O PIB E A PREVISIBILIDADE ECONÔMICA Gilmar Mendes Lourenço A expansão de 1,2% do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro no 2º trimestre de 2010, em relação aos três meses imediatamente antecedentes, contra 2,7% no 1º trimestre, anunciada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), confirma o quase consenso das previsões, realizadas pelos meios especializados e governo, de desaceleração da velocidade de recuperação da economia, após o ajuste à crise internacional, acontecido no final de 2008 e começo de 2009. Já em relação ao mesmo trimestre de 2009, o acréscimo foi de 8,8%, o mais acentuado da série histórica. De fato, depois de retrair mais de 4,0% entre outubro de 2008 e março de 2009, as atividades produtivas começaram a acusar reativação, a partir do 2º trimestre de 2009, acumulando variação de 5,1% no ano encerrado em junho de 2010 e de 8,9% no 1º semestre, a maior em 14 anos. Tratou-se do mergulho recessivo mais profundo e da superação mais rápida entre todas as turbulências que assolaram o Brasil desde 1994. Porém, tal panorama atesta a natureza exagerada dos diagnósticos de superaquecimento da demanda doméstica, que proliferaram nos mercados entre fevereiro e maio do corrente ano, sentenciando os perigos de ocorrência de uma escalada inflacionária e de apagão logístico, em um sistema que estaria crescendo acima do seu PIB potencial, estimado entre 4,5% e 5,0% ao ano. A mensagem foi captada pelo Banco Central (BC), particularmente pelo Comitê de Política Monetária (Copom), que subiu a taxa Selic de 8,75% a.a., em abril, para 10,75% a.a., em julho de 2010. O parâmetro foi mantido no começo de setembro, em razão da compreensão (ou seria rendição?) oficial do quadro de abrandamento da intensidade de reativação do ciclo de produção e de negócios no Brasil. O componente solitário da demanda agregada a apresentar impulsão de embalo entre abril e junho de 2010 (a maior em cinco trimestres) foi o dispêndio do governo (que reponde por cerca de 20,0% do PIB), atrelada à necessidade de escape da legislação eleitoral, que impede a celebração de contratos de obras públicas depois do mês de julho. Os demais elementos contabilizaram diminuição do ímpeto de incremento, com destaque para a formação bruta de capital fixo (FBCF), que recuou da média de 7,0%, experimentada desde o 3º trimestre de 2009 para 2,4%, o consumo Vitrine da Conjuntura, Curitiba, v.3, n. 7, setembro 2010 | 1 das famílias (pelo 4º trimestre consecutivo), as exportações (1,0% versus 2,1% no trimestre anterior) e as importações (4,4% contra 12,9%). A segurada na FCBF resultou na queda da taxa de investimento (referência para o crescimento futuro do País) de 18,0% para 17,8% do PIB e, ao lado da retração da onda da economia, justificaria o declínio da propensão importadora. Com essa performance, a taxa situa-se ainda abaixo dos patamares pré-crise, daqueles experimentados nos anos 1970 (25,0% do PIB) e dos registrados pelas nações emergentes, que estariam entre 40,0% e 50,0% do PIB. Já o comportamento do consumo privado traduziu a condição de proximidade de atendimento pleno da demanda reprimida por bens essenciais, expresso na intensa mobilidade social verificada nos anos recentes, o fim dos incentivos tributários baseados no imposto sobre produtos industrializados (IPI) e a exaustão da capacidade de endividamento primário da população, com o surto de compras de bens duráveis. Já o medíocre desempenho exportador exprime a pífia demanda mundial e a apreciação do real. A trajetória de resgate do estágio de expansão rápida, evidenciada pelos indicadores industriais e comerciais observados em julho, já mirando a movimentação de final de ano, sinalizada pela antecipação do pagamento do 13º salário dos trabalhadores, permite admitir que 2010 estaria ganho, com inflação de 5,0% e PIB acima de 7,0%, representando o maior acréscimo desde 1986 quando, embalada pelo Plano Cruzado, a economia cresceu 7,5%. A questão crucial seria como evitar a repetição do episódio de “voo da galinha”, considerando as restrições à alta longevidade de modelos de crescimento calcados em elevado consumo doméstico (público e privado), déficit externo e reduzidos níveis de poupança pública e privada. A resposta possui raízes na capacidade de enfrentamento dos desafios colocados ao novo presidente da República, reproduzidos, de forma concatenada, na melhoria do ambiente de negócios, na promoção das reformas microeconômicas (tributária, fiscal, previdenciária, administrativa, etc.) e na recuperação da competitividade da infraestrutura. Vitrine da Conjuntura, Curitiba, v.3, n. 7, setembro 2010 | 2