TROMBOEMBOLISMO PULMONAR – FOCO NA URGÊNCIA Sumário 1 – Introdução ............................................................................................................................... 1 2 – Epidemiologia .......................................................................................................................... 2 3 – Fisiopatologia .......................................................................................................................... 2 4 – Manifestações clínicas............................................................................................................. 3 5 –Testes diagnósticos .................................................................................................................. 4 6 – Algoritmo diagnóstico ............................................................................................................. 5 7 – Orientações terapêuticas ........................................................................................................ 9 8– Prognóstico............................................................................................................................. 12 9 - Referências ............................................................................................................................ 13 1 – Introdução O tromboembolismo pulmonar é uma condição clínica comum e, muitas vezes, fatal. Sua apresentação clínica inespecífica e variável dificulta sobremaneira o diagnóstico, o que traz sérios impactos sobre a morbimortalidade da doença. Muitas vezes, o quadro se manifesta em situações de urgência, e o médico deve ser capaz de fazer o diagnóstico correto rapidamente e instituir as medidas terapêuticas adequadas. Pode-se classificar o tromboembolismo pulmonar em agudo e crônico. Nos quadros agudos, os sintomas e sinais surgem imediatamente após a obstrução dos vasos pulmonares, enquanto, nos quadros crônicos, desenvolve-se insidiosamente hipertensão pulmonar progressiva. As embolias pulmonares agudas variam, em sua apresentação, de formas pouco sintomáticas até quadros dramáticos, com insuficiência ventricular direita aguda, choque e óbito. 1 2 – Epidemiologia Sabe-se que a incidência de tromboembolismo pulmonar aumenta com a idade e que cerca de 50% dos pacientes não apresentam fatores de risco identificáveis. A verdadeira incidência da doença não pode ser determinada devido às dificuldades diagnósticas inerentes ao quadro. Homens e mulheres são afetados igualmente, e as populações brancas e negras têm incidências maiores que os asiáticos. Estudos de necropsia realizados na população mostram que a prevalência varia entre 3,9% a 16,6% no Brasil e entre 3,4% a 14,8% nos EUA, enquanto necropsias realizadas em pacientes hospitalizados revelam que a taxa de embolia pulmonar pode ultrapassar 60%, demonstrando a alta mortalidade nos pacientes em que o diagnóstico passa despercebido.1,2 São descritos fatores predisponentes de natureza genética e adquiridos. Dentre os genéticos, que determinam estados de hipercoagulabilidade, citam-se fator V de Leiden, mutação gene 20210A da protrombina, deficiências de proteína C, S e antitrombina III, além de hiper-homocisteinemia. Quanto aos fatores adquiridos, são citados idade avançada, obesidade, fenômenos tromboembólicos prévios, neoplasias malignas e síndrome do anticorpo antifosfolípide. O tromboembolismo pulmonar, na maioria das vezes, ocorre em pacientes com fatores predisponentes submetidos a situações desencadeantes transitórias como cirurgias, imobilização, gestação e uso de estrógenos.1,2,3 3 – Fisiopatologia A sequência de eventos que leva à trombose venosa, provavelmente, decorre de interações dinâmicas entre fatores genéticos e adquiridos. Um estímulo endotelial