Manuseio de complicações hemorrágicas adquiridas no tratamento

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emergências oncológicas
Manuseio de complicações
hemorrágicas adquiridas no
tratamento do paciente oncológico
Divulgação
Introdução
Alexandre Mello de Azevedo
* Médico hematologista do
Centro de Tratamento
Oncológico (CENTRON)
Contato: omomom
Daniel Tabak
* Hematologista-Oncologista;
diretor médico do Centro de
Tratamento Oncológico (CENTRON);
membro titular da Academia
Nacional de Medicina
Contato: [email protected]
Simone Maradei
Isabela Gonçalves A. Pereira
Marcia Trindade Schramm
Leonardo Javier Arcuri
* Médicos hematologistas do
Centro de Tratamento
Oncológico (CENTRON)
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O sangramento é uma complicação frequente e potencialmente letal em pacientes com câncer. Pode
estar diretamente relacionado à doença, ao tratamento antineoplásico ou, ainda, a fatores não relacionados à neoplasia em si.
O termo hemostasia refere-se ao processo pelo
qual o sangramento é controlado no local da lesão
endotelial. É um mecanismo dinâmico, que inclui
a ação do subendotélio, endotélio, plaquetas e proteínas plasmáticas. Didaticamente, é dividido em
três fases: vascular, plaquetária e plasmática. Defeitos na hemostasia primária (plaquetas e fator de
von Willebrand [FvW]) tipicamente resultam em
sangramento mucocutâneo. Por outro lado, a sintomatologia de defeitos na cascata de coagulação
(hemostasia secundária) é bem variável, podendo
haver acometimento de tecidos profundos, levando
a hematomas, sangramento retroperitoenal ou até
no sistema nervoso central (SNC).
Não importa quão grave seja a situação, devese sempre tentar obter uma história completa, que
inclua sintomas associados, tempo de evolução e
tratamentos/medicações recentemente realizados.
Abordaremos neste texto o diagnóstico e o manejo de sangramentos em pacientes com câncer.
Eventualmente, deparamo-nos com alterações em
testes laboratorias de coagulação sem repercussões
clínicas, e esse tema também será abordado.
Avaliação laboratorial
O sucesso da terapia baseia-se no diagnóstico correto. O primeiro passo na avaliação é obter um hemograma com contagem de plaquetas, tempo de
protrombina (TP e INR), tempo de tromboplastina
parcial ativada (TTPa) e fibrinogênio.
A trombocitopenia isolada e grave (< 20.000/µl)
normalmente é secundária a púrpura trombocitopênica idiopática (PTI), trombocitopenia induzida
por drogas (TID), microangiopatia trombótica ou
púrpura transfusional. Deve-se lembrar que a trombocitopenia deve ser sempre confirmada por
hematoscopia, uma vez que o satelitismo (aderência
a leucócitos) e agregados plaquetários podem causar
trombocitopenia espúria, sem qualquer repercussão
clínica. É importante notar que a trombocitose intensa (> 1.000.000/µl) também pode causar sangramento, principalmente por consumo de FvW pelo
número aumentado de plaquetas.
O TP e o TTPa avaliam a via extrínseca e a via
intrínseca da coagulação, respectivamente. Essa divisão é de importância apenas diagnóstica e laboratorial. Alterações do fibrinogênio, protrombina,
fatores V e X causam aumento tanto do TP quanto
do TTPa. Alterações do fator VII aumentam apenas
o TP, enquanto alterações do FvW, VIII, IX, XI e XII
causam aumento do TTPa.
As alterações dos fatores de coagulação identificadas pelos testes TP e TTPa podem ser causadas
por consumo ou diminuição de produção, ou por
produção de autoanticorpos (inibidores). Diferenciam-se esses dois grupos pelo “teste da mistura”,
misturando-se plasma normal com o do paciente
em iguais proporções (1:1). Quando a mistura não
corrige o TP ou o TTPa, isso indica a presença de
algum inibidor. Quando a mistura corrige o defeito,
o mais provável é que haja deficiência quantitativa
ou qualitativa de algum fator.
Há, portanto, três padrões de alteração do TP
e do TTPa, que indicam como deve prosseguir a
investigação. Esses três padrões estão sumarizados
na Tabela 1.
Ensaios de TP e TTPa mais modernos não são
alterados por anticoagulante lúpico. Se houver
suspeita de anticorpo inibidor (o mais comum é
contra o FVIII), a atividade de cada fator suspeito
deverá ser testada separadamente. O padrão do
anticorpo inibidor do FVIII, por exemplo, é uma
baixa atividade do FVIII que não se corrige pela mistura 1:1 com
plasma normal. Uma vez identificado, o anticorpo inibidor deve ser
quantificado em sua atividade.
A dosagem de fibrinogênio tem mais importância terapêutica do
que diagnóstica. Níveis de fibrinogênio < 100 mg/dl devem ser tratados. O plasma fresco congelado (PFC) tem pouco fibrinogênio, e a
reposição deve ser feita com crioprecipitado, transfundindo-se 1 U a
cada 10 kg do paciente.
