Repercussão da Hemodiálise na Função Pulmonar de Pacientes

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Artigo Original
Repercussão da Hemodiálise na Função Pulmonar de Pacientes com
Doença Renal Crônica Terminal
Repercussion of Hemodialysis on the Pulmonary Function of Terminal
Chronic Renal Patients
Patrícia Dall Agnol Bianchi1, Sérgio Saldanha Menna Barreto2, Fernado S. Thomé3, Adriane Belló Klein4.
1Universidade
Federal do Rio Grande do Sul. Docente da Universidade de Cruz Alta - RS, Brasil; 2Médico Doutor, Professor Titular,
Departamento de Medicina Interna, Faculdade de Medicina, Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Serviço de Pneumologia,
Hospital de Clínicas de Porto Alegre - RS, Brasil; 3Médico Doutor, Professor Auxiliar de Ensino do Departamento de Medicina Interna
da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Chefe do Serviço de Nefrologia do Hospital de Clínicas de Porto Alegre - RS, Brasil;
4Bióloga, Doutora Professora Adjunta – Departamento de Fisiologia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul – Porto Alegre – RS,
Brasil.
Dados parciais da Dissertação de Mestrado de Patrícia Dall’Agnol Bianchi. Título: Avaliação da Função Pulmonar e Estresse Oxidativo
em Pacientes com Insuficiência Renal Crônica em Hemodiálise. Agosto de 2003. Programa de Pós-Graduação em Ciências Biológicas –
Fisiologia, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS. Agências de Fomento: CNPq, FIPE/HCPA.
RESUMO
Introdução: Pacientes com doença renal desenvolvem frequentemente complicações pulmonares como edema, derrame pleural e
infecção. Método: A avaliação respiratória deu-se através de exames de espirometria, manovacuometria, oximetria e gasometria, antes
e depois de sessão de hemodiálise (HD). As variáveis espirométricas foram analisadas em percentagens de valores de referência com
o objetivo de eliminar efeitos da idade, altura e sexo. Resultados e Discussão: Avaliaram-se 33 pacientes (51,5% mulheres) com
média de idade 42,8 ± 14,2 anos, em tratamento no Hospital de Clínicas de Porto Alegre. A capacidade vital forçada (CVF), o volume
expiratório forçado no primeiro segundo (VEF1) e o pico de fluxo expiratório (PFE) apresentaram um aumento significativo após sessão
de HD, o que determinou um aumento no número de espirometrias normais, passando de 12 (36,4%) para 17 (51,5%). A força muscular
também apresentou aumento significativo. A oximetria permaneceu inalterada após HD, o que pode ser explicado pelos resultados da
gasometria, pois, após HD, houve um aumento substancial no pH e nos níveis de bicarbonato, caracterizando quadro de alcalose
metabólica. Observou-se, também, queda na pressão parcial de oxigênio e aumento na pressão parcial de dióxido de carbono,
provavelmente na tentativa de restabelecer o valor do pH. Conclusões: Mesmo sem apresentar sintomas respiratórios, pacientes renais
crônicos apresentam alteração na função pulmonar que melhora após tratamento com HD.
Descritores: Uremia. Espirometria. Manovacuometria.
ABSTRACT
Introduction: Renal disease patients frequently develop pulmonary complications such as edema, pleural vascular accident, and infection.
Method: Respiratory evaluation was performed through spirometric exams, manovacuometry, acidimetry and gasometry before and after the
hemodialysis session (HD). Spirometric variables were analysed in reference percentage values in order to eliminate the effects of age, height,
and gender. Results and Discussion: A total of 33 patients were evaluated, (51.5% females) averaging 42.8 ± 14.2 years old, receiving
treatment at the Clinical Hospital of Porto Alegre. Forced Vital Capacity (FVC), forced expiratory volume in the first second (FEV1) and the
peak of expiratory flow (PEF) showed a significant increase after the HD session, leading to an increase in the number of normal spirometries,
from 12 (36.4%) to 17 (51.5%). Muscular strength also significantly increased. Acidimetry remained unchanged after HD and this may be
explained by the gasometry results, given that a significant increase in pH and bicarbonate levels was evident after HD, characterizing a
metabolic alkalosis panel. We also observed a decrease in the partial oxygen pressure and an increase in the partial carbon dioxide pressure,
probably due to an attempt to reestablish the pH value. Conclusions: Even without showing respiratory symptoms, chronic renal patients
show alterations in pulmonary function which improve after treatment with HD.