determinaria ativação da cascata de coagulação, com geração de trombina e deposição de fibrina no lume venoso. Os trombos originados dos membros inferiores, especialmente das veias ilíacas e femorais, são a fonte mais frequente de embolia pulmonar, embora eles também possam se originar das veias pélvicas, renais, dos membros superiores e do coração direito. Os trombos, geralmente, são levados aos lobos pulmonares inferiores. Em pacientes sem doença cardiopulmonar subjacente, o infarto pulmonar é relativamente infrequente, ocorrendo em cerca de 10% dos casos. Atribui-se tal fato à oclusão vascular incompleta pelos êmbolos ou à presença de anastomoses com veias brônquicas. Já nos pacientes com patologias cardiopulmonares de base, a incidência de infarto pulmonar pode aproximar-se de 30%, pois, frequentemente, existe comprometimento prévio da oxigenação da árvore pulmonar secundário à doença das vias aéreas ou aumento da pressão venocapilar pulmonar.2,3 As trocas gasosas são comprometidas pela obstrução mecânica dos vasos arteriais pulmonares e pela liberação de mediadores inflamatórios que levam a 2 desequilíbrio ventilação/perfusão, aumento do espaço morto fisiológico e shunt intrapulmonar. Podem ocorrer hiperventilação alveolar e broncoconstrição. As respostas hemodinâmicas dependem do grau de obstrução da circulação arterial pulmonar e da presença de doença cardiopulmonar subjacente. A resistência arterial pulmonar aumenta em decorrência da obstrução vascular mecânica e da vasoconstrição induzida por hipoxemia e por mediadores inflamatórios. Embora possa haver variações individuais, a oclusão vascular súbita, que compromete mais de 50% da circulação arterial pulmonar, causa disfunção aguda do ventrículo direito quando a pressão arterial pulmonar média ultrapassa 40 mmHg. Pacientes, com doença cardiopulmonar prévia e reserva fisiológica reduzida, podem apresentar falência ventricular direita com graus menores de oclusão da circulação pulmonar.3 A insuficiência ventricular direita aguda reduz a pré-carga do ventrículo esquerdo, podendo causar hipotensão e choque. A dilatação aguda do ventrículo direito causa desvio do septo interventricular, comprometendo ainda mais o enchimento ventricular esquerdo. A distensão ventricular direita também aumenta a pressão venosa coronariana e reduz a distensibilidade diastólica do ventrículo esquerdo, fatores que contribuem para dano miocárdico isquêmico e redução progressiva do débito cardíaco.3,4,5,6 4 – Manifestações clínicas Os sinais e sintomas do tromboembolismo pulmonar são variados e inespecíficos, tornando o diagnóstico um desafio ao médico. Estima-se que cerca de 90% dos óbitos por embolia pulmonar ocorrem em pacientes que não têm o diagnóstico correto, no momento oportuno.2 Na avaliação clínica, devem-se considerar dispneia, taquipneia e taquicardia, especialmente se associadas à hipoxemia. Dor pleurítica, escarros hemoptoicos, cianose e sinais de trombose venosa profunda também são elementos importantes. Em pacientes hipotensos, suspeita-se de embolia pulmonar quando houver evidências de cor pulmonale agudo, como ingurgitamento jugular, hiperfonese do componente pulmonar da segunda bulha, terceira e quarta bulhas de ventrículo direito ou evidências de trombose venosa profunda, como edema e sinais inflamatórios unilaterais nos membros inferiores. O diagnóstico diferencial inclui pneumonia, infarto do miocárdio, insuficiência cardíaca, dissecção aórtica, DPOC exacerbada, pneumotórax, pleurite, pericardite, trauma musculoesquelético, ansiedade, neoplasias intratorácicas e até processos abdominais como colecistite aguda.2,3 3 5 –Testes diagnósticos - Radiografia de tórax: apresenta alterações inespecíficas, como atelectasias, derrame pleural, infiltrados e elevações de hemicúpula diafragmática, em até 80% dos casos, de modo que não pode ser usada para confirmar ou excluir o diagnóstico. São descritos alguns sinais clássicos, como imagens cuneiformes periféricas ou oligoemia focal (sinal de Westermark), que são sugestivos do diagnóstico, mas raramente vistos. Uma radiografia de tórax normal no contexto de insuficiência respiratória grave pode ser altamente sugestiva de embolia pulmonar grave.