INTEGRAÇÃO ENTRE A FRONTEIRA DE EFICIÊNCIA DO CAPM E A TEORIA DA PREFERÊNCIA Regis da Rocha Motta, Ph..D. Prof. Adjunto, UFRJ/DEI, [email protected] Rua Vice Governador Rubens Berardo 407-2, Gávea Rio de Janeiro RJ Guilherme Marques Calôba COPPE/UFRJ, [email protected] Alan Seixas Bello Moreira DEI/UFRJ, [email protected] Abstract The goal of this article is to present the relationship between numerical optimization tools applied to investments and preference theory, using utility riskaversion functions, in the determination of optimum portfolio for the upstream sector. Some articles have already been published in Brazilian(1) and international(2) magazines and congresses. This article, however goes a little beyond the previous ones. The petroleum industry is very singular on the economy, featuring huge uncertainties associated to the return on investment. In an environment like this, it is natural to search for tools that may identify and reduce risks. Given the extensive amount of capital invested in a block for its exploration, appraisal and possible development, risk analysis finds, in this field, very extensive use. Further on this article, the Capital Asset Pricing Model (CAPM) and risk analysis techniques are going to be introduced, discussing a case applied to the petroleum exploration industry. The main feature of this article is the integration between CAPM and Risk Analysis through the Preference Theory, using utility functions and the certainty equivalent concept. Keywords: Petroleum, CAPM, Preference Theory 1. O CAPM e sua aplicação O modelo de CAPM foi desenvolvido por Harry Markowitz, em 1962, o que o levou a ser laureado com o Prêmio Nobel posteriormente. Baseado no equilíbrio que existe na relação entre risco e retorno de um investimento, estruturou uma teoria para precificação de ativos. O trabalho de Markowitz, na verdade, é sensivelmente maior do que será apresentado aqui. Apenas uma das idéias principais de sua teoria será apresentada, a fronteira eficiente, que apresenta, para diversos níveis de risco, o maior retorno possível e a composição de portfólio que leva a esta configuração. Em um projeto, ou investimento que possua incertezas, o retorno é dado pela média do valor presente líquido descontado ou da taxa interna de retorno alcançada calculada em um número n suficientemente grande de iterações para que se possa aproximar o resultado a um valor esperado do investimento ou projeto. Entende-se por risco uma relação de dispersão dos dados encontrados para a medida de retorno. A medida mais utilizada é o desvio-padrão dos resultados, supondose a aproximação dos valores encontrados por uma distribuição normal ou lognormal. Esta relação de risco-retorno pode ser intuitivamente estudada. Uma relação natural é o fato de que, quanto mais se aumenta o retorno, maior será o risco embutido no projeto. O modelo de Markowitz propõe a composição da fronteira eficiente para um dado conjunto de projetos, composta de uma forma matematicamente simples. Dentre os projetos especificados, e limitando a resolução através de uma condição de contorno, leia-se limitação de capital a ser aplicado, é possível construir a fronteira eficiente. Algumas características da indústria de petróleo foram envolvidas na caracterização do problema. Neste setor, bem como em diversos outros de grande porte, é muito utilizada a formação de Joint-Ventures para a realização de projetos em conjunto. Basicamente, dados níveis de risco máximo, a função objetivo será maximizar o retorno, dada a restrição de capital máximo e mínimo a ser investido. A otimização será feita modificando o nível de participação em cada projeto (que estará sempre entre 0% e 100%). Para minimizar o risco dado um retorno mínimo, o procedimento será o mesmo. Os passos para a formação da fronteira são os seguintes: Inicialmente, determina-se o menor risco dado um investimento mínimo, e seu retorno associado; A seguir, calcula-se o retorno máximo associado ao portfólio; Divide-se a diferença entre risco mínimo e máximo em intervalos iguais e, a seguir, calcula-se, para estes valores de risco, o retorno máximo encontrado; Ligando-se estes pontos por uma curva, é obtida a fronteira de eficiência; Verificam-se as seguintes fórmulas para retorno e risco do portfólio, supondo apenas dois projetos: RetPortf = Ret1*x1 + Ret2*x2 σ Portf = (σ1x1)2+(σ2x2)2 + 2σ1σ2x1x2ρ1,2 2 onde: RetPortf é o retorno do portfólio a ser composto σportf, é o risco associado ao portfólio Ret1,Ret2 é o retorno associado a cada projeto σ1,σ2 é o risco associado a cada projeto, ρ1,2 é o índice de correlação entre os dois projetos* e x1,x2, é o nível de participação de cada projeto * Ressalte-se que neste caso se supõe que a correlação entre os projetos seja zero. Entretanto, é possível montar uma matriz de correlação e de covariância Um exemplo prático ilustrará melhor a metodologia do CAPM. 2. Utilização prática do CAPM Supondo que um investidor possua quatro projetos, A,B,C e D, como opções de investimento e que estes tenham as seguintes características. 