ensino sobre a
matéria. Aliás, é bom que se diga de passagem, que no
Novo Testamento encontramos muito pouco mesmo
sobre a prática do jejum, que não será difícil comentar
cada passagem, como vamos passar a fazer, o que não foi
possível quando estudamos a matéria no Velho Testamento, dado os muitos casos de jejuns que são lá encontrados.
1. O jejum de Jesus no deserto (Mat. 4:1-11; Mar.
1:12-13; Luc. 4:1-13): Começando com Jesus, vamos
começar com o início do seu ministério terreno, examinando o seu jejum no deserto, narrado nos textos acima.
Para mim não seria surpresa encontrar Jesus Cristo
jejuando, uma vez que Ele cumpriu o seu ministério aqui
na terra sob a legis ação religiosa do Velho Testamento,
como já demonstramos no capítulo anterior, porém o
caso presente de jejum não se trata de uma cerimonia reli-
giosa que esteja sendo executada por Jesus Cristo. Trata-se, tão-somente, de um jejum involuntário, ocasionado
pelas circunstâncias em que se encontrava Jesus. Observem o início dsiS três«arrações dos evangelistas:
"Então foi conduzido Jesus pelo Espírito ao
deserto, para ser tentado pelo diabo" (Mat. 4:1).
"E logo o Espírito o impeliu para o deserto"
(Mar. 1:12).
"E Jesus, cheio do Espírito Santo, voltou do
Jordão e foi levado pelo Espírito ao deserto" (Luc.
4:1).
Pelas três narrações dos evangelistas, acima citadas,
nos certificamos de que Jesus não havia programado ir
para o deserto após o seu batismo. Os tres evangelistas
são unânimes em afirmar que Jesus foi "conduzido", "impelido", "levado" ao deserto pelo Espírito. A segunda
coisa que temos a observar nessa narração, é a finalidade
da ida de Jesus ao deserto: "Para ser tentado pelo diabo"
(Mat. 4:1, Luc. 4:2 e Mar. 1:13). O objetivo, a finalidade, a
tarefa de Jesus no deserto, segundo o plano de Deus através do Espírito Santo e não de Jesus, era enfrentar o
diabo, começando dessa forma as suas lutas contra o inimigo no seu ministério terreno. Então o jejum foi uma
decorrência circunstancial da sua estada no deserto. Ele
não levou alimentação, no deserto não havia onde adquiri-la, bem como Jesus não iria suspender as suas atividades ali ou pedir uma trégua ao diabo para ir até à cidade
comer e depois voltar, pois ele nunca se preocupou
com a comida. Daí o jejum involuntário, ocasionado peia
falta de alimentação. Mas, repito o que disse de início:
Não veria qualquer problema mesmo que fosse um jejum
voluntário, pois Jesus estava debaixo da Dispensação da
Lei.
2. O caso da expulsão dos demónios (Mat. 17:14-21 e
Mar. 9:14-29): Para nossas considerações, vamos transcrever apenas o último versículo do texto de Mateus, pois
ambos os textos são praticamente iguais:
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CAPITULO y i i
JESUS E A PRÁTICA DO JEJUM
"Mas esta casta de demónios não se expulsa
senão pela Oração e pelo jejum" (Mat. 17:21).
Temos duas explicações para o referido texto:
a) A primeira diz respeito à autenticidade da expressão: A palavra "jejum" não se encontra nos melhores
manuscritos. Teria algum copista, mais tarde, acrescentado esta parte; quem sabe um daqueles judaizantes que
não podiam separar a Oração do jejum, por ainda não ter
entendido o ensino evangélico. Mas deixemos essa
explicação de lado, por ser um tanto controvertida, e
vamos para a segunda.
b) Este fato está dentro do período ainda sob a lei, na
Dispensação da Lei, conforme já explicamos atrás, onde
o jejum fazia parte do cerimonial para uma preparação
espiritual necessária visando alcançar uma perfeita comunhão com Deus e ter, por conseguinte, o seu poder para
tão importante tarefa que era a expulsão de um demónio.
Por certo que os discípulos, contando com a ausência do
Mestre e de outros colegas, que estavam no monte da
transfiguração, já por algum tempo, não deviam estar
nada preparados espiritualmente para enfrentar os demónios. Precisavam penitenciar-se diante do i odo-Poderoso
Deus, e o jejum era, segundo a lei, um dos meios para
isso, dentro da antiga dispensação em que estavam. O
"Cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo" ainda
não havia sido morto; não havia sido sacrificado em
expiação pelos pecadores. Ele, Jesus, ao ser inquirido
pe os discípulos, não poderia ter dito; Esta casta de demo- •
nios só se expulsa com Oração mediante a vossa confissão
de pecados, a mim, para que eu vos purifique com o meu
sangue derramado na cruz. Não, naquela hora, naquela
ocasião, a resposta só poderia ter sido a que Jesus deu.
