do que a escravidão, os Estados nortistas eram, de maneira geral, abolicionistas (em especial aqueles da Nova Inglaterra) já os sulistas defendiam com veemência o direito à escravidão e ao seu modo de vida. A Guerra Civil dos Estados Unidos da América Também chamada de Guerra da Secessão, foi um conflito armado que envolveu os estados membros da federação estadunidense em dois lados opostos, os estados nortistas ou unionistas e os estados sulistas ou confederados, entre 1861 a 1865. Assim como a Revolução Americana (a Independência das 13 Colônias) essa Guerra constitui um dos eventos mais marcantes na formação dos Estados Unidos e simboliza um marco definitivo da passagem do colonialismo para modernidade industrial. Antecedentes e Histórico A colonização muito distinta nas unidades regionais do Sul e do Norte dos Estados Unidos produziram sociedades e economias muito diferentes nessas respectivas regiões. No Sul desenvolveram-se grandes fazendas monocultoras, que utilizavam trabalho escravo, essa economia era essencialmente agroexportadora e dependente. Nesse ambiente sulista florescia uma sociedade marcadamente elitista, que estava mais voltada para a Europa do que para os “irmãos” do Norte. O modelo em muito se assemelhava ao existente na América Latina da mesma época. Ao Norte desenvolveu-se uma sociedade e economia mais diversificada e urbana. No campo predominavam pequenas e médias propriedades, que utilizavam trabalho familiar e assalariado. Suas cidades desenvolveram-se rapidamente, com o comércio e com uma indústria crescente, contribuiu também para esse desenvolvimento o fluxo constante de imigrantes europeus que vinham tentar a sorte no Novo Mundo, chegando a portos como Boston e Nova York. A expansão para o Oeste e a formação de novos Estados exacerbou essa crise política, tributária e social entre Norte e Sul. Os novos Estados do Oeste que ingressavam na Federação seguiam o modelo sulista ou o nortista, qualquer discussão sobre que modelo que seria adotado gerava conflitos violentos. Buscando solucionar ou diminuir as tensões, foram assinados os Acordos do Missouri, estipulando que os novos Estados do Oeste que entrassem na Federação seriam divididos a partir da latitude 36’ 30”, os que estivessem ao Norte desse paralelo seriam abolicionistas e ao Sul seriam escravistas. Esses acordos foram abandonados a partir de 1850, o crescimento demográfico do Norte desequilibrou o quadro político em favor dos nortistas, fato claramente visível na Câmara dos Representantes (eleitos proporcionalmente pelas populações dos Estados) dominada pelos representantes do Norte. A entrada da Califórnia (abaixo do paralelo 36’) na Federação como um Estado sem escravidão foi um golpe definitivo nos acordos e barganhas entre os Estados nortistas e sulistas. A lei KansasNebraska veio tentar resolver a questão dos novos Estados, deixando aos habitantes do Estado a escolha do modelo a seguir, no entanto, a lei causou mais conflitos e cisões políticas. A “Guerra” do Kansas entre abolicionistas e escravistas, necessitou de intervenção Federal para acabar. No mesmo período a campanha abolicionista ganha força e destaque, com jornais e livros como A Cabana do Pai Tomás. O Partido Republicano surgiu nesse momento de tensões crescentes, com franca orientação abolicionista e nortista. Cresceu rapidamente e ganhou muitos representantes na Câmara e no Senado Federal. Perdeu cadeiras nas eleições de 1856, mas recuperou-as nas eleições de 1858, chegando com força na eleição de 1860 para a presidência. O Partido Democrata, uma força nacional, chegou dividido nas eleições de 1860, ao invés de um candidato entrou com dois na corrida presidencial. Os republicanos concorreram com Abraham Lincoln, que defendia posições moderadas em relação à escravidão, mas não via futuro na manutenção de dois modelos tão diferentes no mesmo país, “uma casa dividida contra si mesma não subsistirá. Acredito que esse