⁷ - Eletrocardiograma: geralmente são vistas alterações discretas de segmento ST e onda T, além de taquicardia sinusal, achados de baixa especificidade. Padrões clássicos como S1Q3T3, sobrecarga ventricular direita e bloqueio incompleto de ramo direito são vistos mais frequentemente na embolia pulmonar maciça.6,7 Gasometria arterial: ao contrário do que se acreditava no passado, a análise dos gases arteriais tem pouco valor no diagnóstico das embolias pulmonares. Cerca de 85% a 90% dos pacientes têm hipoxemia e aumento do gradiente alvéolo-arterial, condições observadas em outras doenças cardiorrespiratórias. Outra alteração inespecífica é a hipocapnia, decorrente do aumento da ventilação. Achados gasométricos normais não permitem a exclusão do diagnóstico.⁷ D-dímero: trata-se de um produto da degradação da fibrina, dosado através de várias técnicas, preferindo-se o método ELISA quantitativo. Nessa metodologia, níveis acima de 500 ng/mL são considerados anormais. É um teste cuja sensibilidade varia de 85 a 98%, mas de baixa especificidade, com resultados falso-positivos em várias situações. Ocorre elevação de D-dímero em infarto do miocárdio, acidente vascular encefálico, coagulação intravascular disseminada, insuficiência cardíaca, trauma, pósoperatório, síndrome de resposta inflamatória sistêmica, hepatopatias avançadas, insuficiência renal, gestação, condições inflamatórias crônicas e malignidades. Em pacientes não hospitalizados, com probabilidade pré-teste baixa, tem valor preditivo negativo alto, sendo especialmente útil para exclusão do diagnóstico nesse grupo de pacientes.⁷ Troponina: pacientes com lesão ventricular direita podem apresentar elevações de troponina I e troponina T, específicas para dano miocárdico. Valores normais não excluem o diagnóstico, mas valores elevados podem se correlacionar com o prognóstico da embolia pulmonar.3,7 Peptídeo cerebral natriurético (BNP): é um marcador plasmático de baixa sensibilidade e inespecífico, o que limita seu uso no diagnóstico de embolia pulmonar. Todavia, tanto seus níveis quanto de seu precursor, N-terminal pro BNP, estão elevados na maioria dos pacientes com embolia pulmonar extensa e sobrecarga de VD. Sua dosagem deve ser incluida na rotina de atendimento aos pacientes, caso haja disponibilidade no serviço. Estudos mostram que a dosagem isolada de troponina ou de BNP tem valor prognóstico, mas a elevação dos dois biomarcadores fornece informações prognósticas mais precisas.⁷ 4 Cintilografia pulmonar de ventilação e perfusão: trata-se de método de imagem muito útil para o diagnóstico de embolia pulmonar. Os exames anormais podem ser classificados como de baixa, média ou alta probabilidade para embolia pulmonar. O ideal é que os achados da cintilografia sejam combinados com a avaliação clínica para aumentar a acurácia diagnóstica. Geralmente, o valor preditivo da cintilografia aumenta quando há concordância com a avaliação de probabilidade clínica. Demonstrou-se que, quando há alta suspeição clínica, uma cintilografia de baixa ou média probabilidade não exclui o diagnóstico, indicando a necessidade de outros testes complementares. Por outro lado, num contexto clínico de baixa probabilidade clínica, uma cintilografia normal ou de baixa probabilidade exclui embolia pulmonar em 95% dos casos.5,7 Angiotomografia computadorizada de