aviso legal

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Manual de
Condutas
2011
SBOC
Dr. ENALDO MELO DE LIMA
Presidente
Dr. ANDERSON ARANTES SILVESTRINI
Vice- Presidente de Organização, Planejamento e Administração
Dr. AUGUSTO CÉSAR DE ANDRADE MOTA
Vice-Presidente de Assistência Médica e Defesa Profissional
Dra. ANA LUIZA GOMES DE MORAIS WIERMANN
Vice-Presidente para Pesquisa Clínica e Estudos Cooperativos
Dra. CRISTIANA DE LIMA TAVARES DE QUEIROZ MARQUES
Secretaria Geral
Dr. CARLOS AUGUSTO DE MENDONÇA BEATO
Secretaria de Comunicação Social
Dr. AMÂNDIO SOARES FERNANDES JUNIOR
Tesouraria
Dra. CARLA ISMAEL
Vice-Tesouraria
Dr. LUIZ ALBERTO SILVEIRA
Conselho de Ética
Dra. RENATA PAIVA QUEIROZ
Conselho de Ética
Dra. RUTE DOLORES RAPOSO DA CÂMARA
Conselho de Ética
Dr. LUCIANO DE SOUZA VIANA
Conselho Fiscal
Dr. ADALBERTO BROECKER NETO
Conselho Fiscal
Dr. WALDIR VEIGA PEREIRA
Conselho Fiscal
ONCOLOGIA CLÍNICA
Outubro de 2011
REVISTA DA SOCIEDADE BRASILEIRA
DE ONCOLOGIA CLÍNICA
Manuais de Condutas
ISSN 1806-6054
Editor Chefe
Evanius Garcia Wiermann
Editores
Alexandre Andrade dos Anjos Jácome
Alexandre José da Silva Fenelon
Alexandre Pieri Chiari
Aline Lauda Freitas Chaves
Ana Luiza Gomes de Morais Wiermann
Anelisa Kruschewsky Coutinho
Artur Katz
Carlos Augusto de Mendonça Beato
Carlos Gil Moreira Ferreira
Cristiana de Lima Tavares de Queiroz Marques
Daniel Goldberg Tabak
Gilberto Luiz da Silva Amorim
João Nunes de Matos Neto
Maria de Fátima Dias Gaui
Óren Smaletz
Paulo Marcelo Gehm Hoff
Rachel Simões Pimenta Riechelmann
Rafael Aron Schmerling
Ricardo Caponero
Roberto de Almeida Gil
Sérgio Lunardon Padilha
Wagner Brant Moreira
Diagramação / Editoração / Capa
Rachel Gomes Magalhães
www.communicatio.com.br
Fotolitos / Impressão
Gráfica e Editora O Lutador
AVISO LEGAL
A adesão às condutas descritas nestes manuais é voluntária e o tratamento oncológico deve ser individualizado
para cada paciente. A SBOC não endossa o uso desses
manuais como critério de aprovação de procedimentos por
parte do SUS ou das empresas de medicina suplementar.
Sumário
27 EDITOrIAL
31 CAPÍTULO 1 - Câncer de Mama Inicial
33 Introdução
33 1.1. Considerações Gerais Relativas ao Tratamento Adjuvante
34 1.2. Conteúdo Mínimo do Relatório Anátomo-patológico.
35 1.3. Avaliação Prognóstica e Preditiva
37 1.4. Recomendações Terapêuticas
37
1.4.1. Pacientes de Baixo Risco
37
1.4.2. Pacientes de Risco Intermediário
38
1.4.3. Pacientes de Alto Risco
38 1.5. Considerações Relativas a Hormonioterapia
40
1.5.1. Supressão da Função Ovariana em Mulheres Pré-menopáusicas
41 1.6. Considerações Relativas à Quimioterapia
42
1.6.1. Pacientes com mais de 70 anos
43 1.7. Considerações Relativas a Tratamento com Drogas Biológicas
43
1.7.1. Trastuzumabe associado à quimioterapia
44 1.8. Rotina de Acompanhamento após o Tratamento Adjuvante
45 1.9. Situações Especiais: Câncer de Mama na Gravidez e em Homens
45
1.9.1. Pacientes gestantes
45
1.9.2. Homens
46 1.10. Considerações sobre o Tratamento Neoadjuvante
46
1.10.1. Introdução
46
1.10.2. Vantagens de se fazer quimioterapia Neoadjuvante
47
1.10.3. Desvantagens de se fazer quimioterapia Neoadjuvante
47
1.10.4. Avaliação patológica do tumor primário antes da QT Neoadjuvante
47
1.10.5. Marcação do tumor
47
1.10.6. Avaliação de doença sistêmica antes do tratamento neoadjuvante
48
1.10.7. Qual o melhor regime?
48
1.10.8. Hormonioterapia Neoadjuvante
48 1.11. Apêndice 1: Estadiamento
50 1.12. Apêndice 2: Esquemas de QT mais Utilizados
59 CAPÍTULO 2 - Câncer de Mama Metastático
61 Introdução
61 2.1. Introdução: Diagnóstico da Doença Metastática / Fatores Prognósticos e
Fatores Preditivos
61
2.1.1. Introdução
62
2.1.2. Avaliação Diagnóstica
62
2.1.3. Fatores prognósticos
63
2.1.4. Fatores preditivos para a resposta aos tratamentos
63 2.2. Terapia Endócrina
64
2.2.1. Tratamento hormonal para paciente na pós-menopausa
64
2.2.2. Hormonioterapia de Primeira Linha
64
2.2.3. Hormonioterapia de Segunda Linha
64
2.2.4. Tratamento Hormonal na pré-menopáusica
65 2.3. Quimioterapia
65
2.3.1. Câncer de mama metastático: agentes isolados versus poliquimioterapia
66
2.3.2. Pacientes previamente tratadas com antracíclicos e taxanos
67
2.3.3. Novas alternativas de tratamento sistêmico
67 2.4. Tratamento de Pacientes Com Câncer de Mama HER2 Positivo;
68 2.5. Duração do Tratamento
69 2.6. Manejo da Doença Mestatática Óssea com Bisfosfonatos
69 2.7. Considerações em Pacientes Geriátricas
70 2.8. Metastasectomia / Tratamento Local do Câncer de Mama Avançado
73 CAPÍTULO 3 - Câncer de Colo de Útero
75 3.1. Considerações sobre HPV e Vacinas
76 3.2. Subtipos Histológicos
76 3.3. Estadiamento (FIGO) / TNM (AJCC, 2010)
76 3.4. Exames de Estadiamento
77 3.5. Tratamento
77
3.5.1 Estágio IA1: tumores microinvasivos
77
3.5.2 Estágio IA2, IB1 e IIA1
79 3.6. Estágio IB2, IIA2: tumores invasivos iniciais volumosos
80 3.7. Estágio IIB, III e IVA: tumores localmente avançados
80
3.7.1. Cirurgia
80
3.7.2. Radioterapia e Quimioterapia
82 3.8. Recidiva Local
82 3.9. Doença Metastática
84 3.10. Cuidados Paliativos
84 3.11. Considerações do Câncer Cervical na Paciente HIV +
84 3.12. Seguimento
91 CAPÍTULO 4 - Câncer Epitelial de Ovário
93 4.1. Introdução
93 4.2. Estadiamento
94 4.3. Fatores Prognósticos
95
4.3.1. Estágio I
95
4.3.2. Estádios II a IV
96 4.4. Abordagem Cirúrgica
96
4.4.1. Introdução
96
4.4.2. Cirurgia para os estádios iniciais
98
4.4.3. Cirurgias para os estádios avançados (ECIII–IV) – Citorredução
Cirúrgica Primária
98
4.4.4. Situações especiais
99 4.5. Abordagem no Carcinoma Limítrofe (Borderline)
100 4.6. Tratamento Oncológico no Estádio I
101
4.6.1. Tratamento
102 4.7. Tratamento Oncológico nos Estádios Avançados (II a IV)
102
4.7.1. Pacientes operadas adequadamente
102
4.7.2. Pacientes com abordagem cirúrgica inadequada
103
4.7.3. Paciente não operada, com doença volumosa
105 4.8. Procedimentos especiais
105
4.8.1. Quimioterapia intraperitoneal
106
4.8.2. Manejo da doença sensível a platina
106
4.8.3. Combinação x agente único
106
4.8.4. Manejo da doença resistente a platina
108 4.9. Papel da Radioterapia
108
4.9.1. Radioterapia adjuvante
109
4.9.2. Radioterapia de consolidação
109
4.9.3. Radioterapia paliativa
109
4.9.4. Técnica e complicações da radioterapia
110 4.10. Critérios para Acompanhamento após o Tratamento
110
4.10.1. Dosagem do CA-125 sérico
110
4.10.2. Exame físico
111
4.10.3. Ultrassonografia
111
4.10.4. Tomografia computadorizada
111
4.10.5. PET-CT
111
4.10.6. Situações especiais
117 CAPÍTULO 5 - Câncer de Endométrio
119 5.1. Introdução
119 5.2. Fatores de Risco
119 5.3. Diagnóstico
120 5.4. Classificação
120 5.5. Estadiamento
121 5.6. Tratamento
121
5.6.1. Tratamento Cirúrgico
122
5.6.2. Tratamento Radioterápico Adjuvante
124
5.6.3. Quimioterapia Adjuvante
125
5.6.4. Doença avançada ou recorrente
127 5.7. Situações Especiais
127
5.7.1. Paciente que não pode ser submetida ao tratamento cirúrgico
127 5.8. Seguimento
131 CAPÍTULO 6 - Câncer Testicular Germinativo
133 6.1. Introdução e Epidemiologia
134
6.1.1 Histologia e Patofisiologia
136
6.1.2. Apresentação Clínica e Formas de Disseminação
136
6.1.3. Diagnóstico e Estadiamento
139 6.2. Tratamento no Estádio I
139
6.2.1. Tumores Seminomatosos
141
6.2.2. Tumores não Seminomatosos
142 6.3. Tratamento dos Pacientes Estádio II
142
6.3.1. Tumores Seminomatosos Estádio II
142
6.3.2. Tumores Não Seminomatosos Estádio II
143
6.3.3. Demais pacientes
143 6.4. Doença avançada (Estádio III)
144
6.4.1. Tumores Estádio III, Abordagem Baseada no Risco (Modelo
Prognostico do IGCCCG)
146 6.5. Situações Especiais
146
6.5.1. Avaliação de Cirurgia Após Quimioterapia
147
6.5.2. Quimioterapia de Resgate
148 6.6. Critérios de Seguimento após Tratamento
148 6.7. Manejo das Toxicidades
148
6.7.1. Toxicidades agudas
149
6.7.2. Toxicidades crônicas
155 CAPÍTULO 7 - Câncer de Próstata
157 7.1. Introdução
157 7.2. Doença Clinicamente Localizada - avaliação inicial e estadiamento
158 7.3. Doença Clinicamente Localizada – tratamento
158
7.3.1. Doença Clinicamente Localizada – Risco Baixo
159
7.3.2. Doença Clinicamente Localizada – Risco Intermediário
160
7.3.3. Doença Clinicamente Localizada – Risco Alto
161 7.4. Seguimento pós-tratamento da doença localizada
161 7.5. Recidiva Bioquímica pós-prostatectomia e pós-radioterapia –
avaliação, estadiamento/risco e tratamento
164 7.6. Doença metastática androgênio-dependente
165 7.7. Doença metastática resistente a castração – hormonioterapia
166 7.8. Doença metastática resistente à castração– quimioterapia
173 CAPÍTULO 8 - Câncer da Bexiga
175 8.1. Introdução e Epidemiologia
175 8.2. Patologia
176 8.3. Características Clínicas
176 8.4. Investigação e Estadiamento
177 8.5. Prognóstico
177 8.6. Tratamento de Câncer de Bexiga
177
8.6.1. Câncer da bexiga não-invasivo
179
8.6.2. Recorrência pós-tratamento ou doença persistente
180
8.6.3. Câncer de bexiga invasivo
181
8.6.4. Radioterapia
182
8.6.5. Quimioterapia Neoadjuvante
182
8.6.6. Quimioterapia Adjuvante
183
8.6.7. Câncer de bexiga metastático
184
8.6.8. Outros tumores da bexiga
191 CAPÍTULO 9 - Câncer de rim
193 9.1. Introdução
193 9.2. Avaliação da doença inicial e estadiamento
194 9.3. Princípos de Cirurgia - nefrectomia radical e nefrectomia citorredutora
196 9.4. Seguimento dos pacientes pós-nefrectomia nos estágios I-III
196 9.5. Doença metastática - estadiamento/avaliação de risco
197 9.6. Doença metastática - tratamento sistêmico
203 CAPÍTULO 10 - Câncer de reto
205 10.1. Definição anatômica
205 10.2. Estadiamento
205 10.3. Métodos diagnósticos para estadiamento
206 10.4. Prognóstico e sobrevida em 5 anos
206 10.5. Tratamento
206
10.5.1. Tratamento cirúrgico primário
206
10.5.2. Tratamento neoadjuvante primário
208
10.5.3. Tratamento sistêmico paliativo
208
10.5.4. Tratamento da recidiva local
209 10.6. Seguimento
211 CAPÍTULO 11 - Câncer de Cólon
213 11.1. Introdução
213 11.2. Estadiamento
214 11.3. Como Estadiar
214 11.4. Tratamento
220
11.4.1. Regimes quimioterápicos de resgate
220 11.5. Situações Especiais
220
11.5.1. Peculiaridades e observações em relação às drogas
221
11.5.2. Toxicidade dermatológica relacionada aos anti-EGFR
221
11.5.3. Interação medicamentosa com warfarina
221
11.5.4. Deficiência de Di-hidropirimidina Desidrogenase (DPD)
221
11.5.5. Metástases hepáticas exclusivas
222
11.5.6. Metástases pulmonares exclusivas
222
11.5.7. Metástases hepáticas e pulmonares
222
11.5.8. Recidiva locorregional
222
11.5.9. Seguimento durante a quimioterapia
223
11.5.10. CEA em elevação, sem doença detectável por métodos
convencionais
223
11.5.11. Carcinomatose exclusiva
223 11.6. Acompanhamento Sugerido
229 CAPÍTULO 12 - Câncer de Estômago
231 12.1. Introdução
232 12.2. Diagnóstico do Câncer Gástrico
233 12.3. Avaliação pré-tratamento
235 12.4. Estadiamento
236 12.5. Patologia
238 12.6. Cirurgia
238
12.6.1. Princípios da cirurgia
238
12.6.2. Extensão da ressecção
239
12.6.3. Extensão da linfadenectomia
239
12.6.4. Videolaparoscopia
240
12.6.5. Ressecção endoscópica
240
12.6.6. Câncer gástrico difuso hereditário
240
12.6.7. Tratamento cirúrgico paliativo
241 12.7. Tratamento Adjuvante do Câncer Gástrico
241
12.7.1. Quimioterapia Adjuvante
242
12.7.2. Quimioradioterapia Adjuvante
242
12.7.3. Tratamento Neoadjuvante
243
12.7.4. Conclusão
244 12.8. Tratamento do câncer gástrico avançado
244
12.8.1. Estudo V325
245
12.8.2. Estudo REAL-2
246
12.8.3. Estudo AVAGAST
247
12.8.4. Estudo ToGA
247
12.8.5. Outras alternativas de 1ª linha
248
12.8.6. Tratamento de segunda linha
248
12.8.7. Tratamento com quimioterapia intraperitoneal
248 12.9. Perspectivas futuras
253 CAPÍTULO 13 - Câncer de Canal Anal
255 13.1. Introdução
255
13.1.1. Histologia
255 13.2. Estadiamento
255
13.2.1. Como Estadiar
256
13.2.2. Estadiamento AJCC
257 13.3. Tratamento da Doença inicial
257
13.3.1. Neoplasia intraepitelial
257
13.3.2. Tratamento da doença localizada
257
13.3.3. Esquema de Nigro
257
13.3.4. Papel da Cisplatina
258
13.3.5. Tratamento da doença alto risco - localmente avançada (T3-4 N2-3)
258 13.4. Tratamento da Doença avançada
258
13.4.1. Tratamento da doença recorrente e da doença persistente
258
13.4.2. Tratamento da doença metastática
259 13.5. Seguimento clínico
261 CAPÍTULO 14 - Câncer de Esôfago e Junção Esofagogástrica
263 14.1. Introdução
263 14.2. Exames de Estadiamento e Avaliação Inicial
263 14.3. Estadiamento TNM
265 14.4. Abordagem Terapêutica
265
14.4.1. Estádio 0
265
14.4.2. Estádio I
266
14.4.3. Estádios II e III com doença ressecável
267
14.4.4. Estádios II e III com doença irressecável
268
14.4.5. Avaliação de resposta pós-quimiorradioterapia
268
14.4.6. Estádio IV
271 14.5. Situações Especiais
271
14.5.1. Abordagem do câncer de esôfago cervical
271
14.5.2. Abordagem da recidiva local
271
14.5.3. Tratamento cirúrgico da doença residual pós-quimiorradioterapia
271
14.5.4. Paliação da disfagia
271
14.5.5. Abordagem do paciente com fístula traqueo-esofágica
272
14.5.6. Avaliação e estadiamento inicial na ausência da ecografia endoscópica
272
14.5.7. As evidências atuais permitem abordagens terapêuticas distintas
conforme a histologia?
272 14.6. Seguimento
273 14.7. Recomendações Finais
279 CAPÍTULO 15 - Câncer de Fígado (Carcinoma Hepatocelular)
281 15.1. Introdução
281 15.2. Classificações e sistemas de estadiamento
283 15.3. Estadiamento
284 15.4. Prognóstico
285 15.5. Tratamento Cirúrgico
287 15.6. Terapias ablativas percutâneas
287
15.6.1. Ablação percutânea por radiofrequência
289
15.6.2. Injeção percutânea de etanol
289
15.6.3. Quimioembolização arterial hepática
290 15.7. Tratamento sistêmico
294 15.8. Seguimento
296 15.9. Prevenção
299 CAPÍTULO 16 - Câncer de Pâncreas Exócrino
301 16.1. Epidemiologia
301 16.2. Estadiamento TNM - AJCC, 2010
301
Agrupamento por estádios, simplificado
301
16.2.1. Como estadiar
302 16.3. Tratamento
302
16.3.1. Considerações Gerais
302
16.3.2. Doença Clinicamente Ressecável (T1-3 N0-1 M0)
303
16.3.3. Doença Clinicamente Irressecável (T3-4 N1 M0)
303
16.3.4. Doença Metastática (qqT qqN M1)
304 16.4. Identificação de pacientes de alto risco para recorrência
304 16.5. Seguimento
307 CAPÍTULO 17 - Câncer de pulmão de pequenas células
309 17.1. Introdução
309 17.2. Fatores de Decisão Terapêutica
310 17.3. Fatores Prognósticos
311 17.4. Avaliação Pré-Tratamento
311 17.5. Tratamentos Recomendados
311
17.5.1. Doença Limitada
312
17.5.2. Doença extensa
314
17.5.3. Duração e Manutenção do Tratamento
314
17.5.4. Tratamento de Segunda Linha
314
17.5.5. Pacientes Idosos e/ou com Baixa Performance
317 CAPÍTULO 18 - Câncer de pulmão não pequenas células
319 18.1. Introdução
319 18.2. Avaliação Pré-Tratamento
321 18.3. Recomendações Terapêuticas
321
18.3.1. Estádio I
322
18.3.2. Estádio Cirúrgico II
322
18.3.3. Estádio III
324
18.3.4. Estádio IV - Primeira Linha
326
18.3.5. Estádio IV - Segunda e Terceira Linhas
331 CAPÍTULO 19 - Câncer de Cabeça e Pescoço
333 19.1. Abordagem Geral do paciente portador de Câncer de cabeça e pescoço
333
19.1.1. Introdução
334 19.2. Diagnóstico e Estadiamento
336
19.2.1. Recomendações gerais para abordagem do paciente com CCP
336 19.3. Câncer de cavidade oral
336
19.3.1. Introdução
337
19.3.2. Diagnóstico
337
19.3.3. Estadiamento
337
19.3.4. Tratamento
339
19.3.5. Tumores de cavidade oral: recomendações
339 19.4. Câncer de Laringe
339
19.4.1. Introdução
339
19.4.2. Diagnóstico
340
19.4.3. Estadiamento
340
19.4.4. Tratamento
343
19.4.5. Tumor de laringe: recomendações
343 19.5. Câncer de Hipofaringe
343
19.5.1. Introdução
343
19.5.2. Estadiamento
344
19.5.3. Tratamento
344
19.5.4. Tumores de Hipofaringe: recomendações
344 19.6. Câncer de Orofaringe
344
19.6.1. Introdução
345
19.6.2. Diagnóstico
346
19.6.3. Estadiamento
346
19.6.4. Tratamento da doença locorregional avançada
348
19.6.5. Tumores de Orofaringe: recomendações
349 19.7. Câncer de Nasofaringe
349
19.7.1. Introdução
349
19.7.2. Diagnóstico
350
19.7.3. Estadiamento
350
19.7.4. Tratamento
352
19.7.5. Tumores de Nasofaringe: recomendações
352 19.8. Tratamento da Doença Metastática ou Recidivada Locorregionalmente
352
19.8.1. Recidiva local ou regional
353
19.8.2. Doença metastática
355
19.8.3. Doença Metastática ou recidivada: recomendações
355 19.9. Esquemas de Tratamento
359 CAPÍTULO 20 - Câncer do Sistema Nervoso Central (Gliomas em adultos)
361 20.1. Introdução
362 20.2. Gliomas de Alto Grau
362
20.2.1. Tratamento primário
367
20.2.2. Tratamento de recidiva
369 20.3. Gliomas de Baixo Grau
375 CAPÍTULO 21 - Tumores Neuroendócrinos
377 21.1. Introdução
378 21.2. Tumores Neuroendócrinos Pancreáticos
378
21.2.1. Diagnóstico
380
21.2.2. Estadiamento e prognóstico
380
21.2.3. Abordagem terapêutica
381
21.2.4. Situações Especiais
382
21.2.5. Orientações para seguimento
382 21.3. Tumores Carcinoides
382
21.3.1. Introdução
383
21.3.2. Epidemiologia
383
21.3.3. Clínica e Diagnóstico
384
21.3.4. Tratamento
388
21.3.5. Seguimento
389 21.4. Carcinomas neuroendócrinos pouco diferenciados extrapulmonares
389
21.4.1. Introdução
389
21.4.2. Diagnóstico
390
21.4.3. Estadiamento
390
21.4.4. Abordagem terapêutica
390
21.4.5. Orientações para seguimento
391 21.5. Carcinoma Medular de Tireoide Esporádico
391
21.5.1. Introdução
392
21.5.2. Estadiamento
392
21.5.3. Abordagem terapêutica
393
21.5.4. Situações Especiais
393
21.5.5. Orientações para seguimento
394 21.6. Carcinoma da Adrenal, Feocromocitoma e Paraganglioma
394
21.6.1. Carcinoma do Córtex da Adrenal
396
21.6.2. Feocromocitoma e Paraganglioma
399 CAPÍTULO 22 - Sarcoma de Partes Moles e GIST
401 22.1. Introdução
401 22.2.Conceitos diagnósticos
403 22.3. Estadiamento
404 22.4. Princípios técnicos em cirurgia de sarcomas de partes moles
404
22.4.1. Biópsias
404
22.4.2. Aspectos técnicos das operações em sarcomas de partes moles
405 22.5. Radioterapia Adjuvante
405 22.6. Tratamento Adjuvante Sistêmico
406 22.7. Tratamento da doença recorrente/metastática
407
22.7.1. Ressecção de Metástases
407 22.8. Sarcomas especiais
408 22.9. Tumor Estromal Gastrointestinal - GIST
408
22.9.1. Introdução
409
22.9.2. Tratamento cirúrgico
410
22.9.3. Tratamento Adjuvante
410
22.9.4. Doença Avançada
417 CAPÍTULO 23 - Melanoma e Câncer de Pele
419 23.1. Melanoma
419
23.1.1. Introdução
419
23.1.2. Considerações diagnósticas
419
23.1.3. Estadiamento
421
23.1.4. Cirurgia
422
23.1.5. Tratamento adjuvante
424
23.1.6. Doença Metastática
426 23.2. Carcinomas de Pele
426
23.2.1. Introdução
426
23.2.2. Carcinoma Baso Celular
427
23.2.3. Carcinoma Espino Celular
428
23.2.4. Carcinoma de Merkel
428
23.2.5. Tratamento adjuvante
429
23.2.6. Doença Metastática
435 CAPÍTULO 24 - Linfoma Não-Hodgkin
437 24.1. Introdução
437 24.2. Diagnóstico
438 24.3. Classificação dos Linfomas Não Hodgkin
439 24.4. Conceitos Gerais sobre o Estadiamento dos LNH
440 24.5. Linfomas Foliculares
440
24.5.1. Introdução
440
24.5.2. Diagnóstico
441
24.5.3. Estadiamento
442
24.5.4.Tratamento
444 24.6. Linfoma Não Hodgkin Difuso de Grandes Células B (LDGCB)
444
24.6.1. Introdução
444
24.6.2. Índice Prognóstico Internacional (IPI)
444
24.6.3. Tratamento
447 24.7. Linfomas da Zona Marginal
447 24.8. Linfomas MALT
448 24.9. Linfomas da Zona Marginal Não-MALT
448 24.10. Linfoma de Células do Manto
448
24.10.1. Introdução
449
24.10.2. Estadiamento
449
24.10.3. Fatores prognósticos
449
24.10.4. Abordagem terapêutica
450
24.10.5. Avaliação de resposta
450
24.10.6. Seguimento
450 24.11. Linfoma Primário do Sistema Nervoso Central
450
24.11.1. Introdução
451
24.11.2. Classificação
451
24.11.3. Diagnóstico e Estadiamento
452
24.11.4. Fatores Prognósticos
452
24.11.5. Tratamento
453 24.12. Linfomas T Periféricos
453
24.12.1. Classificação
453
24.12.2. Diagnóstico e Estadiamento
454
24.12.3. Fatores Prognósticos
454
24.12.4. Tratamento
457 24.13. Linfomas de Altíssimo Risco
457
24.13.1. Linfoma de Burkitt
459
24.13.2. Linfoma de Células B com características intermediárias entre
Linfoma de Grandes Células B e Linfoma de Burkitt
459
24.13.3. Linfoma Linfoblástico
465 CAPÍTULO 25 - Linfoma de Hodgkin
467 25.1. Introdução e Classificação
467 25.2. Avaliação inicial e estadiamento
467
25.2.1. Sintomatologia
468
25.2.2. Diagnóstico
468
25.2.3. Avaliação Inicial
468
25.2.4. Estadiamento Costwold para LH
469
25.2.5. Fatores prognósticos
470 25.3. Avaliação de resposta ao tratamento
472 25.4. Tratamento da doença inicial (Estádios I e II)
472
25.4.1. Linfoma de Hodgkin Clássico
473
25.4.2. Linfoma de Hodgkin Nodular com Predominância Linfocitária
474 25.5. Tratamento da doença avançada (Estádios III e IV)
476 25.6. Tratamento de crianças e adolescentes
476
25.6.1. Introdução
476
25.6.2.Tratamento da Doença inicial
476
25.6.3. Tratamento da doença avançada
477
25.6.4. Tratamento das recidivas
477
25.6.5. Recaída
477 25.7. Tratamento da doença recorrente ou Refratária
477
25.7.1. Introdução
478
25.7.2. Quimioterapia em Doses Convencionais no Tratamento das
Recidivas
478
25.7.3. Altas Doses de Quimioterapia e Transplante de Precursores
Hematopoéticos
479
25.7.4. Avaliação da Resposta Terapêutica com o PET-CT antes do TMO
479
25.7.5. Radioterapia Isolada como Forma de Resgate em Doença de
Hodgkin em Recidiva ou Refratária
479
25.7.6. Transplante Alogênico em Doença de Hodgkin Refratária
480 25.8. Tratamento do paciente HIV positivo
481 25.9. Seguimento pós-tratamento e complicações tardias
481
25.9.1. Rastreamento de recidiva
482
25.9.2. Rastreamento de complicações tardias do tratamento
487 CAPÍTULO 26 - Leucemia Mielóide Crônica
489 26.1. Conceito de LMC
489 26.2. Fases da LMC
489
26.2.1. Fase crônica
490
26.2.2. Fase Acelerada
490
26.2.3. Fase Blástica
490 26.3. Avaliação inicial do paciente com LMC
491
26.3.1. Critérios Prognósticos
492 26.4. Tratamento de primeira linha da fase crônica
492
26.4.1. Introdução
492
26.4.2. Tratamento de primeira linha
492
26.4.3. Monitorização do tratamento
494
26.4.4. Recomendações
495 26.5. Tratamento de segunda linha da fase crônica
495
26.5.1. Definição e abordagem do problema
496
26.5.2. Recomendações
496 26.6. Tratamento da fase acelerada
496
26.6.1. Introdução
497
26.6.2. Critérios para o diagnóstico de Fase acelerada
497
26.6.3.Tratamento de pacientes sem exposição prévia ao imatinibe
498
26.6.4. Recomendações
498
26.6.5. Tratamento de pacientes previamente expostos ao imatinibe
499 26.7. Leucemia Mielóide Crônica em crise blástica
499
26.7.1. Introdução
499
26.7.2. Diagnóstico
499
26.7.3. Tratamento
501
26.7.4. Transplante alogênico de célula tronco
501
26.7.5. Recomendações
501 26.8. Tratamento da LMC na infância e adolescência
501
26.8.1. Definição do problema
502
26.8.2. Recomendações
503 26.9. Papel do transplante alogênico na LMC
503
26.9.1. Introdução
504
26.9.2. Recomendações
509 CAPÍTULO 27 - Leucemia Linfática Crônica
511 27.1. Introdução e diagnóstico
511 27.2. Avaliação inicial do paciente
511
27.2.1. Procedimentos a serem realizados à suspeita diagnóstica de LLC
512
27.2.2. Exames para avaliação de prognóstico
512
27.2.3. Sistemas de estadiamento
512 27.3. Indicações de tratamento
513
27.3.1. Sintomas relacionados à LLC
513
27.3.2. Evidência de progressão de doença
514
27.3.3. Outras complicações relacionadas à LLC
514 27.4. Leucemia Linfocítica Crônica: tratamento de primeira linha
514
27.4.1. Tratamento do paciente com boas condições clínicas
515
27.4.2. Tratamento dos pacientes com anormalidade genética 17p-
515
27.4.3. Tratamento dos pacientes sem boas condições clínicas
516 27.5. Tratamento da doença recorrente ou refratária
518 27.6. Manejo das complicações clínicas
520 27.7. Transplante de Células Tronco Hematopoiéticas (TCTH)
527 CAPÍTULO 28 - Biomarcadores em oncologia
529 28.1. Tumores de mama
530
28.1.1. Testes não validados
530
28.1.2. Testes validados
531 28.2. Tumores de Pulmão
532 28.3. Tumores do Sistema Nervos Central
532
28.3.1. Deleção do cromossomo 1p±19q
533
28.3.2. Hipermetilação do promotor de O6-Metilguanina-DNA
metiltransferase (MGMT)
533
28.3.3. Outros biomarcadores em fase de validação
533 28.4. Tumores gastrointestinais
534
28.4.1. Biomarcadores Prognósticos
534
28.4.2. Biomarcadores preditivos de resposta
535
28.4.3. Biomarcadores preditivos de toxicidade
535
28.4.4. Potenciais biomarcadores
536 28.5. Tumores de câncer ginecológico
536
28.5.1. Câncer de endométrio
536
28.5.2. Câncer de ovário
538
28.5.3. Câncer de colo uterino
538 28.6. Tumores de cabeça e pescoço
538
28.6.1. Receptor do Fator de Crescimento Epidérmico (EGFR)
538
28.6.2. Infecção pelo papilomavírus humano (HPV)
539
28.6.3. p53
539 28.7. Biomarcadores em Sarcoma
539
28.7.1. Ki-67
539
28.7.2. ERCC1, ERCC5 e BRCA1
540
28.7.3. VEGFR e FGFR
540 28.8. Tumores em Melanoma
540
28.8.1. Hsp90
540
28.8.2. HER3
541
28.8.3. BRAF
541
28.8.4. KIT
541 28.9. Tumores genitourinários
541
28.9.1. Câncer de Próstata
542
28.9.2. Câncer Renal
543
28.9.3. Câncer de bexiga
543 28.10. Conclusão
549 CAPÍTULO 29 - Medicamentos de suporte
551 29.1. Bisfosfonatos e outros inibidores de osteólise
551
29.1.1. Uso clínico dos bisfosfonatos no tratamento de osteoporose
552
29.1.2. Uso clínico dos bisfosfonatos em metástases
553
29.1.3. Uso de bisfosfonatos no câncer de próstata
554
29.1.4. Uso de bisfosfonatos no câncer de mama
554
29.1.5. Uso de bisfosfonatos em tumores sólidos
554
29.1.6. Complicações com o uso de bisfosfonatos
555
29.1.7. Uso clínico do Denosumabe em metastases ósseas
556 29.2. Eritropoietina
556
28.2.1. Uso da eritropoetina
557
28.2.2. Efeitos colaterais relacionados ao uso da Eritropoetina
558 29.3. Fatores estimuladores de colônias de granulócitos (FEC)
558
29.3.1. Profilaxia Primária
559
29.3.2. Profilaxia Secundária
559
29.3.3. Uso Terapêutico
559
29.3.4. Dose e administração
565 CAPÍTULO 30 - Cuidados Paliativos
567 30.1. Introdução
568 30.2. Manejo dos Sintomas em Cuidados Paliativos
568
30.2.1. Dor oncológica
571
30.2.2. Síndrome Anorexia-Caquexia (SAC)
572
30.2.3. Náuseas e vômitos
575
30.2.4. Constipação Intestinal
577
30.2.5. Obstrução Intestinal Maligna
579
30.2.6. Dispneia
580 30.3. Transtornos Psiquiátricos em Pacientes Com Câncer
580
30.3.1. Transtornos do humor
582
30.3.2. Transtorno de ansiedade
584
30.3.3.Transtorno Mental Orgânico (Delirium)
584 30.4. Aspectos Psicológicos nos Cuidados Paliativos
585
30.4.1. O sofrimento do paciente
585
30.4.2. O sofrimento da família
586
30.4.3. Formas de intervenção
586 30.5. Conclusão
MANUAIS DE COND UTAS
Editorial
| 27
28 |
MA N UA I S D E CO N DUTAS
MANUAIS DE COND UTAS
| 29
Editorial
Caros Associados da SBOC e Congressistas do XVII Congresso Brasileiro de Oncologia Clínica,
Vocês estão recebendo o 2º. Manual de Condutas da SBOC. Após trabalho exaustivo e
brilhantemente conduzido pelo Editor Geral, Dr. Evanius Garcia Wiermann, onde 22 editores
confeccionaram em conjunto com aproximadamente 156 autores os 30 capítulos constantes nesse
Manual de Conduta.
Nessa 2ª. Edição procuramos uma melhor padronização da elaboração e confecção de cada
capítulo, com normatização das regras gerais. Foram realizadas discussões presenciais, assim como
à distância, até definição final e consensual do texto, além da disponibilização pela SBOC, para os
Editores, do Programa EndNote, a fim de facilitar a busca e organização das referências.
O produto final que lhes é entregue abrange grande parte do atendimento diário da
Oncologia Clínica de uma forma atualizada, concisa e sofisticada, lastreado e suportado pelos
profissionais da Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica.
Dedicamos esse trabalho aos pacientes que usufruirão desse material.
Agradeço imensamente a todos os autores, editores e ao Editor Chefe, Dr. Evanius, pela
dedicação e compromisso com a SBOC.
Agradeço também à Bibliotecária da SBOC, Paula Carolina de Freitas Palmeira, e à Designer
Gráfico Rachel Gomes Magalhães, pela organização, compilação e diagramação de todo o material.
Agradecemos aos Laboratórios AstraZeneca do Brasil LTDA, Novartis Biociências S.A, Produtos
Roche Químicos e Farmacêuticos S.A. e Laboratório Pfizer LTDA, pelo suporte logístico para a
realização desses Manuais.
Agradeço aos meus amigos pessoais Dr. Roberto Porto Fonseca (Presidente da SBC), Dr. Amândio
Soares Fernandes Junior (Tesoureiro da SBOC), Dr. Anderson Arantes Silvestrini (Presidente Eleito
da SBOC), Dra. Lúcia M. P. Freitas (Gerente Jurídica da SBOC) e Sra. Vanessa Renata Ribeiro Ambrósio
(Secretária da SBOC) pela ajuda, amizade, carinho e compreensão em todos os momentos dos
últimos dois anos em que tive a honra de ser, pela 2ª. vez, Presidente da SBOC.
Por fim, agradeço ao Dr. Sebastião Cabral Filho e a todos os funcionários, residentes e médicos
do Centro de Quimioterapia Antiblástica e Imunoterapia LTDA (CQAI) pela minha acolhida,
instrução, formação e apoio ao longo dos últimos 19 anos e ao Hospital Mater Dei, nas pessoas
dos Drs. José Salvador, Dra. Norma, Dra. Maria Norma, Dra. Márcia e Dr. Henrique pela confiança e
acolhida na nova fase de minha carreira.
Gramado-RS, 26 de outubro de 2011.
Enaldo Melo de Lima
Presidente SBOC
30 |
MA N UA I S D E CO N DUTAS
Editorial
A Oncologia atual provê uma quantidade imensa de informações e é neste cenário que o uso
de protocolos pode permitir que estas sejam otimizadas, ajudando nas tomadas de decisão e
uniformizando condutas.
Em 2007, a Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica editou o Manual de Condutas da SBOC,
que foi um marco para a instituição e disponibilizou à classe médica nacional mais uma fonte de
consulta para atualização na especialidade.
Agora, em 2011, uma nova edição deste Manual foi preparada, ampliada com a inclusão de
novos temas relevantes à prática diária, e atualizada com as mais recentes referências para permitir
uma consulta segura e embasada em evidência científica de peso.
Foram escolhidos editores que sabidamente são expoentes em suas áreas de atuação e com
experiência mais que suficiente para que pudessem agregar valor inestimável a esta edição. Foi
um prazer trabalhar com todos eles.
Finalizando, este Manual não seria publicado sem o esforço sem precedentes do presidente da
SBOC, o Dr. Enaldo Melo de Lima e à dedicação de sua equipe de apoio na sede, incluindo a Srª Andrea
e a Srª Paula, bem como de todos os editores e autores associados. Além disto, não posso deixar
de lembrar o suporte e a paciência de minha família, a Ana Luiza e minhas filhas, sem os quais não
poderia executar esta função.
Uma boa leitura a todos,
Dr. Evanius Garcia Wiermann
Editor-chefe do Manual de Condutas SBOC 2011
MANUAIS DE COND UTAS
| 31
Capítulo 1
Câncer de Mama Inicial
Editor: Dr. Gilberto Luiz da Silva Amorim
Autores: Dr. Antônio Carlos Buzaid, Dr. Artur Katz, Dr. Bruno Lemos Ferrari, Dr. Carlos Sampaio, Dr.
Daniel Luiz Gimenes, Dr. Jacques Bines, Dra. Leticia Carvalho Neuenschwander, Dra. Maria de Fátima
Dias Gaui, Dra. Rute Dolores Raposo da Câmara
32 |
MA N UA I S D E CO N DUTAS
MANUAIS DE COND UTAS
| 33
Capítulo 1
Câncer de Mama Inicial
Introdução
O câncer de mama é a neoplasia mais frequente em mulheres no Brasil com 49.240 casos
esperados para 2010 e um risco relativo estimado em 49/100.000 mulheres, variando de 17/100.000
na região norte a 63/100.000 na região sul. Paralelamente, é a principal causa de óbitos por câncer
em mulheres no nosso país com uma taxa de mortalidade em clara ascensão contrariando a
tendência de diminuição progressiva que evidenciamos na última década em países desenvolvidos.
Nos EUA, mais recentemente (a partir de 2003) observou-se uma redução da incidência da ordem
de 7% atribuída entre outros fatores a redução da prescrição de reposição hormonal para mulheres
na pós-menopausa. Existem variações importantes no manejo das pacientes com câncer de mama
em diferentes regiões do Brasil. O desenvolvimento de diretrizes pode resultar em melhoria da
assistência oferecida.
Este documento é exclusivamente dirigido ao médico responsável pelo cuidado e aconselhamento de pacientes com um diagnóstico de câncer de mama. Mesmo com suas limitações,
pretendemos refletir um amplo consenso das diferentes alternativas de conduta aceitáveis de
acordo com as evidências científicas existentes. Reconhecemos que o manejo do câncer de mama
inicial é necessariamente multidisciplinar e que não existe processo ideal que possa estabelecer um
consenso definitivo ou que seja capaz de abranger a totalidade das informações existentes.
Por uma questão meramente prática o conteúdo deste documento será dividido nos
seguintes temas:
1. Considerações Gerais Relativas ao Tratamento Adjuvante
2. Conteúdo Mínimo do Relatório Anátomo-patológico
3. Avaliação Prognóstica e Preditiva
4. Considerações Terapêuticas
a. Pacientes de Baixo Risco
b. Pacientes de Alto Risco
c. Pacientes de Risco Intermediário
5. Considerações Relativas a Hormonioterapia
6. Considerações Relativas a Quimioterapia
7. Considerações Relativas a Tratamento com Drogas Biológicas
8. Rotina de Acompanhamento após o Tratamento Adjuvante
9. Situações Especiais: Câncer de Mama na Gravidez e em Homens
10. Considerações sobre o Tratamento Neoadjuvante
11. Apêndice 1: Estadiamento
12. Apêndice 2: Esquemas de tratamento mais utilizados
1.1. Considerações Gerais relativas ao Tratamento Adjuvante
A abordagem adjuvante tem por objetivo o tratamento de doença oculta, tratamento de
micro-metástases, visando assim à redução do risco de recidiva da doença e aumento da sobrevida
global. As recomendações terapêuticas adjuvantes têm sido baseadas, em estimativas de risco,
34 |
MA N UA I S D E CO N DUTAS
uma vez que não existe na prática, tecnologia diagnóstica que possa definir com precisão quais as
são as pacientes com câncer de mama inicial que apresentam doença subclínica. Fatores de risco
são fundamentados na valorização de algumas características clínicas, patológicas e biológicas do
tumor, particularmente tamanho e grau do tumor, status linfonodal, expressão de receptores
hormonais e da proteína cerbB2.
Estudos científicos controlados demonstram que o tratamento sistêmico adjuvante pode
reduzir o risco de recorrência da doença nos primeiros 5 anos, resultando numa redução
substancial nas taxas de mortalidade em 15 anos de acompanhamento. Evidências recentemente
apresentadas na literatura indicam claramente que apesar das diferenças relativas à recorrência
da doença permanecerem estáveis após os primeiros 5 anos de acompanhamento (entre as
mulheres tratadas vs. não tratadas), as diferenças de sobrevida continuam a aumentar ao longo dos
primeiros 15 anos de acompanhamento. Isto provavelmente reflete a eficácia do tratamento
adjuvante que é curativo numa percentagem das pacientes ao prevenir recorrências nos primeiros
5 anos depois do diagnóstico.
1.2. Conteúdo Mínimo do relatório Anátomo-patológico
e Imunohistoquímica
A seguir salientamos as informações mínimas que devem constar no relatório anátomopatológico:
• Dados de Identificação
• Data da cirurgia
• Descrição (macroscópica) do espécime cirúrgico com mensuração
• Tamanho do tumor invasivo (apenas o componente de carcinoma invasivo é levado em conta
para a tomada de decisão relativa à instituição de terapia adjuvante)
• Avaliação de margens
• Classificação Histológica
• Grau Histológico/Nuclear (segundo a classificação de Nottingham)
• Invasão Angiolinfática
• Ki-67 (em percentual)
• Linfonodo sentinela (se realizado)
• Número de linfonodos totais divididos por níveis
• Número de linfonodos comprometidos (especialmente no caso de linfonodo sentinela, a
descrição do diâmetro da lesão: células tumorais isoladas versus micro-metástases versus macrometástases e, sobretudo, quando for o caso, da presença de extravasamento capsular)
• Receptores de Estrógeno e de Progesterona (expressão em % ou Escore tipo Alred)
• Receptor cerbB2 ou HER2
Nota: incluir lateralidade da mama, topografia do tumor, indicar os anticorpos usados,
inclusive clones, indicar controles internos e externos das reações imunoistoquímicas, tipo de
fixação e tempo de fixação.
Deve ser realizada determinação por imunoistoquímica da expressão de receptores
hormonais (estrógeno e progesterona) assim como de HER2 no momento do diagnóstico inicial em
pacientes portadoras de carcinoma de mama invasor. É importante destacar que a experiência do
laboratório que realiza a avaliação dos receptores é crítica na valorização dos resultados. Embora
não exista um padrão definido no Brasil, em 2010, a ASCO estabeleceu, junto com o Colégio
Americano de Patologia, diretrizes bem detalhadas sobre esta análise, e na ausência de um padrão
brasileiro a SBOC sugere que sejam adotadas estas diretrizes pelos laboratórios nacionais.
MANUAIS DE COND UTAS
| 35
Laboratórios que realizam testes com pouca frequência apresentam resultados discrepantes numa
percentagem expressiva dos casos quando comparados a um laboratório de referência.
Recentemente tem sido recomendado que os resultados de imunohistoquímica sejam valorizados
somente quando determinados em laboratórios com um volume adequado (>250 testes ao ano)
e com procedimentos de controle de qualidade. Em relação aos receptores hormonais, e para fins
de tratamento, são consideradas portadoras de tumores hormônio sensíveis aquelas pacientes
cuja neoplasia apresente expressão do receptor hormonal (estrógeno e/ou progesterona). O limiar
específico é tema de debate, mas algum grau de resposta hormonal permanece mesmo com
expressão em 1% das células tumorais ainda que se reconheça que a magnitude do benefício seja
tanto maior quanto mais intensa for a expressão do receptor. E este limiar de 1% que é considerado
pela ASCO/CAP nesta revisão de 2010.
Reconhecemos duas formas de mensurar HER2: (1) a imunoistoquímica, que avalia o receptor
de acordo com a intensidade da expressão e pelo número de células que o expressam e, sendo
considerado positivo quando a coloração é forte e atinge 30% ou mais de células avaliadas segundo
o último consenso da ASCO/CAP; (2) FISH (fluorescent in situ hybridization) que avalia o número de
cópias (amplificação) do gene. São consideradas como positivas para HER2 aquelas pacientes que
apresentam uma expressão de 3+ na imunohistoquímica ou que são FISH positivas com razão
superior a 2,2. As pacientes com expressão de HER2 0 ou 1+ são consideradas negativas enquanto
que as HER2 2+ pela imunohistoquímica devem ser submetidas ao teste de FISH já que entre 20 a
25% delas podem apresentar amplificação gênica.
1.3. Avaliação Prognóstica e Preditiva
As recomendações para tratamento adjuvante sistêmico estão baseadas na estimativa do
risco de recidiva. Tradicionalmente são reconhecidas categorias de risco definidas de acordo com
diversos fatores. Os elementos básicos que devem ser utilizados para caracterizar o risco de recidiva
são: comprometimento de linfonodos axilares (positivos vs negativos), número de linfonodos
comprometidos, tipo histológico (carcinoma ductal invasor ou lobular invasor vs tipos histológicos
especiais), tamanho do tumor primário, grau histológico, invasão vascular peri-tumoral extensa
(presente vs ausente), expressão de receptores hormonais (positivos ou negativos), expressão ou
amplificação de receptores HER2, e a idade da paciente. O índice de proliferação Ki-67 vem
ganhando importância. Entretanto, não há ainda um consenso quanto ao emprego do mesmo
como fator de decisão da indicação de tratamento adjuvante. Existem problemas na padronização
do teste e na definição do seu ponto de corte. Recentemente, em St. Gallen, o painel de
especialistas considerou que Ki67 >14% seria considerado elevado, mas há divergências na
literatura.
São consideradas como tipos histológicos especiais: carcinoma tubular, mucinoso (colóide),
cribiforme, adenóide cístico e papilífero. A confirmação da presença de uma histologia especial
por um patologista com experiência em patologia mamária deve ser estimulada. Em casos de
tumores com histologia especial, recomendamos tratamento adjuvante somente quando os
tumores apresentam tamanhos maiores do que 3cm ou linfonodos axilares comprometidos.
Tumores com histologia ductal invasora e áreas de histologia especial (tumores mistos) devem ser
graduados e manejados de acordo com as recomendações para tumores ductais. Nos medulares
atípicos, mesmo sem informações prospectivas, recomenda-se a mesma abordagem adjuvante
dos carcinomas ductais invasores.
A idade é um fator de prognóstico independente com um risco relativo que varia de 1,5 a 1,8
para as categorias de idade entre 35 a 40 quando comparadas com pacientes com mais de 40 anos
de idade.
36 |
MA N UA I S D E CO N DUTAS
A presença de expressão aumentada (imunoistoquímica 3+ ou FISH positivo) do receptor
HER2, presente em aproximadamente 20-25% de todas as pacientes com câncer de mama,
identifica uma população com um risco expressivo de recidiva precoce da doença. O programa
Adjuvant! On Line atualizou a avaliação do risco relacionado ao HER2 aumentando em 50% o risco
básico de cada caso com hiper-expressão do receptor (www.adjuvantonline.com). É importante
destacar que a amplificação de HER2 é frequentemente encontrada em carcinoma ductal in situ
(CDIS). Nestas situações, a valorização deste achado é de valor questionável e não deve interferir
na seleção terapêutica.
Utilizando estes elementos, recomendamos caracterizar o risco de recidiva das pacientes com
câncer de mama de acordo com a Tabela 1.
Tabela 1 - Diretrizes SBOC para CM Inicial: Definições de Categorias de risco para recidiva
Categoria de risco
Baixo risco *
Linfonodo negativo e todos os seguintes critérios:
ü pT ≤2 cm,
ü Grau 1,
ü Ausência de extensa invasão vascular e peritumoral
ü RE e/ou RPg positivos
ü HER2 negativo
ü Idade ≥35 anos
Risco intermediário
Linfonodo negativo e pelo menos um dos seguintes critérios:
ü pT >2 cm, ou
ü Grau 2-3, ou
ü Presença de extensa invasão vascular e peri-tumoral Ω , ou
ü RE e RPg ausentes, ou
ü HER2/neu gene superexpresso ou amplificado, ou
ü Idade <35 anos
Linfonodo positivo (1 a 3 LN) e todos os seguintes critérios:
ü RE e RPg positivos,
ü HER2/neu gene negative
Alto risco
Linfonodo positivo (1-3 LN) e pelo menos um dos seguintes
critérios:
ü RE and RPg ausente, ou
ü HER2/neu gene super expresso ou amplificado
Linfonodo positivo (4 ou mais envolvidos)
* Subtipos histológicos especiais também são considerados de Baixo Risco, desde que o diâmetro tumoral não exceda 3cm
e não exista comprometimento de linfonodos axilares. Ω Êmbolos neoplásicos vistos em dois ou mais blocos de tumor.
(Adaptado de acordo com a classificação de risco do Consenso de St. Gallen, 2007).
Devido às inúmeras variáveis de risco existentes e suas diferentes combinações, calcular o
risco individual de uma paciente se torna uma tarefa imprecisa. Inúmeros modelos matemáticos
foram desenvolvidos, utilizando as características acima mencionadas, aplicadas a uma base de
dados com acompanhamento prolongado de pacientes. O Adjuvant! On Line, disponibilizado na
internet é um exemplo destes programas, de grande auxilio para estimarmos o risco de recidiva de
MANUAIS DE COND UTAS
| 37
cada caso com e sem tratamento adjuvante. Seu emprego rotineiro deve ser estimulado para a
avaliação da melhor orientação terapêutica adjuvante.
O Oncotype DX®, teste que analisa 21 genes em material parafinado é um dos poucos testes
disponíveis que avalia o risco de pacientes com axila negativa (ou 1-3 linfonodos positivos) e RH
positivos. Pacientes com escore alto (>31) tem >30% de chance de recorrência, beneficiando-se de
quimioterapia, enquanto aquelas de escore baixo (<18) têm apenas 7% de chance, podendo
receber apenas hormonioterapia (www.genomichealth.com). O Mammaprint® é outro teste
disponível. Tanto o MammaPrint como o Oncotype DX necessitam de validação prospectiva, mas
acredita-se que a individualização molecular dos tumores seja uma ferramenta promissora na
avaliação de risco e na decisão do tratamento. Dois importantes estudos são aguardados para
avaliação prospectiva destes testes. O MINDACT (Microarray in Node-Negative Disease May Avoid
Chemotherapy) e o TAILORx (Trial Assigning Individualized Options for Treatment).
1.4. recomendações Terapêuticas
Três fatores devem ser levados em conta na decisão de se instituir tratamento sistêmico
adjuvante: 1) responsividade endócrina (através da análise dos receptores de estrógeno e
progesterona); 2) Hiperexpressão de HER2; 3) Risco de recidiva. Tumores que expressam receptores
de estrógeno e ou progesterona são considerados endócrino sensíveis. Ao contrário, tumores nos
quais não há expressão destes receptores são considerados não-responsivos. Alguns fatores como
a baixa expressão de receptores de estrógeno e/ou progesterona, ausência de expressão de
receptor de progesterona e superexpressão de HER2, são indicativos de resposta endócrina
incompleta. Tumores altamente endócrino-responsivos devem ser considerados para
endocrinoterapia ou combinação de quimioterapia e endocrinoterapia. Para os tumores nos quais
a responsividade à endocrinoterapia é incompleta, deve-se considerar quimioterapia e
endocrinoterapia. Pacientes que são claramente endócrino-resistentes devem ser considerados
para quimioterapia e não devem receber endocrinoterapia adjuvante. Do mesmo modo, pacientes
que superexpressam HER2, devem ser considerados para terapia anti-HER2 que será discutida
adiante. Em relação ao risco de recidiva, dividiremos a discussão pelas categorias de risco, conforme
a Tabela 1.
1.4.1. Pacientes de Baixo risco
Para qualificar uma paciente de Baixo Risco, devemos lembrar que todas as características
mencionadas na Tabela 1 devem estar presentes. A decisão de oferecer ou não tratamento
adjuvante nestas situações deve levar em consideração que estas pacientes apresentam o bom
prognóstico inerente a este grupo em termos de recorrência da doença e de sobrevida global e
também a responsividade à terapia endócrina. Certamente existe entre elas uma percentagem
significativa de pacientes que já estão curadas somente com o tratamento local (cirurgia associada
à radioterapia/radioterapia). A mortalidade por câncer nesta população é estimada em torno de 35% de acordo com o programa Adjuvant! On Line. O melhor manejo destas pacientes passa por
uma discussão aberta entre médico e paciente, levando em consideração os riscos e benefícios
potenciais associados a qualquer tratamento proposto. Estas pacientes poderão ser acompanhadas
sem tratamento ou uma recomendação de tratamento hormonal poderá ser considerada em casos
particulares.
1.4.2. Pacientes de risco Intermediário
As pacientes com risco intermediário representam um desafio particular. É importante
destacar que nossa capacidade de discriminar o risco potencial destas pacientes apresenta maiores
38 |
MA N UA I S D E CO N DUTAS
limitações do que nas outras duas categorias. Como discutido nas pacientes de Baixo Risco é muito
importante uma discussão aberta e informativa entre médico e paciente para fazer a melhor
recomendação para um caso em particular. É neste grupo de pacientes onde vivenciamos mais
claramente a frustração de não podermos definir com precisão quais as pacientes que tem doença
micro-metastática e necessitam de tratamento daquelas que já estão curadas com o tratamento
local. Pacientes com tumores com responsividade intermediária à endocrinoterapia são candidatos
a quimioterapia e endocrinoterapia. Já pacientes portadores de tumores resistentes à
endocrinoterapia são candidatos à quimioterapia. Neste grupo, as pacientes com acesso aos testes
genômicos (Oncotype DX, p.ex.) podem se beneficiar sobremaneira, pois se o escore de recorrência
for compatível com baixo risco (<18) a paciente poderá receber apenas tratamento endócrino.
Evidente que se o escore for alto (>31) a indicação de quimioterapia seguida de endocrinoterapia
deve ser preferencial. Ressaltamos que várias pacientes, mesmo após este teste de alto custo,
continuarão com escores intermediários, precisando de decisão individualizada, embora os dados
atuais sugiram ausência de benefício com o tratamento quimioterápico. Estudos randomizados
que visam responder qual o papel da quimioterapia neste subgrupo de pacientes estão em
andamento.
Outro desafio deste grupo é a definição do tratamento adjuvante para as pacientes com até
3 linfonodos microscopicamente positivos, receptores fortemente positivos e HER2 negativo. Em
caso de baixo RS pelo Oncotype DX, poderemos abrir mão da quimioterapia, mas esta não é uma
opinião unânime entre os especialistas, já que muitos nem solicitam o teste neste subgrupo e a
realidade é que a grande maioria não terá acesso ao teste. Existe um grupo destas pacientes onde
o benefício da quimioterapia será pequeno e a análise individualizada entre o oncologista e sua
paciente será decisiva para a melhor escolha terapêutica.
1.4.3. Pacientes de Alto risco
A maior parte das pacientes de alto risco deverá receber quimioterapia como parte do seu
tratamento adjuvante. Aquelas pacientes de alto risco com receptores hormonais positivos que
recebem quimioterapia devem também ser tratadas com hormonioterapia.
Opções terapêuticas:
Tabela 2 - Escolha da modalidade de tratamento de acordo com o grupo de risco
Altamente Hormônio-sensível
Não hormônio sensível
Baixo risco
HT
NA
Alto risco
QT→HT
QT
HT, hormonioterapia; QT, quimioterapia; NA: Não se aplica
OBS: Deve se evitar o início do tamoxifeno concomitante à quimioterapia, não há evidências na literatura quanto a este
cuidado em relação aos inibidores de aromatase, mas também deve ser iniciado após QT.
1.5. Considerações relativas à Hormonioterapia
Tradicionalmente, durante os últimos 30 anos, o tratamento hormonal das mulheres com
tumores com expressão de receptores hormonais tem sido baseado no tamoxifeno e na
ooforectomia. Quando indicada, a administração de tamoxifeno resulta numa redução do risco de
morte por câncer de mama na ordem de 31%. Estes resultados são independentes do uso de
MANUAIS DE COND UTAS
| 39
quimioterapia e da idade da paciente. O tratamento por 5 anos oferece melhores resultados do
que 1 ou 2 anos. É importante lembrar que o benefício em sobrevida observado após 5 anos de
tamoxifeno extende-se após a interrupção do tratamento, sendo maior aos 15 anos de acompanhamento do que 5 anos depois do diagnóstico.
O tamoxifeno é uma droga muito bem tolerada. Trombo-embolismo, doença cerebrovascular
e carcinoma de endométrio têm sido raramente associados ao seu uso. Informações geradas por
grandes estudos randomizados indicam que, em mulheres pós-menopáusicas, a administração de
inibidores de aromatase resulta num maior intervalo livre de doença quando comparado ao uso de
tamoxifeno. Este achado tem sido demonstrado de forma reproduzível e consistente. Embora as
diferenças absolutas sejam estatisticamente significativas, elas são numericamente na ordem de 3
a 4% o que significa que existe uma percentagem importante das pacientes que ainda se beneficia do
tamoxifeno. Também observamos que ainda não existem nestes estudos de uso precoce dos
inibidores da aromatase, diferenças estatisticamente significativas na sobrevida das pacientes, quando
da comparação direta entre o uso de tamoxifeno e dos inibidores de aromatase. Até o momento,
os fatores preditivos que possam identificar quais as pacientes que se beneficiam mais dos
inibidores seriam tu >2cm, alto grau, HER2 superexpresso, invasão peri-tumoral vascular e axila
positiva com mais de 4 gânglios, mas outros estudos são necessários. Ao mesmo tempo, os inibidores
de aromatase representam uma ótima alternativa para pacientes com uma contra-indicação
absoluta ou relativa ao uso de tamoxifeno. Devemos ter particular atenção ao uso concomitante de
antidepressivos em vigência de tamoxifeno, pois como sabemos, existem interferências no metabolismo
do tamoxifeno com diminuição da disponibilidade do metabólito ativo endoxifeno em especial
com fluoxetina, paroxetina, sertralina, o que comprometeria a eficácia do tamoxifeno. A venlafaxina
e outros da classe poderiam ser utilizados. Importante ressaltar que ao longo da adjuvância outros
médicos (clínicos, geriatras, psiquiatras, neurologistas, cardiologistas, ginecologistas e endocrinologistas)
podem recomendar algum antidepressivo, o que obriga o oncologista durante o seguimento
assegurar-se de que nenhum destes medicamentos foram introduzidos posteriormente.
A administração de um inibidor de aromatase pode ser feita desde o início do tratamento por
5 anos (anastrozol ou letrozol, mais recentemente também o exemestano – TEAM e MA-27), após
2 a 3 anos de tamoxifeno até completar 5 anos de tratamento (letrozol, exemestane ou anastrozol).
A atualização do estudo BIG 1-98 (letrozol versus tamoxifeno seguido de letrozol ou letrozol seguido
de tamoxifeno) nos ofereceu uma outra alternativa que é a de iniciar letrozol e substituir por
tamoxifeno, o que pode ser particularmente útil para aquelas pacientes que apresentam efeitos
colaterais com o inibidor de aromatase, sendo difícil manter o uso do mesmo por 5 anos. Na
adjuvância extendida utilizamos por 5 anos em pacientes que completaram 5 anos de tamoxifeno
(letrozol ou anastrozol). Nesta última situação, foi identificada uma vantagem na sobrevida do
subgrupo de pacientes com gânglios comprometidos tratadas com o letrozol.
Não existem informações na literatura que justifiquem a administração adjuvante de
inibidores de aromatase em pacientes pré-menopáusicas, mesmo após bloqueio ovariano. Estudos
em andamento estão explorando a utilização destes agentes nesta população em combinação
com bloqueio da função ovariana. O estudo austríaco ABCSG-12 avaliou se o anastrozol em adição
a supressão ovariana com gosserrelina seria superior ao tamoxifeno mais gosserelina, ambos pelo
período de 3 anos. Após seguimento de 47.8 meses, o anastrozol não foi superior ao tamoxifeno.
O padrão de toxicidade apresentado pelos diferentes inibidores de aromatase é consistente e
parece ser mais favorável do que o do tamoxifeno com exceção para a incidência aumentada de
queixas músculo-esqueléticas e de um risco aumentado de fraturas. Em pacientes que apresentem
efeitos adversos músculoesqueléticos severos, a troca por outro inibidor/inativador de aromatase
resulta em benefício sintomático em até 50% dos casos. Podemos ainda trocar para o tamoxifeno,
pois considerando o risco que muitas pacientes ficam expostas é muito melhor manter algum
tratamento endócrino do que simplesmente parar de utilizar o inibidor.
40 |
MA N UA I S D E CO N DUTAS
É importante considerar a necessidade de acompanhar as consequências potenciais da
inibição estrogênica extrema que ocorre com a utilização destes agentes. É recomendado o
acompanhamento anual da densidade mineral óssea neste grupo de pacientes, além do estímulo
a atividade física e aumento da reposição de cálcio e vitamina D. Usar bisfosfonatos orais nas
pacientes que apresentem osteopenia (notadamente se T<-2,0) ou osteoporose. Uma alternativa
a esta estratégia é o uso semestral de ácido zoledrônico. As comparações diretas na literatura não
indicam de forma definitiva que um inibidor seja superior a outro, mas existem efeitos colaterais
algo diferentes. A recuperação da função ovariana tardia pós quimioterapia é frequente,
notadamente em pacientes com menos de 50 anos, e em muitos casos pode demorar até mais de
1 ano. Isto posto, muita atenção na prescrição de inibidores da aromatase para estas pacientes,
pois uma dosagem isolada de níveis séricos do estradiol e do FSH com níveis compatíveis com
menopausa não é suficiente para caracterizar a menopausa definitiva. Estas pacientes devem seguir
com tamoxifeno e a troca pode ser avaliada depois, p.ex: após 2 anos.
Quando da indicação de hormonioterapia e quimioterapia numa paciente, o tratamento deve
ser feito de forma sequencial (quimioterapia seguida de hormonioterapia) e não concomitante.29
Há indicações de que quando da combinação de quimioterapia (CAF) e tamoxifeno a administração
concomitante resultou num pior resultado de sobrevida livre de doença.
A concomitância do tratamento com tamoxifeno e radioterapia tem sido motivo de debate.
Algumas informações retrospectivas sugerem aumento da toxicidade pulmonar (fibrose), aumento
de fibrose mamária e edema quando da utilização simultânea das duas modalidades. Outras
publicações indicam que tamoxifeno pode ser administrado tanto simultaneamente quanto após
a radioterapia sem diferenças importantes em relação tanto à eficácia quanto à toxicidade. Ainda
mais, a maioria dos estudos para avaliação do tamoxifeno adjuvante iniciou a droga durante a
administração da radioterapia. Em definitivo, a prática de iniciar o tamoxifeno e manter sua
administração durante a radioterapia pode ser considerada uma prática aceitável.
1.5.1. Supressão da Função Ovariana em Mulheres Pré-menopáusicas
A supressão da função ovariana (cirúrgica, radioterápica ou com análogos de LHRH) reduz a
mortalidade por câncer de mama, mas parece fazê-lo somente quando não consideramos a
administração de outros tratamentos sistêmicos adjuvantes não-hormonais. A duração do
tratamento de supressão ovariana quando se opta por administrar um análogo de LHRH não está
definida. Os diferentes estudos administram o tratamento por períodos que variam de 2 a 5 anos.
Uma análise da literatura revela limitações de conhecimento muito importantes nesta área.
Diversos estudos sugerem equivalência entre a terapêutica hormonal baseada em ablação ovariana
(associada ou não ao tamoxifeno) e a administração de tratamento quimioterápico. Entretanto,
muitos destes estudos utilizaram esquemas quimioterápicos que não são considerados ideais de
acordo com os padrões atuais. Nos estudos que utilizaram um regime quimioterápico com base em
antracíclicos, os resultados não foram definitivos e não foi incluído um braço com a associação de
quimioterapia seguida de tamoxifeno, uma opção considerada com frequência na prática atual.
Nenhum dos estudos de supressão ovariana incluiu esquemas terapêuticos com taxanos. O melhor
manejo hormonal de pacientes pré-menopáusicas permanece indefinido.
O Estudo austríaco (ABCSG12) publicado mostrou sobrevida livre de doença muito elevada em
pacientes que não receberam quimioterapia, recebendo análogo, tamoxifeno ou anastrozol e ácido
zoledrônico semestral em caráter adjuvante por 3 anos. Houve uma redução de 36% nas recidivas
para as pacientes que receberam o bisfosfonato, mas o estudo recebeu críticas, pois este não seria
o padrão ideal de tratamento para esta população com câncer de mama, já que muitas pacientes
tinham linfonodos positivos. O seguimento tardio do estudo, apresentado na ASCO 2011, já com
72 meses, mostra que os benefícios da adição do ácido zoledrônico permanecem. Não houve
vantagem do inibidor sobre o tamoxifeno. como já dissemos, mas no evento de San Antonio (2010)
MANUAIS DE COND UTAS
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em que o seguimento do estudo austríaco foi apresentado o estudo AZURE foi reportado e seus
resultados são diametralmente opostos. É possível que o valor do ácido zoledrônico se restrinja as
mulheres com baixo nível de estradiol com sugere a análise de subgrupo do estudo AZURE em
que as mulheres que estavam em menopausa por pelo menos 5 anos se beneficiaram da medicação.
Não obstante a controvérsia sobre a adição de bisfosfonato adjuvante está longe de terminar. Em
pacientes pré-menopáusicas com indicação de quimioterapia, que não podem ou não queiram
receber este tratamento, a estratégia austríaca (ABCSG 12) pode ser considerada.
Uma outra questão ainda em aberto é qual a melhor conduta nas pacientes pré-menopáusicas
que permanecem menstruando ou que recuperam a menstruação após completar o tratamento
quimioterápico adjuvante, apesar do tratamento com tamoxifeno. Ainda que reconheçamos que
parte do beneficio do tratamento quimioterápico possa derivar da interrupção da função ovariana,
as informações atualmente disponíveis não permitem recomendar o emprego rotineiro da ablação
ovariana nestas situações. É possível que pacientes muito jovens (<35-40 anos) e de alto risco
(linfonodos positivos, tumores localmente avançados) possam beneficiar-se desta opção. Análises
retrospectivas das mulheres com menos de 35 anos que participaram em estudos de vários grupos
cooperativos sugerem que somente a quimioterapia adjuvante seguida de tamoxifeno possa ser
tratamento insuficiente. Ensaios prospectivos e randomizados atualmente em andamento
pretendem responder esta questão. Considerações dos riscos associados ao induzir uma
menopausa precoce nestas pacientes devem ser cuidadosamente avaliadas. É fundamental levar
em conta as expectativas de cada uma em relação a sua doença, o que certamente é influenciado
na maioria das vezes pela discussão com o médico.
Tabela 3 - recomendações de hormonioterapia adjuvante em tumores hormoniosensíveis
Status menopausal
Pré-menopausa
Pós-menopausa
Baixo risco
TMX por 5 anos
TMX por 5 anos
TMX 2-3anos → IA 3-2anos
TMX 5anos → IA 5anos
Alto risco
TMX com ou sem SO*
IA 5an ou TMX 2-3an→IA 3-2an
IA 3-2an→ TMX 2-3an
TMX, tamoxifeno; IA, inibidores de aromatase (Anastrozol, Letrozol e Exemestano); SO, supressão ovariana (cirúrgica, actínica
ou com o uso de gosserrelina).
* Não houve consenso na inclusão de supressão ovariana entre os autores neste cenário
1.6. Considerações relativas à Quimioterapia
Não existe um regime quimioterápico ideal que possa ser considerado adequado para todas
as pacientes com câncer de mama. Entretanto, dois princípios gerais aplicáveis à quimioterapia
devem ser levados em conta em todos os casos: o tratamento, quando indicado, deverá ser
administrado em doses completas e dentro dos intervalos recomendados para cada regime. A
administração e o manejo das complicações decorrentes do tratamento adjuvante requerem um
acompanhamento por um profissional adequadamente treinado e com experiência em oncologia
clínica. Com relação ao início do tratamento após a cirurgia, embora não tenha sido definitivamente
determinado com base em informações prospectivas, é recomendável iniciar o tratamento
quimioterápico adjuvante assim que a paciente esteja recuperada do procedimento cirúrgico.
42 |
MA N UA I S D E CO N DUTAS
Informações disponíveis na literatura indicam que regimes de combinação incluindo um
antracíclico (doxorrubicina ou epirrubicina) administrados em doses adequadas por pelo menos 6
ciclos de tratamento (FAC, FEC100, CAF) reduzem a taxa anual de mortalidade em 38% nas
mulheres com menos de 50 anos e em cerca de 20% nas mulheres entre 50 e 69 anos. Este resultado
é independente do uso de tamoxifeno, da positividade dos receptores hormonais, do
comprometimento ganglionar ou de outras características tumorais. Em termos de redução de
recorrência ou mortalidade, estes regimes são significativamente mais eficazes do que a
combinação de ciclofosfamida, metotrexato e 5-fluorouracil (CMF) quando administrada por 6
ciclos. O tratamento com 4 ciclos da combinação de um antracíclico e ciclofosfamida (AC ou EC) é
equivalente a 6 ciclos de CMF. A incorporação de taxanos (AC-D, AC-P (dose densa ou não), FEC100D, TAC, AC-P semanal x12, FEC90-Px8) a regimes com antracíclicos em pacientes com linfonodos
comprometidos e em pacientes com axila negativa de alto risco tem demonstrado vantagens
pequenas, mas consistentes em relação à sobrevida livre de doença e, em alguns estudos, também
à sobrevida global. Um estudo randomizado com 36 meses de acompanhamento demonstrou que
a administração mais intensa da quimioterapia (intervalo de duas semanas) denominado de dose
densa, resultou em vantagem na sobrevida livre de doença e sobrevida global quando comparado
ao esquema tradicional repetido a cada três semanas, notadamente no subgrupo de pacientes
receptores negativos. Este regime de tratamento requer a utilização de suporte com fatores
hematopoiéticos. O estudo que comparou 4 ciclos de AC com 4 ciclos de TC, no qual 48% dos
pacientes eram axila negativa, teve recente atualização. O esquema TC apresentava menor risco de
recorrência em 6 anos (85 vs 79%) e de morte (SG 85 vs 79%). Outros estudos também oferecem
taxanes para pacientes com axila negativa, como, por exemplo, o estudo TAC x FAC do grupo
Espanhol GEICAM (exclusivamente axila negativa neste estudo) e o estudo que avaliou as 4
possibilidades de uso de taxane (docetaxel ou paclitaxel a cada 21 dias ou semanal) após 4 ciclos
de AC (ECOG 1199). Neste estudo, pacientes eram elegíveis com axila positiva ou axila negativa de
alto risco (tumores de pelo menos 1cm com RH negativos ou 2cm com RH+). Os melhores braços
deste estudo foram o de paclitaxel semanal ou docetaxel a cada 3 semanas. É importante lembrar
que o comprometimento axilar não é um critério absoluto para avaliação de risco e que devemos
reconhecer que algumas pacientes com linfonodos negativos apresentam um maior risco de
recorrência e mortalidade que algumas pacientes com comprometimento axilar.
A radioterapia deve ser administrada após completar o tratamento quimioterápico.
1.6.1. Pacientes com mais de 70 anos
Apesar de a média de idade para o diagnóstico de um câncer de mama é de 52 anos no Brasil,
a população de pacientes com mais de 70 anos representa uma percentagem crescente de casos
na nossa prática diária. Poucos estudos, até aqui, incluíram números expressivos de pacientes com
idade acima de 70 anos. Estas pacientes, com frequência apresentam comorbidades que podem
limitar a capacidade em tolerar um tratamento adjuvante relativamente tóxico. Não obstante, a
idade cronológica não deve ser fator determinante para contraindicar quimioterapia adjuvante. O
tratamento deve ser considerado, sobretudo, para aquelas pacientes, mesmo que idosas, que se
apresentam com doença de maior risco, receptores negativos e/ou linfonodos comprometidos e
com boa condição clínica. Na meta-análise do EBCTCG publicada, poucas pacientes com mais de
70 anos foram incluídas para estabelecermos conclusões definitivas quanto ao benefício do
tratamento neste subgrupo. Informações retrospectivas sugerem que não existem diferenças nos
benefícios obtidos por mulheres jovens ou idosas com o tratamento adjuvante, porém com maior
toxicidade. O estudo que avaliou Capecitabina vs AC vs CMF nesta população mostrou vantagem
destes 2 últimos e tradicionais esquemas, mas acabou endossando o uso de quimio nestas
pacientes já que a toxicidade foi semelhante a observada em outros estudos. Outros estudos
prospectivos estão estudando especificamente esta população de pacientes. O esquema TC nesta
MANUAIS DE COND UTAS
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população (houve uma estratificação para pacientes >65 anos) mostrou eficácia superior ao AC,
sem nenhum sinal particular de toxicidade que seja diferente das pacientes mais jovens. Atenção
para aquelas pacientes com mais de 75 anos, com reserva medular insuficiente ou diabéticas de
difícil controle, onde a incidência de neutropenia febril será mais elevada, e por causa disto, haja a
consideração para fatores de crescimento profilático, conforme diretrizes da ASCO.
Tabela 4 - regimes de quimioterapia adjuvante aceitáveis
regime terapêutico
Número de ciclos
1ª geração
CMF, AC, FAC
6/4/6
2ª geração
FEC100, CEF120 , TC
6/6/4
3ª geração
AC-D , AC-T dose densa,
AC-T sem, FEC90-Psem
8/8
4-12sem / 4-8sem
OBS: Tumores com HER2 positivo: Trastuzumabe 8mg/Kg na primeira dose e 6 mg/Kg nas doses subsequentes, 21/21 dias,
até completar 1 ano.
1.7. Considerações relativas a Tratamento com Drogas Biológicas
1.7.1. Trastuzumabe associado à quimioterapia
Em pacientes com hiperexpressão de HER2, informações publicadas indicam uma vantagem
expressiva quando da administração de quimioterapia associada a trastuzumabe, com redução de
recorrência da ordem de 50% e diminuição do risco de morte em 34% em pacientes com ca de
mama invasivo com pelo menos 1cm. Este anticorpo monoclonal foi administrado com base a duas
estratégias básicas: a cada 3 semanas por um ano sequencialmente a vários regimes
quimioterápicos convencionais (estudo HERA) ou após 4 ciclos de doxorrubicina e ciclofosfamida
semanalmente, e após ou de maneira concomitante com paclitaxel (também administrado
semanalmente). Após completar o paclitaxel, trastuzumabe foi continuado semanalmente até
completar um ano de tratamento adjuvante (B31/9831). O BCIRG 006 demonstrou a eficácia do
docetaxel concomitante ao trastuzumabe. Mais importante foi a constatação de que um regime
de quimioterapia, composto por docetaxel, carboplatina concomitantes ao trastuzumabe (DCT)
parece ser tão eficaz quanto o regime contendo doxorrubicina. O regime DCT apresenta como
vantagens potenciais a possibilidade de introdução mais precoce do trastuzumabe e cardiotoxicidade
muito menor comparável a esquemas sem trastuzumabe pelo não emprego do antracíclico (NEJM,
in press) A duração ideal da utilização do trastuzumabe ainda não está bem estabelecida. Um
pequeno estudo finlandês utilizando trastuzumabe por nove semanas, sequencialmente à
quimioterapia (com docetaxel ou vinorelbina) demonstrou eficácia de magnitude semelhante,
porém, a atualização em St. Gallen 2009, não demonstrou manutenção dos resultados e só a análise
do subgrupo de linfonodos positivos mantiveram persistência do benefício. Por ora, parece-nos
mais prudente recomendar a utilização do trastuzumabe por um ano concomitante com o taxane.
Um ponto crítico é a questão da monitorização da função cardíaca, que deve ser feita a cada 3-4
meses, devendo ser interrompido o anticorpo (ou não iniciado) se FE<55% (ECO ou MUGA). Nos
casos de queda da FE durante o trastuzumabe após interrompido por um mês, se nova avaliação
indicar recuperação o anticorpo pode ser reiniciado. Se houver nova queda, a droga deve ser
definitivamente abandonada.
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MA N UA I S D E CO N DUTAS
É importante ressaltar que os estudos randomizados com trastuzumabe incluíram pacientes
T1c, mas recentemente vários estudos retrospectivos vêm mostrando que o risco de recidiva de
tumores HER2 positivos subcentimétricos é mais alto que seus pares negativos. Isto posto, vários
grupos têm recomendado tratamento adjuvante com trastuzumabe em pacientes com T1b. O
NCCN sugere esta indicação embora o nível de evidência seja inferior. Parece-nos que a decisão
deva ser bem individualizada e numa paciente jovem com outros fatores de risco como RH ausentes
ou G3 ou tumores muito proliferativos, a consideração de Trastuzumabe adjuvante é aceitável. Esta
paciente com um tumor de 8 ou 9mm pode ter um risco maior do que uma outra RH positivo, G2
com 11mm, por exemplo.
1.8. rotina de Acompanhamento após Tratamento Adjuvante
Uma vez concluído o tratamento adjuvante, as pacientes com câncer de mama inicial
necessitam de um acompanhamento seriado. Devemos reconhecer que o risco de recidiva da
doença, embora maior nos primeiros anos, estende-se por muitos anos. Estudos prospectivos
sugerem não haver benefício em termos de sobrevida para um acompanhamento intensivo
(história e exame clínico, mamografia anual, radiografia de tórax, cintilografia óssea a cada seis
meses, bioquímica e ecografia hepática/abdominal). Até 75% das recidivas são detectadas como
consequência de alterações que surgem nos intervalos das consultas de acompanhamento.
Também é importante considerar que não existem evidências que indiquem melhora da sobrevida
ou qualidade de vida quando do tratamento precoce de pacientes com câncer de mama
metastático assintomático. Exames subsidiários como hemograma, bioquímica do sangue,
marcadores tumorais, radiografia de tórax e cintilografia óssea, não apresentam sensibilidade e
especificidade aceitáveis para ser recomendados rotineiramente. Exames de imagem mais
apurados como tomografia computadorizada de tórax e abdômen, ressonância magnética e PETCT não têm sido sistematicamente testados no acompanhamento de mulheres assintomáticas.
Nos anos que se seguem ao diagnóstico e tratamento adjuvante do câncer de mama, o
médico também deve estar atento a potenciais efeitos adversos tardios do tratamento incluindo
segundos tumores (câncer de endométrio, mielodisplasia, leucemia), disfunção miocárdica e
osteoporose entre outras manifestações relacionadas à menopausa. Ao mesmo tempo, a
possibilidade de uma recorrência local ou de um segundo primário na mesma mama ou na mama
contralateral deve ser sempre lembrada. O exame endometrial por biópsia ou a avaliação
endometrial por ecografia transvaginal seriadas em pacientes (em uso de tamoxifeno) sem
sintomas de sangramento não demonstrou ter benefício clínico e não é recomendado na rotina de
acompanhamento. Uma história clínica, exame físico, mamografia anual e educação continuada das
pacientes constituem o esqueleto de um acompanhamento adequado para pacientes que se
mantêm assintomáticas após tratamento inicial de câncer de mama. Devemos também destacar
uma preocupação particular com a saúde óssea destas pacientes após o tratamento adjuvante. A
quimioterapia pode resultar numa menopausa precoce e o tratamento hormonal prolongado
(particularmente com inibidores de aromatase) apresenta um risco aumentado de
desenvolvimento ou agravamento de osteoporose. Por este motivo, é recomendável a realização
de uma densitometria óssea anual no acompanhamento destas mulheres. As visitas médicas
podem ser recomendadas a cada 3 meses por dois anos, a cada 6 meses por 3 anos e anualmente
após o quinto ano.
MANUAIS DE COND UTAS
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1.9. Situações Especiais: Câncer de Mama na Gravidez e em Homens
1.9.1. Pacientes gestantes
Embora não se trate de uma situação corriqueira, o diagnóstico e o tratamento do câncer de
mama podem ocorrer durante uma gestação. No contexto do tratamento adjuvante, quando
indicada a quimioterapia, recomenda-se iniciar o tratamento a partir do segundo trimestre. Na
literatura, as drogas mais utilizadas no tratamento adjuvante como a doxorrubicina, ciclofosfamida,
fluorouracil e os taxanos, podem ser oferecidas sem risco de má formação fetal e complicações
peri-parto. Um cuidado importante é que o último ciclo de quimioterapia deve ser administrado
até 40 dias antes da data provável do parto, desta forma, se evita que tanto a mãe como o filho não
estejam leucopênicos no ato do parto. Com relação ao trastuzumabe, há descrição de oligodrâmnio
quando utilizado e, desta forma, recomenda-se utilizá-lo somente após o parto. No contexto da
radioterapia adjuvante, recomenda-se oferecer apenas após o parto. Embora a literatura seja
escassa, os efeitos da quimioterapia a longo prazo para o feto parecem não comprometer o
desenvolvimento neuropsicomotor e psicológico, e muito menos oferecer um risco de aparecimento
de neoplasias.
1.9.2. Homens
O câncer de mama em homens é uma neoplasia rara, com cerca de 1750 novos casos por ano
nos EUA, sendo responsável por 0,5% dos óbitos por tumores em homens. Aproximadamente 90%
dos tumores são do tipo ductal invasor, enquanto o subtipo lobular é raro. Em mulheres, 60 a 70%
dos tumores de mama são receptor de estrógeno e progesterona positivos. Em contraste, 90% dos
tumores de mama em homens expressam receptor de estrógeno e 80% de progesterona. Em
relação à superexpressão de HER2, dados recentes têm sugerido que um menor número de tumores
no sexo masculino apresentam superxpressão de HER2, quando comparado a dados da população
feminina, aproximando-se a 10%. No Brasil, em 2008 foram registrados 125 óbitos em homens.
História familiar de câncer de mama e situações de desiquilíbrio hormonal, como excesso de
estrogênio e ausência de androgênio, existentes em hepatopatias, obesidade e Síndrome de
Klinefelter são fatores de risco. Em uma população não selecionada de homens com câncer de
mama 0 a 4% tem BCRA1 e 5 a 15% BRCA2. O NCCN recomenda que o teste seja oferecido aos
homens.
A apresentação clínica do câncer de mama em homens é semelhante ao das mulheres, com
uma média de idade maior (60 vs 53 anos). O diagnóstico, porém, se faz na grande maioria dos
casos com a doença avançada devido à baixa suspeição de neoplasia de mama em homens e a
ausência de rastreamento nesta população.
O tratamento local da doença é na maioria das vezes realizado com mastectomia radical. A
cirurgia conservadora de mama pode ser realizada, porém, a pequena quantidade de tecido
mamário dificulta a técnica cirúrgica. O esvaziamento axilar é o padrão, porém a ASCO considera,
apesar da pouca evidência na literatura, a pesquisa de linfonodo sentinela aceitável. A radioterapia
pós-mastectomia segue as mesmas indicações de tumores de mama em mulheres, bem como o
tratamento sistêmico adjuvante. A definição do tratamento baseia-se em extrapolação dos
resultados observados em mulheres e em estudos retrospectivos que mostraram ganho de
sobrevida com o uso de quimioterapia adjuvante em homens. Quimioterapia é indicada em
tumores receptores negativos maiores do que 1cm ou linfonodo positivo. Por insuficiência de
dados, recomendamos protocolos similares aos de câncer de mama feminino, inclusive para
pacientes HER2 positivos. O tamoxifeno adjuvante é o tratamento hormonal de escolha em homens
com tumores de mama que expressam receptor hormonal, também com embasamento científico
em estudos retrospectivos. Não existem dados na literatura para o uso de inibidores de aromatase
nesta circunstância.
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Os homens com câncer de mama metastático são inicialmente tratados com hormonioterapia. O tamoxifeno é a droga de escolha com cerca de 80% de resposta. Outros hormônios
podem ser usados utilizados em segunda linha, em pacientes hormônio-responsivos. A
quimioterapia é indicada em pacientes hormônio-refratários ou com doença visceral extensa. Os
esquemas utilizados são os mesmos indicados no câncer de mama feminino.
1.10. Considerações sobre o Tratamento Neoadjuvante
1.10.1. Introdução
Estimativas de várias instituições públicas que são responsáveis por aproximadamente 80%
do atendimento dos casos no país indicam que 64% dos casos se apresentam com estádios II (30%)
e III (34%). (H. do Câncer, H. de Oncologia e H. Luísa Gomes de Lemos (INCA/RJ), H. Aristides Maltez
(Salvador), H. Erasto Gaertner (Curitiba) e H. AC Camargo (São Paulo) apontando para a relevância
do tema. A quimioterapia neoadjuvante, administração de quimioterapia antes de um tratamento
local cirúrgico potencialmente curativo, foi inicialmente utilizada para tratamento de tumores
inoperáveis (localmente avançados) com o intuito de citorredução. São designados tumores
localmente avançados, aqueles que apresentam: fixação à parede torácica, envolvimento cutâneo,
linfonodos fusionados e/ou envolvimento de fossa supraclavicular ipsilateral. Também, no
tratamento de carcinomas inflamatórios, a quimioterapia neoadjvuvante é considerada padrão. O
carcinoma inflamatório representa cerca de 2,5% dos diagnósticos de câncer de mama e está
associado a sobrevida significativamente menor que pacientes com câncer de mama localmente
avançado não inflamatório (Hance et al., JNCI 2005). Entretanto, sobrevida em 10 anos de cerca de
30% é observada após tratamento multidisciplinar que envolve quimioterapia neoadjuvante.
Nas pacientes com câncer de mama operável, mas que não são candidatas a uma cirurgia
conservadora, o tratamento neoadjuvante pode ser considerado como uma alternativa, já que a
administração pré-operatória da quimioterapia resulta em uma diminuição do tamanho do tumor
permitindo uma diminuição geral de 18% na taxa de mastectomias (EBCTCG, Peto R et al, San
Antonio, 2006). Nos carcinomas que se apresentam em estádios iniciais, o tratamento neoadjuvante
tem resultados semelhantes ao tratamento adjuvante. Numa meta-análise que utilizou dados de
pacientes individuais de 9 estudos randomizados foi demonstrada equivalência quanto a SLD, SLD
à distância, e SG. (Mauri D, et al. JNCI 97:188, 2005). Revisando mais de 4600 pacientes em 11
estudos randomizados investigadores estimam 3% a mais de recorrências intramamárias, sem
diferencias em relação à sobrevida ou recorrências à distância em pacientes tratadas com
neoadjuvância (EBCTCG, Peto R et al, San Antonio, 2006; Wood, NCI, 2007). Entre outros elementos
que podem ser considerados, idade e status menopausal não devem influenciar a indicação de
terapia neoadjuvante. Da mesma forma, pode-se dizer que quimioterapia neoadjuvante é efetiva
e segura nos dois últimos trimestres de gestação.