governo, meio escravocrata e meio livre, não poderá durar para sempre... e ele se transformará só numa coisa, ou só noutra.” Lincoln ganhou a eleição com 40% do voto popular e apoiado por todos os dezesseis estados do Norte e dois estados do Oeste. Para os estados sulistas esse foi o golpe final, para eles a eleição do republicano Lincoln eliminava qualquer chance de convivência futura entre os estados nortistas e sulistas, além de ameaçar seu modelo escravista e seu modo de vida. A Constituição de 1787, federativa e com seus artigos de ampla interpretação, permitiu que esse dois modelos tão diferentes convivessem por décadas no mesmo país, também arranjos políticos temporários garantiram essa convivência por mais algum tempo. As Causas No entanto, a partir de meados do século XIX novos problemas agravaram as relações na Federação, somando-se a outros préexistentes. A Revolução Industrial atingia os Estados do Norte, o que gerou novas necessidades e o desejo de uma nova ordem administrativa da nação. Questões tarifárias, distribuição de recursos e emissão de papel moeda tornavam a convivência entre os Estados extremamente difícil, o Norte defendia leis e medidas de âmbito federal, enquanto o Sul desejava maior autonomia estadual nesses assuntos. O Norte tendia ao protecionismo alfandegário e o Sul ao livre-cambismo. Mas nenhum outro problema era mais grave Figura 1 - Abraham Lincoln em 1862, acampamento militar na Batalha de Antietam. Antes mesmo da posse de Abraham Lincoln, liderados pelo Estado da Carolina do Sul, os estados sulistas do Alabama, Arkansas, Carolina do Norte, Flórida, Geórgia, Louisiana, Mississippi, Tennessee, Texas e Virgínia; romperam a União e criaram um novo país, os Estados Confederados da América, desligando-se dos Estados Unidos da América. O presidente em exercício e o presidente eleito Lincoln tentaram negociar, mas não foram ouvidos, o Sul rompia a União e mantinha o desejo de permanecer independente e desligado definitivamente dos Estados Unidos. Quando o Norte tentou manter a União e impedir a secessão, estourou a Guerra. Ficaram na União a Califórnia, Connecticut, Delaware, Illinois, Indiana, Iowa, Kentucky, Maine, Maryland, Massachusetts, Michigan, Minnesota, Missouri, Nova Hampshire, Nova Jérsei, Nova Iorque, Ohio, Oregon, Pensilvânia, Rhode Island, Vermont e Wisconsin, mais os territórios de Colorado, Dakota, Nebraska, Nevada, Novo México, Utah e Washington. Figura 3 - Generais Confederados, em destaque no centro a direita, General Robert E. Lee. Os sulistas lutaram para manter sua Confederação, já os yankees ou unionistas lutavam para acabar com o que considerava ser uma rebelião e restaurar a União. Desta forma os federados ou unionistas partiram para o ataque, mas foram rechaçados. Faltavam as tropas da União e aos seus oficiais (muitos deles inexperientes) brilhantismo e eficiência; o que sobrava nas tropas confederadas ou rebeldes. No entanto, o enorme peso das reservas nortistas, sua capacidade industrial e o bloqueio sobre os estados confederados (Plano Anaconda) foram decisivos em longo prazo para a vitória da campanha unionista. Na frente diplomática, os embaixadores dos Estados Unidos anularam as tentativas de reconhecimento da Confederação junto aos governos europeus e impediram que esses mesmos governos apoiassem a causa confederada. Mas nenhuma campanha diplomática se comparou a iniciativa do presidente A. Lincoln quando em 1º de janeiro de 1863, pelo Ato de Emancipação, libertou os escravos nos Estados Unidos da América (a lei definitiva só viria em dezembro de 1865, quando o Congresso proibiu oficialmente a escravidão nos Estados Unidos através da 13ª Emenda Constitucional). A medida teve pouco ou nenhuma ação prática no Sul que permanecia em guerra, mas transformou a Guerra Civil numa campanha civilizatória e humanista, não mais a guerra do Norte contra o Sul, mas a Guerra contra a escravidão e pela liberdade. Figura 2 - Mapa