1º CONSENSO NACIONAL DE DOR ONCOLÓGICA EPM- Editora de Projetos Médicos Ano 2002 São Paulo,SP (* distribuído pelo Laboratório Cristália ) A dor crônica oncológica, pos si, representa um grande problema de saúde. Ainda grande é o desconhecimento e,por vezes,a negligência destes sintomas,porém ainda maior é a deficiência na formação médica dos diferentes aspectos diagnósticos e terapêuticos atuais na abordagem paliativa dos pacientes com câncer,além da escassez de recursos medicamentosos e da dificuldade de acesso à medicação apropriada. Diante destas terríveis constatações e de forma muito objetiva, reúnem-se a Sociedade Brasileira para o Estudo da Dor (SBED) e a Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica (SBOC), agregando ainda a Associação Brasileira de Cuidados Paliativos (ABCP) que, valorizando e cumprindo o verdadeiro papel de Sociedades Científicas, prepararam este importante instrumento de ensino e pesquisa, mas que, sobretudo, visa à qualificação do atendimento médico ao paciente oncológico que apresenta dor em algum momento de sua história nosológica. É sem dúvida o fruto de um trabalho primoroso de todos os colaboradores, renomados e conhecedores do tema, certamente contribuirá com a profundidade e a abrangência necessária, preenchendo as lacunas profundas da formação médica atual nesta área de crescente importância. Que todos aproveitem os ensinamentos deste manual. André Augusto J.G.Moraes Presidente da SBOC TEMAS DO LIVRO ( SUMÁRIO) Dor oncológica Avaliação da dor Mensuração da dor Mecanismos fisiopatológicos da dor Síndromes dolorosas Tratamento farmacológico Vias de administração Procedimentos oncológicos Procedimentos anestésicos Procedimentos neurocirúrgicos Cuidados paliativos Abordagem multidisciplinar Qualidade de vida Farmacoeconomia Algoritmo para o manejo da dor no paciente com câncer Glossário Aspectos éticos e legais no tratamento da dor oncológica no Brasil *Abaixo,trechos do capítulo “CUIDADOS PALIATIVOS”. A bibliografia do capítulo pelos autores abaixo encontra-se no livro do consenso.Por ser longa,não digitei. CUIDADOS PALIATIVOS Ricardo Caponero ( Oncologista do Hosp.Albert Einstein entre outros) Ana Geórgia Cavalcanti de Melo ( Psicóloga Clinica especializada em Oncologia,fundadora ex-presidente e secretária executiva da Associação Brasileira de Cuidados Paliativos) Introdução Hipócrates dizia: ”Sedarem dolorem opus divinum est” (Aliviar a dor é obra divina). Numa época de tão poucos recursos,cuidar dos enfermos era aliviar-lhes os sofrimentos na medida do possível e consolar-lhes quando nada havia pra ser feito. Descobertas científicas que se avolumaram exponencialmente: anestésicos, quimioterápicos, próteses, cirurgias mais invasivas, exames de imagens, etc. Os médicos caminharam para a “super-especialização”, surgiram enfermeiros, auxiliares, atendentes e técnicos de enfermagem, fisioterapeutas, fonoaudiólogos e tantos outros paramédicos. Os cuidados caminharam para a “hiperespecialização”. A expectativa de vida aumentou, tornaram-se curáveis algumas doenças, mas persistem situações onde a cura ainda não é possível. Em muitas dessas situações,conseguimos melhorar a evolução das doenças e as complicações delas decorrentes,como:na diabetes,na hipertensão arterial,em algumas doenças reumáticas e até mesmo no câncer e na AIDS. O processo de morrer mudou.O doente,que era cuidado em casa por familiares,foi transferido para o hospital,pelo menos,em parte,pela necessidade da técnica e da assistência.A morte,que muitas vezes acontecia no quarto de casa,ao lado de familiares e de amigos,foi transferida para o ambiente hospitalar,muitas vezes acontecendo no Centro de Terapia Intensiva,com o paciente longe de seus entes queridos, ao lado de alarmes,de tubos ,de fios e de monitores.A medicina tornou-se “hospitalocêntrica”. Muitas variáveis contribuíram para levar o paciente a esse caminho. Entre elas, a apologia da técnica sofisticada, o desejo de onipotência dos profissionais de saúde,angústias familiares cronificadas ao longo da existência e dificuldade de encarar a morte como parte do processo da vida.Isso colaborou para situações de distanásia,de um morrer deturpado,onde o exercício da técnica prepondera sobre a qualidade de vida e os anseios individuais.A medicina deslumbrou-se com a tecnologia. A equipe de