Recentemente, a quimioterapia neoadjuvante tem sido bastante usada como ensaio clinico
para avaliar a sensibilidade a novos protocolos e drogas. A observação feita pelo estudo do NSABP
B18 e B27 de que a PCR se correlaciona com a sobrevida livre e global, instituiu a PCR como um
desfecho precoce. Entretanto, recentemente, este conceito tem sido reavaliado, pois reconhecemos
que os tumores luminais A são de bom prognóstico e não responsivos a quimioterapia
neoadjuvante. Desta forma, a observação de pCR como desfecho precoce não pode ser aplicada a
todos os tumores.
1.10.2. Vantagens de se fazer quimioterapia Neoadjuvante
1) Maiores chances de realizar uma cirurgia conservadora.
2) Possibilidade de observar uma resposta in vivo do tumor.
MANUAIS DE COND UTAS
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3) Identificação de pacientes (seleção) que respondem muito bem ao tratamento (pCR)
4) Observar, acompanhar e estudar marcadores biomoleculares alternativos que podem ser
avaliados antes, durante e depois do tratamento.
1.10.3. Desvantagens de se fazer quimioterapia Neoadjuvante
Necessidade de equipe multidisciplinar integrada: oncologista clínico, mastologista e
radioterapeuta. Aspecto positivo por existir maior discussão do caso, porém, algumas vezes difícil
na prática clinica.
Ao escolhermos a abordagem neoadjuvante, alteramos o estadiamento patológico do tumor.
Gânglios axilares que eram comprometidos podem tornar-se negativos pelo efeito do tratamento
neoadjuvante. Portanto, a quimioterapia neoadjuvante não deve alterar a indicação inicial de
tratamento quando utilizada em tumores localmente avançados. A determinação do linfonodo
sentinela em quimioterapia neoadjuvante ainda não é recomendada como padrão.
A quimioterapia neoadjuvante utilizada com o intuito de preservação da mama de fato
diminuiu o número de mastectomias, entretanto, existem evidências de um aumento no número
de recorrências intramamárias após o tratamento neoadjuvante, quando comparado com o
tratamento cirúrgico inicial. Finalmente, existe a possibilidade de progressão da doença em casos
de resistência primária ao tratamento sistêmico (ocorre em <5% das pacientes). Também, como
comentado antes, isto não compromete os parâmetros de sobrevida ou sobrevida livre de doença.
1.10.4. Avaliação patológica do tumor primário antes da QT Neoadjuvante
A avaliação anátomo-patológica antes da QT neoadjuvante requer uma biópsia por trucut
(core), não sendo aceitável somente a citologia de um aspirado por agulha fina (FNA). É necessário
fazer uma avaliação patológica e imunoistoquímica completas que inclua Grau, RE, RPg, Ki-67,
HER2 e invasão vascular nesta amostra inicial. Eventualmente, poderá ser necessário obter várias
biópsias ou até mesmo fazer o procedimento sob orientação por imagem. Com o crescente
desfecho de resposta patológica completa, é indispensável que a biópsia inicial permita a avaliação
de todos os fatores prognósticos/preditivos necessários para a completa condução do caso.
1.10.5. Marcação do tumor
Colocação de clips (marcadores ou localizadores) ou de tatuagens de pele para delimitação
do tumor antes de iniciar o tratamento quimioterápico é mandatório visto que observamos entre
15-35% de resposta clínica completa no caso de tratamento neoadjuvante. Isto não é necessário
em pacientes com contraindicação à cirurgia conservadora (isto é que, independentemente do
resultado do tratamento neoadjuvante devem ser submetidas a uma mastectomia), a saber:
microcalcificações difusas na mama, doença multicêntrica, grandes tumores centralizados, doença
do colágeno que contraindique radioterapia adjuvante.
1.10.6. Avaliação de doença sistêmica antes do tratamento Neoadjuvante
O estadiamento sistêmico é mandatório em pacientes com doença localmente avançada:
laboratório, Radiograma de tórax, ecografia abdominal e cintilografia óssea. Nas pacientes com
doença inicial, o estadiamento segue as regras gerais (deverá ser definido pelo grupo). A
investigação deve levar em consideração o risco de doença sistêmica e os sintomas que a paciente
apresente. Em pacientes abaixo de 35 anos, deve ser considerada a realização de RM de mama
devido a frequência de tumores multicêntricos ou contralaterais não identificados ao US e
mamografia. O PET-CT vem sendo usado com frequência em centros internacionais nestes casos,
mas seu exato papel, custo e acessibilidade ainda são fatores limitantes para a sua popularização.
É fato que, em muitos casos, o resultado causa impacto na decisão terapêutica cirúrgica e sistêmica.
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MA N UA I S D E CO N DUTAS
1.10.7. Qual o melhor regime?
Não existe nenhuma razão biológica para considerar que qualquer regime quimioterápico
que funcione depois da cirurgia não seja eficaz antes dela. Um regime adjuvante aceitável é
também e deve ser considerado como um regime neoadjuvante aceitável. Preferencialmente,
realizar toda a QT antes da cirurgia. A maior parte dos estudos em neoadjuvância empregou
esquemas contendo antraciclinas e ciclofosfamida, e mais recentemente taxanes, como o estudo
B27 (AC x4 seguido de Docetaxel x4). Pacientes com positividade para receptores hormonais têm
uma expectativa menor de resposta quando comparados a receptores ausentes. A hiperexpressão
de HER2 (FISH positivo ou IHQ 3+) em estudos randomizados tem valor preditivo para resposta
patológica completa com a associação de quimioterapia e trastuzumabe com índices próximos ou
superiores a 50% (mais do que o dobro do que se via antes sem o uso de trastuzumabe, como visto
no NOAH e no Geparquinto). Entretanto, a duração do tratamento e a combinação de escolha ainda
não estão definidos. Favorecemos o uso de esquemas que na fase do taxane incorporem o
anticorpo sendo que após a cirurgia o tempo total de 1 ano seja completado. A utilização do
esquema de Buzdar et al (Paclitaxel + T seguido de FEC com T deve ser visto como um esquema
aceitável (>50% de pCR) mas a preocupação da concomitância de trastuzumabe com a epirrubicina
é altamente relevante pelo risco de toxicidade cardíaca de longo prazo. 98 Recomendamos, portanto,
o uso de trastuzumabe em todos os casos de QT neoadjuvante, desde que não haja contraindicação
para o uso do anticorpo. Recentemente, o uso de Lapatinibe (NEO-ALTO e outros), Bevacizumabe
(ASCO 2011) e Pertuzumabe (NeoSphere) foram apresentados, mas esta indicação ainda deve ser
considerada experimental até o presente momento.
1.10.8. Hormonioterapia Neoadjuvante
A hormonioterapia neoadjuvante tem sido descrita como uma opção terapêutica eficaz desde
1989 por autores ingleses. Recentemente, com a incorporação dos inibidores de aromatase no
tratamento do câncer de mama na pós-menopausa e a constatação de que os tumores com
receptores hormonais positivos respondem menos à quimioterapia, esta modalidade terapêutica
tem sido alvo de grandes estudos. O estudo IMPACT comparou na neoadjuvância anastrozol versus
tamoxifeno isolado e a associação. Demonstrou maior taxa de cirurgia conservadora com anastrozol
isolado, embora não tenha existido diferença na resposta. (JCO 23:5108, 2005). Embora, a duração
exata do tratamento neoadjuvante ainda não tenha sido estabelecido estudos demonstram que
tratamentos por mais de 6 meses aumentam a taxa de resposta clinica. (Breast Cancer Res Treatment
113:145,2009). A pCR não é um bom desfecho intermediário para este grupo de pacientes. Estudos
moleculares apontam para a redução de Ki-67 após 15 dias de tratamento como um possível
marcador precoce de resposta.
1.11. APÊNDICE 1: Estadiamento (resumido do AJCC 2002)
Tamanho do Tumor (T)
• Tx - tumor não pode ser avaliado
• T0 - Sem evidência de tumor primário
• Tis - carcinoma in situ
• T1 - tumor com até 2cm em sua maior dimensão
• T1 mic - carcinoma microinvasor (até 1mm)
• T1a - tumor com até 0,5 cm em sua maior dimensão
• T1b - tumor com mais de 0,5 e até 1cm em sua maior dimensão
• T1c - tumor com mais de 1cm e até 2cm em sua maior dimensão
• T2 - tumor com mais de 2cm e até 5cm em sua maior dimensão
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• T3 - tumor com mais de 5cm em sua maior dimensão
• T4 - qualquer T com extensão para pele ou parede torácica
• T4a- extensão para a parede torácica
• T4b - edema (incluindo peau d'orange), ulceração da pele da mama, nódulos cutâneos satélites
na mesma mama
• T4c - associação do T4a e T4b
• T4d - carcinoma inflamatório
Observações:
a. O comprometimento do músculo grande peitoral não caracteriza T4
b. Presença de retração da pele ou papila não interfere no estadiamento.
Linfonodos regionais (N)
• Nx - Os linfonodos regionais não podem ser avaliados
• N0 - Ausência de metástase
• N1 - Linfonodo(s) homolateral(is) móvel(is) comprometido(s)
• N2 - Metástase para linfonodo(s) axilar(es) homolateral(is), fixos uns aos outros ou fixos a
estruturas vizinhas ou metástase clinicamente aparente somente para linfonodo(s) da cadeia
mamária interna homolateral
• N2a - Metástase para linfonodo(s) axilar(es) homolateral(is) fixo(s) uns aos outros ou fixos à
estruturas vizinhas
• N2b - Metástase clinicamente aparente somente para linfonodo(s) da cadeia mamária interna
homolateral, sem evidência clínica de metástase axilar
• N3 - Metástase para linfonodo(s) infraclavicular(es) homolateral(is) com ou sem comprometimento
do(s) linfonodo(s) axilar(es), ou para linfonodo(s) da mamária interna homolateral clinicamente
aparente na presença de evidência clínica de metástase para linfonodo(s) axilar(es) homolateral(is),
ou metástase para linfonodo(s) supraclavicular(es) homolateral(is) com ou sem comprometimento
do(s) linfonodo(s) axilar(es) ou da mamária interna
• N3a - Metástase para linfonodo(s) infraclavicular(es) homolateral(is)
• N3b - Metástase para linfonodo(s) da mamária interna homolateral e para linfonodo(s) axilar(es)
• N3c - Metástase para linfonodo(s) supraclavicular(es) homolateral(is)
Observação:
Clinicamente aparente é definido como detectado por estudos de imagem (exceto linfocintigrafia), pelo
exame clínico ou pelo diagnóstico patológico macroscópico.
Metástases (M)
• Mx - metástase à distância não pode ser avaliada
• M0 - ausência de metástase à distância
• M1 - presença de metástase à distância
30. Fonte: UICC, 2002; * qq = qualquer
Estádio 0 Tis N0 M0
Estádio I T1 N0 M0
Estádio IIA T0 N1 M0 / T1 N1 M0 / T2 N0 M0
Estádio IIB T2 N1 M0 / T3 N0 M0
Estádio IIIA T0 N2 M0 / T1 N2 M0 / T2 N2 M0 / T3 N1 M0 / T3 N2 M0
Estádio IIIB T4 N0 M0 / T4 N1 M0 / T4 N2 M0
Estádio IIIC Tqq N3 M0
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MA N UA I S D E CO N DUTAS
Estádio IV Tqq Nqq M1*
1.12. APÊNDICE 2: Esquemas de QT mais Utilizados
HErA
Trastuzumabe após quimioterapia adjuvante: 8mg/kg EV primeira dose, seguido de 6mg/kg
EV doses subsequentes, por 1 ano NEJM 2005; 353:1659-1672.
NSABP B31
AC a cada 3 semanas x 4 > Paclitaxel a cada 3 semanas x 4 + Trastuzumabe semanal por 52
semanas NEJM 2005; 353:1673-1684.
NCCTG
AC a cada 3 semanas x 4 > Paclitaxel semanal por 12 semanas + Trastuzumabe semanal por
52 semanas. NEJM 2005; 353:1673-1684.
BCIrG 006
DCH – Docetaxel 75mg/m2 e Carboplatina AUC6 a cada 3 semanas, por 6 ciclos, com
Trastuzumabe semanal iniciando com a quimioterapia, passando a cada 3 semanas ao término da
QT, até completar 1 ano. Breast Cancer Res Treat 2005; 94 (supp 1): S5.
FEC100 / CEF120
Ciclofosf. 500(600)mg/m2 EV D1 (D8) 5Fluorouracil 500(600)mg/m2 EV D1 (D8) Epirrubicina
100(120)mg/m2 EV D1 21 dias J Clin Oncol 2001; 19:602-611.
FEC90-P
Ciclofosf. 600mg/m2 EV D1, 5Fluorouracil 600mg/m2 EV D1, Epirrubicina 90mg/m2 EV D1 21
dias, Paclitaxel 100mg/m2 x8 GEICAM 9906 J Clin Oncol.
TAC
Ciclofosfamida 500mg/m2 EV D1, Doxorrubicina50 mg/m2 EV D1, Docetaxel 75mg/m2 EV D1
com G-CSF 21 dias NEJM 2005; 352:2302-2313.
AC
Ciclofosfamida 600mg/m2 EV D1, Doxorrubicina 60mg/m2 EV D1, 21 dias J Clin Oncol 2002;
20:3114-3121.
AC-P
Seqüência de AC (x 4) e Paclitaxel 175mg/m2(x 4) ou 80mg/m2 EV x12, 21 dias ou semanal , J
Clin Oncol 2003; 21: 976-983 e PASCO 2007:Abs 517.
AC-P dose densa
AC a cada 2 semanas (x 4), seguido de Paclitaxel 175mg/m2 cada 2 semanas (x 4) com G-CSF
após cada ciclo 5-8 dias 14 dias J Clin Oncol 2003; 21:1431-1439.
AC-D
Ciclofosfamida 600mg/m2 EV D1, Doxorrubicina 60mg/m2 EV D1, 21 dias (x4) seguido de
Docetaxel 100mg/m2 (x4)
MANUAIS DE COND UTAS
| 51
CMF
Ciclofosfamida 50mg/m2 VO D1-D14, 5Fluorouracil 600mg/m2 EV D1 e D8, Metotrexate
40mg/m2 EV D1 e D8, 28 dias Eur J Cancer 1991; 27:966-970.
FAC
Ciclofosfamida 500mg/m2 EV D1, 5Fluorouracil500 mg/m2 EV D1, Doxorrubicina 50mg/m2 EV
D1, 21 dias Cancer 1999; 85:1091-1097.
Buzdar Neo
Trastuzumabe semanal por 23 sem com Paclitaxel 225mg/m2 EV IC 24h x4, seguido 5Fu e CTX
500mg/m2 Epi 75mg/m2 EV x4 21 dias J Clin Oncol 2005: 23: 3676-3685.
TC
Ciclofosfamida 600mg/m2 EV D1, Docetaxel 75mg/m2 EV D1, 21 dias J Clin Oncol 2006; 24:
5381-5387.
Bibliografia Sugerida
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Instituto Nacional de Câncer. Coordenação de Prevenção e Vigilância. Estimativa 2010:
Incidência de Câncer no Brasil. Rio de Janeiro: INCA, 2010.
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4. Boyle P, Ferlay J. Cancer incidence and mortality in Europe, 2004. Ann Oncol 16:481, 2005.
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Proceedings (Post-Meeting Edition). Vol 22, No 14S (July 15 Supplement): 567, 2004.
8. Smith I, Procter M, Gelber RD, et al. 2-year follow-up of trastuzumab after adjuvant chemotherapy
in HER2-positive breast cancer: a randomized controlled trial. Lancet 369: 29–36, 2007
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MANUAIS DE COND UTAS
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Capítulo 2
Câncer de Mama Metastático
Editor: Dr. Gilberto Luiz da Silva Amorim
Autores: Dr. Bruno Lemos Ferrari, Dr. Carlos Sampaio, Dr. Daniel Luiz Gimenes, Dr. Gustavo Fernando
Veraldi Ismael, Dr. Jacques Bines, Dr. Jeferson Vinholes, Dra. Leticia Carvalho Neuenschwander,
Dr. Mário Alberto Dantas, Dr. Sérgio Simon
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MANUAIS DE COND UTAS
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Capítulo 2
Câncer de Mama Metastático
Introdução
Há importantes variações no manejo das pacientes com câncer de mama em diferentes
regiões do Brasil. Isto é resultado tanto de disparidades nas condições assistenciais quanto de
treinamento e conhecimento heterogêneo por parte dos responsáveis pelo cuidado das pacientes.
Evidências na literatura científica sugerem que o desenvolvimento de diretrizes pode resultar numa
maior consistência na assistência oferecida numa determinada situação clínica. É neste cenário
que a Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica (SBOC) propõe estas diretrizes para o manejo do
câncer de mama metastático.
Este documento é exclusivamente dirigido ao médico responsável pelo cuidado e aconselhamento de pacientes com um diagnóstico de câncer de mama metastático. Mesmo com suas
limitações, pretendemos refletir um amplo consenso das diferentes alternativas de conduta
aceitáveis de acordo com as evidências existentes na atualidade. Estas diretrizes procuram facilitar
o processo de discussão compartilhada entre médico e paciente, o que poderá resultar na melhor
recomendação terapêutica para cada situação.
Deve ser destacado que estas diretrizes não pretendem definir uma única alternativa correta
para o manejo de cada caso. Eventualmente, decisões fora das aqui recomendadas poderão ser
necessárias em situações clínicas especiais. Entretanto, quando alguma recomendação for feita
fora destes padrões, é razoável esperar que seja acompanhada de uma sólida justificativa. É
importante lembrar que entre muitas variáveis, a atitude filosófica frente à doença varia de
indivíduo para indivíduo assim como também podem variar os recursos diagnósticos e a disponibilidade de oferecer determinados tratamentos em algumas circunstâncias.
Por uma questão meramente prática o conteúdo deste documento será dividido nos
seguintes temas:
1. Introdução: Diagnóstico da Doença Metastática / Fatores Prognósticos e Fatores Preditivos;
2. Terapia Endócrina;
3. Quimioterapia;
4. Tratamento de Pacientes Com Câncer de Mama HER2 Positivo;
5. Duração do Tratamento;
6. Manejo da Doença Mestatática Óssea com Bisfosfonatos;
7. Considerações em Pacientes Geriátricas;
8. Metastasectomia / Tratamento Local do Câncer de Mama Avançado.
2.1. Introdução: Diagnóstico da Doença Metastática /
Fatores Prognósticos e Fatores Preditivos
2.1.1. Introdução
O câncer de mama metastático (CMM) ou recidivado é uma entidade heterogênea e requer
do oncologista clínico uma abordagem criteriosa. Esta condição já está presente, ao diagnóstico,
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MA N UA I S D E CO N DUTAS
em cerca de 7-10% das pacientes, mas pode desenvolver-se em até 20% das pacientes com axila
negativa e em 50-85% das pacientes com axila positiva.
Em sua fase metastática, considera-se como uma doença incurável e os principais objetivos
são a melhoria da qualidade de vida, a prevenção e o controle efetivo dos sintomas, bem como o
aumento, quando possível, do tempo de sobrevida. A sobrevida mediana destas pacientes é de 2
a 3 anos, mas cerca de 3-10% podem sobreviver por 10 ou mais anos. Há grande heterogeneidade
de apresentações clínicas, com pacientes evoluindo de forma fulminante, com rápido desenvolvimento de metástases para órgãos vitais, resistência à terapêutica e óbito em alguns meses,
enquanto que outras pacientes apresentam um curso indolente, com longos períodos de resposta
clínica, com longa sobrevida. O progresso no conhecimento da biologia molecular do câncer de
mama levou ao reconhecimento de distintos “subgrupos histológico/moleculares” de câncer de mama,
cada qual com uma evolução característica, e que requerem distintas abordagens terapêuticas.
Para que estes objetivos sejam atingidos, é necessária uma definição clara do diagnóstico, dos
sítios de metástases e uma avaliação de fatores prognósticos e preditivos .
2.1.2. Avaliação Diagnóstica
A confirmação anátomo-patológica não é necessária na maioria dos casos de recidiva, porém
pode ser indicada nos casos de apresentação incomum ou dúvida quanto à origem da lesão, ou
ainda para a realização de estudos da expressão de receptores hormonais – estrógeno (RE) e
progesterona (RPg) – e da proteína HER2. Recentemente várias publicações têm recomendado
sempre que possível a biópsia da metástase, pois além da possibilidade de variação da
imunohistoquímica (em até 20% para os RH e até 10% para a proteína HER2), existe a possibilidade
de que artefatos pré-analíticos, analíticos e pós-analíticos possam ter prejudicado a análise do
tumor primário. Dados de literatura indicam, ainda, que em 10 a 20% dos casos, outro tumor
primário pode ser identificado no curso da investigação da doença metastática, com óbvias
implicações clínicas.
Além da detalhada anamnese e do completo exame físico, deve-se solicitar exame hematológico
completo, provas de função hepática (incluindo bilirrubinas, transaminases, fosfatase alcalina e
desidrogenase láctica), radiografia ou tomografia de tórax, cintilografia óssea e avaliação hepática
por tomografia computadorizada ou ultrassonografia1. Em pacientes com tumores triplo negativo
e com hiperexpressão de HER2, alguns autores recomendam a realização de RNM de crânio, mesmo
em pacientes assintomáticas, mas esta conduta é questionada por outros estudos2. O uso dos
marcadores biológicos CA 15-3, CEA, no diagnóstico, é discutível e não é indicado por todos os
autores, mas pode ser útil na monitorização da resposta clínica, não devendo ser usado de forma
isolada para a determinação de progressão ou não de doença. O PET-CT vem sendo usado
frequentemente em vários centros nestes casos, mas apesar de sua grande sensibilidade na
detecção de doença metastática, seu custo e acessibilidade ainda são fatores limitantes para o seu
acesso em nosso meio.
2.1.3. Fatores prognósticos
Os principais fatores independentes são estado geral da paciente mensurado pela
performance status (medidas pelas escalas ECOG ou Karnofsky), o sítio de metástase, o número de
sítios de acometimento metastático, a presença de receptores hormonais e da hiperexpressão
proteína HER2, o intervalo entre o final da adjuvância e o diagnóstico da doença metastática, o
uso prévio de quimioterapia adjuvante ou paliativa e o subtipo histológico/molecular do câncer de
mama. Vale ressaltar que muitas pacientes podem se enquadrar num grupo intermediário, que
não seria nem favorável nem desfavorável. (Tabela 1).
O subtipo histológico/molecular do tumor é outro fator prognóstico importante. As pacientes
que apresentam os chamados tumores do tipo “Luminal A” (caracterizados por forte expressão do
MANUAIS DE COND UTAS
| 63
RE e do RPg, ausência de hiperexpressão da proteína HER2 e um Ki-67 abaixo de 15%) possuem
melhor prognóstico e se caracterizam, clinicamente, por metástases preferenciais a pele, tecidos
moles, linfonodos e ossos. Os tumores caracterizados como “Luminal B” (caracterizados por uma
marcação positiva, porém mais fraca, dos receptores hormonais e por um k-i67 mais alto e cerca de
50% das pacientes com hiperexpressão de HER2) têm prognóstico significativamente pior do que
os tumores classificados como “Luminal A” e, apesar de terem receptores hormonais, frequentemente
causam metástases viscerais. O subtipo dos tumores “HER2 positivos” (HER2+) (definidos pela
hiperexpressão da proteína HER2 na superfície da célula tumoral e ausência de receptores
hormonais, geralmente com Ki-67 elevado) são tumores de prognóstico mais reservado, por terem
tendência a rápida disseminação metastática visceral, sobrevida livre de doença e sobrevida global
inferior aos tumores luminais. Finalmente, os tumores chamados de “Triplo Negativos” (definidos
pela ausência de receptores hormonais e de proteína HER2, muitas vezes com presença das
citoqueratinas 5 e 14, bem como expressão do EGFR) se constituem num grupo relativamente
heterogêneo de tumores, mas geralmente com prognóstico mais desfavorável.
Tabela 1 - Fatores prognósticos
Fator Prognóstico
performance status
sítios de doença
número de sítios de doença
receptores hormonais
HER2
intervalo livre de doença
quimioterapia adjuvante
quimioterapia paliativa
1
Favorável
bom
ossos, partes moles
poucos
positivos
negativo
> 2 anos
não
não
Desfavorável
ruim
vísceras
múltiplos
negativos
positivo
< 2 anos
sim
sim
2.1.4. Fatores preditivos para a resposta aos tratamentos
A expressão de RE ou RPg pelas células tumorais é altamente preditivo de resposta à
hormonioterapia (HT). Sua determinação está, portanto, indicada em todas as pacientes. Nas
pacientes do tipo “Luminal B”, nas quais a marcação geralmente é fraca, o tratamento deve ser
individualizado, mas a terapia endócrina não deve ser omitida somente por este motivo.
Recomendações internacionais recentemente publicadas (ASCO-CAP) indicam que positividade
para receptores hormonais deve ser considerada a partir de >1% de expressão.
A hiperexpressão de HER2 avaliada através de imunohistoquímica (IHQ) ou pela técnica de
FISH é fortemente preditiva de resposta ao trastuzumabe. Considera-se que pacientes com escore
3+ pela IHQ ou FISH positivas sejam consideradas como passíveis de resposta ao trastuzumabe.
Por outro lado, pacientes com IHQ escores 0 ou 1+ ou teste de FISH negativo são consideradas não
sensíveis ao trastuzumabe. Pacientes com escore 2+ na IHQ devem ser submetidas ao teste de FISH
, para confirmação da amplificação do gene HER2.
2.2. Terapia Endócrina
O tratamento hormonal deve ser considerado como primeira opção de tratamento em
pacientes com câncer de mama hormônio dos tipos “Luminal A” e “Luminal B” (positivos para RE e
RPg) que apresentam as seguintes características clínicas:
1. ausência de crise visceral;
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MA N UA I S D E CO N DUTAS
2. longa expectativa de sobrevida;
3. doença metastática de evolução indolente (que pode ser difícil de definir);
2.2.1. Tratamento hormonal para paciente na pós-menopausa
O tamoxifeno foi, durante muitos anos, considerado como a primeira opção de tratamento no
tratamento do câncer de mama metastático responsivo à terapia endócrina. Com a emergência
dos inibidores de aromatase de terceira geração (anastrozol, letrozol e exemestano) e do
fulvestranto, houve um significativo incremento no arsenal terapêutico para o câncer de mama
metastático neste cenário. É importante sempre confirmar o diagnóstico de menopausa, pois
algumas mulheres em amenorréia ainda têm níveis relativamente elevados de estradiol e baixos
níveis de FSH, sugerindo função ovariana residual, o que torna inadequado o uso dos inibidores de
aromatase e do fulvestranto.
2.2.2. Hormonioterapia de Primeira Linha
Devido à superioridade terapêutica frente ao tamoxifeno em estudos randomizados, os
inibidores de aromatase de terceira geração - anastrozol4, letrozol5 ou exemestano6 são recomendados
como primeira opção de terapia endócrina, em pacientes na pós-menopausa. Uma meta-análise
publicada em 2006 favorece o uso dos inibidores da aromatase em 1ª linha, inclusive com melhora
de sobrevida. Há ainda que se considerar qual a terapia endócrina utilizada na adjuvância na
escolha da melhor estratégia de tratamento na recorrência. Em caso de uso prévio apenas de
tamoxifeno, com intervalo livre de doença inferior a dois anos, os inibidores são a melhor opção de
tratamento. Entretanto um número frequente de pacientes já recebeu tamoxifeno seguido de
inibidores da aromatase na adjuvância, ou mesmo somente um inibidor de aromatase, o que coloca
o fulvestranto como opção em tratamento de primeira linha na doença metastática. Neste cenário
também há que se considerar a questão da dose de fulvestranto: estudos recentes sugerem que a
dose de 500mg/mês pode estar associada a melhores resultados do que a dose de 250mg/mês,
atualmente aprovada no Brasil. Para pacientes que já tenham recebido letrozol ou anastrozol,
fulvestranto e exemestano apresentaram atividade bastante similar em estudo randomizado. O
tamoxifeno pode também ser considerado para as pacientes que usaram somente inibidores da
aromatase na adjuvância.
2.2.3. Hormonioterapia de Segunda Linha
Após falha ao tamoxifeno, os inibidores de aromatase de terceira geração ou o fulvestranto estão
indicados como terapia de segunda linha. Em caso de falha aos inibidores reversíveis da aromatase
de terceira geração (anastrozol e letrozol) pode-se utilizar exemestano ou fulvestranto7. O estudo
EFECT, publicado em 2010, não demonstrou diferença na resposta objetiva, sobrevida global e
tempo livre de progressão entre o uso de exemestano e fulvestranto após falha aos inibidores de
aromatase não esteroidais. Tamoxifeno8, progestágenos como o acetato de megestrol 160mg/dia
ou dietilestilbestrol (6mg/dia) são outras opções de tratamento em linhas subsequentes.
É importante lembrar que as pacientes com tumores com receptores hormonais positivos
mais indolentes, tipo “Luminal A”, frequentemente respondem a inúmeras linhas de hormonioterapia.
Caso não haja urgência clínica ou rápida evolução da doença, a hormonioterapia deve ser sempre
sugerida como a melhor opção de tratamento para doença metastática nestas pacientes,
procurando se esgotar todas as linhas de tratamento possíveis.
2.2.4. Tratamento Hormonal na pré-menopáusica
Tamoxifeno ou ablação/supressão ovariana competem como a melhor abordagem
terapêutica do câncer de mama metastática em mulheres na pré-menopausa. Estudos randomizados
e uma meta-análise sugerem que a combinação do tamoxifeno com ablação ovariana resultou em
MANUAIS DE COND UTAS
| 65
melhor taxa de resposta, melhor tempo para progressão e maior sobrevida quando comparada à
ablação ovariana isolada.
Pode-se, portanto, utilizar o tamoxifeno, supressão da função ovariana com agonista LHRH
(gosserrelina) ou preferencialmente ambos9. A ooforectomia cirúrgica ou actínica tem eficácia
semelhante aos agonistas LH-RH, porém com menor custo a longo prazo. Apesar dos dados
insuficientes sobre a utilização de inibidores de aromatase ou fulvestranto neste cenário, sua
utilização deve incluir alguma forma de ablação/supressão ovariana, seguindo a lógica das
pacientes menopausadas.
2.3. Quimioterapia
É importante lembrar que na doença metastática devem-se escolher estratégias de
tratamento que tenham como objetivos o controle dos sintomas, a manutenção da qualidade de
vida e, sempre que possível, o ganho de sobrevida.
2.3.1. Câncer de mama metastático: agentes isolados versus poliquimioterapia
Estudos recentes evidenciaram que a poliquimioterapia apresenta maior taxa de resposta e
aumento do intervalo até a progressão em relação à monoterapia, sem, no entanto, ganho de
sobrevida global e à custa de maior toxicidade. Este assunto é polêmico, mas a decisão deve ser
individualizada e baseada na necessidade de respostas mais rápidas e nas condições clínicas da
paciente: aquelas com necessidade de uma resposta rápida devido à gravidade do quadro clínico
devem receber poliquimioterapia, enquanto que pacientes com quadros um pouco mais indolentes
geralmente são tratadas com agentes únicos.
No tratamento paliativo, o estado geral da paciente, a sensibilidade à terapia endócrina, a
expressão de HER2/neu e a extensão da doença sistêmica, ajudam a determinar qual a melhor
opção de tratamento. Pacientes com pior performance status, devem ser tratadas com esquemas
de menor toxicidade sistêmica. Eventualmente, algumas destas pacientes devem ser consideradas
para suporte paliativo exclusivo, devido aos riscos que estas pacientes apresentam quando
expostas à quimioterapia.
Existem diferentes cenários possíveis para uma apresentação de doença metastática, gerando
uma grande variedade de opções terapêuticas iniciais e subsequentes. Alguns exemplos podem ser
vistos na Tabela 2. Os esquemas mais utilizados e suas referências podem ser encontrados no final
deste capítulo (Apêndice).
Vários agentes citotóxicos promovem respostas objetivas (redução de pelo menos 30% na
soma dos maiores diâmetros de lesões metastáticas alvos) entre 20% e 60% em pacientes sem
tratamento prévio para doença metastática. Os taxanos (paclitaxel, docetaxel e nab-paclitaxel –
este último ainda não disponível no Brasil) e as antraciclinas (doxorrubicina, doxorrubicina
lipossomal e epirrubicina) são considerados os agentes mais ativos e eficazes. Os taxanos produzem
respostas clínicas entre 30% e 50% em pacientes consideradas como resistentes às antraciclinas.
Paclitaxel semanal, docetaxel a cada 21 dias e nab-paclitaxel são superiores ao paclitaxel a
cada 21 dias. A combinação de antraciclinas e taxanos produz uma maior taxa de resposta clínica,
entretanto nenhum estudo randomizado conseguiu demonstrar superioridade da combinação em
sobrevida global quando comparada à terapia seqüencial com os mesmos agentes. Vale lembrar
que a cardiotoxicidade das antraciclinas é cumulativa e o risco de um evento cardíaco aumenta
consideravelmente após 400-450mg/m2 de doxorrubicina. Também ressaltamos que a segurança
cardíaca é maior com o uso de doxorrubicina lipossomal.
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MA N UA I S D E CO N DUTAS
Tabela 2 - Tratamento do câncer de mama metastático
Doença óssea
ou visceral
assintomática,
em pacientes
com receptores
hormonais
positivos.
Doença visceral
sintomática ou
extensa
Pacientes que
superexpressam
HER2/Neu
1ª Linha
Terapia endócrina +/inibidor da osteólise;
radioterapia em áreas de
dor intensa ou risco de
fratura
Quimioterapia isolada ou
associada a Bevacizumabe
***
Trastuzumabe +/- QT ou
HT
2ª Linha
Se mantiver o padrão
ósseo, tentar outra
terapia endócrina.
> 3ª Linha
Nova manipulação
endócrina* OU
quimioterapia.
QT****
QT
Manter supressão do HER2 ** com
Trastuzumabe/Lapatinibe + QT de 2ª linha
(T+L)*****
* esgotar endócrino antes de iniciar quimioterapia
** Estudos retrospectivos sugerem trocar QT e manter Trastuzumabe
Estudos recentes sugerem a combinação de Lapatinibe com Capecitabina na progressão após falha de trastuzumabe.
*** Dar preferência a Paclitaxel semanal quando associado a Bevacizumabe
**** Análise do RIBBON2 (ASCO 2011) é positiva para a adição de Bevacizumabe em 2ª linha, mas esta indicação ainda não
consta em bula.
***** Estudo de fase 3 com duplo bloqueio do HER2 é positivo
Pacientes com benefício clínico em tratamentos prévios podem se beneficiar de sucessivas
linhas de tratamento, às vezes 4 ou 5 linhas, embora com tendência ao encurtamento da duração
da resposta. Cabe ao senso crítico do oncologista para julgar a oportunidade de interromper a
quimioterapia e recomendar suporte e cuidados paliativos. Pacientes com boa performance status
podem ser elegíveis para participação em estudos clínicos utilizando novas alternativas terapêuticas.
2.3.2. Pacientes previamente tratadas com antracíclicos e taxanos
O uso de antraciclinas foi durante muito tempo o alicerce do tratamento quimioterápico
adjuvante do câncer de mama. Mais recentemente, os taxanos foram incorporados ao tratamento
quimioterápico adjuvante em maior escala. Em termos gerais, tem sido frequente a abordagem
terapêutica de pacientes com recorrência do câncer de mama após uma exposição prévia a alguma
antraciclina e/ou algum taxano no seu tratamento adjuvante, o que limita a escolha dos agentes
quimioterápicos para o tratamento da doença metastática ou recidivada.
As alternativas que podem ser consideradas para o tratamento de pacientes com câncer de
mama metastático ou recidivado e previamente expostas a antraciclinas e taxanos são as seguintes:
• trocar pelo taxano não utilizado (paclitaxel ou docetaxel);
• antracíclico lipossomal10;
• tratamento com outros agentes quimioterápicos: gencitabina +/- cisplatina, capecitabina11,
vinorelbine12,13, quimioterapia metronômica ou cisplatina. A eribulina foi aprovada em 2010 nos
EUA após demonstrar benefício em sobrevida global em pacientes previamente tratadas com várias
linhas de tratamento, porém este agente ainda não está disponível no Brasil.
• combinações: capecitabina/vinorelbina, gencitabina/vinorelbina, capecitabina/gencitabina,
5-FU infusional +/- vinorelbina ou gencitabina/cisplatina.
É importante destacar que a maioria dos tratamentos aqui citados são baseados em estudos
de Fase II, entretanto consagrados pela prática devido ao evidentes benefícios clínicos observados.
MANUAIS DE COND UTAS
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2.3.3. Novas alternativas de tratamento sistêmico
• Inibidores da PARP: Os inibidores da poli (ADP-ribose) polimerase-1 (PARP-1) são ainda
experimentais estão interessantes principalmente para as pacientes triplo-negativas. Estudo de
fase II publicado no NEJM em 01/2011 utilizou iniparibe em associação com gencitabina e
carboplatina, com dados favoráveis ao grupo tratado com o inibidor da PARP. No entanto, o estudo
de fase III apresentado na ASCO 2011 foi negativo. Nas pacientes com mutações de BRCA 1 e 2,
outra molécula em estudo, com resultados iniciais promissores, é o olaparibe. Não há indicação
uso destes agentes na prática clínica no presente momento.
• Agentes antiangiogênicos: O bevacizumabe foi aprovado em combinação com taxanos no
tratamento de primeira linha metastática. Esta aprovação baseia-se em 3 estudos fase III (ECOG
2100, AVADO, RIBBON-1) que demonstraram que a adição do bevacizumabe a taxanos (em especial
no estudo ECOG2100, com paclitaxel semanal) aumenta significativamente a taxa de resposta
assim como o tempo livre de progressão, sem benefício na sobrevida global. Meta-análise
apresentada na ASCO 2010 confirmou estes achados, e não conseguiu observar nenhum efeito na
sobrevida global. O uso de Bevacizumabe com quimioterapia pode ser considerado em casos
selecionados na existência de metástases viscerais e/ou já refratários ao tratamento endócrino.
Nesta situação, considerar paclitaxel semanal com bevacizumabe. Devemos atentar para o risco
de maior toxicidade quando se associa bevacizumabe (mielotoxicidade, neurotoxicidade,
fenômenos tromboembólicos, sangramento). A agência reguladora européia (EMEA) aprovou a
associação com paclitaxel semanal e em Maio 2011 ampliou esta indicação também para
capecitabina. Mais recentemente (ASCO 2011) foi apresentado o benefício para aquelas pacientes
que não receberam bevacizumabe em 1ª linha, mas o receberam de forma sequencial em
associação com quimioterapia na 2ª linha (RIBBON-2). Este estudo demonstrou aumento
significativo da sobrevida livre de progressão e tendência para aumento de sobrevida global,
notadamente para pacientes com câncer de mama triplo negativo. Até o momento do fechamento
deste capítulo (Junho de 2011) ainda aguardamos a decisão acerca da retirada da indicação para
tratamento do câncer de mama metastático pelo FDA.
2.4. Tratamento de Pacientes com Câncer de Mama Her2 Positivo
Cerca de 20 a 25% das pacientes com câncer de mama apresentam hiperexpressão do protooncogene HER2/neu14. Existe sólida evidência na literatura de que a presença da hiperexpressão da
proteína HER2 confere a estes tumores um pior prognóstico e interfere na resposta terapêutica à
quimioterapia e à terapia endócrina, funcionando desta forma como fator prognóstico.
O trastuzumabe é o tratamento padrão para as pacientes com câncer de mama metastático
HER2 positivas15,16. Entretanto, a combinação com quimioterapia ou hormonioterapia assim como
a seqüência ideal ainda não estão estabelecidas. A escolha depende da extensão da doença, do
acometimento visceral e das morbidades associadas, da mesma forma como ocorre com as
pacientes HER2 negativas. Apenas deve ser lembrado que drogas cardiotóxicas devem ser evitadas
em função da possibilidade do uso prolongado do trastuzumabe. O uso concomitante de
antraciclinas e trastuzumabe é contra-indicado pela elevada incidência de cardiotoxicidade, muitas
vezes irreverssível.
Pode-se escolher uma dose inicial de 4mg/kg seguida de 2mg/kg semanal ou uma dose inicial
de 8 mg/kg seguida de 6mg/kg a cada 3 semanas. O trastuzumabe pode ser administrado
associado à quimioterapia com paclitaxel +/- carboplatina, docetaxel, gencitabina +/- cisplatina17,18,
vinorelbina19 ou capecitabina20. Recente estudo demonstrou equivalência da combinação de
vinorelbina com trastuzumabe quando comparada à combinação docetaxel e trastuzumabe, tanto
em resposta clínica como em sobrevida livre de progressão e sobrevida global, com uma grande
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MA N UA I S D E CO N DUTAS
vantagem no perfil de segurança para o grupo de pacientes que receberam vinorelbina e
trastuzumabe26. Após a resposta máxima ou estabilização da doença recomenda-se manter o
trastuzumabe até progressão.
Em pacientes que progridem em tratamento com quimioterapia e trastuzumabe alguns
especialistas recomendam manter o trastuzumabe além da progressão e acrescentar um novo
quimioterápico como, por exemplo, capecitabina. O estudo GBG26 foi demonstrou benefício desta
estratégia: a taxa de resposta foi maior, além de maior tempo até a progressão (embora não se
tenha documentado ganho em sobrevida global). Vale lembrar que este estudo foi interrompido
precocemente, o que levou a um menor número de pacientes randomizadas.
A alternativa padrão para as pacientes que progridem doença em vigência de trastuzumabe
é a associação de lapatinibe e capecitabina, conforme estudo de fase III no qual pacientes foram
randomizadas para capecitabina com ou sem lapatinibe. Este estudo mostrou aumento significativo
do tempo livre de progressão no braço de tratamento combinado. Outro estudo neste cenário foi
feito com a adição de lapatinibe a pacientes que já receberam trastuzumabe ou o inibidor de
tirosina-quinase isolado. O duplo bloqueio foi superior, mas ainda não há aprovação para esta
indicação. Em linhas gerais, a sugestão da literatura é que o bloqueio ao sistema HER2 deve ser
continuado, com trastuzumabe, lapatinibe ou a combinação de ambos.
Pacientes com hiperexpressão do HER2 e receptores hormonais positivos podem se beneficiar
da combinação de um agente anti-HER2 e uma terapia endócrina. O estudo TAnDEM demonstrou
aumento da sobrevida livre de progressão para pacientes na pós-menopausa que adicionaram
trastuzumabe ao anastrozol no tratamento do câncer de mama com receptor hormonal positivo e
HER2 positivo, quando comparadas à terapia isolada com anastrozol. Outro tratamento já aprovado
em pacientes que progrediram ao trastuzumabe e que têm receptores hormonais positivos é a
associação de letrozol com lapatinibe, conforme estudo GF 30008. Neste estudo, a adição de
lapatinibe ao letrozol aumentou a sobrevida livre de progressão, a taxa de resposta e o benefício
clínico, sem benefício na sobrevida global.
2.5. Duração do Tratamento
O tratamento do CMM baseado em hormonioterapia, seja com tamoxifeno, seja com
inibidores de aromatase ou com qualquer outra abordagem endócrina, pode ser extendida até a
progressão da doença. As pacientes em uso de tamoxifeno deverão ser acompanhadas quanto ao
maior risco de eventos tromboembólicos e aquelas pacientes tratadas com inibidores de aromatase
deverão ser avaliadas e seguidas quanto para a sua densidade óssea.
Ainda não há um consenso com relação à duração do tratamento do CMM com quimioterapia.
Assim, a duração ideal do tratamento na ausência da progressão de doença não é bem definida.
Pequenas vantagens em sobrevida podem representar muito para uma paciente com CMM, porém,
deve-se sempre considerar os riscos e toxicidades associados a um tratamento prolongado com
quimioterapia . Não há indicação para manutenção de quimioterapia por mais de 6-8 ciclos, salvo
situações de pacientes que continuam apresentando resposta ou benefício clínico na ausência de
efeitos colaterais limitantes. De forma prática, tem-se recomendado administrar mais 2 ciclos de
tratamento além da resposta máxima.
No uso de antraciclinas, deve-se sempre considerar a dose acumulada, respeitando-se a dose
máxima para a redução dos riscos relacionados à cardiotoxicidade. No uso de taxanos, é infrequente
a extensão além de 24 semanas (8 ciclos a cada 21 dias) pela elevada incidência de eventos
adversos.
Na ASCO de 2007, um estudo de manutenção com doxorrubicina lipossomal demonstrou
aumento do tempo até a progressão mas sem benefício de sobrevida global. O mesmo já havia
MANUAIS DE COND UTAS
| 69
sido tentado com paclitaxel, sem sucesso. Em pacientes com doença responsiva à terapia endócrina
pode ser oportuno reintroduzir hormonioterapia após a interrupção da quimioterapia.
2.6. Manejo da Doença Metastática Óssea com Bisfosfonatos
As diretrizes da ASCO publicadas em 2003 consideram os dados de superioridade do
zoledronato (Ácido Zoledrônico: 4 mg intravenoso a cada 4 semanas) sobre o pamidronato (90 mg
intravenoso a cada 3 semanas) insuficientes e recomendam igualmente os dois agentes22. O
clodronato não é aprovado nos Estados Unidos, embora seja aprovado internacionalmente,
inclusive no Brasil. O NCCN (National Comprehensive Cancer Network) de 2011 indica o uso de
zolendronato em pacientes com metástases ósseas líticas ou blásticas, com preferência para as
metástases líticas. Não está claro o tempo total de uso destes medicamentos, mas recomenda-se
atenção para o uso além de 2 anos.
Regularmente devemos checar a função renal destas pacientes e ficar atentos para o uso
concomitante com procedimentos invasivos dentários, pelo risco de osteonecrose de mandíbula.
Em pacientes que progrediram com pamidronato, pode ser tentado o zoledronato. Existem
evidências de que o denosumabe seja superior ao zoledronato na redução da incidência de fraturas
e eventos esqueléticos, mas esta droga não está disponível no Brasil até o momento.
2.7. Considerações em Pacientes Geriátricas
O número de pacientes diagnosticadas com câncer de mama e idade superior a 65 anos é
significativo e cabem aqui algumas considerações especiais para estas pacientes. A expectativa de
vida para uma mulher sem morbidades e com 65 anos fica ao redor dos 17,5 anos em países
ocidentais, enquanto que em mulheres com 80 anos sem morbidades esta expectativa gira em
torno dos 8,5 anos. A idade cronológica não pode ser um fator determinante na terapêutica, sendo
que o oncologista deve considerar as morbidades associadas e as reservas funcionais da paciente
(função cardíaca, renal, hepática e hematológica). O grau de autonomia para as atividades diárias
e o nível cognitivo também deve ser considerado. Condições de morbidades aumentam com a
idade e usualmente são os maiores fatores limitantes para a sobrevida destas pacientes e para a
tolerância ao tratamento.
A proporção de pacientes com expressão de receptores hormonais aumenta com a idade, e
a terapia endócrina é ferramenta importante para estas pacientes, especialmente quando
consideramos o perfil de segurança destes agentes. Combinando com uma maior mortalidade e
morbidade em pacientes idosas, o benefício absoluto da quimioterapia tende a ser menor quando
comparado ao benefício em pacientes jovens sem expressão de receptores hormonais.
Alguns eventos adversos da quimioterapia são mais frequentes e de maior gravidade em
pacientes idosas do que em pacientes jovens, especialmente a neurotoxicidade (taxanos, sais de
platina, alcalóides da vinca) e toxicidade renal (sais de platina, metotrexate e bisfosfonatos).
Toxicidade cardíaca (antraciclinas e trastuzumabe) também é mais frequente em pacientes idosas,
o que pode direcionar a escolha da terapêutica. Na idosa, é particularmente importante não se
esquecer de ajustar a dose do quimioterápico para a função renal e hepática.
70 |
MA N UA I S D E CO N DUTAS
2.8. Metastasectomia / Tratamento Local em Pacientes com Câncer
Avançado
Cerca de 6% das pacientes com câncer de mama em nosso país já se apresentam com doença
metastática ao diagnóstico inicial. Nestas, o tratamento cirúrgico do tumor primário, frequentemente
tem sido deixado de lado, pelo caráter irreversível da doença e pela prioridade do tratamento
sistêmico. Entretanto, nos últimos anos, alguns estudos (em sua maioria série de casos uniinstitucionais ou estudos retrospectivos de vários centros) têm destacado que aquelas pacientes
que receberam algum tipo de tratamento local (cirurgia com ou sem radioterapia ou radioterapia
isolada) apresentam benefício inclusive com maior sobrevida global. Este benefício parece ser mais
significativo nas pacientes operadas com margens livres, com toda doença macroscópica ressecada.
Deve-se ponderar a ausência de estudos prospectivos, mas em pacientes com uma boa evolução
da doença sistêmica, pode-se considerar a discussão sobre o tratamento local.
Outro cenário polêmico é o de ressecção cirúrgica de metástases, a metastasectomia. Em
diferentes cenários, esta estratégia tem recebido atenção dos pesquisadores. Em pacientes com
bom prognóstico e bom controle da doença sistêmica, alguns grupos de grandes centros (MDACC
nos EUA, por exemplo) têm apresentado resultados promissores de ressecção de metástases
hepáticas, ósseas (esterno principalmente) e mais raramente pulmonares. Há que se reforçar o caráter
excepcional destas indicações em casos altamente selecionados e por profissionais experientes
nesta estratégia. Outra alternativa que vem sendo utilizada é a ablação por radiofreqüência (ARF),
em especial nos casos extremamente selecionados de metástases hepáticas pequenas e isoladas
(de até 3cm), onde a ARF é uma alternativa à metastasectomia cirúrgica, embora o índice de falha
seja relevante.
Apêndice - Esquemas de Tratamento mais Utilizados em Câncer de Mama
Nome
Doxorrubicina
Descrição
50-75mg/m2 EV D1
Intervalo
21 dias
Docetaxel
Docetaxel+
Capecitabina
75 a 100mg/m2 EV D1
75mg/m2 EV D1 +
1000mg/m2 VO D1-14
21 dias
Paclitaxel
175mg/m2 EV D1
80mg/m2 EV D1, D8 e D15
21 dias
semanal
Vinorelbina
25 a 30mg/m2 EV D1 e D8
semanal
1.000mg/m2 VO 12/12 h por 14 dias
(dose mais correta)
1.200mg/m2 EV D1, D8 e D15
750mg/m2 EV D1 e D8 +
Cis 30mg/m2 EV D1 e D8
21 dias
Capecitabina
Gencitabina +
Cisplatina
Lapatinibe
Lapatinibe+
capecitabina
1500mg/dia VO contínuo
1250mg/dia VO contínuo +
2000mg/m2/dia D1-14 VO
21 dias
28 dias
21 dias
diário
referência
Eur J Cancer 1992;
28:1023-1028
Br J Cancer 2002;
87:1210-1215
J Clin Oncol 20:28122823, 2002
J Clin Oncol 1996;
14:1858-1867
J Clin Oncol 19:42164223, 2001
J Clin Oncol 1995;
13:2722-2730
Ann Oncol 2003;
14:1227-1233
Oncology 2001;
60:303-307
J Clin Oncol 2000;
18: 2245-2249
N Engl J Med, 2006.
355(26): p. 2733-43.
MANUAIS DE COND UTAS
Nome
Trastuzumabe
Doxorrubicina
lipossomal
CMFπ Modificado
FAC
Descrição
4mg/kg EV primeira dose, seguido de
2mg/kg EV doses subsequentes
8mg/kg EV primeira dose, seguido de
6mg/kg EV doses subsequentes
40-50 mg/m2 EV D1
Ciclofosfamida 600mg/m2 EV D1
5Fluorouracil 600mg/m2 EV D1
Metotrexate 40mg/m2 EV D1
Ciclofosfamida 500 mg/m2 EV D1
5Fluorouracil 500mg/m2 EV D1
Doxorrubicina 50mg/m2 EV D1
Vinorebina 25mg/m2 + Gemcitabina
100mg/m2 EV D1 e D15
21 dias
referência
J Clin Oncol 1999;
17: 2639-2648
J Clin Oncol 2005;
23:2162-2171
Ann Oncol 2004;
15:440-449
Eur J Cancer 1991;
27:966-970
21 dias
Cancer 1999;
85:1091-1097
Intervalo
semanal
21 dias
28 dias
| 71
GT
Gemcitabina 1.200mg/m2 EV D1 e
D8, com Paclitaxel 175mg/m2 EV D1
21 dias
PaclitaxelBevacizumabe
Paclitaxel 90 mg/m2 EV D1, D8, D15
Bevacizumabe 10 mg/Kg
Ciclofosfamida 500mg/m2 EV D1
5-Fluorouracil 500mg/m2 EV D1
Epirrubicina 75-100mg/m2 EV D1
Ciclofosfamida 50mg/dia contínuo +
Metotrexate 2,5mg/dia D1 e D2 de
cada semana com hemograma
quinzenal
Mitoxantrona 12mg/m2 EV D1
28 dias
14 dias
J Clin Oncol 2002;
20:37-41
BMC Cancer 2005;
5:151
Proc Am Soc Clin
Oncol 2004 (abs 510)
N Engl Med
357:2666, 2007
21 dias
várias
Nav-Gem
FEC
Metronômica
Mitoxantrona
28 dias
Contínuo
21 dias
π CMF modificado em cenário paliativo tem eficácia semelhante ao CMF clássico, embora em adjuvância este último seja
considerado o padrão.
Obs: 5-FU infusional, 5-FU inf + vinorelbina podem ser usados excepcionalmente
Bibliografia Sugerida
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MANUAIS DE COND UTAS
| 73
Capítulo 3
Câncer de Colo de Útero
Editora: Dra. Cristiana de Lima Tavares de Queiroz Marques
Autores: Dr. Eriberto de Queiroz Marques, Dr. Eriberto de Queiroz Marques Jr., Dr. Diego Chaves
Rezende Morais, Dra. Káthia Cristina Abdalla, Dra. Angelina Maia, Dr. Erasto Tenório Filho, Dra. Carla
Limeira Barreto, Dra. Liliane Massad Duarte Chousinho e Dra. Eliane de Oliveira Trigueiro
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MA N UA I S D E CO N DUTAS
MANUAIS DE COND UTAS
| 75
Capítulo 3
Câncer de Colo de Útero
3.1. Considerações sobre HPV e Vacinas
Atualmente, são identificados mais de 100 tipos de HPV que acometem a espécie humana.
Desses, 40 tipos são responsáveis pela infecção do trato anogenital. Aproximadamente 15 tipos
são potencialmente oncogênicos. São chamados de “Alto Risco” e os mais frequentes são os 16, 18,
45, 31, 33, 52, 58 e 35. É inegável a correlação “HPV de Alto Risco” com NEOPLASIA Intraepitelial
Cervical (NIC)/Câncer do colo do útero, da vagina, e parte dos tumores de vulva e canal anal. A
incidência de HPV oncogênico é mais elevada em mulheres jovens, mas o risco de infecção e/ou
reinfecção permanece durante toda a vida. Os subtipos de HPV chamados de ”Baixo Risco” são
aqueles que podem provocar as verrugas genitais e os mais frequentes são 6 e 11, responsáveis por
90% dos condilomas. Mais de 80% das infecções por HPV sejam elas por HPV de alto ou de baixo
risco, são transitórias, assintomáticas e se resolvem espontaneamente. Os subtipos de HPV 16 e 18
são responsáveis por até 70% dos cânceres do colo do útero em todo o mundo e a infecção
persistente por um tipo de HPV oncogênico é necessária para a formação do câncer de colo de
útero. Condições que diminuem a imunidade favorecem a oncogênese, tais como infecção pelo
HIV. O HPV tem uma proteína na sua capa chamada L1 e a partir dessa proteína foram produzidas
as “partículas semelhantes a vírus”, as chamadas VLP, que quando utilizadas nas vacinas, induzem
excelente resposta imune, além de serem seguras porque não possuem o DNA do HPV, dando a
certeza de que não irão causar infecção por este último ou a oncogênese. É possível que os altos
e sustentados níveis de anticorpos provocados pela vacinação, sejam o principal fator de proteção
contra os HPV, pois na infecção, de forma natural por este vírus também aparecem esses anticorpos,
porém, seus níveis são muito inferiores aos produzidos pela vacina contra HPV. Esta vacina tem
caráter preventivo e impede a contaminação pelos subtipos de HPV mais frequentes na gênese
do câncer ano-genital e verrugas. Na bula das vacinas a idade recomendada é de 10 a 25 anos para
a da GSK (Glaxo SmithKline) e de 9 a 26 anos para a da MSD (Merck Sharp Dohme). Os estudos
mostraram que é nessa faixa etária que se encontra o maior número de mulheres sem infecção
pelo HPV. Sem dúvida, o ideal é vacinar as mulheres mais jovens, antes do contato sexual, ou com
menor número de parceiros, porém há estudos evidenciando que essas vacinas são imunogênicas
e seguras até os 55 anos de idade. Embora, haja contra-indicação para o uso da vacina na gestação,
os estudos não evidenciaram problemas nem para o feto, nem para a gestante que fez uso da
vacina no início da gravidez. Contudo, por precaução, se a mulher engravidar durante o esquema
da vacinação o mesmo deverá ser interrompido e reiniciado um mês após o parto a partir da dose
realizada, não sendo necessário reiniciar o esquema. Não é recomendada a vacinação com as duas
vacinas de forma sequencial (uma após a outra). O esquema vacinal completo é feito com três
doses em seis meses. Caso haja descontinuação das doses, será recomendado continuar o esquema
a partir da dose feita, isto é, não precisa reiniciar o esquema. Mesmo após a vacinação faz-se
necessário manter os exames preventivos de rotina (citologia e colposcopia). Existem duas vacinas
aprovadas pelos órgãos regulatórios:
• Vacina contra HPV oncogênico (16 e 18, recombinante, com adjuvante AS04) da GSK (Glaxo
Smith Kline). Esquema vacinal: três doses com 0, 1 e 6 meses, via IM.
• Vacina quadrivalente recombinante contra HPV (Tipos 6, 11, 16 e 18) da MSD (Merck Sharp
Dohme). Esquema vacinal: três doses com 0, 2 e 6 meses, via IM.
76 |
MA N UA I S D E CO N DUTAS
3.2. Subtipos Histológicos
Os carcinomas epidermóides representam cerca de 80% dos subtipos histológicos enquanto
os subtipos restantes são compostos pelos adenocarcinomas e suas variantes (endometrióide,
células claras, adenoescamoso, adenocístico, adenobasal e carcinoma Glassy Cell) que juntos perfazem
os 20% restantes. Há controvérsias em relação à agressividade daqueles dois tipos histológicos,
porém alguns estudos evidenciam agressividade maior nos adenocarcinomas sugerindo que os
adenocarcinomas e os carcinomas adenoescamosos têm prognóstico mais reservado quando
comparados aos carcinomas escamosos, particularmente quando há extensão extracervical1. Não
há diferença nas opções terapêuticas utilizadas em relação aos subtipos histológicos.
3.3. Estadiamento (FIGO) / TNM (AJCC, 2010)
0: carinoma in situ ou neoplasia intraepitelial grau III. IA/T1a: carcinoma invasivo
diagnosticado somente pela microscopia; invasão do estroma cervical ≤ 5mm e a extensão ≤ 7mm;
IA1/T1a1: invasão do estroma ≤ 3mm e a extensão ≤ 7mm; IA2/T1a2: invasão do estroma >3mm
e ≤ 5mm e extensão ≤ 7mm; IB/T1b: lesão clínica confinada ao colo uterino ou lesão microscópica
maior que a do estádio IA; IB1/T1b1: lesão clínica ≤ 4cm; IB2/T1b2: lesão > 4cm; II/T2: tumor invade
além do útero, mas não a parede pélvica ou o terço inferior da vagina; II/T2a: ausência de invasão
dos paramétrios; IIA1/T2a1: lesão clínica ≤ 4cm; IIA2/T2a2: lesão clínica > 4cm; IIB/T2b: invasão
de paramétrios; III/T3: extensão do tumor até parede pélvica ou envolvimento do1/3 inferior da
vagina sem extensão para a parede pélvica; IIIB/T3b: extensão até a parede pélvica e/ou
hidronefrose ou rim não funcionante; IIIB/N1: metástases para linfonodos regionais; IV: extensão
além da pelve verdadeira ou invasão (confirmada por biópsia) da mucosa da bexiga ou reto. Edema
bolhoso vesical apenas não permite que um caso seja alocado no estádio IV; IVA/T4: invasão de
órgãos adjacentes; IVB/M1: doença à distância.
I T1N0M0
II T2N0M0
III T3N0M0
IA T1aN0M0
IIA T2aN0M0
IIIA T3aN0M0
IV
IVA T4N0-1M0
IA1 T1a1N0M0
IIA1 T2a1N0M0
IIIB T3bN0M0
T1-3N1M0
IVB T1-3N0-1M1
IA2 T1a2N0M0
IIA2 T2a2N0M0
IIB T2bN0M0
3.4. Exames de Estadiamento
• Exame físico e ginecológico (especular, toque vaginal e retal);
• Hemograma completo, creatinina sérica, glicemia de jejum, fosfatase alcalina, TGO (AST),
TGP (ALT);
• ECG e parecer cardiológico;
• Marcadores virais de hepatite B e C, teste anti-HIV;
• Radiografia do tórax e Ultrassonografia do abdome total;
• TC ou RNM do abdome total devem ser solicitados em casos selecionados objetivando avaliar
o acometimento linfonodal2;
• Uretrocistoscopia com ou sem biópsia e Retossigmoidoscopia com e sem biópsia podem ser
solicitados em casos suspeitos de invasão vesical e retal nos estágios IIB, III e IV2;
MANUAIS DE COND UTAS
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• PET-CT pode adicionar informações em relação ao acometimento linfonodal para-aórtico
como fator excludente de cirurgia, porém ainda não há dados que estabelecem sua solicitação de
rotina no estadiamento do câncer cervical 2-3;
3.5. Tratamento
3.5.1. Estágio IA1: tumores microinvasivos
O tratamento de escolha é o cirúrgico sendo a histerectomia total preconizada se a
profundidade da invasão for menor que 3mm comprovadamente pela conização com as margens
de ressecção cirúrgicas livres e ausência de invasão vascular ou dos canais linfáticos. Nestes casos,
a frequência de metástase linfonodal é mínima não justificando a linfadenectomia. Conservam-se
os ovários em pacientes com idade inferior a 50 anos. A ooforectomia será indicada na presença
simultânea de patologia própria do ovário. A conização é uma opção se a profundidade da invasão
for menor que 3mm, com AUSÊNCIA de invasão vascular ou dos canais linfáticos e as margens de
ressecção cirúrgica do cone forem NEGATIVAS. Conização pura é apropriada para aquelas pacientes
que querem preservar a fertilidade.4,5,6,7,8,9 Estes tumores apresentam baixo risco de acometimento
parametrial e taxa de comprometimento dos linfonodos pélvicos inferior a 1%. Sendo assim,
pacientes inoperáveis devido a comorbidades, podem ser tratadas com sucesso com braquiterapia
exclusiva (06 inserções de 7Gy cada de braquiterapia de alta taxa de dose). Os resultados com
braquiterapia isolada para tumores microinvasivos são excelentes, comparáveis aos obtidos em
séries cirúrgicas, com taxas de sobrevida livre de progressão em 10 anos de 98-100% e com perfil
de toxicidade bastante favorável 10.
3.5.2 . Estágio IA2, IB1 e IIA1: tumores invasivos iniciais não-volumosos
3.5.2.1. Cirurgia
• Estágio IA2: a histerectomia radical modificada (Tipo II de PIVER) é selecionada em
pacientes com invasão tumoral entre 3mm e 5mm. Tal conduta é fundamentada em evidências de
até 10% de metástase linfonodal. A injeção de 2mL de azul patente no colo uterino durante a
cirurgia traz benefício ao permitir melhor identificação da rede linfática tumoral.
• Estágio IB1: a histerectomia radical com linfadenectomia pélvica bilateral (TIPO III de PIVER
ou Wertheim-meigs). Conservação dos ovários em pacientes até 50 anos. Ooforopexia nas goteiras
parieto-cólicas para retirar os ovários do campo de tratamento radioterápico em caso de
necessidade de radioterapia adjuvante. Castração cirúrgica nas pacientes climatéricas ou com
patologias próprias dos ovários. Como artifício técnico para diminuir a incidência de margens de
ressecção cirúrgica vaginal exígua ou comprometida recomenda-se uma abordagem via vaginal
para delimitar a margem vaginal adequada no primeiro tempo cirúrgico. Faz-se a mensuração
macroscópica ou criomicrotomia, em sala cirúrgica para o estudo das margens. A injeção de 2mL
de azul patente no colo uterino durante a cirurgia traz benefício ao permitir melhor identificação
da rede linfática tumoral. Na ocasião, a linfadenectomia para-aórtica é assertiva para fins de
estadiamento e prognóstico e nas mãos de um cirurgião oncológico experiente não aumentará a
morbidade. Outrossim, tal procedimento orientará o rádio-oncologista na sua programação de
tratamento adjuvante em caso de evidência de metástase na região para-aórtica11.
• Estádio IB2: a conização semiótica, APÓS O TRATAMENTO PRIMÁRIO, em casos tecnicamente
factíveis para fins de evidenciar presença de doença residual viável e neste caso realizar Wertheimmeigs com linfadenectomia para-aórtica em pacientes operáveis(Salvage Surgery). A injeção de
2mL de azul patente no colo uterino durante a cirurgia traz benefício ao permitir melhor
identificação da rede linfática tumoral que se encontram modificados pelas reações actínicas. Como
artifício técnico para diminuir a incidência de margens de ressecção cirúrgica vaginal exígua ou
78 |
MA N UA I S D E CO N DUTAS
comprometida recomenda-se uma abordagem via vaginal para delimitar a margem vaginal
adequada no primeiro tempo cirúrgico. Faz-se a mensuração macroscópica ou criomicrotomia, em
sala cirúrgica para o estudo das margens 11.
• Estádio IIA: Histerectomia radical com linfadenectomia pélvica bilateral (Tipo III de PIVER
ou Wertheim-meigs), com colpectomia proximal adequada (margem vaginal mínima deverá distar
2,5cm do tumor). Como artifício técnico para diminuir a incidência de margens de ressecção
cirúrgica vaginal exígua ou comprometida recomenda-se uma abordagem via vaginal para delimitar a margem vaginal adequada no primeiro tempo cirúrgico. Faz-se a mensuração macroscópica
ou criomicrotomia, em sala cirúrgica para o estudo das margens. Conservação dos ovários em
pacientes até 50 anos. Ooforopexia nas goteiras parieto-cólicas para retirar os ovários do campo de
tratamento radioterápico em caso de necessidade de radioterapia adjuvante. Castração cirúrgica
nas pacientes climatéricas ou com patologias próprias dos ovários. A injeção de 2mL de azul patente
no colo uterino durante a cirurgia traz benefício ao permitir melhor identificação da rede linfática
tumoral. Na ocasião, a linfadenectomia para-aórtica é assertiva para fins de estadiamento e
prognóstico e nas mãos de um cirurgião oncológico experiente não aumentará a morbidade.
Outrossim, tal procedimento orientará o rádio-oncologista na sua programação de tratamento
adjuvante em caso de evidência de metástase na região para-aórtica11.
3.5.2.1. Radioterapia
Nessas pacientes, os resultados terapêuticos são excelentes. A cirurgia ou a radioterapia
proporcionam a mesma chance de cura, devendo o tratamento ser individualizado. Somente um
único estudo prospectivo de fase III, publicado por Landoni, comparou a cirurgia com a radioterapia
em pacientes com tumores iniciais de colo uterino. Este importante estudo randomizou 343
pacientes com tumores estágio IB e IIA para cirurgia radical ou radioterapia exclusiva. Os resultados
demonstraram não haver diferença entre as duas modalidades de tratamento na sobrevida global
(83% em ambos os grupos), bem como na sobrevida livre de doença (74% em ambos os grupos)12.
Além disso, a radioterapia esteve associada a um melhor perfil de toxicidade, com taxa de
complicações grau II e III de 28% no grupo da cirurgia e de 12% no grupo da radioterapia
(p=0,0004).12 Com base nos resultados deste estudo, tanto a cirurgia quanto a radioterapia são
consideradas opções de tratamento adequadas para esse grupo de pacientes, devendo a escolha
ser discutida com o paciente e particularizada para cada caso. Nos casos em que se opta pela
radioterapia, recomenda-se o uso de 45-50Gy de radioterapia externa sobre pelve com ou sem
quimioterapia semanal a base de platina e posterior braquiterapia (04 inserções de 7Gy cada ou 05
inserções de 6Gy cada com braquiterapia de alta taxa de dose) 13, 14.
3.5.2.3. Radioterapia e Quimioterapia Adjuvantes
Em pacientes inicialmente tratadas com cirurgia, a radioterapia adjuvante exclusiva deve ser
recomendada se houver pelo menos dois dos critérios abaixo:
• presença de invasão linfovascular;
• histologia desfavorável (adenocarcinoma ou adenoescamoso);
• tumores grau III;
• presença de invasão estromal profunda;
• tumores com mais de 4cm.
Tais pacientes apresentam risco intermediário de recidiva e o uso da radioterapia adjuvante é
justificado por estudo randomizado de fase III publicado pelo GOG (GOG 92/RTOG 8706). Este estudo
incluiu 277 pacientes submetidas à histerectomia radical e linfadenectomia pélvica e que apresentavam
pelo menos dois dos critérios acima. Os resultados, recentemente atualizados, demonstraram que o
uso da radioterapia adjuvante neste contexto proporcionou redução de 46% no risco de recorrência
e redução significativa no risco de progressão ou morte (hazard ratio 0,58, p=0,007) 15, 16.
MANUAIS DE COND UTAS
| 79
A radioterapia adjuvante em concomitância com a quimioterapia deve ser preferida em
pacientes com critérios de alto risco para recidiva após cirurgia:
• linfonodos positivos;
• margem exígua (<3mm) ou positiva;
• paramétrios comprometidos.
Em pacientes com tais achados histológicos, existem evidências de estudo de fase III, também
publicado pelo GOG (GOG 109/SWOG 8797), com 268 pacientes. Este estudo incluiu pacientes
inicialmente tratadas com cirurgia e que apresentavam pelo menos um dos critérios acima, as quais
foram randomizadas para radioterapia adjuvante com ou sem quimioterapia associada (o
tratamento quimioterápico neste estudo baseou-se em cisplatina 70mg/m2 e fluorouracil
1000mg/m2 infusão contínua por 4 ciclos). Os resultados demonstraram que a adição da
quimioterapia baseada em platina proporcionou ganho na sobrevida livre de doença em 4 anos
(63% com radioterapia adjuvante versus 80% com radioquimioterapia adjuvante, p=0,003) e na
sobrevida global em 04 anos (71% versus 81%, respectivamente, p=0,007) 17. Estudo fase III
publicado como abstract da ASCO 2010 avaliou a associação de radioterapia à quimioterapia
baseada em platina administrada de forma adjuvante em 271 pacientes portadoras de câncer
cervical de alto risco e seu objetivo foi comparar quimioradioterapia com cisplatina 40mg/m2
semanal à combinação de paclitaxel 175mg/m2 e carboplatina AUC5 a cada 3 semanas seguido de
radioterapia (50,4Gy). Os critérios de inclusão foram histerectomia e dissecção linfonodal prévia por
câncer cervical estádios IIB ou IB-IIA e pelo menos um dos seguintes fatores de risco: linfonodo
positivo, invasão vascular, invasão linfática, histologia de adenocarcinoma ou estágio > T1b1. A
sobrevida livre de progressão (objetivo primário) em dois anos foi de 82,2% (95%IC 75,1 – 89,3) para
o braço do CDDP versus 88% (95%IC: 82,1 – 93.9) no braço do taxane (p=0,126) e a sobrevida global
em 5 anos foi 85,8% para o braço do CDDP e 78,9% para o braço do taxane (p=0,251). Toxicidade
hematológica graus 3/4 foi superior no braço do CDDP e alopecia (p<0,001) e neurotoxicidade
(p<0,001) no braço do taxane 18. Este estudo não evidencia superioridade do braço contendo
taxane e por isso ele pode ser considerado uma alternativa em pacientes não candidatas ao uso da
cisplatina. Atualmente, existem dois estudos em andamento que buscam elucidar melhor o papel
do tratamento adjuvante nos tumores de colo uterino ressecados: GOG 263 e GOG 724. No GOG
263, estão sendo recrutadas pacientes com tumores de colo uterino submetidas à histerectomia e
linfadenectomia pélvica que apresentam invasão linfovascular associada a pelo menos um dos
seguintes critérios: invasão estromal profunda (terço profundo); penetração de 2/3 do estroma e
tumor com mais de 2 cm de diâmetro; penetração superficial do estroma e tumor de pelo menos
5cm de diâmetro. Já as pacientes sem invasão linfovascular devem ter invasão de pelo menos 2/3
do estroma e tumor com pelo menos 4 cm de diâmetro. A randomização é entre radioterapia
adjuvante isolada ou radioquimioterapia adjuvante com cisplatina semanal 19. Já o estudo GOG
724, está incluindo pacientes tratadas inicialmente com cirurgia com pelo menos um dos seguintes
critérios: linfonodos pélvicos positivos, paramétrios comprometidos ou linfonodos para-aórticos
positivos, complemente ressecados e com PET-CT negativo após cirurgia. Estas pacientes são
randomizadas para radioquimioterapia adjuvante baseada em cisplatina semanal seguida ou não
por carboplatina e paclitaxel por 04 ciclos 20. Ambos os estudos estão atualmente recrutando pacientes
e seus resultados podem mudar o contexto da adjuvância nos tumores de colo uterino no futuro.
3.6. Estágio IB2, IIA2: tumores invasivos iniciais volumosos
Com base nos resultados do estudo prospectivo italiano citado anteriormente, a cirurgia não
representa uma boa opção de tratamento para tumores iniciais volumosos. Isso se justifica por
dois motivos. Primeiro, porque os resultados da cirurgia, em termos de sobrevida global e controle
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MA N UA I S D E CO N DUTAS
local, são equivalentes aos obtidos com radioterapia exclusiva, não havendo diferença entre ambas
as modalidades terapêuticas em termos de curabilidade 5. Segundo, porque a maioria das pacientes
com tumores volumosos (60-80%) submetidas à cirurgia como tratamento inicial irão necessitar de
tratamento adjuvante com radioterapia, associada ou não à quimioterapia, o que resulta em um
perfil de toxicidade bastante desfavorável 5. Sendo assim, pacientes com tumores iniciais volumosos
devem ser preferencialmente tratadas com radioterapia associada à quimioterapia (categoria 1 do
NCCN). Os esquemas quimioterápicos utilizados nesse contexto serão os mesmos abordados nos
tumores localmente avançados. As doses recomendadas são semelhantes às utilizadas para
tumores não volumosos: 45-50Gy de radioterapia externa sobre pelve em associação com
quimioterapia semanal a base de platina e posterior braquiterapia (04 inserções de 7Gy cada ou 05
inserções de 6Gy cada com braquiterapia de alta taxa de dose) 6,7.
3.7. Estágio IIB, III e IVA: tumores localmente avançados
3.7.1. Cirurgia
• Estádio IIB: a conização semiótica APÓS O TRATAMENTO PRIMÁRIO e, em casos
tecnicamente factíveis, para fins de evidenciar presença de doença residual viável e em caso de
RESSECABILIDADE, realizar WERTHEIM-MEIGS AMPLIADA com linfadenectomia para-aórtica em
pacientes operáveis (SALVAGE SURGERY). A injeção de 2mL de azul patente no colo uterino no
transcirúrgico não traz benefícios técnicos uma vez que os canais linfáticos se encontram
modificados pelas reações actínicas. Como artifício técnico para diminuir a incidência de margens
de ressecção cirúrgica vaginal exígua ou comprometida recomenda-se uma abordagem via vaginal
para delimitar a margem vaginal adequada no primeiro tempo cirúrgico. Faz-se a mensuração
macroscópica ou criomicrotomia, em sala cirúrgica para o estudo das margens.
• Estádio IIIA e IIIB: biópsias vaginais e conização semiótica APÓS O TRATAMENTO PRIMÁRIO.
Em caso de doença residual e RESSECABILIDADE realizar WERTHEIM-MEIGS AMPLIADA,
COLPECTOMIA ADEQUADA e linfadenectomia para-aórtica em pacientes operáveis (Salvage
Surgery). Como artifício técnico para diminuir a incidência de margens de ressecção cirúrgica
vaginal exígua ou comprometida (o que não deve ocorrer, pois não haveria mais terapia adjuvante
disponível), recomenda-se uma abordagem via vaginal para delimitar a margem vaginal adequada
no primeiro tempo cirúrgico. Faz-se a mensuração macroscópica ou criomicrotomia, em sala
cirúrgica para o estudo das margens. A injeção de 2mL de azul patente no colo uterino no
transcirúrgico não traz benefícios técnicos uma vez que os canais linfáticos se encontram
modificados pelas reações actínicas.
• Estádio IVA: Cirurgias exenterativas com intenção curativa em pacientes operáveis
selecionados e em caso de doença residual ressecável. Cirurgias paliativas para fins de melhorar
qualidade de vida.
3.7.2. radioterapia e Quimioterapia
Nas pacientes com tumores localmente avançados, o tratamento padrão é a radioterapia
concomitante à quimioterapia baseada em platina, ficando a cirurgia reservada para os casos de
recidiva ou persistência de doença. Diversos estudos randomizados 21, 22 bem como meta-análises24
demonstraram o benefício em termos de controle local e sobrevida global obtido com a adição da
quimioterapia à radioterapia, tornando o tratamento combinado a terapêutica padrão em tumores
localmente avançados de colo uterino. Estudos prévios demonstraram que 70% dos pacientes com
estádio III e 83% daqueles com estádio II recorriam cerca de 24 meses após a radioterapia exclusiva.
Estima-se que o benefício da adição da quimioterapia à radioterapia consista na redução de 36%
no risco de morte 25, 26. As doses de radioterapia recomendadas são as mesmas citadas
MANUAIS DE COND UTAS
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anteriormente e mesmo em pacientes com tumores avançados as taxas de sobrevida global em 5
anos são relativamente satisfatórias com o tratamento combinado, sendo de 70-80% para tumores
IIB, 50-60% para tumores IIIB e 15-25% para tumores IVA 27. Estudo fase III do GOG incluiu 526
pacientes randomizando-as em três braços sendo que o primeiro continha cisplatina em
monoterapia, o segundo cisplatina, fluorouracil e hidroxiuréia e o terceiro hidroxiuréia isolada todos
concomitantes com radioterapia. Com seguimento de 106 meses, evidenciou-se aumento da
sobrevida livre de progressão e da sobrevida global nos braços contendo platina (p< 0,001)
inclusive para os estádios IIB e III (p< 0,025 para cada estágio). O risco relativo de progressão ou
morte foi 0,57 (95% IC, 0,43-0,75) com cisplatina e 0,51 (95% IC, 0,38-0,67) com esquemas
combinados com cisplatina quando comparado com hidroxiuréia isolada 28. Estudo apresentado na
ASCO de 2009 com 515 pacientes portadoras de tumor de colo de útero com estádios IIB-IVA, sem
envolvimento em linfonodos para-aórticos, randomizadas para receber cisplatina e gencitabina
semanais por 6 semanas concomitante à radioterapia externa seguida de braquiterapia e dois ciclos
adicionais adjuvantes de cisplatina e gencitabina comparado com cisplatina isolada semanal
durante a radioterapia externa por 6 semanas seguida de braquiterapia. O braço das duas drogas
foi superior em relação à sobrevida livre de progressão em 3 anos (74,4 x 65%, HR 0,68, 95% IC
0,37–0,77, p=0,001) e sobrevida global (HR 0,68, 95%IC 0,49–0,95, p=0,022). O dado mais
importante neste estudo foi a redução da incidência de metástases à distância (8,1 x 16,4%, HR
0,45, 95%IC 0,26–0,78, p=0,005). O braço das duas drogas apresentou toxicidade considerável
quando comparado ao da monoterapia, muito embora seja uma toxicidade manejável 29. Apesar
das taxas de respostas apresentadas acima, o esquema com duas drogas ainda não é padrão e
considerado como nível de evidência 2B pelo NCCN. Ainda não há definição quanto à quimioterapia
a ser utilizada em pacientes com contra-indicação à cisplatina, porém alguns estudos evidenciam
resposta completa ou parcial com capecitabina ou taxol associado à carboplatina. O uso das novas
tecnologias na radioterapia deve ser encorajado, principalmente em situações especiais como em
pacientes com rim pélvico ou múltiplas cirúrgicas pélvicas prévias. Neste contexto, a radioterapia
de intensidade modulada (IMRT) pode reduzir a dose nos órgãos de risco, principalmente intestino
delgado e bexiga, preservando a cobertura do volume tumoral 30. As evidências disponíveis na
literatura não demonstram ganho no controle local ou na sobrevida com o uso do IMRT, mas essa
técnica pode minimizar a toxicidade aguda gastrointestinal e hematológica 31, 32. É importante
ressaltar que quando se opta pelo tratamento combinado com radioterapia, quimioterapia e
braquiterapia, é fundamental que o tempo total do mesmo seja o menor possível e não ultrapasse
08 semanas, pois o aumento na duração do tratamento acarreta piora no controle local e na
sobrevida global 33, 34. Outro aspecto relevante a ser mencionado é a importância prognóstica dos
níveis séricos de hemoglobina durante tratamento. É bem documentado o impacto adverso da
anemia nas pacientes tratadas com radioterapia 35, sendo recomendada por muitos autores a
manutenção dos níveis de hemoglobina acima de 10 ou 11 g/dL durante o tratamento 36.
Permanece incerto, porém, se o efeito prognóstico negativo da anemia representa uma relação
direta de causa e efeito ou se a anemia seria na verdade apenas uma indicação indireta de tumores
mais avançados e volumosos. É também altamente discutível o real benefício do uso da
eritropoetina na correção dos níveis séricos de hemoglobina destas pacientes, em virtude dos
resultados altamente discordantes disponíveis na literatura 37. Atualmente, há um estudo em
andamento buscando avaliar o papel da quimioterapia adjuvante ao tratamento combinado
radioquimioterápico. O estudo OUTBACK está recrutando pacientes com tumores localmente
avançados de colo uterino que estão sendo randomizadas para radioquimioterapia concomitante
baseada em cisplatina com ou sem quimioterapia adjuvante (4 ciclos de carboplatina e paclitaxel)38.
Os resultados deste estudo podem trazer novas informações sobre o possível benefício da
quimioterapia adjuvante nestas pacientes.
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3.8. recidiva Local
A recidiva local ou sistêmica, da neoplasia de colo uterino, está relacionada ao estádio inicial da
doença 39. As taxas de recorrência local variam de 10% a 20%, após tratamento da doença precoce,
com histerectomia radical, e em metade destes casos, a recorrência é limitada à pelve 40, 41. Nestes
casos de recidiva local da doença, o tratamento a ser empregado depende de qual tratamento
primário foi realizado inicialmente. Cirurgias exenterativas com intenção curativa podem ser
orientadas em pacientes operáveis altamente selecionadas em caso de doença recorrente
ressecável e cirurgias paliativas têm sua aplicabilidade para fins de melhorar a qualidade de vida,
como colostomias, derivações urinárias nos casos de fístulas, ligadura das artérias ilíacas internas
nos casos de hemorragias incontroláveis pelas méodos conservadores.
• Pacientes submetidas à radioterapia prévia - Pacientes submetidas à cirurgia seguida
de radioterapia ou à radioterapia exclusiva, são candidatas à cirurgia (histerectomia radical,
vaginectomia parcial ou exenteração pélvica) com potencial curativo, na ausência de doença
metastática e sem fixação da parede pélvica, dependendo da extensão da lesão42. Quando há
fixação da parede pélvica, as pacientes são consideradas inoperáveis, sendo indicada quimioterapia
paliativa, com combinação de agentes: paclitaxel 175mg/m² EV, durante 3 horas, seguido de
cisplatina 50mg/m² EV, no D1, a cada 3 semanas; ou TIP – paclitaxel 175mg/ m² EV, em infusão de
3 horas, no D1, cisplatina 70mg/m² EV, no D2, e ifosfamida 1,5g/m² EV, do D1 ao D3, com suporte
de G-CSF do D7 ao D11, a cada 4 semanas. Alternativas incluem vinorelbina 30mg/m², nos D1 e D8,
com cisplatina, 50mg/m² EV, no D1, a cada 3 semanas, ou gencitabina 1.000mg/m², nos D1 e D8,
com cisplatina 50mg/m², no D1, a cada 3 semanas; ou topotecano 0,75mg/m², nos D1, D2 e D3, com
cisplatina 50mg/m², no D1. Em pacientes que apresentam contraindicação à cisplatina,
favorecemos carboplatina AUC5 EV, no D1, e paclitaxel 175mg/m² EV, em infusão de 3 horas, no D1,
a cada 3 semanas 43, 44, 45. Em pacientes com baixo performance status ou com importantes
comorbidades associadas recomenda-se quimioterapia paliativa com agentes únicos: cisplatina
50mg/m² EV, no D1, a cada 3 semanas, caso não haja exposição prévia, exceto se usada como
radiossensibilizante. Outras opções também podem ser usadas para paliação após falha ou contraindicação à cisplatina: paclitaxel 80mg/m² EV, semanalmente; vinorelbina 25-30mg/m² EV,
semanalmente; ifosfamida 1,2g/m² (com mesna) EV, do D1 ao D5, a cada 3 semanas; irinotecano
350mg/m² EV, a cada 3 semanas (ou alternativamente 125mg/m² EV, nos D1 e D8, a cada 3
semanas); gencitabina 800 mg/m² EV, nos D1, D8 e D15, a cada 4 semanas 46.
• Pacientes não submetidas a radioterapia prévia - A radioterapia é uma opção curativa, em
mulheres submetidas à tratamento primário cirúrgico exclusivo. A dose de irradiação na pelve total,
dependendo do volume tumoral, deve ser de 45-50Gy, podendo ser feito complemento de dose em
paramétrios até 60Gy. A braquiterapia intracavitária, com alta taxa de dose ou baixa taxa de dose, deve
ser considerada para melhor controle de doença em vagina 47, 48. A cisplatina 40mg/m²/semana, durante
6 semanas (iniciando no primeiro dia da radioterapia externa), deve ser utilizada como radiosensibilizante 49.
• recorrência isolada em linfonodos para-aórticos - Após a irradiação pélvica, a taxa de
recorrência nos linfonodos para-aórticos é de cerca de 3%, devendo ser a paciente tratada de
maneira agressiva com radioterapia externa hiperfracionada, 60Gy com 1,2Gy/fração, duas frações
ao dia, ou radioterapia com fracionamento convencional (50 Gy em 25 frações), campo de T12 a L5
(preferencialmente com IMRT), concomitante à quimioterapia baseada em cisplatina. 50, 51
3.9. Doença Metastática
Aquelas pacientes que apresentam doença metastática à distância, após tratamento inicial
com quimiorradioterapia, raramente são curáveis. Na maioria dessas pacientes, a quimioterapia
MANUAIS DE COND UTAS
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paliativa ou suporte básico com cuidados paliativos será a melhor opção.