2 Projetos Projetos Custo de Desenv. Retorno Risco 300 300 60 A 200 250 50 B 180 220 40 C 130 60 10 D Fig. 1 – Sumário dos Projetos Ainda há a suposição de que a empresa em questão possua um capital de risco a ser investido de, no máximo, 400 milhões de reais e que pressuponha um investimento mínimo de 50 milhões para manter seu nome no mercado. Inicialmente, calcula-se o risco mínimo. Após este passo, o retorno máximo. Neste caso, calculou-se o intervalo entre o risco máximo (dado pelo retorno máximo) e o risco mínimo, dividindo-o em dez pontos intermediários. Para estes valores de risco, calcula-se o retorno máximo a ser alcançado, dado o portfólio e as porcentagens alocadas a cada projeto. O gráfico da fronteira eficiente, bem como a indicação de risco e retorno de cada um dos projetos segue abaixo: Fronteira de Eficiência 600 Retorno 500 400 300 200 100 0 0 10 20 30 40 50 60 70 Risco Fronteira A B C D Figura 2 – Fronteira de Eficiência Verifica-se que, aumentando-se o nível de risco mínimo, o retorno máximo aumenta. Esta aplicação vislumbra diversos investimentos de capital nos projetos, alcançando sempre resultados ótimos na relação risco-retorno. A seguir, apresenta-se uma tabela com resultados obtidos para otimização em cada ponto, além das percentagens de cada projeto tomadas em cada uma das opções: Min. Risco Risco Retorno Custo do Projeto 1.32 12.83 20.00 7.60 81.96 104.18 13.89 149.71 190.28 3 %A %B 0.72% 0.69% 5.88% 7.05% 10.73% 12.88% %C %D 0.98% 9.69% 17.71% 11.29% 42.31% 77.28% 19.55% 26.89% 100.00% 27.34% 37.59% 100.00% 34.79% 47.85% 100.00% 44.14% 60.13% 80.32% 52.63% 71.50% 39.47% 60.50% 82.09% 1.55% 80.17% 100.00% 0.00% 100.00 100.00% 0.00% Max. Retorno % Pela tabela, é possível examinar melhor a fronteira de eficiência e tirar algumas conclusões interessantes. Primeiramente, verificar que os projetos menos arriscados são mais preferidos no início da curva, quando a exigência sobre risco é maior. Destaca-se o aumento do projeto D e sua seguinte redução, demonstrando que, apesar de possuir menos incertezas associadas do que os outros três projetos, interessa apenas aos investidores mais conservadores, trabalhando a um nível de risco menor. No entanto, os projetos B e C crescem em importância a cada aumento no nível de risco. O projeto A possui uma característica singular: devido a seu alto custo, não é plenamente utilizado em nenhum dos pontos ótimos, embora seja o de maior retorno. Comprova-se, desta forma, a capacidade do método CAPM de otimizar carteiras ótimas de investimento, buscando a melhor relação retorno-risco. O exemplo apresentado demonstra como podem ser enganosas algumas considerações a priori, tais como: O Projeto de maior retorno e risco será o preferido pelos investidores em um nível de risco alto e O Projeto de menor risco será o único envolvido quando da otimização para risco mínimo; O método CAPM mostra-se extremamente útil na resolução de problemas de análise de investimentos neste estágio de seleção de projetos. Deve-se ressaltar que uma análise de risco detalhada e extensa deverá ser realizada até se definirem níveis de retorno e risco do investimento. Assim, na exploração de petróleo e gás, por exemplo, devem ser computados os riscos geológicos, de exploração, avaliação e desenvolvimento, assim como incertezas ligadas ao volume de óleo recuperável, curva de produção, etc. Através do Método de Amostragem de Monte Carlo, é possível simular o fluxo de caixa do investimento inserindo cada um destes fatores de risco, chegando a uma média de valor presente líquido descontado para o retorno e um desvio padrão para o risco associado a cada um dos investimentos. Uma breve descrição destes riscos pode ser encontrada em (citar Brasil Energia). No entanto, foi otimizada a relação de risco e retorno para um determinado investimento tendo em vista apenas os possíveis resultados dados pela combinação dos mesmos. Em momento nenhum foi introduzida a idéia de preferência ao risco. Nepomuceno (1997), além de Walls (1994), citaram a aplicação da teoria da preferência para a indústria de petróleo. Este tipo de otimização será descrito no próximo tópico. Interv. Risco