Keywords: Uremia. Spirometry. Manovacuometry.
Recebido em 18/06/08 / Aprovado em 02/02/09
Endereço para correspondência:
Patrícia Dall’Agnol Bianchi
Rua: Barão do Rio Branco 1.485/1.003.
Cruz Alta, RS, Brasil
CEP: 98005 - 030
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Hemodiálise na Função Pulmonar de Doentes Renais Crônicos
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INTRODUÇÃO
A doença renal crônica terminal representa, não
somente a falência da excreção renal, mas também das
funções metabólicas e endócrinas dos rins, afetando todos
os órgãos do corpo. A disfunção pulmonar em doentes
renais crônicos terminais pode ser resultado direto da
circulação de toxinas urêmicas ou pode resultar da sobrecarga de volume, anemia, imunossupressão, desequilíbrio ácido-básico e ou má nutrição. Em contraste com
outros órgãos, os pulmões são afetados por ambos,
doença (uremia) e tratamento, HD ou diálise peritoneal
ambulatorial contínua (CAPD)1.
Pacientes com doença renal aguda ou crônica,
tratados ou não com diálise, desenvolvem frequentemente
complicações pulmonares, como edema, derrame pleural
e infecção1. Alterações mecânicas e hemodinâmicas
podem ocorrer nos pulmões de pacientes com insuficiência renal crônica. Essas mudanças podem ocorrer sem
sintomas pulmonares óbvios, podendo levar a desordens
pulmonares2.
Nestes pacientes, as forças pressóricas na equação
de Starling geralmente favorecem o edema pulmonar secundário. Pressões hidrostáticas na circulação central podem estar altas em função do aumento do volume intravascular, doença cardíaca ou ambos. A pressão oncótica
pode também estar baixa por causa da hipoproteinemia,
predispondo a edema pulmonar.
Essas alterações presentes nas pressões vasculares,
por si sós, podem levar à formação de infiltrados e edema
pulmonar. Porém, a função pulmonar parece estar alterada
na insuficiência renal crônica por diferentes mecanismos:
sobrecarga de fluidos (alterando pressões vasculares),
infecções respiratórias, acidose, fibrose pulmonar, calcificações e alterações na ventilação/perfusão do pulmão
de pacientes urêmicos 3-6 .
As complicações pulmonares observadas com
maior frequência em doentes renais crônicos terminais
são edema pulmonar clínico ou subclínico e derrame
pleural. Porém, além dessas, observa-se também a
ocorrência de fibrose pulmonar, hipertensão pulmonar e
fibrose pleural2.Segundo Alves et al.7, as alterações
pulmonares, geralmente designadas por pulmão urêmico,
caracterizam-se por edema peri-hilar bilateral e parecem
estar relacionadas com aumento da volemia e com valores
séricos muito altos de substâncias osmoticamente ativas.
Com o início do tratamento hemodialítico, entretanto, desaparecem rapidamente, sem deixar sequelas.
Uma das informações postuladas é que o efeito
HD gera um aumento da ventilação nas áreas basilares do
pulmão, provocando uma elevação da capacidade vital
em pacientes urêmicos com edema pulmonar. Essas
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mudanças são explicadas pela diminuição do conteúdo de
água nos pulmões, desde que o edema intersticial seja
razoavelmente pequeno, causando fechamento relativo
das vias aéreas6.
Complicações pulmonares são comuns em pacientes em estágio final da doença renal. Apesar dos
avanços tecnológicos com relação às terapias de substituição, permitindo prolongar a vida dos pacientes urêmicos, anormalidades como hiperemia, bronquite e fibrose
intersticial são comumente encontradas em autópsias de
pacientes em hemodiálise crônica 8.