Transfusão maciça
O sangramento agudo em pacientes com câncer pode levar à transfusão de grandes quantidades de sangue em pouco tempo. A transfusão maciça leva à diluição de fatores de coagulação e plaquetas. O
diagnóstico é feito pela história, associada a TP e TTPa aumentados. A
transfusão de mais de 10 U de hemácias é um fator de risco para coagulopatia por transfusão.
Deve-se repor PFC (15 ml/kg). Se houver CID associada, deve-se
manter as plaquetas > 50.000/µl. Se o fibrinogênio for < 100 mg/dl,
deve-se repor crioprecipitado (1 U/10 kg de peso). Os testes de coagulação devem ser repetidos após a reposição para guiar a terapia adicional. O objetivo é manter INR < 2, TTPa < 1,5 (relação paciente/
controle) e fibrinogênio > 100 mg/dl.
Complicações da transfusão maciça
A complicação mais comum é a hipotermia, que prejudica a função
plaquetária e a eficiência das reações de coagulação, além de aumentar
a fibrinólise. Alterações eletrolíticas são raras, e não se deve atribuir a
acidose à transfusão maciça. Não se deve repor empiricamente cálcio
(o citrato presente na bolsa de sangue é rapidamente metabolizado)
nem bicarbonato.
Sangramentos por problemas em fatores da coagulação
Doença de von Willebrand adquirida
A doença de von Willebrand (DvW) adquirida pode ocorrer nos linfomas, nas síndromes mieloproliferativas, no mieloma múltiplo (MM)
e em outras gamopatias monoclonais. A fisiopatologia pode envolver
um de vários mecanismos possíveis: anticorpos contra o FvW, proteólise do FvW, ligação anormal do FvW a células tumorais ou
diminuição da síntese do FvW. Mais comumente, manifesta-se por sangramento difuso em feridas cirúrgicas, epistaxe ou sangramento do
tubo digestivo em um paciente sem história pessoal ou familiar de sangramento. Os pacientes com DvW adquirida podem apresentar fenótipos diferentes, incluindo o tipo 1 (distúrbio quantitativo) ou o tipo 2
(distúrbio qualitativo).
A resposta ao tratamento nos pacientes com DvW adquirida é variável. A desmopressina (DDAVP) é efetiva em muitos pacientes com
DvW adquirida dos tipos 1 e 2; no entanto, uma vez que o mecanismo
de destruição da molécula é mediado por anticorpos, a magnitude e a
duração do efeito são frequentemente menores que o esperado.
Em pacientes que apresentam sangramento ativo, indicam-se idealmente doses altas de concentrado de FvW, nem sempre disponíveis.
Na indisponibilidade do produto purificado, pode-se recorrer à transfusão de crioprecipitado (80 a 100 U de FVIII por bolsa). O fator VIIa
(FVIIa) pode ser indicado em pacientes com sangramentos graves
(risco de vida ou lesões irreversíveis) e/ou portadores de inibidores
fortes, nos quais os concentrados de FvW podem não ser eficazes.
Inibidores adquiridos do fator VIII
Em pacientes idosos com câncer, a deficiência de FVIII causada por
autoanticorpos é a mais frequente complicação por deficiência
adquirida de um fator da coagulação. As neoplasias linfoproliferativas
são as mais frequentemente associadas. Diferentemente da hemofilia
clássica, esses pacientes costumam apresentar equimoses extensas,
além de possíveis hematomas em grupos musculares e tecidos moles.
O diagnóstico é feito pelo prolongamento do TTPa, pelo teste positivo
para a presença de um inibidor (teste da mistura) e pela dosagem subnormal de FVIII.
O concentrado de FVIIa recombinante é o tratamento de escolha
para pacientes com sangramentos graves e risco de vida. A dose é de
90 µg/kg, repetida a cada 2 ou 3 horas até a cessação do sangramento.
Na indisponibilidade do FVIIa, pode-se recorrer a altas doses do
Tabela 1: Diagnósticos diferenciais das alterações em TP e/ou TTPa
TP aumentado
1. Deficiência de vitamina K
2. Terapia com warfarina
3. Doença hepática
4. Deficiência/Inibidor de fator VII
TTPa aumentado
1. Heparina
2. Deficiência/Inibidor de FvW, VIII ou IX
(risco alto de sangramento)
3. Deficiência/Inibidor de FXI ou XII
(risco baixo ou ausente de sangramento)
4. Anticoagulante lúpico (risco de sangramento ausente)
TP e TTPa aumentados
1. Heparina ou warfarina em altas doses
2. Coagulopatia por transfusão maciça
(sem reposição adequada de plasma)
3. Deficiência de vitamina K
4. Doença hepática grave
5. Deficiência/Inibidor de FII (anticoagulante lúpico),
V (estreptomicina) ou X (amiloidose)
6. Coagulação intravascular disseminada (CID)
7. Hipofibrinogenemia
8. Paraproteinemia
9. Leucemia promielocítica aguda
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próprio FVIII recombinante e/ou ao tratamento imunossupressor,
visando à redução da produção do inibidor.
Coagulação intravascular disseminada (CID)
A CID é a manifestação clínica da ativação descontrolada da trombina.