saúde, super-especializada, tornou-se excessivamente técnica e se esqueceu do humano por trás de um código de diagnóstico, de um procedimento, e resolveu sua angústia com a impotência frente à morte. escondendo-´se por trás das estatísticas e da própria tecnologia.Pacientes fora de possibilidade curativas são ainda encaminhados para serviços de retaguarda num processo,numa ruptura,entre o lado “curativo” e o “paliativo”. Com tanto aparato tecnológico, com novas medicações e formas de intervenção, o tratamento foi ficando cada vez mais caro. Surgiram planos de saúde, auditores, reforma na forma de assistência e a medicina baseada em evidências. Já que com o dinheiro não dá pra se fazer tudo o que se pode ( e cada vez se pode mais),passou-se a questionar o custo-efetividade dos procedimentos.Não se pensa mais se um procedimento pode funcionar ou não,mas se ele é custo-efetivo e fundamentado em evidências clinicas.O doente,então,deixa de ser encaminhado para a CTI,não porque esse ato possa lhe proporcionar mais qualidade de vida,mas sim porque não há evidências que comprovem que o investimento financeiro para se obter um determinado resultado valha a pena. Descobrimos, então, que ainda estamos na situação de curar poucas vezes, melhorar muitas vezes e consolar sempre. Chegamos em um ponto onde abrimos os olhos e vemos que,de fato,curamos muito pouco, e o que fazemos realmente é amenizar o sofrimento.Meio que por caminhos tortos,redescobrimos o ser humano que sofre e que clama por ajuda.Percebemos que um ouvir atento,um olhar amigo,um toque pode ter mais significado que a última novidade em SPECT.Redescobrimos os cuidados paliativos. Não se trata de parar de tratar, de abandonar a tecnologia e esquecer as pesquisas e os novos medicamentos, Os cuidados paliativos não são a antítese da cura, mas a constatação da realidade em situações onde a busca pela cura pode ser uma mera ilusão. Não são o abandono, e sim o reencontro de uma medicina exercida por um ser humano e para um ser humano que,por sua nova dimensão,extrapolam-se os cuidados médicos,numa atenção global ao indivíduo. Cuidar de forma paliativa não é antecipar a morte, nem deixar de brigar pela vida, mas é dar mais valor à vida que se acrescenta ao tempo, do que ao tempo que se acrescenta à vida, Não é abandonar, num diagnóstico de prognóstico reservado, mas aproximar-se em um momento onde a vida passa a ter mais significado. Cuidados Paliativos em Oncologia No ano de 1996, sete milhões de pessoas, no mundo, morreram em decorrência de um câncer, Embora os resultados do tratamento estejam melhorando as chances de cura em até 50% dos casos, muitos pacientes ainda irão falecer em decorrência de sua neoplasia. Esses pacientes,para os quais não há cura,vão necessitar de cuidados paliativos. A Organização Mundial da Saúde (OMS) estima que o número de pacientes com câncer irá dobrar até o ano 2030. Não há perspectiva de mudanças radicais nos tratamentos e nas chances de sucesso terapêutico até lá. O resultado disso é que a demanda por cuidados paliativos será crescente nos próximos anos.Esse cenário já faz com que as grandes sociedades de oncologistas,a Americam Society of Clinical Oncology (ASCO) e a European Society of Medical Oncology (ESMO),preocupemse em capacitar seus membros para manter a excelência em todos os aspectos dos cuidados aos pacientes com câncer tornando-os aptos a coordenar os cuidados dos pacientes em todos os estágios de suas doenças,numa preocupação, também, com a continuidade da atenção ao paciente. Muitos pacientes portadores de neoplasias ainda morrem em hospitais, e os médicos oncologistas são confrontados com a necessidade de oferecer cuidados paliativos adequados num cenário dominado pela tecnologia. Mudança de Visão A visão moderna dos cuidados paliativos ampliou a abrangência de seu campo de atuação para incluir o manejo dos sintomas dos pacientes desde o momento do diagnóstico. Dessa forma, cuidados paliativos agora incluem o manuseio dos sintomas induzidos pela doença tanto quanto os sintomas relacionados ao próprio tratamento. Isso inclui o formidável desafio de aliviar as inevitáveis sérias seqüelas psicossociais do câncer e de seu tratamento. Os cuidados paliativos também incluem os cuidados aos pacientes em fase terminal e o seguimento continuo de sinais de longa duração e os sintomas que