tórax: os equipamentos modernos permitem sensibilidade diagnóstica próxima de 85% e especificidade de 95%. À semelhança da cintilografia pulmonar, as possibilidades diagnósticas com angiotomografia computadorizada do tórax devem ser analisadas à luz dos dados clínicos. Vantagens sobre outros métodos de imagem são a rapidez do teste e a possibilidade de excluir patologias não vasculares, como anormalidades musculoesqueléticas, doenças de vias aéreas, linfadenomegalias, doenças pleuropericárdicas e doenças pulmonares. Potenciais desvantagens são as reações ao contraste (alergia, nefrotoxicidade) e a falta de portabilidade.⁷ Ecocardiograma: é um método importante na estratificação de risco por permitir avaliação do estado contrátil do ventrículo direito e estimativa da pressão arterial pulmonar, além de permitir diagnóstico diferencial com dissecção aórtica e doenças pericárdicas. Um achado significativo para diagnóstico e prognóstico é a presença de trombo intracavitário no ventrículo direito. Trata-se de teste limitado para diagnóstico, pois um exame normal não exclui embolia pulmonar. Angiografia pulmonar: teste extremamente sensível e específico, considerado padrão ouro para diagnóstico de embolia pulmonar aguda. Entretanto, por tratar-se de método invasivo, com riscos ao paciente, deve ser reservado para situações específicas em que a propedêutica não invasiva não define o diagnóstico e para pacientes candidatos à embolectomia pulmonar.3,7 6 – Algoritmo diagnóstico O diagnóstico do tromboembolismo pulmonar deve ser baseado na análise conjunta de fatores de risco, manifestações clínicas e testes complementares. A estratificação de risco rápida e acurada é fundamental para o tratamento adequado do tromboembolismo pulmonar. Uma abordagem diagnóstica consagrada na literatura médica5,7 de fácil aplicabilidade, parte de uma regra de predição clínica baseada em um escore de pontos.* * Fonte: http://www.bibliomed.com.br/calculadoras/wells/ 5 CRITÉRIOS DE WELLS E CRITÉRIOS DE WELLS MODIFICADOS PARA AVALIAÇÃO CLÍNICA DE EMBOLIA PULMONAR Sinais clínicos de trombose venosa profunda Diagnósticos alternativos menos prováveis que embolia pulmonar FC > 100 bpm Imobilização (> três dias) ou cirurgia nas últimas quatro semanas Embolia pulmonar ou trombose venosa profunda prévias Hemoptise Neoplasia maligna 3.0 3.0 1.5 1.5 1.5 1.0 1.0 PROBABILIDADE ESCORE Avaliação clínica de probabilidade tradicional (Critérios de Wells) Alta > 6.0 Média 2.0 a 6.0 Baixa < 2.0 Avaliação clínica de probabilidade simplificada (Critérios de Wells modificados) Embolia pulmonar provável > 4.0 Embolia pulmonar improvável ≤ 4.0 Após a classificação clínica dos pacientes pelos critérios de Well tradicionais ou modificados, o próximo passo para confirmação ou exclusão do diagnóstico é a avaliação de imagem por angiotomografia computadorizada do tórax ou por cintilografia pulmonar de ventilação e perfusão. A opção pelo método de imagem pode ser feita pela disponibilidade, experiência do serviço ou aspectos clínicos (alergia a contraste ou insuficiência renal, por exemplo), visto que o rendimento diagnóstico é semelhante em ambas estratégias. 6 ESTRATÉGIA DIAGNÓSTICA BASEADA EM ANGIOTOMOGRAFIA DE TÓRAX Figura Fonte: do autor Figura 1 7 ESTRATÉGIA DIAGNÓSTICA BASEADA EM CINTILOGRAFIA PULMONAR DE VENTILAÇÃO/PERFUSÃO Figura 2 Fonte: do autor Nos serviços de urgência de hospitais gerais, em que a prevalência de embolia pulmonar é baixa, mas o diagnóstico é cogitado com frequência, recomenda-se uma abordagem baseada em critérios de exclusão. Comprovou-se que em populações em que há baixa prevalência de embolia pulmonar, casos de baixa suspeição clínica, que preencham todos os critérios de exclusão citados a seguir, podem ter o diagnóstico afastado seguramente, sem qualquer propedêutica complementar.