Coordenação de Controle de Infecção Hospitalar CCIH/HUCFF/UFRJ Agosto 2013 PREVENÇÃO E CONTROLE DA DIARRÉIA ASSOCIADA A CLOSTRIDIUM DIFFICILE (DACD) 1. Introdução: Clostridium difficile é um bacilo Gram positivo anaeróbio esporulado associado à infecção gastrointestinal, que pode variar de formas assintomáticas até diarréia severa, colite pseudomembranosa, megacólon tóxico, perfuração intestinal, evoluindo para sepse grave e óbito. A manifestação como formas graves aumentou recentemente, possivelmente pela existência de uma nova cepa, hiperprodutora de toxina. O C. difficile é apenas mais uma causa de diarréia hospitalar. Outras etiologias devem ser lembradas no manejo do paciente com diarréia nosocomial, como outras bactérias patogênicas, vírus, disabsorção, uso de antimicrobianos ou outros fármacos. Por outro lado, até 20% dos pacientes com DACD adquiriram o C. difficile na comunidade. Portanto, DACD pode ser uma doença relacionada à assistência à saúde ou não. A colonização assintomática varia de 2 a 3% na população geral, e entre 20 a 30% em pacientes internados por outros motivos. O C. difficile pode permanecer no ambiente sob a forma de esporos durante semanas, já que o mesmo é resistente as principais rotinas de desinfecção e precisa de remoção mecânica. 2. Fatores de risco: • Uso de antibióticos: praticamente todos antimicrobianos podem ser implicados como causa de DACD. Quanto maior o espectro de ação sobre a microbiota intestinal, maior a probabilidade de DACD. O tempo entre o uso do antibiótico e a manifestação da doença não está estabelecido, podendo variar de pouco tempo após o início do antibiótico até algumas semanas após. Freqüente: Ampicilina e amoxicilina Cefalosporinas Clindamicina Quinolonas Associação entre antibióticos e C. difficile: Infrequente: Cloranfenicol Macrolídeos Sulfonamidas e Trimetropim Tetraciclinas Rara: Metronidazol Vancomicina Aminoglicosídeo parenteral • Uso de inibidores de bombas de prótons, bloqueadores dos receptores histamínicos, agentes inibidores da motilidade do trato gastrointestinal (derivados da morfina, p. ex). • Imunodepressão • Idade maior que 65 anos • Cateter nasogástrico ou orogástrico • Cirurgia gastrointestinal • Tempo de hospitalização 1 Coordenação de Controle de Infecção Hospitalar CCIH/HUCFF/UFRJ Agosto 2013 3. Prevenção: Os dois pilares da prevenção da DACD em unidades hospitalares são política racional de uso de antibióticos e uso correto de barreiras que evitem a disseminação da forma esporulada. O uso desnecessário e inapropriado de antibióticos deve sempre ser evitado. A transmissão do C. difficile ocorre inicialmente por via fecal-oral, sendo as mãos do profissional de saúde e dos contactantes uma importante via de transmissão cruzada. A contaminação do ambiente também tem importante papel na cadeia de transmissão, principalmente pela manutenção do C. difficile sob a forma esporulada. 4. Diagnóstico: A manifestação clínica é bastante variável, podendo apresentar-se como diarréia sem sinais de invasão até colite com instabilidade clínica. A maioria dos casos se apresenta como diarréia não invasiva, moderada, acompanhada ou não de cólica abdominal. Febre e leucocitose podem ou não estar presente. Deve-se suspeitar de DACD em pacientes que apresentam fatores de risco, como uso de antimicrobianos, internação prolongada e que não tenham outras causas para diarréia, como alteração de dieta ou fármacos. A solicitação da pesquisa de C. difficile deve ser feita em pacientes com diarréia aquosa, três ou mais episódios por dia (ou com volume superior a 300ml/dia) ou colite visualizada por colonoscopia. O material deve ser colhido e enviado ao laboratório de bacteriologia a fresco (não usar formol), preferencialmente até as 12:00h. As fezes podem ficar na geladeira, a 4°C, por até 24h. Métodos diagnósticos: • Imunoensaio para detecção da toxina A e B: sensibilidade > 80%, rápida execução. • Cultura: em 72 horas, sensibilidade > 89%. Possibilita testagem molecular, mas não distingue cepas produtoras de toxinas. • Colonoscopia: demonstração endoscópica de lesões exudativas (colite pseudomembranosa). Sensibilidade baixa (por volta de 50%). A presença da bactéria não caracteriza a doença, pois há indivíduos assintomáticos (principalmente crianças). A cultura é útil para análise epidemiológica e avaliação de surtos pela tipagem molecular. 