A ativação da trombina leva a: (1) conversão de fibrinogênio em fibrina, (2) ativação e consumo de plaquetas, (3) ativação do FV e do
FVIII, (4) ativação da proteína C (e a consequente degradação dos fatores Va e VIIIa), (5) ativação do endotélio vascular, e (6) fibrinólise.
Descrevem-se quatro padrões clínicos na CID:
1. Forma assintomática ou “CID crônica”
Pode haver evidência laboratorial de CID, mas sem sangramentos ou
tromboses significativas. É uma situação em geral transitória, frequentemente encontrada em pacientes com tumores sólidos (ex: adenocarcinomas) ou hematológicos (ex: leucemias mielocíticas). Geralmente,
caracteriza-se por um estado protrombótico compensado. A progressão
da doença de base pode, no entanto, sobrepujar os mecanismos anticoagulantes naturais e precipitar os sintomas característicos.
2. Forma predominantemente hemorrágica
Os sangramentos costumam ter causa multifatorial: depleção de fatores
procoagulantes, disfunção plaquetária, trombocitopenia e fibrinólise excessiva. Os sangramentos são geralmente difusos, em sítios múltiplos.
3. Forma predominantemente trombótica
Apesar da ativação generalizada dos processos da coagulação, a trombose em vasos grandes é pouco frequente em pacientes com CID
aguda, sendo observada principalmente na microcirculação, onde determina isquemia e pode precipitar a síndrome de disfunção de múltiplos órgãos (ex: fígado, rins). Nos pacientes com câncer, a trombose
pode ser o principal fator complicador. A trombose é mais frequentemente venosa, mas há relatos de tromboses arteriais e de endocardite
trombótica não bacteriana.
4. Purpura fulminans (PF)
É a associação entre CID e equimoses e necrose simétrica da pele das
extremidades. Dois modos de apresentação são descritos: A PF
primária ocorre caracteristicamente após infecções virais (ex: varicela)
em hospedeiros imunodeficientes. Nesses casos, a PF começa com
eritema e dor em uma extremidade, progredindo rapidamente para
necrose isquêmica e escurecimento da pele. A PF secundária é mais
frequentemente associada à meningococcemia, mas pode ocorrer em
qualquer tipo de infecção grave. Pode ocorrer em pacientes com câncer
ou esplenectomizados com síndrome séptica. Em geral, o quadro
clínico é de sépsis, e as lesões cutâneas frequentemente envolvem as
extremidades, podendo levar à gangrena e à amputação.
O tratamento deve ser primariamente dirigido à causa subjacente,
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o que nem sempre é possível. Inicialmente, medidas de ressuscitação
e reposição volêmica devem ser observadas, uma vez que a má perfusão do fígado é um dos principais obstáculos à correção das anormalidades hemostáticas da CID.
A reposição de plaquetas e fatores da coagulação (ex: fibrinogênio)
através da transfusão de produtos como o crioprecipitado, o PFC e os
concentrados de plaquetas não deve ser feita com o único objetivo de
corrigir as anormalidades laboratoriais encontradas, mas sim para o
controle de sangramentos clinicamente relevantes ou o preparo do paciente para a realização de procedimentos invasivos.
O uso de heparina permanece polêmico, e deve se restringir aos
pacientes que demonstram sinais claros de oclusão circulatória por deposição excessiva de fibrina (ex: insuficiência renal, isquemia de extremidades) sem evidência de hemorragia significativa concomitante,
situação esta que é mais comum na CID crônica. É bom lembrar que
a heparina exerce seu efeito pela potencialização da ação da antitrombina III (ATIII), e que esta última pode estar diminuída. Já existem
concentrados de ATIII recombinante para reposição. A monitorização
da anticoagulação pelo TTPa é pouco confiável na CID descontrolada,
sendo mais indicados os níveis séricos de heparina.
Em alguns pacientes sépticos com CID, a reposição com concentrado de proteína-C ativada recombinante tem mostrado bons resultados
preliminares. Os antifibrinolíticos, como o ácido aminocaproico ou
tranexâmico, podem ser utilizados nos casos que não respondem às medidas iniciais mas que trazem o risco de complicações trombóticas.
Problemas de função e número de plaquetas
Púrpura trombocitopênica idiopática (PTI)
A PTI afeta 1:20.000 indivíduos, sendo mais comum em mulheres
jovens. Pode estar associada a neoplasias, principalmente hematológicas,
como a leucemia linfoide aguda (LLA) e linfomas. A fisiopatologia consiste na formação de autoanticorpos dirigidos contra glicoproteínas da
membrana plaquetária, principalmente contra os complexos GPIIb-IIIa
e GPIb-IX.
A PTI tem chances de ocorrer em qualquer momento do curso de
uma neoplasia, inclusive antecedendo o diagnóstico de uma eventual recidiva do câncer em pacientes que se encontram em remissão. De um
modo geral, os pacientes são assintomáticos e a trombocitopenia pode
ser um achado laboratorial. Os pacientes toleram bem contagens plaquetárias baixas, existindo um risco maior de sangramento com plaquetas
abaixo de 5.000/µl. Não existe um teste laboratorial específico; é um
diagnóstico de exclusão.
