uma discussão possível no âmbito da filosofia da educação

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PARADIGMA OU MÉTODO: UMA DISCUSSÃO POSSÍVEL NO
ÂMBITO DA FILOSOFIA DA EDUCAÇÃO
PROENÇA, Kátia Aparecida Poluca Proença1 - UFPel
OLIVEIRA, Neiva Afonso2 - UFPel
Grupo de Trabalho – Formação de professores e profissionalização docente
Agência Financiadora: CNPq
Resumo
O presente artigo apresenta dois eixos de discussão. Um dos eixos retoma a discussão sobre a
relação Filosofia e Educação e tem por finalidade mencionar o debate caro às duas áreas, que
é o da intersecção dos caminhos existentes entre elas. O texto aborda o modo como Filosofia
e Educação trabalham com o mesmo tema – a obtenção do conhecimento – por meio de
formas diferentes. A Filosofia, quando se debruça sobre um tema, objetiva discutir as fontes
já existentes fazendo uma reflexão crítica sobre elas. Nessa direção, os filósofos questionam
temas emergentes, fazendo uma teorização reflexiva sobre o assunto. A Educação, por meio
de seu viés teórico-prático, procura encontrar novos temas a fim de implementar as lides
pedagógicas. Esse seu envolvimento, porém, com as práticas pedagógicas a fez (a pedagogia)
abrir mão de seu caráter de ciência da educação. No segundo eixo temático, são trazidos os
paradigmas da Fenomenologia e da Dialética pelo fato de os considerarmos modelos e
métodos de pensamento clássicos e adequados para pensarmos a Filosofia, a Educação e seus
imbricamentos. A retomada conclusiva do texto acontece pela reflexão sobre as duas áreas.
Apesar do fato de compreendermos que as duas trabalham com a mesma finalidade
(transmitir conhecimento), podem divergir quanto à utilização de distintos paradigmas e
métodos. Nesse contexto, entendemos que suas ideias conversam e possuem horizonte
semelhante (formação humana), porém com práticas diversas no campo de conhecimento. É
inegável, entretanto, que a Fenomenologia e a Dialética são caminhos através dos quais a
reflexão pedagógica e filosófica acontecem.
Palavras – chave: Filosofia, Educação, Dialética, Fenomenologia
1
Acadêmica do 7º Semestre do Curso de Matemática Instituto de Matemática e Física da Universidade Federal
de Pelotas. E-mail: [email protected].
2
Acadêmica do 7º Semestre do Curso de Pedagogia da Faculdade de Educação da Universidade Federal de
Pelotas, Bolsista PIBIC/UFPel/CNPq, integrante do Grupo de Pesquisa em Filosofia, Educação e Práxis Social
(FEPráxiS) e do Núcleo de Estudos Paulo Freire. E-mail: [email protected]. Orientadora: Profª. Dra.
Neiva Afonso Oliveira, e-mail: [email protected]
11287
Introdução
No âmbito da Filosofia da Educação, quando cogitamos buscar conhecer uma forma
de pensamento/conhecimento ou uma prática educativa, indagamo-nos, entre outros aspectos,
a respeito da possibilidade de pensar o quanto é relevante à experiência de um determinado
autor que trata daquela temática, caso pretendamos optar por um ou por outro modo de pensar
e caso tenhamos a finalidade de buscar fundamentos nas ideias e reflexões daquele pensador.
Normalmente, nos deparamos com as denominações paradigma, modelo de pensar e/ou
método ou procedimento de pesquisa. e nos questionamos sobre qual a melhor forma de nos
apropriarmos das ciências produzidas durante séculos. De como podemos trabalhar com essas
denominações que nos parecem tão similares e tão divergentes?
A gênese da palavra paradigma – do grego parádeigma – ganha corpo e é trabalhada
como o “aparecer” das revoluções do pensamento científico que desembocam em
transformação do mesmo e de sua prática correspondente. Essa linha de pensamento
representa a contribuição que Thomas Kuhn (1922-1996) propiciou-nos como pioneiro na
literatura científica a estruturar o conceito de “Paradigmas” para explicar o processo histórico
das ciências.