o câncer e seu tratamento produziram. Os cuidados paliativos também compreendem a grande parte do nosso dia de trabalho como oncologistas clínicos e excluem apenas alguns tratamentos com intenção curativa, tais como aquelas formas curáveis de neoplasia e os tratamentos adjuvantes. Definição Na oncologia clinica, os tratamentos paliativos são utilizados freqüentemente. Esses tratamentos não são direcionados para a cura, mas para promover e para manter a qualidade de vida através da provisão de tratamentos específicos para as doenças. Quando já se sabe que a neoplasia é incurável, ou uma neoplasia potencialmente curável não está respondendo bem ao tratamento, os cuidados paliativos devem ser iniciados. Os cuidados paliativos são a atenção total e ativa direcionada a manter a qualidade de vida dos pacientes, englobando as necessidades físicas, psicológicas, sociais e espirituais de cada indivíduo. Os cuidados paliativos: 1. afirmam a vida e consideram a morte como um processo normal da vida; 2. não apresentam nem adiam a morte, 3. provém o alívio da dor e de outros sintomas 4. integram os cuidados psicossociais e espirituais no cuidado ao paciente 5. oferecem um sistema de suporte para assistir ao paciente que morre e à sua família Qual o Melhor Lugar para os Cuidados Paliativos? As necessidades específicas de cada paciente devem ser consideradas com o objetivo de otimizar sua qualidade de vida, por isso as preferências individuais de cada paciente devem ser respeitadas, embora, em muitas circunstâncias, as necessidades de cuidados de saúde impeçam que esses desejos sejam realizados. Muitos pacientes,na Europa ocidental,morrem no hospital.Vários estudos têm demonstrado que 50 a 90% dos pacientes com câncer,tratados por serviços de oncologia,morrem no hospital.Isso não é o que a maioria dos pacientes prefere.Alguns estudos mostram que os pacientes desejam falecer em casa ou em um “hospice”. Cuidados Paliativos no Hospital Manter os cuidados paliativos em um hospital tem vantagens e desvantagens. As vantagens são: a continuidade dos cuidados; a competência em tratamento oncológico; acesso à tecnologia e excelência em controle sintomático; disponibilidade de uma equipe multiprofisisonal e a possibilidade de treinamento e de pesquisa em cuidados paliativos. As desvantagens são que os cuidados paliativos são administrados mais tardiamente no processo da doença; que tratamentos desnecessários podem ser administrados, que esta pode não ser a escolha do paciente e de sua família e que esta é uma forma mais dispendiosa para o sistema de saúde. A intensa comunicação necessária entre o paciente, a família, outros profissionais de saúde e os oncologistas clínicos, em adição à falta de treinamento em lidar com questões difíceis podem ser outras desvantagens. O pessoal hospitalar também pode achar difícil lidar com pacientes em cuidados paliativos, desde que muitas intervenções no hospital são designadas para o tratamento agudo de pacientes com câncer. Cuidados Paliativos em “hospices” Um outro local em que os pacientes oncológicos podem receber cuidados paliativos são os “hospices”. Estas são instituições semi-residenciais,com um quadro de pessoal especializado em cuidados paliativos,onde o paciente pode permanecer por um período limitado de tempo,ou onde cuidados diários específicos podem ser administrados. A vantagem dos “hospices” é a presença de uma equipe multidisciplinar especializada em cuidados paliativos, a qual é capacitada em prover cuidados contínuos, suporte ao luto e em manter a possibilidade de treinamento educacional e de pesquisa em cuidados paliativos. As desvantagens são: a ruptura na continuidade do tratamento oncológico do paciente, que tem que abandonar seu time de especialistas, com o qual ele pode ter desenvolvido um relacionamento de longa data; a possibilidade de que certos tratamentos antineoplásicos não serão administrados; o fato de que alguns pacientes podem não querer estar em um “hospice” porque ele percebe que aquele é um lugar para pacientes que estão morrendo; a possibilidade de que a família não deseje que o paciente seja confrontado com o fato de que ele está morrendo; a falta de leitos disponíveis ou o tempo de espera, o que pode tornar difícil a transferência urgente de um paciente para o “hospice” e o custo da infra-estrutura e de