• Quimioterapia combinada: a cisplatina é considerada o mais efetivo agente para tratamento do câncer cervical metastático. No entanto a maioria dos pacientes que desenvolvem
metástases à distancia já tem história de tratamento prévio a radioquimioterapia com platina, e
estes podem não ser muito sensíveis ao tratamento com a platina isolada. Por isso, a maioria dos
estudos realizados para o tratamento da doença metastática tem sido direcionada para o
tratamento com associações da platina (cisplatina ou carboplatina) associado a outros tipos de
drogas que possam potencializar o efeito do tratamento e melhorar a sobrevida e qualidade de vida
destes pacientes 52, 53, 54, 55, 56, 57, 58. Entre estes regimes combinados de quimioterapia as combinações
de cisplatina + paclitaxel e cisplatina + topotecan têm sido extensivamente estudadas. Há alguns
estudos de fase III, como o GOG 169, GOG 179 e o GOG 204, os quais avaliam o tratamento destes
pacientes com regimes de combinações associadas à quimioterapia com cisplatina. O GOG 169 foi
um estudo randomizado, fase III, o qual comparou em 264 pacientes o tratamento com cisplatina
+ paclitaxel versus o tratamento com cisplatina isolada. Neste estudo, houve uma taxa de resposta
de 36% x 19%, aumento na sobrevida livre de progressão de 4,8 x 2.8 meses, no entanto, não houve
aumento na sobrevida global. O tratamento com associação de cisplatina e paclitaxel apresentou
um significante aumento na qualidade de vida dos pacientes estudados. A associação carboplatina
e paclitaxel ainda não foi estudada em estudos randomizados e prospectivos, mas muitos médicos
a usam pela melhor facilidade de aplicação e tolerabilidade dos pacientes52. O estudo GOG 179
randomizado, fase III, 294 pacientes foram tratadas com os regimes de cisplatina + topotecano
versus cisplatina isolada. Neste estudo, as pacientes submetidas ao tratamento com topotecano
apresentaram melhores resultados. Foi demonstrada maior taxa de resposta (27x 13%), maior
sobrevida livre de progressão (4,6 x 2,9 meses) e maior sobrevida mediana (9,4 x 6,5 meses). No
entanto, os esquemas com cisplatina/ carbolatina + paclitaxel são regimes muito menos tóxicos e
com maior facilidade de administração e manejo dos pacientes do que os esquemas com cisplatina
+ topotecano 53. O estudo do GOG 204 estratificou pacientes com doença metastática ou recorrente.
Estudo randomizado, fase III, no qual 513 pacientes foram submetidas ao tratamento com
esquemas combinados de quimioterapia associadas à cisplatina. Os esquemas continham cisplatina
+ paclitaxel, cisplatina + gencitabina, cisplatina + topotecano ou cisplatina + vinorelbina. Este
estudo foi fechado precocemente porque houve uma superioridade com o esquema de cisplatina
+ paclitaxel e nenhum dos outros braços apresentou superioridade. Não houve diferença
significativa na sobrevida global, no entanto houve uma maior taxa de resposta, sobrevida livre
de progressão e sobrevida global (21,9 x 10 meses) para o regime com cisplatina + paclitaxel, bem
superior aos outros esquemas. Cisplatina + paclitaxel foi associado com menos trombocitopenia
e anemia, mas houve uma maior incidência de náuseas e vômitos, infecções e alopecia. Cisplatina
+ gencitabina não se mostrou superior, mas se mostrou bastante útil em pacientes com
neurotoxicidade importante com algum dos outros esquemas e pode ser indicado em pacientes
com neuropatia não tolerável 54.
• Carboplatina x Cisplatina - Até o momento muitos médicos preferem usar carboplatina ao
invés da cisplatina por causa da fácil administração, tolerabilidade e também da melhor preservação da função renal conferida pela carboplatina. Há um estudo retrospectivo que confirma estas
afirmações sobre a carboplatina e não mostra diferença em relação à sobrevida global. Há alguns
estudos que fazem uso da carboplatina + paclitaxel, todos fase II e com pequeno número de
pacientes, os quais demonstram boa sobrevida, que vai de 13 a 21 meses. No momento, há um
estudo fase III em andamento, o qual compara o esquema cisplatina + paclitaxel x carbopaltina +
paclitaxel, mas ainda aguardamos o resultado 54,55,56,59,60,61.
• Quimioterapia com Agentes Isolados - A cisplatina é o agente quimioterápico mais usado
no tratamento da doença recorrente ou metastática e além de ser o mais ativo agente, é o mais
recomendado para ser usado como primeira linha quimioterápica como agente isolado. O seu uso
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isolado tem uma taxa de resposta de ate 20-30%, e com ocasional resposta completa. A sobrevida
global conferida com a cisplatina é em torno de 6 a 9 meses. Carboplatina ou paclitaxel também
têm sido muito utilizados como agentes isolados. Estas são as principais drogas mais racionalmente
usadas no tratamento de primeira linha como agentes isolados nas pacientes com câncer de colo
uterino, nas quais não haja mais nenhuma proposta cirúrgica ou radioterápica de tratamento. Há
uma boa resposta com tratamento utilizando o topotecano, inclusive com a apresentação de
respostas completas como no caso do paclitaxel, porém o topotecano apresentou muito maior
toxicidade. Há estudos com outros agentes quimioterápicos como bevacizumabe, fluorouracil,
gencitabina, ifosfamida, irinotecano, pemetrexede e vinorelbina. Algumas dessas drogas
apresentam boa taxa de resposta e melhora da sobrevida livre de progressão e da qualidade de
vida, mas todos esses estudos não são randomizados, são de fase II e, na maioria, usados em
segunda linha terapêutica. As vacinas não têm sido aplicadas como tratamento, mas há alguns
estudos em investigação73,74 e as terapias com drogas alvo (anticorpos monoclonais ou pequenas
moléculas) também vêm sendo estudados 63,75. Nos tumores metastáticos, o tratamento deve ser
pautado fundamentalmente na quimioterapia. Porém, a radioterapia pode ser utilizada para
pacientes com tumores pélvicos volumosos com intenção anti-álgica e/ou anti-hemorrágica. São
recomendados esquemas curtos, 30Gy em 10 frações, por exemplo, os quais proporcionam boa
melhora das queixas álgicas, bem como de possíveis sangramentos vaginais. Esquemas mais curtos
tais como, duas frações de 10Gy cada ou 06 frações (02 frações diárias) de 3,7Gy cada, podem ser
usados, porém estão associados à toxicidade aguda significativamente maior16.
3.10. Cuidados Paliativos
Pacientes podem ser acompanhados pelo serviço de cuidados paliativos, desde o início do
tratamento da doença metastática ou recorrente ou desde que sejam refratários ao tratamento
sistêmico ou apresentem muitas comorbidades, estado geral comprometido ou outras
complicações.
3.11. Considerações do Câncer Cervical na Paciente HIV +
O HPV e o vírus da imunodeficiência humana (HIV) são transmitidos sexualmente. Em
pacientes portadores do HIV, não apenas a infecção pelo HPV é mais comum70, como também a
presença de subtipos do papilomavírus de alto risco71. Além disso, há um maior risco de reativação
e recorrência do HPV 72,73 e de carcinoma invasivo do colo uterino rapidamente progressivo74,75,
principalmente nas pacientes com contagem de CD4 < 200 /mm3.72,76 Aumento de sobrevida e/ou
de sobrevida livre de doença foi encontrado apenas na presença de CD4 > 500/mm3. 75 Com
advento do uso da HAART (Terapia Anti-retroviral Altamente Ativa), embora tenha havido uma
maior taxa de redução de lesões escamosas intraepiteliais, não houve impacto na incidência do
câncer invasivo do colo do útero77,78,79, nem na ocorrência de resposta completa 80. A proposta
terapêutica oncológica obedece aos critérios utilizados em pacientes soronegativas, no entanto, em
geral, são verificados piores níveis de resposta 75.
3.12. Seguimento
• Exame físico e ginecológico (exame especular com coleta de material para citologia, toque
vaginal e retal);
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• Exames laboratoriais e de imagem (Radiografia do Tórax, USG do abdome total e TC da pelve)
de acordo com a indicação clínica da paciente2;
• Em casos de histerectomia total abdominal tipos I, II e III (com ou sem radioterapia), o
seguimento deve ser realizado a cada 6 meses durante 2 anos e anual até 5 anos 2;
• Em casos de radioterapia exclusiva ou associada à quimioterapia deve-se seguir em 3 meses
por 2 anos, em 6 meses por três anos e anualmente após 5 anos 2.
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Capítulo 4
Câncer Epitelial de Ovário
Editor: Dr. Wagner Brant Moreira
Autores: Dra. Clarissa Maria de Cerqueira Mathias, Dr. Eduardo Carvalho Brandão, Dr. Leandro Alves
Gomes Ramos e Dra. Stella Sala Soares Lima
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Capítulo 4
Câncer Epitelial de Ovário
4. 1. Introdução
O câncer de ovário representa a quinta causa de morte por câncer em mulheres americanas,
sendo a causa de morte mais comum entre mulheres com tumores ginecológicos. A estimativa
para 2010 é de 21880 novos casos em mulheres nos EUA e, destas, 13850 morrerão da doença1.
No Brasil o INCA publicou em 2009, uma estimativa de 3837 casos novos e em 2008 houve
2836 mortes por câncer de ovário 2.
Parte deste prognóstico ruim deve-se ao fato de que aproximadamente 75 % das pacientes ser
diagnosticada com a doença nos estádios III e IV 3. No entanto, Goff et al., relataram que cerca de
95 % das pacientes apresentaram sintomas precedendo o diagnóstico4. O mais importante é que
sintomas estavam presentes em 89 % daquelas posteriormente diagnosticadas como câncer inicial.
Como podemos ver, câncer epitelial de ovário é uma doença complexa, com baixa curabilidade,
o que significa um grande desafio para o oncologista.
Neste Manual de Condutas procuramos apresentar, aos oncologistas clínicos, as alternativas
terapêuticas mais indicadas, segundo as evidências científicas disponíveis.
Não pretendemos esgotar as situações possíveis na prática médica diária, mas, somente,
fornecer um roteiro para a tomada de decisão clínica.
Entendemos que a conduta em cada caso deve ser individualizada e que a decisão do médico,
responsável pela paciente, é soberana.
4. 2. Estadiamento
O termo estadiamento, em neoplasias de ovário, aplica-se tanto à padronização anatômica
da extensão da doença quanto ao procedimento cirúrgico inicial, que faz parte do tratamento
considerado ideal.
A cirurgia como tratamento inicial da neoplasia de ovário evoluiu nas últimas décadas até
um procedimento complexo, que inclui não somente a ressecção da doença visível, mas também,
pesquisa detalhada da extensão da mesma, com finalidade de estabelecer um estadiamento mais
preciso. Assim, a cirurgia inicial possui uma importância fundamental para o diagnóstico, estadiamento e tratamento do câncer de ovário, e deve ser realizada por um especialista em ginecologia
oncológica sempre que possível, pois alguns estudos já demonstraram melhoras significativas no
resultado, quando a paciente é operada por tais especialistas5,6.
Os ovários são órgãos de formato oval, com 2 a 4 centímetros de diâmetro, conectados por
ligamentos ao peritônio pélvico e à parede lateral da pelve. A drenagem linfática ocorre pelos
troncos dos ligamentos redondo, infundíbulo-pélvico e útero-ovariano, ou ainda pela rota acessória
da ilíaca externa. A disseminação preferencial é pela cavidade abdominal, mais especificamente
pelo peritônio, incluindo a superfície hepática e o diafragma. O acometimento extra-abdominal
mais comum é o pleural7. Uma radiografia simples de tórax serve como rastreio de doença
metastática pleural ou pulmonar.
A tomografia computadorizada (TC) e a ressonância magnética (RNM) podem delinear a
extensão da doença intra-abdominal, porém não substituem a necessidade de estadiamento
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MA N UA I S D E CO N DUTAS
cirúrgico. Na presença de doença abdominal extensa ou suspeita de doença à distância, está
justificada a realização de propedêutica adicional tais como TC, RNM ou tomografia por emissão de
pósitrons associada a TC (PET-CT) 8.
O estadiamento das neoplasias de ovário classifica as pacientes por prognóstico, porém a
ordenação dos estádios também descreve o modo de disseminação ascendente da doença a partir
da pelve. O estádio I agrupa os tumores restritos ao ovário, enquanto o estádio II inclui a doença
restrita à pelve, com a extensão de doença extra-pélvica descrita no estádio III. Assim como em
outros tumores sólidos, o estádio IV inclui os casos de metástases para parênquima do fígado ou
qualquer doença extra-abdominal confirmada (Tabela 1).
Tabela 1 - Estadiamento da Neoplasia de Ovário(9)
FIGO
0
I
IA
IB
IC
II
IIA
IIB
IIC
III
IIIA
IIIB
IIIC
IV
O tumor primário não pode ser localizado.
Sem evidência do tumor primário.
Tumor confinado aos ovários.
Limitado a um dos ovários, com cápsula intacta, sem neoplasia na superfície
do ovário e sem células malignas no lavado peritoneal ou ascite.
Doença em ambos os ovários, com cápsula intacta, sem neoplasia na
superfície dos ovários e sem células malignas no lavado peritoneal ou ascite.
Tumor em um ou ambos os ovários, incluindo: ruptura da cápsula, tumor
na superfície do(s) ovário(s), ascite ou lavado peritoneal positivo para células
malignas.
Tumor em um ou ambos os ovários, com extensão para a pelve.
Extensão e/ou implantes para útero ou tubas uterinas, sem células malignas
no lavado peritoneal ou ascite.
Extensão e/ou implantes para outros órgãos pélvicos, sem células malignas
no lavado peritoneal ou ascite.
IIA ou IIB com células malignas no lavado peritoneal ou ascite.
Tumor em um ou ambos os ovários, com metástases peritoneais extrapélvicas histologicamente comprovadas e/ou doença linfonodal regional.
Doença peritoneal extra-pélvica microscópica.
Doença peritoneal extra-pélvica macroscópica ≤ 2 cm.
Metástases peritoneais extra-pélvicas > 2 cm e/ou metástases linfonodais
regionais.
Metástases além da cavidade abdominal*.
TNM
TX
T0
T1
T1a
T1b
T1c
T2
T2a
T2b
T2c
T3 e/ou
N1
T3a
T3b
T3c e/ou
N1
M1
*Implantes secundários na cápsula do fígado são considerados T3 - estádio III, enquanto as lesões hepáticas parenquimatosas
são incluídas no estádio IV (M1). O derrame pleural deve ter citologia positiva para ser considerado M1.
Os carcinomas primários de peritôneo são incluídos juntos com os de ovário pelo último
estadiamento proposto pela American Joint Comittee on Cancer (AJCC)9.
4. 3. Fatores Prognósticos
O estadiamento é o principal fator prognóstico no câncer epitelial invasivo do ovário, conforme
assinalado na Tabela 2, com sobrevida em 5 anos da ordem de 70-100% dos casos no ECI e 3-15%
no ECIV 9,10.
MANUAIS DE COND UTAS
| 95
Tabela 2 - Sobrevida por estádios
Estádio
I
II
III
IV
Sobrevida em 5 anos (%)
70-100
55-63
10-27
3-15
Adaptado de Stratton 10.
A presença de uma tumoração com características histológicas de neoplasia, mas sem invasão
do estroma, define o tumor borderline ou limítrofe do ovário com prognóstico melhor do que nos
tumores invasivos e que, por se tratar de uma entidade à parte, será estudado em um capítulo
específico11.
Uma abordagem deste tema visando facilitar a tomada de decisão médica envolve a divisão
das pacientes, com tumores invasivos, em dois subgrupos.
4.3.1. Estagio I
Dembo et al., relataram que apenas grau de malignidade, aderência densa do tumor e a
presença de ascite volumosa (> 300ml) foram fatores independentes de prognóstico, sendo que
estádio (IA ou IB), ruptura de cisto, invasão capsular, tamanho do tumor, subtipo histológico, idade
e terapia pós-operatória, não foram fatores condicionantes do prognóstico12.
Vergote et al., em um estudo que incluiu 1545 pacientes com câncer invasivo estádio I
concluíram que apenas grau de malignidade, ruptura do cisto antes ou durante a cirurgia, o subestádio (IA ou IB) e a idade foram determinantes independentes do prognóstico. Na análise
multivariada, tipo histológico, aderência densa, crescimento extra-capsular, ascite e tamanho do
tumor não foram fatores prognósticos significativos13. Tropé et al. relataram que grau de
malignidade, ploidia do DNA e níveis séricos, pré-operatório, do CA 125 foram fatores independentes de prognóstico14. Bondy et al., em um estudo de base populacional que incluiu 1341
pacientes com câncer de ovário estádios I e II (onde o estádio II era baseado apenas na aderência),
concluíram que, na análise multivariada, apenas idade, grau de malignidade e o acometimento da
superfície da cápsula, foram fatores independentes de prognóstico15.
Como podemos verificar os fatores mais freqüentes associados a prognóstico, no estádio I,
são o grau histológico e o subestádio (que inclui ascite, ruptura de cápsula e neoplasia na superfície
da cápsula). Baseado neles, é usual separar estas pacientes em dois subgrupos16:
• Baixo risco: compreende pacientes com doença estádios IA ou IB e grau histológico I, com
taxa de sobrevida em 5 anos de mais de 90%.
• Alto risco: inclui pacientes com estádios IA ou IB associado a graus II ou III de malignidade e
pacientes com doença estádio IC.
Embora vários autores considerem a histologia de células claras como de pior prognóstico, isto
parece ser verdade para os estádios mais avançados e no estádio IC. Seu valor prognóstico nos
estádios IA e IB é controverso17.
De qualquer forma, como veremos mais adiante, os estudos de quimioterapia adjuvante no
estádio I consideraram pacientes com esta histologia como de alto risco, a despeito da falta de
evidências de alto nível.
4.3.2. Estádios II a IV
Vários autores, na era pré-platina, descreveram que os principais fatores prognósticos, neste
subgrupo de pacientes, são a idade, o estágio da neoplasia e o volume da doença residual após a
cirurgia18.
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MA N UA I S D E CO N DUTAS
Recentemente, o GOG publicou um estudo de fatores prognósticos, baseado nos resultados
de 6 protocolos em que se usou quimioterapia baseada em platina e paclitaxel, com um total de
1895 pacientes com EC III de câncer epitelial de ovário, dos quais 64,8% tinham citorredução
considerada ótima (≤ 1 cm), sendo 23,1% com resíduo microscópico. Na análise multivariada, idade
mais elevada, pior performance status, histologia de células claras ou mucinoso e doença residual
macroscópica foram fatores independentes de predição para pior sobrevida livre de progressão e
global18.
O estudo GOG ICON 5, desenvolvido para avaliar o papel de uma terceira droga associada a
carboplatina e paclitaxel incluiu 4312 pacientes. A avaliação da sobrevida livre de progressão em
relação ao resíduo tumoral, após a cirurgia, revelou que ela foi de 13 e 16 meses respectivamente
para pacientes com resíduo tumoral maior que 1 cm e ≤ 1 cm, mas de 29 meses para pacientes com
resíduo apenas microscópico. Este achado corresponde a uma sobrevida livre de progressão em 48
meses de aproximadamente 7,4%, 12,4% e 34,6%, respectivamente, nos 3 pontos de corte.
Portanto parece que o resíduo ideal é apenas microscópico e não ≤ 1 cm (isto foi alcançado em 25%
dos casos). 19
Concluindo, o principal fator prognóstico neste subgrupo de pacientes é a dimensão da
doença residual após a cirurgia primária. Os outros fatores também relacionados, como de
importância prognóstica, são a idade, o estádio, o performance status e a histologia sendo que os
tumores mucinosos e de células claras estão associadas a pior prognóstico18.
Recomendações
A avaliação dos fatores prognósticos nos permite subdividir os tumores epiteliais de ovário nos
seguintes grupos:
1. Tumor não invasivo ou bordeline ou limítrofe.
2. Tumor invasivo estádio I:
2.1) Baixo risco
2.2) Alto risco
3. Tumor invasivo avançado (estádios II a IV): os fatores prognósticos não nos autorizam a
uma subdivisão em grupos de risco com finalidade de orientar a decisão terapêutica.
4. 4. Abordagem Cirúrgica
4.4.1. Introdução
A cirurgia desempenha um papel importante no diagnóstico, no estadiamento, e na
terapêutica dos tumores malignos do ovário. O seu emprego deve ser orientado por princípios que
respeitem a história natural e as características de disseminação desta neoplasia, assim como as
possibilidades de terapias associadas, em especial, a quimioterapia.
Com o desenvolvimento de uma lesão neoplásica expansiva maligna pode ocorrer o
desprendimento de células do tumor que tendem a se implantar em outros pontos da superfície
peritoneal e desenvolver novos focos da doença.
Apesar do comprometimento das superfícies peritoneais, viscerais e parietais, das cavidades
pélvica e abdominal, representar uma das características do câncer ovariano, a disseminação por via
linfática também é bastante comum, mesmo quando os tumores aparentam estar restritos ao
ovário.
4.4.2. Cirurgia para os estádios iniciais
Do ponto de vista cirúrgico, consideram-se os estádios clínicos I e II como iniciais; ou seja,
àqueles em que a doença encontra-se restrita aos ovários ou estruturas peritoneais pélvicas.
MANUAIS DE COND UTAS
| 97
A indicação de uma intervenção cirúrgica, nestas situações, decorre geralmente do
diagnóstico de uma “massa anexial”, ou seja, de formações císticas complexas, detectadas durante
um exame ultrassonográfico de rotina. Quando estas alterações ocorrem em uma mulher em
menopausa e estão acompanhadas de níveis elevados de marcadores tumorais (p. ex: CA -125), a
presença de uma neoplasia maligna ovariana deve ser fortemente considerada20.
O procedimento cirúrgico ideal deve cumprir três papéis fundamentais que são: primeiro,
obter material adequado para a determinação da origem, tipo e grau histopatológico da neoplasia;
segundo, estabelecer a extensão da doença na cavidade peritoneal e no espaço retroperitoneal
(linfonodos), procedimento conhecido como estadiamento cirúrgico; terceiro, proceder ao
tratamento inicial da neoplasia20.
Para uma exploração cirúrgica adequada, a realização de biópsias ou a remoção de focos da
doença no andar superior do abdômen e diafragma, se faz necessária uma incisão abdominal
longitudinal, suficientemente ampla para permitir o acesso do cirurgião a estas regiões com
segurança, isto é, através de uma laparotomia exploradora.
A cirurgia padrão deve começar pela coleta de líquido ascítico, se houver, ou de lavado
peritoneal após a instilação de 20 a 40 ml de soro fisiológico.
Após o inventário meticuloso da cavidade peritoneal e das superfícies viscerais, inicia-se a
ressecção da tumoração anexial, evitando a sua ruptura. Todo o anexo removido deve ser enviado
ao patologista para a realização da biópsia por congelação per-operatória. Em 80-90% dos casos
este procedimento permite definir se estamos frente a uma lesão maligna ou benigna, primária ou
secundária.
Confirmando-se o achado de um carcinoma epitelial de ovário, complementa-se a cirurgia
com a retirada do útero e do anexo contralateral, do omento infracólico, além de biópsias
sistematizadas do peritôneo das reflexões vésico e reto-uterinas, goteiras parieto-cólicas,
mesentério, mesocólon e superfícies diafragmáticas. Áreas nodulares ou espessadas e, aderências
peri-tumorais também devem ser removidas. O apêndice cecal deve ser removido sempre que
estiver macroscopicamente comprometido por implantes, aderido à massa anexial, ou mesmo de
aparência normal quando tratar-se de tumor ovariano mucinoso; nesta última situação, o objetivo
é afastar a possibilidade de se tratar de um tumor primário de apêndice com metástase em ovário.
Concluída a fase dos procedimentos na cavidade peritoneal passa-se para as dissecções dos
linfonodos pélvicos e para-aórticos (linfonodectomias).
O relatório da intervenção deve conter a descrição dos achados cirúrgicos antes e depois da
ressecção, especificando todos os locais biopsiados e incluindo o volume da doença residual. Estas
informações são fundamentais para a definição do estadiamento correto após o confronto com os
resultados anatomopatológicos do exame em parafina.
Sijmons et al. estudando os dados do Registro Regional de Câncer da Holanda, no período de
1991-1997, encontraram que as pacientes com estádios clínicos iniciais que receberam um
estadiamento qualificado como “ótimo” apresentaram uma sobrevida global em 5 anos de 97,6%
versus 68,5% entre as que receberam um estadiamento “não-ótimo”21.
Vernooij et al, numa revisão de 19 séries de pacientes operadas a partir de 1990, observaram
que, quando o tratamento cirúrgico foi realizado por um oncologista ginecológico ou em um
hospital especializado, resultou em ganho na sobrevida mediana de 5 a 8 meses para o grupo de
pacientes com doença avançada22.
Estudos recentes, de base populacional, comparando categorias de especialização do
cirurgião ou do hospital, e outros avaliando o efeito da introdução de guias de referência, têm
justificado e recomendado que pacientes com massas pélvicas suspeitas de câncer de ovário devem
ser encaminhadas para tratamento em centros especializados em oncologia ginecológica por uma
equipe multidisciplinar5,6, 22.
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4.4.3. Cirurgias para os estádios avançados (ECIII–IV) – Citorredução Cirúrgica Primária
Diferentemente de outras neoplasias abdominais, nos casos de câncer ovariano, em que a
avaliação intra-operatória criteriosa evidenciar o comprometimento pela doença além da pelve, o
cirurgião deve se empenhar na remoção de todos os focos identificados da doença. A maioria dos
autores denomina a esta situação como uma citorredução “ótima”, ou seja, quando ao final do
procedimento não restam lesões maiores que 1,0 ou 2,0 cm de diâmetro20,23.
No entanto, conforme dito anteriormente, o estudo GOG 0182-ICON5 demonstrou cabalmente
que o resíduo tumoral que realmente muda o prognóstico, quase triplicando a sobrevida livre de
progressão em 4 anos, é apenas microscópico.19
Contudo, para que este objetivo seja alcançado, pode ser necessário “um esforço cirúrgico
máximo”, muitas vezes incluindo a ressecção de outras estruturas anatômicas e vísceras que se
apresentem infiltradas pela doença, como freqüentemente ocorre com o retossigmóide e o íleo
distal24. Intervenções sobre as vias urinárias25, baço26, fígado27, diafragma20,28, também estão
indicadas quando o cirurgião avalia a possibilidade objetiva de, com estas ressecções, atingir níveis
mínimos de doença residual.
A presença de metástases parenquimatosas hepáticas, desde que em número reduzido e
passíveis de ressecção completa com morbidade aceitável, não devem ser consideradas uma contra
indicação para se prosseguir com a intervenção27,29.
Estas são, sem dúvida, intervenções cirúrgicas de grande porte, complexas e que requerem
equipes treinadas e centros com infra-estrutura adequada para os cuidados do pré, intra, e pósoperatórios, fundamentais para o sucesso. O ideal é que seja feita uma avaliação conjunta com o
oncologista clínico na determinação dos objetivos, oportunidade (timing), intensidade e extensão
dos procedimentos, adequados para cada caso (NIH Consensus, 1994)30.
Portanto, pelo dito acima, recomendamos que o cirurgião faça uma cirurgia extensa apenas
se for conseguir deixar um resíduo microscópico, que é o objetivo necessário para realmente tornar
o prognóstico melhor.
4.4.4. Situações especiais
• Cirurgias conservadoras
Pacientes jovens com doença aparentemente limitada ao ovário, ou com tumores de baixo
potencial de malignidade (vide tumores borderline), podem ser submetidas ao estadiamento
cirúrgico com a conservação do útero e do anexo sadio, visando manter sua capacidade
reprodutiva. Esta conduta deve ser considerada caso a caso e deve incluir um consentimento
informado da paciente. Preconiza-se um acompanhamento rigoroso, trimestral nos primeiros 2 anos.
• Cirurgia de intervalo e QT neoadjuvante
Quando não se atinge uma citorredução ótima na cirurgia inicial, deve ser analisado se este
objetivo não foi alcançado pela inabilidade cirúrgica do ginecologista não oncológico ou apesar da
técnica adequada, a extensão da doença realmente não permitia uma citorredução ótima.
No primeiro cenário, a paciente deve ser reencaminhada para o onco-ginecologista. No
segundo cenário foi proposta, em 1995, a realização de cirurgia de intervalo após 3 a 4 ciclos de
quimioterapia, desde que a paciente apresente sinais de resposta clínica e performance que a
permitam31.
Rose et al. usaram quimioterapia com cisplatina e paclitaxel em pacientes com citorredução
sub-ótima (resíduo maior do que 1,0 cm) e não encontraram vantagens na cirurgia de intervalo32.
Rosa et al. verificaram que pacientes com câncer de ovário EC III e IV tratadas com
quimioterapia neoadjuvante com derivados de platina, apresentaram taxas de resposta e de
sobrevida mediana similares, quando comparadas com aquelas submetidas a uma cirurgia
citorredutora primária sub-ótima33.
MANUAIS DE COND UTAS
| 99
Estudo de fase III recentemente publicado por Vergote et cols comparou quimioterapia
neoadjuvante seguida por cirurgia versus cirurgia inicial em pacientes com estágio IIIC e IV. A
sobrevida mediana foi equivalente nos dois grupos (29 versus 30 meses), mas pacientes que
receberam quimioterapia neoadjuvante seguida por cirurgia tiveram menos complicações. A
principal crítica a este estudo internacional é a sobrevida relatada no braço da cirurgia inicial inferior
aos estudos publicados pelos grupos americanos (em torno de 50 meses)34.
Portanto, apesar dos dados apresentados, o papel da quimioterapia neoadjuvante seguida por
cirurgia de intervalo permanece controverso, e não deve ser considerada conduta padrão na prática
clínica.
• Cirurgias de resgate
Cerca da metade das pacientes diagnosticadas com carcinoma epitelial de ovário (ECI-IV)
poderá apresentar recorrência da doença nos primeiros anos de seguimento, a despeito de resposta
clínica completa após a cirurgia agressiva e a quimioterapia baseada em platina e taxane35,36.
Um subgrupo destas enfermas parece se beneficiar de nova abordagem cirúrgica, ou seja, de
“citorredução cirúrgica secundária” como parte da terapêutica multidisciplinar de “resgate”.
Vários centros especializados têm, ao longo das últimas duas décadas, relatado séries e
análises retrospectivas com resultados objetivos positivos, isto é, com aumento superior a 50% na
sobrevida mediana, a partir da recorrência31,36. A maioria dos autores destaca a importância da
seleção criteriosa das pacientes que necessitam de reexploração cirúrgica, e do volume de doença
residual mensurável ao final da re-intervenção.
Há indícios de que apenas as pacientes nas quais se consegue ressecção completa se
beneficiam desta abordagem35. Deve-se indicar, portanto, a cirurgia de resgate apenas naquelas
onde a chance de ressecção completa é elevada.
Recomendações
• Cirurgia é fundamental para o estadiamento correto e tratamento adequado.
• Cirurgia deve ser realizada por um ginecologista oncológico ou cirurgião oncológico
especialmente treinado.
• Cirurgia radical deve seguir, sempre, os princípios descritos acima;
• Quando encaminhar a paciente, o cirurgião deve fornecer um relatório detalhado do
procedimento realizado.
• Cirurgia conservadora é admissível em alguns casos de pacientes jovens com tumor
borderline ou invasivo estágio IA e que desejem engravidar.
• Cirurgia na recidiva deve ser realizada apenas se for possível a exérese total das lesões.
4.5. Abordagem no Carcinoma Limítrofe (Borderline)
Os tumores limítrofes de ovário são definidos pela Organização Mundial de Saúde como
neoplasias que apresentam epitélio com múltiplas camadas, atividade mitótica e atipia nuclear,
mas sem invasão do estroma. Tumor ovariano, não invasivo, que apresenta duas ou mais
características descritas acima envolvendo 10% ou mais da lesão, pode ser classificado como
limítrofe.
Os tumores limítrofes de ovário representam 10-20% de todos os tumores epiteliais de ovário,
acometendo mulheres jovens com idade média de 40 anos. Mulheres inférteis, ou nulíparas,
apresentam maior risco, sugerindo que gestações, assim como o uso de anticoncepcional, reduzem
o risco para neoplasia de ovário. A taxa de sobrevida para mulheres com tumor limítrofe de ovário
é superior à de outros tumores epiteliais ovarianos e a recorrência, quando ocorre, é tardia. No
100 |
MA NUA IS D E CO ND UTAS
momento do diagnóstico, 70% das pacientes apresentam estádios I e II 37. A sobrevida em 5 anos
para o estádio I encontra-se em torno de 98%; a sobrevida em 5 anos para os estádios mais
avançados varia de 86% a 92%. O estadiamento é o fator prognóstico mais relevante11.
Os tipos histológicos mais comuns são os serosos em 50% dos casos, mucinosos em 46% dos
casos e mistos (endometrióides, células claras e tumores de Brenner) em 3,9% dos casos. Os
tumores serosos são bilaterais em 30% dos casos e são associados com lesões extra-ovarianas,
denominadas implantes, em 35% dos casos11. Microscopicamente, estes implantes podem ser
divididos em não-invasivos ou invasivos. Discute-se se são verdadeiros implantes metastáticos ou
manifestações de lesões multifocais in situ do peritônio. Gershenson DM et al relataram uma taxa
de recidiva de 18% para tumores que não apresentavam implantes peritoneais invasivos, com uma
mortalidade de 6%, enquanto pacientes com implantes invasivos apresentaram uma taxa de
recidiva de 36% e mortalidade de 25%38.
Os sintomas e os exames necessários para o diagnóstico são semelhantes aos dos demais
tumores epiteliais do ovário. Vale ressaltar que o CA 125 tem pouco valor no diagnóstico e
seguimento destas pacientes.
O estadiamento segue os mesmos princípios utilizados nos demais tumores epiteliais do
ovário.
O tratamento padrão para os tumores limítrofes de ovário é cirúrgico, sendo idêntico ao das
neoplasias malignas. Em tumores limítrofes mucinosos recomenda-se sistematicamente a
apendicectomia11.
Cirurgia conservadora é definida como uma cirurgia com estadiamento completo, conforme
descrito anteriormente, mas com preservação do útero e, pelo menos, de parte do ovário. O
tratamento cirúrgico conservador pode ser considerado, em pacientes jovens, com tumor
confinado a um ovário, estádio I, mas elas devem ser informadas do maior risco de recidiva e da
necessidade de seguimento por longo prazo. Parece seguro não realizar biópsias no ovário
contralateral, macroscopicamente normal, em pacientes candidatas a cirurgia conservadora
diminuindo, portanto, as aderências em torno do ovário e preservando a fertilidade. Um estudo
multi-institucional39 observou uma taxa de gravidez de 32% entre 162 mulheres tratadas com
cirurgia conservadora (cistectomia ou salpingooforectomia unilateral) para tumores limítrofes.
Não existem protocolos para terapia adjuvante neste grupo de tumores11. Alguns autores têm
indicado quimioterapia adjuvante baseada em platina para pacientes com implantes peritoniais
invasivos até que estudos futuros consigam definir o papel da quimioterapia de maneira mais
precisa38.
Na recidiva, pode ser utilizada quimioterapia paliativa com protocolos contendo cisplatina,
porém as respostas são pobres e não foram demonstrados benefícios na sobrevida global, mas, na
ausência de estudos randomizados, prospectivos, existe uma concordância na recomendação de
cirurgia ótima seguida de quimioterapia11,37.
Recomendações
• Cirurgia deve ser semelhante à do tumor invasivo de ovário.
• Cirurgia conservadora pode ser realizada em paciente jovem com doença estádio IA que
deseja engravidar.
• Tratamento sistêmico só é recomendado na progressão após cirurgia.
4.6. Tratamento Oncológico no Estádio I
Baseados nos fatores prognósticos definidos anteriormente, podemos dividir as pacientes
com câncer epitelial de ovário estádio I em 2 subgrupos:
MANUAIS D E COND UTAS
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1. Baixo risco: compreende as pacientes com doença estádio IA e IB, grau histológico I;
2 . Alto risco: pacientes com estádio IA e IB graus II ou III ou estádio IC.
4.6.1. Tratamento
Apesar do consenso de que a cirurgia corretamente realizada é fundamental para o estadiamento e tratamento desta neoplasia, isto ocorre, de início, em apenas 10-30% das pacientes40.
Outro complicador é que o estádio I ocorre em cerca de 20% das pacientes com câncer de
ovário e a sobrevida em 5 anos é da ordem de 50-95%41. As consequências destes fatos são a baixa
inclusão de pacientes e o pequeno número de eventos, o que dificulta a realização de estudos
clínicos controlados.
Apesar disto, dois grandes estudos que incluíram pacientes com câncer de ovário nos estádios
iniciais foram realizados na década de 1990.
O estudo ACTION incluiu 448 pacientes que foram randomizadas entre quimioterapia (QT)
com esquema contendo platina versus observação; este estudo determinou critérios rígidos para
a abordagem cirúrgica. Após 5 anos de observação, a sobrevida global foi de 85% no grupo QT e de
78% no grupo observação (p=0,10) e a sobrevida livre de doença foi, respectivamente, de 76% e 68%
(p=0,02).42 No entanto, somente 1/3 das pacientes foi operada corretamente; análise de subgrupo
revelou benefício nas sobrevidas global e livre de recidiva, com QT, apenas nas pacientes com
cirurgia sub-ótima. Atualização dos resultados, após 10,1 anos de observação, confirmaram benefício
da QT adjuvante apenas nas pacientes submetidas a cirurgia considerada não ótima. Os autores
recomendam firmemente que, nas pacientes operadas de forma inadequada, nova cirurgia deve
ser indicada e que QT deve ser limitada apenas àquelas nas quais tal conduta não for possível43.
O estudo ICON1 incluiu 477 pacientes, que foram randomizadas para QT com esquema
contendo platina versus observação; não foram estabelecidos critérios para estadiamento cirúrgico.
A sobrevida global em 5 anos foi de 79% no grupo QT e de 70% no grupo controle (p=0,03) e a
sobrevida livre de doença foi, respectivamente, de 73% e 62% (p=0,01).44 No entanto, atualização
dos resultados após 9,2 anos de observação, revelou benefício da QT adjuvante apenas nas
pacientes com doença de alto risco45.
O estudo ACTION incluiu pacientes com doença nos estádios IA-B G2-3, IC e IIA ou qualquer
estádio I ou II, mas com histologia de células claras; o estudo ICON1 incluiu pacientes com doença
estádios I, II ou III.
Bell et al. compararam o uso de 3 versus 6 ciclos de carboplatina (AUC = 7,5) associada a
paclitaxel (175mg/m2) em pacientes com câncer de ovário inicial com critério de elegibilidade
semelhante ao do protocolo ACTION e não encontraram diferença estatisticamente significativa nas
taxas de recidiva ou óbito46.
Portanto, muita controvérsia ainda persiste sobre o melhor tratamento para pacientes com
câncer de ovário estádio I.
Recomendações
• É fundamental que as pacientes sejam operadas adequadamente, pelos critérios estabelecidos acima, mesmo que seja necessária segunda cirurgia.
• Pacientes operadas adequadamente com doença estádio IA ou IB e grau histológico I: mais
de 90% delas estarão vivas após 5 anos e nenhum tratamento adjuvante é recomendado16.
• Pacientes com doença estádio I e, que por qualquer motivo, não puderam ser operadas
adequadamente: considerar quimioterapia adjuvante com paclitaxel + cisplatina ou carboplatina
por 3-6 ciclos.
• Pacientes com doença estádio IA ou IB graus 2 ou 3 de malignidade ou estádioIC e que foram
operadas adequadamente: o benefício da QT adjuvante é duvidoso e cada caso deve ser analisado
separadamente; quando indicada, usar mesmo esquema acima.
102 |
MA NUA IS D E CO ND UTAS
OBS: como vimos anteriormente, o valor prognóstico da histologia de células claras é
controverso nos estádios IA e IB; no entanto, os estudos que avaliaram tratamento na doença inicial
consideraram esta histologia como de pior prognóstico.
4.7. Tratamento Oncológico nos Estádios Avançados (II a IV)
As pacientes com câncer de ovário avançado apresentam-se ao oncologista em três cenários
possíveis:
1- paciente foi operada com citorredução ótima;
2- pacientes operada com citorredução inadequada;
3- paciente com doença volumosa não candidata a citorredução inicial.
4.7.1. Pacientes operadas adequadamente
O uso de platina é rotineiro desde o final da década de setenta e está plenamente substanciado em meta-análise publicada em 200147. As comparações entre cisplatina e carboplatina
mostraram resultados terapêuticos semelhantes com perfil de toxicidade diferente, sendo a
primeira mais emetizante e neurotóxica e a segunda mais mielossupressora47.
O estudo do GOG158 consagrou a associação da carboplatina e paclitaxel como tão efetiva e
melhor tolerada que a cisplatina e paclitaxel48. A adição do paclitaxel, primeiramente avaliado pelo
estudo GOG111 e depois em outros49, mostrou vantagem sobre a associação de cisplatina e
ciclofosfamida.
Estudo comparando carboplatina com paclitaxel versus carboplatina com docetaxel mostrou
resultados precoces semelhantes, com toxicidades diferentes, concluindo-se que o docetaxel pode
ser uma alternativa ao paclitaxel50.
Katsumata N et al compararam o esquema padrão de carboplatina e paclitaxel versus
carboplatina e paclitaxel dose densa (80 mg/m2 dias 1, 8 e 15 em ciclos de 21 dias) e encontraram
maior sobrevida livre de progressão (p=0,0015) e sobrevida global (p=0,03) em 3 anos, com o
esquema de dose densa51. No entanto, o regime de dose densa é mais tóxico, com um índice de
descontinuidade do tratamento superior ao regime padrão.
Concluindo, a quimioterapia de escolha, aceita internacionalmente, para carcinoma de ovário
é a combinação de platina com taxane, sendo a mais difundida o paclitaxel 175mg/m2 em infusão
de 3 horas e carboplatina AUC 5 (5-7), a cada 21 dias, por 6-8 ciclos.
Se o diagnóstico histopatológico é de carcinoma mucinoso do ovário, deve-se pensar na
possibilidade de tratar-se de metástase ovariana de tumores gastrointestinais e investigar-se esta
possibilidade. Embora o carcinoma mucinoso possa se originar primitivamente no ovário, há relato
de resposta inadequada, desses casos, à terapia usual52.
Recentemente foi aventada a hipótese de que os carcinomas de células claras responderiam pior
a esquemas baseados em platina, inclusive com proposta de outras opções terapêuticas para esta
histologia 17,53. Entretanto, na análise dos casos do GOG tratados com platina e paclitaxel, o HR foi de
1,37 (p=0,004) em favor da histologia serosa para sobrevida global quando comparado ao de
células claras e 2,18 (p<0,001) comparado com o mucinoso ou seja a resposta é pior mas não nula18.
4.7.2. Pacientes com abordagem cirúrgica inadequada
Os casos devem ser individualizados, mas em nosso meio, onde há escassez de ginecologista
oncológico, este problema é frequente. A primeira opção seria rediscutir o caso com o cirurgião
com vistas a nova abordagem com oncologista ginecológico para cirurgia adequada.
Quando esta conduta não é possível, uma abordagem prática freqüente é separar as pacientes
em dois grupos.
MANUAIS D E COND UTAS
| 103
O primeiro, no qual as informações do cirurgião, os exames clínicos e de imagens não
demonstram haver doença em atividade, ou se há doença, ela é pequena; o CA125 pode estar
elevado ou normal. Nestas pacientes estão indicados 6-8 ciclos de quimioterapia com carboplatina
e paclitaxel. Não há evidências científicas para indicação de cirurgia após a quimioterapia. Os casos
devem ser individualizados com relação à indicação cirúrgica.
O segundo subgrupo é aquele em que as informações do cirurgião, o exame clínico e/ou
exames de imagem demonstram doença extensa intra-abdominal ou cujo estadiamento seja IV
(geralmente por derrame pleural neoplásico). Se após avaliação conjunta com ginecologista
oncológico, a paciente for considerada sem condições de citorredução ótima, deverão ser
submetidas a quimioterapia neoadjuvante com seis a oito ciclos e reavaliadas para serem
abordadas cirurgicamente se a citorredução ótima for possível54. Como vimos anteriormente, não
há vantagem aparente com quimioterapia neoadjuvante associada a cirurgia de intervalo, com os
esquemas atuais32,33,34.
4.7.3. Paciente não operada, com doença volumosa
A abordagem cirúrgica inicial seguida pela quimioterapia sistêmica não é factível se houver
doença muito volumosa e/ou morbidade cirúrgica proibitiva.
Uma alternativa para essas pacientes é a realização de quimioterapia sistêmica neoadjuvante
seguida da citorredução cirúrgica naquelas que obtiveram resposta. Uma possível vantagem para
esta estratégia é selecionar pacientes com doença quimiossensível e que possam se beneficiar da
citorredução cirúrgica e evitar a morbidade desse procedimento nas não respondedoras.
Como vimos anteriormente a quimioterapia neoadjuvante com cirurgia de intervalo ainda é
controversa32,33.
A alternativa mais comum é a realização de quimioterapia com carboplatina e paclitaxel por
6 a 8 ciclos, seguida de cirurgia34.
• Procedimentos especiais
Alguns procedimentos ainda não padronizados merecem discussão: quimioterapia
intraperitoneal, tratamento de consolidação, quimioterapia de manutenção e uso de anticorpo
monoclonal.
• Quimioterapia intraperitoneal
Sendo a disseminação do tumor epitelial de ovário basicamente intrabdominal, com a
administração intraperitoneal seria conseguida uma concentração maior da droga nos locais de
implantação das lesões. Como as drogas, geralmente, são absorvidas via peritoneal, não há prejuízo
teórico, quanto à ação sistêmica.
Esta modalidade de tratamento já foi testada algumas vezes, com vantagens nas sobrevidas
livre de progressão e global, mas não foi bem aceita pela comunidade médica. A discussão foi
avivada após recente publicação em que a modalidade foi utilizada em pacientes ECIII, com resíduo
tumoral <1 cm, comparando-se paclitaxel 135mg/m2 em 24h e cisplatina 75mg/m2 via venosa
versus paclitaxel 135mg/m2/24h EV no D1 seguida de cisplatina 100mg/m2 intraperitoneal no D2
e paclitaxel 60mg/m2 intraperitoneal no D8. Seguimento de mais de 4 anos demonstrou aumento
significativo da taxa de remissão completa (41% x 57%), da sobrevida livre de progressão mediana
(18,3 x 23,8 meses) e da sobrevida global mediana (49,7 x 65,6 meses), favorecendo o tratamento
intraperitoneal. Entretanto a toxicidade foi muito maior para o tratamento IP e apenas 42% das
pacientes conseguiram completá-lo por esta via55. Embora com maior toxicidade e pior qualidade
de vida, há pelo menos 3 meta-análises confirmando um aumento de sobrevida da ordem de 8 a
16 meses para as pacientes tratadas com quimioterapia intraperitoneal56,57,58.
Os críticos da quimioterapia intraperitoneal argumentam, com razão, que em todos os
104 |
MA NUA IS D E CO ND UTAS
estudos foram utilizadas drogas e doses diferentes em cada braço, alem do que nenhum dos grupos
controle foi tratado com o tratamento hoje considerado padrão 59.
Portanto, para esse grupo de pacientes, esta é uma opção tentadora, em que se pese a
controvérsia, toxicidade e as dificuldades técnicas inerentes ao procedimento.
• Tratamento de consolidação
Vários estudos não mostraram benefício com a administração de quimioterapia alem do
considerado padrão. No entanto, foram incluídos poucos pacientes e com baixo poder de detectar
diferença útil. Em 2010 Hess LM et al publicaram meta-análise avaliando o papel dos tratamentos
de consolidação e manutenção60. Os resultados são, no entanto, passíveis de críticas devido à
inclusão de estudos não randomizados e à heterogeneidade entre eles.
Até o presente, tratamento de consolidação com quimioterapia ou radioterapia não são
recomendados.
• Tratamento de manutenção
Quimioterapia de manutenção, ou seja, fazer uso de um tratamento mais prolongado após
indução, foi testada pelo SWOG/GOG em pacientes tratadas com 5-6 ciclos de paclitaxel e cisplatina,
sem neurotoxicidade grave, acrescentando-se 3 ou 12 ciclos de paclitaxel (175mg/m2/3h) a cada
28 dias. Na última atualização do estudo, foi demonstrado ganho de sobrevida livre de progressão,
porém, sem ganho de sobrevida global 61. O pequeno número de pacientes incluídos e o tratamento
realizado no momento da recidiva podem ter contribuído para não se observar ganho de sobrevida.
Mei L et al publicaram meta-análise com inclusão de 6 estudos randomizados e não
encontraram benefício nas sobrevidas livre de doença e global com o uso de quimioterapia de
manutenção62.
• Anticorpo monoclonal
Leary A et al avaliaram, recentemente, o papel do bevacizumabe no tratamento do câncer
epitelial de ovário63. Estudos de fase II na doença recidivada mostraram resposta objetiva em 1621% das pacientes, mas perfuração intestinal ocorreu em 11% delas.
Dois estudos de fase III em pacientes com doença estágio I-IIA de alto risco (ICON7) ou estágio
IIB-IV (ICON7) ou estágio III-IV (GOG 218) avaliaram a adição de bevacizumabe ao esquema padrão
de quimioterapia com carboplatina e paclitaxel. Foi relatada melhora na sobrevida livre de
progressão no grupo que recebeu o anticorpo monoclonal, mas sem benefício na sobrevida
global63. Vale lembrar que estes estudos foram apresentados sob a forma de sumário e o tempo se
seguimento é pequeno.
Portanto, não há evidência sólida para a indicação de bevacizumabe.
Recomendações
1 – Doença residual mínima:
• Carboplatina AUC 5 ou 6, associado a paclitaxel-175 mg/m2 EV a cada 21dias por 6-8 ciclos
ou
• Paclitaxel-135 mg/m2 contínuo por 24 horas EV no D1 associado a cisplatina 100 mg/m2,
intraperitoneal, no D2, seguido de paclitaxel-60 mg/m2,intraperitoneal, no D8, a cada 21 dias por
6 ciclos.
2 – Doença residual ≥ 1,0 cm:
• Carboplatina AUC 5 ou 6 associado a paclitaxel-175 mg/m2 EV, a cada 21dias por 6-8 ciclos
ou
• Paclitaxel dose-densa 80mg/m2 IV em 1 hora nos dias 1,8 e 15 e carboplatina AUC 6 em 1
MANUAIS D E COND UTAS
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hora no dia 1 a cada 3 semanas por 6 ciclos
3 – Doença maciça:
• Carboplatina AUC 5 ou 6 associado a paclitaxel-175 mg/m2 EV, a cada 21 dias por 6-8 ciclos
• Considerar cirurgia após quimioterapia se houver resposta clínica compatível com
citorredução ótima.
4. 8. Procedimentos especiais
Carcinoma epitelial de ovário recidivado é considerado doença incurável e o objetivo do
tratamento é paliativo. A duração mediana da sobrevida após a recidiva é de 2 anos, mas pode
variar de meses a mais de 10 anos64.
A seleção do tratamento é baseada na sensibilidade da paciente a esquemas contendo
platina. Pacientes que responderam previamente a esquema contendo platina e têm tempo livre
de doença maior que 6 meses, são consideradas sensíveis à platina. Essas pacientes beneficiam-se
da utilização de esquemas com platina na segunda linha.
Em contraste, as pacientes que recidivam antes de 6 meses após o final da quimioterapia de
primeira linha contendo platina, que progridem durante esse tratamento ou que atingem doença
estável como melhor resposta ao tratamento, são chamadas de resistentes à platina. Essas mulheres
não responderão a tratamento contendo derivados de platina. Apresentam um pior prognóstico
e devem receber drogas que não apresentem resistência cruzada à platina65.
4.8.1. Quimioterapia intraperitoneal
Como o objetivo da quimioterapia nesse cenário é eminentemente paliativo, é questionável,
o real benefício do início imediato do tratamento quando a paciente ainda encontra-se
assintomática.
O estudo MRC OV05/EORTC 55955 foi desenhado para responder esta questão. Nele 1442
mulheres com doença em remissão completa e níveis séricos de CA-125 normais foram seguidas
com dosagens trimestrais desse marcador. Tanto as pacientes quanto os investigadores
desconheciam os valores do CA-125. As mulheres que apresentavam elevação do CA-125 maior ou
igual a 2 vezes o valor de referência eram, então, randomizadas para início imediato de
quimioterapia ou seguimento “cego” do CA-125 e tratamento apenas quando surgissem sintomas
ou sinais clínicos de recorrência. Após seguimento de 57 meses, a sobrevida foi similar em ambos
os braços, sendo que o grupo de início imediato de tratamento teve um impacto negativo na
qualidade de vida66.A conclusão deste estudo é de que não se deve basear apenas na elevação do
CA 125 para se indicar quimioterapia precoce na recidiva.
No estudo de Chi DS et al 35, citado anteriormente, pacientes com recidiva sensível a platina
e que foram submetidas a cirurgia citorredutora secundária com exérese de todas as lesões visíveis
seguida de quimioterapia com platina e taxane, tiveram sobrevida mediana de 56 meses.
Como no estudo MRC OVO5/EORTC 55955, a cirurgia de resgate não foi incluída no protocolo
e a questão não foi respondida adequadamente.
Recomendamos acompanhamento pós-tratamento primário conforme definido adiante, com
inclusão de dosagem de CA 125. Na eventualidade de elevação de seus níveis séricos, estudos de
imagem devem ser realizados. Se lesão anatômica for detectada, e considerada passível de
ressecção completa, cirurgia deve ser indicada, seguida de quimioterapia. Muitas destas pacientes
sobreviverão por muitos anos.
106 |
MA NUA IS D E CO ND UTAS
4.8.2. Manejo da doença sensível a platina
O intervalo livre de tratamento é um importante preditor de resposta a terapia na doença
sensível a platina. A taxa de resposta é de 27% quando o intervalo livre de doença é de 6-12 meses,
de 33% quando é de 13-24 meses e de 59% quando é maior do que 24 meses67.
O melhor regime não está estabelecido, porém é fundamental a inclusão de platina no
esquema terapêutico. Estudo fase III avaliou a utilização de agente único platina ou outra droga,
demonstrando benefício na duração de resposta e na mediana da sobrevida (35 x 26 meses) a favor
do braço que incluiu platina68.
4.8.3. Combinação x agente único
Evidências sugerem que uma combinação de agentes similares aos usados na primeira linha
possa ser efetivo. Outros acreditam que o tratamento com platina isolada poderia ser considerado
em virtude dos pequenos ganhos em sobrevida e a maior toxicidade observada nos esquemas
combinados68.
Existem 3 estudos fase III que avaliaram o papel da quimioterapia combinada versus
monoterapia neste cenário64.
O estudo ICON4/AGO OVAR 2,2 é a união de 2 estudos europeus que incluíram 802 pacientes,
randomizadas para receberem platina e taxane versus platina isolada. Pacientes que receberam a
combinação apresentaram aumento significativo na duração mediana da sobrevida livre de
progressão (13 versus 10 meses – p=0,0004) e da sobrevida global (29 versus 24 meses – p=0,02).64
O estudo AGO OVAR 2,5 incluiu 356 pacientes, randomizadas entre carboplatina mais
gencitabina versus carboplatina isolada. Pacientes que receberam a combinação apresentaram
maior taxa de resposta objetiva (47,2% versus 30,5% - p=0,0016) e maior duração mediana da
sobrevida livre de progressão (8,6 versus 5,8 – p=0,003), mas não houve diferença na sobrevida
global64. Estes dados demonstram a superioridade da combinação sobre a monoquimioterapia.
Um único estudo (CALYPSO), com grande número de casos recidivados e sensíveis a platina
(976 casos), comparou carboplatina na dose de AUC5 associada a doxorrubicina lipossomal
(30mg/m²) a cada 4 semanas ou a paclitaxel 175mg/m² a cada 3 semanas, com seguimento
mediano de 22 meses e demonstrou um aumento da sobrevida livre de progressão de 11,3 versus
9,4 meses significativamente favorável a doxorrubicina (p=0,005), com um perfil de toxicidade
diferente e considerado melhor pelos autores, principalmente por menor neuropatia > grau 2 (4%
versus 27%).69
Recomendações
- Avaliar cirurgia de resgate:
• Indicar cirurgia apenas se for possível exérese de todas as lesões
- Quimioterapia:
- associar platina a paclitaxel:
• Carboplatina AUC 5 + Paclitaxel 175 mg/m2 EV a cada 3 semanas
• Resposta esperada: ± 60% de resposta objetiva, com remissão completa em ± 25%.
- em caso de neurotoxicidade associada ao uso de paclitaxel, considerar:
• Carboplatina AUC 5 EV D1 + Gencitabina 1000 mg/m2 EV D1+ D8 a cada 3 semanas ou
• Carboplatina AUC5 + doxorrubicina lipossomal 30mg/m2 a cada 3 semanas
4.8.4. Manejo da doença resistente a platina
Não existem estudos fase 3 demonstrando benefício da quimioterapia combinada sobre
monoterapia, neste contexto64. Poucos estudos de fase 3 compararam drogas isoladas, mas
nenhuma delas demonstrou superioridade sobre as demais, em termos de resultados clínicos64.
Portanto, não há droga de escolha baseado na resposta. A decisão depende de fatores tais
como comorbidades, perfil toxicológico e da preferência do médico64.
MANUAIS D E COND UTAS
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Merece destaque o fato de que os critérios vigentes para avaliação de resposta objetiva são
tão rigorosos que podem dar a falsa impressão de que não há benefício com o tratamento. Por
outro lado, a prática clínica demonstra que melhora de sintomas ou estabilização por tempo
significativo é muito freqüente, com evidente melhora na qualidade de vida das pacientes.
Preferimos, então, enunciar as drogas consideradas ativas com as respectivas respostas descritas
como orientação, sem fazer recomendações explícitas sobre sequências terapêuticas a serem
seguidas.
Várias drogas são ativas nessa situação:
- Taxanos:
• Paclitaxel - 135 a 175 mg/m2 a cada 3 semanas
• Paclitaxel - 80 mg/m2/semana por 4 semanas a cada 6 semanas
Resposta esperada em 21-33% das pacientes64.
• Docetaxel 100 mg/m2 EV D1 a cada 3 semanas
Resposta esperada semelhante ao paclitaxel64.
- Etoposide:
• Etoposide oral 50 mg/m2 por 21 dias a cada 4 semanas
Resposta esperada em 8,3-27% das pacientes64.
- Doxorrubicina lipossomal:
• Doxorrubicina lipossomal 35-50 mg/m2 EV a cada 4 semanas
Resposta esperada em 9,0-27,5% das pacientes64.
- Topotecano:
• Topotecano 1 mg/m2/dia EV por 5 dias a cada 4 semanas.
Resposta esperada em 12-19% das pacientes64.
- Gencitabina:
• Gencitabina 800 mg/m2 EV D1, D8 , D15 a cada 4 semanas
Resposta esperada em cerca de 13-27% das pacientes64.
- Vinorelbina:
• Vinorelbina 30 mg/m2 EV D1 + D8 + D15 a cada 4 semanas.
Resposta esperada em 10-20% das pacientes64.
- Ifosfamida:
• Ifosfamida 1,0-1,2 g/m2/dia por 5 dias a cada 3 semanas
Resposta esperada em cerca de 10-20% das pacientes64.
- Outros agentes:
- Tamoxifeno:
Tamoxifeno 20 mg de 12/12 horas
O uso de tamoxifeno está associado a resposta objetiva (RO) em 10-20% das pacientes70.
Estudo do GOG que incluiu 105 pacientes revelou RO em 17% delas e doença estável, com benefício
clínico, em 38%. Este estudo sugeriu, também, que a resposta é mais freqüente quando o receptor
de estrógeno é positivo71.
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- Irinotecano:
Irinotecan 250-300 mg/m2 EV 90 min a cada 3 semanas
Resposta esperada em cerca de 16% das pacientes72.
- Oxaliplatina:
Oxaliplatina 100 mg/m2 EV a cada 3 semanas
Resposta esperada em 11-23% das pacientes74.
- Capecitabina:
Capecitabina 1250 mg/m2 2 X /dia por 14 dias em ciclos de 21 dias
Resposta esperada: objetiva em ±24% e bioquímica em 7-29 % das pacientes74,75.
- Bevacizumabe:
Bevacizumabe 10 mg/kg de peso a cada 2 semanas
Resposta esperada em 16-21% das pacientes63,64
OBS: perfuração intestinal ocorreu em 0-11% das pacientes64.
Recomendações
• Paclitaxel é a droga de escolha (quando não foi usado previamente)
• Doxorrubicina lipossomal, topotecano e etoposide oral são as próximas escolhas.
• A escolha do agente depende do perfil de toxicidade e conveniência de administração da
droga;
• Tamoxifeno é uma escolha importante em mulheres que não tolerem a toxicidade da
quimioterapia;
• Gencitabina, vinorelbine e ifosfamida têm similares níveis de resposta ao tamoxifeno, em
tumores resistentes a platina, porém, são mais tóxicos;
• Irinotecano, oxaliplatina e capecitabina têm menor atividade em doença resistente a platina,
mas podem ser consideradas em casos selecionados.
4.9. Papel da radioterapia
No tratamento da neoplasia epitelial de ovário, a radioterapia pode ser empregada em três
situações: adjuvante, em casos selecionados com contra-indicação a quimioterapia; de resgate,
naquelas pacientes com doença residual de pequeno volume após cirurgia e quimioterapia; e
paliativa.
4.9.1. radioterapia adjuvante
Um dos estudos que corrobora o papel da radioterapia adjuvante foi publicado por Dembo
et al., no qual 190 pacientes, estádios IB, II e III assintomáticas foram randomizadas para receber
radioterapia pélvica versus RT pélvica com clorambucil versus radioterapia de abdome total (WART,
do inglês whole-abdominal radiation therapy)76. Naquelas submetidas a ressecção completa, WART
apresentou elevação da sobrevida global aos 5 anos (78% versus 51%) e aos 10 anos (64% versus
40%), quando comparado com radioterapia pélvica associada a clorambucil. O benefício não foi
observado naquelas com doença residual extensa.
Várias outras séries de uso de radioterapia adjuvante, sendo a maioria retrospectiva, foram
publicadas, com resultados e toxicidades semelhantes, com sobrevida global em cinco anos de 5561% e em 10 anos de 41-54%, com toxicidade crônica em cerca de 10-21% das pacientes77,78,79.
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Meta-análise publicada em 2003, incluindo 5 estudos e 862 pacientes, comparando
quimioterapia adjuvante (4 estudos com cisplatina e 1 estudo com melfalano) versus radioterapia
(2 estudos com radioterapia abdominal total) versus instilação intraperitoneal de 32P (3 estudos)
não encontrou diferença entre as três modalidades terapêuticas adjuvantes, embora seus
resultados devam ser avaliados com cautela, pela grande heterogeneidade das pacientes80.
Na ausência de estudos randomizados adequados que comparem esquemas atuais de
quimioterapia versus radioterapia abdominal total com técnicas mais modernas de radioterapia, a
terapia adjuvante mais empregada é a quimioterapia baseada em platina e taxane. No entanto,
radioterapia pode ser empregada naquelas pacientes estádio IB-II e III assintomáticas, com contraindicação a quimioterapia.
4.9.2. radioterapia de consolidação
Após cirurgia e quimioterapia, na cirurgia second-look cerca de 50% das pacientes apresentam
resposta completa, embora mesmo nesse subgrupo a persistência de doença residual subclínica
seja causa de taxa significantemente alta de recidiva, habitualmente em pelve e abdome.
Na tentativa de se reduzir a taxa de recidiva após resposta inicial completa ou parcial, baseado
em estudos que demonstram que a WART na adjuvância é efetiva em doença residual <2 cm, a
radioterapia passou a ser avaliada em uma série de estudos. A maioria deles mostrou que WART não
é melhor que esquemas adicionais de quimioterapia, todavia o número de pacientes avaliadas foi
pequeno e a maioria de estudos não randomizados.
Dois estudos recentes avaliaram a radioterapia abdominal de consolidação em subgrupo
específico de paciente, sugerindo potencial benefício em um grupo selecionado de pacientes, sem,
ou com mínima, doença residual microscópica. No primeiro, Pickel et al. randomizaram 64 pacientes
estádio III-IV (maioria III), para WART versus observação após cirurgia citorredutora seguida de
quimioterapia, sem evidências de doença residual (embora cirurgia second-look não tenha sido
empregada). WART elevou a sobrevida livre de doença de 26% para 49% (p=0,013) e a sobrevida
global de 33% para 59% (p=0,020), em 5 anos81.
O segundo estudo, publicado por Sorbe em 2003, incluiu exclusivamente pacientes com
doença estádio III. Aquelas com resposta patológica completa na cirurgia second-look foram
randomizadas para WART versus quimioterapia versus observação. As pacientes com doença
residual microscópica foram randomizadas para WART versus quimioterapia. O benefício em
sobrevida livre de doença em 5 anos foi observado nas pacientes com remissão patológica
completa submetidas a radioterapia (56% WART versus 36% para QT versus 35% para observação),
sem diferença estatística em sobrevida global. Nas pacientes com doença residual microscópica,
não foi observada diferença entre WART e quimioterapia82.
Embora WART de consolidação não tenha sido avaliada após esquemas atuais de
quimioterapia, essa modalidade de terapia de consolidação pode ser considerada em casos
selecionados, com doença residual mínima83.
4.9.3. radioterapia paliativa
Radioterapia paliativa é empregada nos casos de sangramento, dor, sintomas obstrutivos, e
menos freqüentemente dispneia, linfedema e metástases cerebrais. Realizada em campos
localizados para paliação dos sintomas, produz benefício significante (taxa de resposta de 34% a
73%), com duração mediana de 5 a 11 meses, e deve ser considerada em pacientes selecionados,
especialmente naquelas com doença refratária à quimioterapia.
4.9.4. Técnica e complicações da radioterapia
A técnica de radioterapia utilizada na radioterapia abdominal total é composta por campos
anterior e posterior em abdome e pelve, da borda superior do diafragma à porção inferior do
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forame obturador, e lateralmente além das reflexões peritoneais, com dose de 30Gy, seguido de
complementação de dose em região para-aórtica até 45Gy e em pelve até 45-50Gy.
Fyles et al. descreveram as toxicidades agudas e tardias em 598 pacientes tratadas com WART
no período de 1971 a 198584. As reações agudas mais freqüentes foram diarréia (70%), náusea/
vômitos (60%), leucopenia e trombocitopenia (11%), com 23% de interrupção do tratamento por
toxicidade, principalmente hematológica. As reações tardias mais frequentes foram alteração da
função hepática (44%), diarreia crônica (14%), pneumonite basal (4%) e obstrução intestinal grave
(4,2%).
Recomendações
• Radioterapia (RT) é ativa no câncer epitelial de ovário.
• RT adjuvante é eficaz, porém mais tóxica do que a quimioterapia (QT), não sendo então,
considerada como tratamento padrão.
• RT em pacientes com doença persistente ou recorrente mínima (≤ 1,0 cm) após QT parece
prolongar a sobrevida.
• RT paliativa, antiálgica ou descompressiva, pode ser considerada quando cirurgia ou QT não
forem opções viáveis.
4.10. Critérios para Acompanhamento após o Tratamento
Como vimos anteriormente, câncer epitelial de ovário recidivado após tratamento primário
adequado, é doença incurável e infelizmente, não foi possível demonstrar benefício de sobrevida
quando se utiliza um programa de acompanhamento intensivo. Também não está definido qual
seria o momento ideal para se iniciar o tratamento de resgate, nas pacientes assintomáticas,
baseado na progressão determinada por este seguimento85,86. A seguir detalharemos os
procedimentos mais citados no seguimento do câncer epitelial de ovário, seguidos das nossas
recomendações.
4.10.1. Dosagem do CA-125 sérico
Níveis séricos elevados de CA-125 podem preceder a recorrência clinicamente detectável em
56% a 94% dos casos, com um intervalo de tempo mediano de 3 a 5 meses85,86,87. Valores como o
dobro do limite superior do valor normal, ou o dobro do valor do nadir, nas pacientes em que a
medida nunca atingiu níveis normais, têm um valor preditivo positivo de 98,8% para progressão
da doença.88
Mais recentemente, critérios de progressão baseados na elevação do CA-125 dentro da faixa
normal foram sugeridos. Uma elevação de 100% sobre o nadir ou um aumento absoluto de 5 U/mL
são preditivos de recorrência89. A taxa mais baixa de CA125, mesmo nas pacientes em que o CA125 se normalizou pode ter valor prognóstico quanto à recidiva90.
Para pacientes com tumores mucinosos e CA-125 normal, outros antígenos, como o CA 19.9,
o CA 72.4 ou o CEA, podem ser úteis para sua monitorização, caso estejam inicialmente elevados85.
4.10.2. Exame físico
Cerca de 50% das recorrências do câncer epitelial de ovário acometem a pelve e, por este
motivo, o exame físico nas consultas de seguimento deve incluir o exame pélvico/ginecológico85.
O exame físico combinado à dosagem do CA-125 sérico, foi capaz de identificar a recorrência em
98% de 54 pacientes em seguimento de câncer de ovário91.
MANUAIS D E COND UTAS
| 111
4.10.3. Ultrassonografia
A ultra-sonografia abdômino-pélvica e transvaginal, com ou sem “doppler”, pode ser útil no
seguimento, porém o exame pélvico pode ser mais sensível, bem como a tomografia computadorizada. Está recomendada como complementar ao exame físico por alguns grupos europeus, porém
nem é citada pelo NCCN (National Comprehensive Cancer Network), por exemplo85,92.
4.10.4. Tomografia computadorizada
A tomografia computadorizada (TC) de abdômen e pelve é utilizada no diagnóstico,
estadiamento, planejamento cirúrgico e na determinação da resposta e da recorrência do câncer
epitelial de ovário. Sua principal limitação é a baixa sensibilidade para pequenos implantes
tumorais. A maioria dos estudos sobre a acurácia do método incluía a cirurgia como padrão ouro.
A sensibilidade variou de 40% a 63%, a especificidade de 50% a 94%, o valor preditivo positivo de
67% a 83% e o valor preditivo negativo de 25% a 83%85,93.
A tomografia computadorizada de tórax está indicada apenas nas pacientes com elevação
do CA-125 sérico e TC de abdômen e pelve normais, uma vez que a recorrência torácica isolada é
rara, variando entre 2,7% e 5%85.
Ressonância Magnética
A ressonância magnética pode ser mais sensível para doença peritoneal, porém menos eficaz
para detecção de doença linfonodal. Alguns autores sugerem que deve ser reservada para os casos
onde existam achados duvidosos na TC, por ter maior custo e ser de realização mais prolongada.
A sensibilidade para detecção da recorrência variou de 67% a 91%, a especificidade de 60%
a 100%, o valor preditivo positivo de 65% a 100% e o valor preditivo negativo de 46% a 83%85.
4.10.5. PET-CT
A tomografia por emissão de pósitrons é particularmente útil nas pacientes que apresentam
elevação do CA-125, durante o seguimento, associado a exames de imagem negativos ou
inconclusivos. É mais sensível para a recorrência linfonodal no retroperitôneo que para a recorrência
peritoneal; sua acurácia, para lesões inferiores a 1 cm, é baixa. A combinação do PET com a tomografia
computadorizada melhora a localização anatômica da captação anormal. A sua sensibilidade para
detecção de recorrência varia entre 73% e 88%, a sua especificidade varia de 40% a 75%, seu valor
preditivo positivo entre 73% e 94% e seu valor preditivo negativo varia entre 40% e 55%85.
Recomendações
História, exame físico, exame pélvico e CA-125 sérico (caso elevado inicialmente) a cada 2-4
meses nos 2 primeiros anos, a cada 6 meses por 3 anos e a seguir anualmente. Hemograma e
bioquímica conforme indicação clínica. A tomografia computadorizada de abdômen e pelve, a
radiografia (ou TC) de tórax e o PET são realizados quando indicados por sintomas ou sinais, e não
rotineiramente.
4.10.6. Situações especiais
Cirurgias conservadoras
Nas pacientes submetidas à cirurgia conservadora como tratamento de câncer epitelial de
ovário invasivo ou borderline, o seguimento deve incluir a ultrassonografia abominal e pélvica e
transvaginal (nas pacientes sexualmente ativas) e exame físico/pélvico a cada 3 meses nos
primeiros 2 anos e a cada 6 meses a seguir. A dosagem do CA-125 segue os critérios anteriores94.
A possibilidade de gestação após tratamento conservador em pacientes jovens pode ser
considerada, e um relato francês de ovulação induzida não aumentou o risco de recidiva da
neoplasia95.
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Capítulo 5
Câncer de Endométrio
Editor: Dr. João Nunes de Matos Neto
Autores: Dra. Cláudia Ottaiano Rogrigues, Dr. Evanius Garcia Wiermann e Dr. Juliano de Pádua
Nakashimas
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Capítulo 5
Câncer de Endométrio
5.1. Introdução
O câncer de endométrio é o câncer ginecológico mais comum nos Estados Unidos com 42160
casos novos anuais e 7780 mortes anuais. 1
No Brasil, segundo dados dos Registros de Câncer de Base Populacional, as maiores taxas
médias de incidência anuais, ajustadas por idade por 100 mil mulheres, foram nas cidades de Jaú,
Porto Alegre e Goiânia, com 10.1, 8.0 e 7.8 respectivamente.2
Embora a incidência seja maior na raça branca, a mortalidade é maior entre as mulheres negras.3
5.2. Fatores de risco
Aproximadamente 80% dos carcinomas de endométrio são do tipo I, cuja exposição ao
excesso de estrógenos endógenos ou exógenos sem a contraposição de exposição aos progestágenos
é o fator de risco determinante 5. Tamoxifeno é uma das drogas mais avaliadas neste contexto. (vide
tabela)
Outro fator relacionado é a anovulação crônica, como na síndrome do ovário policístico, em
que o risco pode chegar a 3 vezes mais que na população geral. Tratamento com anticoncepcionais
e retirada de progesterona regular pode reduzir tal risco.
Síndromes hereditárias, particularmente a de Lynch, podem aumentar o risco cumulativo de
carcinoma endometrial em até 43% durante a vida, bem como de outros tumores como tumores
colorretais, gástricos, biliares, urológicos e ovarianos.
Fator de risco para Carcinoma Tipo I
Terapia estrogênica não oposta crônica, por ex., TRH
Síndrome metabólica
Obesidade
Diabetes mellitus
Síndrome de ovário policístico
Longo tempo de vida com sangramento menstrual
Nuliparidade
Infertilidade
História de câncer de mama
Terapia com tamoxifeno
risco relativo
2-10
NA
2-4
2
3
2
2
NA
NA
2-4
5.3. Diagnóstico
A apresentação mais comum do carcinoma de endométrio é o sangramento vaginal anormal,
que inclui a menorragia, metroragia ou a menometrorragia em pacientes em menacme ou
sangramento pós-menopausal nas que já interromperam seus ciclos há mais de 12 meses, sendo
importante manter o índice de suspeição naquelas com fatores de risco presentes. Lembrar que
75% dos casos acontecem em mulheres na pós-menopausa.
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Quando sintomas presentes, geralmente inicia-se a investigação com a ecografia transvaginal,
mas após mantida suspeita, deve-se seguir para avaliação histológica da cavidade endometrial.
Atualmente, a biópsia endometrial ambulatorial tem uma acurácia muito alta, índices de sensibilidade
de até 82%, mas com valores preditivos negativos baixos, o que implica que em se obtendo um
resultado negativo na persistência de sintomas, ou com amostra inicial insuficiente ou naquelas
pacientes que não toleram o exame ambulatorial por desconforto ou estenose de canal cervical,
deve-se prosseguir com investigação sob visão histeroscópica ou mesmo dilatação e curetagem
de cavidade endometrial.
5.4. Classificação
O câncer de endométrio é classificado em dois subtipos, com prognóstico e história natural
diferentes 4:
• Tipo I - Carcinoma de Endométrio relacionado ao Estímulo Estrogênico - estes tumores
tendem a aparecer em mulheres obesas, diabéticas, nulíparas e hipertensas, com forte fator indicativo
de excesso de estímulo estrogênico. Geralmente apresentam-se como tumores endometrioides de
baixo grau, com forte associação com hiperplasia endometrial prévia ou concorrente;
• Tipo II - Carcinoma de Endométrio Não-relacionado ao Estímulo Estrogênico - Geralmente não são estrógeno-dependentes e apresentam-se, via de regra, como tumores agressivos,
de alto grau, do tipo seroso-papilar ou tumores de células claras.
5.5. Estadiamento
O carcinoma de endométrio é estadiado cirurgicamente. Avaliação pré-operatória deve incluir um
radiograma torácico para excluir doença extrapélvica. A ressonância nuclear magnética com contraste
é o melhor exame de imagem para avaliação de envolvimento cervical e avaliação de invasão
miometrial, mas não oferece nenhuma informação adicional se terapia cirúrgica estiver planejada.
Uma ecogrfia abdominal total pode ser útil para descartar obstrução do tratao urinário, bem como
uma cistoscopia e retoscopia, podem de forma opcional, avaliar envolvimento de estádio IVA.
O estadiamento foi recentemente reavaliado, com nova publicação pela AJCC em 2010, com a
retirada de algumas subclassificações anteriores, que foram reagrupadas. Houve, concomitantemente,
um novo realinhamento do estadiamento da Federação Internacional de Ginecologia e Obstetrícia,
que seguiu a mesma linha do AJCC6.
Tumor Primário - Achados Operatórios
TNM
TX
T0
Tis*
T1
T1a
T1b
T2
T3a
T3b
T4
FIGO
Definição
Tumor Primário não avaliável
Sem evidência de tumor primário
Carcinoma in situ
I Tumor confinado ao corpo do útero
IA Tumor limitado ao endométrio ou que invada menos que metade do miométrio
IB Tumor invade metade ou mais do miométrio
II Tumor invade tecido conectivo do cérvix uterino mas não se extende através do útero
IIIA Tumor envolve serosa ou anexos por invasão direta ou metástase
IIIB Comprometimento vaginal por extensão direta ou metástase OU envolvimento
IVA parametrial
Invasão da mucosa da bexiga ou mucosa intestinal
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Estadiamento Linfonodal
TNM
NX
N0
N1
N2
FIGO
IIIC1
IIIC2
Definição
Linfonodos regionais não podem ser avaliados
Sem metástase linfonodal
Metástases em linfonodos pélvicos
Metástases em linfonodos para-aórticos (com ou sem comprometimento
de linfonodos pélvicos)
Metástase à distância
TNM
M0
M1
FIGO
IVB
Definição
Sem metástase à distância
Metástase à distância (exclui-se metástase para linfonodos para-aórticos,
vagina, serosa da pelve ou anexos).
Agrupamento Prognóstico
Estádio 0*
Estádio I
Estádio IA
Estádio IB
Estádio II
Estádio III
Estádio IIIA
Estádio IIIB
Estádio IIIC1
Estádio IIIC2
Estádio IVA
Estádio IVB
Tis
T1
T1a
T1b
T2
T3
T3a
T3b
T1-T3
T1-T3
T4
qualquer T
N0
N0
N0
N0
N0
N0
N0
N0
N1
N2
qualquer N
qualquer N
M0
M0
M0
M0
M0
M0
M0
M0
M0
M0
M0
M1
* FIGO não mais inclui Estádio 0 (Tis). Envolvimento endocervical glandular exclusivo é considerado estádio I. Citologia
positiva não altera o estadiamento original e deve ser reportada separadamente
Grau 1: ≤ 5% de padrão de crescimento sólido não escamoso ou não morular
Grau 2: 6 a 50% de padrão de crescimento sólido não escamoso ou não morular
Grau 3: > 50% de padrão de crescimento sólido não escamoso ou não morular, histologia serosa, células claras ou tumor
mesodérmico misto
5.6. Tratamento
Tratamento da Doença Localizada e Locorregionalmente Avançada
5.6.1. Tratamento Cirúrgico
A cirurgia é o tratamento primário recomendado. A histerectomia total abdominal com
salpingo-ooforectomia bilateral é um procedimento aceito quando presume-se, através da
avaliação clínica pré-operatória, o estádio I e, mesmo não trazendo informações do status linfonodal,
não interfere na sobrevida global e na sobrevida livre de doença7. Em adição, linfadenectomia deve
ser recomendada para pacientes EC I de alto risco e com histologias adversas. O estadiamento
cirúrgico padrão tradicionalmente inclui citologia peritoneal, histerectomia extrafascial total,
salpingo-ooforectomia bilateral e biópsia de qualquer lesão suspeita e tipicamente inclui
amostragem linfonodal retroperitoneal.
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Linfadenectomia sistemática pélvica tem sido avaliada para doença extrauterina e alguns
advogam sua utilidade com fim terapêutico. O estudo ASTEC avaliou se este procedimento poderia
aumentar a sobrevida de pacientes neste cenário. 26 Aproximadamente 1400 mulheres com doença
clinicamente confinada ao útero foram aleatorizadas para tratamento cirúrgico padrão com ou
sem linfadenectomia, sendo que as pacientes de doença inical de risco intermediário ou alto
também foram posteriormente randomizadas para radioterapia complementar. Após 37 meses de
seguimento, a diferença absoluta de sobrevida global e de sobrevida livre de recidiva foram de 1%
e de 5%, respectivamente, favorecendo o braço da cirurgia ampliada, o que foi considerado
negativo, mesmo após ajuste para características clínicas e patológicas desbalanceadas.
Outro estudo interessando este assunto aleatorizou pacientes com estádio clínico FIGO I para
associação ou não da linfadenectomia pélvica à cirurgia padrão e notaram taxas de complicações
pós-operatórias precoces e tardias significativamente mais altas no braço dos que se submeteram
à toalete linfonodal. Embora a linfadenectomia tenha produzido melhora significativa no
estadiamento cirúrgico, este não foi associado a melhora nos parâmetros de sobrevida.
Além disso, assuntos como a extensão para-aótica deste procedimento têm sido debatidos.
Uma análise do GOG demonstrou que na vasta maioria dos pacientes com metástase linfonodal
aórtica comprovada, pelo menos 1 dos seguintes fatores estava presente: linfonodos pélvicos
grosseiramente positivos, metástases anexiais grosseiramente positivas ou invasão de terço externo
miometrial, podendo servir como referências para o tratamento. Mas, também de maneira
retrospectiva, identificou-se que a taxa de linfedema pós-operatório foi estatisticamente maior
nos pacientes nos quais foram removidos mais de 10 lindonodos regionais. Meta-análise recente
revela que naqueles com risco elevado para metástases infonodais (pT1b, grau 3), o risco de morte
pode ser reduzido em até 50%, se realizada a linfadenectomia estendida até nível para-aórtico,
com benefício absoluto de sobrevida a 5 anos de 10,6% (HR 0,44; 95% IC 0.30–0.64; p<0.0001).27
Estudos aleatorizados avaliando o papel da amostragem linfonodal pélvica e para-aórtica
seletivas contra a dissecção sistemática ainda não estão disponíveis, mas análises retrospectivas,
com seus sabidos viéses, têm indicado que em pacientes de risco intermediário e alto (incluindo
aqueles com estádios IB, grau 3; estádio IC e II-IV, de todos os graus), a linfadenectomia está
associada a um ganho de sobrevida doença específica. Para pacientes com estádios IIIC/IV e com
doença linfonodal, a extensão da ressecção foi ainda mais impressionante, com sobrevida livre de
doença a 5 anos de 51% para 1 linfonodo ressecado até 72% quando mais de 20 foram avaliados.
Nos estádios mais avançados, o esvaziamento linfonodal pélvico e para-aórtico pode então trazer
informações valiosas que podem ser utilizadas na estratégia de tratamento adjuvante definitivo.
Já pacientes de baixo risco não demonstraram tal benefício relacionado ao procedimento.28
O método cirúrgico também foi avaliado pelo GOG, sendo que pacientes com estádios I-IIA foram
randomizados para laparotomia ou laparoscopia, sendo detectadas taxas de conversão de até 23,7%,
especialmente se encontradas dificuldades para estadiamento para-aórtico, mas sem diferenças
nos outros parâmetros, tornando a laparoscopia um procedimento razoável nestas mulheres.
5.6.2 . Tratamento radioterápico Adjuvante
5.6.2.1. Doença confinada ao útero:
Após tratamento cirúrgico e avaliação patológica completa, as pacientes devem ser estratificadas
em grupos de risco de recorrência, que orientarão a indicação de tratamento adjuvante, principalmente
o tratamento adjuvante radioterápico.
O uso da radioterapia no câncer precoce de endométrio ainda é sujeito a debate. Diversos
estudos avaliando este assunto falharam em demonstrar benefício de sobrevida, mas o fizeram
em relação à redução de recorrência. As questões relevantes e que trazem discussões acaloradas
referem-se à indicação do tratamento adjuvante no estádio I, além da dúvida se a braquiterapia
poderia substituir a teleterapia em alguns cenários específicos.
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Além disso, um grande fator de confusão é que a classificação de risco utilizada em todos os
estudos que debatem a questão foi formulada não se levando em consideração o estadiamento da
AJCC de 2010 e sim, sistemas de estadiamentos anteriores, o que pode trazer confusão na
interpretação e transporte dos dados para o estadiamento atual.
Vários fatores como estadiamento, o grau histológico, a presença de invasão linfática/vascular,
a idade, os subtipos histológicos seroso-papilífero e células claras interferem na decisão terapêutica
quando avaliamos os estudos disponíveis, sendo difícil estabelecer um critério de risco que seja
aceito universalmente.
Inicialmente, um estudo do GOG99 avaliando radioterapia adjuvante de abdome total em
pacientes com adenocarcinoma de qualquer grau e sem envolvimento linfonodal com doença de
risco intermediário com qualquer grau de invasão miometrial estádios IB, IC e II conseguiu
demonstrar redução significativa de recorrência (12 vs 3%, HR 0.42; P 0,0007) e, em especial, em
pacientes com características de risco intermediário alto (grau 2, invasão linfovascular e invasão
miometrial de terço externo) comparado à observação, mas sem impacto em sobrevida global.29
Já o estudo PORTEC comparou radioterapia pélvica (46Gy) contra observação em pacientes
com carcinoma endometrial estádio I classificados como grau 1 com invasão miometrial profunda
(≥50%), grau 2 com qualquer nível de ou grau 3 com invasão superficial (≤50%) e identificou ganho
na sobrevida livre de recidiva locorregional (14 vs 4%, P<0,001) às custas de mais toxicidade, mas
sem ganho de sobrevida global. Os pacientes com estádios IC grau 3 não foram aleatorizados e
receberam todos radioterapia, mas ainda se detectou taxas de metástases à distância de 31% neste
subgrupo, a despeito de 14% de recidiva local, sendo o grau 3 o fator mais importante para risco
de recidiva e morte nesta doença em análise multivariada.30
O uso de braquiterapia vaginal contra radioterapia externa foi interessado no estudo PORTEC2 numa tentativa de melhorar o controle local com qualidade de vida. Pacientes com câncer
endometrial de risco intermediário operados (estádios IC graus 1-2, IB grau 3, IIA grau 1-2 ou grau
3 com <50% de invasão miometrial) foram aleatorizados para um destes braços. Observou-se que,
a 3 anos de seguimento, as recidivas vaginais foram de 0% e 1,6%, as pélvicas de 1,3% e 0,7%, e as
sistêmicas de 6,4% e 6,0%, respectivamente para braquiterapia e telerradioterapia, com melhor
qualidade de vida para o tratamento intravaginal.31 Estudos como o GOG 249 atualmente estudam
o papel da incorporação da quimioterapia à radioterapia adjuvante nestes pacientes.
Em torno de 20% das pacientes tratadas com radioterapia externa pélvica apresentam
sequelas leves tardias e 3% apresentam sequelas severas tardias, sendo que a indicação deste
tratamento adjuvante tem que sobrepor o risco desta estratégia8.
Frente a esta realidade, sugerimos que a classificação de risco siga os critérios de risco que
aparecem listados nos estudos utilizados de substrato para a meta-análise conduzida por Kong e
colaboradores9:
• Alto risco - presença de algum dos fatores infralistados:
- Subtipo seroso-papilar ou de células claras, grau III, citologia peritoneal positiva, ou estádio II;
• risco Intermediário:
- IA grau II e invasão linfovascular ou IA grau II e idade >60 anos, IB grau I com invasão
linfovascular ou IB grau I e idade >60 anos e estádio IB grau II
• Baixo risco:
- Não se encaixa em nenhuma das classificações acima para o estádio I.
Utilizando-se esta classificação de risco, favorecemos a seguinte estratégia de tratamento
radioterápico (tabela1):
• Baixo risco:
- Apenas observação;
• risco Intermediário:
- Braquiterapia endovaginal;
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• Alto risco:
- Radioterapia externa + braquiterapia endovaginal.