O tratamento inicial consiste em pulsoterapia com dexametasona
40 mg/d durante 4 dias. Nos pacientes com trombocitopenia severa
(< 10.000/µl) ou sangramento ativo, um ou mais tratamentos devem ser
instituídos na tentativa de induzir uma resposta mais rápida. Tanto a
imunoglobulina intravenosa (IgIV) na dose de 2 g/kg divididos em dois
dias quanto o anticorpo anti-D na dose de 75 µg/kg em dose única
podem induzir resposta em mais de 80% dos casos em 24 a 48 horas.
Trombocitopenia induzida por droga (TID)
Os pacientes com TID apresentam trombocitopenia
de 1 a 3 semanas após o uso da medicação causadora. Vários medicamentos estão implicados no
desenvolvimento da TID (Tabela 2). A terapia inicial consiste em suspender a medicação suspeita.
Na presença de múltiplas medicações, deve-se suspender a que apresentar maior associação.
O tratamento consiste em IgIV em altas doses
(0,4 g/kg/d) durante 5 dias. O número de plaquetas
costuma aumentar em 3 a 5 dias. Outra opção é a
plasmaférese, porém com resultados inferiores. A
transfusão de plaquetas, por ser pouco eficaz, deve
ser reservada apenas para as situações de sangramento grave e potencialmente fatal. Devem ser
usadas plaquetas negativas para o antígeno HPA-1a.
Púrpura pós-transfusional (PPT)
É uma condição clínica grave que se caracteriza
pela queda repentina do número de plaquetas,
geralmente até níveis < 10.000/µl, e púrpura, 7 a
14 dias (em média, 9 dias) após a transfusão de
componentes sanguíneos contendo plaquetas.
Acomete principalmente mulheres multíparas,
porém também é descrita em outras populações,
como pacientes politransfundidos.
É causada por aloanticorpos do receptor contra
antígenos plaquetários do doador, ausentes no receptor. Essa destruição plaquetária ocorre, na maioria das
vezes, pela presença de anticorpos contra o antígeno
plaquetário HPA-1a, que está presente em 98% dos
indivíduos, ocasionando uma destruição tanto das
plaquetas infundidas quanto das plaquetas do
próprio paciente. O quadro clínico é autolimitado e
se resolve geralmente em três semanas. Porém, de
10% a 15% dos pacientes evoluem para óbito por
sangramento no SNC.
Refratariedade às plaquetas
A refratariedade à transfusão de plaquetas caracterizase por um incremento plaquetário inadequado após
a transfusão de concentrado de plaquetas. Esse mau
aproveitamento se deve a inúmeras causas não imunes, como febre, infecção e grande esplenomegalia,
bem como a fatores imunes, como a aloimunização
contra antígenos do sistema HLA de classe I. Outras
causas imunes importantes são: aloimunização contra
antígenos plaquetários específicos e o uso de plaquetas ABO-incompatíveis.
O diagnóstico é simples e consiste na ausência
de incremento da contagem de plaquetas após três
transfusões no período de duas semanas. O cálculo
do incremento corrigido da contagem (ICC) após
transfusão pode ser feito com o emprego de fórmula específica:
ICC = IP x SC/dose (x 1011), no qual IP = incremento plaquetário desejado; SC = superfície
corporal (m2).
Se o ICC for menor que 7,5 a 10 x 109 em uma
amostra colhida de 10 minutos a 1 hora após a transfusão, ou se o ICC for menor que 4,5 a 5 x 109 em
uma amostra colhida 24 horas após a transfusão,
pode-se definir como refratariedade à transfusão.
Deve-se realizar, sempre que possível, a contagem
plaquetária pré e pós-transfusional em pacientes politransfundidos. Uma vez constatada a refratariedade,
devem ser utilizadas preferencialmente plaquetas
ABO-idênticas. Em pacientes que estejam recebendo
concomitantemente anfotericina B, deve-se fazer um
intervalo de 2 horas entre a infusão do medicamento
e a transfusão das plaquetas. Caso essas medidas não
sejam eficazes, deve-se optar por transfundir apenas
em caso de sangramento.
Tabela 2: Drogas que comumente
induzem trombocitopenia
Drogas antiarrítmicas
Procainamida, quinidina
Agentes anti-GPIIb/IIIa
Abciximab, eptifibatide, tirofiban
Agentes antimicrobianos
Anfotericina B, rifampicina, vancomicina,
trimetoprim-sulfametoxazol
Bloqueadores H2
Cimetidina, ranitidina
Outras
Acetaminofeno, amrinona, sais de ouro, heparina, quinine, efalizumab, carbamazepina, hidroclorotiazida, anti-inflamatórios não esteroides
“O sangramento é
uma complicação
frequente e potencialmente letal
em pacientes com
câncer. Pode estar
diretamente relacionado à doença,
ao tratamento
antineoplásico
ou, ainda, a fatores
não relacionados
à neoplasia em si.”