profissionais de saúde. Cuidados Paliativos no Domicílio A administração de cuidados paliativos no domicílio é o que muitos pacientes preferem. As vantagens são: a proximidade com parentes e amigos e o conforto de um ambiente familiar ao redor; a possibilidade de continuidade de cuidado com um clinico feral e o custo mais baixo para o sistema de saúde. As desvantagens são: o problema da continuidade da atenção durante o período noturno; o problema do controle de sintomas e a deterioração aguda da condição do paciente; a alta carga emocional e de trabalho colocada sobre a família, que pode tornar-se exausta; o custo dos cuidados domiciliares para os pacientes individualmente; as dificuldades de organizar uma equipe de profissionais para o trabalho em casa; o problema da comunicação entre os diversos profissionais que assistem ao paciente e a organização global dos cuidados domiciliares. Quem deve Coordenar os cuidados Paliativos? Como médicos oncologistas, nós devemos lidar com todos os aspectos do tratamento dos pacientes com câncer.Quando o paciente precisa de cirurgia ou radioterapia,nós referimos o paciente para um especialista,porque esses tratamentos estão fora da alçada dos médicos oncologistas.Entretanto,acreditamos que o manuseio dos sintomas do paciente com câncer seja responsabilidade do oncologista, e , limitando os encaminhamentos para situações excepcionalmente difíceis,o oncologista clinico deve ser treinado para lidar com todos os aspectos das necessidades dos pacientes com câncer.Somente oncologistas bem treinados estão aptos a predizer as complicações do tratamento e podem ser capazes de diagnosticá-las precocemente.Somente oncologistas clínicos conhecem bem a história natural das neoplasias malignas,assim podem antever as necessidades de avaliação dos pacientes com câncer. Devido ao fato de que os oncologistas clínicos mantêm estreitos relacionamentos com os pacientes com câncer ao longo de toda sua doença. Sua habilidade para remover o medo do desconhecido,através da provisão de informações,e promover o suporte psicossocial é crítica.Desde que os médicos oncologistas estão próximos aos pacientes no momento do estabelecimento do diagnóstico,é natural que o paciente prefira continuar esse contato estreito,mesmo quando se trata de abordar a fase terminal de sua doença.Muitos pacientes não são referidos para sistemas especializados para cuidados terminais ( tais como os “hospices”) e, então,os oncologistas têm que assumir a liderança em lidar com esse período delicado e estressante na vida dos pacientes. Os médicos de família usualmente participam dos cuidados aos pacientes no final da vida, mas sem a orientação e o conhecimento de oncologistas, eles frequentemente sentem-se inseguros. Os pacientes e seus entes amados certamente apreciam a participação do oncologistas nas tomadas de decisão durante essa difícil parte da vida. Médicos Oncologistas ou especialistas em cuidados paliativos? Os objetivos dos cuidados paliativos são otimizar a qualidade de vida do paciente e permitir que ele possa viver nas melhores condições possíveis no local que ele assim desejar. Esse também pode ser o objetivo de um profissional triador que poderá determinar qual profissional de saúde tomará a responsabilidade pelo paciente. Clínicos gerais, oncologistas clínicos e paliativistas devem trabalhar como um time, e não em competição, desde que isso pode levar a não referência, ou à referência tardia e à desconfiança. resultando num cuidado não ideal ao paciente. Qualquer dos especialistas que tomem a responsabilidade dos cuidados paliativos do paciente deve ser capaz de prover um ótimo cuidado. O profissional deve saber (conhecimento), estar apto (habilidade) e desejar (atitude) preservar e melhorar a qualidade de vida de paciente oncológicos em uma estrutura de cuidados paliativos. Conhecimento Os oncologistas clínicos que trabalham com cuidados paliativos devem ser “experts” na avaliação e no manejo dos sintomas físicos comuns no câncer avançado, incluindo dor, fadiga, alterações respiratórias (dispnéia e tosse), alterações gastrintestinais (náuseas e vômitos, constipação, diarréia, obstrução gastrintestinal), alterações cutâneas (prurido, úlceras de pressão), alterações urológicas (incontinência e obstrução) e alterações neurológicas (insônia, delirium, agitação). Os