Min-Max :62.84 20.17 26.45 32.74 39.02 45.30 51.59 57.87 64.16 216.91 279.39 339.25 389.89 427.28 462.01 480.09 490.00 266.38 320.68 372.71 400.00 400.00 400.00 400.00 400.00 16.29% 22.78% 29.00% 33.03% 38.24% 43.07% 19.89% 6.67% 3. Função Utilidade, Equivalente Certo e o CAPM 4 A aplicação de Funções Utilidade e Teoria da Preferência para o setor de petróleo já vem de alguns anos. As curvas de utilidade, calcadas na preferência ao risco, vem sendo utilizadas a um certo tempo. O perfil do setor de exploração de petróleo, assim como de diversos outros setores de grande porte, é de aversão ao risco, ou seja, quanto maior se torna o risco associado ao investimento em questão, menor é o aumento relativo na valoração dada pelo investidor a este investimento. Pelo outro lado, setores de novas tecnologias são mais condizentes com risco, e tem aumento relativo maior na valoração de investimentos com o acréscimo do risco associado. Uma forma de mensurar esta relação são as chamadas funções utilidade. Estas funções seguem esta forma básica: Preferente ao Risco U(x) Indiferente ao Risco Avesso ao Risco VE(X) Figura 3 – Função Utilidade Na figura acima, U(x) denota a utilidade de um investimento X, e VE(X) é o valor esperado do investimento, supondo que o risco (desvio-padrão associado) seja proporcional a este. A tendência natural do ser humano em sua vida pessoal, bem como a de setores de grande porte é de aversão ao risco. Com base nisso, desenvolveu-se uma teoria para a valoração de investimentos incertos através da determinação de um valor para o mesmo. A este valor se dá o nome de equivalente certo. Especificando melhor, para cada investimento incerto, a quantia pela qual a empresa ou investidor avaliaria este negócio, ou seja, o valor certo pelo qual se troca o investimento coberto de incertezas representa o equivalente certo. Similarmente à função utilidade, é esperado que o investidor indiferente ao risco possua equivalentes certos iguais ao valor médio esperado do negócio. A aversão ao risco, por sua vez, denota equivalentes certos menores que o valor médio esperado do negócio, e a preferência pelo risco corresponde a equivalentes certos maiores que o valor esperado. Tendo em vista o comportamento comum de aversão ao risco, é usual empregar funções exponenciais para o equivalente certo, seguindo esta fórmula: EqC(x) = -R*ln(p1*e-(V1 /R) + p2*e-(V2 /R)), onde V1 é o retorno financeiro do evento 1; V2 é o retorno financeiro do evento 2; p1 é a probabilidade de ocorrência do evento 1; p2 é a probabilidade de ocorrência do evento 2 e 5 R é a tolerância ao Risco. O fator R é uma característica particular de cada empresa, sendo uma representação do capital de risco da empresa. Obviamente, índices de tolerância ao risco menores corresponderão a tomada de decisão por investimentos de menor risco, e da mesma forma para tolerâncias maiores. O uso de funções de utilidade e de equivalente certo é interessante, principalmente, pela possibilidade de se atingir um máximo absoluto para a função objetivo, no caso, o equivalente certo. Dado que existe uma tolerância ao risco determinada, é possível maximizar o equivalente certo para uma dada configuração de risco. Em um ambiente constituído de diversos projetos, a aproximação do equivalente certo é feita de forma diferente, através da seguinte fórmula: EqC (Portf) = VE – (σ2/R), onde VE é o valor esperado do retorno do portfólio σ2 é a variância do retorno do portfólio e R é a tolerância ao risco Através desta fórmula, é possível calcular e maximizar o equivalente certo do portfólio de projetos. Assim, para diferentes valores de R, é possível calcular equivalentes certos ótimos. Uma vez determinado o nível de preferência ao risco, o problema deixa de ser dependente de uma apreciação externa e passar a ser simplesmente um problema de otimização. Retornando ao exemplo exibido anteriormente, pode-se ter uma melhor visualização do que ocorre quando se integra o CAPM e a teoria da preferência. 