Nas fronteiras do natural.

Propaganda
ADRIANA PISCITELLI
IHSÂ"07/11EIR,O.S 7,0 71.47~414: 9ê em e ~taco.
' Novo Dicionário Aurélio cia
Língua Portuguesa. Rio de
Janeiro: Editora Nova
Fronteira, 1986.
Algumas questões que
retomo aqui foram, além de
discutidas no Grupo de
Estudos do PAGU, do qual
participaram, em diferentes
momentos, Carla Bassanezi,
Karla Bessa, Mariza Corrêa e
Suely Kofes, apresentadas no
Grupo de Trabalho Relações
de Gênero do XX Encontro
ANPOCS, Caxambu, 1996.
Agradeço às participantes e
debatedoras desses
encontros pelas diversas
sugestões.
Verbete: natural'
(Do lat. naturale.)
Adj. 2 g.
De, ou referente à natureza.
Produzido pela natureza.
Em que não há trabalho ou intervenção do homem.
Que segue a ordem regular das coisas; lógico.
Inato, ingênito, congênito.
Próprio do instinto; instintivo.
Próprio, peculiar.
Não estudado ou calculado; sem artifício; desafetado,
espontâneo.
Provável, presumível.
Nascido; originário, procedente, oriundo.
Diz-se da trompa e da trombeta sem pistons.
S. m.
V. nativo (7).
Aquele que pertence a uma certa localidade.
Aquilo que é conforme a natureza.
Tendência natural; índole, caráter.
A realidade; o original.
Sorte, destino.
Mat. Número natural.
Bras., N.E. Pop. Terra do nascimento; terra natal.
Ao natural.
Diz-se de alimento que se serve como foi colhido,
sem qualquer alteração.
Discussão feminista, parentesco, gênero
Neste texto proponho explorar a contribuição das
perspectivas feministas para pensar a relação gênero/
parentesco nas sociedades contemporâneas'. Refletir
sobre essa relação nas sociedades contemporâneas
levanta, pelo menos, dois conjuntos de questões. O
parentesco é considerado uma instituição central nas
HOWELL. Signe e MELHUUS,
Marit. The Study of Kjnship;
the Study of Person; a Study
of Gender? ln: DEL VALLE.
Gendered Anthropology.
Nova Iorque: Routledge,
1993, p. 39-53.
sociedades "primitivas" e problemática, em termos de
conceitualização teórica, nas sociedades contemporâneas. A dificuldade consiste em dar-lhe uma magnitude
apropriada comparando-o com aqueles sistemas de
outras culturas nas quais as categorias de parentesco
aparecem como uma linguagem através da qual a
sociedade é organizada e regulada. Nas sociedades
ditas primitivas, o parentesco aparece como um marco
significativo para a organização da sociedade, dos
interesses políticos e econômicos. Nas sociedades
modernas, onde há uma separação de domínios sociais
que entre os "primitivos" estão imbricados uns nos
outros, o parentesco não deveria ser considerado como
domínio englobador de todas as relações sociais. O
parentesco, portanto, não poderia ser tratado como o é
nos grupos "primitivos". Uma vez que o parentesco
parece "reduzir-se", nas sociedades modernas, às
"relações familiares" e à vida doméstica, que sentido
faria, nesses casos, pensar em termos de parentesco?
A antropologia outorga grande importância ao
parentesco - que assume um lugar fundamental na
compreensão das sociedades primitivas -, pois considera as relações de parentesco estruturantes da vida
social, no sentido em que estrutura a sociedade cosmologia, economia, organização política, institucional. Entretanto, o sentido do conhecimento antropológico não se limita à compreensão dos "primitivos".
Trata-se de colocar em perspectiva diversas culturas, as
"outras" e, supostamente, a do antropólogo, com o
objetivo de alcançar uma compreensão universal do
social. Nesse sentido, justifica-se o trabalho com parentesco, à maneira de instrumento que possibilite traçar
essa perspectiva.
A relação entre parentesco e gênero coloca
outras questões. Na medida em que as teorias de
parentesco tratam das relações estabelecidas entre
homens e mulheres, elas são inerentemente marcadas
pelo gênero (gendered). Entretanto, algumas feministas/
antropólogas chamam a atenção para o paradoxo
presente nessas teorias. Essas autoras consideram que a
maneira como as teorias de parentesco tratam das
relações entre homens e mulheres diz pouco sobre o
gênero nas sociedades que descrevem. Isto é, os
valores inerentes à masculinidade e à feminilidade nas
ideologias matrimoniais e nas práticas de parentesco
teriam sido pouco investigadas'. Para elas, a questão
seria desenvolver um trabalho com parentesco que
incorporasse essa perspectiva de gênero.
Aproximar-me dessas questões exige prestar
atenção aos argumentos de algumas autoras que
participam do debate feminista. Minha intenção é
4 Vale a pena lembrar que,
na perspectiva de Dumont,
há duas teorias de
parentesco que não devem
ser confundidas: a teoria da
"descendência" e a teoria
da aliança. Segundo o
autor, a primeira se basearia
na descendência, conceito
que difere nos diversos
teóricos da escola inglesa.
Em Rivers, por exemplo, o
termo descendência se
referiria à transmissão da
qualidade de membro de
um grupo. Em RadcliffeBrown, a idéia de descendência seria um pouco
diferente: o importante são
os direitos e sua transmissão,
que devem ser definidos de
maneira que garantam a
permanência da sociedade
independentemente da
contínua renovação dos
indivíduos. A teoria da
aliança matrimonial, em seu
aspecto restringido, se
referiria às sociedades que
possuem regras positivas
relativas à escolha de
cônjuge desde o ponto de
vista do parentesco. Essa
teoria integrar-se-ia numa
teoria geral do parentesco,
centrada numa interpretação estrutural da proibição
do incesto. DUMONT, Louis.
Introducción a dos Teorias
de la Antropologia Social.
Barcelona: Editorial
Anagrama, 1975.
5 É o caso de Gayle Rubin,
cuja formulação dos
sistemas sexo/gênero
inspirou as versões dos
conceitos de gênero que
perpassaram os escritos
feministas, em diversas
disciplinas, até a beirada
dos anos 90. RUBIN, Gayle.
The Traffic in Women. Notes
on the "Political Economy"
of Sex. In: REITER, Rayna
(ed.): Toward an
Anthropology of Women.
Nova Iorque: Monthly
Review Press, 1975.
apenas considerar alguns textos de autoras anglo-saxãs,
publicados entre as décadas de 1970 e 1990, que me
parecem relevantes na medida em que sintetizam
tendências diferenciadas que marcaram, em diferentes
momentos, a discussão. Devo deixar claro, entretanto,
que, embora meu percurso seja mais ou menos cronológico, não pretendo sugerir que haja fases ou etapas na
produção feminista.
Esses textos provocaram-me inquietações sobre as
quais farei alguns comentários. As autoras compartilham
a obsessão feminista pela "desnaturalização". Tratam
de compreender como os processos de construção de
identidades e de laços sociais aparecem como se
ancorados na natureza, na biologia ou em alguma
instância divina. Entretanto, as diferenças que as autoras apresentam nas maneiras de pensar em sexo,
gênero e parentesco levantam alguns pontos sobre as
fronteiras do "natural".
As autoras escolhidas estabeleceram diálogos,
em momentos diferentes, com diversas perspectivas
teóricas. Lévi-Strauss, Radcliffe-Brown, Fortes, Schneider
são autores fundamentais com os quais elas discutem e
nos quais se inspiram. Na verdade, o diálogo se estabelece basicamente com as duas teorias do parentesco e
com uma perspectiva desconstrutivista dessas teorias'.