Trombocitopenia induzida por heparina (TIH)
A TIH é uma síndrome imuno-hematológica mediada por um anticorpo que ocasiona ativação plaquetária na presença de heparina, induzindo à
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agregação plaquetária e, consequentemente, a eventos trombóticos. A
frequência de TIH em pacientes que recebem heparina não fracionada
é maior quando comparada aos pacientes que recebem heparina de
baixo peso molecular (HBPM).
Os pacientes que apresentam uma queda de 30% a 50% na contagem
de plaquetas durante o tratamento com heparina, mesmo que não apresentem trombocitopenia, também têm um risco aumentado de desenvolver eventos trombóticos.
Há dois tipos distintos de TIH: tipo I e tipo II. O tipo I é a forma
menos severa e mais frequente. Caracteriza-se por trombocitopenia leve,
quase sempre > 100.000/µl, que se inicia precocemente após o uso da
heparina. Entretanto, a TIH tipo II caracteriza-se por trombocitopenia
mais severa, que geralmente surge de 4 a 14 dias após o início da administração da heparina. O diagnóstico clínico deve ser confirmado através
de testes laboratoriais capazes de detectar anticorpos heparina-dependentes ou antígenos heparina-fator 4 plaquetário.
Entre as medidas terapêuticas, a mais importante é a suspensão da
droga envolvida. Devido à participação da trombina na patogênese da
TIH, o tratamento primário deve incluir uma droga que reduza a geração
de trombina, ou seja, inibidores de trombina. O argatroban é um inibidor
sintético da trombina, de metabolização hepática. Sua atividade farmacológica faz com que ele atinja uma rápida eficácia terapêutica antitrombótica, com mínimo risco de sangramento e rápida restauração da
hemostasia ao normal no momento da suspensão. A hirudina, mais potente, liga-se à trombina e forma um complexo não covalente irreversível,
e com isso inibe todas as funções proteolíticas da trombina. Entretanto,
a metabolização é renal, devendo a dose ser corrigida nos pacientes com
função renal comprometida.
Púrpura trombocitopênica trombótica (PTT)
A PTT é uma microangiopatia trombótica caracterizada pela oclusão
difusa de arteríolas terminais e de capilares por trombos ricos em
plaquetas e em FvW.
Na PTT adquirida, muitos pacientes não apresentam os cinco
sinais e sintomas clássicos da doença, que são: trombocitopenia, anemia hemolítica microangiopática (AHMA), alterações neurológicas,
comprometimento renal e febre. Porém, estão sempre presentes a
AHMA, a trombocitopenia e as alterações neurológicas. Os níveis de
lactato desidrogenase (LDH) estão sempre aumentados, constituindo
um importante fator prognóstico na PTT. A mortalidade entre os pacientes não tratados é alta, em torno de 95% a 100%.
Atualmente, a plasmaférese constitui a base do tratamento, podendo reduzir a mortalidade para menos de 20%. Por isso, é importante realizá-la o mais precocemente possível, tão logo se estabeleça o
diagnóstico. Ela deve ser realizada diariamente, com trocas de 1 a 1,5
vez o volume de plasma do paciente, utilizando PFC como fluido de
reposição. Não se sabe ao certo o número ideal de sessões, porém ela
deve ser mantida até que se estabeleça uma remissão estável, que consiste na normalização do quadro neurológico, da contagem de plaque-
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tas e do nível de LDH, e no aumento da hemoglobina por pelo menos
dois dias consecutivos.
Síndrome hemolítico-urêmica (SHU)
A SHU é uma microangiopatia trombótica caracterizada por anemia
hemolítica e trombocitopenia, mas com predomínio de envolvimento da microcirculação renal. Ela pode estar associada ao uso de
medicações imunossupressoras como a ciclosporina e o tacrolimo,
bem como a agentes antineoplásicos como a mitomicina-C, a carboplatina e a gemcitabina.
Além disso, a SHU pode ser uma complicação clínica secundária
ao transplante alogeneico de medula óssea, com uma incidência em
torno de 15%, podendo ocorrer também no contexto do transplante
autólogo (5%). Em transplantados, as infecções pelo citomegalovírus
também podem causar a SHU.
O tratamento é incerto. Deve-se tratar ou remover, se possível, o
fator desencadeante. Nesses casos, a plasmaférese não parece eficaz e
o prognóstico é sombrio.
Distúrbios hemorrágicos adquiridos
associados a neoplasias hematológicas
Leucemia promielocítica aguda (LPA)
A LPA caracteriza-se pela presença em número aumentado de
promielócitos anormais. Pode cursar com grave coagulopatia e deve
ser encarada como uma emergência médica, requerendo uma série de
medidas de suporte que devem ser iniciadas rapidamente e de forma
simultânea. Uma fração significativa desses pacientes desenvolve hemorragia fatal durante a avaliação diagnóstica, antes ou durante os
primeiros dias do tratamento de indução.
A fisiopatologia dessa coagulopatia é complexa, e os defeitos hemostáticos são múltiplos. O mecanismo patogênico mais convincente
aponta para propriedades da célula leucêmica, que por meio da liberação de uma série de mediadores ativa a coagulação através de três
mecanismos principais: CID, fibrinólise e liberação de enzimas procoagulantes. Esse processo é intensificado pela trombocitopenia e rápida
liberação celular de produtos tumorais induzidos pela quimioterapia.