Tudo ainda estava debaixo do cerimonial antigo. A Dispensação da Graça ainda não havia sido instituída.
3. Jesus ensinando o jejum (Mat. 6:16-18): Esta passagem é muito citada pelos jejuadores para argumentar que
Jesus ensinou a jejuar. Vamos transcrever o texto:
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"E, quando jejuardes não vos mostreis contristados, como fazem os hipócritas; porque desfiguram os seus rostos para que aos homens pareça
que jejuam. Em verdade vos digo que já reccoeram
o seu galardão.
Porém tu, quando jejuares, unge a tua
cabeça, e lava o teu rosto, para que não pareça aos
homens que jejuas, mas a teu Pai que está em
oculto; e teu Pai, que vê em oculto, te recompensará".
À primeira vista, parece mesmo que Jesus está dando
um mandamento sobre a prática do jejum. Mas não é
realmente isso que estava acontecendo. Ò jejum já era um
mandamento, e bem antigo, observado pelo povo de Deus
desde o Sinai. Fazia parte do seu cerimonial religioso,
como já discutimos anteriormente. Todo o bom judeu
devia praticá-lo com sinceridade de coração. O fato aconteceu naquele período do ministério de Jesus, aliás, parece-nos que bem no início, portanto em plena Dispensação
da Lei. Naquela altura do seu ministério, Jesus nao estava
autorizado a abolir al|um coisa dos preceitos da lei, nem
mesmo o jejum. Ele nao veio para abolir ou abrogar, mas
para cumprir (Mat. 5:17). O que Jesus estava fazendo,
naquela ocasião referida no texto em apreço, não era,
repetimos, dando um mandamento para a prática evangélica do jejum, mas sim ensinando aos judeus a maneira
certa e correta de se proceder na prática do jejum, em
face dos erros que vinham sendo cometidos pelos fariseus
hipócritas. Ele não disse: Vós deveis jejuar, mas sim:
"Quando jejuardes . .."
4. Jesus e os discípulos de João (Mar. 2:18-22): Esta é
a passagem mais importante neste estudo, pois aqui temos
realmente mui claro o pensamento e ensino de Jesus
sobre a prática do jejum: Leiamos o texto:
"Ora os discípulos de João e os fariseus jejuavam; e foram e disseram-lhe: Por que jejuam os
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discípulos de João e os dos fariseus, e não jejuam
os teus discípulos?
E Jesus disse-lhes: Podem porventura os
filhos das bodas jejuar enquanto está com eles o
esposo? Enquanto têm consigo o esposo, não
podem jejuar;
Mas dias virão em que lhes será tirado o
esposo, e então jejuarão naqueles dias.
Ninguém deita remendo de pano novo em
vestido velho: doutra sorte o mesmo remendo
novo rompe o velho, e a rotura fica maior;
E ninguém deita vinho novo em odres velhos;
doutra sorte, o vinho novo rompe os odres
e entorna-se o vinho, e os odres estragam-se; o
vinho novo deve ser deitado em odres novos".
Vamos considerar esse texto em todas as suas minúcias, pois, como dissemos acima, estamos diante de uma
das passagens mais importantes sobre a prática do jejum
no Novo Testamento.
Inicialmente, observemos a pergunta dos discípulos
de João, feita a Jesus: "Por que não jejuam os teus discípulos?"
Dentro dessa pergunta está implícita uma afirmação:
Os teus discípulos não jejuam. Jesus não contrariou essa
afirmação, o que torna claro que se tratava de uma verdade. Os discípulos de Jesus não jejuavam. Não podemos
aceitar que, se o jejum fosse uma doutrina cristã e importante na vida espiritual, Jesus, que sempre teve o cuidado
de ser um exemplo e ensinar todos os preceitos de Deus, o
tivesse relegado. Também não aceitamos o fato de que, se
Jesus praticava o jejum, os seus discípulos, que acompanhavam o Mestre no seu ministério,não o acompanhassem nesse mister. O certo mesmo é que nem Jesus e nem
os seus discípulos praticavam a doutrina antiga do jejum.
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Todavia, o mais importante nesse texto não é a pergunta feita pelos discípulos de João, mas a resposta dada
por Jesus Cristo, que é o que vamos considerar em
seguida, dividindo-a seguiido as figuras apresentadas pelo
Mestre.
1) Osfílhosdas bodas e o Esposo (vs. 19-20): Está
claro no próprio texto que "os filhos das bodas" eram os
seus discípulos, ou, por extensão, os seus seguidores. O
"esposo", não há dúvida, é o próprio Jesus.Não precisamos de muita profundidade teológica para entendermos o
que o Mestre queria ensinar. Seria o mesmo que dizer:
"Enquanto eu estiver presente, os meus discípulos, meus
seguidores, não podem jejuar". Em outras palavras, a presença de Jesus torna sem efeito e desnecessário o jejum.