Refletir sobre os argumentos dessas autoras, no marco
das preocupações enunciadas, exige, é claro, contextualizar essa produção, concedendo atenção à discussão feminista em sentido amplo.
A discussão teórica feminista é, necessariamente,
interdisciplinar. Um dos seus maiores atrativos reside,
precisamente, no esforço conjunto que, atravessando
fronteiras, é realizado por autoras que trabalham no
âmbito de horizontes disciplinares diversos. O interesse
no parentesco, entretanto, está presente, sobretudo, na
produção de antropólogas. Refletir sobre a contribuição
dessas autoras levanta diversas questões, algumas das
quais mostram tensões presentes na discussão feminista.
É possível perceber que diversas antropólogas e, sobretudo, aquelas interessadas no parentesco, exerceram,
na década de 1970, uma influência marcante nesse
debates. As primeiras formulações do conceito de
gênero das perspectivas feministas contemporâneas
devem muito à antropologia feminista. Entretanto, nos
anos 90, a produção das antropólogas tende a ser
(respeitosamente) evitada. Essa tendência é intrigante,
levando em consideração que as elaborações recentes
dessas autoras, formadas numa disciplina constituída
prestando atenção à diferença, tão cara às feministas,
oferecem perspectivas promissoras para o trabalho
desconstrutivo da "naturalização das desigualdades".
A contribuição das antropólogas inspiradas no
feminismo para pensar na relação aqui proposta é
importante sob diversos aspectos. Prestar atenção a
essa produção abre caminhos para refletir sobre temas
fundamentais não apenas para a antropologia, ,mas
para diversas perspectivas disciplinares. Ao mesmo
tempo, possibilita refletir sobre a particular inserção das
antropólogas na discussão feminista em sentido amplo.
Sistemas de sexo/gênero
6 RUBIN. Op. cit., p. 179.
Vide, além de REITER, op.
cit., ROSALDO, Michelle e
LAMPHERE, Louise. Woman,
Culture and Society.
Stanford University Press,
1974; HARRIS, Olivia e
YOUNG, Kate (orgs.).
Antropologia e Feminismo.
Barcelona: Anagrama 1979,
p. 19-20. Esta última
coletânea reproduz diversos
textos publicados no livro de
Rosaldo e Lamphere,
incorporando, além disso,
outros textos.
'Embora o termo gênero Já
fosse utilizado, a partir da
conceitualização de Rubin
começou a difundir-se com
uma força inusitada. O
termo foi aplicado à
diferença sexual pela
primeira vez em linhas de
pesquisa desenvolvidas por
psicólogos estadounidenses.
O termo identidade de
gênero foi introduzido pelo
psicanalista Robert Stoller
em 1963, no Congresso
Psicanalítico de Estocolmo.
Stoller formulava o conceito
da seguinte maneira: o sexo
está relacionado com a
biologia (hormônios, genes,
sistema nervoso, morfologia)
e o gênero com a cultura
(psicologia, sociologia). O
produto do trabalho da
cultura sobre a biologia era
a pessoa "acabada`
gendered, homem ou
mulher. HARAWAY, Donna.
Gender for a Marxist
Dictionary In: Symians
Cyborgs and Women. The
Reinvention of Nature. Nova
Iorque: Routledge, 1991.
"Os sistemas de parentesco... transformam
machos e fêmeas em homens e mulheres, cada
um, uma metade incompleta que só adquire
completude quando unida com a outra"6.
Gayle Rubin trabalhou, na década de 1970, com
a relação gênero/parentesco no marco das preocupações feministas que se expressavam, na época, numa
questão que foi amplamente debatida: a subordinação
universal das mulheres. Este problema inspirou uma série
de artigos reunidos em coletâneas que se tornaram
clássicos da antropologia feminista da época. Nesses
textos, as autoras criticam diversas tradições do pensamento antropológico, considerando-as incapazes de
incluir, de maneira adequada, as mulheres na análise
social'. As autoras pensam que essas perspectivas
apresentam as mulheres apenas como seres marginais
ou intermediadores numa sociedade concebida como
exclusivamente masculina.
Introduzindo sistematicamente a dimensão
política na relação entre os sexos e questionando tanto
perspectivas estruturalistas como funcionalistas, diversas
autoras inseridas no debate olham criticamente para os
"universais" presentes nas análises antropológicas,
reivindicando outorgar especial importância à observação das diferenças reais entre as sociedades. Essas
diferenças adquiririam particular relevância uma vez
que, para elas, olhar apenas para os universais jogaria
as mulheres numa esfera a-histórica impermeável à
observação de mudanças. Ao mesmo tempo, essa
produção permite perceber que, de maneira contraditória, uma série de universais, tais como a oposição
natureza/cultura, aos quais se associam as preocupações com as relações de poder entre os sexos, perpassam os textos. A subordinação das mulheres passa a ser
pensada também como um universal, passível de ser
explicado pela associação das mulheres à natureza e
dos homens à cultura.
O texto de Rubin, O Tráfico das Mulheres, marcou,
na época, a discussão das académicas feministas,.
Nas palavras da autora, "a
passagem de fêmea, como
se fosse matéria prima, à
mulher domesticada".
II, Esta interpretação do
intercâmbio de mulheres
tem sido questionada, entre
outros, pelo próprio LéviStrauss. Vide as críticas
colocadas por Heilborn e
por Viveiros de Castro.
Heilborn questiona a leitura
da autora de uma visão da
sociedade na qual a troca é
um pressuposto da
organização social
opressora de parcelas da
humanidade ou da
sexualidade. Heilborn cita a
crítica de Viveiros de Castro
sobre a concepção de
intercâmbio de mulheres
como "troca de pessoas",
pois o que efetivamente se
trocaria nos sistemas
culturalmente determinados
de aliança são'propriedades
simbólicas, direitos, signos,
valores, por meio de
pessoas. HEILBORN. Maria
Luiza. Gênero e Hierarquia. A
costela de Adão revisitada
In: Revista Estudos Feministas.
" Nesse sentido, as críticas
que a autora formula ao
conceito patriarcado são
extremamente pertinentes.
Ela chama a atenção pára
a necessidade de manter a
distinção entre a capacidade e necessidade de criar
um mundo sexuado e as
formas empiricamente
opressivas através das quais
esse mundo se organiza. Essa
distinção seria obscurecida
pelas formulações do
patriarcado. Os "sistemas
sexo e gênero", ao
contrário, mostrariam as
relações sociais que os
organizam. RUBIN. Op. cit.,
p. 168.
Rubin, pensando dentro do quadro da diferenciação
natureza/cultura, se perguntava quais seriam as relações sociais que convertiam as "fêmeas" em "mulheres
(domesticadas)". Ela procurou a resposta numa leitura
crítica de autores - sobretudo Lévi-Strauss e Freud - que,
prestando atenção à diferença sexual, discutem como
se produz a passagem da natureza à cultura9.
A autora localiza o sistema de sexo/gênero, "um
conjunto de arranjos através dos quais a matéria prima
biológica do sexo humano e da procriação é modelada pela intervenção social humana", precisamente no
trânsito entre natureza e cultura e no espaço da sexualidade e da procriação. Embora questionando aspectos
dos trabalhos dos autores acima mencionados, Rubin
utiliza as ferramentas conceituais que eles oferecem.
Sua intenção é utilizá-las para desenvolver, de maneira
mais apropriada, a definição do sistema sexo/gênero.