Este estudo teve como objetivo avaliar, em doentes
renais crônicos terminais, a repercussão de uma sessão de
HD em sua função pulmonar e força muscular respiratória.
MÉTODO
Seleção de Pacientes
Foram avaliados pacientes com insuficiência renal
crônica terminal que realizavam hemodiálise na Unidade de
Nefrologia do Hospital de Clínicas de Porto Alegre. Para
realização do estudo, os pacientes foram avaliados em uma
sessão de hemodiálise em que não tivesse transcorrido mais de
48 horas desde a sessão anterior.
Utilizaram-se, como critérios de exclusão, presença de
doenças hepáticas, processos inflamatórios crônicos, doença
cardíaca conhecida, consumo de tabaco e de álcool.
Para que os pacientes pudessem participar do estudo,
era necessário que os mesmos não possuíssem nenhuma doença
pulmonar de base e que não tivessem apresentado nenhum
episódio respiratório nos últimos seis meses. Por esse motivo,
foram avaliadas radiografias de tórax e história clínica dos mesmos dos seis meses anteriores ao estudo. Além disso, no dia das
avaliações, o paciente deveria estar sem nenhum tipo de sintoma
respiratório.
Todos os pacientes foram informados dos objetivos,
benefícios, riscos e da metodologia que seria aplicada para a
realização do trabalho. Antes das avaliações, os mesmos assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido. O projeto
deste estudo foi avaliado e aprovado em seus aspectos éticos e
metodológicos pela Comissão Científica e pela Comissão de
Pesquisa e Ética em Saúde do HCPA.
Oximetria
Para avaliação da saturação de oxigênio, utilizou-se um
oxímetro da marca Nellcor Puritan Bennett – NPB 195.
Mensurou-se a saturação de O2, através de técnica espectrofotométrica, antes e depois da sessão de HD9. As medidas de saturação foram realizadas antes das outras avaliações respiratórias,
já que estas exigiam esforço dos pacientes e isso poderia interferir nos resultados. Os resultados eram apresentados em
percentual no visor do aparelho.
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Mensuração das Pressões Respiratórias Máximas
Coleta Sanguínea
Para mensuração das pressões respiratórias máximas,
utilizou-se um manovacuômetro da marca FAMABRAS,
calibrado em cmH2O, com limite operacional de –300 cmH2O a
+300 cmH2O. No adaptador do bocal do manovacuômetro
(modelo 0001 da marca ROWAN), utilizou-se um orifício de
1,5mm de diâmetro, para gerar um discreto fluxo de ar, evitando
o fechamento da glote e aumento da pressão da cavidade oral,
impedindo, com isso, alteração dos valores obtidos.
A mensuração das pressões respiratórias máximas foi
realizada antes de o paciente ser conectado à máquina dialisadora e após o término da sessão de hemodiálise. Em cada
tempo determinado, o paciente realizava cinco manobras de
Pressão Inspiratória Máxima (PImáx) e cinco manobras de Pressão Expiratória Máxima (PEmáx), desde que a última não fosse
a maior da série e que a variabilidade entre as medidas não
excedesse a 10% com relação ao maior valor obtido.
Durante a realização do teste, os pacientes permaneceram sentados, com as narinas ocluídas por um clipe nasal; o
próprio paciente segurava firmemente o bocal contra os lábios,
evitando vazamento perioral de ar10-14. A PImáx foi medida
durante esforço iniciado a partir do volume residual e a PEmáx
foi medida durante esforço iniciado a partir da capacidade pulmonar total. Solicitou-se aos pacientes que as pressões fossem
mantidas por três segundos15. O intervalo entre as manobras foi
determinado pelos próprios pacientes, e o maior valor obtido
para PImáx e para PEmáx foi o valor considerado para análise
dos resultados.
As coletas de sangue para avaliação dos gases respiratórios, hemograma e medidas bioquímicas, nos pacientes em
HD, foram realizadas em dois momentos distintos: no início da
sessão de HD, quando os pacientes eram ligados às máquinas
dialisadoras, e ao término da sessão, instantes antes de serem
desligados das mesmas. As coletas foram realizadas na porção
arterial da fístula arteriovenosa.