⁷ CRITÉRIOS DE EXCLUSÃO DE EMBOLIA PULMONAR - Idade inferior a 50 anos - Frequência cardíaca inferior a 100 bpm - Saturação de oxigênio superior a 95% - Ausência de escarros hemoptoicos - Ausência de uso de estrógenos 8 - Ausência de episódios prévios de trombose venosa profunda ou embolia pulmonar - Ausência de edema unilateral de membro inferior - Ausência de cirurgia ou trauma requerendo hospitalização nas últimas quatro semanas. 7 – Orientações terapêuticas O tratamento adequado do tromboembolismo pulmonar deve ser orientado por uma estratificação de risco rápida, visto que os casos mais graves requerem terapias mais agressivas. As embolias pulmonares agudas podem ser classificadas em três grupos de acordo com a gravidade dos pacientes. Os casos leves caracterizam-se por estabilidade hemodinâmica, função ventricular direita preservada e ausência de elevação de biomarcadores (troponina, peptídeo cerebral natriurético ou N-proBNP). Casos de gravidade moderada apresentam estabilidade hemodinâmica, mas têm sinais de disfunção ventricular direita e aumento de biomarcadores. Já os pacientes graves têm hipotensão, falência ventricular direita e aumento dos marcadores plasmáticos. A anticoagulação parenteral, com finalidade de evitar novos episódios e permitir que mecanismos fibrinolíticos endógenos lisem o coágulo, é o pilar do tratamento. Nos casos graves, além da anticoagulação, estão indicadas terapias de reperfusão, com o objetivo de aumentar rapidamente o fluxo pulmonar e reduzir a pressão arterial pulmonar. Quando há forte suspeita clínica, deve-se iniciar a anticoagulação imediatamente, antes da confirmação diagnóstica, a menos que o risco de sangramento seja excessivo. Contraindicações absolutas aos anticoagulantes são hemorragia intracraniana, sangramento ativo grave, hipertensão maligna e cirurgias recentes em SNC, medula espinhal e olhos. São consideradas contraindicações relativas grandes cirurgias recentes, acidente cerebrovascular recente, hemorragia digestiva ativa, hipertensão grave, insuficiência renal, insuficiência hepática e trombocitopenia (níveis inferiores a 50.000/mm³). Nos pacientes estáveis, a anticoagulação deve ser feita com heparina não fracionada ou heparina de baixo peso molecular. Prefere-se a heparina não fracionada nos pacientes de alto risco (idosos, histórico de neoplasia maligna, doença cardiopulmonar crônica), por sua meia-vida mais curta e possibilidade de reversão com protamina. Tais pacientes podem evoluir com sangramento ou piora clínica, necessitando de procedimentos invasivos e terapia de reperfusão. A heparina não fracionada deve ser administrada em bomba de infusão contínua, em doses ajustadas pelo peso corporal (bolus de 80U/kg seguido por infusão de 18U/kg/hora ajustada pelo PTTa). Faz-se necessário monitorizar as plaquetas pelo risco de trombocitopenia induzida pela heparina, complicação imunológica, mediada por anticorpos, que leva à ativação plaquetária e causa tromboses arteriais e venosas. A opção por heparina de 9 baixo peso molecular, usada por via subcutânea, deve ser feita em pacientes de baixo risco. As heparinas de baixo peso molecular não requerem monitorização da coagulação, e o risco de trombocitopenia é muito inferior em relação à heparina não fracionada. Nos pacientes com insuficiência renal (clearance de creatinina inferior a 30 mL/min), prefere-se heparina não fracionada, pois as heparinas de baixo peso são eliminadas pelos rins. Uma droga alternativa, com farmacocinética semelhante às heparinas de baixo peso molecular, é o fondaparinux, de uso subcutâneo, cujo mecanismo de ação é a inibição específica do fator X ativado.