ISLAMISMO A GRANDE FORTALEZA RELIGIOSA INTRODUÇÃO O dia 11 de setembro de 2001 entrou para a História. É impossível a qualquer pessoa olhar para aqueles eventos sem considerar o seu significado. É impossível também ser imparcial quanto a Osama bin Laden ou George W Bush. Contudo, é certo também que algo muito sério foi despertado: a atendo para uma religião que parecia restrita ao Oriente Médio e suas adjacências, mas que tem conquistado espaço no mundo silenciosamente: esta é o Islã. BREVE HISTÓRICO O islamismo está diretamente ligado a Abulgasin Mohammed Ibn Abd Al-Muttalib Ibn Hasin, ou simplesmente Maomé, que significa "Altamente Louvado". Nascido em Medina, na atual Arábia Saudita, no ano 570 d.C. Membro de uma das principais famílias de comerciantes dali e responsável pelo templo da Caaba, em Meca, Maomé teve desde cedo um contato com a religião politeísta e mesclada de vários outros elementos de religiões próximas da Arábia. Na juventude, Maomé se tornou guia de caravanas, vindo a conhecer profundamente os princípios elementares do judaísmo e do cristianismo, religiões monoteístas. Casou-se, posteriormente, com a viúva e sua ex patroa Khadidja, próspera comerciante. Segundo alguns historiadores, Khadidja seria membro da igreja ariana, cujos conceitos acerca da trindade e divindade de Jesus estão claramente assimilados no islã, sendo ela também grande incentivadora da carreira religiosa do marido e sua primeira discípula. Isso por volta de 610 d.C. Segundo a lenda islâmica, Maomé se retirava diariamente para meditação e oração, quando um dia o anjo Gabriel lhe apareceu com um pergaminho nas mãos e lhe ordenou que o lesse. Maomé respondeu não saber ler, então Gabriel, segundo a lenda, revelou a primeira surata (Surata 98.1-19). Daí por diante, várias outras revelações se sucederam. Em 616 d.C., Maomé iniciou a pregação pública da nova religião que, para ele, era a continuação da religião monoteísta de Abraão (lbhraim, em árabe). Em razão de sua oposição à religião politeísta e idólatra de Meca, Maomé e seus seguidores foram forçados a fugir para Medina, lá chegando no dia 22 de setembro de 622 d.C., sendo esta data considerada o ano primeiro do calendário muçulmano. A esta fuga dá-se o nome de Hégira. Em Medina, Maomé propôs uma Jihad, guerra santa, contra Meca e seus ídolos. Maomé e um grupo de 10 mil homens conquistaram Meca, em 628 d.C., e destruíram os ídolos, preservando a Caaba e o santuário, transformando-os na primeira mesquita, e no lugar mais sagrado do Islã. A partir daí todas as tribos árabes foram submetidas ao Islã. Novas guerras santas foram propostas contra os infiéis, conquistando o norte da África, Oriente Médio, Europa e Ásia. Maomé morreu em 632 d.C. DIVISÕES DO ISLAMISMO O islamismo não é composto por apenas um grupo. Essa divisão teve início após a morte de Maomé, com a disputa pela liderança do grupo, diante disto temos dois grupos: os sunítas e os xiitas. A. Sunitas - Os sunítas formam o grupo majoritário, cerca de 90% do Islã. Para eles, a liderança do Islã deveria estar na mão que de fato controlava o poder, portanto, reconhecem apenas quatro califas como sucessores de Maomé. Possuem uma interpretação moderada do Alcorão. Contudo, os sunítas também reconhecem a validade da Jihad com os infiéis, sejam judeus, cristãos ou muçulmanos. B. Xiitas - Os xiitas, embora sejam o segundo grupo mais numeroso, são os mais conhecidos por causa do radicalismo e fanatismo com que interpretam o Alcorão. Aceitam que a revelação do Alcorão pode ser ampliada pela interpretação dos líderes espirituais, como é o caso dos Aiatolás, no Irã. Os xiitas defenderam que os legítimos sucessores de Maomé deveriam ser descendentes dele. C. Existe ainda um terceiro grupo que não está relacionado com o cisma pós-Maomé. Esse grupo é chamado Sufita e forma o menor grupo do Islã. Possuindo uma tendência mais mística, os sufitas originais tinham uma vida simples e austera, diferente daquilo que estava acontecendo nos palácios dos sultões. Após essa fase, os sufitas começaram a pensar na possibilidade da presença de Alá em suas vidas, numa mística união, como no cristianismo ortodoxo. São dados à oração, à meditação e à ascese; e de modo curioso têm livre acesso aos dois grupos majoritários. PRINCIPAIS PONTOS DOUTRINÁRIOS Alcorão Sagrado Dentro do estudo das religiões, existem aquelas que são chamadas as Religiões do Livro. Ou seja, a formação espiritual, ética e cultural está orientada por algum escrito considerado