“Um paradigma pode ser compreendido como um modelo ou parâmetro, dignos de
serem seguidos”. De modo geral, podemos dizer que um paradigma é uma
percepção geral sobre algum assunto – podendo não ser a melhor – com o objetivo
de estruturar algo de modo a validar as demais formas adotadas. Compreendemos
que um paradigma sustenta uma determinada concepção diante do mundo em uma
determinada época.
Segundo Kuhn, um paradigma pode ser considerado uma aquisição ou uma
“conquista” conceitual. E, para ele, a conquista ou o ponto que marca o nascimento de um
paradigma possui duas características centrais: (1) exerce atração sobre um conjunto
duradouro de adeptos de modelos de atividade científica concorrente; e (2) o próprio modelo é
razoável e suficientemente aberto para permitir que o grupo redesenhado de praticantes
solucione todos os tipos de problemas (“Posfácio)” (PROENÇA, 2011).
Várias alternativas são oferecidas à Filosofia da Educação, diante da possibilidade que
apontamos, qual seja a de olhar para as diferentes posições filosóficas e, partindo delas,
orientar nossa prática como educadores. Uma das alternativas é o que a Filosofia como pensar
crítico e reflexivo nos propicia. Em outras palavras, se entendermos a Filosofia como Saviani
(1996) a compreende, enquanto reflexão radical, rigorosa e de conjunto (p.16), sem
11288
equiparação à ciência, estaremos exercitando uma atividade própria do homem, qual seja a de
olhar para a realidade como um problema filosófico. É o próprio Saviani que destaca o fato de
os problemas não serem filosóficos, científicos, tampouco sociológicos. São os homens e suas
atitudes filosóficas, científicas ou sociológicas que geram os referidos problemas a exigirem
respostas. Uma outra alternativa, paralela a da postura filosófico-crítico-reflexiva é aquela que
nos aproxima da História da Filosofia. Por exemplo, quando ensinamos Filosofia,
frequentemente, optamos pela transmissão dos conhecimentos filosóficos, por meio da
História da Filosofia.3Sem obstruir ou travar uma reflexão crítica, esta opção evoca uma certa
linearidade no estudo da Filosofia, linearidade esta não só temporal ou etapista, mas de
acompanhamento do desenvolvimento das ideias filosóficas ao longo da História do
pensamento. Em linguagem adequada ao debate sobre Ensino de Filosofia, podemos dizer que
a terceira alternativa com a qual a Filosofia da Educação precisa ocupar-se (em termos do
Ensino de Filosofia) é a de trabalhar com temas da atualidade.
Obviamente, a Educação, de uma maneira geral, e a Pedagogia como ciência, tomadas
a partir de seus corpus e estrutura de conhecimentos são preocupações da Filosofia da
Educação e da História da Educação. Impossível não notar que, ao nos referir a
“preocupações”, estamos pretendendo mencionar zonas de intersecção entre elas e
metodologias de trabalho similares nas áreas. Isso tem a ver com o que mencionamos no
resumo do nosso texto: que os filósofos questionam temas emergentes. Evidentemente, a
Educação e seus processos é um desses temas. Não é demais recordar que a Filosofia reflete
sobre as questões da Educação, a partir de uma metodologia e não é só porque uma filosofia
radical, rigorosa e de conjunto não se viabiliza sem a adoção de um método, mas também
pelo fato de que seria severamente cobrada pela Pedagogia por esta falha.
