Os traços ecológicos podem predizer a abundância relativa de espécies em Melastomataceae? Bruno Barçante Ladvocat, Thiago Gechel Kloss, Camila Vieira, Alêny Lopes Francisco determinantes Introdução A maior parte das espécies na raridade ou abundância das espécies no ambiente. existentes são incomuns ou raras, fato De acordo com a Teoria de que atrai atenção especial dos cientistas Nicho (Hutchinson 1959), estratégias sobre adaptativas as causas e consequências são selecionadas por ecológicas da distribuição e abundância processos de partição de nicho que das espécies (Hubbell 2001). As teorias ocorrem em resposta à competição entre desenvolvidas na tentativa de elucidar as espécies ancestrais, fenômeno este os conhecido mecanismos que resultam em como “fantasma da raridade ou abundância das espécies são competição passada” (Connel 1980). divididas Este fenômeno resulta na evolução de basicamente em determinística e neutra. A teoria neutra diferentes parte do pressuposto básico de que característicos de cada espécie, que todas igual estão associados a diferentes demandas capacidade de colonizar os ambientes, conflitantes presentes nos ambientes sendo limitadas apenas por eventos que ocupam. Desta forma, uma das estocásticos associados à dispersão maneiras de se elucidar questões sobre (Hubbell 2001). A teoria determinística raridade e abundância das espécies é mais antiga é a Teoria de Nicho estudando os mecanismos biológicos (Hutchinson 1959), que presume que ligados aos traços funcionais presentes espécies estratégias em cada espécie, que refletem a história adaptativas especializadas relacionadas de vida e evolução das plantas (Wright a et al. 2007). as espécies possuem demandas demandas possuem conflitantes. conflitantes Essas serão traços funcionais Traços funcionais se referem a características morfológicas, 0 fisiológicas e fenológicas das espécies, filogenética que podem ser selecionadas em resposta similaridade de nichos. está relacionada à a demandas conflitantes do ambiente. A combinação dos traços funcionais das Métodos espécies representam suas estratégias Área de estudo ecológicas (Westoby Essas Desenvolvemos este estudo em estratégias variam em função das uma área de floresta de terra firme do demandas conflitantes, pois quando os “Projeto recursos organismos Fragmentos Florestais” na Amazônia devem optar por alocar recursos para Central, localizada na Fazenda Dimona reprodução, armazenamento de energia (2º20’S-60º06’O) a 90 km ao norte de e/ou crescimento (Leishman & Murray Manaus (AM). Trata-se de uma área sob 2001). Desta forma, as estratégias efeito de fragmentação experimental, ecológicas podem as onde ao se desmatar a floresta para a abundâncias das um criação de pastos foram deixados são 1998). limitados, definir espécies em ambiente. Dinâmica Biológica de fragmentos de 1, 10 e 100 ha. Desde o Nosso objetivo foi avaliar a primeiro desmatamento, a matriz que se hipótese de que o investimento em desenvolveu entre os fragmentos já foi crescimento e em vigor competitivo por retirada algumas vezes, tendo decorrido luz está relacionado com a abundância aproximadamente 10 anos desde a ou raridade das espécies no ambiente. última vez. Para avaliar essa hipótese testamos a previsão de que a área foliar relativa e a Coleta de dados altura máxima dos indivíduos estão diretamente relacionadas com a Na borda do fragmento de 100 ha, quantificamos o número de cada espécie de abundância relativa de cada espécie na indivíduos comunidade. Para isso, utilizamos como Melastomataceae modelo de comunidade, espécies de amostrais de 4 x 10 m, distanciadas 20 Melastomataceae m entre si. Estabelecemos as parcelas tropical de uma secundária, pressuposto que floresta partindo a de em 12 parcelas do adjacente à borda do fragmento, onde o proximidade número de espécie de Melastomataceae era satisfatório para análise (observação 1 pessoal). A razão do número de seguida pesamos as folhas secas e indivíduos de cada espécie em relação calculamos a média por espécie para ao obtermos a razão entre área foliar e peso número total de indivíduos corresponde à abundância relativa de seco, expressa em cm2.g-1. cada espécie. Identificamos as espécies de acordo com Ribeiro et al. (1999). Análise estatística Medimos a altura dos indivíduos Para testar se as variáveis altura com fita métrica para plantas baixas e e área foliar específica de espécies de utilizamos o método da estimativa Melastomataceae visual para plantas altas. Na estimativa abundância relativa das espécies no visual, ficou ambiente, realizamos uma análise de posicionado na base da planta, para regressão múltipla. Consideramos como servir como referência de altura para variável outro pesquisador, que a estimou. relativa das espécies e como variáveis Adotamos como altura da espécie o independentes a altura da planta e área maior valor encontrado nas parcelas. foliar específica. um Para pesquisador calcular a área influenciam dependente a a abundância foliar específica, coletamos folhas de alguns Resultados indivíduos encontrados nas parcelas e Encontramos 414 indivíduos de sorteamos cinco dessas folhas de cada Melastomataceae distribuídos em 13 espécie . Em seguida retiramos de cada espécies. Miconia nervosa foi a espécie folha uma área de 16 cm2 ou 36 cm2 e que padronizamos os cortes apenas no relativa (Figura 1). A área foliar limbo, excluindo a nervura central. As específica e a altura máxima das diferentes necessárias espécies não foram bons preditores da devido à variação no tamanho das abundância de Melastomataceae (R2= folhas. Secamos no forno as cinco áreas 0,31; F(2,10)= 2,26; p=0,15; Figura 2). áreas foram apresentou maior abundância foliares retiradas de cada espécie. Em 2 abundância relativa 0,7 0,6 0,5 0,4 0,3 0,2 0,1 0 Figura 1. Abundância relativa das espécies de Melastomataceae em uma borda de fragmento na Fazenda Dimona, Amazônia Central. 