da Secessão. A Guerra Considerada a primeira guerra moderna da história, pois utilizou pela primeira vez táticas, armas e novos meios de destruição, por exemplo: a utilização em larga escala das ferrovias, no transporte de tropas e suprimentos; a introdução e o uso comum de armas de repetição; as trincheiras que foram usadas muitas vezes; os aeróstatos (balões de observação) surgiram no horizonte do campo de batalha; os navios blindados (encouraçados), os submarinos, as minas e os torpedos chegaram a ser usados em violentas batalhas navais; mas principalmente, foi a primeira guerra a aplicar o conceito da Guerra Total, no qual todos os recursos da nação são usados para alcançar a vitória e até a população civil tornava-se alvo prioritário de um exército. Tropas unionistas conseguiram uma serie de vitórias ao longo do rio Mississipi, culminado na queda de Vicksburg, que dividiu a Confederação, concretizando uma ideia do Plano Anaconda, envolver o coração do Sul (Alabama, Carolinas, Tennessee, Geórgia, Mississippi e Virgínia) e isola-lo do Oeste (Texas, Arkansas e Louisiana), desta forma concluindo o bloqueio sobre o Sul e agravando seu “sufocamento” econômico. No transcorrer do conflito morreram mais de 600.000 estadunidenses (mais do que os mortos dos Estados Unidos somados nas duas guerras mundiais, na guerra da Coreia e na guerra do Vietnã). Os yankees, os nortistas, tinham claras vantagens numéricas, população de mais de vinte milhões quase 90% da indústria, das ferrovias e da fabricação de armas da nação; maior parte do dinheiro em circulação e os trabalhadores mais qualificados. Também foi importante o controle de praticamente toda a esquadra de guerra, que era baseada em portos nortistas. O Sul, não estava sem condição de resistir, pelo contrário, possuía as melhores tropas e melhores oficiais, a maioria das altas patentes do exército antes de secessão eram sulistas. Além disso, os confederados lutavam em seu próprio território. Figura 4 - Batalha de Gettysburg, 1 a 3 de Julho de 1863. Percebendo a necessidade de uma vitória decisiva contra as forças da União, o General Robert E. Lee, Comandante-em-Chefe dos confederados, iniciou uma campanha de ataque ao Norte, que chegou ao clímax na Batalha de Gettysburg, durante três dias os exércitos sulistas e nortistas bateram-se nos campos ensolarados próximos a cidade de Gettysburg, terminando com a vitória das tropas da União. A derrota do General Lee, marcou o fim de qualquer nova iniciativa do Sul Confederado. “Encontramo-nos atualmente empenhados numa grande guerra civil, pondo à prova se essa Nação, ou qualquer outra Nação assim concebida e consagrada, poderá perdurar. Eis-nos num grande campo de batalha dessa guerra. Eis-nos reunidos para dedicar uma parte desse campo ao derradeiro repouso daqueles que, aqui, deram a sua vida para que essa Nação possa sobreviver. É perfeitamente conveniente e justo que o façamos.” ABRAHAM LINCOLN, 19 de Novembro de 1863, Cemitério Militar de Gettysburg, Pensilvânia, Estados Unidos da América. As vitórias dos yankees (unionistas) na Campanha do Mississipi alçou a figura do General Ulysses S. Grant ao Comando-em-Chefe das forças unionistas, sua estratégia foi manter pressão ininterrupta sobre os “rebeldes” sulistas, mesmo com um alto custo em vidas tanto da União quanto dos confederados, Grant poderia repor suas perdas, os confederados não. Um dos principais generais de Grant foi William T. Sherman, que iniciou uma campanha de muito sucesso, partindo do Mississipi em direção ao Oceano Atlântico, devastando o Coração da Confederação. Situação que perdurou até a segunda metade do século XX. A herança de anos de racismo e segregação pode ser notada na situação econômica da maioria da comunidade afrodescendente, o que em grande parte levou a sociedade organizada a tentar “pagar” essa dívida, vide as Ações Afirmativas adotadas ainda hoje nos Estados Unidos e que chegaram até ao Brasil. O