Analisando a denominação “método”, vocábulo de origem latina, methodus, que
significa “caminho e instrumentos para fazer pesquisa” (Gamboa, 2007, p.24), procuramos o
conceito em um dicionário de Filosofia e no dicionário da Língua Portuguesa. Encontramos,
então, as seguintes definições:
“Este termo tem dois significados fundamentais: 1" qualquer pesquisa ou orientação
de pesquisa; 2" uma técnica particular de pesquisa. No primeiro significado, não se
distingue de "investigação" ou "doutrina". O segundo significado é mais restrito e
indica um procedimento de investigação organizado, repetível autocorrigível, que
garanta a obtenção de resultados válidos” (ABBAGNANO, 2000, p. 668).
3
Sobre este tema, ver Ensino de Filosofia: um estudo de caso, de autoria de Letícia Maria Passos Corrêa. O livro
é uma publicação da Editora e Gráfica da UFPel.
11289
“método: s. m: 1. Ordem pedagógica na educação.
2. Tratado elementar.
3. Processo racional para chegar a determinado fim.
4. Maneira de proceder.
5. Processo racional para chegar ao conhecimento ou demonstração da verdade
“(Dicionário Priberam da Língua Portuguesa).
Consideraremos que o “método” é uma forma para se chegar a uma determinada
finalidade, ou seja, a Educação busca um “método” para as aplicações de suas teorias sem ter
o comprometimento da reflexão sobre a aplicação deste método dentro do âmbito
educacional, prevalecendo o intuito de alcançar resultados favoráveis a seus objetivos.
O “método”, por ser mais do que uma ferramenta, por sua qualidade enquanto maneira
de proceder possui a característica de fazer processar e acontecer o conhecimento, de facilitar
o acontecimento dos resultados de investigações. Entretanto, à metodologia escolhida pelo
pesquisador não cabe avaliações ou o procurar saber se realmente é válida sua aplicação.
Mesmo porque nem todos conseguem enquadrar-se dentro dos critérios e o objetivo do
método é apenas facilitar a aquisição do resultado desejado.
Com isso, entendemos que a Filosofia busca ir muito além de um praticismo e a fim de
considerar algo válido e próprio para ser investigado, procura investigar toda uma cadeia de
pensamentos vigentes e busca estruturar suas ideias. Faz, para a obtenção de seus fins, uma
opção metodológica, mas não se fixa tão somente no método. Por isso, a palavra “paradigma”
acomoda melhor o anseio da Filosofia. Falarmos em paradigmas filosóficos, portanto,
representa melhor as diversas visões ou concepções filosóficas, com seus métodos diversos.
Assim, quando tratarmos da Filosofia, em razão de seu claro rigor para versar sobre
qualquer tema, devemos levar em conta ou analisar as diversas correntes filosóficas que
compõem ou fazem parte da História da Filosofia. Em contraposição, na Pedagogia, pelo fato
de ser consensualmente4 considerada uma “ciência prática”, busca-se privilegiar metodologias
ou formas de realização de um determinado conhecimento funcional, ou seja, não se valoriza
a reflexão, infelizmente, com tanta propriedade a reflexão, mas a praticidade de suas ações.
A pesquisa dialogando com a Filosofia e com a Educação
4
Gamboa (2007, a respeito dessa negligência da Pedagogia, afirma: “Um indicador da crise da Educação que,
sendo mãe e berço do método científico, refere-se ao fato de ter aplicado pouco de si mesma a seus próprios
assuntos, tais como a crise de sua natureza, do seu estatuto epistemológico e do seu próprio método. Tais
assuntos são deslocados para outros campos como a filosofia, a epistemologia e a gnosiologia” (p.24).
11290
O projeto de pesquisa: “Paradigmas Filosóficos na educação: perspectivas para
pensar a educação e formação humanas”5, inicialmente dedicou-se a conceituar
“Paradigmas” e a discriminar a maneira como trabalhar com esse conceito na pesquisa.
Partimos, então, do livro A estrutura das revoluções científicas (1962), cujo autor, o físico
norte-americano, Thomas Kuhn retoma o termo e dele serve-se para mostrar como a ciência
progride e avança.