Tabela 1 - recomendações para radioterapia Adjuvante
Grau Histológico
Grau 1
Grau 2
Grau 3, histologia
adversa, citologia
peritoneal positiva
IA
BraquiRxT, se LVI ou >
60 anos
+ e BraquiRxT
Estádios
IB
IC
BraquiRxT, se LVI ou > + e BraquiRxT60 anos
BraquiRxT
+ e BraquiRxT
+ e BraquiRxT¹
+ e BraquiRxT
¹Após linfadenectomia completa, considerar braquiterapia sozinha devido a excesso de complicações
LVI= invasão linfovascular
+= telerradioterapia recomendada
- = telerradioterapia não recommendada
5.6.2.2. Doença Não-Confinada ao Útero:
• Estádio III :
. Radioterapia externa associada ou não a braquiterapia endovaginal
. IIIB - incluir toda a vagina no planejamento da braquiterapia endovaginal
. IIIC2 - incluir linfonodos para-aórticos no planejamento da radioterapia
• Estádio IVA:
. Radioterapia externa
5.6.3. Quimioterapia Adjuvante
Vários estudos prospectivos e casualizados têm avaliado o papel da quimioterapia comparada
à radioterapia ou em combinação com a radioterapia no tratamento pós-operatório do carcinoma
de endométrio. Em alguns cenários específicos o papel da quimioterapia está bem determinado.
• Pacientes com doença confinado ao útero de alto risco
- Hogberg e colaboradores avaliaram a associação de quimioterapia à radioterapia.10 A
quimioterapia foi administrada antes ou após a radioterapia e foram utilizados 4 ciclos de vários
esquemas de quimioterapia com associação de doxorrubicina e cisplatina (AP), epirrubicina e
cisplatina, carboplatina e epirrubicina, além da associação de paclitaxel e carboplatina (TC) em 383
pacientes com estádios I-IIIC (a maioria com estádio I). Da análise destes dados, foi favorecido o
braço multimodal de quimioterapia seguida de radioterapia externa com ou sem braquiterapia;
- Outro estudo também avaliou o papel de 3 ciclos de doxorrubicina e cisplatina (AP) em 157
pacientes com doença IIB-IIIC, sendo que a análise conjunta destes dois trabalhos supracitados
demonstrou um ganho significativo na sobrevida doença-específica (HR=0,55, IC 95% 0,35-0,88,
p=0,01), na sobrevida livre de doença (HR=0,63, IC 95% 0,44-0,89, p=0,009) e uma tendência para
aumento da sobrevida global (HR=0,69, IC 95% 0,46-1,03, p=0,07) em favor do braço da
quimioterapia seguida de radioterapia, sendo que o regime AP emerge como a opção mais clara,
podendo-se usar o regime TC naqueles com contraindicações para antraciclinas.32
• Pacientes com estádio III/IVA
- O estudo de fase III GOG 122 11 avaliou a radioterapia abdominal total contra quimioterapia
com regime AP (doxorrubicina 60mg/m2 e cisplatina 50mg/m2 dadas a cada 3 semanas (7 ciclos),
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seguida de cisplatina isolada no último ciclo) em pacientes com adenocarcinoma estádios III ou IV
com doença otimamente operada. O Hazard Ratio para progressão ajustada por estádio foi de 0,68
em favor do braço da quimioterapia, com projeção de sobrevida a 5 anos de 50% e 38%,
respectivamente para AP e radioterapia, às custas de maior toxicidade associada. Análise exploratória
identificou grau 3, idade avançada, histologia serosa e raça negra como fatores de pior prognóstico.
- Atualmente, o GOG protocol 258 está recrutando pacientes com carcinoma endometrial
estádios III e IVA, aleatorizando-os para receber cisplatina associada a radioterapia volumedirecionada seguida por carboplatina e paclitaxel vs carboplatina e paclitaxel isolados sem radiação
e estes resultados são ansiosamente aguardados para se tentar estabelecer um benefício do
tratamento combinado neste contexto.
Recomendações:
• Terapia Adjuvante do Carcinoma Endometrial baseada em risco (pela classificação antiga)
• Após histerectomia com remoção de anexos bilaterais e linfadenectomia sistemática (15
linfonodos pélvicos e 10 para-aórticos)
• pT1a G1/2, pT1b G1, pN0 - Sem terapia adjuvante
• pT1a G3, pT1b G2/3, pT1c, pT2, pN0 - Braquiterapia vaginal ± Telerradioterapia e/ou quimioterapia
• pT3, pT4, pN0 e todos pN1 - Telerradioterapia ± braquiterapia e/ou quimioterapia
• Carcinoma seroso e de células claras - Telerradioterapia ± braquiterapia e/ou quimioterapia
• Após histerectomia com remoção de anexos bilterais mas sem lnfadenectomia sistemática
• pT1a G1/2 e T1b G1 Nx/cN0 - Sem terapia adjuvante
• pT1b G2 Nx/cN0 - Braquiterapia vaginal
• Se estadiamento cirúrgico completo secundário não for possível
• pT1a G3, pT1b G3 Nx/cN0 - Braquiterapia vaginal; telerradioterapia adicional pode ser considerada
• pT1c, pT2 Nx/cN0- Telerradioterapia ± braquiterapia e/ou quimioterapia
• pT3/pT4a Nx/cN0, and all cN1 - Telerradioterapia ± braquiterapia e/ou quimioterapia
Carcinoma seroso ou de células claras- Telerradioterapia ± braquiterapia e/ou quimioterapia
5.6.4. Doença avançada ou recorrente
5.6.4.1. Citorredução
Estudos retrospectivos avaliaram a utilidade da cirurgia citorredutora em pacientes com
doença avançada e metastática. Bristow e colegas identificaram que em pacientes com EC IVB e que se
submeteram a citorredução ótima, definida como doença residual ≤ 1cm tiveram a sobrevida
mediana melhorada comparada aos que não atingiram tal nível de sucesso operatório (34,3 vs 11.0 meses,
P =0,0001). Da mesma forma, Chi e colegas avaliaram retrospectivamente os pacientes com
adenocarcinoma estádio IV e conseguiram identificar 3 grupos distintos: aqueles com citorredução
ótima (diâmetro do maior nódulo ≤ 2cm), aqueles com citorredução subótima e os com carcinomatose
irressecável e sem cirurgia, com medianas de sobrevida de 31, 12 e 3 meses, respectivamente (P <0,01).
Apesar da ausência de dados prospectivos que avaliem o papel da citorredução no câncer de
endométrio avançado ou recorrente, uma meta-análise condensou os diversos estudos
retrospectivos a cerca do assunto e definiu benefício de sobrevida global no grupo de pacientes
submetidos a cirurgia citorredutora sem doença residual grosseira. 12 7
5.6.4.2. Hormonioterapia
São candidatas à hormonioterapia as pacientes com câncer de endométrio grau I e grau II,
com receptores hormonais positivos, com doença indolente e oligossintomática. A melhor opção
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de tratamento hormonal ainda permanece incerta. Os tumores bem diferenciados apresentam
maior taxa de resposta ao tratamento na maioria dos estudos publicados.
- Thigpen e colaboradores 13 avaliaram o papel dos progestágenos (acetato de medroxiprogesterona) nos pacientes com este perfil e obtiveram taxas de resposta de 25%. Neste estudo,
houve reposta completa em 17% dos pacientes tratados e o tempo até progressão da doença foi
de 3,2 meses.
- Fiorica e colaboradores 14 estudaram a taxa de resposta e a toxicidade envolvida em esquema
com acetato de megestrol 160mg/dia por 3 semanas intercalado com tamoxifeno 20mg/dia por 3
semanas. Ficou demonstrado respostas em 27% dos pacientes, sendo que 53% dos pacientes que
responderam a terapia mantiveram resposta por período superior a 20 meses.
5.6.4.3. Quimioterapia de primeira linha
São candidatas à quimioterapia sistêmica as pacientes com câncer de endométrio grau III
e/ou ausência de receptores hormonais positivos e/ou progressão de doença após hormonioterapia
e/ou pacientes sintomáticos e com doença de comportamento agressivo.
Fleming e colaboradores 15, no estudo de fase III do GOG 177, avaliaram o benefício da adição
dos taxanes ao esquema de Doxorrubicina e Cisplatina (AP) no contexto de pacientes com câncer
de endométrio avançado ou recorrente. O uso do esquema TAP, que consiste em Doxorrubicina
45mg/m2 (D1), Cisplatina 50mg/m2 (D1) e Paclitaxel 160mg/m2 (D2) a cada 21 dias (associado a
fator estimulador de colônias de granulócitos) e demonstraram taxa de resposta objetiva (57 vs
34%), sobrevida livre de progressão (8.3 vs 5.3 meses) e sobrevida global (15.3 vs 12.3 meses)
significativamente melhores para o regime tríplice (TAP), quando comparado ao regime padrão,
mas às custas de maior toxicidade neurológica.
Um esquema alternativo é a utilização de Carboplatina associada a Paclitaxel, naquelas
pacientes que não apresentam condições clínicas de serem tratados com esquema TAP. Hoskins e
colaboradores 16 demonstraram eficácia e segurança deste esquema utilizando Carboplatina (AUC
5 a 7) e Paclitaxel 175mg/m2 em 3 horas a cada 28 dias, em estudo fase II. Um estudo de não
inferioridade (GOG 209) está em andamento, comparando Carboplatina (AUC 6) e Paclitaxel
(175mg/m2) ao esquema TAC 17.
5.6.4.4. Quimioterapia de segunda linha ou pacientes com uso prévio de Taxanes e
Doxorrubicina
Pacientes com doença recorrente ou avançada que tenham utilizado esquemas de
poliquimioterapia no contexto adjuvante ou em primeira linha de tratamento paliativo, baseada
em doxorrubicina e/ou taxanes, devem ser avaliadas quanto a tratamento com os esquemas em
tabela abaixo, com as seguintes taxas de resposta:
referência
Sutton 18
Miller 19
Muggia 20
Lincoln 21
Fracasso 22
Garcia 23
Dizon 24
n
52
22
42
44
54
27
50
Esquema
Ifosfamida 1,2g/m2 D1-D5 (28 d)
Topotecano 0,5-1,5mg/m2 D1-D5 (21 d)
Doxorrubicina peguilada 50mg/m2 D1 (28 d)
Paclitaxel 110 a 200mg/m2 D1 (21 d)
Oxaliplatina 50mg/m2 D1 (28 d)
Docetaxel 36mg/m2 (semanal)
Ixabepilona 40mg/m2 D1 (21 d)
Taxa de resposta
15%
9%
9%
27%
13%
7%
12%
5.6.4.5. Tratamento de recidiva local isolada
Recorrência vaginal isolada é tradicionalmente tratada com radiação, com taxas de controle
local de moderado a bom reportadas com braquiterapia de baixa taxa de dose na casa de 40 a
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100%. Outras publicações retrospectivas avaliando a braquiterapia de alta taxa de dose obtiveram
taxas de controle mais consistentes do 90 a 100%, com poucas recidivas a 3 anos de seguimento
aliados a sobrevidas livre de doença e doença especifica muito altas (96% cada). Um estudo
revisional de Tewari e colegas avaliou retrospectivamente braquiterapia intersticial com ou sem
radioterapia externa para recorrência vaginal de carcinoma endometrial.33 A população do estudo
identificou recorrências vaginais diagnosticadas com uma mediana de 29 meses após a
histerectomia sem evidência associada de extensão para parede pélvica lateral ou doença
metastática sincrônica e demonstrou resposta clínica completa em 28 pacientes (93%). Quando
medidos do tempo de recidiva vaginal, os investigadores conseguiram obter mediana de sobrevida
de 60 meses, com taxas de morbidades maiores como proctite em 2 pacientes, fístulas em 2 e
estenose em um quinto.
O estudo PORTEC anteriormente citado documentou prospectivamente as taxas de
salvamento de radioterapia, e os resultados mostraram uma sobrevida actuarial a 3 anos de apenas
51% nas 46 mulheres com recorrência pélvica sem terapia actínica prévia. Portanto, melhores
estratégias têm que ser desenvolvidas. O GOG 238 é um estudo de fase II que está também
estudando este grupo de pacientes com recidivas confinadas à vagina ou pelve, sendo estes
pacientes aleatorizados para radioterapia pélvica total + braquiterapia ou reforço externo contra
radioterapia pélvica total + cisplatina semanal seguida de braquiterapia ou reforço externo, tanto
do ponto de vista de sobrevida livre de progressão, quanto do de sobrevida global e toxicidade.
A cirurgia também parece trazer benefícios a pacientes selecionadas, com recidivas vaginais
isoladas em área irradiada e sem envolvimento de parede pélvica e retroperitôneo. Um estudo
retrospectivo, com 35 pacientes resgatadas cirurgicamente, reportou sobrevida mediana de 39
meses contra 13 meses das pacientes submetidas à cirurgia não completa ou àquelas submetidas
ao tratamento não cirúrgico (n=26) (p=0,0005) e num seguimento mediano de 40 meses, 54% das
mulheres submetidas à cirurgia de salvamento completa continuavam sem evidência de doença.
5.7. Situações Especiais
5.7.1. Paciente que não pode ser submetida ao tratamento cirúrgico
Existe um pequeno número de pacientes que têm contraindicação para a cirurgia, por
apresentarem riscos inacetáveis de complicações, consideradas inoperáveis. As pacientes com
estádio I e II podem ser tratadas com radioterapia exclusiva e apresentam boas taxas, tanto de
sobrevida livre de doença como sobrevida global 25. As pacientes com estádio III, podem ser tratadas
com quimioterapia seguida de tratamento definitivo com radioterapia externa e braquiterapia.
5.8. Seguimento
Não existem dados que definam que o diagnóstico precoce da recidiva tumoral tem impacto
na sobrevida global. Além disso, não há uma recomendação padrão.
Baseados na história natural da doença, orientamos avaliação clínica e ginecológica semestral
nos 3 primeiros anos para doença inicialmente confinado ao útero e dosagem de CA 125.
Nos pacientes com doença inicial extrauterina, orientamos associação de exames de imagem
do abdome, preferencialmente a tomografia computadorizada de abdome total.
128 |
MA NUA IS D E CO ND UTAS
Bibliografia Sugerida
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130 |
MA NUA IS D E CO ND UTAS
MANUAIS D E COND UTAS
Capítulo 6
Câncer Testicular Germinativo
Editora: Dra. Ana Luiza Gomes de Morais Wiermann
Autores: Dr. Sérgio Lunardon Padilha e Dr. Wagner Brant Moreira
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MA NUA IS D E CO ND UTAS
MANUAIS D E COND UTAS
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Capítulo 6
Câncer Testicular Germinativo
6.1. Introdução e Epidemiologia
O câncer de testículo é o tumor maligno mais comum em homens adultos jovens (com idade
entre 15-40 anos) nos Estados Unidos.1 Uma vez que aproximadamente 95% dos tumores
testiculares são tumores de células germinativas (TCG), os termos "câncer testicular" e "TCG" são por
vezes utilizados como sinônimos. Entretanto, uma variedade de outros tipos de tumores podem
ocorrer nos testículos (Tabela 1) e 10% dos TCG surgem em localizações extragonadais.1
A incidência de câncer testicular tem aumentado nos Estados Unidos e varia significativamente
em todo o mundo. São mais altas na Escandinávia, Suíça, Alemanha e Nova Zelândia (até 10
casos/100000 homens), mais moderado nos Estados Unidos e Reino Unido (5 casos/100000
homens) e menor na África e Ásia (1 caso/100000 homens).1
Nos Estados Unidos, o câncer de testículo afeta principalmente homens brancos, com menor
incidência em hispânicos e americanos de origem asiática, e ainda menor em negros. Historicamente,
essas diferenças raciais são mal compreendidas. No entanto, recentes estudos genômicos têm
demonstrado um polimorfismo de nucleotídeo único no KITLG (codificação do ligante para a
proteína c-KIT), que é 4 vezes mais comum em brancos do que em negros e que está associado com
um risco três vezes maior de desenvolver TCG. 2
A criptorquidia, o único fator de risco comprovado para TCG testicular, é associada com um
aumento de 5 vezes na incidência.3,4 Ambos os testículos estão em risco, com aproximadamente
10% dos casos ocorridos no testículo tópico. A orquipexia antes da puberdade é recomendada e
promove redução do risco para TCG testicular, bem como o monitoramento para o seu desenvolvimento.5,6 A história familiar positiva também pode aumentar a probabilidade de desenvolver TCG
testicular.7
Os estudos retrospectivos de pacientes com TCG testicular demonstraram taxas de aumento
de 2 a 4 vezes nos pais dos pacientes, 5 a 9 vezes nos irmãos, 10 vezes em gêmeos dizigóticos e de
30 vezes em gêmeos monozigóticos.8,9 Identificação do loci de susceptibilidade ao KITLG em
estudos de associação ampla de genoma pode fornecer um mecanismo plausível para uma
predisposição familiar.2
A história de câncer testicular também aumenta o risco de desenvolver um tumor contralateral
primário de novo. Aproximadamente 2% dos pacientes desenvolvem um segundo tumor testicular.10
Tais tumores são considerados e tratados como segundo tumor primário, em vez de metástases da
neoplasia anterior.
O câncer de testículo pode também ser mais comum em pacientes com subfertilidade,
infertilidade e certas doenças como a feminização testicular.11
Estudos retrospectivos sugerem que a exposição a pesticidas ou o uso da maconha é mais
frequente em pacientes com câncer testicular, mas deve isto ser visto com cuidado, pois não há
dados convincentes mostrando uma associação entre o câncer testicular e qualquer exposição
ambiental.12,13 Finalmente, TCG mediastinal é mais comum em pacientes com síndrome de
Klinefelter do que em controles pareados por idade.14
134 |
MA NUA IS D E CO ND UTAS
Tabela 1 - Classificação dos tumores do testículo modificada (OMS)
Tumores de células germinativas
Lesão precursora
• Neoplasia de células germinativas intratubular (carcinoma in situ)
Tumores de tipo histológico único
• Seminoma
Variante com sinciciotrofoblasto (anaplásico)
• Seminoma espermatocítico
• Carcinoma embrionário
• Tumor de saco vitelino
• Coriocarcinoma
• Teratoma
Maduro (benigno)
Imaturo (maligno)
Variantes monodérmicas (Carcinóide e neuroectodérmico)
Tumores mistos
Tumores do estroma gonadal / cordão sexual
• Tumor de células de Leydig
• Tumor de células de Sertoli
• Tumor de células granulosas
Adulto
Juvenil
• Tumor de células da Teca
• Indiferenciados
• Mistos
Tumores mistos de células germinativas e estroma gonadal
• Gonadoblastoma
Miscelânea
• Sarcoma
• Tumor carcinóide
• Mesotelioma maligno
Tumores de linhagem linfática
Tumor de ducto coletor e rete testis
Metastáticos
6.1.1 Histologia e Patofisiologia
Tumores de células germinativas (TCG) são derivados de células germinativas primordiais.
Consequentemente, estes tumores têm a capacidade de se diferenciar em uma vasta gama de
diferentes tecidos embrionários e tecidos extraembrionários.
MANUAIS D E COND UTAS
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A Neoplasia intratubular de células germinativas é a lesão precursora não invasiva para TCG.
Ao tornarem-se invasivos, os TCG são separados em duas grandes categorias histológicas:
seminomas e não seminomas, cada um representando aproximadamente 50% dos casos.
Seminomas são geralmente menos agressivos e tendem a ocorrer em homens com mais
velhos, com um pico de incidência no final dos 30 anos. Embora os seminomas já tenham sido
separados nos subtipos clássico e anaplásico, a Organização Mundial de Saúde eliminou essa
distinção, uma vez que o prognóstico e tratamento são semelhantes.
O pico de incidência do tipo não seminoma é por volta dos 20 anos e inclui quatro diferentes
subtipos histológicos (Tabela 1): carcinoma embrionário, coriocarcinoma, tumor de saco vitelino,
e teratoma. A maioria dos não seminomas contêm uma mistura de 2 ou mais desses subtipos e
quando um único subtipo está presente o subtipo mais comum é o carcinoma embrionário.15
Enquanto o seminoma pode ser um componente de um tumor não seminomatoso misto, o
diagnóstico de seminoma puro exige que nenhum outro componente não seminomatoso esteja
presente.
O carcinoma embrionário é o subtipo histológico mais indiferenciado. Este é pluripotente e
pode estar associado com elevações em todos os três marcadores tumorais séricos (gonadotrofina
coriônica humana, alfa-fetoproteína, e lactato desidrogenase), e podem se diferenciar em todos os
outros subtipos histológicos.
O coriocarcinoma representa uma transformação neoplásica do tecido trofoblástico e, por
definição, deve conter sinciciotrofoblastos e citotrofoblastos. A presença de sinciciotrofoblasto por
si só não qualifica um tumor como não seminomatoso e ocasionalmente pode ser vista em um
seminoma puro.
O coriocarcinoma puro é raro e está associado com altos níveis de gonadotrofina coriônica
humana, metástases pulmonares difusas e a uma maior incidência de metástases cerebrais, bem
como a uma propensão à hemorragia.
O tumor de saco vitelínico (também chamado de carcinoma do seio endodérmico) é semelhante
ao saco vitelínico embrionário e está associado com elevação de alfa-fetoproteína. Os tumores do
saco vitelínico ino puros originam-se mais comumente no mediastino do que no testículo.
O teratoma é caracterizado por uma diferenciação em tipos de células somáticas derivadas de
duas ou mais camadas de células germinativas (ectoderma, mesoderma e endoderma) e podem
ser subclassificados como maduros ou imaturos, dependendo de sua aparência de tecido adulto
ou fetal. Embora histologicamente benigno (sem a capacidade de invadir tecidos adjacentes), o
teratoma pode progredir com crescimento descontrolado local ou se transformar em um tumor
maligno somático (isto é, teratoma com transformação maligna), como por exemplo, um
rabdomiossarcoma embrionário, tumor neuroectodérmico primitivo ou adenocarcinoma. A
transformação para doenças hematológicas, como linfoma e leucemia também tem sido
observada, embora rara. Leucemia aguda pressagia um prognóstico particularmente pobre e tem
principalmente sido relatada com TCG não seminomatosos primários do mediastino.16
Vários marcadores imunoistoquímicos ajudam a diferenciar seminoma de não seminoma.16
Ambos, seminoma e não seminoma, expressam os fatores de transcrição OCT-3/4 e NANOG.
Seminomas expressam CD117 (c-KIT), mas não marcadores de diferenciação somática, como
queratina.17 Não seminomas não expressam CD117, mas normalmente expressam citoqueratinas
de baixo peso molecular. CD30 é expresso por carcinomas embrionários, mas não por seminoma.
Dados importantes na análise do exame histopatológico
• tipo histopatológico com percentual de cada componente para tumores mistos
• extensão do tumor (túnica albugínea, rete testis, cordão espermático, epidídimo)
• invasão vascular e/ou linfática com especificação se no testículo, rete testis, paratesticular ou
cordão espermático
• margem cirúrgica
136 |
MA NUA IS D E CO ND UTAS
6.1.2. Apresentação Clínica e Formas de Disseminação
Apesar de uma massa testicular indolor ser muito sugestiva de malignidade testicular, é mais
comum que os homens relatem dor testicular progressiva, dureza e/ou edema, que pode ser autodetectado ou observado por um médico no exame de rotina. O diagnóstico diferencial é muitas
vezes entre epidídimo-orquite e malignidade. Se epidídimo-orquite é uma suspeita, um tratamento
inicial com antibióticos é razoável, com encaminhamento para uma ultrassonografia escrotal dentro
de 2 semanas, se os sintomas não se resolverem.
O benefício de modalidades adicionais de imagem escrotal, como ressonância magnética,
não foi comprovado. Os sintomas também podem acompanhar a doença metastática. Padrões de
disseminação normalmente acompanham o desenvolvimento embriológico e a descida dos
testículos através do abdome para o escroto. Portanto, o padrão mais comum de disseminação
linfática é para os gânglios linfáticos retroperitoneais. A veia gonadal esquerda se une à veia renal
esquerda no nível do hilo renal. Consequentemente, os linfonodos para-aórticos (entre o rim
esquerdo e aorta) servem como zona de pouso principal para tumores testiculares à esquerda. Por
outro lado, a veia gonadal direita drena diretamente para a veia cava inferior de tal forma que os
linfonodos interaortocavais representam a zona de aterragem natural para tumores do lado direito.
Dor nas costas é comumente relatada quando linfonodos retroperitoneais estão aumentados
e exercem efeito de massa sobre os músculos iliopsoas. Pacientes frequentemente descrevem a
dor como uma dor surda que piora com a posição deitada, possivelmente interrompendo o sono.
Raramente, o tumor pode invadir duodeno, causando sangramento gastrointestinal. O sistema
linfático mesentérico coalesce para formar a cisterna do quilo, que superiormente torna-se o ducto
torácico, entrando no tórax através do hiato aórtico do diafragma. Depois correndo pelo mediastino
posterior, o ducto torácico surge no pescoço e reentra no sistema vascular na confluência da veia
jugular interna esquerda e da veia subclávia esquerda. Linfadenopatia pode se desenvolver em
qualquer lugar ao longo deste caminho, sendo os locais mais comuns o mediastino,a região
retrocrural posterior, e a fossa supraclavicular. Ocasionalmente, os pacientes podem queixar-se de
uma massa cervical esquerda como o seu sintoma inicial como resultado do aumento dos gânglios
linfáticos supraclaviculares.
O órgão visceral mais comum de propagação do tumor é o pulmão. Quando as metástases
pulmonares são extensas, estas podem levar à tosse ou falta de ar, mas podem ser assintomáticas.
O coriocarcinoma tem uma predileção especial para metástases de pulmão e hemorragia, podendo
manifestar-se, por vezes, como hemoptise. Metástases supraclaviculares esquerdas e de pulmão
podem ocorrer ocasionalmente, mesmo na ausência de adenopatia retroperitoneal. Outros sítios
de metástases viscerais incluem o fígado, cérebro e ossos. Sintomas constitucionais, incluindo perda
de apetite, perda de peso e suores noturnos, também podem estar presentes em casos disseminados.
6.1.3. Diagnóstico e Estadiamento
Quando o ultrassom confirma uma massa testicular, o procedimento inicial de diagnóstico e
também a terapêutica de escolha é a orquiectomia inguinal radical com pinçamento e ligadura do
cordão espermático no anel interno. A orquiectomia transescrotal não é recomendada porque a
violação da integridade escrotal pode facilitar um padrão incomum de metástases, incluindo a
pele e os linfonodos inguinais.
Após a orquiectomia, a avaliação deve incluir tomografia computadorizada (TC) do tórax,
abdome e pelve. Exame cuidadoso da região de drenagem linfática testicular, o retroperitônio é
recomendado. Linfonodos com mais de 5mm em uma zona de drenagem são suspeitos de doença
metastática em um paciente com um tumor testicular conhecido. Nos pacientes em que o contraste
iodado é contraindicado, a ressonância magnética (RM) do abdome e da pelve pode substituir a TC.
A RM pode também ser útil para definir a anatomia vascular antes de tratamento cirúrgico de
massas volumosas retroperitoneais.
MANUAIS D E COND UTAS
| 137
Cintilografia óssea e imagem cerebral (tomografia computadorizada ou ressonância
magnética) não fazem parte do estadiamento de rotina. No entanto, se houver suspeita clínica de
metástase óssea (ou seja, dor óssea inexplicada ou fosfatase alcalina elevada) ou cerebral (sinais ou
sintomas de massa intracraniana), estes exames devem ser considerados. Imaginologia cerebral
também pode ser indicada para pacientes assintomáticos com altos níveis de gonadotrofina
coriônica humana (HCG) e numerosas metástases pulmonares difusas.
Nenhum benefício de Tomografia por Emissão de Pósitrons (PET-CT) sobre TC foi demonstrado, e o uso rotineiro de imagem PET-CT não é recomendado.18,19 Em particular, pequenas lesões
e teratomas não podem ser identificados por este método.18,19 Os marcadores tumorais séricos alfafetoproteína (AFP), HCG, e lactato desidrogenase (DHL) são essenciais para diagnóstico,
estadiamento, avaliação, resposta e acompanhamento.
Aumento dos níveis séricos de AFP, HCG, ou ambos podem estar presentes antes da
orquiectomia e não necessariamente estão associados com doença metastática. É importante que
os níveis dos marcadores após a orquiectomia também sejam obtidos uma vez que estes valores
influenciarão nas decisões de tratamento e estimativas de prognóstico (Tabela 3). AFP é secretado
exclusivamente por tumores não seminomatosos. Níveis séricos aumentados de AFP em um
paciente com diagnóstico patológico de seminoma implica que um componente de não seminoma
está presente. Cerca de 40% a 60% dos pacientes com metástase de tumores não seminomatosos
elevaram AFP no momento do diagnóstico. Causas adicionais raras de elevação AFP que precisam
ser consideradas incluem carcinoma hepatocelular, com outras doenças malignas abdominais e
lesão hepática. O declínio esperado da meia-vida da AFP é de 5 a 7 dias. Aproximadamente 50%
dos pacientes com não seminoma metastático e 15% daqueles com seminoma metastático se
apresentam com níveis elevados de HCG. A subunidade alfa de HCG é idêntica a outros hormônios
hipofisários, incluindo os hormônios luteinizante (LH), folículo estimulante (FSH) e o estimulador
da tireoide (TSH). Por esta razão, o radioimunoensaio para HCG é direcionado à subunidade beta
(ß-HCG). No entanto, a reatividade cruzada com o hormônio luteinizante ainda pode ocorrer e levar
a elevações falsas no HCG sérico, quando o LH está elevado (por exemplo, na deficiência de
testosterona). Causas adicionais incluem anticorpos heterófilos, outros tumores malignos, e
possivelmente, alguns medicamentos. A meia-vida para o declínio HCG é de cerca de 1 a 3 dias.
Embora muito menos específico do que o AFP e HCG, a DHL também carrega um significado
prognóstico e deve ser incluída na avaliação. Lactato desidrogenase é elevada em até 80% dos
pacientes com seminoma metastático e 60% dos pacientes com não seminoma metastático.20,21
Após orquiectomia (ou outros procedimentos cirúrgicos), marcadores elevados são acompanhados
cuidadosamente no aguardo de seu tempo natural de declínio. Um declínio lento, platô, ou
aumento da AFP ou HCG, mesmo na ausência de achados radiológicos, é suficiente para indicar
doença metastática e para iniciar a terapia sistêmica22. A Tabela 2 mostra o sistema de estadiamento
do American Joint Committee on Cancer para o câncer testicular, seguido pelas tabelas de critérios
prognósticos do International Germ Cell Cancer Collaborative Group Consensus (IGCCCG).23, 24
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MA NUA IS D E CO ND UTAS
Tabela 2 - Sistema de estadiamento do câncer de testículo (TNM 2002) do American Joint
Committee on Cancer (AJCC) e da International Union Against Cancer (IUAC)
TUMOr PrIMÁrIO (T)
pTX – Tumor primário não pode ser avaliado (se não foi realizada orquiectomia radical, é usado TX)
pT0 – Não existe evidência de tumor primário (por exemplo, cicatriz histológica no testículo)
pTis – Neoplasia intratubular de célula germinativa (carcinoma in situ)
pT1 – Tumor limitado ao testículo e epidídimo, sem invasão vascular/linfática
pT2 – Tumor limitado ao testículo e epidídimo, com invasão vascular/linfática, ou tumor
estendendo-se através da túnica albugínea com envolvimento da túnica vaginal
pT3 – Tumor invade o cordão espermático com ou sem invasão vascular/linfática
pT4 – Tumor invade o escroto, com ou sem invasão vascular/linfática
LINFONODOS rEGIONAIS (N)
Clínico
NX – Linfonodo regional não pode ser avaliado
N0 – Não existe metástase em linfonodo regional
N1 – Metástase em linfonodo com massa de até 2cm na sua maior dimensão, ou massas de
linfonodos múltiplos, até 2cm na sua maior dimensão
N2 – Metástase com massa de linfonodo >2cm e <5cm em sua maior dimensão ou linfonodos
múltiplos com massa de 2cm e <5cm em sua maior dimensão
N3 – Metástase com massa de linfonodos >5cm em sua maior dimensão
Patológico
pN0 – Sem evidência de tumor em linfonodos
pN1 – Massa de linfonodo de 2cm ou menos na maior dimensão e ≤6 linfonodos positivos,
nenhum >2cm na maior dimensão
pN2 – Massa de linfonodo >2cm, mas <5cm na maior dimensão; mais que 5 linfonodos
positivos, nenhum >5cm, ou evidência de extensão extranodal do tumor
pN3 – Massa de linfonodo >5cm na maior dimensão
METÁSTASE À DISTÂNCIA (M)
M0 – Sem evidência de metástases à distância
M1 – Metástase pulmonar ou em linfonodo não regional
M2 – Massa visceral não pulmonar
MArCADOrES TUMOrAIS SÉrICOS (S)
LDH
βHCG (mil/ml)
SO
≤N
≤N
S1
< 1,5 X N
< 5.000
S2
< 1,5 – 10 X N
5.000 – 50.000
S3
> 10 X N
> 50.000
αFP (ng/ml)
≤N
< 1.000
< 1.000 – 10.000
>50.000
MANUAIS D E COND UTAS
| 139
ESTADIAMENTO AGrUPADO
Estádio T N M S
0 pTis N0 M0 S0
I T1–4 N0 M0 SX
Ia T1 N0 M0 S0
Ib T2 N0 M0 S0
T3 N0 M0 S0
T4 N0 M0 S0
Is qualquer T N0 M0 S1 - S3
II qualquer T qualquer N M0 SX
IIa qualquer T N1 M0 S0
qualquer T N1 M0 S1
IIb qualquer T N2 M0 S0
qualquer T N2 M0 S1
IIc qualquer T N3 M0 S0
qualquer T N3 M0 S1
III qualquer T qualquer N M1 SX
IIIa qualquer T qualquer N M1 S0
qualquer T qualquer N M1 S1
IIIb qualquer T qualquer N M0 S2
qualquer T qualquer N M1 S2
IIIc qualquer T qualquer N M0 S3
qualquer T qualquer N M1a S3
qualquer T qualquer N M1b qualquer S
6.2. Tratamento no Estádio I
O tratamento dos tumores germinativos do testículo, estádios clínico I evoluiu muito a partir
do final da década de 1970, principalmente graças ao aparecimento da quimioterapia baseada em
cisplatina, no desenvolvimento do conceito de cirurgia adjuvante e na detecção de marcadores
biológicos. Nos últimos anos, a melhoria nos métodos diagnósticos com a introdução da TC, RM e
o uso do PET-CT aumentaram a capacidade de detecção precoce de metástases e/ou recidivas após
o tratamento primário.25 Após a orquiectomia, tratamento adjuvante com cirurgia (linfadenectomia
retroperitoneal com preservação de nervos), quimioterapia adjuvante ou vigilância com tratamento
em caso de recidiva são as opções terapêuticas disponíveis. Independentemente do método
empregado, cerca de 98 a 100% dos pacientes com estádio clínico I obterão a cura da doença.25 Em
uma doença altamente curável e com várias opções terapêuticas, a decisão final dependerá dos
riscos e benefícios, bem como a disponibilidade e eficiência dos centros de tratamento e as
preferências de cada paciente. Para facilitar a abordagem desta questão, estudaremos separadamente
os tumores seminomatosos e os não seminomatosos.
6.2.1. Tumores Seminomatosos
Classicamente, o tratamento padrão para pacientes com seminoma estádio I era orquiectomia
seguida de radioterapia nos linfonodos retroperitoneais com cura em cerca de 100% dos pacientes.
Historicamente, a radiação adjuvante foi o pilar do tratamento,no entanto, cerca de 70% deles
eram curados pela cirurgia e, portanto, recebiam radioterapia desnecessariamente.26 Além do mais,
a associação relatada entre a radiação e neoplasias secundárias e a ausência de uma vantagem de
140 |
MA NUA IS D E CO ND UTAS
sobrevivência da radiação sobre a vigilância têm levado muitos a favorecer a vigilância.
A taxa de recaída de 5 anos com a vigilância é de aproximadamente 15 a 20%. Em uma série
multi-institucional, envolvimento de rete testis e tumor >4cm foram associados com uma maior
taxa de recaída.27 Pacientes sem qualquer fator apresentaram uma probabilidade de 12% de
recorrência em comparação com 16% para aqueles com 1 fator e 32 % para aqueles com ambos
os fatores.27 No entanto, estes dados devem ser vistos com cautela, pois um estudo de validação
recente não conseguiu identificar o envolvimento de rete testis como fator prognóstico, embora
este estudo tenha sido publicado apenas sob a forma de abstract.28 A vigilância é apropriada para
pacientes que irão aderir a um acompanhamento rigoroso, incluindo consultas médicas frequentes
e tomografia computadorizada periódica. Infelizmente, os estudos sugerem que até 21% dos
pacientes são perdidos de seguimento de 5,5 anos e, se a não aderência é provável, a terapia
adjuvante deve ser considerada.29
A pacientes aderentes de alto risco podem ser oferecidos tanto a radioterapia adjuvante
quanto a vigilância. Ensaios clínicos randomizados têm demonstrado que uma dose de 20-25Gy de
radioterapia em 2 a 5 semanas é eficaz. Doses mais elevadas aumentam a toxicidade.30 A forma do
campo de radiação tem permanecido um tanto controversa. Um estudo randomizado não
encontrou diferença significativa nas taxas de recorrência total (cerca de 4%) entre um campo de
retroperitônio (RP-somente) e apenas um RP mais linfonodo ipsilateral pélvico (também chamado
de campo dog-leg).39 No entanto, um aumento significativo de recorrência pélvica foi observado no
braço RP-somente, requerendo o uso de seguimento com tomografia computadorizada pélvica. Por
isso, alguns profissionais ainda preferem o campo dog-leg. Consequências a curto prazo da radiação
incluem náuseas, vômitos, leucopenia e diarréia. Consequências a longo prazo incluem
infertilidade, proctite e neoplasias secundárias31,32. A presença de um "rim em ferradura", doença
inflamatória intestinal e/ou radiação abdominopélvica anterior são contra-indicações.33
Diante deste quadro, vigilância ativa com tratamento na recidiva passou a ser uma opção
passível de investigação. Choo et al estudaram 88 pacientes e após um período mediano de
observação de 12,1 anos, descreveram sobrevida livre de recidiva de 83% em 5 anos e de 80% em
10 e 15 anos.34 Todos pacientes que recidivaram foram resgatados por um segundo ou terceiro
tratamento e nenhum paciente faleceu devido ao seminoma.
Vários estudos revelaram que os fatores preditivos de recidiva são o tamanho do tumor
primário (≤ 4,0cm versus > 4,0cm) e a invasão da rete testis (presente versus ausente).43 Em
pacientes tratados apenas com orquiectomia, a taxa de recidiva em 5 anos é de 12% em pacientes
sem nenhum fator de risco, de 16% em pacientes com apenas 1 fator de risco e de 32% em
pacientes com os 2 fatores.
Considera-se, então, uma boa abordagem adjuvante para os pacientes de baixo risco, a
vigilância ativa; pois isto poupará cerca de 85-90% dos pacientes de receber radioterapia
desnecessária. Para pacientes com alto risco, ou seja, aqueles com os 2 fatores de mau prognóstico,
esta abordagem gera mais riscos. No entanto, no estudo de Choo et al, mesmo os pacientes com
risco mais elevado foram resgatados na recidiva, o que favorece a vigilância como uma alternativa
de menor fardo também neste grupo de risco.34
Atenção recente tem incidido sobre o uso de um ciclo de carboplatina, administrado em dose
única, como tratamento adjuvante. Oliver et al avaliaram num estudo de não inferioridade
aleatorizado,1477 pacientes com seminoma estádio clínico I, que foram randomizados após
orquiectomia para receber radioterapia em linfonodos paraórticos na dose de 20-30Gy ou
quimioterapia adjuvante com 1 ciclo de carboplatina (AUC 7,0).35 Após período mediano de
observação de 4 anos, não houve nenhuma diferença na sobrevida livre de recidiva entre os 2
tratamentos; apenas 1 paciente morreu de seminoma no grupo que recebeu radioterapia e
nenhuma morte ocorreu no grupo de quimioterapia. O perfil de toxicidade variou entre as formas
de tratamento, mas ambas foram muito bem toleradas. A maior crítica a este estudo é o curto
MANUAIS D E COND UTAS
| 141
tempo de observação; em seminoma, há relatos de recidiva tardia e muitos dos efeitos colaterais
de ambos os tratamentos manifestam-se após muitos anos.
A Sociedade Européia de Oncologia Médica (ESMO) recomenda vigilância ativa para todos os
pacientes com seminoma estádio I independente do grupo de risco, com tratamento de resgate na
recidiva.36 Porém, se a vigilância não for possível devido à dificuldade de aderência do paciente ao
protocolo de acompanhamento, às dificuldades geográficas de acesso ao serviço de oncologia, à
ausência de disponibilidade de recursos dos serviços de saúde para uma vigilância adequada ou
à condição psicológica do paciente, que expressou não tolerar a incerteza da possibilidade de
recidiva, radioterapia ou quimioterapia adjuvantes podem ser indicadas.
6.2.2. Tumores não Seminomatosos
Cerca de 40% de todos os pacientes com tumor germinativo testicular não seminomatoso
(TGTNS) têm doença no estágio clínico I à apresentação e cerca de 99% destes pacientes curam.37
Embora vários fatores, tais como invasão vascular/linfática (ILV), predominância de carcinoma
embrionário, ausência de componentes do saco vitelino e ausência de -fetoproteína elevada
antes da orquiectomia, sejam considerados como importantes fatores prognósticos em estudos
isolados, a invasão linfovascular têm sido largamente aceita como o fator mais importante.37,38 Na
ausência de tratamento adjuvante, este grupo de pacientes com invasão linfo-vascular apresenta
uma taxa de recidiva de 41,7% em 4,7 anos, em contraste com 13,5% naqueles sem a invasão linfovascular.39
O tratamento considerado clássico é orquiectomia seguida de linfadenectomia retroperitoneal,
ou dissecção linfonodal retroperitoneal (DLNRP), com índices de sobrevida livre de recidiva a longo
prazo, naqueles pacientes estágio patológico I, próximo de 100%, com baixíssimos índices de
complicação (2-3%), quando operados por equipe de cirurgiões especialmente treinados.40
O principal efeito adverso da DLNRP é a ejaculação retrógrada. Com as técnicas modernas
preservadoras dos nervos do plexo sacral, a incidência de ejaculação retrógrada diminuiu
consideravelmente para ≤ 5% nos centros de excelência.41
No entanto, mais de 50% dos pacientes serão submetidos a cirurgia desnecessária, o que
estimulou o estudo de outras abordagens.
Tandstad et al publicaram os resultados do estudo SWENOTECA que incluiu 745 pacientes
com TGTNS estádio clínico I no qual àqueles sem invasão linfovascular era oferecido a escolha entre
vigilância ativa (N=338) ou 1 ciclo de quimioterapia com BEP (N=157) e àqueles com invasão
linfovascular 1 ciclo de BEP (N=157) ou 2 ciclos de BEP (N=70).39 Após um período mediano de
observação de cerca de 5 anos, 13,5% dos pacientes sem invasão linfovascular e submetidos a
vigilância ativa apresentaram recidiva e todos foram resgatados pelo tratamento subseqüente.
Entre aqueles sem invasão linfovascular e que receberam 1 ciclo de BEP, 2 recidivaram (1,3%).
No subgrupo de pacientes com invasão linfovascular e que recebeu 1 ciclo de BEP, 5 (3,2%)
recidivaram e naqueles que receberam 2 ciclos de BEP nenhum recidivou. Cerca de 80-90% de
todas as recidivas ocorreram nos primeiros 2 anos após a orquiectomia e nenhum dos 745 pacientes
morreu de câncer de testículo.
Num estudo realizado na Nova Zelândia com seguimento de 17 anos, 248 pacientes com
estádio I de tumores não-seminomatosos, foram tratados apenas com orquiectomia e seguimento,
com tratamento nas recidivas pela quimioterapia combinada; 28% recidivaram, sendo 46% com
invasão linfática ou vascular e 17% sem esta característica.42
Nguyen et al procederam a uma análise de decisão usando o modelo de Markov que leva em
consideração além dos resultados do tratamento, os seus efeitos tóxicos e as preferências dos
pacientes.40 Os autores concluíram que, para pacientes de baixo risco, a vigilância ativa oferece a
melhor taxa de sobrevida ajustada à qualidade de vida e para os pacientes de alto risco (com
invasão linfovascular) com índice de recidiva menor do que 46%, a quimioterapia era preferencial
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MA NUA IS D E CO ND UTAS
à vigilância ou à linfadenectomia retroperitoneal.
Diante destes resultados, nos EEUU a preferência é por vigilância ativa nos pacientes de baixo
risco e linfadenectomia retroperitoneal com preservação de nervos nos pacientes de alto risco; a
sobrevida câncer-específica é da ordem de 99-100% nos centros especializados.43 Na Europa
recomenda-se a vigilância ativa nos pacientes de baixo risco e quimioterapia com 2 ciclos de BEP
nos pacientes com alto risco podendo em algumas situações ser aceitável a vigilância ativa.43
Em qualquer circunstância na qual a vigilância for escolhida é necessário o comprometimento
do paciente e a existência de condições para a realização dos exames recomendados (marcadores
biológicos e tomografia computadorizada) na frequência adequada. Na impossibilidade de
vigilância adequada, é conduta aceitável a administração de 1 a 2 ciclos de BEP após a orquiectomia.
Com esta abordagem a sobrevida livre de recidiva em 5 anos é da ordem de 97-99% com toxicidade
muito baixa.44
A manutenção de níveis elevados dos marcadores no pós-operatório (estádio IS) indica a
presença de doença sistêmica, muitas vezes fora do retroperitônio e requer tratamento com
quimioterapia sistêmica.
6.3. Tratamento dos Pacientes Estádio II
Quando os TCG extendem-se além do sítio primário são considerados como doença metastática
e a conduta vai depender de alguns fatores que discutiremos em seguida.
6.3.1. Tumores Seminomatosos Estádio II
Pacientes com seminoma estádio II têm doença metastática de baixo risco. O tratamento
padrão após a orquiectomia em seminomas em estádio IIA é a radioterapia com aproximadamente
30Gy de radiação destinadas a um campo dog-leg. Normalmente, uma dose base é administrada
a toda a região, com uma dose adicional para a área da doença visível bruta. Um campo de RPsomente é insuficiente para o estádio II ou superior da doença. Muitos tumores no estádio IIB,
particularmente tumores solitários <3 cm, são apropriados para a radiação, usando um campo e
dose similar aos estádios IIA. Lesões maiores e multifocais devem ser tratadas com quimioterapia
com o protocolo PEB por 3 ciclos. No geral, as recidivas ocorrem em 5% a 15% dos pacientes com
seminomas estádio II tratados com radioterapia, mas a morte por seminoma continua a ser rara.45
A irradiação profilática do mediastino não é mais administrada, porque recaídas solitárias do
mediastino são incomuns, e esta prática tem sido associada a toxicidade cardíaca e neoplasias
torácicas secundárias.
6.3.2. Tumores Não Seminomatosos Estádio II
Após a dissecção linfonodal retroperitoneal (DLNRP), são encontradas metástases ocultas
em aproximadamente 30% dos pacientes em estádio clínico I não-seminomatosos.
Para os pacientes com estádio patológico IIA e IIB, as opções são a vigilância ativa ou 2 ciclos
de quimioterapia adjuvante (BEP). Cerca de 30-50% dos pacientes em vigilância ativa irão recidivar
e receber 3 a 4 ciclos de BEP. No subgrupo de pacientes que receberam 2 ciclos de BEP na adjuvância,
o índice de recidiva é de 0-7%.43
Desde que, qualquer que seja a abordagem terapêutica, a taxa de cura é de cerca de 98% dos
pacientes, a decisão final depende das preferências do paciente e das condições ideais para a
realização da vigilância ativa.
Para a maioria dos pacientes com estádio clínico IIA com tumor não-seminomatoso, o padrão
de manejo consiste em DLNRP bilateral. A abordagem preservadora dos nervos deve ser usada
quando não comprometer a integridade de ressecção ou a capacidade de atingir margens
MANUAIS D E COND UTAS
| 143
cirúrgicas livres. O benefício de DLNRP neste grupo seria a possibilidade de evitar-se o tratamento
com quimioterapia na maioria dos pacientes, ou de utilizar-se 2 ciclos contra 3 ou 4 ciclos, reduzindo
o risco de toxicidade aguda e crônica.46 Entretanto os pacientes com níveis elevados de alfafetoproteína ou fração beta da gonadotrofina coriônica humana (βHCG) ou linfonodomegalia
contralateral devem receber quimioterapia primária ao invés de DLNRP pelo risco significativamente
maior de recaída após a cirurgia. O último grupo inclui pacientes nos quais os gânglios contralaterais
são detectados nos exames de imagem, mesmo na ausência de envolvimento ipsilateral.
A necessidade de quimioterapia adjuvante é ditada pela achados patológicos no momento
da DLNRP. Além do tamanho, o sistema de estadiamento patológico nodal também incorpora o
número de linfonodos envolvidos e a presença ou ausência de extensão extranodal. Pacientes com
necrose ou fibrose (N0) e pacientes com doença N1 podem ser observados com vigilância, pois o
risco de recaída é de aproximadamente 10% a 20%. A doença N2 apresenta um risco substancialmente maior de recaída, que pode ser praticamente eliminado com dois ciclos de etoposido e
cisplatina com ou sem bleomicina.46
Embora a sobrevida entre a quimioterapia adjuvante ou a vigilância sejam equivalentes com
o tratamento de resgate na recidiva, os pacientes tratados com quimioterapia adjuvante não
necessitam de acompanhamento ou exames de imagem tão frequentes. Além disso, os pacientes
que tiveram recaída depois do acompanhamento, necessitam de 3 ou 4 ciclos de quimioterapia. É
raro encontrar doença N3 nos pacientes em estádio clínico IIA e recomenda-se a quimioterapia
adjuvante.
6.3.3. Demais pacientes
Pacientes com a doença nos estádios IS, II e III que não se enquadrem nos subgrupos acima,
devem ser avaliados de acordo com seu grupo de risco, baseado no modelo prognóstico do IGCCCG
para doença avançada, infradescrito.
6.4. Doença avançada (Estádio III)
Aproximadamente 20% dos pacientes com tumores de células germinativas (TCG) apresentam
doença avançada como manifestação inicial.
Foram desenvolvidos vários modelos prognósticos diferentes para distinguir entre grupos de
risco de acordo com o prognóstico, no intuito de adequarem-se os regimes de tratamento ao
pacientes, reduzindo a toxicidade e aumentando a eficácia. Com dados de mais de 6000 pacientes
em 13 países, o Grupo Colaborativo Internacional do Câncer de Células Germinativas (IGCCCG)
desenvolveu um algoritmo prognóstico, baseado na histologia (seminoma contra nonseminoma),
local do tumor primário (mediastino contra não mediastinal), metástases viscerais não pulmonares
(presente contra ausente) e o nível de elevação dos marcadores tumorais séricos (tabela anexa).24
Utilizando estes fatores, o modelo separa os pacientes em grupos de risco baixo, intermediário e
alto, com resultados significativamente diferentes. O tempo livre de doença de 5 anos e as taxas de
sobrevida global foi de 88% e 91%, respectivamente, para os doentes de baixo risco, 75% e 79%
para pacientes de risco intermediário e 41% e 48% para os pacientes de alto risco.24
144 |
MA NUA IS D E CO ND UTAS
Classificação Prognóstica 24:
Tabela IGCCCG - Modelo prognóstico para tumores de células germinativas não seminomatosos
metastáticos, segundo o IGCCCG
Critério
Grupo
de risco
Necessita todos os seguintes: tumor primário
gonadal ou retroperitonial, ausência de MPNV,
HCG < 5000mIU/dL, AFP < 1000ng/dL, e DHL < 1.5 x
ULN
Necessita tumor primário gonadal ou retroperitonial,
Intermediário ausência de MPNV, e ≥ 1 dos seguintes: HCG 500050,000mIU/dL, AFP 1000-10,000ng/dL, ou DHL 1.510.0 x ULN
Necessita qualquer um dos seguintes: tumor
mediastinal primário, presença de MPNV, HCG >
Alto
50,000mIU/dL, AFP > 10,000ng/dL, ou DHL > 10 x ULN
Baixo
SLD
SG
5 anos (%) 5 anos (%)
88
91
75
79
41
48
Tabela IGCCCG - Modelo prognóstico para tumores de células germinativas seminomatosos
metastáticos, segundo o IGCCCG
Grupo
de risco
Baixo
Intermediário
Critério
Ausência de MPNV
Presença de MPNV
SLD
SG
5 anos (%) 5 anos (%)
82
86
67
72
*Não há risco alto para tumores seminomatosos.
AFP, alfa-fetoproteína; SLD, sobrevida livre de doença; TCG, tumor de células germinativas; HCG, gonadotrofina humana coriônica;
DHL, desidrogenase lática; MPNV, metástases pulmonares não viscerais; SG, sobrevida global; ALN, acima do limite normal
6.4.1. Tumores Estádio III, Abordagem Baseada no risco (Modelo Prognóstico do IGCCCG)
Pacientes com a doença nos estádios IS, II e III que não se enquadrem nos subgrupos acima,
devem ser avaliados de acordo com seu grupo de risco, baseado no modelo prognóstico do IGCCCG
para doença avançada ( retira-se a palavra "infradescrito"). Aproximadamente 20% dos pacientes com
tumores de células germinativas (TCG) apresentam doença avançada como manifestação inicial.
6.4.1.1. Risco Baixo
A maioria dos pacientes com doença metastática estão classificados no grupo de baixo risco.
Inicialmente, na década de 80, o esquema clássico utilizava as seguintes drogas: vimblastina,
cisplatina, bleomicina, dactinomicina, ciclofosfamida (VAB-6), que foi comparado com a cisplatina
100 mg/m2 e etoposido 100mg/m2 dias 1 a 5 (500mg/m2 por ciclo - PE500) por 4 ciclos. Concluiu-se
que ambos apresentavam eficácia comparável, mas menor toxicidade para o PE500. Vários estudos
randomizados demonstraram uma taxa de resposta completa elevada neste grupo, utilizando-se
esquemas que incluíam cisplatina, etoposido (PE) ou ainda a bleomicina (PEB).47 Einhorn e
colaboradores compararam o esquema PEB por 3 ou 4 ciclos, demonstrando que o quarto ciclo foi
associado com excesso de toxicidade, mas sem aumento na sobrevida específica da doença.48 Até
o final da década de 1980, tanto PE500 por 4 ciclos ou BE500P por 3 ciclos foram estabelecidos
como tratamentos padrão para os tumores de células germinativas de baixo risco. Outros estudos
não conseguiram demonstrar que outros regimes poderiam oferecer melhores resultados.
MANUAIS D E COND UTAS
| 145
Com a intenção de reduzir a toxicidade pela cisplatina, quatro estudos compararam a
cisplatina com a carboplatina, mas em todos o regime com base em cisplatina mostrou-se superior
ao braço carboplatina.49
A Universidade de Indiana e o Memorial Sloan-Kettering Cancer Center (MSKCC) numa atualização
de um seguimento mais longo comparando BE500P por 3 ciclos ou PE500 por 4 ciclos, mostrou que
a resposta completa, sobrevida livre de doença e sobrevida global foram essencialmente
idênticos.49 Uma vez que os ensaios clínicos randomizados mostram resultados desfavoráveis
quando doses mais baixas de cisplatina e etoposido são administradas, a redução da dose de ambos
deve ser evitada, e recomenda-se a administração de fator de crescimento em todos os ciclos após
um episódio de neutropenia febril.
6.4.1.2. Riscos Intermediário e Alto
A quimioterapia baseada na cisplatina permanece o tratamento padrão para a primeira linha
em tumores de células germinativas avançado e em torno de 70% são curados com a combinação
de PEB; para os 30% restantes outras opções incluem: regimes de quimioterapia convencionais
contendo a cisplatina, vimblastina e ifosfamida (VIP), ou paclitaxel (TIP) e ainda quimioterapia em
altas doses com suporte de células tronco.50,51
Alguns fatores prognósticos tanto para o uso de quimioterapia convencional, quanto para o
tratamento com altas doses, foram identificados para selecionar a melhor abordagem. Pacientes
com tumores gonadais primários com respostas parciais ou completas e que mantém-se por mais
de 6 meses, possuem mais de 60% de chance de cura com a quimioterapia convencional de resgate;
entretanto, aqueles com doença refratária ou com progressão com menos de 6 meses, possuem
uma chance menor de 10% na sobrevida longa. O tratamento com quimioterapia de altas doses
com resgate de células tronco hematopoiéticas pode alcançar respostas completas duráveis em 30
a 60% nos pacientes de mau prognóstico. Num estudo fase II, 107 pacientes com TCG de mau
prognóstico ao tratamento de salvamento convencional, receberam o esquema de paclitaxel e
ifosfamida, seguido de alta dose de carboplatina e etoposido (TI-CE) com resgate com células
tronco hematopoiéticas. Com uma mediana de seguimento de 61 meses 50% mantiveram-se em
remissão completa e 8% parcial com marcadores negativos. A sobrevida livre de doença foi de 47%
e a sobrevida global de 52% em 5 anos. Na análise multivariada foram preditivos para os eventos
adversos: local primário mediastinal, ≥2 linhas de tratamento anterior, gonadotrofina coriônica de
base ≥1000U/L e metástases pulmonares.52
Aproximadamente 40% dos pacientes com TCG não seminomatosos classificam-se no risco
intermediário e alto. Os seminomas nunca são de alto risco e apenas cerca de 10% estão na
categoria de risco intermediário. O padrão de tratamento para ambos os grupos é PE500B por 4
ciclos. A sobrevida livre de doença com VIP por 4 ciclos é comparável ao PEB (64% para o VIP contra
60% com o PEB), maior toxicidade hematológica, mas pode ser útil nas situações onde a bleomicina
está contra-indicada.53
Recentemente, um estudo do EORTC apresentado no congresso da Associação Americana de
Oncologia Clínica (ASCO) em 2011, comparou a eficácia de 4 ciclos de T-PEB (paclitaxel 175mg/m2
administrado em 3 horas de infusão contínua no dia 1 antes de iniciar o PEB padrão) com PEB nos
pacientes com TCG de risco intermediário. Foi planejado para 498 pacientes, mas foi fechado
prematuramente pelo recrutamento baixo. Foi mais tóxico que o PEB, mas demonstrou aumento
da sobrevida livre de progressão em 3 anos de 82,7% para o T-PEB contra 70,1% para o PEB, p=0,03,
entretanto sem impacto significativo na sobrevida global.64
Os tumores de células germinativas com refratariedade à cisplatina, representam um
subgrupo de mau prognóstico. As quimioterapias com doses convencionais induzem respostas
objetivas em 10 a 20% dos pacientes, com raras remissões completas duráveis. Em 3 estudos fase
II, utilizaram-se oxaliplatina 130mg/m2 dia 1 e gencitabina 1000mg/m2 dias 1 e 8, em ciclos de 21
dias, obteve-se respostas entre 32 a 46% com 14% de sobrevidas longas.54,55
146 |
MA NUA IS D E CO ND UTAS
Tabela 3 - Quimioterapias mais utilizadas no tratamento do Câncer de Testículo
Cisplatina
Etoposido
Vimblastina
Bleomicina
Paclitaxel
Ifosfamida
PEB
20mg/m2 D1-5
100mg/m2 D1-5
30mg D1,8,15
-
PE
20mg/m2 D1-5
100mg/m2 D1-5
21
21
-
Mesna
Intervalos
(dias)
VIP
20mg/m2 D1-5
75mg/m2 D1-5
-
TIP
25mg/m2 D2-5
250mg/m2 D1
1200mg/m D1-5
1500mg/m2 D2-5
2
120mg/m IV D1 500mg/m2 IV antes,
1200mg/m2 IC D1-5 4 e 8hs após IFO,
D2-5
21
21
2
IFO: Ifosfamida; IC: infusão contínua
6.5. Situações Especiais
6.5.1. Avaliação de Cirurgia Após Quimioterapia
A indicação de cirurgia após a quimioterapia dependerá de fatores como a histologia do
tumor, os níveis séricos de marcadores tumorais e das imagens após o tratamento. Ressecção de
doença residual é considerada para os pacientes com tumores não seminomatosos quando os
marcadores normalizam e lesões residuais estão presentes na imagem (geralmente numa
tomografia computadorizada). Pacientes com marcadores persistentemente elevados ou crescentes
são geralmente tratados com quimioterapia de resgate ao invés de cirurgia, exceto em casos de não
seminomatoso mediastinal primário ou casos selecionados de uma massa retroperitoneal solitária.
Há um consenso generalizado de que a dissecção retroperitoneal linfonodal é indicada
quando há lesões residuais ≥1cm no retroperitôneo (RP), porque tumor de células viáveis
germinativas (TCG) e/ou teratoma podem estar presentes. Necrose e fibrose compõem
aproximadamente 45% dos achados patológicos no RP, teratoma em 40% e GCT viável em 15%.51
Infelizmente, modelos para prever achados patológicos têm produzido resultados decepcionantes.
A ressecção de outros sítios de doença residual (por exemplo, nódulos pulmonares,
adenopatias em pescoço, lesões no fígado) também é recomendada. Os achados histológicos em
um sítio (por exemplo, RP) não prevêem a descoberta em outros locais (por exemplo, fígado,
pulmão, linfonodos mediastinais), uma vez que a patologia pode ser comumente discordante. Para
lesões <1 cm ou focos residuais relatados como dentro dos limites normais, existe controvérsia sobre
se a ressecção deve ser realizada, particularmente no RP.56 Séries retrospectivas demonstraram que
20% a 25% dessas lesões contêm teratoma, com um adicional de 5% de TCG viáveis. Embora
incomum, um TCG viável acabará progredindo, exigindo quimioterapia. Teratoma residual também
pode ocasionalmente ser problemático por causa do crescimento descontrolado podendo gerar
compressão de estruturas importantes e dor, ou transformação em um tumor maligno somático.
Considerando que a transformação maligna se comporta como o tipo de célula transformada, ela
é mais virulenta e está associada com alta mortalidade, e que um teratoma crescendo normalmente
pode ser curado com a ressecção cirúrgica, ao se tomar decisões quanto à ressecção, deve-se pesar
a história natural do teratoma e o potencial de complicações desta cirurgia. Quando teratoma ou
MANUAIS D E COND UTAS
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necrose é encontrado, nenhum tratamento adicional é recomendado, mas em contrapartida,
quando a patologia demonstra GCT viável, 2 ciclos adicionais de quimioterapia devem ser
administrados para diminuir a chance de recidiva.57
A avaliação de lesões residuais em pacientes com seminoma difere daquela em pacientes
com tumores não seminomatosos. Ressecção cirúrgica é mais difícil por causa de uma reação
desmoplásica que, muitas vezes, ocorre após a quimioterapia, e que destrói os planos do tecido,
podendo levar à ressecção incompleta e aumento da morbidade. Além disso, teratoma residual
não precisa ser considerado em pacientes com seminoma. Critérios clínicos podem ajudar a prever
a presença de seminoma viável residual. Em uma série, 27% das lesões >3cm contidas seminoma
viável versus 3% de lesões ≤ 3 cm58.
6.5.2. Quimioterapia de resgate
Cerca de 20% a 30% dos pacientes irão desenvolver doença progressiva após a quimioterapia
inicial, com ou sem cirurgia e exigirão terapia de resgate. Esta é uma população heterogênea, que
inclui pacientes com tumores gonadais e extragonadais; pacientes com doença refratária primária
(resposta incompleta ou progressão da doença dentro de 4 semanas após a conclusão da
quimioterapia inicial) e os reincidentes após remissão completa (CR) ou remissão parcial (RP) com
marcadores negativos; além de pacientes reincidentes nos primeiros dois anos da conclusão da
quimioterapia, ou após estes dois anos iniciais. Doses convencionais de cisplatina associada a
vimblastina e ifosfamida ou paclitaxel são os regimes mais comumente usados. Doses
convencionais de ifosfamida resultam em uma taxa de remissão durável de cerca de 25%. A taxa
de remissão duradoura melhora se apenas os pacientes com características favoráveis forem
incluídos. Pacientes com características desfavoráveis para quimioterapia em doses convencionais
incluem aqueles com tumores não seminoma e de tumor primário mediastinal, bem como aqueles
com doença refratária primária. As taxas de remissão duradoura em pacientes com tais esquemas
de dose convencional são menores que 10%, sendo que eles devem ser preferencialmente referidos
para tratamento de resgate inicial com altas doses de quimioterapia ou para protocolos de
pesquisa, se disponíveis. Taxas de sobrevida livre de doença de quase 50% foram alcançadas nesta
população, com o uso de esquemas de altas doses de quimioterapia.59
Um estudo de quimioterapia de altas doses incluiu pacientes com características prognósticas
ruins, tais como tumores não seminomatosos mediastinais primários, doença refratária, curto
intervalo de tempo de recidiva (<6 meses), remissão parcial com marcadores negativos, ou
progressão com um esquema de resgate baseado em ifosfamida e cisplatina. Pacientes com
recaídas tardias também foram elegíveis para inclusão neste estudo. O tratamento consistiu de
dois ciclos de paclitaxel e ifosfamida “dose-densa” com a coleta de células-tronco, seguido por três
ciclos de altas doses de carboplatina e etoposido (TI-CE).52 A taxa de resposta favorável foi de 58%
e com um seguimento médio de mais de 5 anos, 52% dos pacientes estavam vivos e 48%
continuamente livres de progressão.
Fatores associados com mau resultado da abordagem de altas doses incluem a administração
desta como terapia de terceira linha ou mais tarde (3 pontos), doença platina-resistente (2 pontos)
e pacientes de alto risco ao diagnóstico inicial (2 pontos).As taxas de sobrevida livre de doença
foram de 70% em pacientes com 0 pontos, 60% naqueles com 2-3 pontos, e 40% naqueles com ≥
4 pontos.60
Os pacientes com progressão da doença após alta doses de quimioterapia são geralmente
consideradas incuráveis. As drogas são selecionadas com base na toxicidade, atividade, e falta de
uso em linhas anteriores de tratamento. Agentes freqüentemente utilizados incluem oxaliplatina,
paclitaxel, gencitabina e etoposido oral.61 Regimes combinados, tais como paclitaxel mais
gencitabina, gencitabina com oxaliplatina, epirrubicina e cisplatina, têm demonstrado alguma
atividade, mas remissão completa durável é rara. Os princípios que regem as decisões sobre a
148 |
MA NUA IS D E CO ND UTAS
cirurgia no cenário de resgate são diferentes do cenário de primeira linha. Até 50% das lesões
residuais após quimioterapia de resgate conterão TCG viável.57 Por esta razão, a ressecção de tumor,
mesmo quando <1cm, é geralmente necessária. Embora os pacientes com marcadores tumorais
elevados ou crescentes não sejam geralmente considerados para ressecção cirúrgica, esta pode
ser apropriada em casos selecionados, particularmente quando a lesão se resume a uma massa
retroperitoneal solitária. Em contraste com a configuração do tratamento de primeira linha, quando
um TCG viável é removido após quimioterapia de salvamento, quimioterapia adjuvante adicional
não é recomendada.62
6.6. Critérios de Seguimento após Tratamento
Os critérios para seguimento após tratamento primário não foram validados em estudos
prospectivos.44 As recomendações são, então, pragmáticas e podem variar entre instituições. No
entanto, naqueles pacientes com doença estádio I submetidos à vigilância após orquiectomia, o
seguimento deve ser bem severo.
Uma síntese das recomendações da ESMO e do National Comprehensive Cancer Network
(NCCN), podem servir de orientação para a política de seguimento.36, 44, 63
1) Seminomas
• Marcadores e exame físico: a cada 2-3 meses nos anos 1 e 2, a cada 4-6 meses nos anos 3, 4
e 5 e anualmente nos anos 6 a 10;
• Rx de tórax: semestral nos anos 1 e 2 e anual nos anos 3, 4 e 5;
• Tc de abdome: semestral nos anos 1 e 2 e anual nos anos 3, 4 e 5.
OBS: em pacientes tratados com quimioterapia ou radioterapia é discutível a realização de
exames após o 5º ano de seguimento.
2) Não seminomas
2.1. Estádio I em vigilância:
• Marcadores, exame físico e Rx de tórax: mensal no ano 1, a cada 2-3 meses nos anos 2 e 3, a
cada 4-6 meses nos anos 4 e 5 e anualmente em seguida.
• Tc de abdome: a cada 3-4 meses no ano 1, a cada 4-6 meses no ano 2, a cada 6-12 meses nos
anos 3, 4 e 5 e é de indicação duvidosa, na ausência de anormalidades, a partir do 6º ano.
2.2. Demais estádios e situações:
• Marcadores, exame físico e Rx de tórax: a cada 2-3 meses nos anos 1 e 2, a cada 4-6 meses
nos anos 3, 4 e 5 e anualmente a partir do ano 6.
• Tc de abdome: a cada 6-12 meses nos anos 1 e 2 e anualmente até o ano 5; a partir do ano
6, a indicação é duvidosa, na ausência de anormalidades.
6.7. Manejo das Toxicidades
6.7.1. Toxicidades agudas
Efeitos agudos da quimioterapia para o tumor de células germinativas (TCG) são náuseas e
vômitos, diarreia, insuficiência renal, neutropenia febril, anemia, trombocitopenia, fadiga, desidratação,
distúrbios eletrolíticos, ototoxicidade, toxicidade pulmonar e fenômeno de Raynaud. Bleomicina,
etoposido e cisplatina (BEP) e etoposido e cisplatina (EP) são considerados regimes altamente
emetizantes, mas náuseas e vômitos são normalmente bem controlados com o uso de dexametasona,
MANUAIS D E COND UTAS
| 149
antagonistas 5-HT3, benzodiazepínicos e antagonistas do receptor neuroquinina-1 (aprepitanto).
Entre 5 a 25% dos pacientes tratados com EP ou BEP desenvolverão neutropenia febril, com
taxas geralmente mais elevadas para BEP. Com regimes com ifosfamida ou de altas doses, essas
taxas aumentam para ≥ 50%, e uso de suporte de fator de crescimento profilático é recomendado.
Ototoxicidade geralmente se manifesta como zumbido de alta frequência ou perda de audição,
mas raramente resulta em surdez completa ou necessidade de um aparelho auditivo. Fenômeno
de Raynaud é observado quase que exclusivamente após bleomicina. A toxicidade pulmonar da
bleomicina ocorre em 6 a 8% dos pacientes tratados com BEP por 4 ciclos e pode ser fatal em 1 a
3%. Pode se manifestar durante a quimioterapia, mas pode ser retardada ou precipitada pela
exposição ao oxigênio no momento da cirurgia. Fatores de risco para toxicidade pulmonar incluem
maior dose cumulativa de bleomicina, exposição prévia à radiação, insuficiência renal, idade
superior a 40 anos de idade, e história de tabagismo.65
6.7.2. Toxicidades crônicas
Neuropatia, ototoxicidade e nefrotoxicidade podem começar de forma aguda, mas podem
também tornar-se subaguda ou crônica. Reduções na taxa de filtração glomerular e níveis séricos
de magnésio podem resultar dos efeitos da cisplatina ou carboplatina e, especialmente em regimes
contendo ifosfamida. A maioria dos pacientes com neuropatia e ototoxicidade melhoram ao longo
do tempo, mas os sintomas podem persistir indefinidamente. Um aumento ≥2 vezes na incidência
de doenças cardiovasculares tem sido observado em pacientes tratados com quimioterapia e pode
ser causado por lesão vascular e/ou indução de fatores de risco cardiovascular, como por exemplo,
o tabagismo.66
Mecanismos de lesão endotelial podem incluir efeitos diretos vasculares (eg, bleomicina e
fenômeno de Raynaud), deficiência de testosterona, a indução de um estado pró-inflamatório ou
estresse oxidativo. Estudos têm demonstrado que a hipertensão, hiperlipidemia, obesidade e
síndrome metabólica podem ocorrer com frequência aumentada em sobreviventes de câncer
testicular tratados com quimioterapia vs aqueles tratados apenas com cirurgia ou vs controles
pareados por idade.68
Infertilidade é uma questão de qualidade de vida importante para sobreviventes de câncer
testicular. Muitos pacientes são diagnosticados antes de terem filhos por causa de sua tenra idade
ou há aumento da incidência de infertilidade ou subfertilidade em pacientes recém-diagnosticados.
Quimioterapia e radiação podem causar infertilidade através de danos às células germinativas
primordiais nos túbulos seminíferos, e cirurgia (dissecção retroperitoneal) pode resultar em
infertilidade por ejaculação retrógrada. Após o tratamento, 30% dos pacientes não pode ser capaz
de gerar um filho naturalmente. Portanto, a criopreservação de esperma é recomendada antes de
qualquer intervenção de tratamento.
O risco de tumores secundários não de células germinativas também aumenta como resultado
do tratamento para o câncer testicular. Terapia de radiação leva a uma taxa de 2 vezes maior de um
segundo câncer vs controles pareados por idade ou sobreviventes de TCG que se submetem a
cirurgia isolada. Um excesso de risco para um segundo câncer também tem sido associada com a
quimioterapia, com um risco relativo de 1,5-2,0, semelhante ao risco relativo de tabagismo na
população em geral. O risco é ainda maior para os pacientes tratados com radio e quimioterapia.66
Leucemia, em particular, tem sido associada ao etoposido de forma dose dependente. A exposição
à radiação de frequentes tomografias pode aumentar ainda mais os riscos de neoplasia
secundária.67,68 Por razões que não são claras, TCG estão associados com um aumento da incidência
de sarcoidose, que pode se apresentar antes, durante ou após o diagnóstico de câncer, podendo
imitar metástases para linfonodos mediastinais e hilares ou mesmo pulmonares, podendo ser
considerado como um diagnóstico alternativo. Uma biópsia pode ser necessária para distinguir
entre metástase e sarcoidose.
150 |
MA NUA IS D E CO ND UTAS
Diretrizes para acompanhamento de pacientes com câncer testicular após o tratamento ou
durante seguimento foram publicados por vários grupos.69,70,71 Devido ao potencial de recaída,
desenvolvimento tardio de neoplasias malignas secundárias e tumores testiculares primários
contralateriais, não está bem estabelecido qual o tempo necessário de acompanhamento. A
transferência para um médico generalista após mais de 5 anos do tratamento representa uma
decisão individualizada a ser feita em conjunto com o paciente e a equipe assistencial.
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Capítulo 7
Câncer de Próstata
Editor: Dr. Óren Smaletz
Autores: Dra. Ana Lucia Coradazzi, Dr. Daniel Herchenhorn, Dr. Fernando Cotait Maluf, Dr. José Luiz
Miranda Guimarães, Dr. Marcus Vinicius Sadi, Dr. Milton Rabinowits, Dr. Óren Smaletz, Dr. Rodrigo
Hanriot, Dr. Vinicius Carrera Souza e Dr. Volney Soares Lima
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Capítulo 7
Câncer de Próstata
7.1. Introdução
O câncer de próstata é o tumor maligno de maior incidência nos homens brasileiros, sem
considerar os tumores de pele não melanoma1. Nos últimos anos, observamos avanços no
tratamento e no conhecimento desta doença: a necessidade do tratamento combinado nos
pacientes com doença localmente avançada, a relevância da recidiva bioquímica e a história natural
dos pacientes neste estado clínico, o fato que quimioterapia deixou de ser um tratamento somente
para paliação de sintomas e sim como meio de extender a sobrevida global dos pacientes. Tratase de um tumor cuja história natural pode ser bem diferente entre os diversos pacientes, em todos
os estados clínicos da doença2.
O presente texto tem o objetivo de padronizar o tratamento deste tipo de tumor nos mais
diversos estados clínicos, desde o seu diagnóstico na doença localizada até a doença metastática
resistente a castração. No desenvolvimento deste texto, houve uma revisão e síntese da literatura
mais recente pelos membros do painel. Mas é de suma importância salientar que tal padronização
não consegue comportar a variação individual entre os pacientes não devendo portanto, substituir
o julgamento do médico que assiste o paciente, mas sim servindo de base para a discussão das
condutas e decisão final do manuseio do paciente.
7.2. Doença Clinicamente Localizada - avaliação inicial e estadiamento
Atualmente, com o advento e o uso mais frequente do antígeno específico prostático (PSA),
a grande maioria dos pacientes é diagnosticada com o câncer de próstata localizado. A classificação
de risco para recidiva para doença localizada de D’Amico et cols (Tabela 1) serve para padronizar os
exames de estadiamento e o tratamento destes pacientes que são diagnosticados com doença
localizada3. Tal classificação usa o valor do PSA ao diagnóstico, o grau histológico de Gleason e o
estadiamento clínico através do toque retal, parte integrante da análise clínica inicial do paciente
com câncer da próstata. Tumores diagnosticados pelo toque retal são periféricos e têm volume
maior que 0,24 mm3. Atualmente, um grande número de tumores de próstata cursam com PSA
baixo e não são palpavéis (estádio T1c). Além disto, o toque retal não é um método preciso de
estadiamento devido a existência frequente de patologias associadas como a hipertrofia, prostatite,
biópsias ou cirurgias prévias contribuem para tornar o exame menos específico.
Na utilização da classificação de risco de D’Amico, um escore de Gleason 7 já é considerado
como risco intermediário, mas se o paciente tiver todos os fatores de risco do grupo de risco
intermediário, o seu prognóstico se assemelha ao dos pacientes com risco alto4. Outros fatores de
risco se mostraram importantes, em especial a cinética do PSA, onde um aumento de mais de
2ng/ml/ano antes do diagnóstico de câncer de próstata se traduz num maior risco de morte câncer
específica, mesmo em tumores iniciais5.
158 |
MA NUA IS D E CO ND UTAS
Tabela 1 - Classificação de risco Modificada para Doença Localizada3
PSA (ng/ml)
Escore de Gleason
Estadiamento clínico
risco Baixo
< 10
<6
cT1c ou cT2a
risco Intermediário
> 10 e < 20
7
cT2b ou cT2c
risco Alto
> 20
>8
> cT3
Para o estadiamento do paciente recém-diagnosticado com câncer de próstata localizado, os
autores recomendam que para os pacientes de risco baixo não são necessários exames adicionais.
Por outro lado, não houve um consenso entre os autores quanto aos exames necessários para os
pacientes de risco intermediário e de risco alto, contudo a recomendação é de realizar nos pacientes
de risco intermediário o mapeamento ósseo (mesmo sabendo da menor sensibilidade deste teste
neste grupo de pacientes) e a tomografia computadorizada ou ressonância magnética de pélvis e
próstata (em especial nos pacientes que estão indecisos quanto ao tratamento definitivo local). Já
para os pacientes com câncer de próstata localizado de risco alto, recomenda-se realizar os exames
de mapeamento ósseo e a tomografia computadorizada ou ressonância magnética de pélvis e de
próstata. A eficácia da ressonância magnética na detecção de linfonodos pélvicos está próxima a
da tomografia computadorizada, com 90% de especificidade e cerca de 70% de sensibilidade para
linfonodos >1cm.6 Quanto ao mapeamento ósseo, este exame também está indicado para
pacientes com dores ósseas ou elevação da fosfatase alcalina7. Recentemente, alguns autores têm
sugerido substitutir o mapeamento ósseo pela realização de ressonância magnética de bacia e
coluna lombar, sendo este um método mais sensível/específico na detecção de lesões ósseas.
7.3. Doença Clinicamente Localizada - tratamento
O tratamento do adenocarcinoma da próstata é controvertido e os casos devem ser individualizados. A escolha do método terapêutico ideal deve levar em consideração não só a
característica do tumor e o seu estadiamento, mas também a idade do paciente, a sua expectativa
de vida, o seu estado clínico geral, as suas doenças associadas, as suas expectativas quanto a sua
doença e a qualidade de vida desejada após o tratamento específico a ser instituído8, 9.
7.3.1. Doença Clinicamente Localizada – risco Baixo
Para os pacientes com câncer de próstata localizado de risco baixo, há algumas alternativas
de tratamento, com taxas de sucesso muito parecidas. Devido a inexistência de estudos comparativos
randomizados de boa qualidade não se pode caracterizar qual a melhor forma de tratamento. Um
grande percentual destes tumores pode ter um comportamento indolente, não apresentar progressão
e, por isso, não alterar a sobrevida do seu portador. Entretanto, até o momento, não existem critérios
bem definidos, clínicos ou moleculares, sobre como selecionar adequadamente os pacientes com
tumores pouco agressivos, evitando-se tratamentos radicais desnecessários e as complicações
advindas destes procedimentos, tais como disfunção erétil, incontinência urinária, sangramento
retal e outras toxicidades gastrointestinais. Baseado na história natural do câncer da próstata, o
tratamento radical não precisa ser considerado, em geral, para indivíduos que apresentem uma
expectativa de vida inferior a 10 anos. A opção mais clássica é a prostatectomia radical por via suprapúbica. Os dados recentes de cirurgia laparoscópica ou robótica sugerem que os resultados sejam
semelhantes. O nomograma de Partin et al. é uma ferramenta importante para predizer o estadiamento
patológico baseado nos dados pré-operatórios de toque retal, PSA e escore de Gleason10.
Se optar por radioterapia externa, os autores recomendam que a técnica seja pelo menos
conformada tridimensional. Esta técnica usa um programa de computador para integrar as imagens
MANUAIS D E COND UTAS
| 159
de tomografia da anatomia interna do paciente a posição do tratamento, o que permite que o
volume que recebe a maior dose de irradiação se acople melhor ao formato da próstata. Acreditavase que doses de 72 a 74Gy eram suficientes, mas recente meta-análise com mais de 2800 pacientes
mostrou ganhos em controle local com escalonamento de dose acima de 76Gy mesmo no
subgrupo de baixo risco. Assim, sugere-se dose de pelo menos 75,6Gy para este segmento11, 12.
A braquiterapia tem sido utilizada para tratar pacientes com tumores de risco baixo, próstata
com peso estimado <60 gramas, ausência de sintomas urinários significativos e que não tenham
sido sumetidos à ressecção transuretral prévia, com resultados similares aos obtidos com a cirurgia
radical e radioterapia externa. A hormonioterapia não tem intuito curativo para estes pacientes, e
se usada deve ter o intuito de controle da doença somente.
Uma vez que a história natural destes tumores pode ser extremamente lenta13, para aqueles
pacientes que optarem por um tratamento não radical, pode-se oferecer ou a observação
expectante ou a monitorização controlada. A observação expectante, conceito mais antigo, não visa
a cura do paciente, mas somente introduzir o tratamento hormonal à época do aparecimento de
metástases. Pacientes idosos e com comorbidades significativas podem beneficiar-se desta
abordagem terapêutica. Já um outro conceito, vigilância ativa, emergiu nos últimos anos e baseiase no fato que para muitos pacientes com tumores pouco agressivos, existe uma “janela de tempo”
após o seu diagnóstico, sem que haja progressão da doença. A história natural destes tumores
demonstra que muitos destes pacientes não apresentarão doença clínica evolutiva e poderão ser
simplesmente observados, enquanto outros, ao longo do tempo, terão progressão tumoral e
poderão ser submetidos ao tratamento radical, sem que tenha se perdido a oportunidade de curálos14. Os resultados de longo prazo dos estudos prospectivos com monitorização controlada e
intervenção são de publicação recente15.
As recomendações atuais para a interrupção da monitorização e para a introdução do tratamento
curativo radical são: vontade do paciente, progressão clínica local pelo toque retal ou ultrassom
transretal da próstata, tempo de duplicação de PSA (TD-PSA) <3anos, aumento do escore de Gleason
em nova biópsia (após 12 meses), e presença de grau de Gleason 4 ou 5 na biópsia subsequente.
Alternativas como crioterapia, ultrassom de alta frequência (HIFU), entre outras modalidades
não estão validados e devem ser considerados como terapias experimentais.
7.3.2. Doença Clinicamente Localizada – risco Intermediário
Para os pacientes com câncer de próstata localizado de risco intermediário, o conceito de
tratamento multidisciplinar já começa a ser empregado, uma vez que usualmente apresentam um
volume de câncer maior e uma maior possibilidade de doença metastática oculta e a chance de cura
com uma só modalidade de tratamento é menor do que nos pacientes de risco baixo.
A prostatectomia radical pode ser oferecida a este grupo de pacientes, mas muitos irão
requerer terapia adicional, seja por câncer localmente persistente ou recidivado, ou por metástase
à distância, evidenciada pela elevação do PSA logo após tratamento local. Ainda não há seguimento
longo o suficiente para o uso de cirurgia assistida por robótica para estes pacientes e recomendase cirurgia clássica adaptada para cada caso.
A cirurgia é curativa em cerca de 50% destes casos. Em um estudo randomizado, a prostatectomia radical foi comparada com vigilância, demonstrando diminuição significativa da mortalidade
específica pelo câncer de próstata, e da mortalidade global e menor risco de metástases e de
progressão local, em um período de seguimento superior a 8 anos, no grupo operado.16 Portanto,
pacientes com uma estimativa de vida maior que 10 anos não devem permanecer sem tratamento
local. Esforços para melhorar estes resultados, como uso de ablação androgênica, com castração
cirúrgica ou química, tentando reduzir o tumor antes da prostatectomia, não obtiveram sucesso17-21
e não se recomenda o uso de hormonioterapia neoadjuvante à prostatectomia. O uso de hormonioterapia adjuvante pode ser necessário, caso o paciente tenha linfonodos acometidos durante a
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MA NUA IS D E CO ND UTAS
cirurgia22, 23 (veja adiante) e o uso de radioterapia adjuvante deve ser discutido com o paciente em
caso de margens positivas24, 25 (veja adiante).
A radioterapia externa é também uma ótima opção para estes pacientes. Não está estabelecido
que a radioterapia externa possa erradicar todas as células tumorais confinadas na próstata e na
tentativa de produzir melhor controle da doença foram tentadas várias modificações da radioterapia,
como aumentar a dose com o uso de radiação conformal, que diminui as toxicidades agudas e
tardias e permite que sejam aplicadas doses maiores com menos efeitos colaterais, o uso combinado
com braquiterapia, ou administração de prótons. No entanto, nenhum destes procedimentos foram
avaliados em estudos randomizados. Recomendamos que nos pacientes com risco intermediário que
optarem pela radioterapia externa, que esta seja aplicada por técnica conformada tridimensional
numa dose maior, de pelo menos 75,6Gy. Alguns estudos mostraram que doses maiores, como
78Gy em comparação a doses de 70Gy conferem um aumento de ganho de sobrevida livre de
recidiva, às custas de uma maior toxicidade retal, principalmente para pacientes com PSA acima de
10ng/ml. Todavia, os estudos não demonstraram ganho de sobrevida global.26, 27
Vários estudos randomizados sugerem que a combinação de radioterapia externa com
ablação androgênica em pacientes de risco intermediário possa melhorar o controle do câncer ou
aumentar a sobrevida. Entretanto, o momento ideal do início da ablação androgênica e a sua
duração são assuntos de grande discussão. Um estudo randomizado mostrou que seis meses de
ablação androgênica neoadjuvante, concomitante e adjuvante com a radioterapia, produziu melhor
sobrevida câncer específica nesta população28. Mais recentemente, o efeito da hormonioterapia
sobres riscos cardiovasculares (veja adiante) tem levantado a discussão real do uso desta terapia
em pacientes com doença localizada, e aqui se recomenda novamente a ponderação do seu uso
frente às comorbidades do paciente e sua expectativa de vida.
Braquiterapia como monoterapia não é recomendada para este grupo de pacientes, pois
apresentou um resultado inferior à radioterapia externa ou prostatectomia radical, produzindo
menor sobrevida livre de progressão de PSA3.
Para pacientes com expectativa de vida de menos de 10 anos ou com comorbidades significativas,
a observação expectante permanece uma opção razoável. Johansson et cols. observaram que
somente 13% destes homens desenvolvem metástases 15 anos após o diagnóstico, e somente
11% morrem de câncer de próstata29.