³ Um fator limitante para o seu uso é o custo mais elevado em relação às heparinas de baixo peso molecular. A incidência de complicações hemorrágicas com as heparinas é próxima de 1,9%, sendo fatais em 0,2% dos casos. Pacientes considerados de gravidade moderada, estáveis hemodinamicamente, mas com sinais de disfunção ventricular direita e aumento de troponina e peptídeo cerebral natriurético, devem ser tratados com heparina não fracionada, embora alguns autores recomendem terapia fibrinolítica nos casos muito sintomáticos. Nos casos de embolia pulmonar grave, com disfunção hemodinâmica e sinais de comprometimento ventricular direito, estão indicadas terapias de reperfusão farmacológica, mecânica ou cirúrgica. Esses pacientes necessitam de suporte hemodinâmico, com infusão de fluidos inotrópicos ou vasopressores e suporte ventilatório, com oxigenoterapia e ventilação mecânica. Quando se indica ventilação mecânica, deve-se atentar para o fato de que altos valores de PEEP podem comprometer o retorno venoso e agravar o estado hemodinâmico do paciente.³ A reperfusão farmacológica consiste na administração sistêmica de um agente fibrinolítico, preferencialmente nas primeiras 48 horas de início dos sintomas. Com essa abordagem terapêutica, até 13% dos pacientes apresentam complicações hemorrágicas, e a incidência de sangramento no SNC ou hemorragia fatal chega a 1,8%. A reperfusão mecânica inclui embolectomia percutânea por cateter com fragmentação do trombo ou terapia fibrinolítica local, direcionada por cateter, que permite doses menores que aquelas usadas no tratamento sistêmico. Em alguns centros, a embolectomia pulmonar cirúrgica, procedimento de alta morbimortalidade, é a opção em pacientes com embolia pulmonar grave e risco alto de sangramento com a fibrinólise sistêmica ou nos casos refratários aos fibrinolíticos.3,6 Após o tratamento inicial com anticoagulação parenteral, a maioria dos pacientes deve receber um antagonista de vitamina K, como warfarin, para prevenir recorrência de embolia pulmonar ou trombose venosa profunda. Nos casos estáveis, o warfarin deve ser iniciado no mesmo dia da anticoagulação parenteral, que deve ser mantida no mínimo por cinco dias e ser interrompida quando o RNI estiver em níveis terapêuticos (entre 2 e 3) por pelo menos dois dias consecutivos. Já nos pacientes graves, recomenda-se que o warfarin seja iniciado mais tardiamente, após a estabilização do quadro. Uma alternativa ao warfarin é o dabigatran, com taxas de tromboembolismo e sangramento semelhantes ao cumarínico e com a vantagem de não necessitar de monitorização laboratorial. Contudo, o custo do dabigatran é significativamente maior que o do warfarin, e convém lembrar que a comodidade laboratorial não livra o paciente 10 de seguimento clínico rigoroso pelo risco das complicações hemorrágicas. Pacientes que desenvolvem embolia pulmonar como complicação de fatores reversíveis – cirurgias, traumas, doenças clínicas – apresentam baixo risco de recorrência após a suspensão da anticoagulação, podendo fazer uso de anticoagulante oral por um período de três meses. Já aqueles pacientes com embolia pulmonar não provocada têm risco maior de recorrência e requerem períodos de anticoagulação mais longos. Filtros de veia cava, implantados por via percutânea, são indicados para pacientes com alto risco de recorrência de embolia pulmonar e contraindicação absoluta à anticoagulação. Tais dispositivos reduzem o risco de recorrências, mas estão associados a complicações como oclusão trombótica de veia cava inferior, trombose venosa profunda e síndrome pós-trombótica. Casos mais raros que evoluem com hipertensão pulmonar crônica devem ser tratados com anticoagulação por tempo indefinido, medidas para insuficiência ventricular direita, como inotrópicos e diuréticos, e drogas com ação vasodilatadora pulmonar, como