4. Continuando o exemplo Dada a situação apresentada, a fronteira de eficiência mostra diversas condições de risco e retorno a serem analisadas. No entanto, supondo um perfil de preferência ao risco, não é óbvio escolher o ponto que maximiza o equivalente certo. Novamente será usada a técnica de gradiente descendente, buscando maximizar a função do equivalente certo, definida para o portfólio anteriormente, através da alteração nas participações nos quatro projetos. Na tabela abaixo, exibe-se, para diversos níveis de tolerância ao risco e seus respectivos risco e retorno, além da percentagem de participação em cada projeto. Risco Retorno R=5 24.53 260.63 Custo do Projeto 304.37 %A %B %C %D EqC 20.83% 25.00% 34.37% 100.00% 140.31 R = 10 36.20 371.57 400.00 30.95% 39.71% 54.29% 100.00% 240.50 R = 20 51.91 463.71 400.00 42.86% 61.14% 82.86% 0.00% 329.00 R = 40 54.23 471.92 400.00 31.29% 70.04% 92.24% 0.00% 398.41 R = 60 57.70 479.76 400.00 20.33% 79.51% 100.00% 0.00% 424.27 12.20% R = 80 61.29 485.85 400.00 91.71% 100.00% 0.00% 438.90 R = 100 64.16 490.00 400.00 6.67% 100.00% 100.00% 0.00% 448.84 R = 200 64.16 490.00 400.00 6.67% 100.00% 100.00% 0.00% 469.42 6 R = 300 64.16 490.00 400.00 6.67% 100.00% 100.00% 0.00% 476.28 R = 400 64.16 490.00 400.00 6.67% 100.00% 100.00% 0.00% 479.71 Pode-se verificar um ponto de saturação na curva, onde não se pode alcançar maior retorno ou risco. Este é o ponto de maior risco e retorno possível, dada a combinação de projetos. Verifica-se também que apesar de tolerâncias ao risco muito pequenas (iguais ao mínimo de investimento), com exceção de uma, todas as seleções de investimento utilizaram o capital total disponível, ou seja, 400 milhões. Apenas a menor tolerância, de 5 milhões, não utilizou plenamente o capital. No gráfico a seguir, apresenta-se a representação da fronteira de eficiência e os pontos relativos aos quatro projetos e as seleções de melhor portfólio, com tolerâncias variando de 5 a 100 milhões. Fronteira de Eficiência 600 Fronteira A 500 B C Retorno 400 D MaxEqC(R=20) 300 MaxEqC(R=40) 200 MaxEqC(R=60) MaxEqC(R=80) 100 MaxEqC(R=100) MaxEqC(R=5) 0 0 20 40 Risco 60 80 MaxEqc(R=10) Figura 4 – Fronteira de Eficiência – Equivalente Certo Não por acaso, todos os pontos de maximização de equivalente certo estão sobre a fronteira de eficiência. Esta não é, entretanto, uma condição sine qua non da resolução deste modelo. Apesar de todos os riscos, a tolerância equivalente ao investimento mínimo corresponde a uma região bem próxima à extremidade da curva. Guiando-se apenas pela fronteira, a opção do investidor seria encontrar o retorno equivalente a este risco, e montar o portfólio de acordo com as indicações da fronteira. Desta forma, a companhia em questão estaria sendo muito conservadora, e não maximizaria o equivalente certo para seu perfil de risco, incorrendo na perda de aproximadamente 300 milhões no retorno esperado. Mostra-se, desta forma, que a análise de teoria de preferência e a análise de fronteira de eficiência através do método CAPM de Markowitz se complementam, levando a uma decisão de investimento ótima. O investidor consegue visualizar os investimentos eficientes e, dentro destes, visualizar sua própria posição ótima, através da maximização de seu Equivalente Certo. 7 5. Conclusões e Recomendações Este artigo verificou a importância e potencialidade da integração da fronteira de eficiência do método CAPM e a teoria de preferência. Um exemplo prático foi exposto, com incertezas e investimentos da magnitude do setor de exploração e produção de petróleo. O setor de exploração de óleo e gás, assim como qualquer outro de grande porte, encontra forte aliado na gerência de riscos, já que as incertezas associadas a toda a operação são muito grandes. Um dos próximos passos na gerência de risco em petróleo é o desenvolvimento de sistemas de suporte à decisão baseados em dados geológicos e econômicos de bacias, dando ao investidor uma melhor delimitação do valor do campo, assim como uma comparação com outros campos, formando um banco de dados. Modelos como este tendem a evoluir cada vez mais com o feedback da realidade, tornando-se preditores cada vez mais precisos. O artigo aponta outros prosseguimentos, como o uso de funções utilidade mais complexas (usando tolerâncias ao risco diversas, em função do montante investido) e representações tridimensionais de risco, retorno e equivalente certo para suporte à decisão. No entanto, como conclusão inerente deste trabalho, a integração entre o CAPM e o Equivalente Certo provou-se não só possível, como também ferramenta de apoio à decisão eficaz e interessante. 6. Bibliografia: 1. MOTTA,R.; CALÔBA,G.M., et alli, “Análise de Investimentos e de Riscos Aplicados à Indústria de Petróleo”, Revista Brasil Energia, no. 224, Julho 1999, pp. 35-36. 2. BERNSTEIN, PETER L. Desafio aos Deuses - A Fascinante História do Risco. Editora Campus Ltda, 1997 3. NEPOMUCENO FILHO, F., Tomada de Decisão em Projetos de Risco na exploração de Petróleo, Tese de Doutorado, UNICAMP, 1997 4. WALLS,M.R., “Corporate Risk Tolerance and capital allocation: a practical approach to implementing an exploration risk policy”, Journal of Petroleum Technology 4, pp. 307-311. 8