oncologistas devem estar familiarizados com a avaliação e com o manejo dos sintomas psicológicos e existenciais mais comuns, incluindo ansiedade, depressão, tendências suicidas e desejo da morte, ansiedade da morte e sofrimento antecipatório. Deve0se reconhecer a importância da participação de outros profissionais no cuidado aos pacientes e ser familiar com os recursos disponíveis na comunidade para o tratamento desses pacientes. Habilidade Os oncologistas clínicos devem adquirir excelência no uso apropriado das técnicas paliativas quando a cura não é mais possível. Isso inclui familiaridade especificamente com conceitos-chave de benefício ao paciente, de qualidade de vida e de análise risco/beneficio. Eles devem ser aprimorados na comunicação efetiva e compassiva com os paciente s oncológicos e com suas famílias.As habilidades específicas incluem a adequada exposição do diagnóstico, das opões terapêuticas,desdobramentos do prognóstico,explicações dos potenciais riscos e benefícios esperados com as diversas opões de tratamento,habilidade no aconselhamento para facilitar uma tomada de decisão efetiva com base em informações corretas. O médico deve ainda estar apto para explicar o papel dos cuidados paliativos e para lidar com o estresse dos membros da família. È necessário que os oncologistas estejam familiarizados com os seus próprios sintomas de esgotamento com os fatores que contribuem para isso e com as formas de prevenir seu desenvolvimento. Atitude Os oncologistas clínicos devem desejar prover cuidados paliativos para seus pacientes e estar motivados a trabalhar em equipe em uma área multidisciplinar. Devem estar familiarizados com os problemas éticos e legais que surgem no manejo de neoplasias avançadas e com os princípios éticos necessários para solucionar esses problemas. Os princípios éticos estão relacionados a todas as fases dos cuidados, desde a comunicação do diagnóstico e prognóstico, a tomada de decisão (paternalismo, autonomia, consentimento pós-informado, etc.) o direito ao adequado alivio dos sintomas físicos e psicológicos e as suas implicações. Deve-se assumir uma postura firme, embora não inflexível, em relação às decisões do final da vida como, por exemplo, sedação em casos de sintomas refratários,hidratação e nutrição no final da vida,ordens de não ressucitação e de abordagens paliativas,suspensão dos procedimentos invasivos,suspensão de tratamento,eutanásia e suicídio assistido. Situação dos Cuidados Paliativos no Mundo A exata situação dos cuidados paliativos na Europa, curiosamente, é desconhecida. Vários grupos de especialistas têm mostrado interesse nos aspectos não curativos do tratamento dos pacientes oncológicos.Dessa forma,anestesistas frequentemente tomam conta do controle da dor,geriatras supervisionam os cuidados de final de vida, e assim por diante. A European Society of Medical Oncology ( ESMO) está atualmente conduzindo um levantamento entre seus membros que irá clarificar a situação presente, assim como a opinião de seus membros sobre seu papel nos cuidados paliativos. Os resultados desse inquérito ser]ao apresentados pelo Dr.Nathan Cherny no congresso da ESMO realizado em Nice em outubro de 2002. Esses resultados irão auxiliar no planejamento de todos os aspectos dos cuidados paliativos em câncer. Destaca-se, nesse cenário, a Inglaterra, onde os cuidados paliativos estão mais organizados e a rede de “hospices” mais bem implantada. De lá e da Itália, provêm os principais modelos de assistência. No lado oposto, encontram-se os países da Europa oriental, onde os pacientes estão começando a dar-se conta de seus direitos e da demanda por um melhor cuidado paliativo. Desde que a medicina na Europa oriental está passando por um período de reorganização e modernização, não há tempo melhor na administração de cuidados paliativos para pacientes com câncer. Nos Estados Unidos, há vários centros trabalhando com cuidados paliativos, mas há carência de uma medicina baseada em evidências para padronização das condutas. A Organização Mundial da Saúde propôs um modelo para tratamento da dor, mas o controle de outros sintomas ainda permanece sem uma padronização nacional. Destacam-se no cenário americano o trabalho do Memorial Sloan-Kettering Câncer Center e do M.D.Anderson Câncer Center. ***Meu ponto de vista: Não acredito que o