Assim, seria possível descrever a parte da vida social
que seria o locus da opressão das mulheres, das minorias sexuais e de alguns aspectos da personalidade
humana nos indivíduos.
Rubin pensa o intercâmbio de mulheres levistraussiano
- um dos princípios fundamentais do parentesco, na
teoria desse autor - como conceito que situa e "explica"
a opressão das mulheres dentro dos sistemas sociais.
Explica, no sentido em que, para ela, o intercâmbio de
mulheres não seria uma definição de cultura, nem um
sistema em si mesmo, mas a percepção de certos
aspectos das relações sociais de sexo e gênero cujo
resultado é a ausência de plenos direitos para as
mulheres. Para Rubin, o intercâmbio de mulheres seria
um primeiro passo para a construção de conceitos
através dos quais pensar a subordinação das mulheres,
na medida em que mostraria essa subordinação como
produto das relações através das quais sexo e gênero
são organizados e produzidos. Isto leva a autora a
pensar na necessidade de estudar cada sociedade
para determinar os mecanismos através dos quais as
convenções da sexualidade se produzem e se mantêm.
A leitura que Rubin faz do intercâmbio de mulheres tem recebido inúmeras críticas que não repetirei
aqui 10. No contexto da discussão feminista, talvez o
maior mérito desse ensaio resida em que, discutindo
como operam os sistemas de sexo e gênero, Rubin
mostra um deslocamento importante dentro da discussão desenvolvida na época. O conceito (sistema sexo/
gênero), oferecido como categoria alternativa ao
patriarcado, ao exigir compreender realidades
empíricas diversas, os contextos específicos nos quais
esse sistema opera, se contrapõe ao suposto de uma
opressão estática".
13 Ibid, p. 169.
13 RUBIN, Gayle. Op. cit., p.
179. Tradução minha.
13 LÉVI-STRAUSS, Claude. A
Familia, Origem e Evolução.
Porto Alegre: Editorial Villa
Marta, 1980.
Interessa-me reter alguns aspectos do trabalho de
Rubin. Eles são importantes na medida em que permitem perceber os pontos de ruptura que outras autoras,
trabalhando com a relação gênero/parentesco, terão
com ela. A leitura que Rubin faz dos autores com os
quais trabalha não a afasta dos pressupostos teóricometodológicos desses autores. Ao contrário, para
"desnaturalizar" a subordinação das mulheres, ela
propõe, explicitamente, "imitá-los", "nos métodos, não
nos resultados" 12, A autora pensa em termos de universais e opera com uma série de dualismos - sexo/gênero,
natureza/cultura -, que se tornarão alvo das críticas
feministas posteriores. Este aspecto, assim como o fato
de discutir aspectos da teoria da aliança, diferencia a
autora de outras teóricas anglo-saxãs que, nas décadas
seguintes, se ocupam do tema.
Rubin não reduz o parentesco à "reprodução
biológica", nem supõe que as teorias do parentesco o
façam. Ao contrário, destina páginas inteiras a mostrar
como o status socialmente definidos pelo parentesco
tem precedência sobre o biológico. Para ela, os sistemas de parentesco estão feitos de e reproduzem formas
concretas da sexualidade socialmente organizada, mas
eles são e fazem muitas outras coisas. Da mesma
maneira, no que se refere à diferença sexual, a cultura
se sobrepõe à natureza. Na perspectiva da autora, se a
natureza fornece dados, esses dados mostrariam que a
diferença é, sobretudo, cultural. Isso é claramente
expressado na seguinte frase:
"Homens e mulheres são, é claro, diferentes. Mas
nem tão diferentes como o dia e a noite, a terra e o
céu, yin e yang, vida e morte. De fato, do ponto de
vista da natureza, homens e mulheres estão mais
próximos entre si do que de qualquer outra coisa - por
exemplo, montanhas, cangurus ou coqueiros. A idéia de
que homens e mulheres diferem mais entre si do que em
relação a qualquer outra coisa deve vir de algum outro
lugar que não (seja) a natureza... longe de ser a expressão de diferenças naturais, a identidade de gênero é a
supressão de similaridades naturais13.
Para Rubin, o parentesco criaria gênero. Seguindo, até certo ponto, os argumentos de Lévi-Strauss 14 no
que se refere às pré-condições necessárias para a
operação dos sistemas de casamento, ela considera
.que o parentesco instaura a diferença, a oposição,
exacerbando, no plano da cultura, as diferenças
biológicas entre os sexos. Os sistemas de parentesco,
formas empíricas e observáveis de sistemas sexo/
gênero, cujas formas específicas variariam através das
culturas e, historicamente, envolveriam a criação social
de dois gêneros dicotômicos, a partir do sexo biológico,
''Rubin é freqüentemente
citada na produção
feminista, sobretudo, pela
distinção sexo/gênero. Sem
dúvida, há exceções. Judith
Butler, resgatando um dos
melhores insights de Rubin, é
uma delas. Sua formulação
crítica da "matriz heterossexual" deve muito a essa
autora assim como a outras
pensadoras feministas
(Wittig, por exemplo) que
utilizaram essa noção.
BUTLER. Gender Trouble.
Feminism and the Subversion
of Identity. Nova Iorque:
Routledge, 1990.
16 Chamo a atenção para
essa indagação porque me
parece significativa na
medida em que anuncia
uma das questões que se
tornaram centrais nos
estudos de gênero
posteriormente desenvolvidos. As perspectivas das
feministas "brancas" sobre o
papel das mulheres "negras"
na família, consideradas
como "racistas", foram
objeto de intenso debate.
Vide AMOS, Valerie e
PARMAR, Pratibha.
Challenging Imperial
Feminism, Feminist Review, n°
17, July, 1984, p. 3-32;
BARRETT, Michèle e
MCINTOSH, Mary.
Ethnocentrism and SocialistFeminist Theory, Feminist
Review, n°. 20, June 1985, p.
23-49 e BHAVNANI, Kum Kum
e COULSON, Margareth.
Transforming SocialistFeminism: the challenge of
racism, Feminist Review, n°
23, June, 1986.
uma particular divisão sexual do trabalho, provocando
a interdependência entre homens e mulheres, e a
regulação social da sexualidade, prescrevendo ou
reprimindo arranjos divergentes dos heterossexuais.
Desta maneira poder-se-ia dizer que, para a autora, o
gênero é um imperativo da cultura, que opõe homens e
mulheres através do parentesco.
No que se refere à importância dos sistemas sexo/
gênero nas sociedades contemporâneas, Rubin mostra
algumas ambivalências. Por um lado, a autora afirma
que a organização de sexo e gênero, no passado,
organizava a sociedade e hoje, esvaziada das funções
do passado, apenas se reproduz a si mesma. Mas Rubin
também afirma que parentesco e casamento, parte
de sistemas totais, fazem sempre parte de relações
inseridas em "arranjos" políticos e econõmicos. O
programa de pesquisa proposto pela autora, incluindo
nele as sociedades contemporâneas, é a compreensão da relação dos sistemas sexuais com os diversos
aspectos do social.
Em termos do debate antropológico, as formulações de Rubin foram rapidamente rebatidas. No âmbito
da discussão feminista, Rubin tornou-se inspiradora de
diversas linhas de trabalho, orientadas pela distinção
sexo/gênero, não necessariamente centradas no
parentesco15.