Prova de Função Pulmonar Respiratória – Espirometria
Os pacientes realizaram duas espirometrias: uma antes
do início da sessão e outra após a sessão de HD.As espirometrias
foram realizadas utilizando-se um espirômetro portátil modelo
Pony da marca Cosmed, que fornece curvas fluxo volume e
volume tempo. Os bocais utilizados eram de papel e descartáveis, da marca Xenon, com 3,5cm de diâmetro.
Realizou-se este exame através de manobras expiratórias forçadas. Solicitou-se ao paciente uma inspiração máxima até CPT e, imediatamente após, uma expiração tão rápida
e intensa quanto possível. O paciente foi estimulado, durante
todo o exame, a realizar esforço máximo, bem como a expirar
todo o ar possível, já que isso é fundamental para a realização
adequada do exame.
Os exames foram realizados observando-se os critérios
para espirometria de boa qualidade16. Para interpretação,
utilizou-se a melhor curva obtida. A análise dos exames foi
realizada de acordo com Pereira et al.16. Procurando eliminar os
efeitos da idade, altura e sexo, utilizaram-se percentagens de
valores de referência previstos em substituição aos valores absolutos obtidos.
As variáveis foram avaliadas em percentagens de
valores previstos, eliminando, dessa forma, possíveis efeitos relacionados com altura, sexo e idade dos pacientes. Como
valores de referência, utilizaram-se equações preconizadas por
Knudson et al.17.
Análise Estatística
Os valores foram expressos pela média ± erro-padrão.
Comparações entre as médias pré e pós HD foram feitas pelo
teste t de Student pareado. Para analisar as correlações entre as
variáveis, utilizou-se o teste de Pearson. Foram considerados
significativos os valores de p<0,05. Os dados foram analisados
através do programa computacional SAS (Statistical Analysis
System).
RESULTADOS
Foram avaliados 33 pacientes com insuficiência
renal crônica terminal, 17 mulheres e 16 homens, com
média de idade de 42,8 ± 14,3 anos. Os pacientes
realizavam três sessões semanais de HD com duração
média de 4,2 ± 0,3 horas, utilizando para diálise membrana de acetato de celulose. A média de tratamento com
HD nos pacientes estudados foi de 47,2 ± 47,7 meses.
Citam-se entre as causas da IRC nos pacientes:
45,5%, hipertensão arterial sistêmica; 15,1%, glomerulopatias; 9,1%, Diabete Melitus; 9,1%, rins policísticos;
15,1%, outras e 6,1%, causa indeterminada.
Avaliação da Função Pulmonar – Espirometria
Os valores obtidos na prova de função pulmonar
– espirometria - estão apresentados na Tabela 1. Pode ser
observado que, com exceção do fluxo médio da CVF,
todas as demais variáveis avaliadas pela espirometria
melhoraram significativamente após sessão de HD.
Laudos Espirométricos
No diagnóstico espirográfico, a comparação dos
valores obtidos com os valores teóricos ou previstos pode
demonstrar alterações no conjunto, caracterizando os distúrbios que são classificados como obstrutivos, restritivos ou
mistos, em grau incipiente, leve, moderado ou grave.
As espirometrias realizadas pelos doentes renais
crônicos, antes e depois de sessão de HD, foram individualmente interpretadas, possibilitando a realização de
uma avaliação clínica da função pulmonar nestes
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Hemodiálise na Função Pulmonar de Doentes Renais Crônicos
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Tabela 1. Variáveis espirométricas antes (Pré HD) e após (Pós
HD) sessão de hemodiálise. Dados apresentados em
percentagens de valores previstos segundo Knudson et al., 1983.
Capacidade Vital Forçada (CVF); Volume expiratório Forçado no
Primeiro Segundo (VEF1); Pico de Fluxo Expiratório (PFE); Fluxo
Expiratório Forçado Médio da CVF (FEF25-75% CVF).
Variável
Pré HDa
Pós HDa
CVF (%)
VEF1(%)
PEF (%)
FEF25-75% CVF
78,1±2,6
80,3±2,5
86,6±3,4
71,0±4,0
81,3±1,8*
84,1±2,2*
93,3±3,4*
74,2±4,4
aValores expressos em média e erro padrão. Diferença significativa (*) pelo teste t (p<0,05).