Kuhn ressalta que um paradigma possui como base apoiadora uma comunidade
científica, que analisa determinado viés de um problema científico, propõe novas ideias
quando o antigo conceito torna-se falho diante dos novos questionamentos da comunidade
científica. Alguns autores, na esteira de Kuhn, defendem que é fundamental a explicitação do
paradigma. Ou seja, para que se possa conversar sobre as diferentes ideias, de forma que não
se tornem antagônicas como ocorre na maioria das vezes, dificultando o diálogo entre os
especialistas, torna-se necessária a explicação do paradigma livre de ambiguidades. Com isso,
compreendemos que um paradigma nada mais é do que um modo diferente de olhar um
mesmo objeto, em uma situação de concordância dos pares de uma determinada comunidade
científica em relação ao mesmo objeto.
Um paradigma é uma teoria que obteve sucesso em uma disputa por um certo tempo
contra outras teorias competidoras, porém, sem esgotar todas as suas ideias. Quando um
paradigma se estabelece, tanto o campo que ele abrange quantos os participantes, estão
firmemente definidos e suas contestações, dentro da pesquisa, encontram-se claramente
estabelecidas.
Dessa forma, segundo Kuhn, a “ciência normal” encontra-se em constante progressão.
Já que de um lado, um paradigma surge em um momento de crise no qual se torna difícil
acomodar todos os fenômenos encontrados dentro da pesquisa por ele defendida ou, no caso
de os fenômenos tornarem-se tão valiosos ou suficientemente numerosos que não podem ser
mais ignorados pelo pesquisador. Advertindo sobre o desfecho ou ponto de chegada de crise
de um paradigma, Kuhn adverte: “O significado das crises consiste exatamente no fato de que
indicam que é chegada a ocasião para renovar os instrumentos” (2011, p.105).
A fenomenologia conversa com a Filosofia e a Educação
5
Projeto de Pesquisa financiado com bolsas e recursos CNPQ e FAPERGS.
11291
A fenomenologia como um paradigma a partir de leituras de Edmund Husserl (18591938) e Stephan Strasser (1905-1991) foi o que nos ocupou em passos subsequentes da
pesquisa. Nos debruçamos sobre a obra Fenomenologia e ciências do homem, uma publicação
do Grupo de Pesquisa FEPraxiS, da Faculdade de Educação da Universidade de Pelotas. De
modo a estabelecer que, na Filosofia, a fenomenologia é um método por meio do qual
podemos estudar muito mais do que os fenômenos que ocorrem no mundo, percebemos o
quão interligados à nossa subjetividade estão esses fenômenos. A partir de uma análise
fenomenológica, ou desde um estilo fenomenológico como diria Merleau-Ponty6, a educação,
fenômeno que diz respeito aos sujeitos, “... aparece como processo-projeto de humanização
do sujeito” (REZENDE, 1990, p.69).
O autor defende que a visão histórica pode se definir como um pensamento da
humanidade que se elevou à pluralidade de “natural” dentre dois tipos de civilização à
uniformidade artificial da civilização universal das ciências, a qual tende a arriscar um salto
dentro dessa pluralidade de ideias que são aceitas pela metafísica. Mesmo que seja
compreendido um risco, um novo caminho deve ser assumido já que não há outro caminho
para o saber supremo.
Nesse contexto, para Husserl, as ciências modernas vivenciam uma crise de
identidade, ou seja, não sabem como trabalhar com a pluralidade devido à cegueira diante dos
sábios da metafísica que não permite uma análise profunda nos problemas. As ciências
modernas ignoram a origem do problema e trabalham pura e simplesmente com os resultados
de sua intervenção com o objeto, resultados esses que não se encontram interligados ao
contexto social.
Em Fenomenologia e Ciências do Homem, encontramos a filosofia fenomenológica
distinguindo-se em três caminhos: a hermenêutica (lidando com a ontologia do problema), a
dialética (que trabalha com situações da realidade para solucionar o problema) e a intuitiva
(que fornece sentido à visão do homem). O pensamento humano orienta-se em direção a três
fases da objetividade: a evidência que corresponde aos resultados das experiências; a intuição
que nos permite ver e perceber os resultados alcançados das pesquisas e a experiência que nos
permite validar as ideias que angariamos sobre o problema/pesquisa.