À medida que se difundia o trabalho com gênero,
a produção feminista preocupada com a reprodução
das convenções de sexo e género desenvolveu uma
linha importante de crítica à famfiia, fervilhante no final
da década de 1970, para a qual convergiram sociólogas, historiadoras, psicólogas e antropólogas. Essa
produção mostra que o sistema de sexo e gênero
formulado por Rubin, plenamente incorporado, operava
como fórmula orientadora. A questão básica colocada
naquele momento era dar conta das experiências de
subordinação. A idéia era, através de diversos procedimentos, obter elementos para desafiar a fixidez da
família, uma entidade que aparecia, no debate público, como sempre similar em forma e conteúdo e,
desnaturalizando-a, mostrá-la como entidade organizada através de estruturas hierárquicas de sexo, gênero e
geração. Ao mesmo tempo, indagaram-se sobre as
relações que o gênero poderia estabelecer com idade,
classe e raça'''. Considerando o gênero como uma
categoria básica de análise, as feministas procuraram
submeter a família a análises históricas e sociais. As
críticas formuladas atacaram aspectos das teorias
sociais que, para as autoras, conferiam esse halo de
imutabilidade à família. Questionaram-se não apenas os
pressupostos sobre a naturalidade da família, em termos
" Vide os textos das
Conferências de Stanford,
em 1979, publicados em:
THORNE, Barrie e YALOM,
Marilyn. Rethinking the
Family. Some Feminist
Questions. Nova Iorque:
Longman, 1986, particularmente YANAGISAKO, Sylvia,
ROSALDO, MIchelle e
COLLIER, Jean. Is There a
Family? New
Anthropological Views.
biológicos, mas também argumentos funcionalistas
sobre a família", considerando que essas análises particularmente as de Parsons - "congelavam" um ideal
de família na linguagem dos papéis, transmitindo idéias
fixas e dicotômicas, obscurecendo o conflito e as
diferenças de poder.
As críticas levantaram outro ponto, particularmente relevante: consideraram que um dos recursos utilizados para dar à família essa forma monolítica e singular
era subsumir nesse termo diversos elementos. O parentesco, os núcleos domésticos e as concepções sobre
domesticidade propriamente dita, desapareceriam sob
a denominação de família. Como parte do processo de
desnaturalização da família, algumas antropólogas
procuraram re-direcionar as análises, pensando-a no
contexto das relações de parentesco.
Esta síntese dos questionamentos levantados
pelas feministas antropólogas permite perceber que o
que estava sendo pensado como naturalizador não
eram apenas os argumentos biologizantes. As perspectivas teóricas - no momento, tratava-se do funcionalismo vistas como incapazes de dar conta de mudanças e
transformações, aquelas que apresentassem diversos
aspectos associados ao gênero como estáticos, também eram consideradas naturalizantes. Entretanto, a
distinção natureza/cultura ainda se sustentava: o
sistema sexo/gênero continuava sendo pensado como
desnaturalizador. É interessante perceber que o interesse
feminista no parentesco foi retomado na segunda
metade da década de 1980, no contexto dos sérios
questionamentos que se foram alinhavando em torno
dos supostos que embasaram a distinção sexo/gênero.
Desnaturalizando o parentesco
COLLIER, Jane e
YANAGISAKO, Sylvia. Gender
and Kinship. Essays toward a
unified analysis. Stanford:
Stanford University Press,
1987.
"„.gênero e parentesco constroem-se mutuamente. Nenhum pode ser tratado como analiticamente anterior ao outro porque são percebidos (are
realized) conjuntamente em sistemas culturais,
econômicos e políticos particulares"'8.
Algumas das autoras presentes na discussão
feminista intervieram intensamente no debate, durante
quase duas décadas, com uma produção particularmente sugestiva, que permite refletir sobre deslocamentos significativos nas perspectivas teóricas feministas. Os
trabalhos de Sylvia Yanagisako e de Marilyn Strathern
mostram esses deslocamentos no que concerne à
discussão sobre gênero e parentesco.
Na segunda metade da década de 1980,
Yanagisako e Collier publicaram Gender and Kinship.
Op. cit.. Vide MOORE,
Henrietta. A Passion for
Difference. Indiana University
Press, 1994, p. 12-14;
STOLCKE, Verena. Is Sex to
Gender as Race to
Ethnicity? In: DEL VALLE,
Teresa. Op. cit., p. 22-24 e
HOWELL Signe e MELHUUS,
Marit. The Study of Kinship;
the Study of Person; a Study
of Gender? In: DEL VALLE.
Op. cit., p. 39-53.
20 00LLIER, Jane e
YANAGISAKO, Sylvia. Op. cit.,
p. 2-5.
21 SCHNEIDER, David. A
Critique of the Study of
Kinship. The University of
Michigan Press, 1984.
Essays toward a unified analysis, uma coletãnea extremamente citada na literatura feminista que trata do
gênero"). Nesse livro, Yanagisako e Collier confrontam
abertamente supostos presentes tanto nas teorias de
parentesco como muitas das formulações teóricas
feministas. Num caminho oposto ao de Rubin, que
elaborou sua formulação dos sistemas sexo/gênero a
partir das teorias de parentesco, as autoras questionam
essas teorias a partir de reflexões estimuladas pela
percepção da maneira como o gênero opera em
diversas sociedades2°.
A proposta das autoras é revitalizar o estudo do
parentesco e situar o estudo do gênero no centro
teórico da antropologia, questionando a fronteira entre
parentesco e gênero, enquanto dois campos de estudo.
Yanagisako e Collier afirmam que, embora intimamente
ligados, gênero e parentesco não constituiriam dois
domínios de análise. Comentarei em seguida os problemas envolvidos nessas afirmações. Antes disso quero
completar seus argumentos, detendo-me primeiro no
autor no qual essas antropólogas procuram inspiração,
David Schneider, quem, na opinião delas, teria assentado as bases para desnaturalizar o parentesco.
Schneider afirma que o saber antropológico sobre
o parentesco - e engloba aqui tanto os teóricos da
descendência como os da aliança - deriva intimamente
das próprias noções culturais das sociedades nas quais
se formaram os antropólogos. Perguntando-se o motivo
pelo qual a reprodução assume um lugar central entre
as instituições privilegiadas para o estudo da sociedade,
o autor chega à conclusão de que o problema reside
na maneira como os cientistas europeus utilizaram sua
própria cultura nativa como fonte nas maneiras de
formular e compreender o mundo. Na cultura ocidental,
os laços de sangue assumem um lugar fundamental. A
questão seria perguntar-se até que ponto isso acontece
em todas as culturas. A maneira de descobri-lo seria
compreender os símbolos e significados que configuram
culturas particulares, evitando a contaminação dos
próprios supostos nativos dos antropólogos.
Como saída, Schneider propõe tomar o parentesco como uma questão empírica, não como um fato
universal, partindo de uma hipótese de trabalho que
indague sobre de que trata o parentesco. Não se
poderia mais assumir que a cadeia genealógica é
universal ou que tem o mesmo valor e significado em
todas as culturas21.
Yanagisako e Colher seguem vários dos caminhos
apontados por Schneider, incorporando uma preocupação específica pelo gênero. Revisam criticamente as
dicotomias analíticas que informaram os estudos de
22 0p. cit., p. 29.
parentesco e os estudos de gênero. A análise das
oposições estabelecidas entre natureza/cultura, doméstico/público e produção/reprodução leva-as a concluir
que esses dualismos, assim como os conceitos que
informam as teorias de parentesco, assentam-se num
mesmo suposto. Este seria o de que a diferença biológica na reprodução sexual seria universalmente central
nas relações entre homens e mulheres.