7.3.3. Doença Clinicamente Localizada – risco Alto
O tratamento ideal para este grupo de paciente não está definido, devendo sempre levar em
consideração a idade do paciente, sintomas da doença e comorbidades. Sempre que possível deve
compreender mais de uma modalidade terapêutica, pois se traduz em sobrevida maior para estes
pacientes. Usualmente para os pacientes de alto risco, ou para os pacientes com estadiamento
clínico >T3, recomendamos radioterapia conformada tridimensional com dose mínima de 75,6Gy
juntamente com o uso de hormonioterapia. Somente um estudo randomizado mostrou que a
irradiação pélvica é superior a irradiação localizada da próstata em termos de sobrevida livre de
progressão30, mas não é rotineiramente empregada. O tempo de início e o tempo total do uso de
hormonioterapia variam de estudo para estudo, mas a recomendação do grupo é que a hormonioterapia deve ser utilizada em combinação com a radioterapia por, no mínimo, 2-3 anos31 podendo
ser iniciada 2 meses antes do início da radioterapia 28, 32-36. Mais recentemente, um estudo europeu
comparou tempo curto de hormonioterapia (6 meses) versus 36 meses, sendo que 6 meses foi
inferior a 36 meses para este grupo de pacientes37.
Pacientes que apresentem apenas estádio T3 como fator de alto risco em casos selecionados
são candidatos para terapia cirúrgica posto que o estadiamento clínico pode corresponder a um
down staging cirúrgico (de T3 clínico para pT2) em até 25% dos pacientes. Nestes casos selecionados,
indica-se de rotina a dissecção de linfonodos pélvicos associada a prostatectomia. A utilização de
MANUAIS D E COND UTAS
| 161
hormonioterapia pré-operatória não produziu aumento de sobrevida global ou livre de doença,
podendo levar a uma redução das margens positivas em cerca de 30%, queda de PSA em 90% e
50% de redução de margens cirúrgicas positivas17-20. Mesmo aumentando o tempo de terapia
neoadjuvante para 8 meses, os resultados não foram significativos21. A utilização de hormonioterapia
após a cirurgia, ainda que controversa, apresenta resultados positivos apenas naqueles pacientes com
linfonodos positivos. O estudo de Messing et cols. demonstrou que o uso hormonioterapia imediata
após a prostatectomia radical, comparada com o seu uso somente após a progressão clínica, promove
aumento significante da sobrevida global (HR 1.84; p=0.04) e câncer específica (HR 4.0; p=0.0004)22, 23.
Outra terapêutica em pacientes submetidos a prostatectomia radical consiste na utilização de
radioterapia adjuvante. Estudos randomizados demonstram aumento da sobrevida livre de doença,
aumento do tempo para recaída bioquímica, maior proporção de pacientes que não requerem
utilização de hormonioterapia e tendência (p=0,06) à menor incidência de metástases à distância.
A atualização de longo prazo de um dos estudos de maior seguimento – 12 anos – mostrou ganho
de sobrevida global com uso de radioterapia adjuvante para pacientes operados e com fatores de
risco presentes (cápsula acometida, margem positiva ou vesículas seminais infiltradas) com HR
0,72; (IC 95% 0,55 – 0,96; p=0,023)38 e estes dados devem ser discutidos com o paciente. Devese considerar em pacientes com fatores de risco como margens positivas ou com invasão de cápsula
ou baseado nos dados de nomogramas.
A braquiterapia não é recomendada para pacientes de alto risco e a hormonioterapia pode ser
considerada para pacientes com expectativa de vida baixa pela sua idade ou comorbidades,
contudo, dois estudos prospectivos randomizados de fase III apresentados na American Society of
Clinical Oncology (ASCO) em 2010 mostraram ganho de sobrevida global da adição de radioterapia
à hormonioterapia quando comparada somente com hormonioterapia para doença localmente
avançada, novamente sugerindo que terapia combinada é melhor que monoterapia39, 40.
7.4. Seguimento pós-tratamento da doença localizada
Após a prostatectomia radical ou radioterapia, recomenda-se que o primeiro PSA seja
realizado em menos de 90 dias após o procedimento, e depois a cada 3-6 meses, se indetectável.
Caso iniciar elevação, individualizar para o paciente. Após 5 anos sem evidência de doença, podese seguir com controle de PSA anual.
7.5. recidiva Bioquímica pós-prostatectomia e pós-radioterapia –
avaliação, estadiamento/risco e tratamento
Cerca de 30 a 40% dos pacientes que se submetem a algum tratamento definitivo para uma
doença localizada, apresentam recidiva bioquímica. Este estado clínico da doença é caracterizado
por uma ansiedade imensa sentida pelo paciente e uma indefinição do melhor tratamento. Para
ajudar a definir a melhor condução do paciente, expomos alguns artigos sobre história natural da
recidiva bioquímica e de possíveis tratamentos de resgate.
Após uma prostatectomia radical, levando-se em conta que todo o tecido prostático foi
inteiramente removido, a meia vida sérica do PSA é de 2,6 dias. Assim, dentro de duas a quatro
semanas é esperado que o nível do PSA esteja abaixo de 0,1ng/mL sendo considerado indetectável.
A recidiva bioquímica pode ser definida como níveis de PSA persistentemente detectáveis após a
prostatectomia radical (PR) ou um aumento do PSA após um período de indetecção. A definição
atual de recidiva bioquímica pós-PR é de PSA ≥0,2 ng/ml seguido de outro aumento de qualquer
valor.
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MA NUA IS D E CO ND UTAS
Durante a radioterapia (externa ou braquiterapia) ocorre uma elevação do PSA na fase inicial
do tratamento provocada pelo dano celular e necrose, e após, observa-se uma evolução bifásica
caracterizada por uma queda rápida dos níveis de PSA e a seguir um declínio mais lento, porém,
gradual dos seus níveis séricos. A meia-vida do PSA após a radioterapia externa varia entre 1,9 a 3
meses e o tempo médio para o nadir do PSA após essa modalidade de tratamento é de 18 meses,
podendo haver flutuações. Segundo o consenso atual, recidiva bioquímica pós-radioterapia externa
(com ou sem hormonioterapia) é definida quando o valor do PSA atingir o nadir mais 2ng/ml41.
Os pacientes com diagnóstico de recidiva bioquímica constituem um grupo bastante
heterogêneo. O estudo original sobre a história natural dos pacientes com recidiva bioquímica
após prostatectomia radical seguiu 329 pacientes com diagnóstico de recidiva bioquímica de um
total de 3263 pacientes submetidos a PR entre 1982 e 2002 42, 43. Ressalta-se que os pacientes não
fizeram uso de hormonioterapia até o diagnóstico de doença metastática e no seguimento
mediano de 10 anos, 44% dos pacientes com recidiva bioquímica desenvolveram metástases. A
mediana do tempo para o desenvolvimento de doença metastática foi de 7,5 anos e a mediana do
tempo entre o diagnóstico de metástase e o óbito foi de 6,5 anos. Os principais fatores preditores
de desenvolvimento de doença metastática foram o escore de Gleason (5-7 vs. 8-10), o tempo para
o diagnóstico de recidiva bioquímica (>2 anos vs. <2 anos) e o TD-PSA (>10 meses vs. <10 meses),
conforme apresentado na Tabela 2.
Tabela 2 - Probabilidade de sobrevida livre de metástases após recidiva bioquímica42, 43
Gleason
recidiva após
quantos anos
da cirurgia
TD-PSA
3 anos
5 anos
7 anos
8-10
5-7
> 2 anos
> 10
meses
92%
92%
84%
< 10
meses
66%
34%
27%
< 2 anos
> 10
meses
92%
92%
84%
< 10
meses
66%
34%
27%
> 2 anos
> 10
meses
92%
92%
84%
< 10
meses
66%
34%
27%
< 2 anos
> 10
meses
92%
92%
84%
< 10
meses
66%
34%
27%
Outro estudo com o mesmo grupo de pacientes analisou a chance de mortalidade câncerespecífica para os pacientes com recidiva bioquímica pós-protatectomia44. Num seguimento
mediano de 10 anos, os fatores preditivos foram TD-PSA, escore de Gleason e tempo da recidiva
após a cirurgia. A Tabela 3 mostra como há grupos extremamente favoráveis neste estado clínico e
grupos com prognóstico desfavorável.
Tabela 3 - Estimativa de sobrevida câncer-específica em 15 anos após recidiva bioquímica pósprostatectomia radical44
Estimativa de sobrevida em 15 anos em %
recorrência > 3 anos após
recorrência < 3 anos após
prostatectomia
prostatectomia
Gleason score < 8 Gleason score > 8 Gleason score < 8 Gleason score > 8
TD-PSA
94 (87 a 100)
81 (57 a 93)
62 (32 a 85)
87 (79 a 92)
> 15 meses
86 (57 a 97)
59 (24 a 87)
31 (7 a 72)
72 (35 a 92)
9,0 – 14,9 meses
59 (32 a 81)
16 (4 a 49)
1 (<1 a 51)
30 (10 a 63)
3,0 – 8,9 meses
19 (5 a 51)
<1(<1 a 26)
<1 (<1 a 2)
2 (<1 a 38)
< 3 meses
MANUAIS D E COND UTAS
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Num mesmo raciocínio, um outro trabalho mostrou que o TD-PSA também é capaz de
predizer as chances de metástases após recidiva bioquímica pós-radioterapia. A incidência de
metástases a distância em 3 anos para pacientes com TD-PSA de 0 a 3, 3 a 6, 6 a 12 e mais que 12
meses é 49%, 41%, 20%, e 7%, respectivamente (P < 0,001)45.
O objetivo da avaliação inicial do paciente com recidiva bioquímica é determinar se essa
traduz recorrência local isolada da doença ou envolvimento sistêmico do câncer de próstata, o que
é justificado pela existência de diferentes modalidades terapêuticas em cada uma destas situações.
A Tabela 4 mostra alguns dados clínicos e patológicos que podem ajudar na determinação do tipo
de recidiva.
Tabela 4 - Variáveis clínicas e patológicas utilizadas que sugerem local da recidiva tumoral em
pacientes com elevação bioquímica após prostatectomia radical
recidiva local
Gleason <7
Margens positivas
Sem invasão de vesículas seminais
Linfonodos pélvicos negativos
PSA detectável >1 ano após a prostatectomia
Duplicação do PSA >10 meses
recidiva Sistêmica
Gleason >7
Margens Negativas
Invasão de vesículas seminais
Linfonodos pélvicos comprometidos
PSA detectável <1 ano após a prostatectomia
Duplicação do PSA <10 meses
A determinação precisa do sítio de recidiva é difícil e muitas vezes não é possível. O toque
retal, cintilografia óssea, tomografia computadorizada, Prostascint, ressonância magnética e biópsia
prostática transretal possuem baixa sensibilidade e especificidade não devendo ser adotados de
rotina, podendo ser utilizados, contudo, quando se considera uma terapia local radical como a
opção de tratamento, para comprovação de ausência de doença à distância. O valor do PET-CT
com 18FDG é pequeno no estado clínico de recidiva bioquímica.
Para pacientes com recidiva bioquímica após cirurgia, a radioterapia de resgate é uma opção
com chance de curabilidade. Recomendamos que seja aplicado o nomograma de Stephenson et
al. como um instrumento para predizer a chance de sucesso da radioterapia de resgate nestes
pacientes46 e para melhor definição da indicação deste tratamento ou de outro tratamento. No
caso de indicar a radioterapia de resgate, deve-se indicar precocemente: Stephenson et cols
mostraram que os melhores resultados foram obtidos com PSA pré-radioterapia de resgate
menores que 1,0ng/ml, porém alguns pacientes com PSA maiores que 1,5ng/ml ainda puderam se
beneficiar de tal tratamento.
Já para os pacientes com recidiva bioquímica pós-radioterapia, há trabalhos recentes
mostrando que a prostatectomia de resgate pode ser realizada em pacientes selecionados, mas
ainda com muita morbidade (lesão retal 6-15%; estenose de colo de bexiga 20-28% e incontinência
urinária 40-50%). Os melhores resultados são vistos em pacientes com PSA pré-prostatectomia de
resgate <10 ng/mL, estádio clínico T3a ou menor47.
Ainda para os pacientes com recidiva bioquímica pós-prostatectomia ou pós-radioterapia
podemos optar por uma conduta expectante ou a hormonioterapia, com fortes evidências para o
tratamento intermitente48, embora não há consenso de quando é o melhor momento de introduzir
este tipo de tratamento, uma vez que as evidências são fracas sobre os benefícios do seu uso
precoce na recidiva bioquímica, e devido aos efeitos adversos decorrentes do uso prolongado desta
terapia. Por outro lado, o uso de outras técnicas de resgate na recidiva bioquímica, como crioterapia,
são consideradas ainda investigacionais.
164 |
MA NUA IS D E CO ND UTAS
7.6. Doença metastática androgênio-dependente
Uma vez que o paciente é diagnosticado com doença metastática, a chance deste paciente
vir a falecer do câncer de próstata passa a ser superior a chance deste paciente vir a falecer de outra
causa. A deprivação androgênica (DA) tem sido o tratamento de escolha para o câncer de próstata
metastático há várias décadas49, embora seus benefícios sejam temporários e paliativos, já que a
grande maioria dos casos evolui para estado de progressão de doença apesar de níveis baixos de
testosterona.
A DA pode ser obtida por via cirúrgica (orquiectomia bilateral) ou medicamentosa (análogos
do GnRH ou estrogênio). A eficácia da supressão dos níveis de testosterona, em termos de resposta
e tempo livre de progressão, é similar entre os análogos GnRH , a orquiectomia e o estrogênio,
assim como a sobrevida a longo prazo50.
A escolha da via de castração deve ser individualizada, levando-se em conta o comportamento
clínico da doença, as expectativas do paciente e a disponibilidade dos tratamentos em questão. A
modalidade cirúrgica pode ser a melhor opção para pacientes cujo acesso aos análogos GnRH não
é possível ou para pacientes com pouca aderência ao tratamento. A orquiectomia é também uma
boa opção quando há necessidade de supressão imediata dos níveis séricos de testosterona, como
na presença de dor óssea severa, síndrome de compressão medular ou obstrução urinária.
Os análogos GnRH são a primeira opção para pacientes que recusem a cirurgia definitiva, ou
para os quais o planejamento terapêutico envolva a deprivação androgênica intermitente. Não
existe aparente superioridade em termos de eficácia e toxicidade entre os análogos GnRH
disponíveis (preparações mensais: Leuprolida 7,5mg, Gosserrelina 3,6mg; ou preparações bimestrais:
Busserrelina; ou trimestrais: Gosserrelina 10,8mg e Leuprolida 22,5mg). Em pacientes com doença
metastática extensa, ou em pacientes com doença localmente avançada, com risco de desenvolver
sintomas associados à elevação aguda da testosterona após introdução dos análogos GnRH (devido
ao fenômeno de flare51), a terapia anti-androgênica periférica deve ser iniciada 2 a 3 semanas antes
e continuada por 2-4 semanas adicionais após o início da administração do análogo GnRH. A fim
de evitar o flare, pode-se usar a bicalutamida, flutamida, nilutamida e a ciproterona. Além disso,
recomendamos que os pacientes com castração medicamentosa devam ter os seus níveis de
testosterona checados em caso de progressão, para haver a certificação da castração.
Por outro lado, o bloqueio androgênico máximo (castração médica ou cirúrgica combinada a
um antiandrogênio periférico por tempo prolongado) proporciona discreta vantagem em termos
de sobrevida global em 5 anos de cerca de 2-3%, segundo dados de uma meta-análise de 27
estudos randomizados com mais de 8000 pacientes52. Porém, o grau de incerteza deste real
benefício é de 0-5%. Assim, o bloqueio androgênico máximo não deve ser recomendado de rotina
e se for indicado, por alguma razão específica, não deve ser feito com ciproterona, pois aumenta a
mortalidade não relacionada ao câncer, mas somente com flutamida, bicalutamida ou nilutamida.
Em determinadas situações, pode-se utilizar o cetoconazol em altas doses53 ou o
dietilestilbestrol (estrogênio) como métodos de castração química54. A monoterapia com
antiandrogênios periféricos parece ser menos efetiva que a castração médica ou cirúrgica e não é
recomendada como primeira linha terapêutica.
O início da DA deve ser preferencialmente durante a fase assintomática da doença metastática,
pois a introdução tardia da DA (no momento do surgimento dos sintomas) mostrou-se
desvantajosa em termos de sobrevida relacionada à doença e resulta em maior incidência de
complicações ósseas e urológicas associadas à progressão da neoplasia55.
Devido aos efeitos adversos da DA, vários regimes alternativos a DA contínua têm sido
testados. A DA intermitente é a abordagem mais estudada, e tem como objetivo retardar os
mecanismos de resistência à supressão hormonal56. Até o presente momento não foi observada
diferença em termos de sobrevida livre de progressão entre pacientes em DA contínua ou
MANUAIS D E COND UTAS
| 165
intermitente. De qualquer forma, a DA intermitente proporciona menor toxicidade, podendo ser
considerada uma alternativa em pacientes para os quais a preservação da potência sexual seja
prioritária ou que apresentem efeitos colaterais intensos com a DA contínua. Embora o melhor
esquema de DA intermitente ainda não tenha sido definido, a abordagem mais aceita é a
manutenção do análogo GnRH até o menor nível de PSA atingível, procedendo-se então a
interrupção do tratamento. A DA deve ser reintroduzida quando os níveis de PSA atingem valores
superiores a 10ng/ml,. Outros grupos advogam que a reintrodução da DA deva ser feita quando o
PSA atingir 50% do nível incial da DA. O tempo de duração do tratamento com análogo GnRH é
bastante variável (7 a 16 meses), assim como os períodos de intervalo, e durante a evolução da
doença, o período de intervalo tende a se tornar cada vez menor. Resultados preliminares de um
estudo alemão randomizado, apresentado recentemente, mostrou a não-inferioridade do
tratamento intermitente à DA contínua usando-se o bloqueio androgênico máximo57.
Os efeitos colaterais associados a DA são o principal empecilho à continuidade do tratamento,
devendo portanto serem abordados precocemente e, se possível, profilaticamente. Os principais
efeitos colaterais e as abordagens terapêuticas preconizadas estão descritos na Tabela 5.
Tabela 5 - Sugestões para minimizar os efeitos adversos da DA contínua
Efeitos colaterais associados à DA
Fogachos
Osteoporose/fraturas
Perda de massa muscular
Alterações cognitivas
Ginecomastia dolorosa
Diabetes Mellitus, dislipidemia,
infarto agudo do miocárdio e morte
súbita65, 66
Intervenções recomendadas
Medroxiprogesterona 400mg IM, aplicada de acordo
com a sintomatologia
Acetato de megestrol 20mg VO duas vezes ao dia58
Estrógenos (dietilestilbestrol 0,5mg VO ao dia) em
pacientes sem fatores de risco ou história prévia de
doença cardiovascular
Uso de bisfosfonatos VO59ou IV60-62
Prática regular de exercícios físicos de resistência,
associados à reposição de cálcio e vitamina D63
Monitoramento das funções cognitivas (memória,
atenção e processamento de informações complexas)
Irradiação profilática das mamas
Tamoxifeno 20 mg VO/dia64
Monitorização laboratorial frequente e avaliação
cardiológica , se necessário
7.7. Doença metastática resistente a castração – hormonioterapia
O estado clínico de câncer de próstata metastático resistente a castração é atingido quando
há progressão de doença apesar da orquiectomia ou, no caso, do uso de análogos de GnRH, apesar
de testosterona sérica em níveis de castração (<50ng/dl). Os termos androgênio-independente,
androgênio-refratário, hormônio-independente ou hormônio-refratário são intercambiáveis e não
servem ao propósito de classificar o risco de morte do paciente e nem de definir se o paciente pode
se beneficar de outras linhas de hormonioterapia ou deva receber quimioterapia.
Como não há estudos randomizados mostrando ganho de sobrevida global com o uso de
hormonioterapia de segunda linha, esta pode ser considerada em situações na qual o paciente tenha
doença indolente, de preferência oligossintomática, e com ausência de doença visceral. Ferramentas
como os nomogramas de Smaletz et cols67 e de Halabi et cols68 para sobrevida global nos pacientes
com doença metastática resistente à castração podem ser incorporados na rotina médica a todos
estes pacientes, pelo seu grau de concordância prognóstica, baseado em parâmetros clínicos e
166 |
MA NUA IS D E CO ND UTAS
laboratoriais de fácil obtenção no dia a dia e por serem úteis na decisão de indicar uma segunda ou
terceira linha de hormonioterapia ou na indicação do tratamento quimioterápico. Os fatores de risco
são idade, performance status na escala de Karnofsky, e parâmetros laboratoriais prévios ao início
do tratamento como hemoglobina, PSA, desidrogenase lática, fosfatase alcalina e albumina sérica.
Em geral, os tratamentos hormonais de segunda ou terceira linha não estão associados à
redução de diâmetro tumoral, mas apenas à melhora sintomática geral e redução dos valores do
PSA, porém este controle de doença costuma ser em taxas menores e por períodos mais curtos
quando comparados à hormonioterapia de primeira linha (castração). A primeira manipulação
hormonal sugerida aos pacientes que desenvolvem doença progressiva resistente à castração é
adicionar um antiandrogênio periférico para os pacientes orquiectomizados ou para aqueles que
faziam uso de análogos GnRH somente.
Para os pacientes que desenvolvem progressão durante o bloqueio androgênico máximo, a
retirada do antiandrogênio periférico pode proporcionar taxas de resposta de cerca de 30-40%69, 70.
Para tal, antes de se pensar em trocar a medicação, deve-se suspender a medicação e rechecar o
PSA após 30 dias, no caso da flutamida e de 6 a 8 semanas no caso da bicalutamida, já que suas
meia-vidas são diferentes. Quanto maior o tempo no qual o paciente utilizou o antiandrogênio
periférico com resposta, maior a chance de se obter sucesso na retirada da medicação. Ainda um
aspecto interessante nesta classe de medicação é o fato de que os pacientes que responderam à
flutamida podem ter uma chance de resposta à bicalutamida e à nilutamida.
Não há condutas estabelecidas em relação ao tipo de hormonioterapia de segunda linha a ser
escolhida. Os critérios de escolha se referem mais ao perfil de toxicidade, às comorbidades
apresentadas pelo paciente e à experiência do médico. Opções de tratamento hormonal para este
grupo de pacientes incluem: retirada do antiandrogênio69, 70, bicalutamida em doses altas (150200 mg)71, nilutamida72, dietilestilbestrol73, cetoconazol em altas doses +/- corticoides53,
corticoides74 e megestrol73.
7.8. Doença metastática resistente à castração– quimioterapia
Há poucos anos, quimioterapia com docetaxel se tornou o tratamento de escolha para os
pacientes com câncer de próstata resistente à castração que têm a indicação de iniciar o tratamento
com medicação citotóxica. Isto se deve a dois estudos randomizados75, 76 que mostraram a
superioridade de quimioterapia à base de docetaxel em relação à mitoxantrona, não somente na
melhora da paliação dos sintomas e melhora da qualidade de vida, mas também na melhora da
sobrevida global deste pacientes, com redução de risco de morte de 20 a 24%. Reconhecemos que
quimoterapia com mitoxantrona pode ser usada em primeira linha em alguns casos (i.e. contraindicação a docetaxel), porém com a ressalva que não há comprovação de ganho de sobrevida77, 78.
Salientamos que o tratamento nos estudos foi até progressão de doença, toxicidade
inaceitável ou 10 ciclos, e todos os pacientes não orquiectomizados mantiveram a castração
química. Além disso, quimioterapia não deve ser usada em pacientes com recidiva bioquímica ou
em casos de doença localizada de risco alto fora de um contexto de estudo clínico.
Pacientes que apresentam progressão na vigência ou após a quimioterapia com docetaxel
podem ser tratados com cabazitaxel. Cabazitaxel foi avaliado em um estudo randomizado com
755 pacientes que comparou a associação de prednisona com cabazitaxel ou a mitoxantrona. Com
seguimento mediano de 13,7 meses, esse estudo mostrou um aumento significativo da taxa de
sobrevida global (15,1 versus 12,7 meses, HR=0,70, IC 95% 0,59 a 0,83, P<0,0001) em favor do braço
de cabazitaxel79. Outras medicações testadas nesta fase pós-docetaxel com ganho de sobrevida
quando comparada a prednisona ou a placebo são a abiraterona e o sipuleucel-T, respectivamente,
ambos ainda não estão disponíveis no Brasil quando da redação final desta padronização80.
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| 167
Em qualquer momento do estado de doença metastática resistente à castração, deve ser
considerado o uso de zoledronato81 para os pacientes com doença óssea para a diminuição de
eventos relacionados ao esqueleto e de radioterapia óssea paliativa, além de radiofármacos como
o Samário-15382. O denosumabe, anticorpo monoclonal humanizado contra o ligante do RANK,
também teve sua eficácia comprovada frente ao zoledronato neste contexto, com um perfil de
tolerância algo melhor, mas ainda não está disponível no Brasil até o momento.
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refractory prostate carcinoma: a phase I/II trial. J Nucl Med 1993; 34:1839-1844.
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Capítulo 8
Câncer da Bexiga
Editor: Dr. Sérgio Lunardon Padilha
Autor: Dr. Nils Gunnar Skare
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Capítulo 8
Câncer da Bexiga
8.1. Introdução e Epidemiologia
O câncer da bexiga é uma das neoplasias mais comuns, com uma incidência anual de cerca
de 16 casos por 100 mil homens por ano e 5 casos por 100.000 mulheres.52 É uma doença
predominantemente de homens mais idosos, com uma idade mediana na apresentação de 60-65
anos. Há variações geográficas na incidência, com taxas de aumento na região dos Grandes Lagos
dos Estados Unidos, na bacia do Mediterrâneo, e em regiões com um aumento da incidência de
esquistossomose . É mais frequente em brancos do que em asiáticos ou negros.20
Associa-se o câncer de bexiga mais comumente ao tabagismo, exposição a corantes, alguns
solventes industriais e gases de escape.52,20 Outras associações incluem tratamento prévio com
ciclofosfamida, dieta rica em gordura, infecção urinária crônica, paraplegia, redução da ingestão de
líquidos, abuso de analgésicos e radiação prévia nas estruturas pélvicas.
8.2. Patologia
O câncer da bexiga consiste predominantemente de carcinoma urotelial (câncer de células
transicionais) em aproximadamente 90% dos casos, carcinoma de células escamosas em 5 a 10%
e adenocarcinomas em 4 a 5%.10 O carcinoma urotelial pode ocorrer em qualquer lugar ao longo
do trato urinário, de modo focal ou multifocal. Os outros tipos histológicos são mais raros:
carcinoma de células pequenas, carcinoma anaplásico, sarcomas, linfomas, melanoma ou ainda
tumores secundários, especialmente do trato gastrointestinal.
O carcinoma de células escamosas está associado predominantemente com o tabagismo e a
esquistossomose, enquanto que o adenocarcinoma correlaciona-se com o tabagismo, vestígios de
úraco e infecção urinária crônica 52, 20, 10. O câncer de bexiga parece ter origem a partir de uma célulatronco, com a capacidade de diferenciar-se em diferentes padrões histológicos.10 Estes tumores
são geralmente associados a um defeito da mucosa urinária, podendo refletir a exposição aos
carcinógenos.
O carcinoma urotelial pode apresentar-se como doença não-invasiva ou invasiva. O grupo
não-invasivo consiste em tumores papilares, representando mais de 60% dos casos ou carcinoma
in situ. De acordo com o grau de diferenciação é classificado como tumores de baixo grau
(papilomas) e de alto grau. Estes apresentam alto risco de invasão, menor diferenciação e correlacionamse com estádios mais avançados e menor sobrevida. Conforme a nomenclatura atual da
Organização Mundial da Saúde, classificam-se em apenas duas graduações de diferenciação
tumoral: baixo e alto grau. Para os tumores invasivos, classicamente o estádio é o fator prognóstico
mais importante sendo a classificação mais utilizada a da American Joint Committee on Cancer
(AJCC).
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8.3. Características Clínicas
A apresentação clínica do câncer da bexiga geralmente está correlacionada com o modo de
apresentação e com a extensão da doença.52, 53, 39 Os pacientes com tumores não-invasivos,
tipicamente apresentam-se com hematúria assintomática (diagnosticada em exames de urina de
rotina), sangramento visível, polaciúria, disúria, ardência miccional ou nictúria. Os tumores invasivos
têm um padrão de apresentação semelhante, embora os mais avançados possam estar associados
à redução do jato urinário, dor pélvica, dispareunia, incontinência fecal ou mais raramente
pneumatúria. Ocasionalmente, os tumores envolvendo o trígono podem obstruir os ureteres,
produzindo dor nos flancos de modo uni ou bilateral.
A doença metastática geralmente apresenta-se com manifestações relacionadas ao local de
envolvimento.53, 39 Os lugares mais comuns de metástase no câncer da bexiga incluem os linfonodos
pélvicos, pulmão, fígado, ossos e, mais raramente, cérebro e pele.
Nas metástases pulmonares, podem produzir sintomas como: tosse, dispneia, hemoptise ou
dor torácica, enquanto que no envolvimento hepático, pode apresentar dor no quadrante superior
direito, dor na extremidade do ombro e ocasionalmente icterícia. As lesões ósseas frequentemente
associam-se com dor óssea e, menos comumente, com fraturas patológicas. As metástases cerebrais
podem cursar com cefaleia, confusão mental, alterações sensitivas, motoras e crises convulsivas.
As lesões cutâneas são incomuns, mas geralmente se manifestam através de um padrão infiltrativo
ou nódulos subcutâneos.
A manifestação paraneoplásica mais comum é o desenvolvimento de tromboses, mas podem
ocorrer outras alterações como: a produção do fator estimulador de colônias de granulócitos e
macrófagos ou outras citocinas, manifestando-se como leucocitose. Os tumores com diferenciação
escamosa podem causar hipercalcemia pelo excesso de produção de paratormônio.
8.4. Investigação e Estadiamento
A cistoscopia é o padrão ouro, permitindo o diagnóstico pela histologia e avaliando a invasão
profunda nas camadas submucosas e muscular, bem como o tratamento pela ressecção transuretral
(RTU). O exame bimanual no momento da ressecção transuretral permite o estadiamento local e
a presença de doença extravesical pela mobilidade da bexiga. A citologia pós-cistoscopia também
pode ser um elemento de utilidade, principalmente no acompanhamento. A análise molecular
permite a detecção de aneuploidia refletindo mudanças nos cromossomos 3, 7 e 17, que estão
associados com tumores de alto grau, e a perda do 9p21 é característica da doença de baixo grau.31
Esses marcadores podem ter maior sensibilidade do que a citologia urinária e alguns foram
aprovados pela Food and Drug Administration (FDA) americano para o diagnóstico de recidiva em
combinação com cistoscopia, mas seu papel no rastreio inicial ainda não foi comprovado.
Os exames de imagem do trato urinário podem ser realizados antes ou após cistoscop.53, 39, 32
A urografia excretora pode delinear a anatomia do aparelho urinário, a presença de tumores no
trato urinário superior ou hidronefrose. A tomografia computadorizada é a mais comumente
utilizada, pois pode avaliar o parênquima renal e a superfície urotelial. A ressonância magnética
define bem a anatomia local e da extensão do tumor invasivo, além de envolvimento dos gânglios
linfáticos locais e distantes, sendo bastante útil nos casos de disfunção renal. A cintilografia óssea
está indicada nos casos de dor óssea, elevação da fosfatase alcalina ou alterações no metabolismo
do cálcio.
A tomografia por emissão de pósitrons (PET-CT) ainda necessita estudos mais consistentes
para definição do seu papel. Os estudos iniciais eram baseados em estudos retrospectivos e com
limitado número de pacientes, entretanto, um estudo prospectivo com 43 pacientes utilizando
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esse exame na avaliação de doença músculo-invasiva demonstrou sensibilidade de 70% e
especificidade de 94%, correlacionando-se com a sobrevida e evitando cistectomias desnecessárias
em 7 de 42 pacientes.38 Outro estudo prospectivo não mostrou diferença significativa entre 18FFDG PET-CT e ressonância magnética para o envolvimento dos linfonodos no câncer da bexiga no
estadiamento pré-operatório.34 Este método pode ser de utilidade em pacientes com função renal
comprometida e naqueles onde há necessidade de uma melhor avaliação do comprometimento
linfonodal e metástases à distância.
A classificação mais amplamente utilizada de estadiamento é o modelo em conjunto do
American Joint Committee on Cancer (AJCC, 7ª edição de 2010).
Tabela 1 - Estadiamento do câncer de bexiga (AJCC – 2010)
Estádio
0a
0is
I
II
III
IV
T
Tx
T0
Ta
Tis
T1
T2a
T2b
T3a
T3b
T4a
T4b
Qq T
Qq T
N
M
N0
N0
N0
N0
N0
N0
N0
N0
N0
N1
M0
M0
M0
M0
M0
M0
M0
M0
M0
M0
N2
M0
N3
Qq N
M0
M1
Extensão da Doença
Tumor primário não pode ser acessado
Sem evidência de tumor primário
Carcinoma papilar não-invasivo
Carcinoma “in situ” (CIS)
Invade a lâmina própria (tecido conectivo subepitelial)
Invade a musculatura superficial, metade interna
Invade a musculatura profunda, metade externa
Invasão microscópica do tecido perivesical
Invasão macroscopica do tecido perivesical (massa externa)
Invade estroma da próstata, útero, vagina
Invade parede pelvica, parede abdominal
Nódulo único na pelve (hipogástrico, obturadora, ilíaca
externa ou pré-sacral)
Nódulos múltiplos na pelve (hipogástrico, obturador, ilíaca
externa ou pré-sacral)
Linfonodos da ilíaca comum
Metástases à distância
8.5. Prognóstico
O prognóstico do câncer da bexiga reflete-se por vários fatores: estádio, grau do tumor,
multifocalidade, presença de invasão linfática, associação com carcinoma in situ, morfologia, padrão de
mutação genética, presença de anemia ou hidronefrose. O estadiamento do câncer de dexiga pela
AJCC geralmente correlaciona-se bem com a evolução, conforme a Tabela 1. A taxa de sobrevida em 5
anos para pacientes com estágio I-II é maior que 70%, enquanto que para estágio IV, com carcinoma
metastático urotelial é inferior a 20%.
8.6. Tratamento de Câncer de Bexiga
8.6.1. Câncer da bexiga não-invasivo
No planejamento inicial do tratamento é importante a avaliação de risco de progressão. Para
os pacientes considerados de baixo risco, todas as características devem estar presentes: sem invasão
da lâmina própria (Ta); histologia de baixo grau; ≤3 lesões (todas ≤3 cm); papilífero; de base estreita;
e nos pacientes com câncer urotelial recorrente, deve haver um longo intervalo entre as recorrências.
Para os tumores de alto risco, pela presença de qualquer um dos fatores: Invasão da lâmina própria
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(T1); histologia de alto grau; > de 3 lesões ou > 3cm de diâmetro; séssil ou com base larga; ressecção
incompleta devido ao involvimento difuso da bexiga ou localização desfavorável; presença de lesões
Tis difusas ou Tis associadas a tumores papilares; múltiplas recorrências dentro de um curto espaço de
tempo. Os tumores não-músculo invasivos são divididos em papilomas, carcinomas papilares não
invasivos (Ta), aqueles que invadem a lâmina própria (T1) e carcinomas “in situ” (Tis).60 O tratamento
padrão para Ta, T1 e Tis é a RTU, utilizada como diagnóstico, estadiamento e tratamento. A RTU em
associação com o exame bimanual sob anestesia, é realizada para ressecar tumores visíveis e
amostragem da musculatura profunda para avaliação de possível invasão.53, 49 Se a citologia urinária for
positiva ou na presença de doença de alto grau, devem ser realizadas múltiplas biópsias aleatórias do
urotélio mesmo que esteja aparentemente normal, para identificar-se lesões ocultas. A ressecção
endoscópica deve ser repetida dentro de 4-6 semanas da ressecção inicial, em pacientes com doença
de alto grau e/ou tumores T1, porque até 50% terão evidência de invasão da muscular própria em
amostragens repetidas.
Os pacientes com câncer de bexiga não-invasivo, papilares de baixo grau, apresentam baixo
probabilidade de progressão para doença invasiva, embora o risco de recorrência local possa ser tão
alta quanto 70 a 80%. Os fatores de risco adversos para recorrência incluem: tumores grandes,
multifocalidade ou história prévia de recorrência. Tais tumores são muitas vezes referidos à terapia
intravesical adjuvante, geralmente instilações semanais para 6-8 semanas após ressecção, preferentemente com o Bacillus Calmette-Guérin (BCG), reduzindo o risco de recorrência em até 40%.29
A terapia intravesical está indicada como profilática ou como adjuvante após a ressecção completa
e, raramente, como terapia em pacientes onde há doença residual. Os resultados de ensaios clínicos
randomizados sugerem que a terapia intravesical com o BCG é superior aos outros agentes na
prevenção de progressão do tumor após a RTU, e a sua utilização na preservação da bexiga está
associada a resultados de longo prazo similares à cistectomia em tumores iniciais de baixo grau.53, 29
A terapia de manutenção com o BCG também promove uma redução na recorrência do tumor e
menor necessidade das cistectomias em comparação com um regime de indução única de 6 semanas,
entretanto, outros estudos não demosntraram impacto na progressão do tumor.51, 1, 60, 61, 69 O maior
estudo de manutenção foi realizado pelo SWOG (Southwest Oncology Group), que demonstrou um benefício
possível na manutenção, onde 660 pacientes com doenças de alto risco tratados com 6 semanas de
indução com BCG, seguidos de RTU.40 Aos três meses, 550 pacientes foram randomizados para receber
BCG adicional semanal por 3 semanas, administradas nos meses 3, 6, 12, 18, 24, 30 e 36, contra a
observação. A manutenção foi associada a uma melhor sobrevida livre de recorrência (mediana de 77
contra 36 meses sem manutenção) e não houve aumento na sobrevida em cinco anos (83% contra 78%).
A associação americana e européia de urologia recomendam a manutenção com BCG baseadas
em meta-análises, que demonstram resultados superiores em termos de prevenção de recorrência e
progressão com BCG, principalmente em estudos com manutenção de pelo menos um ano.69, 71, 7,8
Em alguns centros europeus, a quimioterapia citotóxica com agentes como: a mitomicina C, a
doxorrubicina ou a gencitabina são as drogas preferidas inicialmente, porque teriam menor
toxicidade.62, 28, 13 Considerando-se os custos, um estudo recente indicou que o tratamento com
mitomicina C intravesical, após a RTU, é menos onerosa para o sistema de saúde que a RTU isolada
quando se incorpora a freqüência no seguimento, cistoscopias e a ocorrência de recaídas.19
• Tumores Ta – baixo grau
A RTU é o tratamento padrão, mas devido ao alto risco de recidivas, recomenda-se uma única
dose de quimioterapia intravesical dentro de 24 horas da ressecção para reduzir a taxa de recorrência
em 12%, sendo mais comumente utilizada a mitomicina C, seguida de quimioterapia de indução de 6
semanas,. A imunoterapia geralmente não está recomendada nestes pacientes, mas deve ser levado
em consideração o tamanho tumoral, o número de lesões, o grau tumoral, a concomitância de
carcinoma “in situ” (CIS), a invasão linfo-vascular e o envolvimento da uretra prostática.70 Estes dados
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foram confirmados por meta-análises.(29) É necessário um acompanhamento atento, inicialmente com
cistoscopias a cada três meses.
• Tumores Ta – alto grau
As lesões papilares de alto grau apresentam maior invasibilidade e um risco relativamente alto de
recorrência e progressão. Observou-se que na ausência da muscular própria no espécime da RTU, 20%
a 40% apresentarão tumor residual e/ou doença músculo-invasiva, portanto, recomenda-se a repetição
da RTU nestes casos. Após a RTU, recomenda-se a terapia intravesical com BCG ou mitomicina C,
preferindo-se o BCG conforme meta-análise de superioridade do BCG intravesical em comparação com
observação25. Recomenda-se o acompanhamento com citologia urinária e cistoscopia a cada 3 a 6
meses de intervalo nos 2 primeiros anos.
Os tumores T1 invadem o tecido conectivo subepitelial (lâmina própria). A maioria são de alto
grau e devem ser considerados com alto risco de recorrência e progressão. Devem ser tratados com RTU
e a ressecção deve ser repetida, se a ressecção completa for duvidosa, ou seja, pelo tamanho do tumor,
localização, não haver o músculo no espécime e a presença de invasão angiolinfática. Em caso de
doença residual após uma segunda ressecção, recomenda-se imunoterapia com o BCG ou a
cistectomia. Em subgrupos de alto risco com lesões múltiplas, a presença de invasão angiolinfática ou
lesões recorrentes após o BCG, e/ou lesões residuais, indica-se a cistectomia precoce. O acompanhamento é semelhante aos T1.
O carcinoma in situ primário, ou Tis, é uma lesão de alto grau, que se acredita, precursora do câncer
de bexiga invasivo. A terapia padrão é a RTU seguida de BCG intravesical, geralmente administrada
por aplicações semanais durante 6 semanas. Em casos de intolerância ao BCG, pode-se administrar a
mitomicina C.
8.6.2. recorrência pós-tratamento ou doença persistente
Nos pacientes em observação com RTU inicial, que mostram recorrência pela citologia positiva,
devem ser submetidos à nova RTU seguida de novo tratamento adjuvante com terapia intravesical
baseado no estádio e grau da lesão recorrente. Os pacientes que respondem à indução com a terapia
intravesical inicial, podem receber uma segunda indução com o BCG ou a mitomicina C de reindução,
não mais que 2 cursos e com intervalo de 12 semanas. Para aqueles com resposta completa, a
manutenção com BCG intravesical é opcional e a recomendação está baseada em estudos clínicos com
melhores resultados com a manutenção.71 Recomenda-se a cistectomia se a progressão for
documentada.
Os eventos adversos habituais a todos os agentes intravesicais de uso comum incluem: sintomas
irritativos e hematúria, sendo com o BCG mais intensos e podendo também pode causar sintomas
semelhantes a um síndrome gripal. Como é um mycobacterium atenuado pode produzir infecções
locais, regionais e sistêmica, semelhantes à tuberculose. Podem formar-se granulomas em locais
distantes como a próstata, epidídimo, testículos, rins, fígado e pulmões. A sepse é a complicação mais
grave e pode ser fatal nos casos de envolvimento sistêmico e deve ser tratada com terapia tripla
antituberculose por 6 meses.
Após completar o tratamento, os pacientes devem ser monitorados de perto com cistoscopia
periódica, citologia urinária e/ou marcadores tumorais, em intervalos de 3 a 6 meses no intuito de
detectar-se a recorrência. Os pacientes com câncer de bexiga de alto risco, não-invasivos (alto grau Ta,
T1, ou carcinoma “in situ”) apresentam pelo menos 50% de chance em desenvolver doença invasiva e
35% de chance de morte por câncer de bexiga. Aqueles com doença persistente ou recorrente de alto
grau após a terapia intravesical vão desenvolver invasão muscular e progressão em 80% dos casos.
Recomenda-se a cistectomia radical nos pacientes com doença de alto risco recidivada, particularmente
naqueles com longa expectativa de vida.27, 63 As taxas de cura são de 90% para este grupo, entretanto,
a demora no tratamento após a recorrência da doença invasiva está associada com pior prognóstico.
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8.6.3. Câncer de bexiga invasivo
Antes de qualquer tratamento, recomenda-se uma avaliação acurada do estadiamento, para
afastar metástases à distância. Estudos laboratoriais como hemograma completo, perfil bioquímico,
cistoscopia, radiograma ou tomografia computadorizada de tórax, cintilografia óssea, nos casos de
dor óssea ou elevação da fosfatase alcalina, tomografia computadorizada ou ressonância magnética
do abdome e pelve.
A cistectomia radical com linfadenectomia pélvica bilateral é o tratamento padrão para câncer de
bexiga invasivo clinicamente localizado.53, 63 Ela requer a remoção em bloco dos órgãos pélvicos
anteriores, que incluem a bexiga, próstata e vesículas seminais em homens e da bexiga, útero, uretra,
ovários e manguito vaginal mais parede vaginal anterior em mulheres.63 A derivação urinária é realizada
conectando-se os ureteres para um reservatório intestinal (ureterostomia) ou também o emprego de
outras técnicas como reservatórios continentes (a bolsa de Indiana) e neo-bexigas ortotópicas, são
abordagens que oferecem continência, melhorando a qualidade de vida.
Os reservatórios “continentes” são esvaziados por autocateterismo intermitente, enquanto que a
neobexiga ortotópica, envolve a criação de um reservatório intestinal anexado à uretra,permitindo
que o paciente possa urinar normalmente, sem autocateterismo. Esses dispositivos geralmente não
permitem a sensação de "plenitude" da bexiga e deve-se tomar cuidado, especialmente quando o
paciente está recebendo fluidos intravenosos.
A cistectomia radical sem terapia adjuvante, é curativa em até 60% a 70% dos pacientes com
câncer de bexiga invasivo T2, dependendo dos fatores prognósticos.53, 63, 26 Nos grandes estudos nos
pacientes com tumores T2-T 3, a sobrevida global aos 5 anos está entre 40% e 65%. A recidiva é
influenciada por: estádio AJCC, grau, presença de invasão linfovascular, positividade nodal e expressão
de prognósticos moleculares adversos. A cistectomia radical é curativa em 20 a 40% dos pacientes com
metástases linfonodais pélvicas, e a evolução é determinada pelos fatores prognósticos.53, 63, 26
Preconiza-se a dissecção linfonodal sistemática extendida, incluindo linfonodos pré-sacrais e ilíacos
comuns, principalmente no acometimento de vários linfonodos e extensão extranodal, com ressecção
em bloco.63 Entretanto, outro estudo demonstrou que a extensão extranodal não parece ser um fator
prognóstico independente em pacientes com linfonodos positivos após cistectomia radical, onde 543
pacientes estudados retrospectivamente, não detectou significância estatística quanto à sobrevida
livre de recidiva ou sobrevivência específica de doença.35
A cistectomia laparoscópica radical com ou sem assistência robótica foi relatada em pequenas
séries de centros com experiência em cirurgia laparoscópica.24 O tempo da cistectomia e a dissecção
dos linfonodos são comumente realizados pela laparoscopia e o desvio urinário na cirurgia
convencional é realizado através de uma incisão mediana menor do habitual. As desvantagens incluem
a dificuldade técnica, maior tempo de cirurgia, e possíveis limitações em termos de eficiência
oncológica, além da maior dificuldade de observação dos linfonodos de estruturas pélvicas para
evidenciar o envolvimento tumoral. As vantagens potenciais incluem a redução da perda de sangue,
menor dor pós-operatória e menor tempo de convalescença. Não há ensaios clínicos randomizados
para avaliar esta abordagem e os dados publicados são casos selecionados e o seguimento curto.
A dissecção linfonodal pélvica e cistectomia radical apresentam importância para estadiamento
e tratamento. Dorin e colegas, numa análise retrospectiva de 162 pacientes com linfonodos positivos
submetidos a cistectomia radical com dissecção linfonodal estendida, onde foram removidos em torno
de 50 linfonodos por paciente (IC 3 a 140 gânglios linfáticos), tendo mediana de 3 gânglios positivos,
demonstrou tempo mediano para a sobrevida global de 28%.17 De acordo com análise multivariada,
os fatores adversos independentes para a sobrevivência incluiram: o estádio do tumor ≥pT3, >4
linfonodos positivos, não ter recebido quimioterapia adjuvante e linfonodos positivos localizados acima
da bifurcação ilíaca (risco relativo de 2,8; P=0,0030), que incluem os ilíacos comuns, pré-ciáticos, paraaórticos, pré-sacrais e para-cavais. O acometimento dos linfonodos acima da bifurcação das ilíacas são
os de pior prognóstico.15
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O tratamento primário para lesões T2 e T3 sem envolvimento nodal é a cistectomia radical, com
uma forte evidência para a quimioterapia neoadjuvante em tumores T3.23,57 A cistectomia segmentar
pode ser considerada apenas em tumores T2 únicos e sem a presença de Tis. O acompanhamento
destes tumores deve ser feito a cada 3 meses. Os tumores T2 e T3 com envolvimento nodal pela TC ou
por biópsia devem ser tratados como T4.
Nos pacientes com doença T4 sem envolvimento linfonodal na tomografia computadorizada ou
biópsia, recomenda-se 2 a 3 ciclos de quimioterapia com ou sem radioterapia, seguido de RTU,
cistoscopia e TC de pelve de controle. Aqueles com linfonodos positivos devem receber quimioterapia
com ou sem radioterapia e cistoscopia, e nos casos que não haja tumor residual, pode-se apenas
observar. Outras opções são reforço (“boost”) tumoral com radioterapia ou cistectomia.
8.6.4. radioterapia
Nos pacientes com câncer de bexiga com invasão muscular, que não apresentam metástases à
distância e que não são candidatos à cirurgia, a radiação é o tratamento de escolha.22, 47, 9, 11 Não há uma
comparação em estudos randomizados entre a radioterapia e a cistectomia radical, embora acreditase que a cirurgia tenha resultados superiores. As características de prognóstico favorável ao uso da
radioterapia são lesões pequenas, localizadas, tumores T2, ausência de hidronefrose, função renal
normal e ausência de anemia.52, 22, 47, 9, 11
A dose padrão da radioterapia é de 65-70Gy ao longo de 6-7semanas, com o principal
componente da dose focada na área do tumor e regiões imediatamente circundantes, definido pela
tomografia computadorizada preferencialmente conformada ou com intensidade modulada de feixe
(IMRT). Os estudos iniciais na década de 80 e posteriormente estudos randomizados do RTOG Radiation Therapy Oncology Group e do NCIC - National Cancer Institute of Canada na década de 90,
demonstraram uma melhora significativa no controle local, associando-se a quimioterapia à radioterapia,
entretanto, o benefício de sobrevida foi menos evidente.53, 12 Recentemente, melhores resultados com
a associação da quimioterapia com a radioterapia em comparação à radiação isolada foram validados
por um estudo prospectivo do Reino Unido, bem como a experiência de 20 anos de acompanhamento
num estudo de um intergrupo internacional.33, 58
As toxicidades da radioterapia incluem inflamação cutânea; proctite, podendo-se complicar com
hemorragia e obstrução; cistite ou fibrose da bexiga; impotência; incontinência e desenvolvimento de
neoplasias secundárias nas áreas adjacentes ao campo de radiação.
A associação da quimioterapia à radioterapia pode ser feita de duas maneiras: quimioterapia
concorrente à radioterapia ou quimioterapia neoadjuvante de indução seguida de quimioterapia
concorrente com radioterapia. O RTOG proctocolo 89-03 comparou 2 ciclos de quimioterapia CMV
(cisplatina, metotrexate e vimblastina) de indução seguida de cisplatina e radioterapia concorrentes,
comparada com cicplatina e radioterapia concorrentes sem esquema de indução. Não houve diferença
na resposta clínica completa ou sobrevida global em 5 anos.58
A radioterapia concorrente à cisplatina é a mais estudada, no tratamento do tumor da bexiga
músculo-invasivo. Após a RTU, a radioterapia é administrada na dose de 40Gy com campos externos
associado à cisplatina 70mg/m² EV, durante 2 h, nos D1 e D22. Após este procedimento, deve ser feita
uma nova avaliação. Se houver doença ativa, recomenda-se a cistectomia ou aplica-se um reforço de
25Gy com mais uma dose de cisplatina. A associação da quimioterapia à radioterapia produz um efeito
sinérgico, com maiores taxas de preservação da bexiga, conforme é demonstrado num estudo
randomizado no qual o uso concomitante de cisplatina e radioterapia reduziu significativamente a
recorrência comparada à radioterapia isolada (P = 0,036).55, 37, 12
Nos pacientes que não são candidatos ao uso da cisplatina, recomenda-se como segunda opção
a mitomicina C 12mg/m2 EV, no D1, e 5-fluorouracil (5-FU) 500mg/m2 EV, em 24 horas, por 5 dias, na
primeira e quarta semanas, concomitante à RT como radiosensibilizante conforme alguns estudos de
fase II50,75, 33.
182 |
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8.6.5. Quimioterapia Neoadjuvante
Há um aumento crescente no papel da quimioterapia neoadjuvante antecedendo a cistectomia
para tumores T2 e T3. Dois estudos randomizados mostraram benefício da quimioterapia neoadjuvante
em pacientes com tumores T3.57, 23 A quimioterapia sistêmica neoadjuvante pode induzir remissões
em tumores primários de bexiga, resultando em redução do estádio inicial, por vezes atingindo
remissões clínica e patológica completas.53
Os estudos clínicos randomizados iniciais com quimioterapia neoadjuvante, seguidos de
radioterapia definitiva ou cistectomia, não demostraram nenhum benefício significativo na sobrevida,
principalmente por agentes únicos, mas com a introdução de regimes adaptados do tratamento da
doença avançada como: MVAC - metotrexato 30mg/m² EV, nos D1, D15 e D22, vimblastina 3mg/m² EV,
nos D2, D15 e D22, doxorrubicina 30mg/m² EV, no D2, e cisplatina 70mg/m² EV, no D2 – repetido a cada
4 semanas, CMV - metotrexato 30mg/m² EV, nos D1, D15 e D22, vimblastina 3mg/m² EV, nos D2, D15
e D22, e cisplatina 70mg/m² EV, no D2 – repetido a cada 3 semanas. Estes protocolos permitiram um
benefício na sobrevida, como indicado por vários ensaios clínicos randomizados.41, 46, 57 No estudo do
SWOG-S8710/INT-0080, cistectomia radical comparada com três ciclos de quimioterapia neoadjuvante
com o esquema MVAC antes da cistectomia, demonstrou aumento na sobrevida global.23
Várias meta-análises demonstraram uma redução significativa de morte e aumento da sobrevida
global com a utilização de esquemas à base de platina.74, 42 Até o momento, nenhum regime citotóxico
demonstrou ser superior, aos esquemas MVAC e CMV para a quimioterapia neoadjuvante, no entanto
esquemas menos tóxicos como CG – cisplatina, 70mg/m² EV, durante 2 h, no D1, e gencitabina,
1.000mg/m² EV, durante 30 minutos, nos D1 e D8 – repetido a cada 3 semanas por 4 ciclos, demonstrou
sua popularidade, principalmente em pacientes idosos ou debilitados.
Tabela 2 - Esquemas de quimioterapia mais utilizados no tratamento do câncer da bexiga
CMV
70mg/m² D1
Cisplatina
Metotrexato 30mg/m² D1,15,22
Vimblastina
3mg/m² D2,15,22
Doxorrubicina
Gencitabina
Paclitaxel
Intervalos
28
(dias)
MVAC
CG
PCG
70mg/m² D1
70mg/m² D1
70mg/m² D1
30mg/m² D1,15,22
3mg/m² D2,15,22
30mg/m2 D2
1000 mg/m² D1,8 1000mg/m² D1,8
80 mg/m² D1,8
28
21
21
8.6.6. Quimioterapia Adjuvante
A quimioterapia adjuvante é administrada após cistectomia radical para os pacientes com alto
risco: tumores T3-T4 e/ou envolvimento linfonodal, no intuito de melhorar a sobrevida, entretanto,
não foi identificada nenhuma melhora estatisticamente significativa na sobrevida global.59, 21, 67 Um
estudo conduzido pela EORTC, foi encerrado prematuramente por falta de recrutamento. Dois
estudos randomizados mostraram vantagem na sobrevida com a terapia adjuvante, mas questões
metodológicas levantam questões com a aplicabilidade destes estudos.43, 44
O momento ideal para a quimioterapia perioperatória foi enfocado no estudo do MD Anderson
Cancer Center, em que 140 pacientes com carcinoma urotelial, foram randomizados para receber
2 cursos pré-operatórios e 3 pós-operatórios de MVAC, ou 5 ciclos pós-operatórios seguidos de
cistectomia e dissecção linfonodal. Após uma mediana de 6,8 anos, não houve diferença na
sobrevida livre de doença entre os dois grupos, 60% contra 56% respectivamente.48
À luz da falta de estudos randomizados com poder para a indicação da quimioterapia
adjuvante, uma meta-análise que comparou a observação à quimioterapia adjuvante, após a
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| 183
cistectomia radical, demonstrando redução do risco de morte em 25% em favor do tratamento
adjuvante.72 Numa coorte de 3947 pacientes, 932 (23,6%) receberam quimioterapia adjuvante.
Houve aumento da sobrevida com RR de 0,93 p=0,017, particularmente para o grupo de pacientes
com T≥3 e envolvimento linfonodal.68
No ASCO 2010, Paz-Ares, em nome do Spanish Oncology Genitourinary Group, apresentou o
estudo 99/01, no qual 142 pacientes com carcinoma urotelial com doença patológica pT3-4 e/ou
linfonodo positivo à cistectomia foram aleatorizados para receber 4 ciclos da combinação de
paclitaxel, cisplatina e gencitabina (PCG) ou observação.76 A quase 30 meses de seguimento, todos
os parâmetros avaliados foram significativamente superiores para o braço de tratamento (SG HR
0,38 95%IC 0.221-0.649; P <0,0004 e SLP HR 0,38 P<0,0001.), com toxicidade geral manejável.
Apesar do seguimento curto, tal estudo torna esta opção considerável neste contexto.
8.6.7. Câncer de bexiga metastático
Em torno de 50% dos pacientes recidivam após a cistectomia, sendo que 10 a 30% são locais,
mas as metástases sistêmicas são as mais comuns. Se a recorrência é local ou doença persistente
após a conservação da bexiga, várias opções estão disponíveis: cistectomia, quimioterapia ou
radioterapia nos casos que não tenha sido irradiado previamente, além de RTU paliativa.
A quimioterapia é o tratamento de escolha para pacientes com câncer de bexiga metastático.
Sternberg e colaboradores demonstraram pela primeira vez que o regime com metotrexato,
vimblastina, doxorrubicina e cisplatina (MVAC) produziu respostas objetivas em mais de 60% dos
casos, com uma sobrevida mediana de 1 ano.64 A principal limitação deste regime é a toxicidade
com muitas vezes efeitos graves: diarreia, estomatite, mielossupressão, disfunção renal e
insuficiência cardíaca.56, 77
Foram introduzidas algumas tentativas para melhorar seu índice terapêutico, como o estudo
randomizado do EORTC, com uma variante de dose intensa do MVAC, propiciando altas taxas de
resposta e toxicidade reduzida em comparação com o regime original, porém não houve aumento
significativo na sobrevida.66
O regime específico de quimioterapia recomendado, depende da presença ou não de comorbidades como doença cardíaca, disfunção renal, classificação do risco e da extensão da doença. Os
pacientes com baixo risco são aqueles com bom índice de desempenho, sem metástases viscerais
(pulmão e fígado) ou doença óssea, além de fosfatase alcalina e desidrogenase lática normais.
Como agentes únicos o paclitaxel, a gencitabina, o docetaxel, a ifosfamida e o pemetrexede
apresentam taxas de resposta de aproximadamente 20 a 30%. A combinação destes agentes com
drogas convencionais ou investigacionais resultou em taxas de resposta de 50 a 80%, e muitas
vezes com menor toxicidade do que o regime clássico MVAC, mas os números sobrevida mediana
permaneceram na faixa de 12-20 meses, e taxas de cura para pacientes com metástases viscerais
não excederam 10 a 15%.37, 78, 3, 30, 4, 73
A combinação de gencitabina e cisplatina, em ensaios clínicos de fase II, demonstrou ser
equivalente ao MVAC em doença metastática, mas com toxicidade substancialmente menor,
conforme ensaios clínicos randomizados.37, 4, 65 O MRC e o EORTC conduziram um estudo
randomizado de fase III avaliando gemcitabina e cisplatina, com ou sem paclitaxel para o carcinoma
urotelial metastático (PCG – paclitaxel, 80mg/m2 EV, nos D1 e D8, gencitabina, 1.000mg/m2 EV, nos
D1 e D8, e cisplatina, 70mg/m2 EV, no D1 – repetido a cada 3 semanas por 4 ciclos).5 A taxa de
resposta foi ligeiramente superior à associação com paclitaxel, entretanto, não foi estatisticamente
significante. Considerando que, a longo prazo, a sobrevida livre de progressão e global foram
similares entre o esquema GC e o MVAC, devendo-se considerar que o GC seja o tratamento padrão
para a doença localmente avançada e metastática do carcinoma urotelial da bexiga.54
Como alternativa à cisplatina, a utilização da carboplatina foi investigada em alguns estudos
particularmente em pacientes idosos e com redução da função renal. Em 238 pacientes que não
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MA NUA IS D E CO ND UTAS
se adequavam à cisplatina foram randomizados para a combinação de gencitabina e carboplatina
ou metotrexate, carboplatina e vimblastina.14 Os pacientes tinham desempenho ECOG 2 e taxa de
filtração glomerular entre 30 e 60 mL/min. A mediana de idade de 71 anos e a sobrevida global não
foi diferente entre os dois tratamentos (8 e 9 meses, RR de 0,94).
Num estudo de 110 pacientes divididos entre: gencitabina associada à carboplatina ou
cisplatina (gencitabina 1250mg/m2 dias 1 e 8 com cisplatina 70mg/m2 no dia 2 cada 3 semanas ou
gencitabina 1250mg/m2 nos dias 1 e 8 com carboplatina AUC 5 no dia 2 cada 3 semanas num
máximo de 6 ciclos. A toxicidade foi similar entre os dois grupos incluindo neutropenia, náusea,
vômitos e nefrotoxicidade. Não houve diferença significativa para a taxa de resposta ou na mediana
de sobrevida. Entretanto, este estudo não tinha poder suficiente para demosntrar a diferença de
eficácia entre os dois regimes.16
Para a segunda linha de tratamento, não há um tratamento padrão, e os painéis de consenso
recomendam a participação em ensaios clínicos. As opções de quimioterapia paliativa, são
baseadas no que foi oferecido em primeira linha que incluem: 5-fluoruracil, ifosfamida, paclitaxel,
pemetrexede, metotrexato e vimblastina que demosntraram benefícios modestos em estudos fase
II. A única droga avaliada em estudo de fase III é a vinflunina, um alcalóide da vinca de terceira
geração, onde os pacientes foram randomizados para vinflunina contra terapia de suporte e
observou-se um aumento significativo no tempo livre de progressão e um aumento na SG.6
8.6.8. Outros tumores da bexiga
Como regra geral, os carcinomas espinocelulares são sensíveis a combinações que incluem um
complexo de platina, paclitaxel e gemcitabina, e as respostas ocasionais foram observadas com o
tratamento utilizando-se o metotrexato, bleomicina e ifosfamida. O MVAC não é um regime útil
para carcinoma epidermóide de bexiga.56 Existem vários modelos diferentes de prática como a
uma combinação de cisplatina e gencitabina associados à ifosfamida (cisplatina 70mg/m² EV, no
D1, paclitaxel 200mg/m² EV, durante 3 h, no D1, e ifosfamida, 1.500mg/m² EV, do D1 ao D3, a cada
3 semanas, com MESNA 300mg/m² EV, 30 minutos antes, 4 e 8 h após a ifosfamida, com suporte
hematopoiético) ou ao paclitaxel (PCG – paclitaxel 80mg/m2 EV, nos D1 e D8, gencitabina
1.000mg/m2 EV, nos D1 e D8 e cisplatina 70mg/m2 EV, no D1 – repetido a cada 3 semanas por 4
ciclos).
Nos carcinomas epidermóides do trato urotelial, o esquema CG obteve taxas de respostas
completa e parcial de 24 e 30%, respectivamente. Os adenocarcinomas tendem a responder apenas
transitoriamente a regimes utilizados para cânceres do trato gastrointestinal, tais como combinações
envolvendo oxaliplatina, irinotecano e fluoropirimidinas (5-fluorouracil ou capecitabina), mas não
há dados bem-estruturados de estudos clínicos de fase II ou de fase III. Recente revisão da literatura
confirmou que as variantes do regime FOLFOX estão associadas com ocasionais remissões
sustentadas, no entanto, toda a experiência parece ser de relatos de caso único.
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MANUAIS D E COND UTAS
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190 |
MA NUA IS D E CO ND UTAS
MANUAIS D E COND UTAS
| 191
Capítulo 9
Câncer de Rim
Editor: Dr. Óren Smaletz
Autores: Dra. Ana Lucia Coradazzi, Dr. Daniel Herchenhorn, Dr. Fernando Cotait Maluf, Dr. José Luiz
Miranda Guimarães, Dr. Marcus Vinicius Sadi, Dr. Milton Rabinovits, Dr. Óren Smaletz, Dr. Vinicius
Carrera Souza e Dr. Volney Soares Lima
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MA NUA IS D E CO ND UTAS
MANUAIS D E COND UTAS
| 193
Capítulo 9
Câncer de Rim
9.1. Introdução
O câncer do rim, também chamado de carcinoma de células renais, é um tumor raro. No Brasil,
são diagnosticados cerca de 4200 casos anualmente1, o que corresponde a cerca de 2% dos
cânceres nos adultos. Tal tumor ocorre em duas formas: a forma hereditária, que é uma manifestação rara e ocorre predominantemente em pacientes jovens através de mutações autossômicas
dominantes (síndrome de Von Hippel-Lindau) e na forma esporádica, que é a mais comum.
Podemos dizer que poucos tumores sólidos tiveram um reconhecido avanço nos últimos anos
no tratamento da doença metastática como este tipo de câncer. Para uma doença onde o
tratamento sistêmico se limitava a algumas poucas opções de imunoterapia, com resultados bem
modestos e às custas de toxicidades substanciais, drogas com ação dirigida a alvos moleculares
pertinentes ao câncer renal tornaram-se uma nova opção de tratamento para estes pacientes. Com
estas novas opções de tratamento, fez-se necessário uma interpretação dos resultados dos estudos
recentes e a discussão de padronização do tratamento, levando-se em conta os custos destas novas
medicações e as diferenças de disponibilidade de recursos no território nacional.
O presente texto tem o objetivo de padronizar o tratamento do câncer de rim. Este documento
é resultado de uma análise crítica da literatura médica referente ao tratamento dos tumores de
rim e discussão entre os autores sobre os diversos tópicos que compõem este documento. Contudo,
salientamos que tal padronização não consegue comportar a variação individual entre os pacientes
e o texto não deve substituir o julgamento do médico que assiste o paciente, mas sim pode servir
de base para a discussão das condutas e decisão final do manuseio do paciente.
9.2. Avaliação da doença inicial e estadiamento
Pacientes com câncer de rim, tipicamente, apresentam uma massa suspeita envolvendo o
rim, visualizada através de exame radiológico, geralmente uma ultrassonografia ou tomografia
computadorizada. Nos últimos anos, o uso mais frequente de exames de imagem fez com que
muitos destes tumores fossem diagnosticados ainda numa fase mais precoce e assintomática,
embora cerca de 25% dos pacientes já apresentem metástases ao diagnóstico. As metástases mais
frequentes incluem sítios como pulmão, linfonodos e ossos.
As queixas mais frequentes podem ser divididas por sintomas locais como hematúria, dor em
flanco ou por sintomas sistêmicos como febre, perda ponderal, anemia, dor óssea ou dispneia.
Uma vez diagnosticado o tumor de rim, recomendamos, além do exame físico, realizar exames
complementares como hemograma, função renal e enzimas hepáticas, incluindo desidrogenase
lática, cálcio total, e análise de urina. Como exames de imagem, há a necessidade de realizar
tomografia de abdome e pelve e uma radiografia ou tomografia de tórax. A ressonância magnética
de abdome é usada para avaliação de envolvimento de veia cava ou pode ser utilizada ao invés da
tomografia no estadiamento, quando o uso de contraste estiver contra-indicado. Quando a massa
for de localização central no rim, deve-se excluir a possibilidade de tumor de pelve renal (tumor
urotelial) e sugere-se citologia urinária e ureteropieloscopia com biópsia para descartar esta
hipótese.
194 |
MA NUA IS D E CO ND UTAS
O mapeamento ósseo deve ser realizado na presença de dor óssea ou fosfatase alcalina
elevada e a ressonância de crânio deverá ser solicitada na presença de sintomas. O exame de PETCT não faz parte dos protocolos de estadiamento, pela sua baixa sensibilidade2.
AJCC 2010 7ª. ed - Estadiamento dos Tumores de Células renais
Tumor (T)
Linfondos regionais (N)
Metástase (M)
TX - tumor primário não acessado
T0 - sem evidência de tumor primário
T1 - Tumor 7cm ou menos, limitado ao rim
T1a - Tumor 4cm ou menos no meior diâmetro, limitado ao rim
T1b - Tumor maior que 4cm e menor que 7cm
T2 - Tumor maior que 7cm, limitado ao rim
T2a - Tumor maior que 7cm e menor que 10cm
T2b - Tumor maior que 10cm
T3 - Tumor extende até vasos maiores ou tecidos perirrenais, mas não invade ad-renal
ipsilateral ou não ultrapassa a fáscia de Gerota
T3a - Tumor invade diretamente a veia renal ou seus ramos ou tecidos perirenais e/ou
gordura do seio renal, mas não além da fáscia de Gerota
T3b - Tumor se extende grosseiramente até veia cava abaixo do diafragma
T3c - Tumor se extende até a veia cava acima do diafragma ou invade a parede da veia cava
T4 - Tumor invade além da fáscia de Gerota e invasão de ad-renal por contiguidade
NX - Linfonodos regionas não podem ser acessados
N0 - Sem metástase para linfonodos regionais
N1 - Metástases em linfonodo(s) regional(is)
MX - Metástase à distância não pode ser avaliada
M0 - Sem metástase à distância
M1 - Metástase à distância, incluindo ad-renal não por contiguidade
Estágio I - T1 N0 M0
Estágio II - T2 N0 M0
Estágio III - T1ou T2N1M0, T3N0 ou N1M0
Estágio IV - T4 Qualquer N M0, Qualquer T Qualquer N M1
9.3. Princípos de Cirurgia - nefrectomia radical e nefrectomia citorredutora
O único tratamento curativo para o câncer de rim localizado é o tratamento cirúrgico. A cirurgia
clássica, neste caso, é a nefrectomia radical. Estudos radomizados compararam a nefrectomia radical
realizada pelas vias de acesso aberta e laparoscópica e os resultados demonstraram resultados
oncológicos similares entre ambas, mas com maior benefício cosmético nos casos operados por
via laparoscópica3, 4.
A necessidade de realização da linfadenectomia é controversa, pois a linfadenectomia não é
um procedimento terapêutico, mas pode fornecer informações prognósticas5, 6. Quase todos os
pacientes com linfonodos positivos desenvolvem doença sistêmica e menos de 1/3 deles sobrevive
MANUAIS D E COND UTAS
| 195
5 anos. Por outro lado, a adrenalectomia é considerada desnecessária, exceto nos casos de grandes
tumores de polo superior ou quando os exames de imagem documentam anormalidades. Até 10%
dos tumores de rim invadem a veia cava inferior e a presença de trombo venoso tumoral não
confere pior prognóstico e a indicação cirúrugica deverá ser mantida.7
A nefrectomia parcial deve ser considerada8, 9 nas situações descritas na Tabela 1. Este
procedimento poupador de néfrons é uma cirurgia mais complexa que apresenta equivalência
oncológica com a nefrectomia radical10. Entretanto, estudos recentes demonstram que pacientes
submetidos a nefrectomia radical apresentam maior chance de desenvolver insuficiência renal
crônica do que aqueles tratados com a cirurgia parcial. Com o tempo, pacientes submetidos à
nefrectomia radical têm menor sobrevida do que aqueles tratados com cirurgia parcial, devido a
um aumento da mortalidade cardiovascular11, 12.
A nefrectomia parcial pode ser realizada por via aberta, laparoscópica ou robótica, mas não
existem estudos prospectivos randomizados que compararam os três procedimentos13. Contudo,
o tratamento padrão ainda é realizar a nefrectomia parcial por via aberta.
Tabela 1 - Indicações de nefrectomia parcial nos tumores renais
Absolutas:
1. Tumor em rim solitário
2. Tumor bilateral
relativas:
1. Tumor renal unilateral na presença de condições clínicas que comprometem a função renal
(litíase, pielonefrite crônica, refluxo vésico-ureteral, estenose de artéria renal, hipertensão
arterial, diabetes)
2. Tumor renal em pacientes com alta probabilidade de apresentarem novos tumores
(portadores da síndrome de von Hippel-Lindau)
Eletivas:
1. Tumor renal <4cm com rim contra-lateral normal (T1a)
2. Tumor renal <7cm com rim contra-lateral normal (T1b) – se localização favorável
3. Cistos complexos Bosniak IIF ou III
O painel admite que alguns pacientes podem ser monitorizados sem ter o tratamento cirúrgico
de imediato quando do diagnóstico de uma massa renal, como nos pacientes de idade avançada,
com más condições clínicas e com tumores pequenos (<3cm). Uma meta-análise de 9 estudos
contendo 234 lesões sólidas renais tratadas de forma expectante, cujos tumores tinham o diâmetro
mediano de 2,5cm e seguimento de 3 anos, documentou que o crescimento destas neoplasias foi
em média de 0.28cm/ano (variação 0-0.86cm/ano), sugerindo que a maior parte destes casos tem
uma evolução muito lenta. Não houve diferença de crescimento entre os oncocitomas e os cânceres
de rim. No entanto, cerca de 1/3 dos casos que eventualmente foram operados eram câncer renal
de alto grau histológico, demonstrando que alguns destes tumores são muito agressivos, mesmo
quando pequenos, mostrando que não há parâmetros prognósticos adequados para se avaliar a
agressividade biológica dos tumores renais pequenos14.
A crioterapia ou ablação por radiofrequência são opções alternativas de tratamento para
grupos seletos de pacientes que não podem tolerar um procedimento cirúrgico.
Mesmo os pacientes com doença metastática ao diagnóstico podem se beneficiar da nefrectomia, neste caso, denominada de nefrectomia citorredutora. Estudos randomizados demonstram
uma vantagem na sobrevida de 3 a 10 meses nos pacientes tratados com cirurgia seguida de
tratamento para a doença sistêmica com interferon versus somente tratamento com interferon15,
16. Nestes casos, os pacientes que mais se beneficiaram da nefrectomia citorredutora eram
pacientes com bom performance status e com metástases pulmonares. O papel da nefrectomia
196 |
MA NUA IS D E CO ND UTAS
citorredutora para o paciente com doença metastática que iniciará tratamento sistêmico com
drogas de alvo molecular não está bem estabelecido e estudos com desenho semelhante estão
em condução na Europa. A nefrectomia ou embolização tumoral devem ser sempre consideradas
para pacientes com hematúria, dor local ou outros sintomas relacionados com a presença do tumor,
caso a nefrectomia radical não possa ser realizada.
9.4. Seguimento dos pacientes pós-nefrectomia nos estágios I-III
Após a ressecção cirúrgica, 20 a 30% dos pacientes com tumores localizados apresentam
recorrência da neoplasia dentro de três anos17. Os fatores de risco para recidiva são o estadiamento,
a presença de componente sarcomatoso, grau histológico de Fuhrman, invasão microvascular,
status de margens, e necrose. Em pacientes submetidos a ressecção completa do tumor, não há
indícios de que qualquer estratégia de tratamento adjuvante seja capaz de mudar o prognóstico
dos pacientes. Estudos comparando interferon-alfa adjuvante18, 19 ou altas doses de interleucina220 versus observação não demonstraram benefícios em termos de sobrevida livre de recidiva ou
sobrevida global para qualquer das estratégias, inclusive demonstrado em meta-análise recente21.
Há estudos clínicos em andamento envolvendo drogas com ação dirigida a alvos moleculares no
tratamento adjuvante do carcinoma renal localizado, incluindo sorafenibe, pazopanibe e sunitinibe,
mas até o momento, não estão indicados na adjuvância até que se conheçam os resultados destes
estudos. A radioterapia no leito cirúrgico também não é indicada após a nefrectomia. Assim, a
observação clínica permanece como conduta padrão para pacientes completamente ressecados.
Para os pacientes com baixo risco de recidiva, recomendamos no seguimento a história
médica, o exame físico, a radiograma de tórax e ultrassonografia de abdome. Para os pacientes
com alto risco de recidiva, recomendamos a história médica, o exame físico, radiografia ou
tomografia de tórax e tomografia ou ultrassonografia de abdome. A sugestão do painel é de que
este seguimento seja feito a cada seis meses nos dois primeiros anos após a nefrectomia e após isto,
uma vez por ano.
9.5. Doença metastática - estadiamento/avaliação de risco
Uma vez constatado que o paciente tem câncer renal metastático, alguns exames devem
constar como parte de seu estadiamento. Recomendamos que seja obtida uma tomografia
computadorizada de tórax. De preferência, deve-se fazer com contraste iodado no exame inicial,
para uma melhor avaliação dos linfonodos mediastinais, caso de função renal adequada. Nos
exames de seguimento, não será necessária a realização de contraste endovenoso, quando se tratar
de acompanhamento de metástases parenquimatosas pulmonares sem a presença de metástases
linfonodais. O abdome deverá ser investigado com tomografia computadorizada ou ressonância
magnética. Quanto ao estadiamento de doença em sistema nervoso central ou doença óssea,
seguir as recomendações anteriormente descritas no item 2.
A realização de exames de rotina deverá necessariamente incluir hemograma, função renal,
enzimas hepáticas, bilirrubinas, fosfatase alcalina, cálcio total, albumina e desidrogenase lática.
Para os pacientes com doença metastática, recomendamos fortemente que estes sejam
classificados conforme o modelo de risco de Motzer et cols.22, para fins de prognóstico, de escolha
de tratamento e pela facilidade de aquisição dos dados preditivos. Os fatores de risco do modelo
são: hemoglobina abaixo do limite da normalidade, escala de Karnofsky <80%, desidrogenase
lática >1,5 vezes o limite superior na normalidade, cálcio sérico total corrigido >10mg/dl e ausência
de nefrectomia ao diagnóstico. Veja Tabela 2.
MANUAIS D E COND UTAS
| 197
Tabela 2 - Classificação de risco para câncer de rim metastático. Adaptado de Motzer et cols.22
Número de fatores de risco
Sobrevida mediana, meses
Sobrevida em 1 ano, %
Sobrevida em 2 anos
Sobrevida em 3 anos
risco Baixo
0
20
71
42
12
risco Intermediário
1-2
10
45
17
3
risco Alto
3 ou mais
4
31
7
0
9.6. Doença metastática - tratamento sistêmico
Até há poucos anos, o tratamento do câncer de rim metastático se baseava em imunoterapia,
uma vez que quimioterapia tem atividade em menos de 6% dos pacientes23. A imunoteropia
empregada era interleucina-2 em altas doses intravenosa ou interferon, com baixas taxas de
resposta (5-20%)24, 25. Segundo a literatura, a interleucina-2 em altas doses pode proporcionar
respostas completas duradouras em poucos pacientes, principalmente naqueles com pouca
doença e doença restrita ao pulmão, mas às custas de toxicidades substanciais24. Por outro lado,
vários estudos utilizando interferon com ou sem interleucina-2 em doses baixas ou intermediárias
demonstraram taxas de resposta global e sobrevida global muito semelhantes, mas com
toxicidades bem mais aceitáveis25, 26. Contudo, o advento de novas drogas com ação dirigida a alvos
moleculares mudou o tratamento destes pacientes nos últimos anos. Recentemente, estudo
prospectivo avaliou a atividade da interleucina-2 intravenosa e alcançou taxas de resposta
superiores as séries históricas (28% resposta objetiva). Neste estudo, o único subgrupo que não se
beneficiou do tratamento foi o de histologia não-células claras (ASCO 2010).
Cerca de 75-85% dos tumores de rim são tumores de células claras, e tal dado deve ser
considerado quando da leitura de alguns trabalhos recentes com drogas com ação dirigida a alvos
moleculares que recrutaram somente pacientes com esta determinada histologia. Outro detalhe
amplamente discutido foi a validade clínica dos objetivos e dos desfechos de análise (end points)
dos estudos recentes e como aplicá-los. Para os pacientes com tumores de células claras, padronizamos
o tratamento sistêmico de primeira linha conforme a classificação de risco de Motzer et cols22.
• Para os pacientes com risco baixo, há algumas opções de tratamento:
1. Sunitinibe, um inibidor de tirosino-quinase, pode ser oferecido aos pacientes. Em um
estudo prospectivo randomizado para pacientes com tumores de células claras metastáticos sem
tratamento prévio, a sobrevida mediana livre de progressão foi significativamente mais longa (11
meses) no grupo tratado com sunitinibe do que no grupo tratado com interferon-alfa (5 meses),
correspondendo a hazard ratio de 0,42 (intervalo de confiança [IC] 95%, 0,32-0,54; P<0,001)27.
Dados mais maduros também demonstraram vantagem na sobrevida global de sunitinibe frente
ao interferon-alfa (26.4 versus 21.8 meses; HR 0.821; 95% IC 0,67-1,00; P=0.051), mesmo com
cruzamento entre braços do estudo28.
2. Dois estudos randomizados entre interferon-alfa com ou sem bevacizumabe demonstraram
maior sobrevida livre de progressão nos pacientes tratados com a combinação do que os pacientes
tratados com bevacizumabe somente (8,5 meses vs. 5,2 meses p< 0,0001; e 10,2 vs. 5,4 meses, HR
0,63, 95% IC 0,52-0,75; p=0,0001), tornando interferon-alfa com bevacizumabe uma opção para os
pacientes com risco baixo/intermediário29,30. O efeito sobre a sobrevida global destes pacientes foi
diluído provavelmente por tratamentos subsequentes dos pacientes, mas meta-análise recente
confirma este ganho.
3. Uma recente opção é o pazopanibe: um estudo randomizado para pacientes com tumores
de células claras metastático que eram virgens de tratamento ou que receberam citoquinas
198 |
MA NUA IS D E CO ND UTAS
previamente mostrou superioridade em termos de sobrevida livre de progressão (9,2 vs. 4,2 meses;
HR 0,46 95% IC 0,34-0,62; p <0.001) para os pacientes que receberam pazopanibe em relação ao
placebo31. Não houve ganho de sobrevida global, muito provavelmente pelo fato de mais da
metade dos pacientes que receberam placebo acabaram recebendo pazopanibe no momento da
progressão e possivelmente por tratamentos subsequentes.
Há a recomendação, porém não uniforme entre os autores, de outras alternativas para este
grupo de pacientes, como: a) o uso isolado de interferon-alfa, uma vez que o modelo de risco de
Motzer mostra que os pacientes de baixo risco tem uma sobrevida mediana de mais de 20 meses
com uso de interferon; b) seguimento vigilante dos pacientes assintomáticos, uma vez que o estudo
com pazopanibe mostrou que se estes pacientes receberem um inibidor de tirosina-quinase na
progressão, a sobrevida do paciente não é ameaçada; c) interleucina-2 em altas doses24 ; e d)
sorafenibe (veja adiante).
• Para os pacientes com doença metastática de risco intermediário, recomendamos o
tratamento com sunitinibe ou com interferon-alfa associado a bevacizumabe, ou com pazopanibe
no tratamento sistêmico de primeira linha.
• Já para os pacientes com doença metastática de alto risco, os autores recomendam o uso de
tensirolimo, um inibidor de m-TOR (mammalian target of rapamycin) que num estudo randomizado
incluindo 626 pacientes foi associado a vantagem na sobrevida global frente a interferon-alfa
isolado (10.9 versus 7.3 meses; HR para morte 0,73; 95% IC 0,58-0,92; P=0,008)32. Uma outra opção
é o sunitinibe, porém salientando que o estudo randomizado teve menos do que 10% deste tipo
de paciente do total recrutado no estudo e a análise por subgrupo de risco mostrou que o ganho
de sobrevida mediana livre de progressão foi de 4 meses comparada com 1 mês, com HR de 0,53
(95% IC, 0,23-1,23).
Para tumores de histologia outra que não células claras, a recomendação mais forte é por
tensirolimo, principalmente se o paciente for de alto risco. Há uma recomendação não uniforme de
outras opções como sunitinibe ou sorafenibe. Pacientes com tumor com componente sarcomatóide,
especialmente se este representar mais de 20% do total de celuridade tumoral, devem ser
submetidos a quimioterapia com doxorrubicina e gencitabina33, pela baixa resposta a terapia
primária com antiangiogênicos.
Em qualquer momento do tratamento da doença metastática, deve-se considerar o uso de
zoledronato para os pacientes com metástases ósseas para diminuir a chance de eventos
relacionados ao esqueleto34 e o uso de radioterapia paliativa para metástases ósseas e cerebrais
(incluindo irradiação cerebral total, radiocirurgia e/ou radioterapia estereotática fracionada). Em
casos selecionados, com bom estado geral e com lesões solitárias ou em sítio único, a metastasectomia
(ressecção cirúrgica de metástases) pode ser útil no manuseio do paciente35, mesmo no paciente
com metástase cerebral. Há uma possível maior incidência de hemorragia cerebral em pacientes
com câncer de rim com metástases cerebrais tratados com estes novos agentes anti-angiogênese
e tal fato deve ser levado em consideração quando do tratamento com estas drogas28.
Quando o paciente apresenta progressão de doença na vigência do tratamento sistêmico de
primeira linha, este paciente pode receber outros tratamentos de segunda linha, se tiver
performance adequada para tal. Sunitinibe mostrou atividade nesta situação antes mesmo de ser
testado em primeira linha36. Sorafenibe mostrou ser uma opção de tratamento para pacientes com
câncer de células claras avançado num estudo randomizado como tratamento de segunda linha
contra placebo, após uso de citoquinas. Os resultados do estudo mostraram que, às custas de
toxicidades toleráveis, o grupo tratado com sorafenibe mostrou um ganho de sobrevida mediana
MANUAIS D E COND UTAS
| 199
livre de progressão [5,5 meses vs. 2,8 meses (HR para progressão de doença de 0,44; 95%IC 0,350,55; P<0,01) e uma tendência a ganho de sobrevida global (HR 0,72; 95%IC 0,54-0,94 P=0,02)37.
Para a atual padronização, o sorafenibe pode ser considerado em alguns pacientes como primeira
linha, uma vez que neste estudo cerca de 20% dos pacientes nunca haviam sido tratados com
alguma citoquina, também torna-se uma opção para pacientes que tenham contra-indicação ao
uso do sunitinibe. Pacientes que receberam algum tipo de inibidor de tirosino-quinase (suninitibe
ou sorafenibe) podem se beneficiar da outra medicação da mesma classe, uma vez que estudos
mostram que não há resistência cruzada, apesar dos estudos prospectivos mostrarem apenas
respostas modestas neste cenário. Pacientes que progridam após sunitinibe e/ou sorafenibe podem
ser tratados com everolimo, um inibidor oral de m-TOR e que mostrou, em estudo randomizado,
benefício de sobrevida livre de progressão frente a placebo em pacientes que já haviam recebido
1 ou mais linhas de tratamento anteriormente (4.0 versus 1.9 meses, HR para progressão 0.30 95%
IC 0.22-0.40, P<0.0001)38.
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Capítulo 10
Câncer de Reto
Editor: Dr. Paulo Marcelo Gehm Hoff
Autores: Dr. Paulo Marcelo Gehm Hoff, Dra. Anelisa Kruschewsky Coutinho, Dr. Fernando Arruda,
Dr. Benedito Rossi, Dr. Jorge Sabbaga, Dr. Roberto de Almeida Gil, Dr. Frederico Perego Costa,
Dr. Paulo Hermann, Dr. René Cláudio Gansl e Dr. Gabriel Prolla
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Capítulo 10
Câncer de Reto
10.1. Definição anatômica
O reto é a porção distal do intestino grosso, com uma extensão média de 15cm e delimitado
inferiormente pela linha pectínea. Este órgão está dividido em: reto baixo, médio e alto e apenas
o reto alto é peritonizado. A definição da distância da tumoração em relação a borda anal é essencial
para determinação do plano de tratamento clínico e cirúrgico e o método mais preciso para
estabelecer esta medida é a retossigmoidoscopia rígida.
Tabela 1 - Subdivisão do reto
Localização
Reto baixo
Reto médio
Reto Alto
Definição
Até 5cm da borda anal
Entre 5 e 10cm da borda anal
Entre 10 e 15cm da borda anal
10.2. Estadiamento
*Ver Capítulo Cólon.