sagrado, uma revelação da divindade. Nesse grupo está o islamismo com o seu Alcorão. O Alcorão, ou apenas Corão, tem a sua raiz no árabe e significa "recitação", uma vez que ele deve ser diariamente recitado pelos fiéis, além do que, no árabe, o Alcorão está escrito em forma de poesia, num estilo semelhante aos salmos. O Alcorão é formado por 114 suratas ou suras (capítulos) divididas em versículos. As suratas não estão arranjadas em forma cronológica, mas das maiores para as menores, com exceção da Surata 1ª com apenas sete versículos. Ao contrário do que se imagina, o Alcorão foi escrito após a morte de Maomé, o que coloca em xeque a teoria da revelação. O conteúdo do Corão versa sobre os principais tópicos da teologia islâmica, mas também sobre ética, comportamento social, economia; além de afirmar posição precípua do islã sobre as demais religiões, especialmente contra o judaísmo e o cristianismo. O DEUS DO ISLÃ O islamismo afirma crer no Deus que se revelou desde o princípio aos profetas do Antigo Testamento e de Jesus Cristo, como descrito no Novo Testamento, do qual o Alcorão é corroborante. E uma boa definição de Deus é a seguinte: "Em nome de Deus, o Clemente, o Misericordioso. Louvado seja Deus, Senhor do Universo, Clemente, o Misericordioso, Soberano do Dia do Juízo. Só a Ti adoramos e só de Ti imploramos ajuda! Guia-nos à senda reta, à senda dos que agraciaste, não à dos abominados, nem à dos extraviados" (Surata 1.1-7). De fato, Alah, em árabe, é uma forma correlata de El ou Eloah (heb. Deus), em hebraico, que é o singular de Elohim. Contudo, percebe-se na leitura do Alcorão uma deficiência em Alá: um deus instável que, embora seja soberano sobre o universo, é atormentado e frustrado pelo homem, que fica ressentido, que se ira facilmente, apesar de ser "clemente e misericordioso". Outra característica de Alá é a sua forte transcendência. Isso quer dizer que o Islã é inalcançável e incognoscível, de modo que um pecador não pode se aproximar dele em razão de sua perfeição e distância, muito diferente do Deus bíblico (SI 138.6). O Deus da Bíblia revela todos os atributos de Alá, mas, vai além, mostrando ser um Deus de amor, que chama todos ao arrependimento, que entrega a si mesmo, em Jesus Cristo, por amor ao pecador. O Deus bíblico é o Deus imutável em todos os seus desígnios, jamais podendo ser manipulado por qualquer ação humana, porém pela sua misericórdia livremente concede ao homem salvação, sem exigir nada em troca. A TRINDADE O islamismo, assim como as TJ, tentou preservar o conceito monoteísta adquirido do judaísmo, numa oposição à Trindade do Cristianismo Ortodoxo. O Alcorão diz: "Crede, pois, em Deus e em seus mensageiros e digais: Trindade! Abstende-vos disso, que será melhor para vós; sabei que Deus é Uno" (Surata 4.171). E acrescentam: "São blasfemos aqueles que dizem: Deus é um da Trindade, portanto, não existe divindade alguma além do Deus Único. Se não desistirem de tudo quanto afirmam, um doloroso castigo açoitará os incrédulos entre eles" (Surata 5.73). É bem possível que a esposa de Maomé tenha pertencido ao arianismo, uma vez que esta seita cristã era monarquiana, e não admitia em hipótese alguma a existência de uma trindade. Esta doutrina cristã, portanto, é a grande dificuldade para a apresentação do evangelho ao muçulmano que resistirá ao cristianismo por julgá-lo uma forma de politeísmo. Jesus Cristo No Alcorão são encontradas mais de 110 vezes as ocorrências do nome de Jesus Cristo, muitas das quais trazem uma definição sutil da sua humanidade em detrimento da sua divindade: o filho de Maria (Surata 2.87). Todavia, uma afirmação mais intensa é apresentada nos seguintes termos: "Ó adeptos do Livro [muçulmanos], não exagereis em vossa religião e não digais de Deus senão a verdade. O Messias, Jesus, filho de Maria, foi tão-somente um mensageiro de Deus e seu Verbo, com o qual Ele agraciou Maria por intermédio do seu Espírito" (Surata 4.171). O comentário dessa sura desdenha ainda dos méritos de Nosso Senhor, afirmando que "sua vida e missão foram mais limitadas do que no caso de outros mensageiros, embora devamos dispensar-lhe iguais honrarias, como um dileto de Deus que foi”. Jesus é colocado como um profeta menor entre os seus pares e nada mais do que isso. E ainda que qualquer tentativa de lhe atribuir divindade seja considerada um embuste do escritor do quarto evangelho, "seja ele quem for", colocando em dúvida a legitimidade da revelação bíblica. Nessa mesma surata, Maomé afirma