As autoras consideram que gênero e parentesco,
conceitualizados como dois campos distintos de estudo,
constituiriam, de fato, um único campo, na medida em
que foram definidos por uma única concepção nativa
dos antropólogos: os fatos biológicos da reprodução
sexual. Yanagisako e Colher afirmam que as teorias
sobre parentesco são, ao mesmo tempo, teorias nativas
- dos antropólogos - da reprodução biológica e estariam marcadas por supostos sobre o gênero. Ao mesmo
tempo, as formulações sobre gênero, inclusive as
feministas, se baseariam na definição de homens e
mulheres a partir de sua função na reprodução biológica.
Uma questão central na reflexão das autoras é,
portanto, a necessidade de atacar - e desmontar - os
pressupostos que fazem com que as unidades fundamentais do gênero, homens e mulheres, e as do parentesco,
cadeia genealógica, sejam vistos como existindo fora
da cultura; a diferença como dada e tratada como fato
pré-social22. A estratégia analítica centra-se em impedir
que male e female sejam pensados como duas categorias naturais de seres humanos cujas relações se
estruturam, em todo lugar, pela sua diferença biológica.
A idéia é que, reconhecendo que essas categorias se definem de formas diferentes em sociedades
específicas, elas não poderiam continuar sendo consideradas, a priori, como categorias universais sobre as
quais se constroem relações particulares de hierarquia
de gênero. Como conseqüência, a análise se deslocaria
para os processos sociais e simbólicos, através dos quais
essas categorias são construídas. Esse tipo de análise,
voltado para a cultura a que pertencem os antropólogos, mostraria como esses processos fazem com que
gênero e parentesco apareçam como auto-evidentes e
como campos de atividade "natural". No que se refere
ao gênero, a pergunta a ser colocada seria: como as
sociedades particulares definem a diferença? No que se
refere ao parentesco, seria necessário perguntar-se:
como as sociedades específicas reconhecem direitos e
alocam responsabilidades?
Há vários aspectos problemáticos nas afirmações
das autoras. Yanagisako e Colher referem-se a diversos
teóricos do parentesco. Entretanto, forçam e simplificam
seus argumentos, ignoram as diferenças importantes
" As autoras, contrapondose à idéia (estruturalfuncionalista) de sociedade
composta por uma série de
domínios análogos na
função, embora não
necessariamente à forma, às
instituições de nossa
sociedade, questionam a
idéia de parentesco como
domínio específico.
24 É importante lembrar aqui
que em Gender and
Kinship..., e apesar de
diversas ambigüidades,
Yanagisako e Collier
questionaram as teorias
clássicas do parentesco,
mas o fizeram mantendo-se
nos termos do debate
"moderno". Suas propostas
eram formuladas em termos
de totalidades sociais,
propunham modelos
sistêmicos e consideravam
inevitável a análise
comparativa.
25 Recurso que oferece
resultados extremamente
interessantes para desvendar pressupostos e relações
entre conceitos. Penso
concretamente na maneira
como Strathern pensa no
gênero, em The Gender of
the Gift - "o gênero refere-se
à apreensão da diferença
entre os sexos, que assume
invariavelmente uma forma
categórica, tanto se o
sexing no corpo ou na
psique de uma pessoa for
considerada inata como se
não for" (Whether or not the
sexing of a person's body or
psyche is regarded as
innate, the apprehension of
difference between "the
sexes" invariably takes a
categorical form, and it is
this to which gender refers) -,
ou no parentesco
euroamericano, em
Necessidade de Pais... - a
maneira como os
euroamericanos pensam
sobre a formação de
relacionamentos íntimos
baseados na procriação.
Parece-me que ambas
concepções mantêm o
entre suas perspectivas - e nisto seguem, sem dúvida,
David Schneider -, e deixam de lado, em particular, as
perspectivas da teoria da aliança. Isto torna-se evidente
nas passagens nas quais as autoras explicitam o que
entendem por parentesco - sistema de direitos e deveres para a reprodução organizada da vida humana.
A argumentação interna ao texto remete a outros
problemas. Um deles reside nas ambigüidades presentes
na concepção de gênero e parentesco como um único
campo (field) de estudo. Na minha opinião, isto não se
justifica sobre a base dos argumentos levantados pelas
autoras, ou seja, por ambos estarem tingidos por um
mesmo pressuposto ou pela necessidade de criticar a
concepção de domínios funcionais que tendem a
separar o estudo do parentesco23. Yanagisako e Collier
optam, à maneira de Schneider, pela idéia de domínio
cultural. Pensando em termos dos significados atribuídos
às relações e ações de parentesco, consideram que o
parentesco não seria isolável, uma vez que esses
significados perpassariam uma série de domínios culturais - religiosidade, nacionalidade, gênero, classe.
Parece-me que, em termos de significados, o parentesco e, sobretudo, o gênero não são isoláveis. Mas, numa
perspectiva que procura trabalhar com o parentesco
como empírico para não atribuir aos "outros" os significados presentes na cultura ocidental, é contraditório
resolver aprioristicamente as relações entre domínios.
Minha última inquietação refere-se precisamente
à formulação das questões antropológicas em termos
empíricos. Compreendo as preocupações que levam as
autoras a procurar trabalhar com o máximo de cautela
e nos termos mais neutros possíveis. Mas, perguntar-se sobre
como as sociedades definem a diferença remeteria ao
gênero? Perguntar-se sobre como as sociedades reconhecem direitos e obrigações remeteria ao parentesco?
Uma proposta que proponha pôr em perspectiva,
através do conhecimento de outras culturas, a cultura
do antropólogo - e os supostos que a embasam -, como
me parece que é a das autoras, exige elementos para
criar essa perspectiva". Nesse sentido, é necessário
operar com alguns conceitos básicos, embora abrindo
possibilidades para que adquiram outros alcances
analíticos. No que se refere a pensar o parentesco, ou o
gênero, como empíricos, há estratégias utilizadas por
Strathern mais apropriadas para conseguir esse objetivo.
Penso no recurso de utilizar as concepções nativas do
antropólogo, sabendo que disso se trata, iluminando-as
a partir de outras concepções nativas. Nesse sentido,
perguntar-se apenas sobre a diferença não permitiria
pôr "em perspectiva" a partir do gênero nem sobre
"direitos e obrigações" a partir do parentesco25.
referencial nativo do
antropólogo mas são
trabalhadas a partir da
perspectiva oferecida pela
análise de outras concepções. STRATHERN, Marilyn.
Necessidade de Pais,
Necessidade de Mães,
Revista Estudos Feministas, p.
303, n° 2/95.
26 HOWELL e MELHUUS. Op.
cit., p. 44-46.
27 Outras reações à proposta
de Yanagisako e Colher
parecem, ao contrário,
exigir uma maior
radicalização. Stolcke, por
exemplo, questiona o
estatuto que o biológico
assume na proposta das
autoras. Ela considera que
deixaram de questionar que
a biologia e a fisiologia e,
portanto, a natureza como
tal, são conceitualizações
sociopolíticas. Isto resultaria
evidente à luz das revisões
da história da biologia, da
embriologia e das imagens
do corpo. Vide STOLCKE,
Verena. Is Sex to Gender as
Roce to Ethnicity? In: DEL
VALLE, Teresa. Gendered
Anthropology. Nova Iorque:
Routledge, 1993, p. 22.