10.3. Métodos diagnósticos para estadiamento
Tabela 2 - Exames recomendados para estadiamento
Exames laboratoriais : incluindo hemograma, função renal, hepática e LDH
Marcador tumoral : CEA
Colonoscopia/retossigmoidoscopia
Tomografia de abdome total ou ressonância nuclear magnética
Ressonância nuclear magnética da pelve ou ultrassonografia (USG) endorretal
Tomografia de tórax
O estadiamento preciso do câncer do reto é muito importante para definição de extensão da
doença em nível locorregional e à distância e com isso determinar o melhor tratamento. O exame
físico completo com toque retal é a primeira etapa desta avaliação. Se o método de endoscopia
baixa utilizado ao diagnóstico foi a retossigmoidoscopia, a complementação com colonoscopia
deve ser programada oportunamente, com a finalidade de avaliar toda extensão do intestino grosso
e afastar a presença de tumores sincrônicos. Tanto a USG endorretal quanto a RNM com técnica de
duplo contraste são eficazes e praticamente se equivalem no estadiamento, quando bem feitos,
com acurácia em torno de 80% para determinar o estádio T, e 60% para o estádio N, entretanto,
ressaltamos que ambos os métodos são insatisfatórios para reavaliação após tratamento
neoadjuvante. Em razão da drenagem venosa dos terços médio e inferior do reto, anatomicamente
para a veia cava, um dos principais sítios de metástases neste tumor é o pulmão. Por este motivo,
206 |
MA NUA IS D E CO ND UTAS
recomenda-se preferencialmente a tomografia do tórax para estadiamento ao invés do radiograma
torácico.
10.4. Prognóstico e sobrevida em 5 anos
De acordo com análise de quase 4.000 pacientes incluídos em estudos clínicos americanos, os
pacientes podem ser divididos em quatro grupos de risco1:
risco
- Baixo risco: T1-2 N0
- Risco intermediário: T1-2N1 e T3N0
- Risco moderadamente alto: T1-2N2, T3N1 e T4N0
- Alto risco: T3N2, T4N+
Sobrevida em 5anos
90%
65 a 73%
48 a 58%
30 a 36%
10.5. Tratamento
10.5.1. Tratamento cirúrgico primário
Estádios clínicos 0 e I (T1-2 N0)
O tratamento deve ser primariamente cirúrgico nos estádios iniciais 0 e I, e a qualidade da
técnica cirúrgica, como ressecção total de mesorreto é diretamente relacionada com o prognóstico2.
Tumores no reto médio e alto devem ser tratados com ressecção anterior baixa, com ressecção total
do mesorreto, e preservaçao da inervação autonômica pélvica, buscando margem proximal de 5 cm
e distal de 2 cm. Vale ressaltar que após tratamento neoadjuvante com radio e quimioterapia,
margens de até 1cm são aceitas, mesmo nas lesões mais infiltrativas. Esta também é a indicação de
tratamento cirúrgico padrão nos pacientes com tumores no reto baixo, entretanto, pode-se tentar
a preservação do esfíncter, com ressecção local transanal, considerando, porém, a impossibilidade
de avaliação dos linfonodos com a abordagem cirúrgica conservadora. A verificação de negatividade
das margens é importante. A incidência de recidiva local na abordagem local transanal é de cerca
de 15%.
Um estudo retrospectivo avaliou 2124 pacientes com tumores pT1-T2 tratados exclusivamente
com cirurgia convencional ou ressecção local, e com seguimento mediano de 8 anos, demonstrou
taxa de recorrência local de 14,3% para ressecção local e de 8,5% para ressecção convencional,
entretanto, com menor morbidade cirúrgica para ressecção local. Nos pacientes com T2N0 podese considerar radioterapia adjuvante após ressecção local. O USG endorretal pode ser útil na
detecção de recidivas assintomáticas não diagnosticadas por toque retal ou exames proctológicos.
A radioterapia neoadjuvante exclusiva em pacientes com tumor cT2 baixo pode aumentar a
ressecabilidade, com preservação de esfíncter em casos muito selecionados.
Não há indicação para tratamento adjuvante complementar nestes estádios.
10.5.2. Tratamento neoadjuvante primário
Estádios II e III (T3N0 ou T1-4N1-2)
O tratamento combinado, incluindo quimioterapia (QT), radioterapia (RT) e cirurgia está bem
estabelecido desde o consenso do NIH (National Institutes of Health) em 19903. A definição do
melhor momento para o tratamento combinado seja pré-operatório (neoadjuvante) ou pósoperatório (adjuvante) foi avaliada em alguns estudos. O estudo alemão CAO/ARO/AIO-94, com
823 pacientes T3-4 ou N+, avaliou a combinação de RT (50,4Gy) e 5-Fluorouracil (5FU) em infusão
MANUAIS D E COND UTAS
| 207
continua por cinco dias, na primeira e na quinta semana de RT, no pré-operatório ou no pósoperatório. Este estudo demonstrou redução da taxa de recidiva local de 13% para 6%,
estatisticamente significativa, aumento da possibilidade de preservação de esfíncter, além de
menor taxa de toxicidades grau 3 e 4 favorecendo o tratamento pré-operatório, embora sem
diferença de sobrevida entre os grupos4. Neste estudo, 18% dos pacientes eram T3N0. A nossa
posição é de favorecer também o tratamento neoadjuvante para pacientes cT3N0, uma vez que os
métodos clínicos de estadiamento pré-operatório têm relativa baixa acurácia e não há como
selecionar os pacientes potencialmente subtratados, uma vez que até cerca de 20% dos pacientes
com estádio cT3N0 terão linfonodo positivo na peça pós-operatoriamente após o tratamento
combinado.
Também o estudo MRC CR07 avaliou 1350 pacientes para tratamento com radioterapia préoperatória (com 5 frações de 5Gy) ou radioterapia pós-operatória combinada a 5FU em pacientes
com margem circunferencial positiva (<1mm). Este estudo demonstrou melhores índices de
recorrência local, sobrevida livre de progressão e sobrevida global em favor da neoadjuvância.
Um outro estudo conduzido pelo EORTC, randomizou 1011 pacientes T3qqN ou T4N0 em 4
braços: RT (45Gy) pré-operatória combinada ou não a 5-FU em bolus e LV por 5 dias, na primeira e
na quinta semana de RT, seguido pelo mesmo regime de quimioterapia por 4 ciclos no pósoperatório ou observação5. O tratamento combinado pré-operatório teve maior índice de redução
tumoral (p<0,001) e redução do estadiamento (p<0,001) quando comparado à radioterapia
exclusiva. O índices de ressecabilidade (95,4%) e preservação do esfíncter (50,5% vs 52,8%, p=0,47)
foram semelhantes nos dois braços, porém com maior toxicidade G3 no braço combinado. Não
houve diferença de sobrevida global nos 4 braços, independente da aplicação ou não de
quimioterapia combinada (p=0,43) ou adjuvante (p=0,50).
Estudos realizados na Suécia e na Holanda, utilizando tratamento radioterápico exclusivo préoperatório, com 5 frações de 5Gy, demonstraram melhor controle local e aumento de sobrevida,
em tumores de reto em estádios II e III, mesmo nos pacientes submetidos à ressecção total do
mesorreto em comparação com pacientes apenas operados6. Porém, a RT de curso curto (5 dias)
está associada a maior disfunção sexual, maior tempo para normalizar as funções do intestinais e
aparecimento de abcesso pré-sacral. Com relação ao tratamento neoadjuvante, a combinação de
RT e quimioterapia é superior à RT ou quimioterapia exclusivas para controle local. É recomendado
o início conjunto de QT e RT combinadas. O tratamento neoadjuvante com regime combinado de
QT com fluoropirimidina infusional associada a RT (Tabela 3) e seguido após oito a doze semanas
de ressecção anterior baixa com ressecção total de mesorreto com preservação da inervação
autonômica pélvica deve ser considerado padrão para os estádios clínicos II e III, particularmente
nos tumores localizados em reto baixo e reto médio. É, porém, discutível a indicação de radioterapia
em tumores de reto alto.
Em relação a quimioterapia, recentemente, alguns estudos de fase III, como o estudo alemão,
demonstraram a não inferioridade da capecitabina comparada ao 5FU infusional, quando
combinado à radioterapia7. Por outro lado, conforme resultados negativos dos estudos STAR 01 e
ACCORD 12/0405 – Prodige 2, a adição de oxaliplatina à quimiorradioterapia baseada em
fluoropirimidina não demonstrou benefício e não deve ser realizada 8,9. Também não é indicado
inclusão do irinotecano nos esquemas de neoadjuvância. A margem de ressecção distal ideal
deverá ser de pelo menos 2cm, sendo 1cm o mínimo aceitável, sempre tentando a preservação do
esfíncter anal, se possível. A indicação de ressecção cirúrgica após o tratamento combinado com
intenção curativa é fundamental. Em pacientes idosos, considerar redução de até 25% da dose de
5-FU durante o tratamento quimioterápico adjuvante.
Embora de impacto ainda incerto, o tratamento quimioterápico adjuvante (por 4 meses)
deve ser considerado após o tratamento combinado, seja com flouropirimidina isolada (5-FU ou
capecitabina) ou esquemas incluindo oxaliplatina como FOLFOX, este último, particularmente em
pacientes pN+ (ver esquemas em Cólon).
208 |
MA NUA IS D E CO ND UTAS
Tabela 3 - Esquemas de neoadjuvância em reto: Associações de radioterapia + quimioterapia
regimes
RT + 5FU IC
RT + Capecitabina
RT + 5FU bolus+ LV
Doses/Drogas/Periodicidade
RT (45Gy + boost de 5,4Gy) + 5FU 225mg/m² IV em IC
concomitante a RT por 5 semanas.
RT+ capecitabina 1650mg/m²/dia oral, dividido em 2
tomadas, D1-5 , por 5 semanas durante a RT.
RT + LV 20mg/m²/dia seguido de 5FU 350mg/m²/dia IV bolus
D1-5, nas semanas 1 e 5 da RT.
RT- radioterapia, 5FU: Fluorouracil, IV : intravenoso, IC: infusão continua, LV: Leucovorin.
Um aspecto fundamental no tratamento adequado do câncer de reto é a realização de cirurgia
com ressecção total do mesorreto, cujo índice de recidiva local é inferior ao da cirurgia convencional
(5 a 10% em estádio II). Os resultados dessa técnica, porém, são altamente dependentes da
experiência do cirurgião. Vale ressaltar que quando há plano de preservar o esfíncter anal, é
importante avaliar sua função durante o planejamento terapêutico, pois a aplicação de tratamento
combinado pode levar a uma deterioração significativa dessa função. A presença de invasão
linfovascular e CEA aumentados parecem ser fatores independentes para maior índice de recidiva
(p=0,006 e p=0,004, respectivamente). A resposta patológica completa, após o tratamento
combinado pré-operatório é o melhor fator prognóstico, com sobrevida estimada áté maior que
90% em 5anos neste grupo de pacientes. Após o tratamento neoadjuvante, pacientes com ypT02, apresentam maior sobrevida global e menor recidiva local, independente do estadiamento
clínico pré-tratamento, quando comparados a pacientes que não tiveram resposta evidente10.
10.5.3. Tratamento sistêmico paliativo
Estádio IV
O controle pélvico é muito importante e pode ser obtido através da ressecção cirúrgica
completa do tumor primário, em associação com RT e quimioterapia. Em pacientes com doença
metastática volumosa e com tumores localizados no reto baixo, em quem uma cirurgia implicaria
em amputação do reto, considerar tratamento exclusivo com RT combinada à quimioterapia. A
quimioterapia sistêmica é indicada conforme os princípios de tratamento paliativo (ver Capítulo
de Cólon – Estádio IV).
10.5.4. Tratamento da recidiva local
As recidivas locais devem ser agressivamente tratadas. As opções são ressecção cirúrgica
combinada à RT intra-operatória, quando possível, ou uso de quimioterapia neoadjuvante, seguida
de cirurgia. A RT pode ser combinada à neoadjuvância em pacientes que não receberam dose
máxima de RT pélvica anteriormente.
Cerca de 10% dos pacientes apresentam recidiva local do tumor de reto após tratamento
curativo inicial. Esse quadro, se não controlado, em geral evolui para uma situação clínica de difícil
manejo, associada a grande morbidade (dor, secreção fétida e infecção recorrente). O diagnóstico
precoce é importante. A biópsia guiada por USG endorretal, o PET-CT, a TC helicoidal e a RNM
podem auxiliar no diagnóstico dos casos suspeitos de recidiva local. Em pacientes selecionados, o
manejo cirúrgico pode proporcionar, além da melhora dos sintomas, possível aumento de
sobrevida. A sobrevida aos 5 anos é observada em 36% dos casos após recorrência local, desde
que seja feita a ressecção da doença recorrente. Já a RT, como tratamento exclusivo da recidiva
local, proporciona controle local e de sintomas apenas por período limitado10. Favorecemos
quimioterapia neoadjuvante no intuito de tentar melhorar o prognóstico do paciente.
MANUAIS D E COND UTAS
| 209
10.6. Seguimento
Ver Capítulo de Cólon, item Seguimento sugerido, com a adição de proctoscopia nas visitas de
rotina ao cirurgião e de TC de tórax nas avaliações de imagem.
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Capítulo 11
Câncer de Cólon
Editor: Dr. Paulo Marcelo Gehm Hoff
Autores: Dr. Paulo Marcelo Gehm Hoff, Dra. Anelisa Kruschewsky Coutinho, Dr. Gabriel Prolla, Dra.
Clarissa Maria de Cerqueira Mathias, Dr. René Cláudio Gansl, Dr. Roberto de Almeida Gil, Dr. Marcelo
Collaço Paulo, Dr. Frederico Perego Costa e Dr. Jorge Sabbaga
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Capítulo 11
Câncer de Cólon
11.1. Introdução
O câncer do cólon é o terceiro tumor maligno mais freqüente tanto no Brasil, como nos Estados
Unidos. Sintomas como alteração do ritmo intestinal, sangramento nas fezes, dor abdominal e perda
de peso devem chamar atenção para esta possibilidade diagnóstica, entretanto, a despeito da ocorrência
de sintomas, está recomendado a triagem na população assintomática a partir dos 50anos. O método
considerado padrão ouro para triagem é a colonoscopia, porém na indisponibilidade deste exame, podese compor com pesquisa de sangue oculto nas fezes, sigmoidoscopia, teste de DNA nas fezes e/ou enema
baritado. A ressecção de pólipos, potenciais lesões pré-malignas, é uma medida efetiva e o diagnóstico
precoce do câncer do cólon com emprego de adequado tratamento tem elevadas chances de cura.
11.2. Estadiamento
O estadiamento da neoplasia colônica é cirúrgico e ainda é a melhor maneira de estabelecer
o prognóstico individual de cada paciente. A classificação de Dukes atualmente em desuso foi
então substituída pelo estadiamento TNM. A modificação mais importante nos últimos anos foi o
entendimento que número de linfonodos analisados pelo patologista é um dos fatores prognósticos
mais importantes. Em pacientes com linfonodos negativos, um mínimo de 12 linfonodos deve ser reportado.
Tabela 1A - Estadiamento AJCC, 2010
TX
Tis
T1
T2
T3
T4a
T4b
N0
N1
N1a
N1b
N1c
Tumor não avaliável
Carcinoma in situ: intraepitelial ou com invasão de lâmina própria
Tumor infiltra a submucosa
Tumor infiltra a muscular própria
Tumor infiltra através da muscular própria até os tecidos pericolorretais
Tumor penetra a superfície do peritônio visceral
Tumor invade diretamente ou está aderido a outros órgãos ou estruturas
Sem envolvimento de linfonodos
Metástase em 1-3 linfonodos regionais
Metástase em 1 linfonodo regional
Metástase em 2 a 3 linfonodos regionais
Depósito de tumor na subserosa, mesentério ou tecidos pericólicos não peritonizados
ou perirretais, sem metástases linfonodais regionais
N2
Metástase em 4 ou mais linfonodos regionais
N2a Metástase em 4 a 6 linfonodos regionais
N2b Metástase em 7 ou mais linfonodos regionais
M0 Sem metástase à distância
M1 Metástase à distância
M1a Metástase confinada a 1 órgão ou sítio
M1b Metástase em mais de 1 órgão ou sítio ou peritônio
Obs: As sinalizações “V”e “L” devem ser usadas para identificar presença de invasão vascular ou linfática respectivamente e
“PN” para invasão perineural.
214 |
MA NUA IS D E CO ND UTAS
Tabela 1B - Correlação estádio e sobrevida de acordo com dados do SEEr
Estádio
I
IIA
IIB
IIC
IIIA
IIIB
IIIC
IVA
IVB
TNM
T1–2, N0, M0
T3, N0, M0
T4a, N0, M0
T4b, N0, M0
T1–2, N1, M0 ou T1,N2a,M0
T3–4a, N1, M0 ou T2-3, N2a, M0 ou T1-2, N2b, M0
T4a, N2a, M0 ou T3-4a, N2b, M0 ou T4b, N1-2, M0
T1–4, N0-2, M1a
T1-4, N0-2, M1b
Sobrevida 5 anos (%)
>95%
85%
79%
58%
87 a 68%
68 a 60%
34 a 19%
11.3. Como Estadiar
O estadiamento básico deve ser feito com toque retal, colonoscopia, tomografia computadorizada
preferencialmente ou radiograma de tórax, tomografia computadorizada preferencialmente ou
ultrassonografia de abdome total e pelve, função hepática, DHL e CEA. O uso do PET-CT no estadiamento
pré-operatório é controverso, e não está recomendado de rotina. No entanto, esse exame pode
ser útil em pacientes com metástases hepáticas potencialmente ressecáveis para avaliação da
presença ou não de doença extra-hepática. Outros exames de imagem, como mapeamento ósseo
e ressonância nuclear magnética, devem ser realizados apenas quando clinicamente indicados.
Nos pacientes operados em caráter de urgência ou com lesões suboclusivas é importante a realização
de colonoscopia completa posteriormente, para afastar a presença de tumores sincrônicos ou de pólipos.
11.4. Tratamento
Estádios 0 e I
Pacientes com apresentação inicial em estádios muito precoces devem ser tratados com
ressecção cirúrgica exclusiva, já que a curabilidade desses pacientes é da ordem de 90% . Não há
indicação de tratamento adjuvante nestes casos, independente do tumor apresentar ou não
características de agressividade.
Estádio II
Estes pacientes devem ser tratados com ressecção cirúrgica, incluindo retirada em bloco de
linfonodos até a origem do vaso que nutre o tumor. A necessidade ou não de tratamento adicional
para pacientes com doença em estádio II é determinada conforme o risco do paciente, se alto ou
baixo. São considerados pacientes de alto risco aqueles com pelo menos um dos fatores listados
abaixo (Tabela 2). Pacientes de baixo risco não apresentam nenhum dos fatores de risco.
Tabela 2 - Fatores de alto risco para pacientes estádio II de câncer do cólon
T4
Obstrução intestinal
Perfuração intestinal
Tumores pouco diferenciados ou de alto grau / Tumores indiferenciados
Invasão angiovascular ou perineural
Menos de 12 linfonodos avaliados na amostra
MANUAIS D E COND UTAS
| 215
A ausência de um grande estudo prospectivo faz com que o benefício do tratamento
adjuvante nos pacientes em estádio II seja altamente controverso. Há conclusões conflitantes na
metanálises de Gill, que analisou um pool de 3.302 pacientes estádio II e III incluidos em sete
estudos randomizados e mostrou beneficio do tratamento adjuvante em todos os subgrupos de
pacientes,1 do National Surgical Adjuvant Breast and Bowel Project (NSABP) C01 a C042 que comparou
dados de quatro estudos e concluiu por beneficio do tratamento adjuvante em pacientes estádio
II, e do IMPACT B23 que analisou 1.016 pacientes incluidos em cinco estudos randomizados e não
identificou beneficio significativo para justificar adjuvância neste grupo de pacientes. Além disso,
a atualização de uma metanálise com 37 estudos avaliando um total de 20.317 pacientes, sendo
4.187 pacientes com estádio II, mostrou redução relativa do risco de morte de 14% com 5-FU/LV
sistêmico em pacientes em estádio II, entretanto, não estatisticamente significante.4 O estudo
QUASAR, maior estudo randomizado de quimioterapia adjuvante baseada em 5-FU que incluiu
2.963 pacientes estádio II, após um seguimento mediano de 5,5 anos, mostrou uma redução
relativa do risco de recorrência de 22% (p=0,001), e de 18% do risco de morte (p= 0,008 ) para o
grupo que recebeu tratamento. Em termos absolutos, houve ganho de sobrevida de 3,6% no grupo
tratado com quimioterapia adjuvante. 5
Uma outra variável a ser considerada em pacientes estádio II é o status de proficiência ou
deficiência de mismatch repair (MMR). Pacientes com deficiência de MMR, ou seja, portadores de
instabilidade de microssatélite de alta frequência (MSI-H), têm melhor prognóstico. Uma metaanálise com mais de 7.642 pacientes mostrou que a presença de MSI resultava em uma redução do
risco de mortalidade de 35%.6 Uma análise que incluiu cinco estudos randomizados e 457
pacientes, avaliou status de MMR e tratamento adjuvante. Os resultados mostraram redução de
sobrevida quando pacientes estádio II, com deficiência de MMR, receberam tratamento adjuvante
com 5-FU como droga isolada.7 Portanto, deve-se evitar tratamento adjuvante com monoterapia
baseada em fluoropirimidina neste grupo de pacientes.
Nos pacientes de alto risco e com estabilidade de microssatélites, MSS ou MSI-L, a decisão de
tratamento com monoterapia ou esquemas baseados em oxaliplatina deve ser individualizada,
considerando principalmente idade e comorbidades.
Há grande número de regimes aceitáveis na adjuvância em estádio II. Os regimes combinados
com oxaliplatina, semelhantes aos usados em estádio III, demonstraram benefício de mais de 7%
em sobrevida livre de doença para o subgrupo estádio II de alto risco, mas este beneficio aparentemente
não se converteu em ganho de sobrevida em 6 anos.8 Recentemente foi apresentado uma análise
do NSABP incluindo 2.009 pacientes estádio II tratados com 5-FU/LV e 991 pacientes tratados com
5-FU/LV/Oxaliplatina. Para SG, o HR de 0,95 (95%IC 0,75-1,21; P= 0,67) e para SLD, o HR de 0,86
(95% IC 0,71-1,04; P= 0,11), com benefício absoluto em SLD de 3-5% e em SG de 2-3% para adição
da oxaliplatina, o que provavelmente não justifica os potenciais efeitos adversos da droga.9 O uso
de monoterapia é a opção mais aceitável no estádio II em geral, e nossa opinião é de que o uso da
oxaliplatina não se justifica nestes pacientes, com a possível exceção dos pacientes com menos de
12 linfonodos avaliados. Nos pacientes com estádio II em que se optar por tratamento com
monoterapia, considera-se os regimes que incluem leucovorin e fluorouracil, ou os regimes com
fluoropirimidinas orais (Tabela 3). Entre todos os regimes apresentados, ressaltamos que o regime
da Clinica Mayo é o menos recomendado, por sua toxicidade muito importante.
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MA NUA IS D E CO ND UTAS
Tabela 3 - regimes de monoterapia baseados em Fluoropirimidinas
regimes
Clinica Mayo
Roswell Park
LV5FU2
X-ACT
modificado
C-06
QUASAR
Drogas, doses, periodicidade
LV 20mg/m² IV seguido de 5FU 425mg/m² IV
D1-5 cada 4semanas
LV 500mg/m² IV em 2h seguido de 5FU 500mg/m² IV em 1h,
semanal por 6 semanas a cada 8 semanas
dl- ou l-LV (200 ou 100mg/m² respectivamente) IV em 2h
seguido de 5FU 400mg/m² IV bolus e 600mg/m² IV em 22h
IC, a cada duas semanas
Capecitabina 1.000mg/m² , duas vezes ao dia, via oral, D1-14,
a cada 21 dias
UFT300mg/m² /dia , dividido em 3 doses, via oral + LV
90mg/dia, via oral , por 4 semanas a cada 5 semanas
5-FU: 370mg/m² IV semanal x 4, por 6 meses + L-LV: 25mg .
referências
Ref 10
Ref 11
Ref 12
Ref 13
Ref 14
Ref 5
LV- Leucovorin, 5-FU – Fluorouracil, IV – Intravenoso, IC – Infusão continua, UFT –uracil e tegafur, QUASAR – quick and simple
and reliable.
Relato do Royal Marsden Hospital avaliando tratamento adjuvante para 801 pacientes em
Estádio II e III tratados com 5-FU/LV em bolus (regime da Mayo Clinic) por 6 meses versus 5-FU
administrado por infusão contínua na dose de 300 mg/m2/dia por 3 meses, observou benefício
semelhante quanto à sobrevida livre de recidiva e à sobrevida global. Neste estudo, o tratamento
com 5-FU IC por 3 meses foi associado a melhor padrão de toxicidade, exceto pela síndrome mãopé.15 As Fluoropirimidinas orais passaram a ser uma opção ao uso de 5FU/LV. Os resultados do
estudo X-ACT com 1.987 pacientes em estádio III, randomizados entre capecitabina e 5-FU/LV
(regime da Clinica Mayo), ambos por 24 semanas. Com 3,8 anos de seguimento mediano, observouse uma forte tendência de melhor SLD e SG (p < 0,001 e p=0,07, respectivamente) e menor taxa
de recorrência em favor da capecitabina (p=0,04).13 O estudo do National Surgical Adjuvant Breast
and Bowel Project Protocol C-06 com 1608 pacientes com estádio II e III randomizados entre UFT e
5-FU/LV (regime do Roswell Park) demonstrou após 62,3 meses de seguimento mediano benefício
semelhante em sobrevida livre de progressão e sobrevida global.14 Considerando-se as vantagens
de uma droga oral, sempre que indicado monoterapia, favoreceremos o uso da capecitabina no
tratamento adjuvante dos pacientes estádio II, desde que a função renal esteja em niveis razoáveis,
particularmente em pacientes idosos.
Estádio III
Embora apresentem risco considerável de recorrência, estes pacientes são tratados com
intuito de cura, e a ressecção cirúrgica é fundamental, com retirada em bloco dos linfonodos, seguida
de quimioterapia adjuvante por seis meses. O estudo MOSAIC com 2.246 pacientes comparou
FOLFOX4 com 5-FU infusional em 44horas + LV na adjuvância, tanto em pacientes em estádio II
como III.16 Com um seguimento mediano de 4 anos, observou-se uma redução relativa do risco de
recorrência de 20% em pacientes em estádio II, e de 25% em pacientes em estádio III. Em termos
absolutos, houve um aumento no intervalo livre de doença de 3,8% em pacientes em estádio II, e
de 8,7% em pacientes em estádio III. Após 6 anos, há um claro benefício em relação a sobrevida
global para os pacientes com estádio III tratados com FOLFOX, mas não para os pacientes com
estádio II. Embora o estudo MOSAIC tenha usado o FOLFOX4, recomendamos a utilização do
mFOLFOX6. Tanto os grupos americanos, como os grupos europeus concordam que o uso do
mFOLFOX6 é o novo esquema padrão, pois apresenta melhor intensidade de dose do 5-FU, com
menor toxicidade do que o FOLFOX4, embora este ainda seja aceitável. O estudo NSABP C-07 com
MANUAIS D E COND UTAS
| 217
2.407 pacientes incluidos, em estádio II (28,8%) e III (71,2%), confirmou os resultados do estudo
MOSAIC. Nesse estudo, além da dose de oxaliplatina corresponder a 75% da dose total acumulada
no estudo MOSAIC, usou-se um regime com 5-FU em bolus, FLOX. Com seguimento mediano de
42,5 meses, a sobrevida livre de doença em 4 anos foi de 73,2% para o FLOX, e de 67% para o 5FU/LV, estatisticamente significante.17 A atualização mais recente deste estudo demonstrou
manutenção do benefício da adição da oxaliplatina, com redução de 14,7% no risco de morte no
grupo FLOX. 18
Há inequívoco ganho de sobrevida com uso dos regimes baseados em oxaliplatina em estádio
III, e regimes monoterápicos devem ser utilizados apenas em situações especiais.
A combinação de oxaliplatina com capecitabina também foi testada na adjuvância. O estudo
XELOXA N016968, com 1886 pacientes estádio III, randomizados para bolus 5-FU/LV (esquemas da
Clínica Mayo ou Roswell Park Memorial Institute) versus XELOX (capecitabina + oxaliplatina)
demonstrou SLD em 3 anos de 70,9% no grupo XELOX versus 66,5% no grupo que recebeu
fluoropirimidina isolada, com HR de 0,80 (p=0,0045).19 Este regime foi considerado seguro, com
toxicidade manejável e passou a ser uma opção adicional na adjuvância.
Tabela 4 - Esquemas combinados para adjuvância em câncer de cólon
regimes
mFOLFOX 6
FOLFOX 4
XELOX
FLOX
Drogas, doses, periodicidade
Oxaliplatina 85mg/m2 IV em 2 horas D1, l-leucovorin
200mg/m2 IV no D1 (conjuntamente com a oxaliplatina), e 5FU 400mg/m2 IV bolus no D1 , seguido de 5-FU 2.400mg/m2
IV em infusão contínua por 46 horas , a cada 2 semanas, por
12 ciclos
Oxaliplatina 85mg/m2 IV em 2 horas D1, leucovorin
200mg/m2/dia IV no D1 e D2, e 5-FU 400mg/m2/dia IV bolus,
seguido de 5-FU 600mg/m2/dia IV em infusão contínua por
22 horas nos D1 e D2, a cada 2 semanas, por 12 ciclos
Oxaliplatina 130mg/m2 IV D1 + Capecitabina 2g/m2/dia oral
D1-14 a cada 3 semanas por 8 ciclos
Oxaliplatina 85mg/m2 nas semanas 1, 3 e 5 a cada 8 semanas,
combinada com 5-FU 500mg/m2 e leucovorin, 500 mg/m2 IV
em bolus, semanalmente, por 6 semanas, a cada 8 semanas,
por 3 ciclos.
referências
Ref 20
Ref 16
Ref 19
Ref 18
Vale ressaltar a possibilidade de reações alérgicas com uso de oxaliplatina. Nestes casos, podese optar por manutenção apenas do 5-Fluorouracil associado ao leucovorin apenas, até completar
os 6 meses recomendados de adjuvância.
Três estudos de fase III, avaliando irinotecano, 5-FU e leucovorin não mostraram benefício com
a adição do irinotecano, nem em relação a aumento de sobrevida, nem em relação a aumento da
sobrevida livre de progressão. Dessa forma, irinotecano combinado a 5-FU não deve ser considerado
como tratamento adjuvante.21, 22, 23 Também outros estudos como NSABP C08 24,25, AVANT 26 e C 0147 27,
que avaliaram a adição de anticorpos monoclonais, seja bevacizumabe ou cetuximabe a quimioterapia
adjuvante, não mostraram benefício nesta estratégia. A radioterapia adjuvante em tumores T4,
completamente ressecados, com intuito de melhorar o controle local, é controversa e não
recomendada rotineiramente.
O tratamento adjuvante em pacientes idosos também é um tópico controverso. Uma análise
de 7 estudos incluindo um total de 3.351 pacientes estádio II ou III, demonstrou benefício em SG e
SLR para os pacientes idosos ( > 70 anos) que receberam tratamento com Fluorouracil.28 Entretanto,
a análise do subgrupo de idosos no estudo MOSAIC não demonstrou benefício com adição da
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MA NUA IS D E CO ND UTAS
oxaliplatina29, o mesmo foi observado no ACCENT. 30 Contrariando estes resultados, a análise do
subgrupo de idosos no estudo N0 16968 mostrou benefício da incorporação da oxaliplatina no
tratamento adjuvante de pacientes maiores de 70 anos31. Portanto, recomedamos muita cautela na
indicação de adjuvância com regimes baseados em oxaliplatina em pacientes com idade superior
a 70 anos e preferencialmente favorecemos monoterapia.
Estádio IV
Pacientes com doença irressecável ou metastática devem usualmente ter o diagnóstico
confirmado por biópsia e receber tratamento com quimioterapia sistêmica. A unanimidade de
opiniões acaba aqui, já que há uma grande variedade de regimes com atividade nesta doença e as
diferenças entre os mesmos são relativamente modestas. Trataremos da adição de anticorpos
monoclonais mais a frente, discutindo inicialmente apenas os regimes quimioterápicos. As opções
mais utilizadas incluem mFOLFOX6 ou FOLFIRI.
Tabela 5 - regimes de quimioterapia preferenciais
mFOLFOX 6
FOLFIRI
XELOX
O 85mg/m2 EV em 2 horas no D1, LV 400mg/m2 EV em 2 horas (junto com a
oxaliplatina no D1), e 5-FU 400mg/m2 EV bolus (logo após LV), seguido de 5-FU
2.400mg/m2 EV em IC por 46 horas no D1 a cada 2 semanas
I 180mg/m2 EV em 90 min, seguido de LV 400mg/m2 EV em 2 horas ( junto com
irinotecano), seguido por 5-FU 400mg/m2 EV bolus, e então 5-FU 2.400mg/m2 EV
em IC por 46 horas a cada 2 semanas
X 1700mg/m2/dia, divididos em 2 tomadas a cada 12 horas, por 14 dias e O
130mg/m2 EV no D1 repetidos a cada 3 semanas
O: oxaliplatina, LV: leucovorin, 5-FU: fluorouracil, IC: infusão contínua, I: irinotecano, X: capecitabina
Tabela 6 - regimes quimioterápicos alternativos
I 100mg/m2 EV em 90 min, seguido de LV 20mg/m2 EV bolus e 5-FU 500mg/m2
EV bolus, semanalmente por 4 semanas, a cada 6 semanas
I 125mg/m2 EV em 90 min, seguido de LV 20mg/m2 EV bolus e 5-FU 500mg/m2
EV bolus, semanalmente por 2 semanas, a cada 3 semanas
O 85mg/m2 EV em 2 horas no D1e D15, e 5-FU 500mg/m2 EV em bolus e LV
20mg/m2 EV em bolus no D1, D8 e D15, a cada 4 semanas
FLOX Nórdico O 85mg/m2 EV D1, 5-FU 500mg/m2 EV em bolus + LV 60mg/m2 D1 e D2 a cada
2 semanas
IFL dose
reduzida
IFL
modificado
bFOL
O: oxaliplatina, LV: leucovorin, 5-FU: fluorouracil, EV: endovenoso, IC: infusão contínua, I: irinotecano
O estudo N9741, avaliando três diferentes combinações quimioterápicas, FOLFOX4, IFL e IROX
(oxaliplatina e irinotecano), com cerca de 265 pacientes por braço, demonstrou aumento de
resposta para FOLFOX4 (45% versus 31% versus 35%, respectivamente) e também aumento do
tempo livre de progressão comparado com IFL ou IROX (8,7 versus 6,9 versus 6,5 meses, p=0,0014
e p=0,001, respectivamente). Quanto à sobrevida, o FOLFOX4 foi significativamente superior ao
IFL (19,5 versus 15 meses, p=0,0001), mas não em relação ao IROX (19,5 versus 17 meses, p>0,05).32
Entretanto, houve um desequilíbrio quanto ao tratamento de resgate no estudo. Apenas 24% dos
pacientes que progrediram com irinotecano receberam oxaliplatina, enquanto 60% dos pacientes
que progrediram com oxaliplatina receberam irinotecano. O grupo GERCOR reportou os resultados
de em estudo de fase III que comparou FOLFIRI versus FOLFOX6 como tratamento de primeira linha,
seguido de cruzamento após progressão. Os regimes mostraram eficácia semelhante em termos
MANUAIS D E COND UTAS
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de resposta (57 versus 56%), sobrevida livre de progressão (8,5 versus 8 meses) e sobrevida global
(21,5 versus 20,6 meses). 20 No caso de precisar usar 5-FU em bolus, são opções os regimes como
FLOX, FLOX Nórdico, bFOL, IFL com dose reduzida , ou IFL modificado. Entretanto, deve-se favorecer
regimes com 5-FU infusional ou fluoropirimidina oral sempre que possível. A suspensão da
oxaliplatina (mantendo-se 5-FU e LV) após 6 ciclos pode ser feita para redução da toxicidade, é
segura e confere os mesmos índices de sobrevida que o tratamento continuado33.
A grande novidade no tratamento de tumores originados no cólon e reto foi o desenvolvimento dos anticorpos monoclonais, embora seja importante a ressalva de que nem todos os
pacientes se beneficiem de tratamento com estes anticorpos. A combinação de bevacizumabe
(anticorpo monoclonal anti-VEGF) com IFL em pacientes sem tratamento anterior demonstrou, em
estudo randomizado com 813 pacientes, um aumento significativo em resposta objetiva (45 versus
35%, p=0,004), tempo livre de progressão (10,6 versus 6,24 meses, p<0,001), e sobrevida global
(20,3 versus 15,6 meses, p<0,001) quando comparada a IFL associado a placebo.34 Dentre os efeitos
adversos mais observados relacionados ao bevacizumabe estão hipertensão arterial, sangramentos
e atraso na cicatrização. Considerando a meia vida da droga, recomenda-se interrupção da mesma
seis semanas antes de procedimentos cirúrgicos de grande porte. Embora rara, a perfuração
gastrintestinal também foi bem documentada. Ademais, bevacizumabe aumenta a incidência de
eventos tromboembólicos arteriais quando combinado à quimioterapia de primeira linha, mas
aparentemente não aumenta a de eventos tromboembólicos venosos. No caso de um evento
tromboembólico venoso, a adição de anticoagulação plena concomitante ao uso de bevacizumabe
não aumenta o risco de sangramento. Devido à maior toxicidade observada no regime IFL,
comparado aos regimes que usam 5-FU infusional, recomendamos a substituição do IFL por FOLFIRI
em associação ao bevacizumabe. O estudo BICC-C iniciado com três braços de quimioterapia sofreu
uma emenda que incluiu 117 pacientes randomizados para FOLFIRI ou IFL e adição de bevacizumabe
em ambos os braços. Apesar de pequena amostragem na etapa com anti-VEGF, houve beneficio em
SG favorecendo o braço com Folfiri + bevacizumabe, 28 versus 19 meses (p=0,037)35. A combinação
de bevacizumabe com FOLFOX em primeira linha foi avaliada no estudo NO 16966, comparada
com FOLFOX e placebo, e observado melhora na sobrevida livre de progressão. Entretanto, não
houve impacto significativo na taxa de resposta (47 versus 49%) ou sobrevida global (21,3 versus
19,9 meses e p=0,077) com esta combinação.36 Baseado no estudo MAX, que mostrou aumento da
SLP para a combinação capecitabina e bevacizumabe quando comparada com capecitabina
isolada, de 8,5 versus 5,7meses, HR 0,63 (p< 0,001), esta é mais uma opção de uso combinado do
anticorpo anti-VEGF, com boa tolerabilidade.37 Um segundo anticorpo monoclonal, cetuximabe,
direcionado contra o receptor para o fator de crescimento epitelial (EGFR) teve sua utilização em
primeira linha avaliada no estudo CRYSTAL, um fase III randomizado com mais de 1200 pacientes
tratados com FOLFIRI com ou sem cetuximabe 38. Nos pacientes com KRAS selvagem houve um
aumento de 17% na taxa de resposta para o grupo recebendo o anticorpo, assim como aumento
estatisticamente significativo em sobrevida global de 20,0 para 23,5 meses e aumento na sobrevida
livre de progressão, que passou de 8,4 para 9,9 meses.39 O cetuximabe também foi testado em
combinação com esquemas baseados em oxaliplatina. O estudo fase II randomizado OPUS avaliou
337 pacientes e demonstrou aumento em taxa de resposta de 37% para 61% (p=0,011)
favorecendo o grupo que usou o anticorpo.40 Em contrapartida, os estudos COIN41,42 e NORDIC VII43
não demonstraram benefício em sobrevida global ou sobrevida livre de progressão com a adição
do cetuximabe a esquemas com oxaliplatina. O aumento da toxicidade e ausência de benefício do
Xelox combinado ao cetuximabe no COIN desestimula esta combinação. Um outro anticorpo anti
EGFR, o panitumumabe também foi testado em primeira linha combinado ao esquema Folfox4 no
estudo PRIME com 1183 pacientes. Houve benefício em SLP nos pacientes KRAS selvagem de 8,0
versus 9,6 meses, favorecendo o grupo que recebeu o anticorpo. 44 Vale relembrar que à luz dos
conhecimentos atuais, somente está recomendado o uso dos anticorpos anti-EGFR para os
220 |
MA NUA IS D E CO ND UTAS
pacientes com KRAS selvagem sendo este teste indispensável antes desta decisão terapêutica.
Com base em resultados desfavoráveis dos estudos CAIRO 2 que combinava bevacizumabe e
CETUXIMABE A CAPOX45 e o estudo PACCE que combinava bevacizumabe e panitumumabe a
Folfox ou Folfiri 46, não recomendamos o uso conjunto de ambos os anticorpos.
11.4.1. regimes quimioterápicos de resgate
A sobrevida dos pacientes com câncer de colon está relacionada a sua exposição aos agentes
com atividade comprovada, independentemente da sequência utilizada. Portanto, o tratamento de
resgate depende do regime utilizado em primeira linha, e pacientes anteriormente tratados com
oxaliplatina e 5-FU devem ser tratados com regimes baseados em irinotecano e vice-versa. O
mesmo se aplica para os anticorpos monoclonais, quando foi utilizado bevacizumabe em primeira
linha, o cetuximabe pode ser utilizado em segunda ou terceira linha na dependência apenas de
ausência de mutação do KRAS, assim como na situação de cetuximabe ter sido escolhido na
primeira linha, o bevacizumabe pode ser adicionado ao esquema quimioterápico em segunda
linha.
Um estudo randomizado de fase III, E3200, com 880 pacientes anteriormente tratados com
quimioterapia baseada em irinotecano e 5-FU, comparou como tratamento de segunda linha, o
esquema FOLFOX + bevacizumabe (10mg/kg) versus FOLFOX versus bevacizumabe isolado. Esse
estudo mostrou um aumento significativo em favor da combinação quanto a resposta objetiva
(22,7 vs 8,6%), tempo livre de progressão (7,3 vs 4,7 meses) e sobrevida global (12,9 vs 10,8 meses)
(p= 0,0011)47. Entretanto, o terceiro braço com bevacizumabe isolado, obteve taxa de resposta de
apenas 3,3%, portanto desfavorecendo o uso desta droga isoladamente. O estudo BOND que
avaliou o uso de cetuximabe (anticorpo contra EGFR) somente ou em combinação com irinotecano,
demonstrou aumento significativo do tempo livre de progressão (HR 0,54, p<0,001) , mas sem
impacto na sobrevida global.49 O estudo EPIC de fase III randomizado com 800 pacientes avaliando
irinotecano +/- cetuximabe demonstrou que o tratamento é seguro em segunda linha e aumenta
a taxa resposta e sobrevida livre de progressão, mas não altera a sobrevida global48 .
11.5. Situações Especiais
11.5.1. Peculiaridades e observações em relação às drogas
A dose de oxaliplatina de 85mg/m2 apresentou os mesmos resultados que 130mg/m2, porém
com menos neurotoxicidade. Oxaliplatina e bevacizumabe nunca devem ser usados como agentes
únicos, pois não apresentam atividade substancial isoladamente. A dose do bevacizumabe é de
5mg/kg IV em 10 minutos de infusão, quinzenalmente. O cetuximabe pode ser administrado
semanalmente com 400mg/m2 EV em 120 min (dose de ataque na primeira semana) seguido por
250mg/m2 EV em 60 min, nas semanas subsequentes ou a cada quinze dias na dose de 500mg/m2,
associado a regime de quimioterapia ou até isoladamente na dependência do performance status
do paciente. A combinação de oxaliplatina e 5-FU deve ser considerada como primeira linha nos
pacientes com icterícia, já que o irinotecano deve ser evitado neste grupo de pacientes. A oxaliplatina
pode ser utilizada sem redução de dose em pacientes com insuficiência renal (clearence de creatinina
> 20 mL/min) e hepática. O esquema IFL é bastante tóxico e, sempre que possível, deve ser
substituído pelo regime FOLFIRI. Considerar pré-medicação com atropina, 0,5mg EV ou SC, antes do
irinotecano, para minimizar a incidência de diarreia aguda durante sua infusão (devido ao efeito
colinérgico do citostático). A capecitabina, fluoropirimidina oral, que apresenta fase metabólica
hepática de ativação, também pode ser usada em pacientes com insuficiência hepática moderada. A
associação de oxaliplatina e raltitrexed apresentou baixos índices de resposta objetiva em primeira e
segunda linhas (26 e 7%, respectivamente), devendo ser considerado apenas em situações especiais.
MANUAIS D E COND UTAS
| 221
Não é necessária a pesquisa de hiperexpressão do EGFR na célula tumoral para o uso do
cetuximabe, pois não há relação deste estudo com resposta ao tratamento. Entretanto é
mandatório a pesquisa de KRAS antes do uso dos anticorpos anti-EGFR. Em pacientes recebendo
cetuximabe, recomendamos monitorar o nível sérico de magnésio, pois em aproximadamente 17%
dos pacientes pode haver hipomagnesemia severa.
11.5.2. Toxicidade dermatológica relacionada aos anti-EGFr
Toxicidade dermatológica para os anticorpos anti EGFR ocorre em cerca de 80% dos pacientes
tratados. Seu aparecimento se dá entre a semana 1 a 3 de tratamento, sendo o melhor indicador
preditivo de benefício clínico. A presença de reação intensa na pele eleva significativamente os
índices de resposta objetiva (6,3 para 33,6%), tempo livre de progressão (3,0 para 10,8 meses) e
sobrevida global (4,1 para 14,9 meses) quando comparada à ausência de reação (p=0,0001).
Pacientes que apresentam reação acneiforme severa ao cetuximabe devem interromper seu
uso por 1 a 2 semanas, até melhora do quadro. Caso o quadro se repita com a reintrodução da
droga, considerar redução de dose em 20% após nova suspensão do tratamento. O uso tópico de
gel de clindamicina 1% 2x/dia e vibramicina 100mg VO 2x/dia por 7 dias, seguido de vibramicina
20 mg VO 2x/dia, em uso contínuo, parece ter benefício no controle dos sintomas.
11.5.3. Interação medicamentosa com warfarina
As fluoropirimidinas, particularmente capecitabina, interferem com o metabolismo da warfarina.
Se possível, pacientes necessitando anticoagulação deveriam ser tratados com heparina de baixo
peso molecular. Se o uso de warfarina for essencial, o tempo de protrombina deve ser seguido
muito de perto.
11.5.4. Deficiência de Di-hidropirimidina Desidrogenase (DPD)
Pacientes que apresentam toxicidade inusitada com uso de 5-FU ou outras fluoropirimidinas
podem ter deficiência de DPD, uma enzima essencial para a metabolização do 5-FU. A toxicidade
observada usualmente inclui alopecia, pneumonite, mucosite, neutropenia e diarréia. Esses
pacientes NÃO poderão ser retratados com 5-FU ou capecitabina, devido ao risco de letalidade. A
incidência global na população caucasiana é de aproximadamente 1 a 2%. Para esses pacientes, a
melhor opção seria o uso de raltitrexede, um inibidor direto da timidilato sintetase não metabolizado
pela DPD. Sua toxicidade é semelhante à do 5-FU, mas seu metabolismo não é influenciado pela
DPD. Não deve ser utilizado em pacientes com depuração de creatinina inferior a 60 ml/min, devido
aos riscos de toxicidade (até letalidade). O raltitrexede pode ser usado em combinação com a
oxaliplatina e o irinotecano.
11.5.5. Metástases hepáticas exclusivas
Pacientes com metastases hepáticas exclusivas apresentam doença potencialmente curável,
desde que sejam ou se tornem tecnicamente operáveis 50. A recomendação atual inclui o uso de
tratamento quimioterápico perioperatório, com discordância quanto a neoadjuvância ou
adjuvância. Em geral, pacientes com doença localizada, de pequeno volume, e com longo intervalo
entre a doença inicial e a recorrência são recomendados diretamente para cirurgia, com tratamento
adjuvante subsequente. Pacientes com doença sincrônica, ou rapidamente progressiva, podem se
beneficiar de quimioterapia neo-adjuvante por 2 a 3 meses, seguida de ressecção das metástases
hepáticas, seguida de quimioterapia sistêmica, completando um total de 6 meses, mesmo quando
as metástases são ressecáveis. Até o momento, apenas um estudo fase III avaliou tratamento
perioperatório em pacientes com metástases ressecáveis com intenção neoadjuvante. Este estudo
foi o EORTC 40983 que incluiu 364 pacientes com metastases hepáticas, randomizados para cirurgia
primária ou 6 ciclos de FOLFOX pré-operatório e 6 ciclos de FOLFOX pós-operatório. O estudo
222 |
MA NUA IS D E CO ND UTAS
demonstrou ganho em SLP em 3anos de 42,4% versus 33,2% no grupo submetido a tratamento
peri-operatório, favorecendo esta opção. 51
O uso de quimioterapia também é particularmente indicado em pacientes com metástases
hepáticas cujos tumores foram considerados irressecáveis. Quando se adota a estratégia de
quimioterapia pré-operatória, deve-se evitar tratamento até máxima resposta, para não dificultar
a identificação das áreas acometidas durante a cirurgia, além de evitar a hepatotoxicidade por
excesso de quimioterápicos. O uso de um regime com quatro drogas (FOLFOXIRI), contendo
oxaliplatina, 5-FU, irinotecano e leucovorin, em pacientes com doença metastática sem
quimioterapia anterior, mostrou altas taxas de respostas, da ordem de 60 a 70% e proporcionou
ressecção completa (R0) de metástases hepáticas anteriormente irressecáveis em até 36% dos
pacientes avaliáveis, entretanto, deve ser reservado para casos selecionados onde a expectativa
de conversão cirúrgica for o maior objetivo.52 A adição dos anticorpos monoclonais aos esquemas
de quimioterapia pré-operatoriamente também tem demonstrado benefício em aumento das
taxas de resposta, particularmente com o cetuximabe, aumento das taxas de ressecção assim como
das cirurgias R0. Vale ressaltar que quando o anticorpo utilizado tiver sido o bevacizumabe,
recomenda-se a suspensão desta droga 6 semanas antes da intervenção cirúrgica, para evitar
possíveis complicações de sangramento e atraso na cicatrização.
11.5.6. Metástases pulmonares exclusivas
Metástases exclusivamente pulmonares são usualmente associadas a tumores originados na
região do reto, e sua ressecção está associada a índices de cura da ordem de 20% a 40%. Devem
ser tratadas com o mesmo algoritmo utilizado para metástases hepáticas exclusivas, incluindo
ressecção e tratamento quimioterápico sistêmico neo-adjuvante ou adjuvante (ver Metástases
hepáticas exclusivas).
11.5.7. Metástases hepáticas e pulmonares
Até recentemente a presença de metástases em dois orgãos diferentes era considerada uma
contraindicação para tratamentos cirúrgicos. No entanto, a ressecção de metástases pulmonares
e hepáticas pode conferir sobrevida longa em uma parcela muito selecionada de pacientes.
Parecem beneficiar-se de ressecção agressiva, pacientes com níveis normais de CEA pré-toracotomia,
lesões pulmonares metacrônicas e metástase pulmonar solitária combinada a pequena quantidade
de lesões hepáticas. Recomendamos início de tratamento quimioterápico sistêmico neo-adjuvante,
com ressecção das metástases pulmonares e hepáticas em caso de doença relativamente localizada
e oligovolumétrica, e com boa resposta ao tratamento quimioterápico inicial. Considerar tratamento
adjuvante após ressecção, completando um total de 6 meses de quimioterapia.
11.5.8. recidiva locorregional
A ressecção de recidiva intra-abdominal está associada a índices de cura da ordem de 10 a
20%, mesmo em séries antigas. A disponibilidade de regimes quimioterápicos modernos deve ser
explorada, com uso de tratamento quimioterápico sistêmico neo-adjuvante ou adjuvante, dependendo
da situação. Os regimes utilizados seguem aqueles recomendados para pacientes com metástases
hepáticas (ver Metástases hepáticas exclusivas).
11.5.9. Seguimento durante a quimioterapia
Vale ressaltar que pode ocorrer uma elevação inicial do CEA, chamado CEA surge, que pode
alcançar o pico em até 56 dias após o primeiro ciclo, e pode ser observada em 15% dos pacientes
tratados que eventualmente alcançam resposta objetiva. Portanto, não recomendamos checar CEA
fora das visitas de reestadiamento, e toda elevação de CEA deve ser confirmada por exames de
imagem.
MANUAIS D E COND UTAS
| 223
11.5.10. CEA em elevação, sem doença detectável por métodos convencionais
Estudos retrospectivos sugerem que o CEA seja o exame mais custo-efetivo na detecção
precoce de metástases. No entanto, uma elevação do CEA praticamente nunca é justificativa
suficiente para início de tratamento quimioterápico em paciente sem comprovação de doença
metastática. Estes pacientes devem ser completamente avaliados, com exames de imágem,
colonoscopia, e repetição dos exames regularmente, já que a maioria das recorrências se manifesta
por tradução em imagens até 6 meses após o aumento inicial do CEA. Não considerar início de
quimioterapia sistêmica até que haja prova de recorrência por confirmação patológica ou exame
de imagem. O PET/CT ajuda na detecção de metástases ocultas em pacientes com elevações
consecutivas do CEA e sem evidência de lesão metastática no exame físico, na TC de tórax, abdome
e pelve e na colonoscopia É importante lembrar que o CEA não é um exame exclusivo para câncer
de cólon e reto, e que sua elevação pode estar associada a outros tumores, bem como a problemas
benignos, como presença de disfunção renal ou hepática.
11.5.11. Carcinomatose exclusiva
Pacientes com carcinomatose apresentam um prognóstico muito reservado, e seu tratamento
usual é sistêmico (ver Estádio IV). Nos pacientes com doença oligometastática, boa performance,
e que podem ser submetidos à ressecção completa dos implantes, pode-se considerar peritonectomia
combinada ou não a tratamento quimioterápico intraperitoneal. A peritonectomia é um procedimento
com alta morbidade e significativa mortalidade, devendo ser feita apenas em casos altamente
selecionados e por cirurgiões com grande experiência no procedimento, que dura entre 14 e 24
horas, respeitando-se rigidamente as indicações estabelecidas.
Um estudo holandês randomizado de fase III com 105 pacientes apresentando envolvimento
peritoneal comparou quimioterapia sistêmica versus quimioterapia sistêmica em combinação com
cirurgia de citorredução e quimioterapia intraperitoneal com mitomicina-C em altas doses
associada a hipertermia. Com um acompanhamento mediano de 21,6 meses, demonstrou um
aumento de sobrevida global de 22,3 versus 12,6 meses (p=0,032), sendo o ganho mais expressivo
em pacientes com citorredução completa.53 Uma análise retrospectiva e multicêntrica, com 506
pacientes tratados com cirurgia citorredutora (peritonectomia) e quimioterapia hipertérmica,
corroborou o potencial curativo dessa estratégia de tratamento.54 A morbidade e mortalidade
foram, respectivamente, de 22,9 e 4%. Ressecação completa (R0) foi obtida em 54%, e metástases
hepáticas foram ressecadas em 12% dos pacientes. A sobrevida mediana de todo o grupo foi de
19,2 meses, sendo de 32,4 meses para pacientes R0, comparado com somente 8,4 meses para
pacientes que não poderam ter citorredução R0. A sobrevida global em 5 anos foi de 19%, e a
sobrevida livre de doença foi de 10%, indicando potencial curativo para um pequeno grupo seleto
de pacientes. Esse é um procedimento de alta complexidade, sendo realizado somente por poucos
hospitais do Brasil.
11.6. Acompanhamento Sugerido
Aproximadamente 80% das recorrências ocorrem nos primeiros 2 anos após o diagnóstico, e
embora o papel de um seguimento intenso em pacientes com câncer colorretal permaneça
controverso, pelo menos uma metanálise com 1.342 pacientes sugere que um seguimento intenso
com exames de imagem e CEA leva a uma redução da mortalidade de 19% (p=0,007). Essa redução
foi ainda maior (27%) em pacientes que foram seguidos com tomografias e frequente checagem
do CEA.55
À luz destes dados, nos primeiros dois anos sugerimos exame físico e avaliação laboratorial
incluindo CEA e função hepática a cada 3 meses, radiogramas de tórax e US ou TC de abdome e
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MA NUA IS D E CO ND UTAS
pelve a cada 6 meses. Para pacientes selecionados recomendamos tomografia de tórax como parte
do acompanhamento. A colonoscopia é obrigatória entre o 1º e 2º ano.
Entre o 3º e 5º ano, recomendamos exame físico e avaliação laboratorial incluindo CEA e
função hepatica a cada 6 meses, raios X de tórax e US ou TC de abdome e pelve anuais. A
colonoscopia deve ser feita ao final do primeiro ano, e a cada 3 anos, e se nada for encontrado
pode ser espaçada.
Após descartar-se a possibilidade de uma síndrome familiar hereditária, os familiares de
primeiro grau ainda devem ser instruídos quanto à necessidade de acompanhamento, com exames
iniciando-se aos 50 anos, ou 10 anos antes da idade do paciente.
Nos últimos anos, houve um acúmulo de dados sugerindo que uma dieta saudável, baseada
em frutas e verduras associada a um programa de exercício físico regular pode ter um impacto no
controle a longo prazo de pacientes tratados para câncer. Trata-se de uma recomendação simples
e que deve ser discutida com os pacientes em acompanhamento após tratamento.
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MANUAIS D E COND UTAS
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Capítulo 12
Câncer de Estômago
Editor: Dr. Roberto de Almeida Gil
Autores: Dra. Anelisa Kruschewsky Coutinho, Dr. Amândio Soares Fernandes Júnior, Dr. Bruno dos
Santos Vilhena Pereira, Dr. Antonio Accetta, Dr. Evanius Garcia Wiermann, Dra. Maria Dirlei Ferreira
de Souza Begnami, Dr. Fernando Meton de Alencar Camara Vieira e Dr. André Márcio Murad
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Capítulo 12
Câncer de Estômago
12.1. Introdução
No manual de Condutas, lançado previamente pela SBOC em 2007, lembramos do seu caráter
temporal e da necessidade constante de sua atualização. Passados poucos anos da 1ª edição nos
vimos obrigados a reescrevê-lo e atualizá-lo procurando atender a necessidade dos oncologistas
brasileiros em legitimar sua prática, incorporando de forma crítica novas tecnologias.
O câncer de estômago inclui-se hoje entre as principais causas de câncer em nosso país tanto
em homens como em mulheres. Dados divulgados pelo INCA estimam que, em 2010, 13.820 casos
novos entre homens e de 7.680 casos novos entre mulheres foram diagnosticados. Estes valores
correspondem a um risco estimado de 14 novos casos a cada 100mil homens e 8 para cada 100 mil
mulheres 1. Os dados são inferiores aos publicados no manual anterior (2006). Apesar disso, o câncer
de estômago ainda é muito significativo no Brasil. Sua distribuição é variável nas diferentes regiões
do país, mas está sempre entre as cinco neoplasias malignas mais prevalentes e frequentes.
Quadro 1
região
Norte
Nordeste
Centro Oeste
Sudeste
Sul
Incidência
Homens
10/100.000 (2ª)
10/100.000 (2ª)
12/100.000 (3º)
17/100.000 (4º)
19/100.000 (4º)
Mulheres
6/100.000 (3º)
6/100.111 (4º)
6/100.000 (5º)
9/100.000 (5º)
10/100.000 (5º)
Nas últimas décadas, o comportamento clínico das neoplasias gástricas tem se modificado de
forma significativa. Observou-se a diminuição da incidência dos tumores distais e aumento na
incidência dos tumores malignos do estômago proximal e junção esofagogástrica. Embora as causas
de tal fenômeno sejam incertas, a obesidade, o refluxo gástrico esofagiano e o uso de tabaco4
parecem estar associados ao aumento do risco de desenvolvimento da doença proximal2. Como
na maior parte das vezes o desenvolvimento do câncer gástrico se faz de forma assintomática, e
como, no Brasil, além da inexistência de programas de rastreamento da doença existem muitos
problemas de média complexidade, o diagnóstico ocorre, geralmente, em fases avançadas,
aproximando as curvas de incidência às curvas de mortalidade.
Ao revisarmos os estudos publicados encontramos muitas vezes resultados conflitantes em
todos os aspectos envolvidos no tratamento do câncer gástrico, quer na intenção curativa, com
condutas diferentes na abordagem cirúrgica e no tratamento sistêmico adjuvante ou neoadjuvante,
quer no tratamento paliativo, onde até hoje não existe um esquema de tratamento considerado
como padrão. Não pretendemos aqui estabelecer diretrizes rígidas, nem que este manual seja
seguido uniformemente. Ele pretende ser apenas uma ferramenta de ajuda aos oncologistas,
apontando para os caminhos mais comumente percorridos, sem restringir o profissional médico
em seu direito de escolha no processo de decisão individual.
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Reafirmamos mais uma vez o caráter temporal de um manual, pois o constante desenvolvimento
tecnológico torna obrigatória a flexibilidade de conceitos e dinâmica de revisão para garantir a
constante atualização do mesmo. Ressaltamos que a incorporação de tecnologia em saúde é tema
complexo e controvertido. O processo abrange não só as conseqüências clínicas dos procedimentos,
mas também as implicações econômicas e sociais de sua utilização.
Assim, este manual não pretende ser um instrumento legitimador de condutas independente
de contextualização. É uma ferramenta auxiliar que a SBOC oferece aos seus associados e à
sociedade em geral, na procura de melhorar a assistência de pacientes com câncer gástrico e
contribuir para a formulação da política de atenção oncológica no Brasil.
12.2. Diagnóstico do Câncer Gástrico
Manifestações clínicas
O câncer gástrico caracteriza-se por sintomas vagos e inespecíficos, o que contribui para
o diagnóstico da doença geralmente em estágios avançados (quadro 2).
Quadro 2
Sintomas do Câncer Gástrico
Sintomas
Perda de peso
Dor abdominal
Náuseas
Disfagia
Melena
Plenitude
Percentual
62%
52%
34%
26%
20%
18%
Alguns sintomas podem sugerir a localização do tumor. A queixa de disfagia pode indicar um
tumor localizado na região proximal, infiltrando a junção esofagogástrica. Queixa de saciedade
precoce está associado ao câncer gástrico tipo difuso (linite plástica). Vômitos persistentes podem
significar um tumor de localização distal com obstrução do piloro. Sangramento gástrico oculto não
é incomum, porém sangramento de maior volume (hematêmese ou melena) ocorre em apenas
10% a 15% dos pacientes 3.
Apresentações clínicas menos comuns podem refletir a disseminação da doença e representar
a incurabilidade. Essas manifestações incluem: ascite, icterícia, massa palpável, obstrução intestinal,
metástase para linfonodo supraclavicular esquerdo (Nodo de Virchow), metástase para linfonodo
periumbilical (Nodo Irmã Mary Joseph), para linfonodo axilar esquerdo (Nodo de Irish), metástase
para ovário (Tumor de Krukenberg) e metástase para fundo de saco (Prateleira de Blumer) 4.
Eventualmente o câncer de estômago se associa à presença de síndromes paraneoplásicas.
No quadro 3 relacionamos as mais frequentemente encontradas.
Quadro 3
Câncer Gástrico – Síndromes Paraneoplásicas
• Ceratose Seborréica Difusa (sinal de Lesser Trelat)
• Acantose Nigricans
• Anemia hemolítica microangiopática
• Nefropatia membranosa
• Síndrome de trousseau (hipercoagulabilidade)
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12.3. Avaliação pré-tratamento
É indispensável que se realize minuciosa avaliação da extensão da doença, para que possamos
estabelecer a melhor estratégia de tratamento para cada caso. Anamnese e exame físico são
essenciais. Devemos utilizar, da melhor maneira possível, os recursos propedêuticos existentes,
estabelecendo avaliação crítica sobre o impacto do exame na decisão de conduta.
A avaliação cuidadosa da invasão tumoral local (avaliação de T no sistema TNM) é um dos
maiores preditores de recorrência e sobrevida nos pacientes com câncer gástrico, podendo ser
determinante na conduta a ser seguida.
A Tomografia computadorizada (TC) de abdome, pelve e de tórax é, usualmente, indicada no
estadiamento pré-operatório. Além de ser um exame amplamente disponível e pouco invasivo, é
método importante para pesquisa de doença metastática para pulmão, fígado, ovário, presença de
ascite e disseminação linfonodal à distância. Embora a utilização de aparelhos mais modernos e
novas técnicas permitam uma avaliação mais acurada da invasão do tumor na parede do órgão e
do comprometimento de linfonodos regionais, esta avaliação frequentemente é subestimada por
este exame. Sua especificidade no estadiamento de (T) é de 74% (T1: 46%; T2:53%; T3:86% e
T4:86%) e de (N) é de 75% (No:76%, N1 69%, N2:80%) A ressonância magnética (RNM) na avaliação
pré-operatória dos adenocarcinomas de estômago não apresenta vantagem sobre a TC 3.
A ultrassonografia endoscópica (USE) vem sendo utilizada no mundo desde a década de 80,
sendo considerada a modalidade de escolha para estadiamento de T pré-operatório. A sua acurácia
varia de 65 a 92%, com sensibilidade de comprometimento de serosa gástrica de 78 a 100% . A USE
tem sensibilidade superior à tomografia computadorizada (TC) convencional na avaliação da
extensão local do tumor. Entretanto, em relação à avaliação de linfonodos regionais (N), esta
diferença parece ser muito discreta, o que torna pouco definido seu papel no estadiamento da
doença. Estudo realizado no MSKCC com 225 pacientes mostrou que a concordância entre o USE
e a patologia foi bastante inferior à esperada (T:57% e N:50%) 6. Além disso, no nosso meio, é
dispendiosa, pouco disponível e dependente de operador treinado.
A utilização do PET-CT vem sendo amplamente realizada no estadiamento e acompanhamento
de tumores gastrintestinais. Particularmente no câncer gástrico, metades dos tumores são
negativos para captação de FDG (fluoro-2-deoxiglicose), principalmente os tumores com células em
anel de sinete. O uso do PET-CT na avaliação inicial do câncer gástrico parece ter papel limitado.
Estudos recentes, incluindo uma grande meta-análise, mostraram que PET-CT apresenta a mesma
acurácia para avaliação do tumor inicial e acometimento linfonodal quando comparado a outros
exames de estadiamento (tomografia, ressonância magnética, ultra-som endoscópico) 7. O PET-CT
mostrou superioridade no diagnostico de metástase à distância. A sensibilidade para avaliação de
acometimento peritoneal aproximou-se de 50%. O PET-CT pode ter papel significativo na avaliação
de resposta em pacientes submetidos a tratamento neoadjuvante. Ott et al. reportaram 90% de
sobrevida em 2 anos em pacientes com resposta ao PET-CT versus 25% naqueles não
respondedores 8. A utilização do PET-CT permite que, em pacientes sem resposta metabólica
precoce, a estratégia terapêutica seja redefinida utilizando procedimento de resgate.
Como recomendação, vemos que o PET-CT no manejo do câncer gástrico deve ter sua
indicação individualizada, devendo-se reservar para avaliação de resposta ao tratamento e em
alguns casos específicos para avaliação de metástases à distância. A Tabela 4, adaptada de revisão
japonesa sobre o assunto, resume os possíveis benefícios do uso de PET scan no manejo do câncer
gástrico 9.
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Quadro 4
Utilidade clínica do PET-CT no Câncer Gástrico
Variáveis avaliadas
Utilidade clínica
Profundidade do tumor
Sem utilidade
Metastase linfonodal
Útil para linfonodos a distância
Metástase distância
Baixa sensibilidade; alta especificidade
Metástase peritoneal
Alta especificidade
Recidiva
Controverso
Resposta ao tratamento
Pode ser útil
Rastreamento
Sem utilidade
Nenhum exame de estadiamento não invasivo apresenta sensibilidade e especificidade
suficientes para descartar acometimento peritoneal. Vinte a trinta por cento dos pacientes
considerados como doença inicial, apresentam comprometimento do peritônio 10. Por isso, a
laparascopia e a citologia oncótica do lavado peritoneal tem importante papel no estadiamento e
definição cirúrgica no câncer gástrico.
A citologia peritoneal está indicada em pacientes com tumores primários localmente
avançados e em presença de linfonodomegalias. Nestes casos, pode ser positiva em 10 a 25% dos
casos, principalmente em tumores pouco diferenciados 11.
Pacientes com citologia positiva tem sobrevida mediana inferior e maior risco de desenvolvimento
de doença peritoneal. Bentram et a.l publicou estudo com 371 pacientes com gastrectomia R0,
com 6,5% dos casos tendo citologia positiva. A sobrevida mediana dos pacientes com citologia
positiva foi de 14,8 meses versus 98,5 meses dos pacientes com citologia negativa. Estes achados
são consistentemente confirmados em diferentes séries 12. Nas diretrizes do NCCN (National
Comprehensive Cancer Network) pacientes com citologia positiva sem evidência de doença
macroscópica em peritônio são considerados como tendo doença metastática.
Algumas séries sugerem que pacientes com negativação da citologia após tratamentos
quimioterápicos, relacionam-se com melhor sobrevida, podendo ser reavaliados quanto à
perspectiva cirúrgica.
Claramente, nem todos os pacientes devem realizar a laparoscopia, mas isto precisa ser
melhor estabelecido. Priorizamos tal procedimento em pacientes com tumores maiores que T1
(há discussão na inclusão de T2 nos pacientes não candidatos do procedimento) e sem diagnóstico
de doença à distância pelos exames de imagens 3. Sua realização pode ser realizada previamente
a cirurgia, como intervenção isolada, ou imediatamente antes do procedimento cirúrgico. Sua
realização pode modificar a estratégia de tratamento do câncer gástrico em 6,5 a 52% dos pacientes 3.
Embora marcadores tumorais como CEA, CA 125, CA 19.9, CA 50 e CA 72.4 possam estar
elevados à apresentação, eles carecem de sensibilidade e especificidade suficiente tanto para
rastreio, como para diagnóstico de adenocarcinoma de estômago. Em alguns pacientes, uma
redução nos níveis séricos destes marcadores podem se relacionar à resposta clínica à terapia
neoadjuvante, entretanto há estudos que não corroboram esta correlação. Critérios anatômicos
continuam sendo o padrão para orientar a ressecabilidade. Não há recomendações para modificar
a conduta cirúrgica baseado em resultados de marcadores tumorais, não sendo indicados, inclusive,
na avaliação pré-operatória nas diretrizes do NCCN. Alguns adenocarcinomas gástricos podem
secretar alfa-fetoproteína e apresentar características histológicas semelhantes ao carcinoma
hepatocelular. Independente da morfologia, estes tumores são agressivos e têm mau prognóstico.
Os marcadores tumorais podem ser utilizados como ferramentas de acompanhamento de resposta
clínica à quimioterapia paliativa no adenocarcinoma metastático, especialmente na ausência de
doença mensurável, como nas metástases peritoneais 14.
MANUAIS D E COND UTAS
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Quadro 5
Método
Endoscopia digestiva alta
Seriografia
TC torax, abdome e pélvica
RM abdome
Us endoscópico
PET-CT
Laparoscopia
Marcadores Tumorais
Câncer Gástrico: Procedimentos
recomendação
Recomendada fortemente
Linite plástica (situação particular)
Recomendada
Não recomendada rotineiramente
Recomendada com ressalvas
Recomendada com restrições, em situações particulares
Recomendada (seleção)
Recomendação ocasional
OBS.: Recomendamos realizar biópsias em lesões viscerais suspeitas e paracentese com citologia em presença de ascite
12.4. Estadiamento
O estadiamento é importante para predizer o prognóstico e o resultado dos tratamentos
oferecidos. Atualmente, temos duas classificações de estadiamento para o câncer gástrico. Uma é
a classificação conjunta AJCC/UICC, utilizada no ocidente, e a outra é a classificação japonesa.
O estadiamento AJCC/UICC é baseado no sistema TNM e foi recentemente modificada 15. É
importante chamar a atenção para o fato de que, nesta classificação, a avaliação do N refere-se ao
número de linfonodos comprometidos e não à sua localização. Torna-se clara, pois, a importância
do trabalho conjunto entre o cirurgião e o patologista, para que se consiga um número adequado
de linfonodos a serem examinados e, portanto, um estadiamento mais acurado.
Quadro 6 - Estadiamento (AJCC 2010)
Definição do TNM
Tumor primário (T)
Tis - Carcinoma in situ: tumor intraepitelial sem invasão da lâmina própria, displasia de alto grau
T1 - Tumor infiltra a lâmina própria, muscular da mucosa, ou submucosa
T1a - Tumor infiltra a lâmina própria ou muscular da mucosa
T1b - Tumor infiltra a submucosa
T2 - Tumor infiltra a muscular própria
T3 - Tumor invade a subserosa
T4 - Tumor penetra na serosa ou invade as estruturas adjacentes
T4a - Tumor penetra na serosa
T4b - Tumor invade as estruturas adjacentes
Linfonodos regionais (N)
N0 - Sem metástases linfonodais
N1 - Metástases de 1 a 2 linfonodos regionais
N2 - Metástases de 3 a 6 linfonodos regionais
N3 - Metástases em 7 ou mais linfonodos regionais
N3a - Metástases de 7 a 15 linfonodos regionais
N3b - Metástases em 16 ou mais linfonodos regionais
Metástase à distância (M)
M0 - Sem metástases à distância
M1 - Com metástases à distância
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Definição do TNM
Estagio
Estágio 0
Estágio IA
Estágio IB
Tis
T1
T2
T1
N0
N0
N0
N01
M0
M0
M0
M0
Estágio II A
T3
T2
T1
N0
N1
N2
M0
M0
M0
Estágio IIB
T4a
T3
T2
T1
T 4a
T3
T2
N0
N1
N2
N3
N1
N2
N3
M0
M0
M0
M0
M0
M0
M0
T4b
T4a
T3
T4a
T4b
N0, N1
N2
N3
N3
N2, N3
M0
M0
M0
M0
M0
Estágio IIIA
Estágio III B
Estágio III C
Estágio IV
Qualquer T Qualquer N M1
A sétima edição das diretrizes da AJCC/UICC para o estadiamento do câncer gástrico apresenta
uma divisão mais detalhada de cada estádio mas com tendência a super estadiamento. Esta edição
vem sendo criticada em avaliações retrospectivas uni e multi-institucionais por gerar migração de
estádio sem melhorar a avaliação prognóstica. No momento está em debate sua revisão 16,17 .
12.5. Patologia
Os adenocarcinomas representam 90 a 95% dos tumores malignos do estômago e é por isso o
enfoque único deste manual. Foi classificado por Lauren em subtipos intestinal e difuso, misto e
indeterminado. Os dois principais subtipos, intestinal e difuso, comportam-se como entidades
biológicas individualizadas, com padrões epidemiológicos, etiológicos, patogênicos e clínicos
diferentes.
O adenocarcinoma do tipo intestinal é constituído por glândulas com vários graus de diferenciação.
É mais freqüente em homens e faixas etárias mais elevadas, sendo sua prevalência relacionada a áreas
de risco e relacionada a fatores ambientais. Está associado à gastrite atrófica e metaplasia intestinal.
Sua incidência vem apresentando declínio em todo o mundo e também no Brasil. Já o câncer do
tipo difuso ou infiltrativo é constituído por células pouco diferenciadas, não coesas com freqüente
mucina intracelular em aspecto de anel de sinete. Tem incidência em pacientes mais jovens e é de
pior prognóstico. Está associada à pangastrite não-atrófica. Ocorre de igual forma em homens e
mulheres. O declínio de sua incidência ocorre de forma muito mais gradual que a do tipo intestinal 18.
MANUAIS D E COND UTAS
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Recomenda-se que a análise patológica da peça retirada inclua sempre: grau de invasão na
parede, tipo histológico, grau histológico, invasão vascular e margens cirúrgicas. A localização do
tumor, o número e a presença ou não de comprometimento de linfonodos é obrigatória na avaliação
de peças de gastrectomia. Em pacientes submetidos a tratamento neoadjuvante recomendamos
que na descrição da patologia da peça ressecada seja analisada a resposta do tumor primário ao
tratamento efetuado. Embora não haja um modelo uniformemente seguido recomendamos a
adoção do sistema adotado para avaliação do câncer de reto e indicado pelo NCCN 19.
Quadro 7
Grau de regressão do tumor
0 (resposta completa)
1 (resposta parcial)
2 (resposta mínima)
3 (resposta pobre)
Descrição
Sem células malignas
Células isoladas ou com pequenos grupos de células malignas
Tumor residual e fibrose
Não regressão ou regressão mínima tumor residual extenso
A carcinogênese gástrica é um processo multifatorial e de múltiplos passos, durante os quais
múltiplas alterações genéticas e epigenéticas estão envolvidas. Anormalidades nos fatores de
crescimento e seus receptores têm sido associados ao desenvolvimento e progressão dos
carcinomas gástricos 20.
Nos carcinomas gástricos, a amplificação de HER2 tem sido encontrada numa freqüência de
7 a 34% dos casos. Esta variabilidade é decorrente, principalmente, das diferentes metodologias
utilizadas para a pesquisa da expressão e/ou amplificação. A superexpressão de HER2 nos
carcinomas gástricos, semelhante ao observado nos carcinomas da mama, tem sido associada a
pior sobrevida dos pacientes 21. Baseado nestes achados, a combinação do tratamento com
quimioterapia e Trastuzumabe tem sido apontada como uma terapia alternativa para os pacientes
com câncer gástrico avançado. Dados recentes de estudos clínicos em fase III (TOGA, protocolo
BO18255), demonstraram que pacientes com carcinomas gástricos com amplificação de HER2 e
que fizeram uso deste esquema terapêutico apresentaram redução do tamanho tumoral,
diminuição das metástases abdominais e maior tempo de sobrevida global e livre de doença 22.
Carcinomas localizados na região cardíaca ou na junção esôfagogástrica e do tipo intestinal são
mais frequentemente positivos para HER2 quando comparados aos tumores distais e do subtipo
difuso, contudo a pesquisa do status do HER2 para o tratamento com trastuzumabe é obrigatória
em todos os tumores.
A seleção dos pacientes deve ser feita através da pesquisa imunoistoquímica da expressão
protéica do HER2 nas amostras tumorais provenientes de biópsias endoscópicas ou das peças
cirúrgicas, sendo considerados negativos os casos classificados com escore 0 ou escore 1; duvidosos
ou indeterminados os casos com escore 2 e positivos os casos com escore 3. A confirmação da
amplificação gênica de HER2 deve ser feita por hibridização in situ fluorescente (FISH) nos casos
classificados com escore 2. Nas amostras provenientes de biópsias endoscópicas recomenda-se o
envio de 6 a 8 fragmentos representativos de áreas distintas do tumor. Os critérios utilizados para
a interpretação da expressão imunoistoquímica de HER2 nos carcinomas gástricos e determinação
dos escores, foram recentemente descritos por Hoffman e colaboradores e apresentam discretas
diferenças em relação ao tecido de origem do material (biópsia x peças cirúrgicas) 23.
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MA NUA IS D E CO ND UTAS
Critérios de classificação de HER2 no câncer gástrico por imunoistoquímica:
Quadro 8
Padrão IHQ
(Espécime Cirúrgico)
Coloração ausente, ou coloração
Negativo muito fraca de membrana é
observada em menos de 10%
das células tumorais
Coloração fraca de membrana
ou pouco perceptível em mais
Negativo de 10% das células tumorais;
células reativas apenas em parte
da membrana
Coloração fraca a moderada,
completa, basolateral ou lateral
Duvidoso em mais de 10% das células
tumorais
Escore resultado
0
1+
2+
3+
Positivo
Coloração forte completa,
basolateral ou lateral de
membrana observada em mais
de 10% das células tumorais
Padrão IHQ
(Espécime de Biópsia)
Coloração ausente, ou coloração
muito fraca de membrana em
qualquer célula tumoral
Coloração fraca de membrana ou
pouco perceptível em grupo de
células tumorais independentemente
da porcentagem de células tumorais
marcadas
Coloração fraca a moderada de
membrana, completa, basolateral ou
lateral em grupo de células tumorais,
independentemente da porcentagem
de células tumorais marcadas
Coloração forte de membrana,
completa, basolateral ou lateral em
grupo de células tumorais,
independentemente da porcentagem
de células tumorais marcadas
12.6. Cirurgia
12.6.1. Princípios da cirurgia
A ressecção cirúrgica permanece como a pedra angular no tratamento dos pacientes com câncer
gástrico, sendo recomendada nos estádios I, II e III da doença. O objetivo principal do tratamento
cirúrgico é a ressecção completa do tumor junto com os seus linfonodos regionais, observando-se
a necessidade de obter margens cirúrgicas livres adequadas, ou seja, uma ressecção R0.
Antes de indicar o tratamento cirúrgico sempre se deve considerar a condição clínica do
paciente, levando-se em consideração dois fatores: performance status e a presença de comorbidades.
A cirurgia com intenção curativa padrão é a gastrectomia com linfadenectomia D2 24, e deve ser
realizada de rotina nos pacientes que apresentam condições clínicas satisfatórias, ou seja, PS 0 ou
1 e eventuais doenças associadas controladas.
São considerados como tendo critérios de incurabilidade os pacientes com doença M1 ou
aqueles M0 irressecável. Doença M1 é caracterizada por metástase à distância, implantes em
peritônio, citologia peritoneal positiva ou linfonodos não regionais comprometidos. Doença M0
irressecável é aquela caracterizada pela invasão de estruturas vasculares principais (aorta, tronco
celíaco ou artéria hepática comum) ou órgãos adjacentes em pacientes sem condições clínicas de
suportar uma ressecção em bloco das estruturas envolvidas.
12.6.2. Extensão da ressecção
O tipo de ressecção empregada depende da localização do tumor no estômago. Nos tumores
do terço proximal a ressecção padrão é a gastrectomia total (GT). A gastrectomia subtotal proximal,
também pode ser realizada nestes casos, mas ela ocasiona com muita frequência esofagite de
MANUAIS D E COND UTAS
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refluxo severa levando a uma pior qualidade de vida ao paciente, somando-se ao fato de poder
falhar na retirada completa dos linfonodos da pequena curvatura.
A gastrectomia subtotal (GST) é a cirurgia de escolha nas lesões do terço distal (antro). Ensaios
prospectivos randomizados controlados demonstraram resultados de sobrevida e complicações
cirúrgicas semelhantes quando comparadas GST e GT nos tumores nessa localização 25. No entanto,
a GT produz uma qualidade de vida inferior ocasionando saciedade precoce, perda de peso e
necessidade de reposição de vitamina B12.
Nos tumores do terço médio, realiza-se a GT quando a lesão situar-se no corpo superior do
estômago. Nas lesões do corpo inferior poderemos indicar GT quando essas apresentam grau
pouco diferenciado. Em casos de tumores bem (G1) ou moderadamente diferenciados (G2), a GST
poderá ser realizada em caso de margem cirúrgica segura. As margens devem ser avaliadas por
exame histopatológico de congelação (no) intraoperatório. A Japanese Gastric Cancer Association
(JGCA) recomenda uma margem de 2cm nos tumores T1, 3 cm nos tumores T2 a T4 com padrão de
crescimento expansivo (Borrmann 1 e 2) e uma margem de 5 cm nas lesões com padrão de
crescimento infiltrativo (Borrmann 3 e 4) 26.
Nos tumores T4b, será realizada a ressecção em bloco das estruturas adjacentes envolvidas
diretamente pela neoplasia. Nestes casos, esplenectomia, pancreatectomia, colectomia segmentar
do transverso ou ressecção do lobo esquerdo do fígado quando realizadas estão associadas a uma
maior morbidade, porém com ganho de sobrevida. Existe consenso de que a esplenectomia deve
ser realizada somente em casos de tumores proximais com invasão direta do baço não devendo,
portanto, ser indicada de rotina na GT com linfadenectomia D2 27.
12.6.3. Extensão da linfadenectomia
A cirurgia padrão com intenção curativa é a gastrectomia com linfadenectomia D2, realizada
de rotina nos grandes centros de tratamento de câncer gástrico dos países do Oriente e Ocidente.
A sua execução resulta em aumento significativo da morbimortalidade em mãos de cirurgiões com
pouca experiência com a técnica ou quando realizada em pacientes não selecionados. A curva de
aprendizado da linfadenectomia D2 é de aproximadamente 15 a 25 cirurgias, devendo este
treinamento ser realizado em centro especializado e com adequada supervisão, promovendo uma
diminuição das suas complicações com o tempo e a experiência do cirurgião 28.
O número de linfonodos examinados tem influencia na acurácia do estadiamento e a
recomendação da AJCC é que pelo menos 16 deles sejam retirados. Além do seu papel terapêutico,
a D2 permite uma melhor avaliação dos linfonodos, diminuindo a chance de migração de estágio
denominado fenômeno de Will Rogers, citado, como uma causa potencial das diferenças nos
resultados entre os pacientes japoneses e do oeste 29.
Após 15 anos de seguimento, o maior ensaio randomizado prospectivo ocidental (Dutch Trial)
mostrou que a linfadenectomia D2 associou-se a menor recidiva locorregional e a menores taxas
de morte relacionadas ao câncer gástrico em comparação a D1, recomendando a D2 como
linfadenectomia padrão de tratamento 30.
12.6.4. Videolaparoscopia
A gastrectomia D2 laparoscópica tem sido cada vez mais empregada nos países do Oriente,
principalmente nos tumores T1. Este método, apesar de tecnicamente difícil e necessitar de uma
curva de aprendizado alargada, pode ser realizado com segurança, sem aumento da morbimortalidade
operatória e com menor perda sanguínea, apesar de requerer um maior tempo cirúrgico. A
quantidade de linfonodos retirados e a sobrevida a curto prazo são equivalentes à cirurgia aberta.
Entretanto, os seus resultados em longo prazo permanecem em aberto devendo ser melhor
avaliado em protocolos de pesquisa clínica 31.
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MA NUA IS D E CO ND UTAS
12.6.5. ressecção endoscópica
A Ressecção Endoscópica da mucosa (REM) denominada Mucosectomia e a Dissecção
Endoscópica da submucosa (DES) são métodos que vem sendo utilizados como alternativa a
cirurgia no tratamento dos pacientes com câncer gástrico precoce. A aplicabilidade da ressecção
endoscópica nos países do ocidente é limitada em função da baixa incidência do câncer precoce.
A DES tem mostrado ser mais efetiva que a REM na cura do câncer gástrico precoce, no entanto,
necessita de maiores habilidades técnicas do endoscopista e instrumental sofisticado para ser
efetuada. Também está associada a maiores taxas de complicações tais como sangramento e
perfuração 32. O National Comprehensive Cancer Network (NCCN) nos Estados Unidos, pela falta de
estudos randomizados na literatura comparando a REM com a cirurgia, não recomenda este fora
de ensaios clínicos, devendo limitar-se a centros médicos com vasta experiência no método 33.
12.6.6. Câncer gástrico difuso hereditário
O câncer gástrico difuso hereditário (CGDH) é uma forma de câncer do causado pela mutação
do gene CDH1, o qual codifica a proteína E-caderina, responsável pela adesão celular. A penetrância
desta mutação é alta, tendo seus portadores um risco maior que 80% de desenvolver câncer
gástrico do tipo difuso (CGD) ao longo de sua vida, com uma idade média de 40 anos por ocasião
do diagnóstico; as mulheres possuem um risco elevado de desenvolver câncer de mama do tipo
lobular. O câncer gástrico do tipo intestinal não está associado a esta síndrome.
A taxa de detecção de mutação do CDH1 é de aproximadamente 30% quando temos os
seguintes critérios clínicos:
• Família com 2 ou mais casos de CGD em parentes de primeiro ou segundo graus, com pelo
menos um deles com diagnóstico antes dos 50 anos, ou
• 3 ou mais casos de CGD em parentes de primeiro ou segundo graus em qualquer idade
Vale ressaltar que menos de 5% dos indivíduos com CGD abaixo dos 50 anos de idade e sem
história familiar de câncer gástrico ou de mama carregam mutação no CDH1.
A todos os portadores de mutação do gene CDH1 deve ser recomendada a gastrectomia total
profilática a partir dos 20 anos de idade, apesar de outros considerarem sua realização em pessoas
numa idade cinco anos mais nova em relação ao membro mais jovem da família que desenvolveu
câncer gástrico. É essencial assegurar a ressecção completa de toda a mucosa gástrica, devendo ser
realizado exame de congelação intra-operatório das margens proximal e distal do estômago. Não
há necessidade de linfadenectomia radical na gastrectomia profilática.
Há necessidade de vigilância endoscópica nos portadores da mutação que recusaram a
cirurgia profilática e naqueles mais jovens em relação à idade em que a cirurgia profilática é
recomendada devendo ser realizada anualmente 34. Devido à natureza focal das lesões, elas são
muito difíceis de serem detectadas pela endoscopia no estádio inicial.