prostaciclina, antagonistas de receptor de endotelina e inibidores de fosfodiesterase. Nesses casos, a resposta ao tratamento clínico costuma ser insatisfatória, propondo-se a tromboendarterectomia cirúrgica com a finalidade de remover o tecido fibrótico que, muitas vezes, está ocluindo as artérias pulmonares. Mesmo em centros especializados, o procedimento está associado à mortalidade operatória próxima de 4%.3,8 11 Figura 3 Fonte: do autor QUADRO 1 ANTICOAGULANTES PARENTERAIS USADOS NO TRATAMENTO DA EMBOLIA PULMONAR AGUDA DROGAS Fibrinolíticos Estreptoquinase Ativador do plasminogênio tecidual (rTPA) Heparina não-fracionada DOSES RECOMENDADAS 250.000 UI em 30 minutos, seguido por 100.00 UI/hora em 12 a 24 horas 100 mg em 2 horas ou 0,6 mg/kg em “bolus” de 10 minutos (dose máxima = 50 mg ) 80 U/kg em “bolus” seguido por 18 U/kg ajustadas pelo PTTa em bomba de infusão contínua Heparinas de baixo peso molecular Enoxaparina 1 mg/kg BID ou 1,5 mg/kg MID Dalteparina 100 U/kg BID ou 200 U/kg MID Fondaparinux 7,5 mg (peso entre 50 e 100 kg) MID 10 mg (peso > 100kg) MID 5 mg (peso < 50 Kg) MID Fonte: do autor Observação: As doses citadas das heparinas de baixo peso molecular e do fondaparinux requerem correção nos pacientes com disfunção renal. 8– Prognóstico A embolia pulmonar aguda não tratada tem taxas de mortalidade próximas de 30%, e a causa mais comum de óbito é a recorrência dos episódios. O diagnóstico correto e o início imediato da anticoagulação permitem que a maioria dos pacientes sobreviva, com mortalidade próxima de 12% em 30 dias de seguimento.3,7 A presença de hipotensão ou choque é a principal variável prognóstica. Pacientes com embolia pulmonar maciça, que se apresentam com choque, têm alta mortalidade, e a maioria evolui para óbito nas primeiras horas do quadro. Outros elementos associados à evolução desfavorável são presença de trombo intramural no ventrículo direito e coexistência de trombose venosa profunda. Sinais ecocardiográficos de disfunção ventricular direita e presença de marcadores plasmáticos como troponina e peptídeo cerebral natriurético ou N-terminal 12 pró-peptídeo cerebral natriurético também estão associados com aumento de mortalidade. A elevação isolada de um dos biomarcadores correlaciona-se com prognóstico desfavorável, mas a elevação dos dois parece ter um significado prognóstico mais preciso.⁷ A complicação de longo prazo mais séria é a hipertensão pulmonar tromboembólica crônica, condição rara, que evolui para insuficiência respiratória crônica progressiva.3,8 9- Referências 1. ALEM, C.E.; FABRO, A.T.; QUELUZ, T.T. Clinicopathological findings in pulmonary thromboembolism: a 24-year autopsy study. J Bras Pneumol. 2004; 30: 426-32. 2. TERRA-FILHO, M.; MENNA-BARRETO, S.S. et al. Recomendações para o manejo da tromboembolia pulmonar. J Bras Pneumol. 2010; 36 supl 1: s1-s68 3. AGNELLI, G.; BECATTINI, C. Acute pulmonary embolism. New Eng J Med. 2010; 363:266-74. 4. STEIN, P.D.; WOODARD, P.K.; WEG, J.G., et al. Diagnostic pathways in acute pulmonary embolism: recomendations of the PIOPED Investigators. Am J Med. 2006; 119(12): 1048-55. 5. VAN BELLE, A.; BULLER, H.R.; HUISMAN, M.V., et al. Effectiveness of managing suspected pulmonary embolism using an algorithm combining clinical probability, D-dimer testing, and computed tomography. JAMA. 2006; 295: 17279. 6. PIAZZA, G.; GOLDHABER, S.Z. Management of submassive pulmonary embolism. Circulation. 2010; 122: 1124 -29 13 7. THOMPSON, B.T.; HALES, C.A. Diagnosis of acute pulmonary embolism. Literature review current through: Feb 2014. [Last literature review Dez. 2013]. Disponível em: www.uptodate.com [Acesso em: 12 jun. 2014]. 8. HOEPER, M.M.; MAYER, E.; SIMONNEAU, G. Chronic thromboembolic pulmonary hypertension. Circulation. 2006; 113: 2011-20 14