A proposta das autoras em relação ao gênero
marcou, no momento da publicação do texto, o
debate feminista. O impacto, nesse sentido, foi maior
que aquele decorrente das críticas às teorias de parentesco. Isto talvez se deva, como afirma Stolcke, ao fato
de que os antropólogos, na atualidade, tendem a
reconhecer que as teorias sobre a concepção e sobre o
parentesco são muito mais culturais que biológicas.
Entretanto, as autoras enfrentaram reações adversas
também no que se refere ao gênero. Entre elas, algumas
mostram ambigüidades no que se refere a aceitar uma
separação total do sexo. Howell e Melhuus exemplificam
essas reações. Estas autoras, que também se preocupam com a relação entre sexo e gênero nas teorias de
parentesco, afirmam:
"Embora as teorias sobre a procriação indubitavelmente variem de maneira muito dramática, isto não
significa que as diferenças fisiológicas entre homens e
mulheres não sejam universalmente reconhecidas. Em
termos antropológicos, o que interessa é de que maneira esse fato é utilizado para criar significados e valores.
(.,.) O que devemos evitar é, impensadamente, manter
os limites de nossas próprias dicotomias quando confrontamos outras (alien) construções"26.
De fato, Yanagisako e Collier propõem pensar em
gênero de uma maneira tão aberta que parecem
eliminar a diferença sexual como referência para o gênero.
Nesse caso, compartilho o desconforto, pois acho que,
perdendo-se o que é percebido como diferença sexual
- parafraseando a Strathern, seja ela pensada como
inata ou não - perde-se também o gênero27.
A discussão dos mesmos supostos que conduziram
a contestar as raízes biológicas do gênero foram deslocando o debate das feministas antropólogas sobre
parentesco. O questionamento às explicações universais, a extrema valorização das categorias nativas e a
escrupulosa insistência em desvendar os pressupostos
que informam as teorias antropológicas encaminharam
a discussão para outros caminhos. Nesse percurso, as
reelaborações das teóricas feministas, aprofundando-se
nos supostos que embasam as teorias clássicas, se
deslocam das formulações concretas das teorias de
parentesco para as formulações sobre cultura e as
(novas) maneiras como é pensada a natureza. Nesse
processo, também se desloca a polêmica centralidade
que o gênero assumiu nos textos da década de 1980.
As fronteiras do natural
Nos anos 90, a discussão das feministas antropólogas anglo-saxãs sobre parentesco volta-se, recorrente-
" Na primeira metade da
década de 1990, Marilyn
Strathern publicou dois livros
nos quais analisa o
parentesco euro-americano.
Num deles, After Nature...,
no qual reconhece ter-se
inspirado em Schneider, a
autora escreveu um "relato
cultural" do parentesco
inglês. Nesse livro, Strathern
entrelaça uma diversidade
de materiais produzidos
entre 1860 e 1960 - páginas
de romances, anúncios de
jornal etc. - e as análises
sobre o parentesco
produzidas por antropólogos
ingleses. Isto porque ela
considera que o estudo
antropológico do parentesco, assim como os modelos
nativos dos não antropólogos (das mesmas classes
sociais ás quais os antropólogos pertenciam) apóiam-se
fortemente na idéia de que
os sistemas de parentesco
foram construídos sobre
certos fatos bem conhecidos
da natureza. O conjunto do
material iluminaria "as idéias
inglesas sobre o parentesco". Strathern explora o que
os ingleses considerariam os
fatos do parentesco: a
individualidade das pessoas,
a diversidade etc..
STRATHERN, Marilyn. After
Nature. English kinship in the
late twentieth century.
Cambrige: Cambridge
University Press, 1992.
29YANAGISAKO, Sylvia e
DELANEY, Carol (ed.).
Naturalizing Power, Essays in
Feminist Cultural Analysis.
Nova Iorque: Routledge,
1995, p. 14. Este livro foi
dedicado à memória de
David Schneider.
30 As autoras comentam as
associações entre a
natureza e o sobrenatural
presentes nos mitos sagrados
da Criação e como algumas
delas, tais como a associação entre natural/dado por
Deus, natural/ordem
hierárquica da criação e
natural/submetido a uma
mente, para a análise da cultura euroamericana,
indagando como natureza e cultura entram em relação, provocando efeitos de naturalização".
Os temas que estimulam a discussão sobre
parentesco são diferentes: trata-se de compreender a
naturalização das "identidades fragmentadas e em
conflito", resultantes da crescente circulação global das
pessoas. Questões tais como o parentesco homossexual
e as novas tecnologias reprodutivas provocam intensa
reflexão e indagações sobre o futuro da relação entre
natureza e cultura. A análise procura ir além do desvendamento dos processos sociais e simbólicos que fazem
com que género e parentesco apareçam como produtos naturais na sociedade euro-americana. O leque de
identidades e instituições aparentemente naturais a
serem analisadas abre-se: nacionalidade, etnicidade,
religião e sexualidade somam-se a gênero e parentesco.
Os textos publicados em Naturalizing Power, Essays
in Feminist Cultural Analysis, na metade da década de
1990, mostram duas perspectivas. A maior parte dos
artigos, através de diversos recortes empíricos, focaliza a
naturalização de uma diversidade de hierarquias
interrelacionadas. Nesse sentido, a centralidade que
outras perspectivas outorgavam à categoria gênero é
deslocada nos artigos. Sylvia Yanagisako e Carol Delaney,
na introdução à coletânea, parecem antecipar-se a
possíveis questionamentos feministas quando, comentando o nexo de união entre os artigos que compõem o
livro, afirmam:
"Estes (...) ensaios constituem um gênero (gene)
de leitura que atravessa domínios culturais... O que os
torna um gênero de análise cultural feminista é que o
estímulo para desafiar os limites dos domínios e suas
afirmações de conhecimento emergiram de uma crítica
feminista das verdades fixas do gênero"29.
É verdade, no entanto, que Yanagisako e Delaney
priorizam analiticamente o gênero quando dirigem suas
reflexões para as bases dos quadros explicativos que
essencializariam as identidades. Elas exploram as narrativas
de origem euroamericanas, refletindo sobre como essas
narrativas, religiosas e científicas, naturalizaram a visão
de mundo dessa sociedade. Yanagisako e Delaney
prestam atenção aos significados outorgados à natureza nesses mitos, particularmente nos científicos, que
assumiriam o lugar do sagrado para os humanistas liberais30.
Para as autoras, ao mostrar as definições de
gênero e os valores inerentes às teorias da procriação, a
assignação do sexo e da reprodução à categoria da
biologia teria sido desafiada. O fato de demonstrar que
os significados de male e female não se baseiam em
diferenças naturais impulsionaria a exploração das
ordem superior, foram
incorporadas nas explicações científicas euroamericanas do século XIX.
Op. cit., p. 2-9.
31 STRATHERN, Marilyn.
Reproducing the Future.
Essays on Anthropology,
Kinship and the New
Reproductive Technologies.
Nova Iorque: Routledge,
1992.
33 Essa questão é colocada
no contexto das grandes
questões da antropologia.
Strathern se indaga sobre as
implicações, para a
antropologia, da incerteza
sobre o termo que se
contrapõe ao indivíduo (a
sociedade) e sobre o
antônimo paralelo,
natureza/cultura.