12.6.7. Tratamento cirúrgico paliativo
O objetivo principal do tratamento cirúrgico paliativo é oferecer a melhor qualidade de vida
ao paciente através de procedimentos que aliviem os sintomas causados pela neoplasia em estágio
avançado tais como dor, sangramento e obstrução. Entre estes procedimentos cirúrgicos temos a
gastrectomia paliativa, gastroenteroanastomose, gastrostomia e jejunostomia alimentar.
Nos tumores distais obstrutivos irressecáveis, a gastroenteroanastomose é o método paliativo
de escolha nos pacientes com performance status ≤ 2 e comorbidades controladas, por apresentar
uma menor taxa de recorrência dos sintomas quando comparada ao stent gastroduodenal 35.
MANUAIS D E COND UTAS
| 241
12.7. Tratamento Adjuvante do Câncer Gástrico
Câncer gástrico é uma doença comum e altamente fatal com taxas de sobrevida em 5 anos
menores que 20%, mesmo em países desenvolvidos. Embora a cirurgia seja a única opção curativa
de tratamento dos carcinomas gástricos, a maioria dos pacientes com doença potencialmente
ressecáveis (EC IB –IV MO) carregam um alto risco de recorrência, seja local ou sistêmica. Para esses
pacientes devemos recomendar terapia complementar, quer adjuvante ou neoadjuvante, quer
com quimioterapia isolada, quer com radioquimioterapia. A escolha do tratamento a ser efetuado
deve ser tomada de forma multidisciplinar e levando em consideração as condições logísticas para
sua realização.
12.7.1. Quimioterapia Adjuvante
Nas últimas 3 décadas, vários estudos de fase III comparando cirurgia isolada com cirurgia e
quimioterapia sistêmica adjuvante têm produzido resultados conflitantes. Entretanto, a maioria
deles tiveram uma amostra reduzida tornando difícil conclusões definitivas. Na tentativa de elucidar
a questão, algumas meta-análises foram produzidas e publicadas, mas sempre com dificuldades
metodológicas.
A meta-análise de Janunger et al de estudos de tratamento adjuvante em câncer gástrico
revelou benefício relativo com quimioterapia adjuvante da ordem de 20-28% na redução do risco de
recidiva e favorecimento significativo da redução do risco de morte para o braço da terapia
combinada (HR 8,84, 95% IC: 0.74-0.96). Entretanto quando os estudos com população asiática são
separados daqueles com população ocidental tal benefício não mais é identificado nestes últimos.36
Recentemente, outra meta-análise (GASTRIC Global Advanced/Adjuvant Stomach Tumor
Research International Collaboration) incluiu 17 estudos aleatorizados com 3838 pacientes avaliados
individualmente, e demonstrou um benefício pequeno, mas estatisticamente significante, para a
quimioterapia adjuvante isolada (sem radioterapia) em termos de SG (HR 0.82, 95% IC 0.75-0.9,
P<0.001), com mais de 7 anos de seguimento médio. Embora não tenha sido encontrada
heterogeneidade significativa entre os estudos, eles não foram estratificados para população
asiática ou ocidental. Entretanto, análises separadas mostraram manutenção do benefício com
diferentes regimes de tratamento. Da mesma forma a exclusão de um estudo que apresentava
resultados atípicos, com o uso isolado de mitomicina C, em população ocidental, manteve o
benefício absoluto até 6% de redução de mortes por câncer gástrico em pacientes tratados com
quimioterapia pós-operatória 37.
Em estudo de população japonesa incluindo 1059 pacientes com adenocarcinoma gástrico
estádios II e III, submetidos à ressecção D2, foram randomizados para observação ou um ano de
terapia oral com S1 em regime adjuvante. Esta droga combina tegafur (pró-droga conversível em
5FU), gimeracil (inibidor de DPD) e oteracil (inibidor de metabolização do FU no trato digestório)
e é administrada por 4 semanas seguidas por 2 semanas de descanso. A sobrevida global aos 3
anos foi melhor no grupo tratado (80.1% vs 70.1%, p=0.003). O perfil de toxicidade foi favorável,
com menos de 10% de toxicidade G3/G4 (anorexia, náuseas e diarréias) 38. Este estudo é importante
por mostrar benefício do tratamento complementar em pacientes submetidos à cirurgia D2.
Entretanto sua aplicabilidade em população ocidental é questionável uma vez que o estudo FLAGS,
que utilizou S1 em doença gástrica metastática em países do ocidente, teve resultado
desapontador, podendo refletir diferenças biológicas no metabolismo da droga 39.
Mais recentemente foram apresentados os resultados do estudo de fase III, CLASSIC TRIAL,
que avaliou tratamento adjuvante quimioterápico com XELOX (capecitabina + oxaliplatina) por 8
ciclos versus apenas observação, em um total de 1035 pacientes estádios II e III submetidos à
cirurgia D2. Os resultados favoreceram o braço do tratamento adjuvante, com redução do risco de
recidiva de 46% (HR 0,56, 95%IC 0.44-0.72, P<0,0001) e SLD em 3 anos de 74% versus 60%. Os
242 |
MA NUA IS D E CO ND UTAS
eventos adversos graus 3 e 4 mais observados com o esquema foram neutropenia em 22%,
trombocitopenia em 8% e náuseas em 8%) 40. Diferentemente do estudo com S1, xeloda e
oxaliplatina são utilizados tanto em pacientes ocidentais como asiáticos, com o mesmo perfil de
comportamento validando sua utilização em nosso meio.
12.7.2. Quimioradioterapia Adjuvante
O estudo Intergroup INT-0116 é um estudo de fase III no quais 556 pacientes com
adenocarcinoma gástrico (80%) e de junção esofagogástrica (20%) ressecados, EC IB-IVM0 de alto
risco (85% dos pacientes com acometimento linfonodal e 69% com lesões T3/T4), onde foram
aleatorizados para observação ou tratamento quimiorradioterápico combinado, consistindo de
cinco ciclos mensais de Fluorouracil em bolus e ácido folínico associado à radioterapia na dose de
45 Gy concomitantes aos 2º e 3º ciclos e demonstrou benefício favorecendo o grupo submetido a
tratamento combinado com sobrevida mediada de 36 vs 27 meses (p=0,005) 41. Dados de
atualização de dez anos de seguimento mostraram manutenção do benefício nos principais desfechos:
sobrevida global (HR 1.32, P=0,004) e sobrevida livre de doença (SLD HR 1.51, P<0,001) 42. A
incidência de efeitos adversos graus 3 e 4 foram de 41% e 32%, respectivamente, no braço da
terapia, denotando a agressividade da mesma, sendo os mais freqüentes os hematológicos (54%)
e os gastrintestinais (33%, em especial náuseas, vômitos e diarréia) e que não se mantiveram
cronicamente. Mortalidade foi incomum. Críticas a este estudo referem-se à inclusão de pacientes
subtratados cirurgicamente, com 54% de pacientes com ressecção apenas D0 e apenas 10% tendo
recebido dissecção linfonodal D2.
O papel da radioterapia em análise não planejada de subgrupos deste estudo foi relevante
apenas nos pacientes com ressecção linfonodal limitada (D0 e D1), sendo que naqueles com
ressecção D2 (apenas 10% dos indivíduos), este benefício não foi detectado. Entretanto, suporte
indireto para o benefício da estratégia combinada mesmo em pacientes submetidos à cirurgia D2
foi identificado em análise retrospectiva de 990 pacientes coreanos com estádios II e IV (não M1)
operados curativamente com linfadenectomia D2, dos quais 544 receberam tratamento idêntico
ao INT-0116 e 446 foram apenas seguidos. Para todos os estágios, a sobrevida livre de recidiva e
global em cinco anos favoreceu significativamente o grupo de pacientes tratados de forma
combinada43.
Os resultados do CALGB 80101 foram recentemente apresentados. Este estudo comparou
tratamento adjuvante quimioterápico nos moldes do INT-0116 versus um esquema de quimioterapia
potencialmente mais efetivo, ECF (epirrubicina, cisplatina e 5-FU infusional), antes e após o esquema
combinado RXT + 5 FU infusional. A despeito do esperado, não houve diferença estatisticamente
significativa em SG ou SLD entre os dois grupos. Surpreendentemente, menor toxicidade foi
apresentada nos paciente do grupo experimental, podendo eventualmente justificar sua utilização44.
12.7.3. Tratamento Neoadjuvante
As premissas básicas dos tratamentos pré e perioperatórios residem na redução do estadiamento
do tumor, permitindo aumento das ressecções R0, e tratamento precoce de micro metástases.
Devemos lembrar que a maioria dos pacientes com câncer gástrico tem doença localmente
avançada no momento do diagnóstico e que muitas vezes o tempo de recuperação pós-operatório
pode adiar o início ao tratamento complementar.
Os resultados de dois estudos, MAGIC TRIAL e ACCORD 07 demonstraram benefícios com esta
estratégia. No primeiro 503 pacientes com adenocarcinoma gástrico potencialmente ressecável
(estádios II e IV MO) foram alocados em um braço com cirurgia exclusiva ou em um de tratamento
pré-operatório com 3 ciclos de ECF, seguidos de cirurgia e após 3 ciclos pós-operatórios com o
mesmo esquema. O braço combinado mostrou-se superior com ganho de SLP (HR 0.66, 95%IC
0,53-0,81, p<0.001) e de sobrevida global (HR:0.75, 95%IC 0.60-0.93, p=0.009). A sobrevida global
MANUAIS D E COND UTAS
| 243
em 5 anos foi de 36% vs 23%. A toxicidade grau 3 e 4 foi significativa, tanto hematológica como a
não hematológica (náuseas e vômitos), com um número significativo de pacientes (35%
aproximadamente) não recebendo o tratamento pós-operatório. Importante assinalar que não
houve diferença na morbidade cirúrgica entre os dois braços (45,7 versus 45,3%). Críticas foram
feitas em função da realização de cirurgias não padronizadas e estadiamento pré-operatório
inadequado, devido à ausência de laparoscopia, gerando assim um braço controle com desempenho
muito pobre 45.
Recentemente, pesquisadores franceses apresentaram os resultados do ACCORD 07 – FFCD
9703 com resultados semelhantes ao estudo MAGIC. Os pacientes tratados com 2 a 3 ciclos de QT
pré-operatórios, com cisplatina e FU infusional, seguidos de cirurgia e após 3 ou 4 ciclos do mesmo
esquema de QT, tiveram um aumento de 14% na sobrevida em 5 anos (38% vs 24%, HR 0.69 95%IC
0.5-0.95 p=0.02) e SLP de 34% versus 19% (HR 0.65, 95%IC 0.48-0.89, p=0.003) sobre os pacientes
tratados com cirurgia exclusiva 46.
12.7.4. Conclusão
Baseados nos dados apresentados, hoje podemos tratar os pacientes com câncer gástrico
não metastático com diferentes estratégias de tratamento, isto é, de forma neoadjuvante, ou
adjuvante, com quimioterapia isolada ou radioquimioterapia. Não existem estudos comparativos
que nos permitam dizer qual melhor escolha. A decisão deve levar em conta as condições logísticas
locais, como qualidade e capacidade de realização de exames pré-operatórios, capacidade de
realização de cirurgias adequadas, capacidade de realização de radioterapia de qualidade e preferência
dos pacientes e médicos assistentes. Outros trabalhos em desenvolvimento poderão nos auxiliar neste
processo de decisão. Relacionamos no quadro abaixo alguns estudos significativos em andamento.
Quadro 9 - Estudos de Fase III em Câncer Gástrico
Estudo
Dutch Colorectal
Cancer Group
(CRITICS)
EORTC
Universidade Kyoto,
Japão (completo)
Samsung Medical
Center (ARTIST)
Coreia do Sul
JCOG9206-2 Japão
(serosa-positivo)
(completo)
Desenho
Braço 1: pré-operatório 3 × ECC seguido de
cirurgia D1 seguido por cisplatina +
capecitabina pós-operatória com radiação
45Gy Braço 2: ECC seguido de cirurgia D1
seguido por mais 3 × ECC
Braço 1: 2 × cisplatina + 5-FU/LV préoperatório seguido de cirurgia Braço 2: cirurgia
isolada
Braço 1: cirurgia D2 seguida de S-1 Braço 2: 2 ×
S-1 + cisplatina pré-operatória seguida por
cirurgia seguido de S1
Braço 1: cirurgia seguida por capecitabine e
cisplatina Braço 2: cirurugia seguida por
capecitabina + cisplatina + radiação
Braço 1: cirurgia D2 seguida por cislatina
intraperitoneal intraoperatória seguida por
cisplatina e UFT pós-operatório Braço 2:
Cirurgia D2 isolada
Número Desfecho
Pacientes
788
SG
360
SG
100
SG
490
SLD
280
SG
IC, infusão contínua; SLD, sobrevida livre de doença; ECC, epirrubicina, cisplatina e capecitabina; SG, sobrevida global; UFT,
uracila + tegafur.
244 |
MA NUA IS D E CO ND UTAS
12.8. Tratamento do câncer gástrico avançado
Na doença irressecável, sejam localmente avançadas ou metastática, diversos esquemas de
quimioterapias já foram avaliados em primeira linha. Não existe hoje nenhum esquema de
tratamento que pode ser considerado como sendo o de escolha.
Destacamos 4 importantes estudos, que servem de orientação para decisão quanto ao
tratamento. Os dois primeiros estudos avaliam esquemas de quimioterapia. Os dois últimos avaliam
a incorporação de agentes biológicos.
12.8.1. Estudo V325
No estudo V325 de fase III 47, pacientes portadores de adenocarcinoma gástrico avançado
foram alocados para receber DCF (docetaxel 75mg/m2 – dia 1; cisplatina 75mg/m2 – dia 1 e 5-FU
750mg/m2/dia – dias 1 a 5 em infusão contínua) a cada 21 dias ou CF (cisplatina 100mg/m2 – dia
1 e 5-FU 1.000mg/m2/dia – dias 1 a 5 em infusão contínua) a cada 28 dias. Os resultados favoreceram
ao uso do esquema DCF, no que se refere à taxa de respostas, tempo para progressão, sobrevida
global mediana e sobrevida global em 1 e 2 anos (quadro 10).
Quadro 10 - Eficácia DCF vs CF
Parâmetros
Idade mediana, anos
Doença metastática (%)
TR (%)
TPP mediano, meses
SG mediana, meses
SG 1 ano (%)
SG 2 ano (%)
DCF (221 pts)
55
96
37
5,6
9,2
40
18
CF (224 pts)
55
97
25
3,7
8,6
32
9
P valor
0,01
< 0,001
0,02
-
TR: taxa de resposta global; TPP: tempo para progressão; SG: sobrevida global
Em relação à toxicidade, o esquema DCF apresentou mais eventos adversos graus 3 e 4 em
relação à diarreia e à neutropenia (quadro 10). Os casos de neutropenia complicada também foram
mais frequentes nos pacientes tratados com DCF. O uso de profilaxia secundária com fator
estimulante de crescimento de colônias de granulócitos (GCSF) reduziu o número de pacientes com
neutropenia complicada no braço tratado com DCF (27% vs 12%). Os pacientes com idade maior
que 65 anos apresentaram infecções graus 3 e 4 relacionadas ao tratamento de 20% e 9%,
respectivamente, para os braços DCF e CF.
Quadro 11 - Toxicidades DCF vs CF
Eventos Adversos, %
Graus 3/4 não hematológico
Estomatite
Diarréia
Náuseas
Vômitos
Anorexia
Neurotoxicidade
DCF (221 pts)
CF (224 pts)
21
19
14
14
10
8
27
8
17
17
9
3
Qualquer neutropenia febril e/ou neutropenia com infecção
MANUAIS D E COND UTAS
Eventos Adversos, %
Graus 3/4 hematológico
Anemia
Trombocitopenia
Neutropenia
Neutropenia complicada*
Morte por toxicidade
DCF (221 pts)
CF (224 pts)
18
8
82
29
3,6
26
13
57
12
5,4
| 245
Qualquer neutropenia febril e/ou neutropenia com infecção
A escolha dos pacientes para receber o regime DCF deve ser cuidadosa e criteriosa,
obviamente dando-se preferência a pacientes com bom desempenho clínico e funções renal,
nutricional e hematológica adequadas. A idade dos pacientes deve ser levada em consideração,
bem como o uso de GCSF.
Na tentativa de diminuir a toxicidade e tornar o esquema DCF em regime mais tolerável, vários
trabalhos com redução de doses de docetaxel (60mg/m2), fluorouracil (500 e 600mg/m2),
diminuição no tempo de infusão de 5 para 4 dias e diminuição da dose de cisplatina ou sua
substituição por oxaliplatina tem sido publicadas. Estas modificações diminuíram a toxicidade sem
reduzir a eficácia do esquema 48.
12.8.2. Estudo rEAL-2
No estudo de Fase III REAL-249, foram avaliados 1002 pacientes com diagnóstico de adenocarcinoma,
carcinoma de células escamosas ou carcinoma indiferenciado do esôfago, junção gastroesofágica
ou estômago, como doenças localmente avançadas e inoperáveis ou metastáticas. A partir do
esquema padrão ECF, as substituições de 5-FU por capecitabina e de cisplatina por oxaliplatina
foram avaliadas. Dessa forma, quatro esquemas de quimioterapia foram utilizados neste estudo,
com um desenho de não inferioridade para sobrevida global (quadro 12).
Quadro 12 - Esquemas de quimioterapias utilizadas no estudo rEAL-2
ECF (n=249)
ECX (n=241)
Epirrubicina: 50mg/m2 IV a cada 3 semanas Epirrubicina: 50mg/m2 IV a cada 3 semanas
Cisplatina: 60mg/m2 IV a cada 3 semanas
Cisplatina: 60mg/m2 IV a cada 3 semanas
2
5-FU: 200mg/m /dia IV continuamente
Capacitabina: 625mg/m2 2x/dia VO continuamente
EOF (n=235)
EOX (n=239)
Epirrubicina: 50mg/m2 IV a cada 3 semanas Epirrubicina: 50mg/m2 IV a cada 3 semanas
Oxaliplatina: 130mg/m2 IV a cada 3 semanas Oxaliplatina: 130mg/m2 IV a cada 3 semanas
5-FU: 200mg/m2/dia IV continuamente
Capacitabina: 625mg/m2 2x/dia VO
continuamente
Neste estudo, o hazard ratio (HR) para óbito não corrigido para a comparação de não
inferioridade de capecitabina com 5-FU foi de 0,86 (IC 95% 0,80-0,99); para a comparação entre
oxaliplatina e cisplatina o HR foi de 0,92 (IC 95% 0,80-1,10). Os dois HR apresentaram valores abaixo
de 1,23, confirmado que a capecitabina e a oxaliplatina foram não inferiores, na comparação dois
por dois. O grupo EOX se destacou em relação aos desfechos clínicos, com uma sobrevida global
mediana de 11,2 meses, quando comparada com os 9,9 meses do grupo ECF (quadro 13).
246 |
MA NUA IS D E CO ND UTAS
Quadro 13 - Eficácia entre os grupos de tratamento
Desfechos
TR (%)
SLP mediana, meses
SG mediana, meses
SG 1 ano (%)
ECF (n=263)
40,7
6,2
9,9
37,7
ECX (n=250)
46,4
6,7
9,9
40,8
EOF (n=245)
42,4
6,5
9,3
40,4
EOX (n=244)
47,9
7,0
11,2
46,8
TR: taxa de resposta global; SLP: sobrevida livre de progressão; SG: sobrevida global
Em relação às toxidades, quando comparado com a cisplatina, a oxaliplatina foi associada a
menos eventos de neutropenia graus 3 e 4, bem como alopecia, porém significativamente mais
diarreia e neurotoxicidade graus 3 e 4. Os pacientes que fizeram tratamento com oxaliplatina
apresentaram menor elevação dos níveis de creatinina graus 1 e 2 (p=0,003), bem como menor
número de eventos tromboembólicos (p<0,001), quando comparados com os pacientes que
fizeram uso de cisplatina.
Quadro 14 - Toxicidades de cada grupo de tratamento
Eventos Adversos, %
Graus 3/4 não hematológico
Estomatite
Diarréia
Náuseas e vômitos
Síndrome mão-pé
Alopecia
Neurotoxicidade
Graus 3/4 hematológico
Anemia
Trombocitopenia
Neutropenia
Neutropenai febril
Morte antes 60 dias
EOF (n=225) EOX(n=227)
ECF(n=234)
ECX (n=234)
1,3
2,6
10,2
4,3
44,2
0,4
1,7
5,1
7,7
10,3
47,4
1,7
4,4
10,7
13,8
2,7
27,7
8,4
2,2
11,9
11,4
3,1
28,8
4,4
13,1
4,7
41,7
9,3
7,2
10,5
4,8
51,1
6,7
5,6
6,5
4,3
29,9
8,5
5,7
8,6
5,2
27,6
7,8
6,1
Dessa forma, a substituição do 5-FU pela capecitabina, bem como da cisplatina pela
oxaliplatina são estratégias interessantes na busca de menores toxicidades, bem como de resolver
dificuldades de alguns centros na realização de tratamentos infusionais.
12.8.3. Estudo AVAGAST
No Congresso da Sociedade Americana de Oncologia (ASCO), em 2010 50, o estudo AVAGAST
foi apresentado. Neste estudo, 774 pacientes com câncer gástrico irressecável, localmente avançado
ou metastático, foram submetidos ao tratamento com XP (capecitabina 1000mg/m2 2x/dia por 14
dias; cisplatina 80mg/m2), com ou sem bevacizumabe (7,5mg/m2), em ciclos a cada 3 semanas (XP
ou XPB). Apesar de o grupo XPB ter alcançado maior estimativa da mediana da SG quando
comparado ao grupo XP (12,1 vs 10,1 meses), não se observou diferença estatística (HR: 0,87;
p=0,1). Não obstante, os objetivos secundários foram alcançados, com um aumento da taxa de
resposta (37 versus 46%, p=0,0315) e sobrevida livre de progressão (5,3 versus 6,7 meses, p=0,0037
HR 0,8) favorecendo o braço XPB.
Na análise de subgrupos, os autores perceberam que os pacientes do continente americano
apresentaram um grande benefício em SG (11,5 vs 6,8 meses; HR 0,63; IC 95% 0,43-0,94). O mesmo
MANUAIS D E COND UTAS
| 247
foi observado com a SLP (5,9 vs 4,4 meses, HR 0,65; IC95% 0,46-0,93). Os pacientes do continente
americano possuíam maior freqüência de tumores da junção gastro-esofágica, bem como maior
proporção de casos com metástase hepática, quando comparado com o subgrupo de pacientes
asiáticos. Outra questão importante, para justificar a diferença em SG com diferença estatística
nesse subgrupo, foi o fato de que apenas 21% dos pacientes foram tratados em segunda linha,
quando comparado com os 66% dos pacientes asiáticos. Diferenças genéticas também podem
estar relacionadas.
Em relação à toxicidade, os eventos graus 3 e 4 foram semelhantes, exceto pela diarreia (4%
vs 8%) e hipertensão (<1% vs 6%), mais freqüente no grupo XPB. Os demais eventos comuns em
pacientes tratados com bevacizumabe, como proteinúria, eventos tromboembólicos, dificuldade
de cicatrização e perfuração possuíram freqüências aceitáveis. Entretanto, devido à falha em se
demonstrar ganho na sobrevida global, a adição de bevacizumabe ainda não deve ser recomendada
fora do escopo de um estudo clínico.
12.8.4. Estudo ToGA
Para avaliação do papel do trastuzumabe no tratamento do câncer gástrico com alta
expressão ou com amplificação de HER-2, o estudo ToGA 22 foi realizado. Neste estudo, 3.803
pacientes foram submetidos à pesquisa de HER-2, sendo que apenas 22% dos pacientes puderam
participar do estudo devido à análise dos blocos por imunohistoquímica (IHQ) ou FISH. Destes, 584
pacientes foram submetidos ao tratamento com cisplatina 80mg/m2, fluoropirimidina (capecitabina
1000mg/m2 2x/dia por 14 dias ou 5-FU 800mg/m2/dia por 5 dias), associado ou não ao trastuzumabe
(8mg/kg no primeiro ciclo, seguido de 6mg/kg) em ciclos de 3 semanas. Foram considerados
positivos para HER-2, os pacientes que apresentaram 3+ na IHQ ou amplificação por FISH.
Com um seguimento mediano de 18,6 meses para o grupo de trastuzumabe mais quimioterapia
e 17,1 meses para o grupo de quimioterapia isolada, observou-se um aumento na taxa de resposta
objetiva (47 vs 35%, p=0,0017), assim como na SG em favor do braço com trastuzumabe (13,8 vs
11,1 meses, HR 0,74; 95%IC 0,60-0,91 p=0,0046). Na análise de subgrupos, os pacientes com alta
expressão de HER-2 (IHQ 2+/FISH+ ou IHQ 3+) apresentaram a melhor mediana de SG, de 16 meses,
quando comparado com o grupo de pacientes que fizeram quimioterapia isolada, que
apresentaram mediana de SG de 11,8 meses.
Em relação às toxicidades graus 3 e 4, náuseas, vômitos, neutropenia e diarreia foram os
eventos mais freqüentes no estudo, porém sem diferença estatística entre os grupos de tratamento.
As toxicidades esperadas com a adição de trastuzumabe, como reações infusionais e insuficiência
cardíaca foram pouco freqüentes. Este estudo estabeleceu assim o uso de trastuzumabe em
combinação com quimioterapia (cisplatina e fluoropirimidina) como um novo padrão em pacientes
com tumor HER-2 positivo.
12.8.5. Outras alternativas de 1ª linha
Outros esquemas têm sido utilizados no tratamento paliativo do câncer gástrico avançado. O
esquema FOLFIRI foi comparado com esquema de cisplatina e fluorouracil, em estudo fase III, e
mostrou-se não inferior e menos tóxico. Embora a sobrevida mediana fosse semelhante nos 2
braços (9 meses no braço FOLFIRI vs 8,7 meses no CF), mais pacientes descontinuaram o tratamento
por toxicidade no esquema com cisplatina (CF 21,5% vs 10% FOLFIRI).
Irinotecano também foi associado à cisplatina (IC), mas estudo fase II mostrou que esta
associação teve menor taxa resposta e tempo para progressão quando comparada ao FOLFIRI.
Críticas foram feitas quanto às doses utilizadas no esquema IC. Esta pode ser alternativa para
pacientes com intolerância ao fluorouracil.
Outro esquema bastante estudado de Fase II é o esquema FOLFOX. Estudos mostraram taxas
de resposta de aproximadamente 50%, com tempo para progressão de 5 a 6 meses e sobrevida
248 |
MA NUA IS D E CO ND UTAS
mediana de 10 a 12 meses. Esquema associando capacetabina e oxaliplatina também pode ser
utilizado em pacientes com capacidade de ingestão de comprimidos 3.
12.8.6. Tratamento de segunda linha
Até recentemente, ganhos de sobrevida não haviam sido demonstrados com quimioterapia
após progressão de doença. O benefício em sobrevida com quimioterapia de segunda linha foi
demonstrado recentemente em um pequeno estudo de fase III, o qual foi fechado precocemente
devido ao baixo recrutamento de pacientes. Foram randomizados 40 pacientes para o tratamento
com irinotecano em monoterapia ou suporte clínico exclusivo. A sobrevida mediana favoreceu o
uso do irinotecano: 123 dias comparado com 72,5 dias para o tratamento suportivo (HR 2,85, IC
95%IC1,41-5,79 p=0,0027). Também houve melhora dos sintomas associados ao tumor em 44% dos
pacientes tratados com irinotecano comparado a 4% dos pacientes em suporte clínico exclusivo (51).
Em 2011, estudo randomizado de fase III comparou tratamento de 2ª linha com docetaxel 60mg/m2
a cada 3 semanas ou irinotecano 150mg/m2 a cada 2 semanas contra tratamento de suporte. O
estudo incluiu 202 pacientes com PS 0 ou 1 e demonstrou benefício de sobrevida (5,1 vs 3,8meses,
HR 0.63 95%IC 0.47-0.86 p=0.004). O benefício ocorreu independentemente da droga utilizada e
mostrou significativo em todos os subgrupos analisados. Importante assinalar que 44% dos
pacientes tiveram condições de receber um tratamento de terceira linha 52.
A escolha por uma segunda ou mesmo terceira linha de tratamento deve sempre ser
individualizada e deve se basear na seleção cuidadosa dos casos, levando-se em consideração o
índice de desempenho, resposta à primeira linha, histórico de drogas utilizadas e volume de doença
metastática. Pacientes com doença pouco responsiva à primeira linha, baixo desempenho clínico
e maior volume de doença metastática têm baixa chance de obter benefício e podem apresentar
toxicidade cumulativa dos tratamentos.
12.8.7. Tratamento com quimioterapia intraperitoneal
Alguns centros utilizam-se da quimioterapia intraperitoneal, quando do diagnóstico de
carcinomatose peritoneal nos pacientes com câncer gástrico, sem doença à distância. A quimioterapia
intraperitoneal pode ser aplicada utilizando-se a técnica de hipertermoterapia, com o objetivo de
citorredução pré-operatória. Não existem estudos randomizados bem desenhados para responder
se essa modalidade terapêutica pode ser utilizada de forma ampla. De qualquer forma, pacientes
selecionados vem sendo tratado em centros mais experientes, com relatos de respostas objetivas.
Não recomendamos a utilização dessa técnica fora de ensaios clínicos.
12.9. Perspectivas futuras
Dentre os potenciais biomarcadores que poderiam ser avaliados como alvos-moleculares, a
superexpressão de EGFR e de HER-2 parecem ser mais viáveis de serem explorados, devido a sua
maior freqüência nos tumores gástricos (quadro 15).
Quadro 15 - Potências biomarcadores e suas respectivas freqüências em câncer gástrico
Biomarcador
Mutação KRAS
Mutação BRAF
Superexpressão de EGFR
Mutação de EGFR
Superexpressão de HER-2
Freqüência
5-10%
< 5%
50-80%
Muito baixa
10-25%
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| 249
Dessa forma, estudos explorando o bloqueio combinado das duas vias iniciadas pelos
receptores epidérmicos estão sendo realizados. Dentre os estudos, destacamos o estudo LOGIC,
em que pacientes com adenocarcinoma gástrico, de junção ou de esôfago, com superexpressão de
HER-2, estão sendo recrutados para receberem tratamento com quimioterapia (capecitabina e
oxaliplatina) associado ao lapatinibe, que possui ação nos receptores de EGFR e HER-2.
Aguardamos a avaliação de novas drogas com ação antiangiogênica, bem como anti-EGFR e
anti-HER-2 com seleção por região continental, devido às diferenças encontradas entre os pacientes
americanos, europeus e asiáticos.
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MA NUA IS D E CO ND UTAS
MANUAIS D E COND UTAS
Capítulo 13
Câncer de Canal Anal
Editor: Dr. Alexandre Pieri Chiari
Autores: Dr. Henrique de Lins e Horta e Dr. Luiz Flávio Penna Coutinho
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Capítulo 13
Câncer de Canal Anal
13.1. Introdução
O carcinoma de células escamosas de canal anal é uma neoplasia maligna incomum e
representa apenas uma pequena percentagem (2%) de todos os cânceres do trato digestivo.
Nas últimas décadas, observou-se um aumento da incidência deste tipo de tumor, especialmente
em mulheres. Esta tendência acompanha a crescente disseminação das infecções por HPV e HIV,
fatores de risco para a doença. Outros fatores, tais como o coito anal receptivo, número elevado
de parceiros sexuais e tabagismo, também são considerados fatores de risco para a doença.
O câncer anal é um tumor de bom prognóstico, sendo geralmente curável.
Os fatores prognósticos mais importantes são o tamanho, o grau de diferenciação, o local de
ocorrência (canal anal medial ou lateral, margem anal) e a presença de metástases inguinais
sincrônicas.
13.1.1 Histologia
Gostaríamos apenas de ressaltar a importância da caracterização histológica destes tumores.
A região anal é fonte de diversas neoplasias distintas, apesar de raras.
O adenocarcinoma da região anal é um tumor de evolução similar ao adenocarcinoma de
reto e deve ser tratado como tal.
Outro diagnóstico diferencial importante é a dos carcinomas de pele da margem anal. Estes
carcinomas espinocelulares da região perineal são tumores de pele, sendo tratados desta maneira.
Esta diferenciação nem sempre é simples.
A doença de Bowen (CEC in situ), doença de Paget (adenocarcinoma intracelular) e o melanoma
são outros tumores mais comuns presentes na região anal.
13.2. Estadiamento
13.2.1. Como Estadiar
Historicamente, o estadiamento do tumor de canal anal era cirúrgico. Com a progressiva
substituição da amputação abdominoperineal pelo tratamento radio e quimioterápicos, a avaliação
clínica ganhou importância.
Na realização do estadiamento é fundamental exame proctológico minucioso, incluindo o
exame da região inguinal. Nas mulheres, indica-se também o exame ginecológico de rotina e
realização do esfregaço cervical. Os exames de imagem incluem tomografia (TC) de abdome e
pelve (ou ressonância nuclear magnética (RNM), além de TC de Tórax.
Não acreditamos que o PET-TC seja exame de rotina no estadiamento. A maior referência da
literatura com o exame como parte do estadiamento consiste de uma série de casos de 61
pacientes, onde o PET alterou conduta em apenas 2% dos pacientes e alterou o campo de
radioterapia em 13%. A recomendação do NCCN não inclui o PET como exame de rotina. 2,3
OBS : Metástases à distância são incomuns ao diagnóstico inicial (< 15%).
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13.2.2. Estadiamento AJCC1
Definição TNM
Tumor primário (T)
• TX: Tumor primário não pode ser avaliado
• T0: Sem evidência de tumor primário
• Tis: Carcinoma in situ
• T1: Tumor até 2cm
• T2: Tumor maior que 2cm mais não maior que 5cm
• T3: Tumor maior que 5cm
• T4: Tumor de qualquer tamanho que invade estruturas adjacentes ex, vagina, uretra, bexiga.
Linfonodos regionais (N)
• NX: Linfonodos regionais não podem ser avaliados
• N0: Sem acometimento linfonodal
• N1: Metástases em linfonodos periretais
• N2: Metástase(s) em linfonodo(s) unilateral(is) ilíaco(s) interno(s) e/ou inguinal(is)
• N3: metástase(s) em linfonodo(s) perirretal(is) e inguinal(is) e/ou ilíaco(s) interno(s) e/ou
inguinal(is) bilateral(is)
Metástases a distância (M)
• MX: Metástases à distância não pode ser avaliado
• M0: Sem metástases à distância
• M1: Com metástases à distância
Estádio 0
• Tis, N0, M0
Estádio I
• T1, N0, M0
Estádio II
• T2, N0, M0
• T3, N0, M0
Estádio IIIA
• T1, N1, M0
• T2, N1, M0
• T3, N1, M0
• T4, N0, M0
Estádio IIIB
• T4, N1, M0
• Qq T, N2, M0
• Qq T, N3, M0
Estádio IV
• Qq T, qq N, M1
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13.3. Tratamento da Doença inicial
13.3.1. Neoplasia intraepitelial
A tendência atual da abordagem destas lesões segue o racional da abordagem da doença do
colo do útero, devido à ligação de ambas com a infecção pelo HPV. Há quem preconize hoje o
rastreamento em populações selecionadas e a divisão destas lesões em baixo e alto grau.
As possibilidades de abordagem são variadas, desde a quimioterapia tópica até a coagulação
ou ablação locais.
13.3.2. Tratamento da doença localizada
O objetivo do tratamento nestes casos, além da resolução da lesão, é a preservação do
esfíncter anal. O padrão de tratamento nestes casos é a associação entre radioterapia e quimioterapia.
OBS: as lesões muito iniciais (carcinoma in situ e estádio I) podem também ser abordadas
cirurgicamente (excisão local). Nestes casos, os tumores não devem acometer mais da metade da
circunferência anal, visto que nesta situação a preservação esfincteriana seria improvável (os dados
destes estudos incluem tumores da margem anal e tumores escamocelulares de pele da região perianal).
13.3.3. Esquema de Nigro
O esquema mais utilizado é a associação de radioterapia com o uso concomitante de
mitomicina (doses de 10 a 15mg/m2 D1) e fluorouracil (1000mg/m2 infusão contínua D1 a D4 e
D29 a 32). Este é o esquema preconizado na publicação de Nigro e colaboradores de 1974, que
ficou conhecido como o protocolo de Wayne State.4
Dois estudos randomizados subsequentes corroboraram o uso deste esquema quimioterápico.
Um estudo do UKCCCR (585 pacientes aleatorizados para radioterapia isolada ou radioterapia em
combinação com mitomicina 12mg/m2 D1 e fluorouracil em infusão contínua 1000mg/m2 D1 ao
D4 ou 750mg/m2 D1 ao D5 na primeira e última semana da radioterapia) 5 e outro estudo do EORTC
(110 pacientes randomizados de forma similar com a mitomicina na dose de 15mg/m2) 6 mostraram
sobrevida global semelhante entre os braços, mas com melhora do controle local com a terapia
combinada (houve menor taxa de recorrência local e melhor taxa de sobrevida livre de colostomia
em favor da quimioterapia). Em um destes estudos, o benefício do tratamento combinado se
manteve mesmo após 13 anos de seguimento.7
Devido a toxicidade do tratamento combinado, o NCCN preconiza o esquema de Nigro modificado
com mitomicina 10mg/m2 e fluorouracil 1000mg/m2 D1 a D4 como tratamento quimioterápico padrão.2
Para pacientes muito idosos, um estudo avaliou o tratamento com fluorouracil isolado
600mg/m2 no D1-4 concomitante à radioterapia. Em um segmento mediano de 16 meses foi
observada uma taxa de sobrevida doença específica de 86%.21
13.3.4. Papel da Cisplatina
O estudo do RTOG 98-11 comparou diretamente 644 pacientes aleatorizados para radioterapia
associada ao esquema de Nigro (com dose de 10mg/m2 de mitomicina nas semanas 1 e 5 de
radioterapia) ou radioterapia associada a quimioterapia com cisplatina e fluorouracil (Cisplatina
75mg/m2 D1 e 5-Fluorouracil 1000mg/m2 D1 a D4 com dois ciclos usuais concomitantes a radioterapia
mais dois ciclos pós tratamento combinado). Não houve diferença entre os grupos com relação a
sobrevida livre de doença e sobrevida global (60% x 54% e 75% x70% para braço da mitomicina e
cisplatina respectivamente). O grupo com uso do esquema Nigro apresentou menores taxas de
colostomia (10% x 19%, p=0,02) e maiores taxas de toxicidade hematológica (p<0,001). 8
Um segundo estudo (ACT - II) está novamente comparando o uso de cisplatina no lugar da
mitomicina na abordagem destes pacientes. Análise interina apresentada na ASCO de 2009 não
mostrou diferenças significativas quanto a eficácia ou toxicidade entre os dois tratamentos. 9
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13.3.5. Tratamento da doença alto risco - localmente avançada (T3-4 N2-3)
O tratamento padrão segue as diretrizes dos tumores de baixo risco.
Mas achamos importante destacar um estudo fase II do CALGB onde foi sugerido um benefício
nos pacientes de doença de alto risco (T3 ou T4 ou N2 volumoso ou N3) com o tratamento de dois
ciclos de indução com cisplatina (100mg/m2 D1 e D29) e fluorouracil (1000mg/m2 D1-4 e D29-32),
seguido de dois ciclos de mitomicina (10mg/m2 D29 e D57) + fluorouracil (1000mg/m2 D29-33 e
D57-60) concomitantes à radioterapia. Na semana 17 ou 18 do tratamento os pacientes eram
restadiados e, nos casos de doença residual clínica ou patológica no sítio primário ou nos casos
inicialmente N2 volumosos ou N3, o tratamento era seguido de um novo ciclo de cisplatina
100mg/m2 + fluorouracil 800mg/m2 D1-5. A taxa de resposta completa foi de 82% e 50% dos casos
permaneceram livres de colostomia.10
Estes resultados contrastam com o do estudo do RTOG 98-11, em que o grupo que recebeu
o tratamento de indução com cisplatina e fluorouracil evoluiu com um intervalo livre de colostomia
inferior.8 Atualização deste estudo na ASCO 2011 demonstra que a quimioterapia com mitomicina
e fluoroural é superior a cisplatina e fluorouracil em termos de sobrevida livre de doença e
sobrevida global ( 67,7% x 57,6% em 5 anos ).
13.4. Tratamento da Doença avançada
13.4.1. Tratamento da doença recorrente e da doença persistente
13.4.1.1. Doença recorrente
As recorrências locais dos pacientes tratados com quimiorradioterapia podem ser resgatadas
com o tratamento cirúrgico. Para os casos tratados inicialmente com cirurgia, as recorrências podem
ser tratadas com quimiorradioterapia conforme já descrito.
13.4.1.2. Doença persistente
A avaliação da resposta geralmente é realizada em aproximadamente 6 a 8 semanas após a
conclusão da quimiorradioterapia, havendo ainda controvérsias se esta avaliação deve ser apenas
clínica ou se acompanhada de biópsias. Como pode haver regressão das lesões por até cerca de 3
a 12 meses após o término do esquema combinado, o paciente deve ser examinado a cada 6
semanas desde o término da quimiorradioterapia.11
• Em caso de lesão residual suspeita, deve ser realizada biópsia. No caso de progressão de
doença ou doença persistente, recomenda-se a ressecção abdominoperineal.
• No estudo RTOG-87-04, em um grupo de pacientes, foi avaliada a radioterapia de resgate
(9Gy) concomitante à cisplatina 100mg/m2 + fluorouracil 1000mg/m2 D1-4) nos casos de doença
persistente após o tratamento quimiorradioterápico com mitomicina + fluorouracil. Após este
tratamento, cerca de 50% dos pacientes permaneceram sem cirurgia por um segmento de 3 anos,
indicando que, em alguns pacientes, ainda é possível a realização de um outro tratamento com
preservação do esfíncter.12
• Nos casos de ausência de lesão residual, a biópsia para se comprovar doença persistente é
controversa. Não há dados consistentes na literatura de que a abordagem cirúrgica de resgate, se
realizada precocemente, implique em ganho de sobrevida ao paciente. A conduta expectante
nestes casos é uma alternativa razoável, desde que o paciente seja seguido adequadamente.
13.4.2. Tratamento da doença metastática
O esquema com dados mais robustos na literatura é o da combinação de cisplatina e fluorouracil.
A combinação cisplatina 100mg/m2 no D1 e 5-fluorouracil 1000mg/m2 do D1 ao D4 a cada 21 dias
MANUAIS D E COND UTAS
| 259
é o padrão de tratamento na doença metastática. Sugere-se 4 a 6 ciclos de tratamento até melhor
resposta clínica ou toxicidade inaceitável.13,14 Uma opção aceitável é o retratamento com
mitomicina + fluorouracil.
Não há dados prospectivos com o uso de outras combinações terapêuticas. Entretanto, no
nosso entendimento, acreditamos que pacientes com bom performance status e que responderam
ao tratamento inicial podem ser candidatos a um esquema de segunda linha.
Existem pequenos estudos que sugerem alguma atividade com carboplatina15, doxorrubicina16,
cetuximabe (para os pacientes sem mutação do k-ras)17, irinotecano18 e taxanos19. Um pequeno
estudo avaliou a combinação de mitomicina+doxorrubicina+cisplatina seguida de bleomicina
+CCNU, sendo um esquema com uma toxicidade expressiva.20
13.4.2.1. Situações especiais
Os pacientes com metástases hepáticas isoladas ou com recidiva isolada em linfonodos paraaórticos constituem desafios terapêuticos. Séries de casos sobre estes pacientes indicam possibilidade
de sobrevida a longo prazo com tratamentos mais agressivos.
Tanto no caso de metástases hepáticas (cirurgia ou radioablação) ou de recidivas em linfonodos
para-aórticos (radioterapia local concomitante a quimioterapia), não há critérios de seleção para
indicação dos tratamentos de resgate. A individualização de conduta na busca de tratamentos
mais agressivos deve ser partilhada com os pacientes.
13.5. Seguimento clínico
Não há dados prospectivos que definem a melhor maneira de se conduzir o seguimento destes
pacientes. De acordo com o NCCN, os pacientes com resposta completa ao tratamento inicial devem
ser avaliados a cada 3 a 6 meses por 5 anos. O exame deve incluir toque retal, anuscopia e a palpação
de linfonodos inguinais. Sugere-se imagem anual (tórax, abdome e pelve) nos primeiros 3 anos. 2
Para os pacientes que necessitaram da amputação cirúrgica de resgate, mantêm-se a sugestão
de imagem nos primeiros 3 anos e de exame local inguinal.
Bibliografia Sugerida
1. AJCC - American Joint Committee on Cancer. Cancer Staging Manual, 7th ed, Edge, SB, Byrd, DR,
Compton, CC, et al (Eds), 2010, Chicago IL.
2. National Comprehensive Cancer Network. NCCN Clinical Practice Guidelines in
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3. Winton, E, Heriot, AG, Ng, M, et al. The impact of 18-fluorodeoxyglucose positron emission
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100:693.
4. Nigro ND, Vaitkevicius VK, Considine B, Jr. Combined therapy for cancer of the anal canal: a
preliminary report. Dis Colon Rectum. 1974; 17(3): 354.
5. Epidermoid anal cancer: results from the UKCCCR randomised trial of radiotherapy alone versus
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superior to radiotherapy alone in the treatment of locally advanced anal cancer: results of a
phase III randomized trial of the European Organization for Research and Treatment of Cancer
Radiotherapy and Gastrointestinal Cooperative Groups. J Clin Oncol. 1997; 15(5): 2040.
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7. Northover J, Glynne-Jones R, Sebag-Montefiore D, et al. Chemoradiation for the treatment of
epidermoid anal cancer: 13-year follow-up of the first randomised UKCCCR Anal Cancer Trial
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2008; 299:1914.
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or cisplatin, with or without maintenance cisplatin/5FU in squamous cell carcinoma of the anus
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http://www.asco.org/ASCOv2/Meetings/Abstracts? & vmview=abst_detail_view & confID=65
& abstractID=30894, accessed July 27, 2009).
10. Meropol NJ, Niedzwiecki D, Shank B, et al. Induction therapy for poor-prognosis anal canal
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MANUAIS D E COND UTAS
| 261
Capítulo 14
Câncer de Esôfago e
Junção Esofagogástrica
Editor: Dr. Alexandre Andrade dos Anjos Jácome
Autores: Dr. Alexandre Andrade dos Anjos Jácome, Dr. Antônio Talvane Torres de Oliveira, Dr. Bruno
dos Santos Vilhena Pereira, Dr. Fabiano Hahn Souza, Dr. Gilberto Fava, Dr. Luciano de Souza Viana,
Dr. Marcus Castilho, Dr. Markus Andret Cavalcante Gifoni e Dr. Ricardo Nakamura
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MA NUA IS D E CO ND UTAS
MANUAIS D E COND UTAS
| 263
Capítulo 14
Câncer de Esôfago e Junção Esofagogástrica
14.1. Introdução
O câncer de esôfago compreende os subtipos histológicos escamocelular (CEC) e adenocarcinoma.
Por se tratarem de carcinomas com patogênese e comportamento biológico distintos, seria
esperada uma abordagem terapêutica individualizada. No entanto, ainda não há uma clara
distinção nas recomendações de tratamento conforme a histologia.
Observa-se, nas últimas décadas, uma mudança de paradigma no tratamento do câncer de
esôfago. Uma doença de exclusivo tratamento cirúrgico passou a ter a quimioradioterapia como
real opção de tratamento. No entanto, a despeito da incorporação de novas estratégias de
tratamento, houve apenas um modesto incremento nas taxas de sobrevida 1. Mas com o crescente
conhecimento acerca da biologia molecular da doença, com a possibilidade do uso de anticorpos
monoclonais, e com a classificação TNM apresentando o estadiamento de acordo com a histologia,
é possível que estejamos iniciando um momento de maior individualização terapêutica.
14.2. Exames de Estadiamento e Avaliação Inicial
A avaliação inicial e estadiamento dos pacientes iniciam-se com endoscopia digestiva alta (EDA)
com biópsia. Após o diagnóstico histológico, recomenda-se que se realize apenas tomografia
computadorizada (TC) de tórax e abdome superior para pesquisa de doença metastática. Na ausência
de metástases à distância, deve-se concluir a avaliação com broncoscopia para tumores localizados
acima e ao nível da carina e ecografia endoscópica, para programação cirúrgica 2-4. O PET-CT apresentase como uma opção para o estadiamento, visto que possui maior sensibilidade para a detecção de
doença metastática, com possível vantagem sobre a TC para metástases ocultas5. Caso trata-se de
adenocarcinoma de esôfago distal ou junção esofagogástrica (JEG) com metástases à distância,
recomenda-se pesquisa de expressão/amplificação de HER2 em espécime cirúrgico ou de biópsia.
14.3. Estadiamento TNM6
Tumor primário (T)
• TX: Tumor primário não pode ser acessado
• T0: Sem evidência de tumor primário
• Tis: Displasia de alto grau
• T1: Tumor invade lâmina própria, muscular da mucosa ou submucosa
T1a: Tumor invade lâmina própria ou muscular da mucosa
T1b: Tumor invade submucosa
• T2: Tumor invade muscular própria
• T3: Tumor invade adventícia
• T4: Tumor invade estruturas adjacentes
T4a: Tumor ressecável invadindo pleura, pericárdio e diafragma
T4b: Tumor irressecável invadindo outras estruturas adjacentes, como aorta, corpo vertebral,
traqueia, etc.
264 |
MA NUA IS D E CO ND UTAS
Linfonodos regionais (N)
• NX: Linfonodos regionais não podem ser acessados
• N0: Sem evidência de tumor primário
• N1: Metástases em 1-2 linfonodos regionais
• N2: Metástases em 3-6 linfonodos regionais
• N3: Metástases em 7 ou mais linfonodos regionais
Metástases a distância (M)
• M0: Sem metástases à distância
• M1: Com metástases à distância
Carcinoma de células escamosas*
Estádio
0
IA
IB
IIA
IIB
IIIA
IIIB
IIIC
IV
T
Tis
T1
T1
T2-3
T2-3
T2-3
T2-3
T1-2
T1-2
T3
T4a
T3
T4a
T4b
Qualquer
Qualquer
N
N0
N0
N0
N0
N0
N0
N0
N1
N2
N1
N0
N2
N1-2
Qualquer
N3
Qualquer
M
M0
M0
M0
M0
M0
M0
M0
M0
M0
M0
M0
M0
M0
M0
M0
M1
Grau
1, X
1, X
2-3
1, X
1, X
2-3
2-3
Qualquer
Qualquer
Qualquer
Qualquer
Qualquer
Qualquer
Qualquer
Qualquer
Qualquer
Localização**
Qualquer
Qualquer
Qualquer
Inferior, X
Superior, Médio
Inferior, X
Superior, Médio
Qualquer
Qualquer
Qualquer
Qualquer
Qualquer
Qualquer
Qualquer
Qualquer
Qualquer
* Ou histologia mista incluindo um componente escamoso
** Localização do tumor primário é definida como a posição do limite superior (proximal) do tumor no esôfago
Adenocarcinoma
Estádio
0
IA
IB
IIA
IIB
IIIA
IIIB
IIIC
IV
T
Tis
T1
T1
T2
T2
T3
T1-2
T1-2
T3
T4a
T3
T4a
T4b
Qualquer
Qualquer
N
N0
N0
N0
N0
N0
N0
N1
N2
N1
N0
N2
N1-2
Qualquer
N3
Qualquer
M
M0
M0
M0
M0
M0
M0
M0
M0
M0
M0
M0
M0
M0
M0
M1
Grau
1, X
1-2, X
3
1-2, X
3
Qualquer
Qualquer
Qualquer
Qualquer
Qualquer
Qualquer
Qualquer
Qualquer
Qualquer
Qualquer
MANUAIS D E COND UTAS
| 265
14.4. Abordagem Terapêutica
14.4.1. Estádio 0
Tratamento endoscópico
A ressecção mucosa endoscópica (EMR) ou a dissecção submucosa endoscópica (ESD) estão
indicadas em lesões superficiais que invadem até a lâmina própria, com diâmetro menor que 3cm,
com envolvimento circunferencial menor que ¾, com até quatro lesões e que se localizam em terço
médio e inferior da parede póstero-lateral do órgão 7. Lesões com invasão da muscular da mucosa
e terço superior da submucosa, com diâmetro maior que 3cm, com envolvimento circunferencial
maior que ¾, com mais de 4 lesões e localizadas em terço superior e porção abdominal da parede
anterior do órgão possuem indicação relativa para o procedimento endoscópico (7). Ainda não há
ensaios clínicos randomizados que compararam ressecção endoscópica com esofagectomia em
carcinomas precoces do esôfago. Dados retrospectivos demonstram que o tratamento endoscópico
oferece eficácia e segurança na abordagem destas lesões, devendo ser realizado preferencialmente
em centros de referência 8. Em casos de ressecção endoscópica, recomenda-se vigilância com EDA
a cada 3 meses no primeiro ano, e após anualmente.
Tratamento cirúrgico
Displasias de alto grau (tumores in situ) devem ser encaminhadas para esofagectomia 9, 10.
Pode-se discutir ressecção endoscópica caso disponível (vide tratamento endoscópico).
Não existem recomendações para o uso de radioterapia externa ou braquiterapia em
displasias de alto grau de esôfago.
14.4.2. Estádio I
Tratamento cirúrgico
A cirurgia é o tratamento padrão e a quimioradioterapia deve ser utilizada como opção em
pacientes inelegíveis ao tratamento cirúrgico.
Tratamento combinado com quimioradioterapia
Excetuando-se as neoplasias localizadas no terço superior do esôfago, cuja morbimortalidade
cirúrgica é maior e cuja indicação do tratamento com quimioradiação deve ser considerada com
maior frequência, apenas pacientes sem condições clínicas para a esofagectomia ou que não
concordem em aceitar a cirurgia devem ser submetidos ao tratamento conservador com
quimiorradiação. Embora em minoria, os pacientes com estádio I foram incluídos nos estudos de
fase III RTOG 85-01 e INT 0123, e as evidências disponíveis permitem afirmar que os resultados são
comparáveis aos desfechos do tratamento cirúrgico convencional 11, 12. Portanto, a quimioterapia
com cisplatina (100mg/m2 D1) e 5fluorouracil (5-FU) (1000mg/m2 em infusão contínua por 4 dias)
nas semanas 1, 5, 8 e 11, concomitante a radioterapia com dose de 50,4 Gy em 25 frações, é o
regime padrão para esta indicação. Os resultados de fase II com cisplatina 30 mg/m2 e irinotecano
65 mg/m2 em D1, D8, D22 e D29 concomitante a radioterapia conferem a este regime o status de
opção aceitável, embora ressalte-se que os dados são restritos a pacientes com histologia
adenocarcinoma 13.
A radioterapia exclusiva apenas deve ser realizada nos pacientes com performance status
desfavorável ao tratamento sistêmico concomitante.
266 |
MA NUA IS D E CO ND UTAS
14.4.3. Estádios II e III com doença ressecável
Tratamento cirúrgico isolado
O tratamento cirúrgico permanece como tratamento padrão na presença de doença ressecável.
Deve-se discutir tratamento adjuvante conforme a histologia (vide tratamento adjuvante). Pacientes
com adenocarcinomas de esôfago distal e JEG podem ser submetidos à quimioterapia perioperatória
(vide tratamento adjuvante).
Tratamento adjuvante
Pacientes com tumores de histologia adenocarcinoma oriundos do estômago ou da JEG se
beneficiam de tratamento adjuvante com quimiorradioterapia baseada em 5-FU. Estudo
randomizado (INT 0116) demonstrou que há benefício significativo em sobrevida global (mediana
de 36 versus 27 meses) para o braço que recebeu quimioterapia com 5 ciclos de 5-FU 425 mg/m2
+ ácido folínico 20 mg/m2 D1-D5 com radioterapia concomitantes aos ciclos 2 e 3 do regime
sistêmico. Não se deve perder de vista o fato que o estudo INT 0116 randomizou pacientes apenas
após a cirurgia, o que prejudicou bastante a qualidade e a padronização dos procedimentos
cirúrgicos envolvidos (em poucos pacientes, houve uma abordagem linfonodal satisfatória) 14.
Outra estratégia de eficácia demonstrada com melhor qualidade dos dados é a quimioterapia
perioperatória. Estudo britânico de fase III com 802 pacientes com braço experimental submetido
a dois ciclos neoadjuvantes de cisplatina e 5-FU versus cirurgia isolada demonstrou benefício da
abordagem sistêmica inicial com sobrevida mediana superior (16.8 m versus 13.3 m)15.
Posteriormente, o estudo MAGIC com 503 pacientes com adenocarcinoma gástrico (75%), terço
distal do esôfago (14%) e JEG (11%) demonstrou que 3 ciclos de ECF (epirrubicina, cisplatina e 5FU) antes e após a cirurgia reduziram a mortalidade de maneira significativa em 25% (HR = 0.75),
com taxas de sobrevida em 5 anos de 36% contra 23% no braço com tratamento cirúrgico exclusivo16.
Estudo randomizado francês de fase III, com 224 pacientes, demonstrou benefício semelhante com
redução do risco de morte de 31% (HR=0,69) com regime de cisplatina e 5-FU em 2-3 ciclos antes
e após a cirurgia17.
Pacientes com tumores de esôfago de histologia escamosa e ressecção completa (R0) não
têm benefício demonstrado da incorporação de estratégias com quimioterapia neoadjuvante ou
adjuvante 15, 18-20. Pode-se discutir quimioradioterapia adjuvante em pacientes com CEC submetidos
à ressecção com doença residual microscópica (R1).
Quimiorradioterapia neoadjuvante e trimodalidade
Não há claras evidências de que pacientes com neoplasia de esôfago de histologia escamosa
se beneficiem do tratamento cirúrgico pós-quimiorradioterapia. Estudo europeu multicêntrico
com 282 pacientes com randomização para quimioterapia (2 ciclos de cisplatina 80mg/m2) e
radioterapia (37Gy em 10 sessões) seguidos de cirurgia versus cirurgia isolada mostrou equivalência
em sobrevida global (18,6 meses para ambos os braços) com maior mortalidade com o regime
neoadjuvante 21. Estudo alemão envolvendo 172 pacientes randomizados para quimioterapia de
indução (5-FU, ácido folínico, etoposido e cisplatina) seguida de quimiorradiação (cisplatina e
etoposido) envolvendo dose terapêutica radical (65Gy) ou dose menor neoadjuvante (40Gy)
seguida de cirurgia também fracassou em demonstrar diferença de sobrevida entre os grupos 22.
A opção pelo tratamento cirúrgico pós-quimiorradiação em tumores de histologia escamosa se
reserva caso haja doença residual após a avaliação de resposta ao tratamento.
De outra maneira, para pacientes com histologia adenocarcinoma há evidências de que o
tratamento com tríplice combinação de quimiorradiação seguida de cirurgia oferece os melhores
resultados. Estudo irlandês com 113 pacientes portadores de adenocarcinoma de esôfago localizado
demonstrou benefício do tratamento com radioterapia (40Gy em 15 frações) concomitante a
MANUAIS D E COND UTAS
| 267
quimioterapia baseada em cisplatina e 5-FU e cirurgia subsequente versus o tratamento cirúrgico
isolado com diferença em sobrevida global mediana (16 versus 11 meses) 23. Outro estudo
randomizado, este multicêntrico, CALGB 9781 demonstrou o benefício do tratamento com a tríplice
combinação de quimiorradiação (cisplatina, 5-FU e 50,4Gy) seguida de cirurgia versus a cirurgia
isolada, com diferença significativa de sobrevida global mediana (4,48 versus 1,79 anos). Vale
ressaltar que o estudo CALGB 9781 foi precocemente fechado por baixo recrutamento, tendo
reunido dados de apenas 56 de um total planejado de 475 pacientes 24. Pacientes com estádios II
e III foram avaliados em estudo de fase III que comparou quimiorradioterapia neoadjuvante versus
cirurgia, com regime composto por carboplatina AUC 2 e paclitaxel 50mg/m2, semanais por 5
semanas consecutivas, concomitante à radioterapia (41,4Gy em 23 frações). Setenta e cinco por
cento dos pacientes possuíam histologia adenocarcinoma. Esse estudo demonstra segurança do
regime e eficácia superior à cirurgia isolada, com ganho em sobrevida 25. No entanto, esse estudo
ainda não foi publicado para análise mais profunda dos seus dados.
Meta-análises que compararam estudos randomizados avaliando quimioradioterapia
neoadjuvante versus cirurgia isolada mostram resultados conflitantes 8, 19, 25-29. Os dados sugerem um
benefício do tratamento combinado neoadjuvante em relação à sobrevida, mas são variáveis em
relação à histologia e a modalidade do tratamento neoadjuvante (concomitante versus sequencial).
Da mesma forma, demonstram resultados variáveis em relação ao risco de óbito pós-operatório
com a inclusão do tratamento combinado.
Conclui-se que o tratamento cirúrgico primário permanece como o tratamento padrão do
câncer de esôfago ressecável. Pacientes com histologia adenocarcinoma podem se beneficiar do
tratamento de tripla combinação com quimiorradiação e cirurgia subsequente. Não há consenso
quanto a qual estádio clínico, subgrupo ou biomarcador poderia predizer um benefício maior desta
abordagem para uma subpopulação dos pacientes com adenocarcinoma. Sugere-se fortemente a
abordagem cirúrgica primária para pacientes com tumores ressecáveis de histologia escamosa.
Quimiorradioterapia definitiva
Esta estratégia tem preferência nos tumores ressecáveis de esôfago superior, e mostra
resultados mais robustos para neoplasias de histologia escamosa. O estudo randomizado RTOG
85-01 (n = 123 pacientes) incluiu pacientes com ambas as histologias e mostrou a superioridade
do braço de quimiorradioterapia (vide estádio I) 11.
Outro estudo randomizado (INT 0123) demonstrou que a intensificação de dose (64,8Gy) de
radioterapia não acrescentou benefício em sobrevida mediana (13 meses para o grupo com maior
dose versus 18,1 meses) ou controle local (44 versus 48%) comparado com o grupo com dose padrão
de radioterapia, sendo, no entanto, este último regime menos tóxico12. O regime padrão de
radioterapia permanece com dose de 50,4Gy em 5 semanas, apesar de doses mais altas permanecerem
em uso, sobretudo no Japão e alguns países da Europa.
Estudo randomizado comparando quimiorradioterapia definitiva com cirurgia isolada em CEC
de esôfago ressecável mostra equivalência dos tratamentos em sobrevida e qualidade de vida,
com menor mortalidade relacionada ao tratamento nos pacientes submetidos ao tratamento
conservador 30, 31. No entanto, esse estudo apresenta limitações metodológicas que impedem
conclusões definitivas acerca da afirmação da melhor opção terapêutica para os tumores
ressecáveis ao diagnóstico, mas reforça o papel da quimiorradioterapia definitiva como alternativa
ao tratamento cirúrgico padrão.
14.4.4. Estádios II e III com doença irressecável
Quimiorradioterapia definitiva
É considerado o tratamento padrão dos pacientes com câncer de esôfago localmente avançado
não candidatos a cirurgia. As recomendações baseiam-se nos estudos RTOG 85-01 e INT 0123 como
268 |
MA NUA IS D E CO ND UTAS
explicitados anteriormente (vide estádios II e III com doença ressecável) 11, 12. Esses estudos foram
realizados em pacientes com doença ressecável e o emprego destes regimes de tratamento em
tumores irressecáveis consiste em extrapolação de dados. Caso haja conversão para doença
ressecável, pode-se considerar o emprego de cirurgia de resgate.
Não há indicação de quimioterapia de indução seguida de quimioradioterapia em tumores de
esôfago localmente avançados irressecáveis 22, 32.
14.4.5. Avaliação de resposta pós-quimiorradioterapia
A avaliação de resposta tradicional para neoplasia de esôfago localizada após tratamento
com quimioradiação é realizada com nova TC de tórax com contraste combinada à EDA, com
estímulo à realização de biópsias esofágicas no sítio anterior da lesão. Esta avaliação deve ser
considerada após período não inferior a 5 semanas do fim do tratamento combinado, uma vez que
podem haver respostas tardias ao tratamento. Estudo realizado no Instituto do Câncer do Ceará
com pacientes de neoplasia de histologia escamosa demonstrou que a biópsia negativa foi capaz
de predizer favoravelmente a sobrevida global nesta população 33. Entretanto, não há evidência
definitiva prospectiva da acurácia da avaliação endoscópica com biópsia para pacientes que
receberam o tratamento combinado.
A incorporação da Tomografia por Emissão de Pósitrons com 18F-Fluoro-2-deoxiglicose /
Tomografia Computadorizada (PET-CT) no estadiamento e na avaliação de resposta tem modificado
esta realidade para os pacientes com histologia adenocarcinoma. Para pacientes com histologia
escamosa, não se encontra a mesma abundância de dados sobre o papel do método na avaliação
de resposta. Estudo com 83 pacientes (88% adenocarcinomas) demonstrou que a resposta
metabólica medida por um valor de captação padronizado (SUV) <4,0 foi capaz de predizer a
resposta patológica e a sobrevida 34. Outros estudos reforçam a idéia de que a avaliação pósquimiorradiação por meio do PET/CT se correlaciona com a resposta patológica e com a sobrevida,
mas deve-se ter cautela em contraindicar a cirurgia nestes pacientes, uma vez que em muitos deles,
os estudos mostram células neoplásicas viáveis nos achados da peça cirúrgica e não há
demonstração inequívoca de que a conduta conservadora (sem cirurgia pós-quimiorradiação) não
proporcione prejuízo aos pacientes 35, 36.
Para os pacientes com adenocarcinoma de JEG em quimioterapia neoadjuvante, a avaliação
de resposta por PET/CT tem papel estabelecido. Uma série de estudos alemães de instituição única
demonstra que a repetição precoce do PET/CT (14 dias) após o início do tratamento é capaz de predizer
uma melhor taxa de resposta patológica e de sobrevida com quimioterapia neoadjuvante baseada em
cisplatina e 5-FU 37-39. Mais recentemente, o mesmo grupo apresentou novos dados demonstrando
que a população de não respondedores à avaliação pelo PET-CT não se beneficia da associação de
cisplatina e radioterapia nas 12 semanas subsequentes, tendo o prognóstico significativamente
inferior ao grupo considerado de bons respondedores metabólicos 40. Assim, apesar de sua
natureza uni-institucional, os dados apontam para a definição do subgrupo que verdadeiramente
se beneficia da quimioterapia neoadjuvante a partir da avaliação metabólica por PET/CT.
14.4.6. Estádio IV
O câncer de esôfago apresenta mediana de sobrevida para a doença metastática de 6 a 9
meses 41. Nestas condições o tratamento possui finalidade exclusivamente paliativa.
Quimioterapia paliativa
Não há comprovação de ganho em sobrevida global com o acréscimo de quimioterapia
paliativa aos cuidados suportivos em câncer de esôfago metastático 42-44. A quimioterapia paliativa
traz benefício em qualidade de vida 20, 41, 45, 46.
A inclusão de pacientes com adenocarcinoma de esôfago distal em estudos de adenocarcinoma
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gástrico e JEG faz com que os protocolos de conduta dessas três patologias sejam cada vez mais
semelhantes na abordagem da doença metastática.
Agentes únicos ou poliquimioterapia
Vários agentes quimioterápicos isoladamente ou em combinação mostraram atividade
terapêutica quando administrados em pacientes com câncer de esôfago recidivado ou metastático
(Tabela 1).
Tabela 1 - Atividade terapêutica de agentes únicos em pacientes com câncer de esôfago
avançado
Agentes quimioterápicos
Bleomicina 47, 48
CCNU 49
Carboplatina 50
Cisplatina 51
Docetaxel 52
Doxorrubicina 53
Etoposide 54
5-Fluorouracil 46
Irinotecano 55
Metotrexato 46, 56
Mitomicina 57, 58
Paclitaxel 59
Topotecano 60
Vinorelbina 61, 62
Taxa de resposta (%)
30
16
7
19-35
31
18
0
38
14
36
33
32
2
7-20
A cisplatina foi amplamente estudada em diferentes regimes e dosagens (50 a 120mg/m2 a
cada três ou quatro semanas), com taxas de resposta observadas entre 19% a 35% nos pacientes
com doença metastática ou recorrente. Regimes com doses mais elevadas (>100mg/m2) são
associados a elevadas taxas de complicações e sem ganho adicional de sobrevida 63, 64.
Pacientes com câncer de esôfago avançado elegíveis para quimioterapia de primeira linha
devem receber regimes a base de platina, devendo ser considerado experimental associações de
drogas sem platina (ex: irinotecano + 5-FU + leucovorin 65; docetaxel + gencitabina 52; docetaxel +
irinotecano + 5-FU 66; gencitabina + irinotecano 67; topotecano 60; capecitabina + irinotecano 68).
O parceiro ideal para a cisplatina ainda não está definido, mas a combinação mais estudada e
aceita é cisplatina com fluoropirimidina (5-FU infusional ou capecitabina) 69. Cisplatina e 5-FU (CF)
é o único regime de combinação que foi avaliado em estudo randomizado 51. Não existem estudos
randomizados comparando o melhor regime de quimioterapia de combinação. Vale a pena ressaltar
que outras associações demonstram taxas de resposta e sobrevida semelhantes ao regime CF, mas
com dados baseados apenas em estudos de fase II não-randomizados, sendo a escolha baseada
no perfil de toxicidade e experiência do oncologista (Tabela 2).
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Tabela 2 - regimes a base de platina estudados em pacientes com câncer de esôfago avançado.
regime Quimioterápico
Cisplatina + 5-FU 51
Cisplatina + irinotecano 70
Cisplatina + paclitaxel 71
Carboplatina +paclitaxel 72
Taxa de resposta (%)
35
57
48,6
43
Sobrevida global (m)
8,5
14,6
13
9
A fundamentação para o uso da combinação de cisplatina com 5-FU para pacientes com
adenocarcinoma ou CEC de esôfago avançado vem dos estudos realizados com doença localizada
e dos resultados de um estudo de fase II randomizado produzido pelo EORTC. Nesse trabalho, 92
pacientes com CEC de esôfago localmente avançado ou metastático foram randomizados para
cisplatina associada a 5-FU (cisplatina 100mg/m2; 5-FU 1000mg/m2, D1-5) ou cisplatina monodroga
(100mg/m2, 21/21 dias). As taxas de resposta observadas no grupo da poliquimioterapia foram
35% contra 19% no grupo da monoquimioterapia, mas sem impacto na mediana de sobrevida (33
versus 28 semanas), além da mesma taxa de sobrevida em 1 ano (34 versus 27%). A toxicidade foi
muito superior no regime combinado, com sete óbitos relacionados à terapia combinada, enquanto
que para o regime monodroga não ocorreram óbitos por toxicidade 51.
Pacientes com adenocarcinoma de esôfago distal ou JEG metastático são atualmente
incluídos nos estudos de câncer gástrico. Logo, as diretrizes terapêuticas dessas entidades clínicas
seguem aquelas recomendadas no tratamento do câncer gástrico.
Anticorpos monoclonais
O único anticorpo monoclonal avaliado em estudos randomizados em pacientes com CEC de
esôfago foi o cetuximabe, enquanto trastuzumabe e bevacizumabe foram avaliados em
adenocarcinoma de esôfago distal e JEG.
Cetuximabe não acrescentou benefícios quando associado à CF e seu uso não deve ser
recomendado 73. Trastuzumabe demonstrou ganho em taxa de resposta e sobrevida global quando
associado à CF ou cisplatina + capecitabina (CX) em pacientes com adenocarcinoma de esôfago
distal, JEG e gástrico com superexpressão imunoistoquímica ou FISH positivo para HER2. A taxa de
resposta foi maior no grupo experimental (47% versus 35%; p = 0,0017) e a sobrevida global
(objetivo primário) foi superior no grupo que recebeu trastuzumabe (13,8 versus 11,1 meses; p =
0,0048; HR 0,74, IC 0,6-0,91). O perfil de toxicidade foi semelhante entre os grupos, mas os pacientes
que receberam trastuzumabe tiveram mais diarréia grau 3 ou 4 (9% versus 4%), além de maiores
taxas de redução assintomática da fração de ejeção do ventrículo esquerdo (5% versus 1%) 74.
Bevacizumabe foi avaliado em associação com CX e não foi observado ganho em sobrevida global.
Observou-se aumento da taxa de resposta e da sobrevida livre de progressão, com resultados
variáveis em sobrevida de acordo com a região geográfica, o que demanda estudos adicionais
antes que seu uso seja recomendado na prática clínica 75.
Quimioterapia de segunda linha
Não existem estudos randomizados que compararam quimioterapia de segunda linha versus
cuidados suportivos em câncer de esôfago avançado. Não há drogas ou regimes considerados
como padrão, e os estudos clínicos que avaliam a eficácia de novos agentes após falha de regimes
de primeira linha apresentam baixa taxa de resposta e altas taxas de toxicidade, com benefício
questionável na sobrevida global 76-78.
Para pacientes que mantêm bom performance status é razoável utilizar outro agente
quimioterápico ativo não utilizado na primeira linha 79, 80. O tipo de resposta obtido após a primeira
linha, o volume de doença metastática, o intervalo livre de progressão após o regime de primeira
linha e o performance status influenciam a escolha do regime de segunda linha. Pacientes com
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progressão de doença após regime de primeira linha com performance status ≥2 devem receber
cuidados paliativos exclusivamente.
14.5. Situações Especiais
14.5.1. Abordagem do câncer de esôfago cervical
A abordagem cirúrgica do câncer de esôfago cervical caracteriza-se por elevada morbimortalidade 81. Portanto, independente do estadiamento, recomenda-se abordagens não-cirúrgicas
no tratamento desses tumores. Para as displasias de alto grau e T1a, o tratamento endoscópico
segue as mesmas recomendações dos tumores esofágicos de outras localizações. Para os tumores
T1b a T4b, independente do status nodal, recomenda-se quimiorradioterapia definitiva com os
mesmos regimes citados para os tumores de outros segmentos. A cirurgia pode ser discutida como
tratamento de resgate em caso de recidivas locais ressecáveis em pacientes com condições clínicas
adequadas para o procedimento.
14.5.2. Abordagem da recidiva local
A abordagem da recidiva local depende basicamente do tratamento prévio e performance
status. Pacientes submetidos à esofagectomia previamente devem ser encaminhados à quimiorradioterapia caso apresentem performance status ≤ 2. Aqueles submetidos à quimiorradioterapia podem
ser encaminhados à esofagectomia caso apresentem condições clínicas adequadas para o
procedimento. No entanto, serão raros os pacientes candidatos ao resgate cirúrgico tendo em vista
a frequente deterioração clínica associada à recidiva local. Esofagectomia de resgate tende a ser um
procedimento de maior morbimortalidade que a esofagectomia planejada após quimioradioterapia
e deve ser considerada em pacientes selecionados e em centros especializados 82. Na impossibilidade do tratamento cirúrgico, deve-se instituir tratamento paliativo.
14.5.3. Tratamento cirúrgico da doença residual pós-quimiorradioterapia
Deve-se considerar esofagectomia para os pacientes com doença residual ressecável após
quimioradioterapia. Deve-se atentar ao estado nutricional, comorbidades, performance status do
paciente, além da extensão do procedimento cirúrgico e experiência do centro de tratamento na
decisão de realizar esofagectomia após quimioradioterapia, considerando a maior morbimortalidade
desta cirurgia.
14.5.4. Paliação da disfagia
Tumores avançados e irressecáveis associados à disfagia grave podem ser paliados com
radioterapia e a associação de quimioterapia depende do performance status e comorbidades.
Entretanto, é necessário providenciar acesso para alimentação objetivando reverter o catabolismo
instalado (exemplo: via sonda nasoentérica).
Radioterapia externa associada ou não a quimioterapia, ou braquiterapia, promovem melhora
da disfagia em cerca de 70% dos pacientes, sendo que 50% desses mantêm essa paliação até o
óbito 83, 84. Se o paciente necessita de reversão imediata da disfagia (dentro de poucos dias), uma
alternativa é o uso de laser ou inserção de stents.
14.5.5. Abordagem do paciente com fístula traqueo-esofágica
Pacientes com câncer de esôfago e fístula traqueoesofágica apresentam prognóstico
desfavorável. São pacientes com tumores T4, frequentemente com doença metastática associada,
com comprometimento nutricional severo comumente presente e com pneumonias recorrentes.
A concepção de que a citorredução provocada pela quimioterapia e radioterapia possam aumentar
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a fístula traqueo-esofágica exclui esses pacientes de receberem tais tratamentos. Existem poucos
estudos direcionados para esse assunto, mas as evidências disponíveis demonstram que esses
pacientes podem se beneficiar de quimiorradioterapia, com chance de fechamento da fístula 85-87.
Baseado nestas evidências, a presença da fístula traqueoesofágica isoladamente não contra-indica
tratamento quimioterápico ou radioterápico. Geralmente esses pacientes não apresentam
performance status favorável ao tratamento sistêmico. Mas, através de cuidadosa seleção de
pacientes, pode-se oferecer quimioterapia e/ou radioterapia.
Caso submetam-se a tratamento quimioterápico ou radioterápico, é fundamental a presença
de via artificial de alimentação, como sonda nasoentérica ou gastrostomia ou jejunostomia. Os
pacientes candidatos a cuidados paliativos exclusivos podem implantar stents metálicos autoexpansíveis, considerados como procedimento de escolha para a abordagem de fístulas
traqueoesofágicas. Em série publicada, a presença destes dispositivos aumentou em 90% o controle
dos sintomas relacionados à presença da fístula 88.
14.5.6. Avaliação e estadiamento inicial na ausência da ecografia endoscópica
A ecografia endoscópica é um método de alta sensibilidade e especificidade para o
estadiamento loco-regional do câncer de esôfago, principalmente quando associada à aspiração
por agulha fina para o adequado estadiamento nodal 89. No entanto, esse exame apresenta-se
muito pouco disponível na prática clínica, estando normalmente restrito a centros especializados.
Na sua ausência, não teremos um estadiamento preciso devido às limitações da TC e consequentemente não poderemos guiar o tratamento de uma maneira estádio-específica, mas podemos
categorizar os pacientes em ressecáveis e não-ressecáveis. A partir daí, recomenda-se as orientações
discutidas nos tópicos anteriores deste capítulo.
14.5.7. As evidências atuais permitem abordagens terapêuticas distintas conforme a
histologia?
Há evidências corroborando que o adenocarcinoma e o carcinoma epidermóide de esôfago
são entidades distintas não só do ponto de vista de epidemiologia, patogenia e comportamento
biológico, mas também com prognósticos diferentes. Enquanto o carcinoma epidermóide evolui
de displasia epitelial até carcinoma in situ e invasivo, o adenocarcinoma se origina da metaplasia
intestinal em reação ao refluxo gastroesofageano 90-92. Cerca de 90% dos adenocarcinomas
relacionados ao esôfago de Barrett estão localizados abaixo da bifurcação da traqueia, enquanto
65% dos carcinomas epidermóides ocorrem acima desta. Apesar de este último ocorrer, em média,
cerca de 10 anos antes, está relacionado a maior mortalidade perioperatória, especialmente aqueles
localizados no terço superior 93, 94. O carcinoma epidermóide tende a apresentar recidivas locoregionais, enquanto o adenocarcinoma se dissemina mais frequentemente à distância. Apesar
disto, várias séries sugerem que o prognóstico do adenocarcinoma é melhor, especialmente em
estádios iniciais, talvez por apresentar acometimento linfático menos freqüente 90, 91, 95-98.
Embora alguns autores acreditem que a quimioterapia neoadjuvante possa ser suficiente para
o tratamento dos adenocarcinomas, sabe-se que para os carcinomas epidermóides mais proximais,
a quimioterapia e radioterapia combinadas relacionam-se a maiores taxas de resposta, possibilitando
ressecções curativas. A maioria dos estudos clínicos não diferencia estas duas histologias. Sendo
assim, ainda há poucos dados para respaldar mudanças de conduta dependendo da histologia.
14.6. Seguimento
A maioria das recidivas ocorre no primeiro ano após o tratamento, com 90% dos casos
compreendidos nos primeiros 3 anos 99.
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Não há estudos randomizados comparando estratégias de seguimento, ou dados que sugiram
melhora de qualidade de vida ou sobrevida em caso de detecção precoce de recidiva assintomática.
Desta forma, algumas sociedades americanas e européias recomendam seguimento minimalista
guiado pela sintomatologia do paciente. Recomenda-se história clínica e exame físico a cada 3 a 6
meses nos primeiros 3 anos seguido de avaliação semestral até completar 5 anos e daí anualmente.
O paciente deve ser acompanhado em equipe multidisciplinar com nutricionista. Exames
laboratoriais como hemograma, bioquímica e marcadores tumorais, se previamente elevados,
assim como exames radiológicos, devem ser solicitados conforme a clínica. A endoscopia digestiva
alta deve ser utilizada judiciosamente, por exemplo, em pacientes com constrição, persistência de
disfagia, suspeita de margem positiva ou história prévia de esôfago de Barrett.
14.7. recomendações Finais
• O estadiamento e avaliação inicial devem ser realizados com EDA com biópsia, TC de tórax
e abdome superior. Na ausência de doença metastática, procede-se à ecografia endoscópica e
broncoscopia para programação cirúrgica.
• O tratamento cirúrgico primário permanece como tratamento padrão para os tumores com
estádios 0 a III ressecáveis não-cervicais.
• Pode-se discutir tratamentos endoscópicos para os pacientes com estádio 0 e estádio I T1a.
• Para os pacientes com estádios I a III ressecáveis, a quimiorradioterapia como tratamento
primário é uma alternativa terapêutica, devendo-se proceder à esofagectomia sempre que possível.
Em pacientes com histologia adenocarcinoma, a quimioterapia perioperatória apresenta-se
também como uma opção.
• Tratamento adjuvante com quimiorradioterapia ou quimioterapia isolada deve ser
considerado para os pacientes com adenocarcinoma de esôfago distal e JEG.
• Quimiorradioterapia deve ser oferecida para os pacientes com tumores considerados
irressecáveis.
• Quimioterapia paliativa deve ser oferecida aos pacientes com performance status ≤ 2.
• Pacientes com câncer de esôfago devem ser acompanhados por equipe multidisciplinar,
com especial atenção aos aspectos nutricionais. A desnutrição associada, se não abordada
adequadamente, inviabiliza qualquer abordagem terapêutica.
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MANUAIS D E COND UTAS
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Capítulo 15
Câncer de Fígado
(Carcinoma Hepatocelular)
Editora: Dra. Anelisa Kruschewsky Coutinho
Autores: Dra. Anelisa Kruschewsky Coutinho, Dr. Paulo Marcelo Gehm Hoff, Dr. Frederico Perego
Costa, Dr. Roberto de Almeida Gil, Dr. Jorge Sabbaga, Dr. Fábio Marinho, Dr. Paulo Herman, Dr. Jorge
Bastos, Dr. André Oliveira e Dr. Marcos Menezes
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MANUAIS D E COND UTAS
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Capítulo 15
Câncer de Fígado (Carcinoma Hepatocelular)
15.1. Introdução
O carcinoma hepatocelular (CHC) é a 5ª neoplasia em incidência no mundo e a 3ª em
mortalidade1. Em 80 a 90% dos casos advém como complicação da cirrose hepática, o que se
configura importante particularidade na abordagem terapêutica deste tumor. Sua incidência é
crescente no mundo ocidental2 e se verifica, principalmente, pela cirrotização relacionada à infecção
crônica pelos vírus da hepatite C (VHC), ao abuso do etanol e à esteatohepatite não alcoólica (do
inglês non-alcoholic steatohepatitis ou NASH). Esta última encontra-se diretamente relacionada à
síndrome metabólica, ao sobrepeso/obesidade, ao diabetes mellitus, às dislipidemias, entre outros
fatores3. Na região asiática e africana subsaariana, há maior prevalência de infecção crônica por
vírus da hepatite B (VHB), que per se apresenta propriedade oncogênica, podendo contribuir para
o desenvolvimento de CHC mesmo na ausência de cirrose hepática.
Há várias modalidades terapêuticas atualmente disponíveis para o tratamento do CHC e o
tratamento deve ser multidisciplinar. Vários parâmetros devem ser levados em consideração antes
de se iniciar tratamento desta doença, tais como extensão tumoral e a gravidade da doença
hepática de base, como veremos mais adiante.
O diagnóstico precoce do CHC favorece o prognóstico, com melhores resultados do tratamento,
e por este motivo recomenda-se rastreamento de pacientes portadores de cirrose hepática de
maneira sistemática, com efetiva redução de mortalidade no grupo submetido a esta medida4.
15.2. Classificações e sistemas de estadiamento
Há vários sistemas de estadiamento e classificação do CHC atualmente em utilização (calculase em torno de 18). Por ser uma condição heterogênea, com múltiplos fatores confundidores, a
avaliação destes pacientes pode ser bastante complexa. Devem ser levadas em consideração as
características tumorais, a presença de sintomas e de comorbidades, além da avaliação da função
hepática remanescente neste paciente. A classificação para avaliação de função hepática mais
utilizada é a de Child-Turcotte desde 19645 e modificada por Pugh em 19736 (Classificação CPT). A
Tabela 1mostra os parâmetros avaliados e sua significação em termos de prognóstico. A Tabela 2
nos mostra dados de sobrevida de acordo com os estágios da classificação CPT
Tabela 1
Critério
Bilirrubina total (mg/dL)
Albumina sérica (g/dL)
RNI
Ascite
Encefalopatia Hepática
1 ponto
<2
>3,5
<1,7
Nenhuma
Nenhuma
2 pontos
2-3
2,8-3,5
1,71-2,20
Leve
Grau I-II (ou suprimida
c/ medicação)
3 pontos
>3
<2,8
>2,20
Severa
Grau III-IV
282 |
MA NUA IS D E CO ND UTAS
Tabela 2
Pontos
5-6
7-9
10-15
Classe
A
B
C
Sobrevida (1 ano)
100%
81%
45%
Sobrevida (2 anos)
85%
57%
35%
Quando se analisa, por outro lado, as características relacionadas ao tumor, alguns modelos
de estadiamento foram propostos, entre eles a famosa classificação de Okuda7, proposta em 1985.
Este modelo leva em consideração a massa tumoral (maior ou menor que 50% do fígado) e algumas
características do paciente relacionadas à função hepática, tais como nível de albumina sérica,
presença de ascite e do nível de bilirrubina.
A classificação TNM, usualmente adotada para outros tumores sólidos não parece
suficiente para o estadiamento do paciente com CHC, pois não leva em consideração a função
hepática, mesmo em sua versão mais recente, a sétima, de 2009. Há considerações particulares de
avaliação do paciente com CHC e cirrose que a tornam mais difícil de ser utilizada, como a presença
de linfonodomegalia na região perihilar, achado frequente na cirrose, mas que pode ser confundida
com invasão regional do tumor, alterando, assim, o real estadiamento do tumor.
Outras classificações tem sido propostas, como a italiana (Cancer of the Liver Italian Program
[CLIP]), a chinesa (Chinese University Prognostic Index [CUPI]), a francesa (Grupe d´Etudeet de
Traitement du Carcinome Hépatocellulaire [GRETCH], a japonesa (Japanese Integrated Staging [JIS])
e a espanhola (Barcelona Clinic Liver Cancer [BCLC]) 8 (figura 1). Esta última foi recentemente
endossada pelas sociedades europeia e americana para estudo do fígado (EASL, AASLD) e vem se
tornando a classificação padrão no mundo ocidental. Foi proposta em 1999 e desenhada em forma
de algoritmo a partir de dados obtidos de estudos metodologicamente bem desenhados com
seguimentos de pacientes com CHCs ressecáveis e irressecáveis. Tem-se mostrado superior na
predição prognóstica em relação à de Okuda, TNM, CLIP, GRETCH, CUPI e JIS. Outra vantagem desta
classificação sobre as demais é a sua capacidade de elencar propostas terapêuticas para os diversos
estádios de doença, também a partir de medicina baseada em evidências, sendo a única a
apresentar esta característica.