Numa situação de enaltecimento aos procedimentos fenomenológicos e existenciais, a
fenomenologia é afirmada pelo autor como sendo uma filosofia que descreve e interpreta a
6
Merleau-Ponty (1908-1961), filósofo fenomenólogo.
11292
existência humana diante de sua relação dialética com outros existentes, pois para ser
considerada uma filosofia, a fenomenologia precisa esclarecer uma estrutura universal de suas
experiências para com isso obter um alcance filosófico.
Em termos das tarefas da educação e da pedagogia, a fenomenologia pode atender ao
anseio de compreender as práticas/ações de alunos e professores no contexto escolar. Ou seja,
mostra/descreve o motivo pelo qual os alunos veem a escola como um lugar/tempo perdido, já
que nada há de atrativo, pois tudo na escola está pronto, cabendo ao aluno apenas incorporar
falas dos professores e reproduzir conhecimentos que adquire. Encontramos, na
fenomenologia, uma forma de compreensão das atitudes dessa prática de alunos e professores.
Quando consideramos a educação um fenômeno, partimos da concepção de que se
trata de uma experiência profundamente humana. Compreendemos que a educação é uma das
formas mais primitivas e típicas do fenômeno humano, pois todos os homens se educam e
essa é uma especificidade humana. A educação não é uma exclusividade da escola, pois a
aprendizagem é passada/transmitida no seio familiar, em meio a grupos de convivência, da
própria sociedade em que o indivíduo esta inserido. Todo entorno encontra-se implícito em
uma estrutura fenomenológica educacional.
Partimos do fato de que a “educação nos parece, desde logo, como sendo o fenômeno
da aprendizagem da cultura (REZENDE, 1990, p. 46).” Nesse contexto, compreendemos a
fenomenologia como um método a ser analisado no âmbito educacional, ou seja, quando
compreendermos a educação como um fenômeno sócio- histórico e cultural, a fenomenologia
torna-se ferramenta indispensável para justificar suas percepções.
Mais profundamente ainda, o que falta às teorias comportamentalistas é a
compreensão da estrutura do comportamento humano. Na verdade, a estrutura do
fenômeno humano integra e reestrutura os outros níveis, de tal forma que, sem
desaparecerem, eles se transformam numa outra realidade. Em sua complexidade
estrutural, o homem é fisiológico, biológico, psicológico, antropológico. Mas a
fisiologia do homem não e a mesma dos outros corpos; sua biologia não é a mesma
dos outros seres vivos; sua psicologia não é a mesma dos animais superiores. É tudo
isso que está presente na noção fenomenológica de corpo-sujeito (REZENDE, 1990,
p.48).
A fenomenologia permite-nos trabalhar em sala de aula com todas as crianças, sem
fragmentação ou segregação, ou seja, “... a fenomenologia fala sempre de estruturas
concretas: o homem não aprende somente com sua inteligência, mas com seu corpo e suas
vísceras, sua sensibilidade e imaginação (REZENDE, 1990, p. 49)”. Esta perspectiva permitenos ir além da concepção intelectual do indivíduo em direção a uma integração plurilateral, ou
11293
seja, em sala de aula, deve ser trabalhado todo o conteúdo do corpo e dos sentidos a fim de
proporcionar a aprendizagem do aluno.
Como se vê, a questão da aprendizagem em filosofia da educação não deixa de ser
também uma questão epistemológica, e, em qualquer hipótese, nunca será
adequadamente tratada por uma ciência isolada ou por uma filosofia reducionista.
Para a fenomenologia, ao falar de aprendizagem humana, queremos dizer que se
trata, finalmente, de aprender de maneira humana a ser homens para existirmos
como tais. É o que se torna ainda mais claro quando dizemos que ela deve ser
também uma aprendizagem significativa (REZENDE, 1990, p. 50).