33 Para que os argumentos
de Strathern fiquem mais
claros é necessário ter
presente como eia
conceitualiza a cultura:
trata-se de conexões entre
conceitos, conceitos que,
por sua vez estendem ou
deslocam seus significados
através de concatenações
de idéias. Dito de outro
modo, trata-se das maneiras
como as pessoas estabelecem analogias entre
distintos domínios de seus
mundos. Na forma de
conexão ou contraste, um
conjunto de idéias pode ser
utilizado para representar
outros. Perguntar-se sobre os
efeitos das inovações no
campo reprodutivo é
perguntar-se sobre todo tipo
de relações. Novas
combinações não só
estenderiam os significados
dos domínios que se
justapõem, mas poderiam
ter o efeito de provocar
mudança de direção, ou
seja, poderiam provocar
deslocamentos - em ênfases,
dissoluções e antecipações
"rebotes" de uma área da
vida para outra. O
parentesco seria um desses
temas que mostram
associações.
maneiras em que esses significados articulam-se com
outras desigualdades supostamente estruturadas por
outras diferenças. A questão seria perguntar-se não só
como essas desigualdades são naturalizadas, mas como
sua distinção do gênero também é naturalizada e isto
levaria ao exame crítico das fronteiras entre o gênero e
outras categorias de diferença.
Uma outra perspectiva é apresentada por Strathern,
também sobre a base do parentesco euro-americano,
particularmente sobre a maneira como os ingleses
concebem o parentesco. A autora tenta compreender,
a partir da discussão desse parentesco, como natureza
e cultura são colocados em novas e complexas relações.
A preocupação pelo futuro desse par é explicitada com
clareza por Strathern no contexto de suas reflexões sobre
a cultura. Embora a autora discuta sobre parentesco,
concretamente sobre as implicações das leis inglesas
associadas às novas tecnologias reprodutivas, sua
intenção não é contribuir diretamente para o debate
sobre o parentesco, mas para a reflexão sobre como
opera a cultura31 . Para Strathern, os novos tratamentos
de fecundidade desestabilizariam o conceito de
natureza e isto teria impacto sobre outras idéias de
parentesco32. A Idéia é que a maneira como são
conceitualizadas as mudanças no campo das novas
tecnologias reprodutivas afetariam outras idéias sobre o
parentesco e afetariam também outras relações33.
Segundo a autora, para os ingleses, o parentesco
conectaria o domínio da cultura com o domínio da
natureza. Por parentesco, Strathern entende não só as
maneiras como os parentes interagem senão também
como pensam que essas relações se constituem" Os
ingleses suporiam que formas particulares de arranjos de
parentesco são específicos de sociedades particulares,
e, nesse sentido, artificiais, mas considerariam como
dado que tratam dos fatos naturais da vida. Esses fatos
naturais, fazer sexo, transmitir genes, dar à luz, pensados,
em termos amplos, como biológicos e, mais estritamente, como genéticos, constituiriam a base das relações
de parentesco do modelo reprodutivo na cultura euroamericana35. Essas Idéias de parentesco ofereceriam
uma teoria sobre a relação da sociedade humana com
o mundo natural. Ao pensar que o parentesco é a
construção social dos fatos naturais, os domínios dos
assuntos sociais se combinariam com o mundo natural.
Entretanto, também se separariam, afirmando-se assim
a diferença entre ambos.
Em que sentido a reprodução "artificial" provocaria efeitos sobre o parentesco e, decorrentemente,
sobre a noção de natural, alterando o equilíbrio do par
natureza/cultura? Segundo Strathern, a idéia do paren-
Reproducing the Future...
Esse texto dá a impressão de
outorgar pouca importância
ao gênero. Entretanto, o
gênero recebe atenção, em
situações específicas. Ele
integra as descrições de
como melanésios e ingleses
imaginam diversos aspectos
de sua socialidade.
Entretanto, quando o foco
das reflexões da autora se
desloca para as conexões
que põem em relação
domínios, o gênero não está
presente. Isso acontece
(acho) porque a análise
opera em outro plano.
"Op. cit., p. 3.
36 A questão é sintetizada
quando a autora reflete
sobre as modificações na
concepção de paternidade
natural. "Na cultura do
século XX, a natureza tem
sido crescentemente
entendida como biologia...
isto significou que a idéia de
parentesco natural foi
biologizada. O que é
considerado como natural
adquiriu significados
específicos. E um desafio
colocado pelas novas
tecnologias reprodutivas é
como elas afetarão esses
significados no futuro. Na
fala corrente, já Introduziram
a distinção entre pais sociais
e biológicos. Entretanto, a
paternidade biológica não
reproduz com exatidão o
velho conceito de parentesco natural; reproduz a idéia,
mas introduzindo novas
diferenças. Há uma nova
ambigüidade no que se
refere ao que conta como
natural. O pai "natural" foi
uma vez o genitor de um
filho extramatrimonial, a
mãe "natural", genitora de
um filho entregue para a
adoção. Idealmente, o pai/
mãe (parent) social ideal
combinava os dois tipos de
credenciais.(...) As possibilidades contemporâneas da
procriação artificial
introduzem um novo
contraste entre o processo
tesco como baseado biologicamente na procriação
integrava os repertórios culturais nativos da Europa. Nas
relações de parentesco, a natureza representava algo
imutável, intrínseco às pessoas e às coisas, qualidades
sem as quais elas não seriam o que eram. Não se
tratava apenas de que as relações de parentesco
fossem consideradas como construídas de materiais
naturais: a conexão entre o parentesco e os fatos
naturais da vida simbolizavam a imutabilidade nas
relações sociais. Nesse contexto, pensar na pater/
maternidade como a implementação de uma opção e
no make up genético como resultado da preferência
cultural provocaria efeitos. Esses efeitos preocupam
Strathern que se indaga sobre como tudo isso operará
como analogia (em cadeia) para outras relações'''.
Para a autora, a antítese entre natureza/cultura, da
maneira como modelou a vida social inglesa no passado, ficaria achatada. Com a irrupção da
"artificialidade" na Natureza, um dos termos (Cultura)
parece consumir o outro (Natureza) como se a cultura
excedesse a si própria.
Finalizando
Encerro agora este percurso procurando retomar
as questões formuladas no início do texto.
É interessante prestar atenção à crítica que Joan
Scott, historiadora, uma das autoras feministas mais
citadas no Brasil, faz às antropólogas. Scott afirma que
elas restringem o gênero ao parentesco, focalizando o
núcleo doméstico e a família como base para a organização socia137. Certamente inspirada em Rubin, a autora
sustenta que faz pouco sentido reconduzir forçadamente
essas instituições à sua utilidade funcional no sistema de
parentesco, ou discutir que as relações entre homens e
mulheres são artefatos de sistemas de parentesco (mais
antigos) baseados no intercâmbio de mulheres. A crítica
de Scott centra-se na idéia de que é necessário trabalhar com uma visão mais ampla sobre o gênero, que
inclua não apenas o parentesco, mas também, particularmente no caso das sociedades complexas modernas,
o mercado de trabalho, a educação, a política.
Retomando agora as críticas de Scott, considero
que, embora essa crítica possa ser compreendida, em
parte, pelas ambivalências apresentadas no trabalho
de Rubin, a argumentação de Scott apresenta diversos
problemas nos quais vale a pena pensar pois podem
dar indícios da dificuldade de inserção da produção
das antropólogas na discussão feminista em sentido
amplo. Scott parece operar com a noção implícita de
antropologia como sinônimo do estudo das sociedades
natural e o artificial: a
reprodução assistida cria o
pai biológico como
categoria separada. Através
do mesmo processo, o pai
social é marcado como
potencialmente deficiente
em credenciais biológicas. (...) O efeito é o
deslocamento dos usos
anteriores. Assim, o pai
- natural- do futuro (...) bem
poderá ser aquele que não
exija técnicas especiais e
para o qual não se precise
de legislação específica.