5. Controle: As principais formas de disseminação do C. difficile são pessoa-pessoa ou através do ambiente. Como o álcool não é efetivo contra o Clostridium difficile, deve-se lavar as mãos com água e clorexidina degermante após manipular o doente com DACD e seu mobiliário. Sempre que possível, o paciente sintomático deve ficar em quarto privativo. Pode-se optar também por “coortes” de pacientes infectados. Deve-se usar luvas e capotes ao manipular o paciente e o mobiliário (conforme a rotina de precaução de contato da CCIH). Os pacientes que forem fazer exames (TC, raio-X) serão tratados com as mesmas precauções de contato, no entanto os aparelhos e mobiliários deverão ser desinfetados com hipoclorito de sódio 1% e não álcool 70%. Precaução de contato: Após 48h de a diarréia cessar, está autorizada a suspensão da precaução de contato. 2 Coordenação de Controle de Infecção Hospitalar CCIH/HUCFF/UFRJ Agosto 2013 6. Tratamento: Nem todos os pacientes que tiveram exame positivo para C. difficile devem ser tratados. Sempre que possível, deve-se suspender o antibiótico e outras drogas implicadas como causas de diarréia, pois mais de 25% dos pacientes recuperam-se sem terapia específica. O tratamento fica reservado para os pacientes que mantém a diarréia após 48h da suspensão do antimicrobiano. Também não há necessidade de tratamento caso a diarréia tenha se resolvido no momento do resultado laboratorial. O tratamento recomendado para as formas sem sinais de gravidades é metronidazol 500mg VO 8/8h por dez dias. Em casos graves (choque séptico, distúrbio eletrolítico, peritonite, íleo paralítico e megacólon tóxico) e que não responderam ao metronidazol, usar vancomicina 125 a 500mg (frasco ampola) por via oral ou intraluminal 6/6h também por dez dias. A manipulação deve ser realizada na farmácia. Em caso da impossibilidade de usar medicação por via oral, fazer vancomicina por via retal ± metronidazol iv. Nunca tratar portadores assintomáticos. Não há indicação de metronidazol ou vancomicina como profilaxia contra DACD em pacientes que estão sob terapia antimicrobiana. 7. Evolução: As manifestações clínicas costumam regredir em 24 a 48 horas. Normalmente a diarréia está resolvida até o quinto dia. A persistência do bacilo, sob a forma de colonização é muito freqüente. Desse modo, o paciente que foi tratado para DACD não precisa ser re-testado se houver resposta clínica. Se após o tratamento, o paciente voltar a apresentar diarréia (com características compatíveis com DACD - descritas acima) a investigação deve ser reiniciada. Considerar, nesses casos, tanto a persistência do C. difficile como outras etiologias. As taxas de recorrência variam de 15 a 25%. Como DACD pode progredir para colite a despeito do tratamento antimicrobiano, deve-se considerar a abordagem cirúrgica em casos de pouca melhora após 48 horas e em casos de megacólon tóxico e peritonite. Ainda não há consenso sobre o desinfectante ideal, mas o uso de hipoclorito a 1% reduz o C. difficile do ambiente e é o desinfetante preconizado. Para maiores informações, consultar a rotina de limpeza e desinfecção para prevenção da disseminação de C. difficile no ambiente hospitalar. CONDUTAS PARA PREVENÇÃO DA DISSEMINAÇÃO DE CLOSTRIDIUM DIFFICILE A) Unidade do paciente: I- Durante internação 1- Limpeza concorrente com água e sabão 2- Limpeza diária com água e sabão * Em caso de extravasamento de material orgânico proceder a descontaminação prévia: • Retirar matéria orgânica com trapo ou papel toalha. • No local colocar hipoclorito a 1% e deixar agir por 10’ • Lavar com água e sabão e desinfetar com hipoclorito 1% 3- Limpeza diária do mobiliário com água e sabão 4- Termômetro – Limpeza com água e sabão 3 Coordenação de Controle de Infecção Hospitalar CCIH/HUCFF/UFRJ Agosto 2013 5- Manter hamper de uso individual 6- Materiais de assistência ventilatória: • Mesmo tratamento dado ao material de tuberculose (descontaminação prévia) • Encaminhar para o SEME. 7- Manter carro para o uso banho de uso individual 8- Utensílios (bacias, patinhos, comadres e cubas) • Limpeza com água e sabão II – Após alta ou óbito 1- Limpeza terminal com água e sabão e desinfetar com hipoclorito 1% 2- Aparelho de PA e termômetro – lavar com água e sabão e desinfetar com hipoclorito 1% 3- Utensílios (bacias, cubas, comadres, patinhos) • Limpeza com água e sabão, • Encaminhar embalado para o SEME identificado como Clostridium difficile 4- Material de assistência ventilatória • O mesmo processo usado durante internação 5- Carro de banho e hamper – limpeza com água e sabão e desinfetar com hipoclorito 1% OBS: Superfícies de difícil penetração do desinfetante, usar um borrifador, deixar o hipoclorito agir por 10’. Referências: Suneshine RS, McDonald LC. Clostridium difficile-associated disease: new challenges from an established pathogen. Cleve Clin J Med. 2006 Feb;73(2):187-97. Review. Bartlett JD, Gerding DN. Clinical recognition and diagnosis of Clostridium difficile infection. Clin Infect Dis. 2008 Jan 15;46 Suppl 1:S12-8. Review. Gerding DN, Muto CA, Owens RC, Jr. Measures to control and prevent Clostridium difficile infection. Clin Infect Dis. 2008 Jan 15;46 Suppl 1:S43-9. 4