Figura 2. Classificação dos laudos espirométricos de doentes
renais crônicos após uma única sessão de hemodiálise (HD).
Normal, distúrbio ventilatório restritivo leve (DVRLeve), distúrbio
ventilatório restritivo moderado (DVRMod), distúrbio ventilatório
restritivo grave (DVRGrave), distúrbio ventilatório combinado leve
(DVCLeve), distúrbio ventilatório obstrutivo incipiente (DVOInc),
distúrbio ventilatório obstrutivo leve (DVOLeve), distúrbio ventilatório obstrutivo leve com capacidade vital forçada reduzida
(DVOLeveCVFRed), distúrbio ventilatório obstrutivo moderado
com capacidade vital forçada reduzida (DVOModCVFRed).
Avaliação da Força Muscular Respiratória
Figura 1. Classificação dos laudos espirométricos de doentes
renais crônicos antes de uma sessão de hemodiálise (HD).
Normal, distúrbio ventilatório restritivo leve (DVRLeve), distúrbio
ventilatório restritivo moderado (DVRMod), distúrbio ventilatório
restritivo grave (DVRGrave), distúrbio ventilatório combinado leve
(DVCLeve), distúrbio ventilatório obstrutivo incipiente (DVOInc),
distúrbio ventilatório obstrutivo leve (DVOLeve), distúrbio ventilatório obstrutivo leve com capacidade vital forçada reduzida
(DVOLeveCVFRed), distúrbio ventilatório obstrutivo moderado
com capacidade vital forçada reduzida (DVOModCVFRed).
indivíduos 16,18. Para melhor visualização, os laudos, em
percentual de classificação, referentes aos dados espirométricos Pré HD, estão apresentados na Figura 1, e os
laudos referentes aos dados espirométricos Pós HD estão
apresentados na Figura 2.
Nas espirometrias realizadas antes da HD, observou-se que apenas 12 (36,4%) pacientes apresentaram
espirometria normal e 21 (63,6%) pacientes apresentaram
algum tipo de anormalidade respiratória. Após sessão de
hemodiálise, houve um aumento no número de espirometrias normais, 17 (51,5%) pacientes apresentaram espirometria normal e 16 (48,5%) pacientes apresentaram
algum tipo de anormalidade respiratória.
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Os dados obtidos, antes e depois de sessão de HD,
para a força muscular respiratória, estão apresentados na
Tabela 2. Pode ser observado, na referida figura, que tanto
a força muscular inspiratória quanto a força muscular
expiratória, avaliadas através da manovacuometria, apresentaram melhora significativa após sessão de hemodiálise.
Avaliação Complementar
Para melhor visualização, os dados referentes às
variáveis bioquímicas, gasometrias arteriais e oximetrias,
avaliadas antes e depois de sessão de HD, estão apresentados na Tabela 3. Pode ser observado que não houve
variação significativa na saturação de oxigênio, tanto
quando avaliada através da gasometria, como quando
avaliada pela oximetria. A PaCO2, o pH e o HCO3 apresentaram aumento significativo e a PaO2 apresentou
redução significativa após HD.
Também foi avaliado o hemograma dos pacientes.
Dados deste exame, hematócrito (%) (34,6±1,0) e hemoglobina (g/dL) (11,1±0,3), utilizados para analisar possíveis correlações entre as variáveis, foram avaliados
apenas antes da sessão de HD.
A variação do percentual de perda de peso corporal
(%) (4,04±0,3) durante sessão de HD também foi utilizada para avaliar possíveis correlações entre as variáveis
estudadas. As principais correlações significativas entre
29
Tabela 2. Avaliação da Pressão Inspiratória Estática Máxima
(PImáx) e Pressão Expiratória Estática Máxima (PEmáx), antes
(Pré HD) e após (Pós HD) sessão de hemodiálise, em percentagem de valores previstos segundo Black & Hyatt, 1969.
Tabela 4. Principais correlações significativas observadas entre
variáveis espirométricas, tempo de tratamento com HD e variação
percentual de perda de peso corporal durante sessão de HD.