profissional mais qualificado para coordenar a equipe de cuidados paliativos seja necessariamente o oncologista clinico.O que percebo na prática,é que esse profissional é muito solicitado ,ou seja, existe grande quantidade de doentes para um pequeno número de especialistas tratando-se da rede pública do SUS.Isso faz com que o oncologista clinica fique sobrecarregado em seu trabalho no que diz respeito a lutar contra a doença,tentando buscar possibilidades de cura ou melhora do prognóstico ou ainda aumento da sobrevida.Assim, não considero como já escutei de outros profissionais médicos ou não, que “o oncologista não se preocupa com o bem estar do doente,só com a doença...”No meu entender,o que falta, é TEMPO!! Isso faz com que os pacientes sem possibilidade de cura,passem a ser acompanhados por uma outra equipe, geralmente a EQUIPE DE TRATAMENTO DA DOR. A Equipe de Tratamento da Dor e Cuidados Paliativos é multidisciplinar,ou seja,formada por profissionais de várias áreas, e conta ainda com o apoio de voluntários, que é uma ajuda muito importante em tratando-se de um país pobre de recursos como o nosso.O objetivo da equipe é voltado para o DOENTE, e não mais para a DOENÇA, visando seu bem estar em todos os aspectos:aliviando-se a dor,melhorando seu apetite,melhorando o padrão do sono,aliviando sintomas desagradáveis em geral como vômitos,etc. e ainda dar apoio psicológico e discutir questões como a morte,caso seja questionado pelo doente e seus familiares. Nem sempre o profissional ou pessoa ( pode ser um voluntário!) que o doente e/ou familiares sintam-se mais a vontade para falar de suas fraquezas,dúvidas,medos é necessariamente o médico oncologista ,ou simplesmente um médico.Isso vai muito da empatia, da maturidade, da forma de interagir de cada um, da identificação pessoal. Por tratarem-se de pacientes complexos,onde pesa também a questão sócioeconômica por ser uma doença em geral arrastada ,envolvendo aspectos emocionais etc.,há uma grande necessidade de troca de idéias entre diversas áreas profissionais, não somente por questões próprias do paciente,mas também por envolver os membros da equipe! Quero dizer que um profissional apenas fica sobrecarregado com a carga emocional que envolve esse tipo de trabalho, e o serviço em equipe torna tudo mais fácil. Abaixo,vou contar um pouco da minha experiência pessoal . Estou à disposição caso queiram fazer alguma troca de idéias. MSN [email protected] Viviane. O Serviço de Tratamento da Dor e Cuidados Paliativos : Muito medo eu tive,confesso,quando comecei a ter contato com pacientes oncológicos.Tive receio que me perguntassem:”Doutora,eu vou morrer?” E aí,o que EU iria responder,se eu também tinha medo da morte??? Mas muito aprendi com eles,inclusive a aceitar a morte com naturalidade. Os pacientes oncológicos em fase pré-terminal ou terminal, ao contrário do que alguns colegas pensam,também são seres humanos, e portanto merecem respeito.Já ouvi de médicos e familiares a velha frase “ele vai morrer mesmo...” Isso tem que ser ABOLIDO de uma vez por todas! Todos vamos morrer um dia.Se não podemos oferecer a cura,então podemos oferecer o conforto,o alívio da dor,boas noites de sono,junto dos familiares, e uma morte tranqüila e com dignidade,sem sofrimentos. Entendam: após o estímulo doloroso,o cérebro codifica e emite a sensação de DOR. Quando ela é aguda,é tratada e acaba.Porém, se esta dor se cronifica, ela gera SOFRIMENTO.O sofrimento implica em outras perdas.Ex: perdas sociais ( deixa de ir a festas ou conviver com a família, deixa de ter relacionamentos sexuais pela dor),faltas ao trabalho trazendo transtornos financeiros,dificuldade de comer devido a mal-estar,vômitos;perda do sono pela dor;culminando com a depressão devido a perda da dignidade.Pense comigo:imagine um familiar,na sua casa,gritando a noite inteira com dor.Ninguém mais dorme na casa,gera depressão,o familiar não consegue trabalhar direito porque não dormiu, e nada se resolve. Em termos de gastos para saúde,pacientes subtratados ou não tratados,geram altos custos em termos de saúde pública,devido a indas e vindas para o hospital.Infelizmente, no Brasil,poucos são os estados que dispõe de um programa de tratamento da dor. Existem algumas portarias do ministério da saúde que você pode ler na íntegra no site http://www.dor.org.br/sbed_portariams.asp (é o site da Sociedade Brasileira para Estudo da Dor – www.dor.org.br) Que garantem a distribuição gratuita de medicamentos para os cuidados paliativos desses pacientes.Para a liberação dessa medicação para o estado,basta que ele crie um programa de assistência a esses pacientes! Porém, ainda assim, na maioria dos estados,isso não acontece.Não há interesse político para tal. Acho interessante,se houver condições,para quem não conhece,passar uns dias acompanhando o serviço de uma clinica de dor.Nas grandes capitais elas funcionam geralmente dentro do Hospital das Clinicas. No site www.saude.br.gov.br da secretaria de saúde do estado do Paraná Clique no link PROGRAMA PARANA SEM DOR à esquerda, e faça o download do livro “O ALÍVIO DA DOR NO CÂNCER”. Trata-se de um protocolo da OMS para tratamento da dor oncológico, e em cima dela, ou, das medicações orientadas, foram criadas as portarias acima. Esse programa foi criado pelo dr. Mário Giublin, médico anestesiologista especialista em Tratamento da Dor , do Hospital das Clinicas do Paraná. DEGRAUS DO CÂNCER * protocolo da OMS para administração de analgesia nos pacientes com dor neoplásica. O tratamento paliativo não visa a doença, e sim, O DOENTE!! Melhorando sua QUALIDADE DE VIDA.Doenças de evolução prolongada comprometem o conforto e o bem-estar de seus portadores.Do mesmo modo, o tratamento a eles dirigidos frequentemente ocasionam diferentes impactos sobre o estado físico,emocional e interações sociais. Diante de um quadro tão complexo,fica claro que um profissional não consegue dar conta do recado sozinho! É necessário o trabalho de uma equipe multidisciplinar, envolvendo profisisonais de várias áreas de saúde como médicos de várias especialidades,psicólogos,enfermagem,nutricionistas,fisioterapeutas,etc.E, em um país pobre como o nosso,com tantas dificuldades,não podemos nos esquecer de uma ajuda fundamental,que são os VOLUNTÁRIOS. Veja essa história: Dona Maria há muitos meses estava acompanhando seu Pedro,doente de câncer.Quando seu Pedro morreu,dona Maria se viu perdida,sua vida perdeu o sentido,não tinha o que fazer! Então,ficou em depressão.Algumas vezes ia ao ambulatório de dor freqüentado antes pelo marido agora falecido,para se queixar,em depressão,.relembrar dele.Então,foi feito um convite: “dona Maria,já que a senhora tem experiência com esse tipo de doente,não gostaria de ajudar outras famílias com doente em casa?” A resposta foi positiva, e dona Maria estava novamente na ativa! Com um grupo acompanhado de médico ou enfermeiro,fazia visitas domiciliares junto com outras voluntárias e trazia informações ao serviço de dor, de como estavam os doentes em seus internamentos domiciliares.Foi bom.Ela ficou feliz sentindo-se útil novamente .Alguns meses se passaram. Depois de algum tempo,dona maria pediu para faltar uma visita,pois iria a um batizado. Passado mais um mês,teria um aniversário e nova falta. No verão,meio sem graça,pediu para ausentar-se por 20 dias pois iria para praia com parentes.Sabiamente,professora Miriam disse: “Dona Maria, nós estamos com um grupo grande de voluntários, e novas pessoas gostariam de passar por essa experiência.A senhora não gostaria de deixar sua vaga para outra pessoa?” E dona Maria, sorridente,agradeceu e disse que sim. O que aconteceu? O assunto CÂNCER já tinha se esgotado para dona Maria,e ela finalmente retomou sua vida.Porém, ficou com receio de pedir para sair, abandonar a equipe que lhe deu apoio.Então,cabe à equipe multidisciplinar,ficar atento também aso familiares, às suas depressões,anseios,e não apenas olhar o paciente. Cuidados Paliativos envolvem também a família. Perguntas do tipo; “Posso beber um pouco de vinho”? ou “Doutora,ele pede vinho ( ou cigarro,etc) Vamos ser sinceros:Pacientes terminais devem ser confortados;nessa altura do campeonato,um cigarro ou uma taça de vinho não vai fazer a diferença e “matálo” mais cedo. Quero chamar a atenção para a importância da HIDRATAÇÃO nestes pacientes.Entendam:tomar medicamentos em doses altas,ex morfina,antidepressivos etc. e estar desidratado,é como colocar muito sabão em um balde com pouca água! Ou seja;O SABÃO NÃO DILUI!! Quero dizer com isso que, se o paciente não se hidratar,a concentração da medicação circulante será maior e ele terá sintomas dos EFEITOS COLATERAIS ( ou indesejáveis) dos medicamentos, como