Esta afirmação está perfeitamente enquadrada dentro do
escopo do jejum. Ele foi instituído para vigorar dentro de
um cerimonial da lei, cujo objetivo era realmente guiar o
povo de Deus até Cristo (Gál. 3:24-25). Portanto, para
vigorar na ausência de Jesus. Com Ele, consequentemente o jejum perde a sua viabilidade. Então, em última
analise, o jejum identifica a ausência de Jesus. Ele afirmou: "Mas dias virão em que o esposo lhes será tirado,
então jejuarão naqueles dias" (v. 20). Mas não vamos
agora querer entender que essa declaração de Jesus se
refira à presente época, em que o esposo foi tirado, voltou
para o Céu. Para o verdadeiro crente Jesus nunca está
ausente. Ele mesmo afirmou: " . . . e eis que estou convosco todos os dias até a consumação dos séculos" (Mat.
28:20b). A ausência referida por Jesus, nada mais seria do
que aquela compreendida entre a sua morte e ressurreição, três dias apenas. Observem que Ele não disse que
passariam a jejuar dali para frente, mas "naqueles dias".
Seriam apenas dias, e graças a Deus por por isso, pois,
pela graça e poder de Deus, temos o "esposo" sempre
presente.
2) Remendo de pano novo em vestido velho (v. 21): Cremos que essa declaração de Jesus é o suficiente para
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esclarecer e dar o seu ponto de vista sobre a doutrina levítica do jejum. "Pano novo" é o Evangelho de Jesus
Cristo, com o seu corpo doutrinário, com toda a simplicidade e beleza, coberto pelo sangue precioso de Jesus, o
sangue da Nova Aliança. "Vestido velho" era a roupagem
do cerimonial judaico, já bastante roto, de cuja textura o
jejum era parte integrante. Infelizmente, há muita gente
por aí tentando remendar e usar o "trapinho velho" da
Dispensação da Lei. Mas Cristo ensinou que não há qualquer proveito nisso, pois a rotura só vai ficar maior.
Aprendamos a lição com o Mestre.
3) Vinho Novo em Odres Velhos (v. 22): A figura
usada por Jesus aqui é igual em parte à anterior, porém
existem outras lições importantes para serem salientadas.
O "vinho novo", como no caso acima, é o Evagelho, e os
"odres velhos" são, igualmente, os componentes do cerimonial judaico, inclusive o jejum que era o de que estava
Jesus falando. Jesus apenas quis reafirmar a lição, usando
figuras diferentes. Mas observemos a primeira afirmação
de Jesus no caso presente: "Ninguém deita vinho novo em
odres velhos; o vinho novo rompe os odres e entorna-se o
vinho". Jesus estava afirmando que o vinho novo seria
perdido, no caso, pois os odres ve hos não teriam capacidade para contê-lo. Realmente, quando as doutrinas cristãs são misturadas com doutrinas antigas, do velho pacto,
doutrina alheias ao Evangelho, o que de melhor acorttece
é uma perda irreparável para a pureza das doutrinas evangélicas e para a vida cristã do crente, que passa a depositar confiança em outros fatores que não Cristo somente.
Isso é o que acontece com Evangelho mais idolatria,
Evangelho mais paganismo. Evangelho mais espiritismo.
Evangelho mais judaísmo, Evangelho mais socialismo.
Mas a mais importante afirmação de Jesus, nesse texto,
foi a última: "O vinho novo deve ser deitado em odres
novos". Se muitos religiosos de hoje, até mesmo muitos
crentes, inclusive pastores, dessem ouvidos a essa afirmação do mestre, não estariam praticando o jejum e cnsi- 49 -
nando-o para o povo. O bíblico, o cristão, o neotestamentário, é Evangelho com preceitos evangélicos; "vindo novo
em odres novos".
Encerrando este capítulo, queremos reafirmar o que
dissemos acima: Cada vez que o homem mistura as doutrinas cristãs com preceitos da velha dispensação ou
outros alheios ao Evangelho, o que resulta normalmente é
um enfraquecimento e até destruição da fé cristã. A fé
que crê em Cristo, o único e todo suficiente Salvador. A
fé que crê no sangue de Jesus Cristo como tendo poder
para nos purificar de todo o pecado. A fé que crê em
Jesus Cristo como o único mediador entre Deus e o
homem. Quantas roturas espirituais por aí; quantas vidas
inúteis e fé praticamente destruídas resultantes de dúvidas doutrinárias contraídas por uma mistura religiosa sem
qualquer base ou fundamento na Bíblia Sagrada, Estejamos preparados e precavidos contra essas coisas.
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