Variáveis
Variável
PImáx (%)
PEmáx (%)
Pré HDa
Pós HDa
72,71±3,93
77,57±2,03
86,01±3,19 *
83,12±2,62 *
a Valores expressos em média e erro padrão. Diferença significativa (*) pelo teste t (p<0,05).
Tabela 3. Gasometria arterial e variáveis bioquímicas, de doentes renais crônicos antes (Pré HD) e após (Pós HD) uma sessão
de hemodiálise (HD).
Variável
PaO2 (mmHg)
PaCO2 (mmHg)
HCO3- (mmol/l)
pH
Sat O2 (%)
Oximetria (%)
Uréia (mg/dl)
Creatinina (mg/dl)
Potássio (mEq/l)
Sódio (mEq/l)
Fósforo (mg/dl)
Ácido úrico
Pré HD a
Pós HD a
94,99 ± 3,42
40,49 ± 0,81
25,72 ± 0,73
7,41 ± 0,008
95,93 ±1,0
97,84 ± 0,16
138,51± 6,07
7,63 ± 0,31
4,93 ± 0,17
137,78 ± 0,42
6,18 ± 0,30
6,15 ± 0,23
89,71± 3,54*
43,00 ± 0,76*
33,30 ± 0,69 *
7,50 ± 0,008*
95,73 ± 1,16
97,24 ± 0,47
57,42 ± 4,39*
3,17 ± 0,17*
3,24 ± 0,08*
138,54 ± 0,46
3,52 ± 0,16*
4,49 ± 0,20*
Valores expressos em média ± erro padrão. Diferença significativa (*) entre Pré e Pós HD pelo teste t (p<0,05).
as variáveis espirométricas, tempo de tratamento com HD
e variação percentual de perda de peso corporal durante
sessão de HD estão apresentadas na Tabela 4. Salientamse as correlações negativas observadas entre o tempo de
hemodiálise e a CVF dos pacientes e, também, a correlação negativa entre o tempo de tratamento e a melhora da
CVF após a HD.
DISCUSSÃO
Avaliando-se as espirometrias obtidas antes da sessão de HD, observou-se uma correlação negativa da CVF e
VEF1 com o tempo que os pacientes estavam em tratamento hemodialítico, ou seja, quanto maior o período de
tempo em que os pacientes estavam fazendo hemodiálise,
menores os valores de CVF e VEF1 obtidos pelos mesmos.
Observou-se, também, uma correlação negativa
entre tempo de tratamento com hemodiálise e variação da
CVF durante uma sessão deste tratamento. Portanto, além
de obterem menores índices de CVF, os pacientes que realizam HD por um período maior de tempo também foram os
pacientes que não melhoraram a CVF após sessão de HD.
Os laudos espirométricos apresentaram mudanças;
antes da HD, observou-se que apenas 37% dos pacientes
r
Variação CVF X Variação VEF1
Variação PFE X Variação CVF
Variação PFE X Variação VEF1
Variação FEF25-75% X Variação VEF1
Variação PEmáx X Variação VEF1
Variação PFE X Variação PEmáx
Variação PFE X Variação Pimáx
Variação PFE X Variação FEF25-75%
Variação PImáx X Variação CVF
Variação PEmáx X Variação CVF
Variação % perda peso X Variação VEF1
Meses de HD X Variação CVF
Meses HD X Pré CVF
Meses HD X Pré VEF1
0,80
0,40
0,48
0,59
0,33
0,51
0,64
0,36
0,41
0,33
0,37
-0,37
-0,57
-0,40
**
*
**
**
ns
**
**
*
*
ns
*
*
**
*
Correlação não significativa (ns), significativa a 5% (*) e 1% (**)
de probabilidade pelo teste de Pearson.
apresentavam espirometria normal e que 63% apresentavam algum tipo de anormalidade respiratória. Dos pacientes com laudo espirométrico alterado, 71% apresentavam padrão respiratório restritivo com maior ou menor
grau de comprometimento da função pulmonar. Dos dez
pacientes que apresentavam um padrão respiratório obstrutivo, oito eram fumantes ou ex-fumantes.