0,7 A resíduo da abundância relativa vs. altura Resíduo da abundância relativa vs. altura 0,6 0,5 0,4 0,3 0,2 0,1 0,0 -0,1 -0,2 0 20 40 60 80 100 120 140 160 180 2 2 -1 Área foliarespecífica específica(cm (cm área foliar .g/g)) 200 220 240 260 1 Resíduo da abundância relativa vs. área foliar específica 0,6 0,5 0,4 0,3 0,2 0,1 0,0 -0,1 -0,2 0 200 400 600 800 1000 Altura máxima (cm) 1200 Figura 2. Regressão do resíduo da abundância relativa de 13 espécies de Melastomataceae em uma borda de fragmento na Amazônia Central com: A) área foliar específica excluindo o efeito da variável preditora altura máxima da planta B) altura máxima excluindo o efeito da variável área foliar específica (g/cm2). hipótese inicial. Este resultado difere da Discussão Nós avaliamos traços funcionais maioria dos resultados encontrados por associados ao crescimento e competição outros autores que correlacionam traços por luz entre indivíduos de diferentes funcionais ao padrão de distribuição das espécies de Melastomataceae, como espécies no ambiente (Laughlin et al. preditores 2010, Westoby 1998, Wright et al. da abundância destas espécies. Não encontramos nenhuma evidência de que a área foliar específica 2007). A área foliar específica está e a altura máxima destas espécies associada estejam sua relacionadas com a rápida aquisição de abundância relativa, refutando nossa recursos e substituição de biomassa ou relacionadas com a demandas conflitantes 2 baixa taxa de crescimento e alta preditores da sua abundância relativa, conservação de recursos adquiridos suas populações devem ser reguladas (Wright et al. 2007). A baixa variação principalmente por fatores de dispersão deste parâmetro entre as espécies e estocasticidade ambiental. Estes traços estudadas elas podem favorecer algumas espécies a se provavelmente aproveitam a luz de estabelecerem em novos ambientes, forma similar, não havendo partição de porém não são fundamentais para nicho entre elas (Leishman & Murray determinar padrões de abundância e 2001). estabelecimento A indica altura que representa uma de dominância de espécies de Melastomataceae. demanda conflitante de que quando uma espécie investe muita energia em crescimento vertical, menos energia Agradecimentos Agradecemos ao Prof. Dr. acaba sendo alocada para defesas Marcus Cianciaruso pela orientação, à metabólicas e aquisição de outros Daniele Kasper e Júnior, pelo imenso recursos até que se atinja a altura apoio no desenvolvimento do trabalho. máxima (Westoby 1998, Wright et al. 2007). Apesar de outros autores terem Referências descrito a altura como responsável por Chu, C.J., Y.S. Wang, G.Z. Du, F.T. grande variação funcional entre espécies Maestre, Y.J. Luo & G. Wang. tropicais (Laughlin et al. 2010, Westoby 2007. On the balance between 1998, Wright et al. 2007), este padrão niche and neutral processes as não pode ser extrapolado para todas drivers of community structure elas. along a successional gradient: As espécies de Melastomataceae insights from alpine and sub-alpine estudadas neste trabalho apresentaram meadow communities. Annals of equivalência ecológica com relação à Botany, 100:807–812. utilização da luminosidade. Este Connel, J.H.1980. Diversity and the resultado indica uma relação neutra coevolution of competitors, or the entre as espécies estudadas (Chu et al. gost of competition past. Oikos, 2007, Hubbell 2001), pois se os traços 35:131-138. funcionais das espécies não são bons 1 Hubbell, S.P. 2001. The unified neutral theory of biodiversity L.H.P. Martins, L.G. Lohmann, and P.A.C.L. Assunção, E.C. Pereira, Princeton C.F. Silva, M.R. Mesquita & L.C. Monographs in Population Biology. Procópio. 1999. Flora da reserva New Jersey: Princeton University Ducke: guia de identificação das Press. plantas vasculares de uma floresta biogeography. Hutchinson, G.E. 1959. Concluding remarks. Cold Spring Harbor Symposium. Quantitative Biology, 22:415-427. de terra‐firme Moore & C.H. Sieg. 2010. A multi- Amazônia Central. Manaus: INPA‐DFID. Westoby, M. 1998. A leaf-height-seed (LHS) Laughlin, D.C., J.J. Leppert, M.M. na plant ecology strategy scheme. Plant and Soil, 199:213227. trait test of the leaf-heigth-seed Wright, I.J., D.A. Ackerly, F. Bongers, plant strategy scheme with 133 K.M. Harms, G. Ibarra-Manriquez, species from a pine forest flora. M. Martinez-Ramos, S.J. Mazer, Functional Ecology, 24:493-501. H.C. Muller-Landau, H. Paz, Leishman, M.R. & B.R. Murray. 2001. N.C.A. Pitman, L. Poorter, M.R. The relationship between seed size Silman, C.F. Vriesendorp, C.O. and Webb, M. Westoby & S.J. Whright. abundance communities: and observed model in plant predictions patterns. Oikos, 94:151-161. 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