A terapêutica apropriada para a LPA consiste no tratamento simultâneo da coagulopatia e da leucemia. O tratamento de escolha atualmente
consiste no uso do ácido transretinoico (ATRA) em combinação com
quimioterapia à base de antracíclicos. O ATRA atua beneficamente
sobre a coagulopatia de forma precoce, e deve ser iniciado nos casos
suspeitos, mesmo antes da comprovação citogenética e/ou molecular
da LPA. O tratamento de suporte consiste em transfusão vigorosa de
PFC, fibrinogênio e/ou crioprecipitado e plaquetas. Deve-se almejar um
fibrinogênio > 100 a 150 mg/dl e plaquetas > 30 a 50 x 109/L. A terapia
de reposição deve continuar até o desaparecimento total de sinais clínicos ou laboratoriais de coagulopatia, e deve ser intensificada em pacientes que têm fatores de risco adicionais (idade avançada,
hiperleucocitose, creatinina sérica aumentada, sangramento ativo). A melhora nos níveis de fibrinogênio é um bom marcador de resposta ao
tratamento. O papel do FVIIa recombinante ou do
complexo protrombínico para o tratamento de hemorragias graves na LPA permanece incerto, e recomenda-se que o uso de agentes procoagulantes
nesse contexto deva se restringir ainda a estudos
clínicos, tendo em vista o risco de complicações
trombóticas. Deve-se ainda evitar cateterização de
acesso venoso central, punção lombar ou outros
procedimentos invasivos antes e durante a terapia
de indução, enquanto a coagulopatia estiver presente, clinica e/ou laboratorialmente.
Outras leucemias e síndrome mielodisplásica
(SMD)
A trombocitopenia é a causa mais comum de sangramento relacionado a essas condições. Entretanto, nos
pacientes com contagens de plaquetas normais ou
elevadas, complicações hemorrágicas podem estar associadas a disfunção plaquetária adquirida ou até
mesmo a morfologia alterada dos megacariócitos.
Defeitos adquiridos de plaquetas relacionados a manifestações hemorrágicas são mais comuns nas leucemias mieloides agudas (LMA), mas têm sido
descritos, também, em leucemias linfoblásticas e
mielomonoblásticas, tricoleucemia e síndromes mielodisplásicas (SMD). Outros fatores de risco, como
hipertensão, anormalidades intravasculares, sépsis,
CID, alterações dos fatores de coagulação e hiperleucocitose podem contribuir para hemorragias. A infiltração hepática por células leucêmicas pode
comprometer a produção de fatores de coagulação. A
coagulopatia mais comumente encontrada em LLA
está relacionada ao uso da L-asparaginase, que diminui a síntese hepática de certas proteínas, alterando
a produção de fatores da coagulação. Felizmente, apesar dos baixos níveis de fibrinogênio nesses casos, o
sangramento é raro. Os sintomas dependem da gravidade da tendência hemorrágica e de sua localização,
e consistem em epistaxe, hematúria, sangramento
gastrintestinal, petéquias e até mesmo sangramento
intracraniano, cursando, por exemplo, com cefaleia
e turvação visual.
A correção da causa subjacente, quando possível, é o melhor tratamento. Transfusão profilática
de plaquetas tem sido universalmente aplicada
como terapia de suporte em pacientes portadores
de leucemias agudas e está indicada nos pacientes
com plaquetas < 10.000/µl, sistematicamente, ou
naqueles com > 10.000/µl e sangramento ativo. O
tratamento para a coagulopatia consiste na infusão
de PFC, complexo protrombínico, ATIII e concentrado de fibrinogênio, quando indicados. O ácido
tranexâmico e similares podem ser considerados
em estados hiperfibrinolíticos, sendo contraindicados em sangramentos de trato urinário. Medidas locais como a infiltração de vasoconstritores, a
embolização arterial ou até mesmo a intervenção
cirúrgica podem ser consideradas. Radioterapia
pode ser usada com efeito hemostático em alguns
casos de sangramento genital ou pulmonar.
Na SMD, múltiplos defeitos funcionais são encontrados nas plaquetas. Isso inclui redução na
agregação plaquetária e diminuição dos estoques
de plaquetas, do FvW e do fibrinogênio. Nesses
pacientes, as hemorragias podem acontecer
mesmo na vigência de plaquetas > 50.000/µl e suporte transfusional.
Síndromes mieloproliferativas (SMP)
Tendência a sangramento e defeitos qualitativos de
plaquetas são comumente encontrados nas SMP.
Essas anormalidades refletem características do clone
leucêmico, assim como alterações adquiridas nas plaquetas circulantes. Descrevem-se a diminuição do receptor alfa-2 adrenérgico plaquetário e da produção
de tromboxano-A2 e anormalidades da expressão
dos complexos GPIIb-IIIa, GPIb e GPIa-IIa. Anormalidades adquiridas do FvW plasmático têm sido
documentadas em pacientes com SMP e elevadas
contagens plaquetárias, e estão relacionadas a hemorragias. O FvW plasmático (particularmente os
grandes multímeros) está diminuído, tendendo a se
normalizar após o tratamento citorredutor.