Nesse caso, o pai natural
combinará atributos
biológicos e sociais. (...) Há
uma dupla Intervenção no
parentesco: avanços
tecnológicos e médicos
intervêm nos fatos naturais
da procriação e a legislação o faz nos fatos sociais do
reconhecimento de parentesco." Op. cit., p. 19-20.
SCOTT, Joan Wallach.
Gender and the Politics of
History. Nova Iorque:
Columbia University Press,
1988, p. 43-44.
"Idem.
" O paper que deu origem
ao capitulo Gender: a useful
category of historical
analysis, no qual a critica é
formulada, foi preparado
para ser apresentado, pela
primeira vez. em 1985. A
Conferência de Bellagio, o
encontro sobre o tema que
talvez tenha provocado o
maior impacto na antropologia feminista, foi realizada,
em 1982, na Itália. Vide
resenha do encontro em
TSING, Anna e YANAGISAKO,
Sylvia. Feminism and Kinship
Theory, Current
Anthropologist, vol. 24, n° 4,
August-October 1983, p. 511516 e o livro resultante dele,
referência recorrente nos
textos das antropólogas.
COLLIER. Jane e
YANAGISAKO, Sylvia. Gender
and Kinship. Essays toward a
unifled analysis. Stanford:
Stanford University Press,
1987.
primitivas. Isto implica ignorar o sentido do conhecimento antropológico e não compreender as implicações de
uma teoria do parentesco como aquela com a qual
Rubin dialoga, para a antropologia. Isto tem conseqüências que Scott parece não perceber quando afirma que
os antropólogos limitam o gênero ao parentesco. Essas
conseqüências tornam-se evidentes na discussão das
feministas/antropólogas quando, no trabalho desenvolvido a partir do gênero, olham criticamente para a maneira
em que os supostos do conhecimento ocidental embasam
as maneiras de pensar a família e as teorias de parentesco38. Talvez precisamente por isso, ao escrever aquela
avaliação, a autora ignorasse a linha de trabalhos
desenvolvida por feministas-antropólogas aqui apresentadas, entre as que alguns tratam especificamente da
sociedade ocidental contemporânea'''. Cito Scott
apenas como exemplo, pois a "evitação" em relação à
produção das antropólogas inspiradas pelo feminismo é
recorrente4°. E essa relação é paradoxal pois o contrário,
o estímulo provocado na produção dessas antropólogas
pela discussão feminista em sentido amplo, é evidente.
Isso manifesta-se nos textos comentados. Todos
tratam de gênero e parentesco. Todos afirmam a
importância de trabalhar com parentesco (e gênero)
nas sociedades contemporâneas'". As autoras comentadas compartilham a obsessão feminista por desnaturalizar
as hierarquias de diferença através das quais se estabelecem relações de poder. Há alguns acordos no que se
refere ao conteúdo dessa desnaturalização. Trata-se de
compreender como os processos de construção de
identidades e de laços sociais aparecem ancorados na
natureza, na biologia ou em alguma instância divina.
Entretanto, há divergências em tornà dos limites do que
pode ser pensado como construído e o que não. Acho
que essas divergências estabelecem a diferença entre
as maneiras de pensar na relação entre gênero e
parentesco. Nesse sentido, na medida em que natureza
e cultura são colocadas em relações diferentes, não
seria possível pensar que, nas formulações dessas
autoras, a relação entre gênero e parentesco é a mesma.
Algumas formulações dessa relação são elaboradas a partir da análise de gênero e parentesco como
empíricos. Porém, que sentido tem esse tipo de análise,
numa perspectiva antropológica? Tenho claras as
restrições que muitos antropólogos fazem às formulações de Schneider. Isto é, a tendência a dissolver por
completo o parentesco ao tratá-lo a partir da oposição
sociedade/cultura. O parentesco seria pensado como
fenõmeno cultural puro, sem qualquer relação com a
estrutura social. Essa posição impossibilitaria as tentativas
de definir universais no âmbito do parentesco42.
4° Essa "dinómica",
detectável na produção
das teóricas feministas, se
reproduz com conotações
talvez mais sérias, à minha
volta, no Brasil. Alunos/as
interessados/as no debate
feminista, muitos matriculados em programas de
antropologia, lêem com
avidez e decodificam
pacientemente a produção
de filósofas, historiadoras da
ciência e psicanalistas, cuja
retórica está longe de ser
simples. Entretanto, quando
se trata dos escritos de
antropólogas, a dificuldade/
rejeição é evidente.
Dificuldades análogas
suscitadas pela preferência
dos jovens antropólogos por
outras disciplinas têm se
manifestado em outras
situações. Vide, por
exemplo, os comentários de
Eduardo Viveiros de Castro.
CASTRO, Eduardo Viveiros
de. Sobre a Antropologia
Hoje: te(i)ma para discussão.
In: O Ensino da Antropologia
no Brasil. Temas para uma
discussão. ABA. Associação
Brasileira de Antropologia.
Mime°, 1995, p. 5-9.
4' Assinalei que, apesar das
ambigüidades, Rubin afirma
este ponto. Yanagisako e
Colher insistem na necessidade de fazê-lo. Contrapondose às perspectivas
funcionalistas que imperaram em alguns estudos de
família, nos quais o
parentesco foi reduzido à
sua função primária de
reprodução e à unidade
reprodutiva primária, a
família nuclear, consideram
que trabalhar com
parentesco permitiria
desnaturalizar esse tipo de
perspectiva. Isto porque
permitira introduzir um leque
de relações e práticas na
análise da família, ignorados
nesses estudos. COLLIER e
YANAGISAKO. Op. cit., p. 3.
42 FILHO. Op. cit., p. 30;
CASTRO. Op. cit..
Parece-me que, na maneira como o parentesco
é trabalhado por algumas destas autoras, na medida
em que se centram na ação social, não se trata de
"pura" cultura. Isto não elimina, é claro, o problema dos
universais. Mas a questão é perguntar-se: a tensão entre
universal e particular deve ser necessariamente resolvida a partir dos universais? Quero dizer que trabalhar
com parentesco ou gênero como empíricos não
implica, necessariamente, a limitação ao particular,
nem a renúncia a uma visão global sobre o social,
embora signifique o abandono da tentativa de alcançar essa visão a partir do parentesco entendido como
construção analítica. Pode ser apenas (mais) um dos
caminhos para procurar a perspectiva que é, sim,
requisito antropológico.
estudos históricos
é uma revista semestral
cujos números são dedicados
a temas específicos.
Os próximos números tratarão
de Arquivos pessoais e
Polícias.
SOLICITAÇÃO
D ASSINATURA NOVA DE ESTUDOS HISTÓRICOS
D RENOVAÇÃO DE ASSINATURA (LIGUE DDG: (0800) 21 77 77)
O ALTERAÇÃO DE DADOS CADASTRAIS
OPÇÃO DE PAGAMENTO
E:1 CHEQUE NOMINAL À FUNDAÇÃO GETULIO VARGAS
I:1 DEPÓSITO BANCÁRIO NA CONTA N° 112.715-2 DO BANCO DO BRASIL,
AGÊNCIA 0287-9 (ENVIAR CÓPIA DO COMPROVANTE À FGV)
CARTÃO DE CRÉDITO
O VISA
CARTÃO
O AMERICAN EXPRESS
N°
O CREDICARD
VALIDADE
NOME
CONTATO
ENDEREÇO
CEP
CIDADE
DDD
TELEFONE
DATA
ASSINATURA
ESTADO
FAX
Download