No âmbito educacional, a fenomenologia traz o aspecto de contemplar um ensino–
aprendizagem que não se efetiva a partir de um aluno/sujeito envolto em fragmentações, mas
que parta dos fenômenos sociais, históricos, culturais e diários para trazer métodos que
envolva esse aluno de uma maneira significativa. Assim, o não reducionismo do aluno e suas
circunstâncias tão aclamado pelos fenomenólogos fica evidente na prática de ensino, com
prejuízo de uma visão unilateral.
Dialética na Filosofia e na Educação
Outro paradigma a que vimos nos dedicando é a dialética que, no campo da Filosofia,
vem sendo abordada antes mesmo de Platão (428-328 a.C) como uma forma primeira de
tornar-se filosofia. A partir de Kant (1724-1804), foi estruturada na lógica que trabalhamos,
principalmente na teoria de Karl Marx (1818-1883). Na base teórica da pesquisa, buscamos
contextualizar as diversas fases em que a dialética obteve destaque para, além de cumprir um
rigor teórico, mostrar o quão paradoxal é a teoria.
No âmbito da filosofia moderna, a lógica dialética permite-nos questionar a identidade
do objeto de estudo, “ao mesmo tempo e sob o mesmo aspecto, igual e diferente de si mesmo
(SEVERINO, 1993, p. 135)”. Nessa perspectiva, temos a teoria da contradição como uma
ferramenta que proporciona novas teorias.
Este movimento de evolução e transformação por contradição é o processo dialético
que permite assim vencer as próprias contradições. E, para Hegel, este era um
movimento presente tanto no real como no pensamento. É que, como filósofo e
metafísico idealista, Hegel fundia ser e pensar numa unidade. Com efeito, entendia
que a substância da realidade era o próprio espírito, a razão, a Ideia. Tudo o que
existe é manifestação da Ideia que está evoluindo rumo ao Espírito. Por isso, a
natureza física assim como a sociedade humana são apenas figuras do Espírito. É
que a totalidade do real, num primeiro momento, é a Ideia (tese); um segundo
momento, é a Natureza (antítese), negação da Ideia; num terceiro momento, é o
11294
Espírito (síntese), negação/ retomada/superação da Ideia e da Natureza
(SEVERINO, 1993, p. 136)”.
Na filosofia contemporânea, há uma crítica às ciências que se apoiam exclusivamente
nas teorias positivistas. Encontramos, no modo dialético de pensar, as estruturas, teorias
pertencentes a uma tradição filosófica de ação e pensamento crítico.
Isto quer dizer que a realidade não é mais vista nem como um conjunto de entidades
metafísicas, eternamente determinadas, nem como um conjunto de entidades
naturais, determinadas, nem como natureza física. Em verdade, ela é tudo isso, mas
é ainda muito mais: ela vai se constituindo num processo histórico resultante, a casa
momento, de múltiplas determinações e esse movimento de constituição decorre de
forças contraditórias que atuam no interior dessa própria realidade” (SEVERINO,
1993, p.133).
No âmbito da Educação, encontramos certa resistência quando falamos em dialética
pois, por algum tempo, assimilamos que, enquanto método de análise da realidade social, foi
considerada ultrapassada. Entretanto, quando analisamos os elementos que compõem o
processo de ensino-aprendizagem que mais favorecem a aprendizagem dos alunos,
encontramos ou nos deparamos com o ensino em espiral, que, ancorado no princípio de
‘desacomodar’ o aluno, mostra o processo o conhecimento sistematizado (conhecimento
científico), conforme se observa na Figura 1. O aluno reflete a partir de suas próprias
concepções (senso comum), ou seja, contrapõe os conhecimentos (senso comum e
conhecimento cientifico) e, após sua síntese/reflexão sobre o que lhe foi ensinado e o que
sabia previamente, eleva-se no interior da espiral o conhecimento adquirido pelo aluno, ou
seja, o aluno aprende frações no 5º ano; no 6º ano, revê as frações aprendendo suas
propriedades ... Assim, o aluno recorda o aprendido na etapa anterior e assimila um elemento
novo, de modo que, por todos os anos, recorrerá ao mesmo tema, sempre recordando e tendo
novos conceitos.