O aumento significativo observado nas variáveis
espirométricas após HD foi suficiente para que 15% dos
pacientes avaliados normalizassem seu teste de função
pulmonar e 27% do total de pacientes avaliados apresentassem melhora que se refletiu na alteração de seus laudos
espirométricos. Após HD, 52% dos pacientes apresentavam espirometria normal e 48%, algum tipo de padrão
respiratório anormal.
Observou-se que a melhora ocorreu principalmente nos pacientes com padrão respiratório restritivo. Dos
pacientes com DVR leve, 50% normalizaram sua espirometria; os pacientes com DVR moderado e grave melhoraram seu quadro restritivo, passando a apresentar um
DVR leve. O paciente com DVR leve e CVF reduzida
normalizou a CVF e um paciente com DVC leve antes da
HD normalizou seu componente restritivo.
Após a HD, 21% dos pacientes ainda apresentavam padrão respiratório restritivo de grau leve; 21%,
algum grau de comprometimento obstrutivo e 6%, distúrbio ventilatório combinado.
A presença de doença pulmonar restritiva em pacientes urêmicos pode ser devido à calcificação pulmonar,
vasculite, infecção recorrente, sobrecarga de volume ou
edema pleural. Geralmente a capacidade vital não é acometida, a não ser que a causa seja sobrecarga de fluidos
ou doença cardíaca incipiente19.
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Hemodiálise na Função Pulmonar de Doentes Renais Crônicos
Quando ocorre acúmulo de água extravascular no
pulmão, esta ocupa primeiramente o tecido intersticial mais
periférico e, à medida que o seu volume vai aumentando,
estende-se para zonas axiais peri-hilares. O acúmulo de
água no período interdialítico relaciona-se com aumento da
pressão hidrostática. Isso, associado ao aumento nos valores séricos de substâncias osmoticamente ativas e aumento de permeabilidade, poderá condicionar a retenção de
água extravascular pulmonar sem que haja manifestações
clínicas ou radiológicas. Essa retenção, no entanto, seria
suficiente para modificar a expansibilidade pulmonar e a
permeabilidade das vias aéreas de menor calibre. Geralmente, com o tratamento hemodialítico, o edema desaparece rapidamente sem deixar sequelas importantes 2,7,19.
A ocorrência de insultos pulmonares repetidos pela
sobrecarga de fluidos pode danificar a parede alvéolocapilar e induzir a uma redução na capacidade de difusão
sem sintomas óbvios2. É possível que esses repetidos episódios de edema subclínico, que ocorrem no intervalo de
cada sessão de HD, possam induzir à fibrose intersticial,
justificando os índices mais baixos de CVF e VEF1 em
doentes renais em tratamento hemodialítico por um período
maior de tempo. Alguns autores têm dado atenção à fibrose
pulmonar, como um fator explicativo para o defeito na
difusão em pacientes com doença renal crônica, mas isso
não foi verificado histopatologicamente 2,6.
Um estudo realizado por Metry et al.20, utilizando
tomografia computadorizada, avaliou as mudanças de
fluidos nos pulmões de dez pacientes em hemodiálise, além
de avaliar os volumes e função pulmonar por pletismografia. Os autores observaram que houve aumento significativo da capacidade pulmonar total e capacidade residual
funcional após HD. O volume corrente também apresentou
melhora, porém este não foi estatisticamente significativo.
Apesar da melhora dos volumes pulmonares após HD,
estes permaneciam abaixo dos valores previstos. A perda de
líquido durante o tratamento era de 2,9 ± 1 litro.
Neste estudo, a hipervolemia pulmonar antes da HD
era manifestada por um aumento significativo da densidade
pulmonar quando comparada com indivíduos controle;
após a diálise, a redução na água corporal total era acompanhada por uma diminuição na densidade pulmonar.