“Não importa quão
grave seja a situação, deve-se sempre
tentar obter uma
história completa,
que inclua sintomas
associados, tempo
de evolução e tratamentos/medicações
recentemente
realizados.”
Disproteinemias
A disproteinemia consiste na produção anormal de
imunoglobulinas, que podem interferir nas várias
fases da coagulação e acarretar hemorragias. Interações fisiopatológicas entre paraproteínas e fatores de
coagulação, plaquetas e vasos sanguíneos podem
produzir anormalidades hemostáticas. Coagulopatias
têm sido descritas em pacientes com amiloidose
primária (AL), macroglobulinemia de Waldenström
(MW), mieloma múltiplo (MM) e gamopatia monoclonal de significado indeterminado (GMSI). Piora
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na função plaquetária, demonstrada por aumento do tempo de sangramento ou alterações da curva de agregação plaquetária, tem sido associada a hemorragias clinicamente significativas relacionadas a altos níveis
de imunoglobulina, principalmente de IgM. O mecanismo fisiopatológico seria a infiltração das plaquetas por paraproteínas. A correção
dessas alterações pela plasmaférese sugere que também a hiperviscosidade esteja relacionada. A DvW adquirida pode complicar o curso de
neoplasias, particularmente os linfomas. A deficiência do FX, isolada ou
não, é a coagulopatia mais comumente descrita na amiloidose, e o grau
de deficiência do FX não se correlaciona com a gravidade do sangramento. A reposição do FX com PFC ou complexo protrombínico corrige
essa deficiência adquirida. Opções adicionais incluem esplenectomia e
FVIIa. A resposta à quimioterapia é geralmente insatisfatória.
Complicações do tratamento
antitrombótico nas neoplasias
A principal complicação do tratamento antitrombótico são as hemorragias e, menos frequentemente (< 1%), a necrose de pele ou de tecidos. Os sinais, os sintomas e o grau de severidade variam de acordo
com a localização, o grau e a extensão do sangramento. Além disso,
reações de hipersensibilidade também podem ocorrer. O risco de hemorragia está relacionado com a intensidade e a duração da terapia e
pode resultar em morte ou deficiência permanente. A necrose está associada a trombose local, e usualmente surge cinco dias após o início
do tratamento. A amputação do órgão acometido e o debridamento
fazem parte do tratamento. O tratamento antitrombótico também
pode levar à liberação de placas ateromatosas e desencadear a “síndrome dos dedos roxos”.
Outros fatores, como viagens, mudanças na dieta, fatores ambientais e físicos, doenças associadas e uso concomitante de medicações, podem influenciar na resposta ao tratamento e aumentar
os riscos de complicações.
Antagonistas da vitamina K
Os antagonistas da vitamina K (warfarina, coumadin) inibem os fatores
de coagulação dependentes da vitamina K (II, VII, IX e X) e as proteínas
C e S, anticoagulantes naturais. Eles não têm efeito direto em um trombo
já estabelecido e também não revertem o dano tecidual isquêmico. Entretanto, uma vez que o trombo tenha se instalado, o objetivo é prevenir
a sua extensão e as complicações tromboembólicas secundárias que
podem resultar em sequelas fatais.
Os principais determinantes do risco de sangramento são a intensidade do efeito anticoagulante, as características do paciente (idosos e
comorbidades associadas), o uso concomitante de drogas que interferem
na hemostasia (aspirina, acetaminofeno e anti-inflamatórios não esteroidais) e a duração do tratamento. A intensidade do efeito anticoagulante é o fator de risco mais importante para a hemorragia
intracraniana, independentemente da indicação. O risco dobra a cada
1,0 ponto a mais no INR. A medicação deve ser descontinuada e a vi-
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tamina K oral ou intravenosa administrada, dependendo da intensidade
do sangramento, pois oferece vantagens sobre a vitamina K subcutânea
e sobre o plasma. O INR começa a diminuir somente de 12 a 36 horas
após a suspensão do anticoagulante. Para os pacientes sem sangramentos
e com INR alto mas < 5, a vitamina K pode ser omitida ou administrada
com dose reduzida. Para os pacientes com INR entre 5 e 10, deve-se administrar de 1 a 2,5 mg de vitamina K por via oral ou, dependendo da
urgência, por via intravenosa, juntamente com o plasma. Quando o INR
for maior que 10, a dose deve ser de 2,5 a 5 mg. Nos pacientes com
risco de hemorragia intracraniana, deve-se administrar 10 mg de vitamina K intravenosa, e também considerar o plasma e o complexo protrombínico para uma correção mais rápida.