Figura 1 – Ensino em espiral
Fonte: Internet - <http://pt.dreamstime.com/auris_portfolio>
Na lógica proposta nos currículos escolares, em que os alunos devem, todos os anos,
ter acesso ao conteúdo ensinado no ano anterior e ter novos elementos que o tornem
11295
interessante sua aprendizagem, fica, de certa forma, implícita a metodologia dialética no
âmbito da educação brasileira. Assim, nesse contexto, compreendemos que a dialética é um
método presente, aprimora a aprendizagem do aluno e está na práxis dos professores.
Considerações Finais
Com a análise e reflexões empreendidas até aqui, assimilamos a importância de que a
Filosofia e a Educação mantenham diálogos a fim de que haja um aprimoramento de suas
teorias e práticas. A filosofia tem como objetivo principal desacomodar as coisas, fazendo
com que as pessoas reflitam de forma crítica diante do que acontece a sua volta. A educação,
por sua vez, surge como um dos fenômenos com o qual se ocupa a filosofia.
“A primeira característica da atitude filosófica é negativa, isso é, um dizer não ao
senso comum, aos pré-conceitos, aos prejuízos, aos fatos e às ideias da experiência
cotidiana, ao que “todo mundo diz e pensa”, ao estabelecido. A segunda
característica da atitude filosófica é positiva, isso é, uma interrogação sobre o que
são as coisas, as ideias, os fatos, as situações, os comportamentos, os valores, nós
mesmos. É também uma interrogação sobre o porquê disso tudo e de nós e uma
interrogação sobre como tudo isso é assim e não de outra maneira. O que é? Por que
é? Como é? Essas são as indagações fundamentais da atitude filosófica. A face
negativa e a face positiva da atitude filosófica constituem o que chamamos de
atitude crítica e pensamento crítico” (1997, p.12 Apud Pereira, 2009, p. 96).
Nessa linha, a Educação, ao dialogar com a Filosofia, possui mais propriedade ao
aplicar suas práticas saindo do seu praticismo e indo além de um pensamento do modismo.
Referimo-nos a “modismo como o lugar-comum que dita padrões comportamentais e acaba
por alienar as pessoas” (Azevedo, 2009, p.100). Nesse sentido, a aproximação das duas
ciências é fundamental para a evolução do sistema educacional. Nas palavras de Paviani
(2008), “a filosofia e a educação são por natureza projetos transversais, nos sentidos éticopolítico e epistemológicos” (p.13).
Apesar do fato de compreendermos que as duas ciências trabalham com as mesma
finalidade (transmitir conhecimento), elas podem divergir quanto à utilização de distintos
paradigmas e métodos. Nesse contexto, entendemos que as ideias abordadas por ambas
conversam entre si e possuem o mesmo horizonte (formação humana), porém com práticas e
utilizações bem diversas no campo de conhecimento. De qualquer modo, não é difícil
concordar com a afirmação de que “o filosofar é uma espécie de ascese pedagógica para a
conquista da verdade” (Paviani, 2008, p.14).
11296
Não é suficiente, entretanto, afirmar que a tarefa da filosofia é a reflexão sobre o
fenômeno da educação. Ela necessita orientar uma reflexão radical a respeito do processo
cognitivo e as grandes escolas filosóficas (paradigmas) caracterizam-se por essa postura
reflexiva imprescindível e que acaba influindo na educação e nas demais ciências. A busca
por esta reflexão tende a viabilizar “uma auto-organização do conhecimento que pertence,
simultaneamente, à filosofia e à ciência” (Paviani, 2008, p. 12-13).
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11297
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