Os resultados indicaram uma melhora na aeração
dos pulmões e ocorreu normalização da densidade pulmonar após HD em seis dos dez pacientes, porém a diminuição da densidade pulmonar foi um achado comum em todos os pacientes avaliados. Não houve correlação entre
mudanças da densidade pulmonar e grau de diálise. Os
autores acreditam que a distribuição de água após HD nos
compartimentos corporais é diferente de paciente para
paciente, e isso poderia ser a explicação para diferentes
variações da densidade pulmonar em pacientes com a
mesma variação percentual de peso corporal.
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Pode-se observar, através dos dados da gasometria
(Tabela 3), que a melhora das variáveis espirométricas
não se refletiu em melhora da oxigenação. Após a HD, os
pacientes apresentavam aumento significativo nos níveis
de HCO3 e pH, o que caracteriza um quadro de alcalose
metabólica.
Além do papel de oxigenação e eliminação de
CO2, os pulmões são fundamentais para o equilíbrio ácido-básico. Ácidos fixos são produzidos pelo metabolismo
tecidual e são continuamente eliminados pelos rins, sendo
que cerca de 40-80mEq de ácidos fixos são diariamente
removidos.
Nas condições em que a habilidade dos rins em
manter o equilíbrio foi perdida, os pulmões compensam o
desequilíbrio de forma aguda ou crônica, para preservar
um pH em níveis aceitáveis21. Quadros de hipoventilação
são descritos quando ocorre formação de bicarbonato em
pacientes dialisados por acetato, ou resultante de alcalose
metabólica intradialítica com altas doses de bicarbonato1.
Essa compensação respiratória é claramente observada
por aumento significativo nos níveis de PaCO2 e por
diminuição significativa nos níveis de PaO2 nos pacientes
após sessão de HD.
Como se pode observar, o PFE apresentou melhora
significativa após sessão de hemodiálise. O PFE apresentou
correlação significativa com CVF, VEF1, FEF25-75% e com a
força muscular respiratória (Tabela 4).
A monitorização sistemática do PEF, através de
um protocolo estabelecido e equipamento adequado, poderia, na impossibilidade de se realizar exames como
espirometria, volumes pulmonares ou RX, sinalizar alguma alteração na função pulmonar de doentes renais
crônicos em HD, já que a melhora dos índices de PFE
associa-se com a melhora das variáveis espirométricas e
da força muscular respiratória.
Mudanças no PFE durante a diálise são provavelmente o reflexo do balanço entre melhora esperada
devido à remoção de fluidos durante a diálise e broncoconstrição devido a bioincompatibilidade da membrana
de diálise5.
Alguns autores mostram um maior aumento no PFE
em indivíduos com perdas de líquido maiores que 2kg
durante sessão de hemodiálise. No presente estudo, não se
observou correlação significativa entre variação de peso
corporal e aumento nos níveis de PFE. A distribuição da
água corporal após HD é diferente em cada paciente e isso
pode explicar diferentes variações de PFE em pacientes
com a mesma perda percentual de peso corporal.
Além disso, o PFE é um parâmetro esforço dependente e pode ser utilizado como um índice da capacidade
de tossir, ou indiretamente da força muscular expiratória17,22. Aumento da força muscular expiratória, como
31
observado no nosso estudo (Tabela 2), juntamente com a
perda de líquido nos pulmões, pode ser responsável por
esta importante melhora no PFE dos doentes renais
crônicos após HD, já que o mesmo apresentou correlação
significativa com a PEmáx.
Apesar de os pacientes urêmicos não apresentarem
nenhum sintoma respiratório, os testes de função pulmonar, na grande maioria dos pacientes avaliados, apresentavam alteração funcional que melhorava após a HD.
Isso demonstra o comprometimento do sistema respiratório que, na maioria das vezes, passa despercebido. Embora essas alterações possam ser de pequena significância
clínica para doentes renais crônicos estáveis, elas podem
ter importância crítica para pacientes com infecções pulmonares, edema pulmonar ou anemia.
CONCLUSÕES
Através deste estudo, pode-se constatar que, mesmo sem apresentar sintomas respiratórios, pacientes
renais crônicos que realizam HD, na maioria das vezes,
apresentam alteração na função pulmonar que melhora
após tratamento com HD. Isso é observado pela melhora
das variáveis espirométricas e força muscular respiratória
após o procedimento.
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