presidente Abraham Lincoln líder da Federação durante todo o conflito e que nunca abandonou o propósito de reestabelecer a União, não pode concretizar seus planos para a reconstrução do país recém-pacificado, pois foi assassinado em 1865, ainda quando comemorava o fim do longo conflito. Uma conspiração liderada por um ator simpatizante da Confederação terminou com o trágico assassinato de Lincoln. Figura 5 - General Ulysses S. Grant (esquerda) e General William T. Sherman (direita). Desta forma tornou-se uma questão de tempo a capitulação incondicional dos confederados, em 09 de abril de 1865, em Appomattox, O General Lee rendeu-se. A partir dessa rendição os demais generais e líderes sulistas capitularam progressivamente. Chegava ao fim a Guerra de custos astronômicos, que ceifou a vida de centenas de milhares de homens e que deixaria marcas profundas nas gerações posteriores. Conclusão e Consequências O Sul confederado foi ocupado por tropas da União e os governos estaduais passaram a ser dirigidos por interventores federais, quase sempre oficiais da União, essa situação permaneceu até 1877. O plano de reconstrução do Sul nunca chegou a ser viabilizado, ao contrário, muitas vezes ocorreu a exploração de famílias sulistas, que se encontravam em situação calamitosa, por parte de capitalistas do Norte. Esses eventos criaram mais ressentimentos, em populações arrasadas pela Guerra, que vivenciavam a derrota e que tiveram seu modo de vida completamente alterado. Os negros, ex-escravos, ganharam a liberdade e obtiveram direitos iguais aos brancos, além de conseguirem a igualdade de direito eleitoral (o artigo suplementar 14 e artigo 15). No entanto, em quase todos os Estados sulistas foram criadas leis específicas que impediam a participação do negro na vida política, os chamados black codes. Quando não era um arranjo legal ou político, o uso da violência impediu também a participação política e “colocou o negro no seu lugar” (expressão segregacionista comum nos Estados sulistas). O terrorismo contra as comunidades e líderes negros tornou-se comum no Sul, grupos como os Cavaleiros da Camélia Branca e a Ku Klux Klan praticavam atos de vandalismo e assassinatos. A partir de 1877, praticamente todos os Estados sulistas desenvolveram legislações segregacionistas e racistas, impedindo assim os cidadãos negros de exercer de fato sua cidadania e, desta forma, tornando-os cidadãos de segunda classe. Figura 6 – Estátua de Abraham Lincoln no Lincoln Memorial, West Potomac Park, Washington, D.C. Os Estados Unidos viveram um período de depressão econômica logo após a Guerra, no entanto, nas últimas décadas do século XIX o modelo industrial e moderno do Norte triunfou completamente. A destruição do modelo sulista de produção eliminou os últimos entraves coloniais que impediam o total desenvolvimento da nação. Foi decisiva também a ocupação efetiva das vastas e ricas regiões do Oeste, para onde foram milhões de imigrantes e norteamericanos, nessas áreas desenvolveu-se um grande mercado consumidor, fornecedor de alimentos e matérias primas para a crescente industrialização estadunidense, consolidando o capitalismo industrial dos Estados Unidos. A Guerra de Secessão deixou marcas que permanecem até hoje, especialmente nas regiões sulistas. Problemas sociais e econômicos persistentes fragilizam muitos dos Estados do Sul, muitas vezes camuflados ou escondidos pela imensa riqueza da nação estadunidense. Bibliografia e fontes: EISENGERG, Peter L., Guerra Civil Americana. 4ª Edição, Editora Brasiliense 1987. NARO, Nancy Priscilla S., A Formação dos Estados Unidos: O Expansionismo Americano, quem é cidadão nos EUA (?), Escravidão e Guerra Civil. 2ª Ed., Campinas, SP, Editora da Universidade de Campinas, 1986. http://www.dw.de/dw/article/0,,372001,00.html http://pt.wikipedia.org/ José Jobson de A. Arruda e Nelson Piletti, Toda a História. Editora ática. Professor: José Augusto B. de Vilhena Jr.