por exemplo alucinações.Esse tipo de paciente não tem apetite,isso se deve à própria doença e também porque não consome tanta energia>Mas deve-se orientar a ele e aos familiares que a hidratação é importante.Na minha prática,oriento tomar sucos,chás,água,gelatina, o que gostar,como “passarinho”,pequenos goles e várias vezes ao dia.Tomar cuidado com locais muito quentes, que levam a desidratação.O quarto deve ser ventilado.Verifiquei que em alguns hospitais ou postos de saúde,justamente a sala que colocam o paciente em separado, para receber a medicação, é a menos arejada, e a mais quente!! Isso tem que ser levado em consideração. REGRAS EXISTEM PARA SER SEGUIDAS. Certa vez,dentro do Hospital das clinicas,estava com uma paciente jovem , uma mulher de 22 anos internada.Teve seu filho na estrada,mulher de caminhoneiro,nunca havia ido a um ginecologista.Agora, procurou as irmãs,já em fase adiantada de câncer de útero.Internada em fase terminal,pediu para ver o filho de 5 anos.Porém, crianças não podem entrar no hospital. Fiquei triste, e fui pedir uma autorização para a diretoria. A minha intenção foi das melhores possíveis.Soube pelas tias que a criança também sentia saudades da mãe.Porém, no dia que as tias levaram o pequenino para o hospital, sua mãe ( que nessa altura já tinha acometimento cerebral,estava cadavérica e passava por alguns períodos de alucinação), sentou no leito feliz,esticou os braços pedindo um abraço.O menino olhou apavorado,gritou “VOCÊ NÃO É MINHA MÃE,” e saiu correndo pelo corredor,chorando aos prantos. E ela, na cama se acabando de chorar. Morri por dentro!! Tudo o que eu não pensei, aconteceu.Chorei por vários dias.E quando contei a minha mestra,ela me respondeu. “Você entendeu agora porque existem regras?As regras existem para ser seguidas. Se alguém as criou,é porque existiram motivos para isso.” Após o atendimento dos pacientes, no ambulatório, a equipe sempre se reúne, e por vezes com as voluntárias, para discutirmos casos de alguns doentes e ver o que poderíamos fazer para melhorar.A integração da equipe deve ser grande,e o carinho pelos pacientes deve existir.Não é apenas um trabalho profisisonal,mas também de solidariedade e amor ao próximo.É para ser feito por pessoas especiais.Deve-se ter a consciência que não se deve deixar ninguém sofrendo por dor, isso é desumano,é cruel,e portanto,se algum paciente oncológico for ao ambulatório ainda que já tenha acabado o horário das consultas,deverá ser atendido por alguém da equipe. Também quero reforçar a importância de orientar a família quanto ao óbito do paciente.Enquanto ele está conversando com outra pessoa da equipe,ou ocupado em alguma terapia,deve-se questionar a família: “vocês já pensaram o que vão fazer quando ele morrer”? Isso tem que ser levantado.Orientar a organizar lista de pessoas a serem avisadas,despesas de funeral,como proceder para pegar o atestado de óbito,muitas vezes essa pessoa é chefe de família,ou mãe sem pai e ...com quem vão ficar as crianças??AS famílias as vezes estão muito envolvidas com a doença, e esquecem disso tudo.É nossa obrigação orientá-los e apoiá-los no que for preciso,bem como impedir de certa forma que façam loucuras do tipo “vender a casa pra ir atrás de um pajé na amazônia que trará a cura da doença”. Gente,fico por aqui,desculpe por não ter enviado o livro. Estou a disposição se quiserem trocar alguma idéia.Abaixo,outros links. Sugiro que entrem em contato com o laboratório Cristália para solicitar o livro do Consenso. Abraços, e fiquem com Deus! http://www.dor.org.br/sbed_portariams.asp DOWNLOADS Livro da OMS: "O ALIVIO DA DOR NO CANCER" Cancer Pain Release is the publication of the World Health Organization global communications program to improve cancer pain control and palliative and supportive care. Cancer Pain Release is dedicated to keeping a worldwide and multidisciplinary audience in the health professions and government abreast of relevant information and developments in clinical medicine, education and policy. http://www.whocancerpain.wisc.edu/ A traduçao para o português está no site da secretaria de saude do Paraná, no link PARANÄ SEM DOR www.saude.pr.gov.br a página é http://www.saude.pr.gov.br/paranasemdor/index.html Associação Brasileira de Cuidados Paliativos http://www.cuidadospaliativos.com.br/inicio.php ( artigos)