claramente que Jesus jamais morreu pelos pecadores: "E por dizerem: Matamos o Messias, Jesus, filho de Maria, o Mensageiro de Deus, embora não sendo, na realidade, certo que o mataram, nem o crucificaram, senão que isso lhes foi simulado, porém, o fato é que não o mataram" (Surata 4.157). A negação da morte de Jesus é a negação de toda a obra redentora. Portanto, nas palavras de Paulo "se Cristo não ressuscitou é vã a nossa fé" '1Co 15.14,. Ora, a ressurreição implica morte, de modo que podemos falar que se Cristo não morreu "é vã nossa pregação, nossa fé e ainda estamos mortos em nossos delitos e pecados" (1Co 15.17). Assim, no pensamento islâmico, crer em Cristo é crer numa mentira descabida, mas demonstrada por seu profeta. Contudo, Jesus Cristo afirmou de si mesmo: "Eu sou o caminho, e a verdade, e a vida; ninguém vem ao Pai senão por mim" (Jo 14.6). Essa é a mensagem que devemos apresentar ao muçulmano. SALVAÇÃO NO ISLÃ A soteriologia islâmica é meritória, isto é, a salvação depende daquilo que o homem faz por si diante de Alá (Surata 2.35-39). Uma chave para a salvação são os chamados "Cinco Pilares da Fé". Esses pilares constituem o modo pelo qual os muçulmanos conquistam a sua salvação. A salvação por meio de uma expiação vicária é expressamente condenada pelo Islã, de modo que ninguém poderia assumir a culpa de outro. 1) Recitação diária da Shahada - A Shahada é uma breve declaração da fé islâmica, que diz: "Alá é o único Deus e Maomé é o seu profeta”. Essa é a fórmula da profissão de fé dos prosélitos ao islamismo, que deve ser recitada três vezes na presença de três muçulmanos seguindo-se de um banho e o vestir de novas roupas. Esse é o rito iniciático no islã. "Deve ser a primeira coisa sussurrada no ouvido dos recém-nascidos e a última a se murmurar no ouvido do moribundo.” 2) As orações - É exigido do muçulmano a realização de cinco orações diárias em horas predeterminada. Essas orações são fórmulas fixas, um ritual que exige palavras e gestos bem definidos. Surata 1 a é constantemente repetida como uma da orações. Algo que se deve ressaltar é que em geral o muçulmano não tem vergonha da sua religião, de modo que, independente do lugar em que esteja ele se ajoelha e faz sua prece. 3) A caridade - O Alcorão diz: "As esmolas são tão-somente para os pobres, para os necessitados, para os funcionários empregados em sua administrarão, para aqueles agás corações têm de ser conquistados, para a redenção dos escravos, para os endividados, para a causa de Deus e para o viajante; isso é um preceito emanado de Deus” (Surata 9.60). Essa esmola é um imposto fixado em 2,5% da riqueza e da propriedade de um muçulmano. Não é fruto de um amor sincero e abnegado, mas do conceito de fazer o bem a si mesmo por meio do outro. 4) O jejum - Durante o mês muçulmano chamado Ramadan, todos os muçulmanos são convocados para um jejum total de alimentos, bebidas, fumo e de relações sexuais do amanhecer até o pôr-do-sol. Há quem até durante a noite observe o jejum, mas também há quem coma o que pode. 5) Peregrinação a Meca - A Peregrinação ou Hajj é exigida de todo muçulmano, que possui condições financeiras para realizá-la pelo menos uma vez na vida. Ali orações são feitas em torno da Caaba, um edifício adornado de granito negro coberto por um pano negro ricamente bordado. Mas, por outro lado, o homem se encontra inteiramente ligado a uma espécie de predestinação incerta, desconhecida e não evidenciável, na qual ninguém pode se firmar, mas que também é um critério último reservado exclusivamente aos caprichos de Alá. Em resumo, pode-se ser um muçulmano, cumprir fielmente todos os pilares e ainda assim não herdar o paraíso. O islamismo é como a sua Caaba; um bloco monolítico. Suas crenças estão profundamente enraizadas na cultura em que se estabeleceu, de modo que é impossível, em alguns países, deixar de ser muçulmano, sem que isso seja crime. I Jostein Gaarder et Tal. O Livro das Religiões. São Paulo: Companhia das Letras, 2001, p. 119. 2 Samir EI Hayek (trad.). O Alcorão Comentado. Disponível em: www.dominiopublico.gov.br. Acesso: 18 de outubro de 2007. As indicações doravante serão por surata e versículos. 1 Por "cristianismo ortodoxo" se entende o cristianismo fiel aos cânones de Nicéia, Constantinopla e ao próprio Credo Apostólico, nos dias do surgimento do islamismo, em contraste com as várias seitas daquele tempo: arianos, sabelianos, docetistas, que negavam a trindade. 4 Um só princípio. Hayek, op. cit., Comentário 320. 6/bid.