Agentes antiagregantes plaquetários
O ácido acetilsalicílico (AAS) inibe a via da ciclo-oxigenase através da
acetilação de aminoácidos. As principais complicações decorrentes do
seu uso incluem sangramentos, reações alérgicas (broncoespasmo), úlceras gástricas, constipação e insuficiência renal. O risco de acidente vascular cerebral hemorrágico (AVCh) é de aproximadamente 1 em 2.500
pacientes/ano. As complicações podem ser resolvidas ou diminuídas com
a redução ou suspensão da dose, a associação de protetores gástricos, a
troca por outro agente antitrombótico ou até mesmo com a transfusão
de plaquetas ou com a desmopressina, em casos emergenciais.
Há pouca informação sobre o manuseio das complicações hemorrágicas que envolvem outros agentes, como ticlopidina, clopidogrel,
dipiridamol, prasugrel ou abciximab. No entanto, a transfusão de plaquetas também está indicada nesses casos.
Alguns estudos in vitro sugerem que a adição de crioprecipitado
pode ajudar a restaurar a função plaquetária em pacientes que usam o
tirofiban, o eptifibatide ou outros agentes antiagregantes que inibem os
receptores plaquetários para o fibrinogênio.
Heparina
A heparina é utilizada para a profilaxia ou o tratamento da trombose.
Ela aumenta a velocidade da ligação entre antitrombina e trombina e
age como catalisador na reação de inativação da trombina. Inibe a coagulação através de alterações na função plaquetária e na permeabilidade
capilar e tem o potencial de causar sangramento em menos de 3% dos
pacientes, que pode ser revertido com o uso de sulfato de protamina
(na maioria das situações, desnecessário, pois a heparina padrão tem
meia-vida curta, de 30 a 60 minutos). A HBPM tem meia-vida mais
longa e requer o uso de protamina. A dose varia de 0,5 a 1 mg para
cada 100 U de heparina administrada. Ela não reverte completamente
o efeito da HBPM, mas pode neutralizar o efeito antitrombótico.
A heparina também pode induzir trombocitopenia, mas raramente
é uma causa importante de sangramento. Ocorre em 1% a 3% dos pacientes com trombose venosa profunda que recebem heparina não fracionada e em menos de 1% com HBPM. A trombocitopenia aparece
de 5 a 10 dias após o início da terapia, mas também pode ocorrer mais
cedo em pacientes que fizeram tratamento recente com heparina. É
mais comum em pacientes com câncer e apresenta taxas altas de complicações trombóticas. É uma condição pró-trombótica associada a um
aumento da trombina, evidenciada pela presença de níveis elevados
de complexos trombina-antitrombina. É considerada uma síndrome
de hipercoagulabilidade adquirida importante. O diagnóstico é clínico
e laboratorial (teste de agregação com heparina e ELISA para a detecção
de anticorpos antiplaquetários). A frequência da síndrome em pacientes tratados com heparina é altamente variável e influenciada pela
preparação da heparina (heparina fracionada bovina > heparina fracionada porcina > HBPM) e pelo perfil dos pacientes que recebem o
tratamento (cirurgias, gravidez). Ocorre queda inexplicada e repentina
das plaquetas, em mais de 50%, já nas primeiras 24 horas e até 4 dias
após o início da aplicação. Raramente podem surgir lesões cutâneas
ou reações sistêmicas agudas após a administração intravenosa.
A heparina deve ser suspensa e recomenda-se a substituição por
anticoagulantes como a lepirudina e o argatroban, a bivalirudina ou
danaparoide, ou por inibidores diretos da trombina, como a hirudina
ou o ximelagatran. Usualmente eles são bem tolerados e apresentam
risco mínimo de sangramentos.
1. Estreptoquinase (SK)
É obtida a partir de culturas de estreptococos-hemolíticos e, por ser um
antígeno, pode causar reações alérgicas. Raramente, anafilaxia (0,5%),
mas tremores, rash cutâneo ou febre podem ocorrer em até 10% dos pa-
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cientes tratados. A eficácia da estreptoquinase não é reduzida pela reação
alérgica, mas deve ser evitada a sua reutilização por um período de um a
dois anos. A hipotensão pode ocorrer durante administração rápida da
solução (acima de 500 U/kg/min), mas geralmente responde a líquidos,
dopamina, diminuição da velocidade de infusão, e raramente é necessária
a interrupção. O pequeno sangramento é a complicação mais comum,
ocorrendo em 3% a 4% dos pacientes, geralmente nos locais de punção.
Os grandes sangramentos, por definição os que necessitam de transfusão
de sangue, são menos comuns. O risco de AVCh é menor que 1% em
todos os pacientes e, em pacientes acima dos 70 anos, é de 1,6%.
2. Ativador tecidual do plasminogênio (t-PA)
A principal complicação do tratamento com t-PA é o sangramento. A
incidência de AVCh em pacientes com mais de 70 anos é 1% maior
do que nos tratados com estreptoquinase. Esse risco pode aumentar
em pacientes com peso < 70 kg, pressão arterial > 170/95 mmHg e
uma heparinização agressiva.
3. Anistreplase (APSAC)
As complicações são semelhantes às da estreptoquinase. Por ser um
antígeno, deve-se evitar reutilizá-la pelo período de um ano.
4. Uroquinase
É frequentemente utilizado para trombólise nas salas de hemodinâmica
e para tratamento da embolia pulmonar grave.
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