A classificação BCLC divide os pacientes em quatro categorias: A ou precoce, B ou
intermediária, C ou avançada e D ou estágio final. São avaliados: estádio do tumor (número de
nódulos, tamanho do(s) tumor(es) e presença de invasão de veia porta), função hepática
(Classificação de Child-Pugh e presença de hipertensão portal), status físico funcional do paciente
(Baseado no ECOG), e a presença de sintomas relacionados ao CHC.
Os pacientes nos estádios precoces de doença, portanto, sujeitos a tratamentos curativos,
apresentam sobrevida média em 5 anos de 70%. Os paciente dos estádios B e C apresentam
sobrevida média de 6 a 16 meses, em média, enquanto os pacientes com classificação BCLC D
teriam uma sobrevida média de apenas 3 meses.
Na prática, utilizamos preferencialmente as classificações de BCLC e CPT.
Há ainda outra ferramenta utilizada para o estadiamento de pacientes CHC e cirrose com
finalidade de indicação de transplante de fígado, chamado de sistema MELD (Model for End-Stage
Liver Disease). Trata-se de um modelo matemático disponível em vários sites ou programas para
PDAs (por exemplo: http://www.mayoclinic.org/meld/mayomodel6.html). Esta ferramenta eletrônica,
que tem a complexa fórmula de MELD = 0,957 x Log e (creatinina mg/dl)+ 0,378 x Log e (bilirrubina
mg/dl) + 1,120 x Log e (INR) + 0,643 x 10 e arredondar para valor inteiro). Esta fórmula fornece um
escore crescente de 1 a 40 para estratificar pacientes em estádios de gravidade crescente da doença
hepática de base. O MELD foi inicialmente criado pela clínica Mayo para estabelecer prognóstico
de 3 meses após inserção de shunt portossistêmico em cirróticos. Hoje, este modelo é utilizado em
MANUAIS D E COND UTAS
| 283
vários países do mundo, incluindo o Brasil, para definição de gravidade de doença hepática e
priorização dos receptores de fígado na fila de espera por um transplante. Os pacientes com CHC
recebem pontos adicionais ao escore calculado primariamente, para evitar a remoção do paciente
de lista por crescimento excessivo do tumor em decorrência de tempo de espera prolongado,
diferente do que acontece aos outros pacientes cirróticos sem CHC.
FIGUrA 1
Classificação BCLC. RF (ablação por radiofrequência). TACE (quimioembolização transarterial). PS (Performance Status)
15.3. Estadiamento
No estadiamento do paciente com CHC deve-se incluir sempre a função hepática, para
classificação de acordo com a proposição CPT (vista acima). Recomenda-se também a dosagem de
alfa-fetoproteina (AFP) que, apesar de estar elevada em apenas 50-60% dos pacientes, pode estar
diretamente relacionada a carga tumoral, além de ser um parâmetro de avaliação de resposta ao
tratamento9.
Sempre se deve diagnosticar a doença de base, como, por exemplo, as hepatites virais.
Neste sentido, a pesquisa do antígeno S da hepatite B (HBsAg) e do anticorpo da hepatite C (antiHCV) são fundamentais. Outras doenças hepáticas crônicas devem também ser rastreadas a
exemplo das doenças metabólicas como a esteatohepatite alcoólica ou não alcoólica.
Por ser o CHC tumor intrinsecamente relacionado à cirrose, deve-se ainda avaliar a presença
de hipertensão portal com a realização de endoscopia digestiva alta buscando identificação de
varizes esôfagogástricas.
Na avaliação por método de imagem prefere-se, quando possível, a realização de ressonância
magnética com contraste (Gadolínio) ou a tomografia computadorizada com múltiplos detectores
também com a utilização do contraste e com a análise das quatro fases (sem contraste, arterial,
portal e de equilíbrio). A chave para um diagnóstico e estadiamento precisos está na dinâmica do
contraste nos exames de imagem, que deve apresentar padrão típico, de captação arterial da lesão,
com washout rápido. Outro método possível, porém menos utilizado, é a ultrassonografia
contrastada. A utilização sistemática dos métodos de imagem para diagnóstico e estadiamento do
CHC está configurada no chamado “Critério de Barcelona para diagnóstico” (Figura 2).
284 |
MA NUA IS D E CO ND UTAS
Figura 2 - Critério de Barcelona para diagnóstico de CHC
1) Critério Histológico
2) Critério Não Invasivo:
RADIOLÓGICO: Duas Técnicas de imagem coincidentes - (USG / TC Helicoidal / RNM /
Angiografia) mostrando lesão focal <2,0cm com hipercaptação do contraste na fase arterial
COMBINADO: Uma técnica de imagem mostrando lesão focal > 2,0 cm + AFP > 400ng/ml
Na avaliação das metástases rotineiramente utiliza-se a tomografia computadorizada de tórax.
A cintilografia óssea deve ser indicada na presença de sintomas ósseos ou se houver indicação
para transplante de fígado. O PET-CT não é validado para estadiamento do CHC.
Tabela 3
Check-List de Estadiamento CHC recomendado
Hemograma com plaquetas
Provas de Função Hepática (Child-Pugh-Turcotte)
Provas de função renal
Alfa-fetoproteína
Sorologias Virais: hepatite B e C
RM ou TC de abdome com contraste
Endoscopia Digestiva Alta
TC de tórax
Cintilografia Óssea (sempre em candidatos a transplante)
15.4. Prognóstico
O prognóstico do CHC depende substancialmente do estádio que o paciente apresenta
quando do diagnóstico. Os pacientes não-cirróticos submetidos a ressecção cirúrgica apresentam
excelente prognóstico, enquanto que os pacientes com cirrose hepática, hipertensão portal, função
hepática residual reduzida, grandes massas tumorais e estado geral comprometido têm uma
sobrevida muito diminuída.
O prognóstico dos tumores ressecáveis de fígado em paciente cirrótico (BCLC A sem hipertensão
portal) é muito favorável, porém, a recorrência tumoral pode alcançar 70% em 5 anos, pela
manutenção da cirrose hepática. O transplante de fígado mudou a história natural dos CHCs após
a publicação dos critérios de Milão em 199610. Lá, estabeleceu-se que pacientes que apresentem
um único nódulo de até 5cm de maior diâmetro ou até 3 nódulos com o maior apresentando até
3cm podem ser transplantados. A sobrevida média destes pacientes em 5 anos é de cerca de 70%,
número igual ao obtido nos transplantados por outras etiologias não neoplásicas.
O prognóstico de CHCs intermediários e avançados não tratados foi avaliado numa recente
meta-análise11 que observou pacientes que haviam sido alocados em grupos-placebo de ensaios
clínicos. Verificou-se que a sobrevida em 1 ano foi de 17,5% e em dois anos de 7,3%, ratificando o
péssimo prognóstico desses grupos.
Além da AFP, são fatores prognósticos classificação CLIP, trombose portal, volume tumoral e
grau de função hepática através do Child-Pugh.
MANUAIS D E COND UTAS
| 285
15.5. Tratamento Cirúrgico
Os programas de rastreamento do CHC com o uso rotineiro da ultrassonografia são amplamente
empregados em pacientes considerados de risco, resultando em aumento da detecção de tumores
em fase precoce, onde o tratamento pode ser curativo.
Duas variáveis devem ser consideradas no momento da indicação cirúrgica para o tratamento
do CHC: o estadiamento do tumor e da doença hepática de base. Apenas 5% a 10% dos carcinomas
hepatocelulares desenvolvem-se em fígados não cirróticos ou apenas com fibrose 12,13.
O transplante de fígado (TF) é a melhor opção teórica de tratamento do CHC, pois pode
propiciar cura tanto do tumor quanto da doença hepática subjacente (cirrose), mas esta modalidade
é limitada pela pequena disponibilidade de enxertos. Em um contexto de escassez de órgãos e
altas taxas de recidiva tumoral, critérios restritivos foram adotados para alocação de órgãos de
doadores falecidos para pacientes com CHC. Na maioria dos países, como no Brasil , para esta
finalidade adota-se os critérios de Milão (Tabela 4). No entanto, o tempo de espera para órgãos
tem aumentado significativamente a um ponto onde a progressão do tumor leva a perda da
indicação do transplante 14,15. A utilização do score MELD é mandatória para determinar a pontuação
como critério de urgência para posicionamento na fila para obtenção de órgão para TF.
Tabela 4 - Critérios para indicação de transplante de fígado
Critérios de Milão
- nódulo único de até 5cm
- até 3 nódulos, de até 3cm
Portador de doença hepática crônica
Ausência de metástases a distância utilizando estadiamento obrigatório com cintilografia
óssea e TC tórax
A ressecção hepática (RH) foi o tratamento de escolha por muitos anos, mas era limitada pelas
altas taxas de morbi-mortalidade e de recidiva hepática por doença hepática subjacente16. No
entanto, as limitações do TF e, especialmente, a melhora dos resultados cirúrgicos da RH modificaram
esta realidade17,18,19. Atualmente, a ressecção do CHC pode ser realizada em centros especializados,
com mortalidade inferior a 5% e índices globais de sobrevida em 5 anos comparáveis aos do
transplante para tumores iniciais.
Apenas cerca de 10 a 15% dos pacientes com CHC são candidatos à ressecção cirúrgica. A
ressecção hepática tem como vantagem ser rapidamente aplicável, pois ao contrário do transplante,
não há lista de espera. Além disto, não há restrições absolutas em relação ao tamanho do nódulo a
ser ressecado.
Para indicação de ressecção, deve-se considerar dois aspectos: “qualidade do fígado” ou função
hepática e “quantidade de fígado remanescente” ou volume de fígado remanescente. A ressecção
hepática é o tratamento de escolha nos pacientes com CHC em fígados sem cirrose (cerca de 10% dos
casos), independentemente do tamanho.
Uma questão ainda controversa no tratamento cirúrgico do hepatocarcinoma é a indicação de
ressecção versus transplante nos pacientes portadores de cirrose, com boa função hepática que se
encontram dentro dos critérios de Milão e na ausência de hipertensão portal relevante (gradiente
venoso hepático < 10mmHg; ausência de varizes de esôfago; número de plaquetas > 100.000/mm3).
Para os que apresentam nódulos múltiplos, há concordância na literatura que o transplante é a
melhor opção terapêutica, com taxas de sobrevida de 80% em 5 anos20 . Estes pacientes com mais
de um nódulo podem ser submetidos à ressecção, no entanto, apresentam inquestionavelmente
um pior prognóstico. Trabalhos do leste asiático ressaltam que a ressecção só é benéfica quando a
286 |
MA NUA IS D E CO ND UTAS
doença é oligonodular (até 3 nódulos). Para os pacientes portadores de nódulo único, a ressecção
pode ser indicada, com taxas de sobrevida similares às do transplante, mesmo considerando sua
maior taxa de recidiva. A hepatectomia é uma modalidade mais disponível, e o paciente pode ser
transplantado normalmente em casos de recidiva ou piora da função hepática em decorrência do
agravamento da doença de base21,22,23 (Tabela 5). Vale ressaltar que em nódulos menores que 3cm,
a ablação por radiofrequência também é uma modalidade terapêutica que pode ser contemplada
em alguns casos e tem sido respaldada na literatura.
A ressecção pode ser segura mesmo para tumores de grandes dimensões (>10cm), contanto
que a função hepática esteja preservada (Child A) e o volume remanescente hepático seja maior
que 40%24,25. Pode-se empregar a embolização portal pré-operatória nas grandes ressecções
hepáticas (> 60%) para promover a hipertrofia do fígado remanescente. A hipertrofia torna a
ressecção mais segura com menores taxas de morbimortalidade, e pode ser utilizada como uma
prova de avaliação funcional do fígado, pois pode demonstrar indiretamente a capacidade
regenerativa do parênquima hepático. Em outro grupo de pacientes, com doença localmente
avançada, pode-se adotar a estratégia da utilização de técnicas de regressão fisiopatológica
(downstaging), como quimioembolização.
Existe controvérsia na literatura sobre as margens ideais de ressecção cirúrgica, com trabalhos
demonstrando que ressecções segmentares de todo o segmento ou setor onde o tumor está
localizado, incluindo-se o seu pedículo portal, apresentam resultados superiores às enucleações e
trabalhos que não demonstram esta superioridade26,27. Diversos estudos mostram que a obtenção
de margens maiores do que 1,0cm de extensão estão associadas com maiores taxas de sobrevida28.
Outro item que deve ser debatido é a presença de invasão vascular macroscópica, especialmente
portal. A invasão vascular é sabidamente um fator de mau prognóstico e está associado a altas taxas
de recidiva tumoral. Nestes casos, a ressecção mostra-se muito pouco benéfica (índices de sobrevida
global <10%), sendo contra-indicada em muitos serviços29,30. A nossa opinião é também de
desfavorecer esta indicação.
Tabela 5 - Critérios para indicação de ressecção hepática
• Pacientes sem cirrose
• Pacientes com cirrose, porém função hepática preservada: Child A
• Ausência de hipertensão portal relevante
• Qualquer tamanho de tumor, desde que volume remanescente hepático > 40% e Child A.
• Preferencialmente que atendam aos critérios de Milão: melhor prognóstico
• Ausência de invasão vascular macroscópica (veia porta / veia cava)
• Ausência de invasão de cápsula hepática
Nos últimos anos, muitos autores têm preconizado a via laparoscópica para a ressecção de
tumores de pequenas dimensões (<5cm) localizados em regiões periféricas do fígado. Nestes casos
selecionados, o sangramento intra-operatório e a morbidade pós-operatória, especialmente. a
ocorrência de ascite, são menores. Até o momento, pode-se apenas afirmar que a ressecção laparoscópica
é factível e não fere os princípios oncológicos31.
Nos pacientes selecionados para a ressecção, a sobrevida em 5 anos varia entre 35 e 50%, mas
pode chegar a 70% quando dentro dos critérios de Milão26. Apesar da maioria dos estudos reportarem
taxas de sobrevida tardia superiores para o transplante quando comparado à ressecção, quando se
analisa a sobrevida tardia em pacientes com tumores dentro dos critérios de Milão submetidos à
ressecção, esta é semelhante à sobrevida reportada para pacientes listados para o transplante hepático
(intenção de tratar), especialmente quando se leva em conta os pacientes que faleceram ou tornaramse inelegíveis ao TF em razão do longo tempo de espera na lista. O índice de recidiva tumoral após RH
é alto, podendo chegar a 50%. A recidiva pode estar relacionada à metástase do tumor ressecado ou
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ao surgimento de novos focos de CHC (de novo). Apesar do transplante propiciar menores taxas de
recidiva, isto é, maiores taxas de sobrevida livre de doença, cerca de 10% dos pacientes submetidos
ao transplante também apresentam recidiva23.
É evidente que o parênquima hepático remanescente permanece com a doença, estando
associado a um risco de recidiva com o aparecimento de novos focos de HCC, acarretando em menor
sobrevida livre de doença do que o TF. No entanto, a RH preserva a possibilidade de TF de resgate,
técnicas de ablação ou novas ressecções em casos de recidiva. Finalmente, a avaliação histológica do
espécime cirúrgico da RH têm sido proposta como um guia para a seleção de candidatos ao TF,
considerando-se nestes casos a RH como um procedimento de ponte para o TF.
Em uma época de escassez de órgãos, estudos mostram que a RH apresenta vantagens sobre o
TF em pacientes com CHC solitário e doença hepática compensada. Algumas vantagens da RH que
podem ser citadas são: (A) é imediatamente disponível quando em centro especializado, (B) carrega
um baixo risco em pacientes bem selecionados, (C) permite uma precisa avaliação histológica, (D)
propicia taxas de sobrevida global comparáveis às da intenção de transplantar, (E) oferece a
possibilidade de TF de resgate em casos de recidiva, desde que os pacientes sejam monitorados de
perto para diagnosticar precocemente as recorrências e (F) pode propiciar uma diminuição de custos
sobre a economia global do TF.
Recomendações relacionadas ao tratamento cirúrgico:
1. A ressecção com margens livres é o tratamento de escolha para o CHC em pacientes sem
cirrose e para pacientes selecionados com cirrose (Child A, sem hipertensão portal) com nódulo único,
independentemente do seu tamanho.
2. O volume do fígado residual tem impacto direto na evolução pós-operatória.
3. Pacientes altamente selecionados com CHC multifocal ou invasão vascular macroscópica
podem ser candidatos à ressecção, mas com resultados muito controversos. A eficácia da ressecção
nestes pacientes ainda necessita ser elucidada.
4. A ressecção laparoscópica é factível, mas seu papel ainda não está claro.
5. No momento, não há nenhuma indicação para tratamento adjuvante após RH. Há estudos em
andamento analisando esta questão.
15.6. Terapias ablativas percutâneas
15.6.1. Ablação percutânea por radiofrequência
A ablação por radiofrequência (ARF) no CHC utilizando a via percutânea guiada por imagem é
hoje um procedimento consagrado, já sendo realizado há mais de 15 anos na Europa32 e EUA33. Neste
procedimento, a agulha é dirigida até a lesão hepática utilizando-se USG e TC como guia. Uma vez que
a posição ideal é alcançada, o gerador descarrega uma corrente elétrica alternada rápida (energia de
radiofrequência) na ponta da agulha. O calor gerado no local pela fricção das moléculas de água e
componentes iônicos causa necrose de coagulação do tumor quando uma temperatura de 55 a 60ºC
é alcançada no tecido tumoral circunjacente à ponta da agulha, o objetivo do tratamento é a ablação
do tumor e de uma margem de tecido ao redor do tumor de 1cm, mimetizando uma margem
cirúrgica.
O amplo uso dessa nova tecnologia apresentou um impacto significativo no tratamento do CHC.
Antigamente, a ressecção cirúrgica constituía a única opção terapêutica curativa para tumores
primários do fígado. No entanto, a grande maioria dos pacientes com CHC apresenta-se com cirrose
hepática, hipertensão portal e outras comorbidades, de modo que frequentemente não são
candidatos cirúrgicos. Nesse cenário, a ARF percutânea possibilitou o tratamento curativo de pacientes
“não-cirúrgicos”, especialmente em estágios iniciais do hepatocarcinoma. Um estudo coorte sobe
ARF demonstrou que a ablação completa de lesões menores que 2cm é possível em mais de 90%
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MA NUA IS D E CO ND UTAS
dos pacientes com recorrência local menor que 1%. Não há estudos randomizados comparando ARF
e ressecção.
Devido ao alto índice de recidivas/novos focos de CHC nos pacientes cirróticos na espera para
transplante hepático e também pela reserva hepática reduzida destes pacientes, a ARF percutânea
apresenta vantagens estratégicas frente à ressecção cirúrgica.
Estudos controlados e randomizados demonstraram que a ARF é mais efetiva que injeção de
etanol para tratamentos de pequenas lesões34, com taxa de necrose completa do tumor maior na
ARF e requerendo menor número de tratamentos35. Em relação à resposta de longo termo, a ARF
também se provou melhor que a alcoolização, com uma melhor resposta completa um ano após o
tratamento. Tem como desvantagem o custo bem mais elevado que a alcoolização.
No tratamento do CHC as indicações são elas:
• Estádios iniciais de CHC36- Algumas meta-análises colocam inclusive as terapias ablativas como
tratamento de escolha para CHC pequenos (até 3,0 cm), devido aos menores índices de complicações
quando comparado à ressecção cirúrgica37.
• Pacientes com comorbidades severas ou inoperáveis. O procedimento, em muitos hospitais, é
realizado rotineiramente com sedação consciente, reduzindo dessa forma o risco anestésico para
pacientes debilitados.
• Pacientes com CHC único ou múltiplos, enquanto esperam pelo transplante hepático38, pois o
método é minimamente invasivo, impede que esses tumores ultrapassem o número e medidas
estabelecidas pelo critério de Milão e possibilita ao máximo preservar parênquima hepático,
diminuindo o risco de insuficiência hepática.
Tabela 6 - Contra-indicações à ArF
• Doença extra-hepática
• Invasão vascular ou biliar
• Cirrose hepática avançada (Child-Pugh C) ou infecção ativa.
• Encefalopatia hepática ou insuficiência hepática descompensada.
• CHC multifocal. Diversos estudos recomendam ARF como método de escolha se menos de
três lesões com até 3,0cm cada39,40.
• Lesões maiores que 5cm
• Lesões centrais e em proximidade com ductos biliares principais
A ARF constitui um procedimento de baixo risco, com baixas taxas de morbidade e mortalidade41,42.
As complicações menores relacionadas à ARF ocorrem em menos de 5% dos procedimentos, ao
passo que complicações graves variam entre 0,9 e 2% em séries de até 3554 lesões tratadas43 (Tabela
7). A taxa de mortalidade, na maior série de casos, foi de 0,3%. Síndrome pós-ablação caracteriza uma
série de sinais e sintomas que cerca de 40% dos pacientes apresentam após o procedimento41. Dentre
eles, febre baixa (até 38oC), desconforto, mal estar, náusea, fadiga e prostração. A síndrome pós-ablação
pode permanecer por até 14 dias após o procedimento, mas usualmente dura de dois a três dias.
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Tabela 7 - Complicações relacionadas à ArF
Menores
• Dor no ombro.
• Hematoma subcapsular.
• Derrame pleural/ ascite.
• Queimadura/celulite na região dos adesivos
que absorvem a energia de radiofrequência.
• Pequeno hemoperitôneo, sem necessidade
de transfusão sanguínea.
• Pequeno pneumotórax, sem necessidade
de intervenção.
Maiores
• Sangramento peritoneal.
• Lesão de alças intestinais
• Colecistite aguda
• Lesão biliar, levando a estenose de
ductos biliares centrais.
• Hemoperitôneo, necessitando de
intervenção.
• Pneumotórax, necessitando de
intervenção.
• Infecção/abscesso hepático.
• Trombose portal.
• Implante tumoral ao longo do trajeto da
agulha.
15.6.2. Injeção percutânea de etanol
A injeção de etanol foi o primeiro método ablativo percutâneo descrito. Trata-se de injeção de
álcool absoluto por uma agulha fina no interior do tumor frequentemente guiada por ultra-som.
Apesar de menos eficaz que a ARF e, geralmente, necessitar de múltiplas sessões, representa
importante método no nosso meio devido ao baixo custo quando comparado a ARF.
Pode ser indicado em tumores menores de 3cm, sem disseminação extra-hepática ou vascular.
15.6.3. Quimioembolização arterial hepática
A quimioembolização intra-arterial é atualmente o método mais utilizado e recomendado
como primeira linha de tratamento paliativo para o manejo dos pacientes com CHC44, sendo
também empregada para o controle e redução das lesões hepáticas nos pacientes que se encontram
na fila para transplante hepático. O suprimento de sangue do CHC é provido principalmente pelo
sistema arterial e a infusão de drogas citotóxicas permite maiores concentrações no tumor, assim
como a interrupção do suprimento sanguíneo do tumor pela embolização induz a isquemia e
necrose.
A comprovação científica do uso da quimioembolização como método terapêutico nos
pacientes com CHC foi respaldada em meta-análise publicada em 2003, que incluiu sete estudos
randomizados, onde foi demonstrado aumento médio de dois anos na sobrevida dos pacientes
com CHC submetidos à embolização45. Além disso, também foi observado que alguns pacientes
foram convertidos de inoperáveis para operáveis após a terapia intra-arterial.
As contra-indicações absolutas e relativas à quimioembolização encontram-se resumidas na
Tabela 8.
Tabela 8 - Contra-indicações à quimioembolização
Absolutas
• Candidatos a ressecção ou ablação percutânea
• Infecção sistêmica intratável.
• Função hepática comprometida (Child-Pugh C).
• Fluxo hepatoportal comprometido.
290 |
MA NUA IS D E CO ND UTAS
relativas
• Envolvimento tumoral >50% do fígado.
• Presença de doença metástatica extra-hepática.
• Bilirrubina >2,0 mg/dl.
• DHL>425 U/l.
• AST>100U/l.
• Insuficiência renal ou cardíaca.
• Ascite.
• Sangramento recente relacionado a varizes.
• Trombocitopenia significativa.
• Fístula arteriovenosa intratável.
• Presença de anastomose portocava.
• Trombose portal extensa.
• Invasão tumoral da veia cava inferior.
O sucesso da utilização dessa terapia depende da seleção criteriosa dos pacientes, sendo os
melhores resultados encontrados naqueles com função hepática preservada e lesões assintomáticas
sem invasão vascular ou metástases extra-hepáticas.
O procedimento pode ser realizado tanto sob sedação consciente ou anestesia geral. Existem
vários regimes quimioterápicos utilizados, sendo a doxorrubicina (50-100mg) em associação com
microesferas embolizantes (100-300 μm) o esquema monoterápico mais indicado atualmente. O
uso da doxorrubicina, associada ou não a cisplatina e/ou mitomicina-C é uma alternativa na
indisponibilidade das microesferas. Sugere-se que um novo exame de imagem (TC ou RM) seja
realizado quatro semanas após o procedimento para a avaliação da resposta terapêutica e
planejamento das possíveis sessões subsequentes. A falta de resposta ao tratamento após a
primeira sessão não deve ser encarada como falha terapêutica, devendo muitas vezes, os mesmos
segmentos arteriais serem embolizados em diferentes sessões até se obter a resposta desejada,
tornando crítica a participação do radiologista intervencionista no seguimento desses pacientes.
A complicação mais comumente relacionada a qualquer quimioembolização é a chamada
síndrome pós-embolização. Esse quadro é caracterizado pela presença de alterações clínicas e
laboratoriais como náusea, vômitos, febre, dor abdominal, fadiga, leucocitose e elevação das
transaminases. Virtualmente todos os pacientes submetidos a procedimentos de embolização/
quimioembolização irão evoluir com essa síndrome em diferentes graus de manifestação nas
primeiras 48 horas após o procedimento. Outras complicações mais raras incluem a formação de
abscessos hepáticos, infarto da vesícula biliar, sepse, embolização sistêmica do agente
quimioembólico e insuficiência hepática irreversível.
15.7. Tratamento sistêmico
Apenas uma minoria de pacientes pode se beneficiar de tratamento curativo nesta doença.
Mais de 80% dos casos de CHC já se apresentam em estádios mais avançados ao diagnóstico, sendo
inelegíveis para tratamentos cirúrgicos, seja ressecção ou transplante. Adicionalmente, a taxa de
recorrência após terapia potencialmente curativa pode chegar a 50% em 2anos, dependendo das
características da neoplasia.
Os pacientes com CHC avançado apresentam predominantemente doença confinada ao
fígado. As metástases extrahepáticas ocorrem em aproximadamente 15% dos casos e os linfonodos
abdominais, pulmões e ossos são os principais sítios. Embora os pacientes com doença hepática
MANUAIS D E COND UTAS
| 291
avançada possam se beneficiar de terapias intrahepáticas, pacientes com doença extrahepática
têm opções mais limitadas de tratamento. É muito importante considerar fatores como função
hepática, velocidade de progressão da neoplasia e sintomatologia para definição da melhor
estratégia terapêutica.
As principais indicações para tratamento sistêmico em hepatocarcinoma são: doença
metastática extrahepática, progressão de doença na ausência de indicação de qualquer outra
modalidade de terapia cirúrgica ou locoregional, geralmente pacientes classificados com critério
de Barcelona, BCLC = C. Não se recomenda tratamento específico em pacientes Child-Pugh C, já que
a terapia antineoplásica não atribui nenhum benefício e neste grupo deve-se oferecer a melhor
terapia de suporte.
Por muitos anos, não se dispunha de nenhum tratamento sistêmico que tivesse demonstrado
aumento de sobrevida nesta doença e as taxas de resposta sempre foram ínfimas. Recentemente,
esta perspectiva mudou quando houve aprovação da primeira droga sistêmica para o tratamento
do hepatocarcinoma avançado, com benefício em sobrevida. Trata-se do sorafenibe, uma pequena
molécula, inibidor de tirosina quinases, que atua bloqueando a sinalização de PDGF, VEGF, c-kit e
RAF tanto nas células tumorais quanto nas células endoteliais circundantes. No estudo SHARP,
foram randomizados 602 pacientes com HCC avançado e cirrose Child-Pugh A, para uso do
sorafenibe 400mg via oral duas vezes ao dia, ou placebo e os resultados mostraram benefício
estatisticamente significativo em SG, de 10,7 versus 7,9 meses e HR: 0,69 e SLP 5,5 versus 2,8meses
e HR 0,58 favorecendo o sorafenibe. Neste estudo, mais de 95% dos pacientes eram Child-Pugh A
e > 80% classificados como BCLC = C. As maiores toxicidades grau 3-4 foram diarréia em 8% e
síndrome mãos-pés em 8% dos pacientes em uso da droga 46. O estudo do grupo asiático também
confirmou o mesmo benefício relativo, porém numericamente menor, já que a população tratada
neste estudo era de pior prognóstico. Em vista destes dados, sorafenibe tornou-se a principal opção
sistêmica de tratamento para pacientes com doença avançada em pacientes com função hepática
preservada. Embora seja uma droga bem tolerada, o sorafenibe tem taxa de resposta objetiva
muito baixa, cerca de 2%, sem impacto real no controle de sintomas ou qualidade de vida.
Em pacientes com hipertensão portal ou trombose de veia porta, os cuidados preventivos
quanto ao risco de sangramento nos portadores de varizes esofageanas são fundamentais,
especialmente quando se considera o tratamento com drogas antiangiogênicas.
Várias drogas quimioterápicas vêm sendo estudadas ao longo dos anos. O fluorouracil foi o
primeiro agente testado no tratamento do hepatocarcinoma, entretanto, a droga mais estudada
nesta doença foi a doxorubicina. Os melhores resultados foram de um estudo de fase II, muito
pequeno, com apenas 14 pacientes e taxa de resposta de 78% que não se repetiu em outros
estudos posteriormente47. Subsequentemente, estudos que avaliaram a doxorubicina mostraram
taxas de resposta entre 10-30% (Tabela 9). A doxorubicina também foi comparada em estudo de
fase III que incluiu 188 pacientes, com uma combinação de drogas no esquema conhecido como
PIAF, composto de cisplatina, interferon, doxorubicina e fluorouracil. Apesar de uma tendência, as
melhores taxas de resposta no esquema PIAF, não houve diferença significativa nas taxas de
sobrevida global, e sim maior toxicidade com a combinação48. A capecitabina, também foi avaliada
e demonstrou taxa de resposta de 11%, tempo mediano para progressão de 2,9 meses e sobrevida
mediana de 10,1 meses nos 37 pacientes avaliados em um dos estudos49. Diversas outras drogas
isoladas foram testadas ao longo dos anos, infelizmente com mínimas taxas de resposta e sem
benefício de sobrevida demonstrado, dentre elas, mitoxantrona, epirrubicina, doxorrubicina
lipossomal, mitomicina, etoposido, irinotecano, interferon (Tabela 10).
Algumas combinações de drogas têm sido estudadas. O esquema GemOx, composto de
gencitabina e oxaliplatina, foi avaliado em estudo de fase II, com apenas 34 pacientes e demonstrou
taxas de resposta de 18%, estabilidade de doença em 58% e uma sobrevida global mediana de
11,5meses, com perfil de toxicidade bastante aceitável50. Recentemente, o esquema FOLFOX,
292 |
MA NUA IS D E CO ND UTAS
composto por fluorouracil, ácido folínico e oxaliplatina, foi comparado com a doxorrubicina isolada.
Este estudo de fase III chamado EACH, incluiu 371 pacientes, predominantemente Child A (87%) e
B, e a maioria (> 80%) portadora de vírus da hepatite B. A análise apresentada após 266 eventos
demonstrou sobrevida global mediana superior no grupo Folfox, 6,4 versus 4,97 meses, entretanto,
não estatisticamente significativa naquele momento 51. Entretanto, os dados de análise posterior,
após 305 eventos demonstraram uma diferença estatisticamente significativa em SG favorecendo
o braço da combinação, com p =0,0425. A sobrevida livre de progressão foi significativamente
maior no grupo Folfox, 2,93 versus 1,77 meses, assim como a taxa de resposta: 8% versus 3%. O
esquema em estudo foi bem tolerado, tendo como maior toxicidade graus 3 e 4 a neutropenia em
30% dos pacientes. Com o exposto, conclui-se que o esquema Folfox é comparável a doxorrubicina,
com tendência a alguma superioridade, com perfil de toxicidade bastante razoável, porém, com
números ainda muito modestos no que tange a beneficio (Tabela 11).
Foi recentemente publicado foi o estudo que comparou doxorrubicina associado a sorafenibe
versus doxorrubicina isolada52. Este estudo randomizou 96 pacientes Child A e demonstrou tempo
mediano para progressão de 6,4 meses versus 2,8 meses; sobrevida global mediana de 13,7 versus
6,5meses, além de sobrevida livre de progressão de 6,0 versus 2,7 meses, todos os índices
favorecendo o grupo que recebeu a combinação com sorafenibe. As toxicidades mais importantes
neste esquema foram gastrointestinal e hematológica, porém manejáveis. Estes resultados são
bastante interessantes, porém não conclusivos em relação ao benefício, devendo-se à combinação
ou simplesmente à ação do sorafenibe. Com a intenção de esclarecer este ponto, atualmente está
em andamento estudo de fase III comparando doxorrubicina associado a sorafenibe versus
sorafenibe isolado e os resultados são aguardados.
Um estudo de fase II avaliou a combinação de Bevacizumabe e Erlotinibe em 40 pacientes. O
objetivo primário do estudo foi SLP em 16 semanas e foi de 62,5%. Resposta objetiva foi alcançada
em 25% dos pacientes, assim como SG mediana de 15,65 meses53. Este esquema teve como
principais toxicidades fadiga (20%), hipertensão (15%), diarréia (10%), elevação de transaminases
(10%) e hemorragia gastrointestinal (12%). Esta combinação merece avaliação adicional, mas ainda
não é recomendada na rotina atual de tratamento. Também comparado recentemente em estudo
fase III, Sorafenibe versus Sunitinibe em um grupo de 1.074 pacientes, entretanto, o Sunitinibe não
demonstrou benefício em nenhum dos parâmetros avaliados, SG, SLP ou taxas de resposta, além
de ter apresentado maior toxicidade54.
Várias outras drogas biológicas e associações vêm sendo estudadas nesta doença, entretanto,
ainda são consideradas investigacional no momento (Tabela 12).
Certamente o desafio para tratamento sistêmico nesta doença ainda é grande onde pesam
múltiplas variáveis, baixos índices de resposta das terapias existentes e onde por vezes o melhor
que podemos oferecer é terapia de suporte, especialmente nos pacientes com doença tumoral
não volumosa e sem sinais evidentes de progressão.
Tabela 9 - Principais estudos com doxorrubicina em hepatocarcinoma
Autor/ano
Olweny/1975
Chlebowski/1984
Lai/1988
Sciarrino/1985
n
14
157
106
109
Fase
II
II
III
II
rr
78%
11%
5%
10%
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| 293
Tabela 10 - Quimioterápicos isolados em hepatocarcinoma: taxas de resposta
Drogas
Doxorrubicina
Mitoxantrona
Epirrubicina
Doxorrubicina lipossomal
Cisplatina
Combinações com Cisplatina
Paclitaxel
VP-16
Capecitabina
Irinotecano
5FU + IFN
5FU + LV
rr
0-20%
8-17%
10-25%
0-10%
0-15%
15-27%
0
18%
3-25%
7%
18%
28%
Tabela 11 - Principais esquemas quimioterápicos atuais em hepatocarcinoma
Esquema
GemOx
FOLFOX
Capecitabina
Doxorrubicina
SG mediana
11,5 meses
6,4 meses
10,1 meses
10,6 semanas
Taxa de resposta
18%
8%
11%
3%
Fase
II
III
II
III
Tabela 12 - Estudos fase II: associação de quimioterápicos e anticorpos monoclonais
Estudo
GemOx + Bmabe
Cape + Bmabe
Xelox+ Bmabe
GemOx+ Cmabe
Bmabe + Erlotinibe
Fase
II
II
II
II
II
Pacientes
33
45
30
45
40
Tx resposta
20%
16%
11%
20%
25%
Doença estável
SGm
27%
9,6 meses
10,7 meses
78%
9,5 meses
15,6 meses
Tabela 13 - recomendação de modificação de doses do Sorafenibe para toxicidade cutânea
Toxicidade cutânea
Grau 1
Grau 2
Grau 3
Ocorrência
Qualquer
Continuar
Sim
Terceira
Não
Modificar
Tratamento tópico para alívio
sintomático
Primeira
Tratamento tópico para alívio
Sim
sintomático, reavaliar em 7dias
Segunda ou terceira Interromper Até resolução para grau < 1 e
reduzir dose para 400mg/dia ou
em dias alternados.
Quarta
Descontinuar
Não
Primeira ou
Interromper Até resolução para grau < 1 e
reduzir dose para 400mg/dia ou
segunda
em dias alternados
Descontinuar
294 |
MA NUA IS D E CO ND UTAS
15.8. Seguimento
O seguimento de pacientes com CHC tem o objetivo de diagnosticar precocemente as
recidivas em pacientes submetidos a terapêuticas potencialmente curativas. Reintervenções
locoregionais são factíveis e podem determinar a curabilidade destes pacientes. Além de exame
físico bi ou trimestrais, recomenda-se dosagem de AFP a cada 2 ou 3 meses e exames de imagem
a cada 3 ou 6 meses.
15.9. Prevenção
A prevenção do CHC é baseada na prevenção da doença hepática crônica, visto que a grande
maioria dos tumores está relacionada à cirrose hepática. Assim a vacinação para hepatite B, por
exemplo, já se mostrou de grande efetividade em Taiwan na redução da incidência de CHC55. Ainda
não se dispõe de vacinação para hepatite C.
A incidência de carcinoma hepatocelular é dramaticamente reduzida após tratamento exitoso
com erradicação viral na hepatite C crônica e na supressão viral da hepatite B crônica, estando,
nesta última, a carga viral diretamente relacionada à incidência de CHC. Surpreendentemente,
apenas o fato de um paciente com hepatite C ter sido tratado, mesmo sem erradicação viral, já
reduz risco de incidência de CHC de acordo com meta-análise56.
Para os pacientes tratados cirurgicamente, há meta-análise57 que evidencia redução
significativa de recorrência do CHC com a instituição de tratamento antiviral, quer para hepatite
crônica B quer para hepatite crônica C.
Por fim, o consumo diário de café em pacientes com doença hepática crônica parece reduzir
incidência de CHC de acordo com elegante meta-análise 58.
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Capítulo 16
Câncer de Pâncreas Exócrino
Editor: Dr. Carlos Augusto de Mendonça Beato
Autores: Dra. Patricia Medeiros Milhomem, Dr. Luciano de Souza Viana, Dr. Anderson Arantes
Silvestrini, Dr. Amândio Soares Fernandes Junior, Dr. Gothardo Peixoto Figueiredo Lima, Dr. Roberto
Magnus Duarte Sales, Dr. Alexandre Pieri Chiari e Dr. Aurelio Julião de Castro Monteiro
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Capítulo 16
Câncer de Pâncreas Exócrino
16.1. Epidemiologia1
Aproximadamente 12.7 milhões de casos novos e 7.6 milhões de óbitos ocorreram no mundo
em 2008 por tumores malígnos.
Em relação ao câncer de pâncreas estima-se que no mundo, em 2015 o número de casos
existentes chegará a 92.475 no sexo masculino e 87.275 no sexo feminino.
No Brasil, o câncer de pâncreas configura-se como o 12º mais incidente quando consideramos
sexo masculino e feminino juntos. Sua incidência e mortalidade encontram-se estáveis (taxa de
incidência paralela a taxa de mortalidade), portanto poucos são os pacientes sobreviventes em
virtude de taxa de resposta global tumoral pobre a modalidades de tratamentos combinados e ao
alto índice de recorrência após procedimento cirúrgico.
A sobrevida em 1 ano é de aproximadamente 21% com tempo médio de sobrevida de 3-6
meses e 6-10 meses para pacientes com doença metastática e doença local respectivamente.
16.2. Estadiamento TNM - AJCC, 2010 2
TX: tumor primário não avaliável;
T0: sem evidência de lesão primária;
Tis: carcinoma in situ; (inclusive neoplasia intraepitelial);
T1: tumor limitado ao pâncreas e ≤ 2cm;
T2: tumor limitado ao pâncreas e > 2cm;
T3: tumor estende-se além do pâncreas, mas não invade o tronco/plexo celíaco ou a artéria
mesentérica superior;
T4: tumor invade o tronco/plexo celíaco ou a artéria mesentérica superior, (irressecável);
NX: linfonodos regionais não avaliáveis;
N0: sem metástases em linfonodos regionais;
N1: metástases em linfonodo(s) regional(is).
MX: metástase à distância não avaliável;
M0: sem metástase à distância;
M1: com metástase à distância. Considerar lavado peritoneal positivo.
Agrupamento por estádios, simplificado
0: TisN0M0; IA: T1N0M0; IB: T2N0M0; IIA: T3N0M0; IIB: T1-3N1M0; III: T4qqNM0; IV: qqTqqNM1.
16.2.1. Como estadiar
O estadiamento básico deve ser realizado com exame físico completo, raio-x de tórax e
tomografias computadorizadas de abdome e pelve, de preferência helicoidais, coleta de CA19.9 e
CEA, hemograma, plaquetas, funções renal e hepática.
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MA NUA IS D E CO ND UTAS
Exames como ultrassonografia endoscópica, ressonância nuclear magnética e tomografia
computadorizada por emissão de pósitrons visam elucidar casos nos quais os demais exames não
conseguiram definir a respeito da ressecabilidade, sendo considerados exames complementares.
O exame anatomopatológico é imprescindível para o diagnóstico, uma vez que cerca de 10%
dos casos são de outras histologias que não adenocarcinomas, com prognóstico e tratamento
diferenciados.
16.3.Tratamento
16.3.1. Considerações Gerais
A ressecção com margens microscópicas livres (R0) é a modalidade de escolha no tratamento
do câncer de pâncreas 3, 4, sendo condição prognóstica quanto à sobrevida global, assim como a
linfadenectomia com mais de 10 linfonodos examinados e sem doença 5 e o grau de diferenciação
da lesão 6.
Avaliação laboratorial do biomarcador CA 19.9 pode encontra-se elevada em até 90% dos
pacientes, sem valor para o diagnóstico de tumor pancreático, porém, com valor preditivo de
resposta e sobrevida em pacientes com doença irressecável que se encontram sob tratamento
quimioterápico 7, 8, 9, 10,11.
16.3.2. Doença Clinicamente ressecável (T1-3 N0-1 M0)
Recomenda-se avaliação cirúrgica adequada, preferencialmente em serviço de referência com
cirurgiões experientes, pois além da ressecção cirúrgica ser o único tratamento curativo, a
mortalidade cirúrgica é inversamente proporcional ao número de procedimentos anuais realizados
na instituição em que o paciente é operado 12. A abordagem cirúrgica diferencia-se para massas
localizadas na cabeça, corpo, cauda e processo uncinado do pâncreas.
A fundamentação para instituição de tratamentos local e sistêmico no cenário adjuvante
surgiu devido a falha pós cirúrgica ser comum (doença recorrente); até 80% dos pacientes
desenvolvem progressão de doença nos primeiros 12 meses pós-operatórios 13, 14 e pelas possíveis
progressões local e à distância.
Recomenda-se quimioterapia sistêmica adjuvante, instituida até 6 semanas após a cirurgia,
com gencitabina, 1000mg/m² IV, durante 30 minutos, D1, D8 e D15 a cada D28, por 6 ciclos 15. O
estudo alemão randomizado CONKO-001 avaliou o uso de gencitabina por 6 ciclos versus
observação em pacientes submetidos à ressecção R0, estádios T1-4 com ou sem comprometimento
linfonodal no cenário adjuvante. A análise interina demonstrou sobrevida livre de doença média
de 13.4 meses para o grupo em uso de gencitabina (n=179; 21.2% censurados) e 6.9 meses para o
grupo em observação (n = 175; 7.4% censurados; P<.001). A Sobrevida Global média de 22.8 versus
20.2 meses (n=179; 23.5% censurados vs n=175; 10.9% censurados; P=.005, para gencitabina e
observação, respectivamente).
Na ASCO de 2009, foram apresentados os dados do ESPAC-3, estudo fase III que randomizou
1088 pacientes em cenário adjuvante com início após 8 semanas de cirurgia entre o uso de 5FU/LV (leucovorin, 20mg/m2 IV bolus seguido por 5-FU, 425mg/m2 IV bolus D1 a D5 a cada D28) ou
gencitabina (1,000 mg/m2 IV D1, D8, e D15 a cada D28) por 6 meses 16. A análise não demonstrou
diferença significativa em sobrevida global e não demonstrou superioridade da gencitabina em
relação ao 5-FU. A sobrevida global média foi de 23.0 meses (95% CI: 21.1-25.0 meses) com 5-FU
e 23.6 meses (95%CI: 21.4-26.4 meses) com gencitabina, p=0.56. Este estudo também confirmou
fatores prognósticos: grau histológico, estádio, status nodal e status da ressecção. Assim, o perfil
de toxicidade favorece o uso de gencitabina, no entanto, estes dados suportam como alternativa
o uso de 5-FU no cenário adjuvante.
MANUAIS D E COND UTAS
| 303
Em casos selecionados (pacientes de alto risco) deve-se considerar a instituição de tratamento
combinado composto de quimioterapia e radioterapia com 5-FU 375mg/m² IV, D1 a D5, nas
semanas 1 e 5 de radioterapia ou 5-FU 500mg/m² IV, D1 a D3, nas semana 1 e 5 de radioterapia 17
ou gencitabina 1000mg/m² IV, durante 30 minutos, D1, D8 e D15 a cada D28, por 1 ciclo, como
indução, seguido de radioterapia com 5-FU 250mg/m²/dia – infusional IV, seguido por mais 3 ciclos
adicionais de gencitabina 18.
O estudo fase III randomizado, RTOG (9704) que incluiu 451 pacientes, demonstrou em sua
última atualização (2009) não ter ocorrido diferença significativa em sobrevida global após 5 anos
entre o grupo que recebeu gencitabina ou 5-FU após quimioirradiação (22 vs 18 %).
16.3.3. Doença Clinicamente Irressecável (T3-4 N1 M0)
Recomendamos o uso de gencitabina 1000mg/m² IV, durante 30 minutos, D1, D8 e D15 a
cada D28 como agente único ou em combinação com capecitabina 1660mg/m²/dia VO em duas
tomadas, a cada D21. Em casos isolados deve-se avaliar a possibilidade de instituição de
radioterapia local como consolidação (RxT + 5-FU) 19.
Após reavaliação, caso a doença se torne ressecável é aconselhavel avaliar o paciente em
relação à ressecabilidade e se indicado for, submeter o paciente à cirurgia.
16.3.4. Doença Metastática (qqT qqN M1)
Nesta situação o tratamento é estritamente paliativo, sendo fundamental a avaliação e
acompanhamento do performance status do paciente (0 ou 1), grau de tolerância ao tratamento,
controle de toxicidades e progressão.
Recomendamos suporte paliativo ou uso de gencitabina 1000mg/m² IV, durante 30 minutos,
D1, D8 e D15 a cada D28 como agente único ou em combinação com capecitabina 1660mg/m²/dia
VO em duas tomadas por 14 dias a cada D21.
Um segundo estudo europeu comparou o uso de gencitabina versus a combinação citotóxica
de gencitabina com capecitabina em 533 pacientes com doença localmente avançada ou
metastática demonstrando uma significativa taxa de resposta (19 vs 12%) mas sem benefício em
relação a sobrevida global com a adição da capecitabina (sobrevida global média de 7.1 vs 6.2
meses; p = 0.08). Esta combinação resulta em mais neutropenia graus 3 ou 4 (35 vs 22%), e
eritrodisestesia (graus 3 ou 4 em apenas 4%).20
Configura-se como primeira opção no cenário metastático, dependendo do performance
status do paciente e dos níveis de bilirrubina (21) a combinação FOLFIRINOX (Oxaliplatina 85 mg/m2
D1 + Irinotecano 180 mg/m2 D1 + LV 400 mg/m2 D1 seguido por 5-FU 400 mg/m2 bolus D1 e 2,400
mg/m2 46h em infusão continua a cada 15 dias). Neste estudo (ACCORD 11) 342 pacientes foram
randomizados para o uso de gencitabina vs FOLFIRINOX; após análise interina com a participação
de 250 pacientes ter demonstrado melhora em sobrevida global (objetivo primário), o estudo foi
interrompido. A taxa de resposta objetiva foi significantivamente maior com FOLFIRINOX (31 vs
9%) assim como a sobrevida livre de progressão (6.4 vs 3.3 meses) e sobrevida global (11 vs 6.8
meses). A toxicidade relacionada ao tratamento foi significantivamente maior com FOLFIRINOX,
incluindo graus 3 e 4 de neutropenia (46 vs 19%), neutropenia febril (5.4 vs 0.6%), trombocitopenia
(9.1 vs 2.4%), neuropatia periférica (9 vs 0%), vômitos (15 vs 5%), fadiga (23 vs 14%) e diarreia (13
vs 1%).
Outra opção a ser considerada para pacientes com performance status 0 ou 1, com
preferencialmente menos de 65 anos é a instituição de gencitabina associada a erlotinibe (
gencitabina 1000mg/m² IV D1, D8, D15, D22, D29, D36, D43 e descanso no D50 + Erlotinibe 100
mg/dia VO no primeiro ciclo de indução com posterior ajuste da gencitabina para D1, D8 e D15 a
cada 4 semanas). Esta combinação proporcionou aumento de sobrevida global com HR de 0.82
(95%IC,0.69-0.99;p=0.038) representando 18% de redução no risco de morte e 22% em aumento
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MA NUA IS D E CO ND UTAS
de sobrevida global em um estudo fase III randomizado 22. A média de sobrevida global com
erlotinibe e gencitabina foi modesta (6.24 vs 5.91 meses) enquanto a taxa de sobrevida em 1 ano
foi de 23% para o braço erlotinibe + gencitabina versus 17% (p=0.023) para o braço placebo +
gencitabina. Melhora em PFS com HR de 0.77 (95%IC,0.64-0.92; p=0.004) suporta o efeito benéfico
do erlotinibe. É importante relembrar que neste caso pacientes que desenvolveram erupção
cutânea obtiveram maior controle da doença e sobreviveram por tempo maior (p=0.037; HR, 0.74;
95% IC, 0.56-0.98). A taxa média de sobrevida para pacientes com erupções graus 0, 1 e 2 foram 5.3,
5.8 e 10.5 meses, respectivamente; e as taxas de sobrevida em 1 ano foram 16%, 9% e 43%
(p=0.001).
16.4. Identificação de pacientes de alto risco para recorrência
Ao se considerar tratamento combinado de quimioterapia e radioterapia deve-se avaliar o
performance status do paciente e a existência de situações de risco alto para recidiva local como
margens comprometidas e comprometimento linfonodal. Muitos serviços optam por não aplicar
a radioterapia frequentemente por toxicidade e possivel redução de sobrevida 17.
16.5. Seguimento
Exame físico e exames laboratoriais ( incluindo CA 19.9 nos pacientes com elevação prévia) e
raio-x de tórax a cada 3 meses nos primeiros dois anos e semestralmente até o quinto ano.
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22. Moore MJ, et al. Erlotinib plus Gemcitabine compared with Gemcitabine alone in pacients with
pancreatic cancer: a Phase III trial of the National Cancer Institute of Canada Clinical Trials
Group.J Clin Oncol. 2007;25:1960-1966.
306 |
MA NUA IS D E CO ND UTAS
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Capítulo 17
Câncer de pulmão de
pequenas células
Editor: Dr. Artur Katz
Autores: Dr. Gustavo Fernando Veraldi Ismael, Dr. Robson Ferrigno, Dra. Aknar Freire de Carvalho
Calabrich, Dra. Clarissa Maria Cerqueira Mathias e Dr. Mauro Zukin
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Capítulo 17
Câncer de pulmão de pequenas células
17.1. Introdução
O Câncer de pulmão pequenas células (CPPC) representa de 15% a 20% de todos os casos de
neoplasia de pulmão. É mais agressivo que o carcinoma de células não-pequenas e é o mais
associado ao tabagismo, em torno de 95% dos casos. Outras causas menos comuns podem estar
envolvidas em sua etiologia, tais como exposição ao asbesto, gás radônio, radiação ionizante e a
certos agentes industriais, como arsênico, níquel e cromo 1. Alguns estudos ocidentais apontam
para uma mudança na frequência dos tipos histológicos mais frequentes em pacientes com câncer
de pulmão. O CPPC, que chegou a ser responsável por aproximadamente 20% dos casos de câncer
de pulmão, teve sua a incidência reduzida com o decorrer do tempo. Alguns estudos Brasileiros apontam
também para o declínio deste tipo histológico no cenário local ao longo dos últimos anos 2.
Aproximadamente um terço dos pacientes apresenta doença limitada ao diagnóstico e 10 a
15% são diagnosticados com metástase cerebral. A incidência de metástase cerebral em dois anos
após radioterapia e quimioterapia varia de 50 a 80% 3.
Clinicamente, apresentam-se como lesões centrais, frequentemente na submucosa do
brônquio e mais comumente associados com síndromes paraneoplásicas. Por conta do seu rápido
crescimento e proliferação, o seu curso clínico usualmente é mais rápido. O CPPC é mais responsivo
à quimioterapia e à radioterapia, contudo a resistência à terapêutica também é mais frequente.
A classificação histológica do CPPC modificou-se ao longo dos anos. Atualmente a World
Health Organization (WHO) divide os tumores de origem neuroendócrina em 5 categorias: 1.
Carcinoma de pequenas células, 2. Carcinoma de pequenas células misto, contendo componente
não pequenas células (pelo menos 10% do tumor), 3. Carcinoma neuroendócrino de grandes
células (que tem comportamento biológico similar ao CPPC), 4. Carcinóide típico, 5. Carcinóide
atípico. A imunoistoquímica auxilia na identificação da origem neuroendócrina. São tumores
positivos para citoqueratinas, EMA (epithelial membrane antigen), cromogranina A, neuron-specific
enolase, CD56, entre outros.
17.2. Fatores de Decisão Terapêutica
Os principais fatores prognósticos para decisão terapêutica são o estadiamento clínico da
doença e o estado geral do paciente.
O câncer de pulmão pequenas células, para efeito de decisão terapêutica, é dividido em
doença limitada e doença extensa. A limitada é definida como acometimento de doença primária
e linfonodal em um hemitórax e com possibilidade de apenas um campo de radiação englobar
toda a doença sem causar complicações sérias, usualmente limitada a um hemitórax e a linfonodos
regionais, incluindo linfonodos mediastinais e linfonodos supraclaviculares ipsilaterais. Doença
extensa é quando não atinge os critérios acima e representa 60 a 70% dos casos recémdiagnosticados. O envolvimento de linfonodo supraclavicular ipsilateral é geralmente considerado
como doença limitada 3. O estadiamento utilizado atualmente é o da sétima edição da “American
Joint Committee on Cancer” (AJCC), descrita na Tabela 1. 4
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MA NUA IS D E CO ND UTAS
Tabela 1 - Descrição das categorias T, N e M, na 7ª edição do estadiamento de câncer de pulmão
da AJCC 3
TX
Tumor não pode ser acessado ou diagnosticado pela presença de células neoplásicas
nas secreções broncopulmonares ou em lavados broncoalveolares, porém, não
identificado pela radiografia ou broncoscopia.
T0
Sem evidência de tumor primário.
Tis
Carcinoma in situ.
T1
Tumor com menos de 3 cm no maior diâmetro, circundado por pleura ou tecido
pulmonar em toda a sua extensão, sem evidência de invasão proximal a um brônquio
lobar ao exame endoscópico.
T1a Tumor ≤2 cm na maior dimensão.
T1b Tumor > 2 cm mas ≤ 3 cm na maior dimensão.
T2
Tumor > 3 cm mas ≤ 7 cm ou com qualquer das seguintes características (tumores T2
com essas características são classificados como T2a se d 5 cm): envolve brônquio
principal mas e 2 cm distalmente à carina; invade pleura visceral; associação com
atelectasia ou pneumonite obstrutiva que se estende à região hilar mas não envolve
todo o pulmão.
T2a Tumor > 3 cm mas ≤ 5 cm na maior dimensão.
T2b Tumor > 5 cm mas ≤ 7 cm na maior dimensão.
Tumor > 7 cm ou que invade diretamente qualquer dos seguintes: Parede torácica
T3
(incluindo tumores do sulco superior), diafragma, nervo frênico, pleura mediastinal,
pericárdio parietal; ou tumor no brônquio principal < 2 cm distal à carina, mas sem
envolvê-la, ou atelectasia associada ou pneumonite obstrutiva de todo o pulmão ou
nódulo(s) tumoral(is) separado(s) no mesmo lobo.
Tumor de qualquer tamanho que invade qualquer dos seguintes: mediastino, coração,
T4
grandes vasos, carina, traquéia, laríngeo recorrente, esôfago, corpo vertebral;
nódulo(s) tumoral(is) separado(s) em um lobo ipsilateral diferente.
NX
Linfonodos regionais não-avaliáveis.
N0
Ausência de metástases linfonodais.
N1
Metástases para linfonodos peribrônquicos e/ou hilares ipsilaterais e intrapulmonares,
incluindo envolvimento por extensão direta.
N2
Metástases para linfonodos mediastinais ipsilaterais e/ou sub-carinal (is).
N3
Metástases para linfonodos mediastinais ou hilares contralaterais, escalenos ipsi ou
contralateral ou supraclavicular.
MX
Metástases à distância não-avaliáveis.
M0
Ausência de metástases à distância.
M1
Metástases à distância.
M1a Nódulo separado em lobo contralateral, tumor com nódulo (s) pleural (is) ou derrame
pleural (ou pericárdico) maligno.
M1b Metástases à distância
17.3. Fatores Prognósticos
A sobrevida mediana dos pacientes com CPPC varia significativamente, dependendo de um
conjunto de fatores e características. Para pacientes com doença limitada a sobrevida mediana fica
entre 15 e 20 meses, com 20% a 40% dos pacientes sobrevivendo mais de 2 anos após o
diagnóstico. Para pacientes com doença extensa, a sobrevida mediana fica entre 8 e 13 meses, com
menos de 5% dos pacientes vivos no período de 2 anos após o diagnóstico. A sobrevida aos 5 anos
MANUAIS D E COND UTAS
| 311
é desmotivadora, alcançando apenas 1 a 2% dos pacientes com diagnóstico de doença extensa
ao diagnóstico e 10 a 13% para aqueles pacientes com doença limitada. Fica muito evidente que
o fator prognóstico para o paciente com CPPC é o seu estadiamento ao diagnóstico 5.
O performance status também contribui significativamente para a determinação do
prognóstico do paciente com CPPC, sendo que aqueles com bom performance status possuem um
melhor prognóstico. Vale lembrar aqui que se a queda da performance é consequência direta da
neoplasia, existe um rápido desaparecimento dos sintomas com o tratamento, com consequente
melhora da qualidade de vida. Por outro lado, se o baixo performance status é consequência direta
de comorbidades, podemos enfrentar uma situação de inelegibilidade para a terapêutica 5.
A desidrogenase láctica (DHL) é um bom parâmetro para a extensão da doença, e,
consequentemente, pode ser considerada como um fator prognóstico em pacientes com CPPC.
Hipoalbuminemia e anemia também foram apontadas como fatores de pior prognóstico.
O gênero também é considerado como um fator prognóstico, com vários estudos apontando para
um melhor prognóstico para as mulheres, mas os motivos para esta vantagem ainda não são claros.
17.4. Avaliação Pré-Tratamento
Sítios frequentes de metástases no CPPC são: encéfalo, fígado, medula óssea e ossos. Por esta
razão, uma completa avalição pré-tratamento torna-se necessária, com hemograma completo,
função hepática, função renal, tomografia computadorizada do tórax e do abdome total, além de
cintilografia óssea e tomografia computadorizada ou ressonância nuclear magnética (RNM) do
encéfalo. Mielograma e/ou biópsia de medula óssea não são necessários, a não ser em casos de
presença de eritoblastos no sangue periférico, leucopenia ou trombocitopenia.
Esta completa avaliação na prática pode não ser realizada, uma vez que, na presença de
qualquer sinal de doença avançada, o completo estadiamento deixa de ser mandatório. Contudo,
se o paciente é um candidato à terapia combinada com radioterapia torácica concomitante à
radioterapia, deve se prosseguir a avaliação com o intuito de afastar a possibilidade de doença
avançada.
Mais recentemente, o PET-CT tem demonstrado valor no estadiamento, podendo substituir
a cintilografia óssea e agilizar o processo de detecção de doença extensa. Também tem valor
prognóstico, pois tumores com alta atividades metabólica estão relacionados a pior sobrevida.
17.5. Tratamentos recomendados
17.5.1. Doença Limitada
A melhor combinação é radioterapia e quimioterapia concomitantes. Os melhores resultados
são obtidos quando a radioterapia é realizada durante o primeiro ou segundo ciclo de quimioterapia
com cisplatina e etoposido 6,7. A ressecção cirúrgica deve ser limitada ao uso diagnóstico ou para
estádios precoces (T1-2N0M0), confirmados por PET-CT associado a RNM de crânio, seguida por
quimioterapia sistêmica 3.
Radioterapia torácica
A técnica minimamente recomendada é a conformada, ou seja, planejada com tomografia e
sistema computadorizado para assegurar uma adequada e segura distribuição de dose, conforme
recomendação do Manual de Condutas da Sociedade Brasileira de Radioterapia 8.
O campo da radioterapia torácica preconizado deve envolver toda a doença visível no
momento do planejamento radioterápico (volume pós-quimioterapia) e todas as cadeias
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linfonodais envolvidas ao diagnóstico (volume pré- quimioterapia). Esta limitação de campos está
relacionada a menor toxicidade e não parece impactar negativamente nas taxas de controle local.
Se houver disponibilidade de estadiamento com PET/CT, os campos devem englobar as áreas
inicialmente comprometidas 8.
A dose de radioterapia mais comumente recomendada é de 45Gy, em regime hiperfracionado,
ou seja, com duas aplicações diárias de 1,5Gy, conforme o estudo Intergroup 0096 9. No entanto,
devido aos problemas de logística da ida do paciente duas vezes ao dia para tratamento, outros
regimes são aceitos, com aplicações de uma vez ao dia, com doses de 50 –70Gy em drenagens
linfáticas comprometida e tumor primário 10 – 12.
Quimioterapia
Entre os regimes de quimioterapia mais utilizados, usualmente temos a combinação de uma
platina (cisplatina ou carboplatina) com etoposido . O esquema mais usado inclui cisplatina na
dose de 60mg/m2 EV no D1 e etoposido na dose de 100 a 120mg/m2/dia, D1 a D3, ciclos a cada 3
semanas, num total de 4 ciclos. Esse esquema parece ser a melhor combinação para o tratamento
concomitante com a radioterapia e deve ser iniciado precocemente13. A administração
concomitante destes dois agentes e radioterapia proporciona taxa de sobrevida global em 2 e 5
anos de 50% e 20%, respectivamente.
A toxicidade mais comumente observada é a esofagite, algumas vezes grave, com disfagia e
odinofagia, podendo levar o paciente à desnutrição e desidratação. Lembramos que a cisplatina é
nefrotóxica, recomendando-se monitoramento da função renal e hidratação endovenosa rigorosa.
Radioterapia Profilática Craniana (PCI)
A PCI é considerada atualmente como tratamento padrão para pacientes portadores de
carcinoma de pequenas células de pulmão, inicialmente com doença limitada e que atingiram
remissão completa com radioterapia torácica associada à quimioterapia de indução. O emprego da
PCI reduziu o risco de desenvolvimento de metástases cerebrais em 3 anos (59 vs 33%) e aumentou
a sobrevida em três anos de 15 a 21%, quando comparado com pacientes que não a receberam,
conforme meta-análise publicada 14.
Mesmo com o emprego da PCI, em torno de um terço dos pacientes ainda desenvolvem
metástases cerebrais e a dose e fracionamento ideais para redução desse tipo de recaída ainda não
estão definitivamente determinados.
Atualmente, a dose padrão para PCI é 25Gy em 10 frações diárias de 2,5 Gy, cinco vezes por
semana. Tentativas de aumentar a efetividade biológica com aumento de dose para 36Gy em 18
frações diárias de 2Gy, cinco vezes por semana (fracionamento convencional) ou em 24 frações de
1,5Gy, duas vezes ao dia (regime de hiperfracionamento) não aumentaram a sobrevida ou controle
de doença em sistema nervoso central 15.
Um importante estudo de fase III também avaliou o papel da PCI em pacientes com doença
extensa que responderam ao tratamento. Houve redução na incidência de metástases cerebrais
assim como aumento na sobrevida global em 1 ano de 13% para 27%. Baseados nestes resultados
positivos, o uso de PCI pode ser discutido no cenário da doença limitada ou avançada 16.
17.5.2. Doença extensa
O alicerce do tratamento de pacientes com diagnóstico de CPPC com doença extensa é a
quimioterapia baseada em cisplatina 13. A quimioterapia sistêmica tem um papel fundamental
tanto no aumento da sobrevida global, como também no controle e paliação dos sintomas,
melhorando a qualidade de vida em comparação a paciente que receberam o melhor cuidado de
suporte e/ou paliativo. O esquema mais usado inclui cisplatina na dose de 60mg/m2 EV no D1 e
etoposido na dose de 100 a 120mg/m2/dia, D1 a D3, ciclos a cada 3 semanas, num total de 4 ciclos.
MANUAIS D E COND UTAS
| 313
Até recentemente, nenhum regime de tratamento conseguiu agregar benefício de sobrevida
quando comparado a esta proposta terapêutica. Com a terapia padrão – etoposido combinado à
cisplatina ou à carboplatina – atinge-se uma taxa de resposta clínica entre 75% a 90% e uma taxa
de resposta clínica completa de 50% pode ser antecipada em pacientes com doença limitada. Para
pacientes com doença extensa, pode-se atingir uma taxa de resposta clínica de aproximadamente
50%, além de 25% de taxa de resposta clínica completa. A resposta usualmente é rápida, ocorrendo
dentro dos primeiros 2 ciclos de quimioterapia, com bom controle dos sintomas relacionados à doença.
A despeito da rápida e elevada taxa de resposta clínica, a sobrevida mediana permanece
desalentadora, com aproximadamente 14 meses para pacientes com doença limitada e 9 meses
para pacientes com doença extensa. Menos de 5% dos pacientes com doença extensa adquirem
uma sobrevida superior a 2 anos. Apesar de resultados iniciais da combinação de irinotecano e
cisplatina ter despertado uma grande motivação em um estudo com uma população japonesa 17,
estes resultados não foram confirmados em estudos ocidentais 18. Os motivos para esta diferença
nos resultados não são claros, mas fatores que podem ter contribuído para tal incluem a diferença
na intensidade dos regimes e diferenças farmacogenômicas entre as populações. No momento,
podemos concluir que cisplatina e irinotecano (cisplatina 60mg/m2 EV no D1 e irinotecano
60mg/m2 EV no D1, D8, D15 a cada 4 semanas, por 4 ciclos ou cisplatina 30mg/m2 EV e irinotecano
65mg/m2 EV, ambos no D1 e D8, ciclos a cada 3 semanas, 4 ciclos) constitui uma combinação
alternativa no tratamento de primeira linha do CPPC com doença extensa.
A combinação de epirrubicina e cisplatina foi avaliada em um estudo fase III no tratamento
de pacientes com CPPC (207 pacientes com doença limitada e 192 pacientes com doença extensa).
Os pacientes foram randomizados a receber epirrubicina (100mg/m2) e cisplatina (100mg/m2)
ambos no D1, a cada 21 dias ou etoposido (100mg/m2 D1 a D3) e cisplatina (100mg/m2 no D1). Os
dois grupos apresentaram resultados similares em resposta global (74% e 69%, respectivamente),
tempo livre de progressão (7,6 meses em ambos os grupos) e sobrevida global (10,9 meses versus
10,1 meses). A toxicidade hematológica foi discretamente menor no grupo que recebeu
epirrubicina 19. Embora pouco utilizada, este regime também pode ser considerado como uma
opção no tratamento de primeira linha do CPPC com doença extensa.
A combinação de três ou mais drogas não mostrou vantagem em termos de eficácia quando
comparada à combinação clássica de cisplatina com etoposido e geralmente é associada a uma
maior toxicidade.
Estudos clínicos que avaliaram regimes com quimioterapia em dose densa ou altas doses
foram conduzidos em pacientes com CPPC, mas a maioria deles falhou em mostrar algum benefício
de sobrevida. Em adição a isto, uma meta-análise que avaliou regimes de quimioterapia intensa
sem a necessidade de resgate com transplante de células tronco hematopoiéticas mostrou uma
ausência de correlação entre intensidade da dose de quimioterapia e benefício clínico 20. Estudos
iniciais que avaliaram regimes de quimioterapia mieloablativos com subsequente infusão de células
tronco hematopoiéticas mostraram resultados pouco promissores. Em um estudo fase III que
comparou quimioterapia de alta dose com quimioterapia convencional mostrou um benefício de
sobrevida livre de recorrência para o grupo de pacientes que recebeu o tratamento experimental,
sem que houvesse extensão deste benefício para sobrevida global 21.
Apesar do CPPC ser bastante quimiossensível, dificilmente a doença é eliminada, provavelmente
porque há um pequeno clone de células refratárias aos agentes quimioterápicos utilizados. Para
minimizar esta resistência, alguns estudos exploraram o uso de regimes alternados com diferentes
drogas que não apresentam resistência cruzada ou o uso sequencial de diferentes regimes ativos,
com o objetivo de expor as células neoplásica ao maior número possível de agentes citotóxicos.
Contudo, os resultados destes estudos não demonstraram nenhum benefício em sobrevida, não
sendo recomendado a sua utilização na prática clínica.
314 |
MA NUA IS D E CO ND UTAS
17.5.3. Duração e Manutenção do Tratamento
Os achados da maioria dos estudos randomizados não conseguiram demonstrar um benefício
de sobrevida para o prolongamento da administração da quimioterapia ou mesmo para regime de
consolidação. A duração ótima da terapêutica para pacientes com CPPC permanece entre 4 e 6
ciclos.
17.5.4. Tratamento de Segunda Linha
O tratamento para pacientes com doença recorrente é paliativo, não sendo descrito nenhum
regime com perspectiva curativa. A chance de resposta clínica a um tratamento de segunda linha
correlaciona-se diretamente ao período em que a recorrência ocorre após a terapêutica inicial;
pacientes que conhecem uma recorrência com prazo maior do que 3 meses após o término da
terapêutica de primeira linha são muito mais propensos a apresentarem melhores taxas de resposta
clínica do que aqueles pacientes que recidivam num prazo inferior a 3 meses. Usualmente, a
quimioterapia de segunda linha é menos efetiva que a quimioterapia de primeira linha e a taxa de
resposta é muito variável, dependendo de uma série de fatores, sendo entre eles o tempo entre a
última quimioterapia e a recorrência, refratariedade à quimioterapia de primeira linha, performance
status do paciente, extensão da doença entre outros.
O irinotecano é associado com uma taxa de resposta clínica entre 20 e 40% entre pacientes
sensíveis à terapêutica, com uma sobrevida mediana estimada entre 22 e 27 semanas 22. O regime
mais usado é o que administra irinotecano 125mg/m2 semanalmente, por 4 semanas, a cada 6
semanas. Naqueles pacientes com doença refratária à terapêutica inicial (recorrência em menos
de 3 meses após o seu término), temos uma desalentadora taxa de reposta que varia entre 3% e
11%, com uma sobrevida global mediana de 20 semanas. Outro inibidor da topoisomerase
estudado no contexto de segunda linha é o topotecano que mostrou similar eficácia e melhor
toxicidade em estudo de fase III comparativo com CAV (ciclofosfamida, doxorrubicina e
vincristina)23. Uma opção futura, ainda não disponível comercialmente, será empregar a
amrrubicina no tratamento das recidivas.
Pacientes que tiveram uma recorrência mais tardia também podem responder a um
retratamento com o regime de primeira linha. Outras drogas que mostram atividade em estudos
de fase II no cenário de segunda linha de tratamento são: ciclofosfamida, doxorrubicina, vincristine,
paclitaxel, gencitabina e vinorelbina .
17.5.5. Pacientes Idosos e/ou com Baixa Performance
Assim como no caso de pacientes com CPNPC, pacientes idosos e/ou com baixa performance
trazem grandes desafios para a sua terapêutica. Diferentemente dos pacientes com câncer de
pulmão não-pequenas células, os pacientes idosos com CPPC não se beneficiam de regimes com
monoterapia. Estudos randomizados no qual a monoterapia com etoposido foi comparada com
a terapia padrão de combinação do etoposido com uma platina foram interrompidos pelo prejuízo
ocasionado pelo braço experimental na sobrevida mediana e na qualidade de vida dos pacientes
submetidos a este tipo de tratamento 24. Com isso, o tratamento padrão para pacientes idosos
elegíveis para o tratamento sistêmico é a quimioterapia combinada.
Bibliografia Sugerida
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Capítulo 18
Câncer de pulmão não
pequenas células
Editor: Dr. Artur Katz
Autores: Dra. Aknar Freire de Carvalho Calabrich, Dra. Clarissa Maria de Cerqueira Mathias, Dr. Mauro
Zukin, Dr. Carlos Gil Moreira Ferreira, Dr. Stephen Doral Stefani e Dr. Artur Katz
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Capítulo 18
Câncer de pulmão não pequenas células
18.1. Introdução
Este documento visa atualizar a proposta de padronização do tratamento do câncer de
pulmão não pequenas células (CPNPC) publicados em 2006. Nestes últimos 5 anos, o entendimento
do câncer de pulmão estendeu-se para o nível molecular modificando sobremaneira a seleção dos
quimioterápicos e o uso de drogas alvo moleculares.
Os autores reviram cuidadosamente a literatura referente ao assunto e realizaram extensas
discussões sobre o assunto, procurando alcançar consenso com relação a estratégias de tratamento
do CPNPC que pudessem estar embasadas pela literatura. As sugestões de conduta constantes
deste documento são reflexo das informações médicas atualmente disponíveis e consequentemente
necessitam ser vistas, interpretadas e atualizadas a luz dos novos conhecimentos médicos que
evidentemente hão de surgir. As informações e recomendações contidas neste texto procuram
espelhar a prática médica atualmente aceita mundialmente em grandes centros oncológicos.
Reconhecemos que nem todos os recursos mencionados neste documento estão disponíveis
rotineiramente em nosso país, mas procuramos proporcionar uma visão atualizada das condutas
médicas, as quais poderão requerer adaptações decorrentes das condições regionais. Nosso
objetivo é auxiliar o médico em seu processo de tomada de decisões terapêuticas, não tendo,
contudo a pretensão de esgotar o assunto, substituir o raciocínio clínico, indispensável aos cuidados
do paciente oncológico ou definir um padrão único de conduta frente ao paciente portador de
câncer de pulmão que preferencialmente deve ser individualizada.
18.2. Avaliação Pré-Tratamento
Na suspeita de câncer de pulmão, é imperativa a realização de procedimentos para
diagnóstico e avaliação da extensão da doença, a fim de que se possa definir o procedimento
terapêutico. Além da anamnese e exame físico, devem ser realizados exames laboratoriais incluindo
hemograma, cálcio, fosfatase alcalina, TGO, TGP, bilirrubinas e creatinina.1 O uso rotineiro de
marcadores tumores ainda não foi estabelecido. Os exames de imagem para avaliar extensão local
ou à distância incluem tomografia computadorizada (TC) de tórax e abdome superior e cintilografia
óssea ou, se disponível, PET-CT, que tem melhor acurácia na avaliação de linfonodos mediastinais
e metástases à distância.2,3 A ressonância nuclear magnética (RNM) de crânio apresenta maior
sensibilidade do que a tomografia na detecção de metástases cerebrais e deve ser realizada em todo
paciente com sintomas neurológicos ou doença com envolvimento linfonodal ou metastático.4
Para pacientes candidatos a cirurgia, devem ser incluídos uma avaliação da função cardiopulmonar.
A comprovação histológica é fundamental para o diagnóstico e definição terapêutica. Em
muitos casos, pode ser feita por procedimentos minimamente invasivos como broncoscopia,
guiados por tomografia ou ultra-som, ou serem realizadas simultaneamente ao processo de
estadiamento como na avaliação de linfonodos mediastinais como descrito abaixo. A localização,
facilidade, segurança e experiência é que vão determinar o melhor método.
320 |
MA NUA IS D E CO ND UTAS
A avaliação mediastinal adequada tem importante valor o prognóstico (Tabela 1) e no
planejamento terapêutico. Linfonodos mediastinais cujo menor diâmetro seja superior a 1,3-1,5cm
na tomografia ou que sejam positivos no PET-CT necessitam ser avaliados do ponto de vista
anátomopatológico (biópsia ou citologia). O PET-CT tem um alto valor preditivo negativo, porém
baixo valor preditivo positivo.5 O material linfonodal para patologia pode ser obtido através de
diversas técnicas minimamente invasivas como mediastinoscopia, mediastinotomia, toracoscopia,
biópsia transtorácica guiada por tomografia computadorizada ou punção transesofágica ou
endobrônquica dirigida por ecoendoscopia, broncoscopia ou US endobrônquico.
Importante ressaltar que em 2010 foi publicada a sétima edição do estadiamento TNM (Tabela
2). As principais modificações são a subdivisão do T1 e T2 de acordo com o tamanho da lesão e a
reclassificação da efusão pleural maligna como M1a e nódulos satélites no mesmo lobo como T3
ou nódulos em lobos diferentes homolaterais como T4.
Recomendação
• O estadiamento do paciente com câncer de pulmão deve incluir história clínica e exame
físico, testes laboratoriais, PET-CT ou tomografia de tórax e abdomen associado a cintilografia óssea.
• Em casos indicados, solicitar RNM de crânio e prova de função cardio-pulmonar. O diagnóstico
histológico deve ser realizado sempre que possível.
Linfonodos mediastinais suspeitos pelos exames de imagem devem ser confirmados
patologicamente.
Tabela 1 - Correlação entre envolvimento linfonodal e sobrevida em 5 anos
Envolvimento Linfonodal
N2 microscópico, um nível comprometido
N2 microscópico, múltiplos níveis comprometidos
N2 clínico, um nível comprometido
N2 clínico, múltiplos níveis comprometido
Sobrevida em 5 anos
34%
11%
8%
3%
Tabela 2 - 7ª edição do estadiamento TNM
Tumor primário (T)
T1
Tumor ≤3cm de diâmetro, circundado por pulmão ou pleura visceral, sem invasão
proximal mais do que brônquio lobar
T1a
Tumor ≤2cm de diâmetro
T1b
Tumor >2cm mas ≤3cm de diâmetro
T2
Tumor >3cm mas ≤7cm, ou tumor com qualquer das seguintes características:
Envolvimento de brônquio principal, ≥2cm distante da carina
Invade pleura visceral
Associado com atelectasia ou pneumonite obstrutiva que estende para a região hilar
mas não envolve o pulmão inteiro
T2a
Tumor >3cm mas ≤5cm
T2b
Tumor >5cm mas ≤7cm
T3
Tumor >7cm ou qualquer das seguintes características:
Invasão direta de: parede torácica, nervo frênico, pleura mediastinal, pericárdio
parietal, brônquio principal a menos de 2cm da carina (sem envolvimento da carina)
Atelectasia ou pneumonite obstrutiva do pulmão inteiro
T4
Nódulos tumorais separados no mesmo lobo
Tumor de qualquer tamanho que invade mediastino, coração, grande vasos, traqueia,
nervo laríngeo recorrente, corpo vertebral, carina, ou nódulos separados em lobos
diferentes ipsilaterais
MANUAIS D E COND UTAS
| 321
Linfonodos regionais (N)
Sem linfonodos regionais metastáticos
N0
Metástase em linfonodos peribrônquicos e/ou hilares ipsilaterais, linfonodos
N1
intrapulmonares incluindo envolvimento por extensão direta
Metástases em linfonodos mediastinais ipsilaterais e/ou subcarinais
N2
Metástases em linfonodos contralaterais mediastinais ou hilares, ipslaterais ou contraN3
laterais escalenos, ou linfonodos supraclaviculares
Metástases a distância (M)
M0
Sem metástases à distância
M1
Metástases à distância
M1a
Nódulos tumorais separados em lobos contralaterais; nódulos pleurais ou efusão
pleural ou pericárdica maligna
Metástases à distância (em órgãos extratorácicos)
M1b
Agrupamento
Estádio IA
Estádio IB
Estádio IIA
Estádio IIB
Estádio IIIA
Estádio IIIB
Estádio IV
T1a-T1b
T2a
T1a,T1b,T2a
T2b
T2b
T3
T1a,T1b,T2a,T2b
T3
T4
T4
Qualquer T
Qualquer T
N0
N0
N1
N0
N1
N0
N2
N1,N2
N0,N1
N2
N3
Qualquer N
M0
M0
M0
M0
M0
M0
M0
M0
M0
M0
M0
M1a or M1b
18.3. recomendações Terapêuticas
18.3.1. Estádio I
Lobectomia é o tratamento padrão em pacientes com câncer de pulmão não pequenas células
estádio I.6 O estudo ACOSOG Z0030 apresentado no 90º Encontro da AATS (American Association
for Thoracic Surgery) demonstrou que em pacientes T1/T2 e N0/N1 (não hilar) a amostragem
linfonodal das cadeias 2R, 4R, 7 e 10R para tumores à direita; e das cadeias 5, 6, 7 e 10L para tumores
à esquerda tem resultado semelhante a dissecção linfonodal casos os linfonodos sejam negativos.
A toracoscopia vídeoassistida (VATS) apresenta-se como uma modalidade com menor morbidade
e, provavelmente sem impactar negativamente no prognóstico;7,8 estudos estão em andamento.
Já a ressecção segmentar pode ser uma opção para os pacientes que não toleram cirurgias mais
extensas; um único estudo randomizado, entretanto, sugere maior taxa de recorrência local e
tendência a maior mortalidade quando comparada a lobectomia.9 A radioterapia também pode ser
uma opção para os pacientes não candidatos ou que recusam a cirurgia. As taxas de sobrevida em
3 anos variam de 17 a 55%.10 Novas modalidades e estratégias radioterápicas como esterotaxia e
radiofrequência oferecem baixa morbidade.
O benefício da quimioterapia adjuvante em casos iniciais de pulmão não-pequenas células
(estádio I) não está comprovado. Importantes estudos clínicos (IALT11, JBR.1012 e ANITA13)
inicialmente demonstraram benefício da quimioterapia adjuvante baseada platina em pacientes
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MA NUA IS D E CO ND UTAS
portadores de tumores dos estádios IB a IIIA. Entretanto, a publicação do estudo CALGB 963314 e
a atualização do estudo JBR.1015 sugerem que, entre os pacientes câncer de pulmão estádio IB,
somente aqueles com tumores acima de 4cm é que teriam ganho de sobrevida livre de progressão
e sobrevida global com o tratamento adjuvante. Porém, estes dados são extraídos de análises de
subgrupo. Na meta-análise LACE, a quimioterapia adjuvante confere ganho na sobrevida de apenas
3%, não estatisticamente significante, no estádio IB e tem efeito deletério na sobrevida para os
pacientes com estádio IA.16 O emprego da quimioterapia adjuvante poderá ser eventualmente
discutido em pacientes considerados de alto risco, como portadores de neoplasia pouco diferenciada,
invasão vascular ou linfática, ressecção em cunha, margens mínimas ou dissecção linfonodal
inadequada ou não realizada. Estes fatores de risco, embora não possam ser considerados objetos
de consenso na literatura médica, são adotados por grupos como o National Comprehensive Cancer
Network® (NCCN), com base no consenso entre especialistas, o que constitui um baixo nível de
evidência científica.
Recomendação
• Lobectomia com avaliação linfonodal (amostragem de pelo menos 3 cadeias N2 ou dissecção
mediastinal completa) é o tratamento padrão para pacientes estádio I.
• Cirurgias segmentares ou radioterapia é uma opção em pacientes não candidatos a cirurgia.
• Não há benefício comprovado de tratamento adjuvante. Em casos selecionados, a depender
dos fatores de risco, a quimioterapia baseada em platina pode ser discutida.
18.3.2. Estádio Cirúrgico II
Por muitos anos, a cirurgia era o único tratamento empregado no CPNPC estádios I-III.
Somente após a meta-análise publicada em 1995, demonstrando ganho de sobrevida de 5% com
a quimioterapia adjuvante que está modalidade de tratamento passou a ser considerada em
pacientes com câncer de pulmão ressecado.17 Desde então, novos estudos foram conduzidos no
intuito de confirmar estes resultados com dados positivos como o IALT11, ANITA13 e JBR.10.12 Na
meta-análise LACE, a quimioterapia adjuvante baseada em platina é capaz de aumentar a sobrevida
global em 5 anos em 5.4%.16 Os ganhos são mais expressivos e estatisticamente positivos somente
em pacientes com estádio II e III, nos quais a redução de risco de morte é de 17%. A mais recente
meta-análise com dados individuais de pacientes demonstrou um ganho absoluto de 4% na
sobrevida global em 5 anos com a quimioterapia após a cirurgia.18
Os estudos positivos utilizam cisplatina em doses variadas combinada a diferentes agentes,
dificultando a interpretação dos resultados de qual seria a melhor combinação. A combinação de
carboplatina com paclitaxel foi avaliada em dois estudos (CALGB 963314 e NATCH19 com resultados
negativos. Os dados mais consistentes são com a combinação de cisplatina/vinorelbina por 4 ciclos.
Recomendação
• Pacientes com CPNPC estádio II devem ser tratados com lobectomia associada a dissecção
linfonodal seguido de quimioterapia adjuvante com duas drogas baseada em cisplatina por 4 ciclos,
na ausência de contra-indicação ou comorbidades importantes.
18.3.3. Estádio III
O tratamento ideal para os pacientes com CPNPC estádio III é motivo de muita controvérsia,
visto tratar-se de um grupo heterogêneo de doença. Envolve tumores tanto com crescimento local
(T3N1) quanto metastáticos para linfonodos mediastinais (T1-T3 N2). Apesar do prognóstico variar
sobremaneira entre os pacientes com doença IIIA ou IIIB, as taxas de cura são baixas com as opções
de tratamento atualmente disponíveis.20
O estadiamento preciso dos linfonodos mediastinais é indispensável antes que se proponha
qualquer estratégia terapêutica. Devemos enfatizar que são poucos os candidatos a cirurgia nesta
MANUAIS D E COND UTAS
| 323
categoria. Dentre eles, estão os pacientes inicialmente classificados clinicamente como estádio I ou
II, porém posteriormente detectados com estádio III na patologia, os pacientes com doença local
volumosa e sem envolvimento mediastinal, porém ressecáveis (T3 N0-1) ou aqueles com linfonodo
N2 único menor do que 3cm.21 Infelizmente, em nosso meio, a avaliação histológica mediastinal
pré-operatória não é rotineiramente realizada na imensa maioria dos pacientes operados o que
acarreta subestadiamento pré-operatório. Também é muito importante a realização de toracocentese
em pacientes portadores de derrame pleural, a fim de que seja determinada a natureza do derrame.
Caso seja de origem maligna, estes pacientes são considerados estádio IV pela 7ª edição TNM
(Tabela 2).
Em pacientes operados e classificados como IIIA, não há dúvidas do benefício da quimioterapia
adjuvante com redução de risco de morte entre 17-20%.6 A radioterapia pós-operatória é deletéria
em pacientes N0 ou N1, porém está associada a aumento de sobrevida livre de progressão e
sobrevida global em pacientes N2.22 A radioterapia adjuvante também pode ser considerada em
pacientes com margens positivas, dissecção linfonodal inadequada, comprometimento de múltiplas
estações linfonodais mediastinais ou extravasamento capsular linfonodal apesar de escassez de
estudos nestes cenários.
De forma geral, os pacientes portadores de estádio III são candidatos a tratamento multidisciplinar. A maior parte destes pacientes deverá ser tratada com radioterapia e quimioterapia
concomitantes.23,24 Não há benefício do uso de quimioterapia de consolidação conforme demonstrado
em 2 estudos randomizados.25,26 Pacientes com contra-indicação ou que não toleram tratamento
concomitante, devem ser tratados com radioterapia exclusiva ou quimioterapia e radioterapia
sequenciais.27,28
O papel da cirurgia em estádio III é motivo de debate. O estudo de fase III conduzido pelo
EORTC não demonstrou diferença entre a cirurgia ou radioterapia após 3 ciclos de quimioterapia
de indução baseada em platina.29 Também não está claramente estabelecido se a cirurgia deva ser
realizada após tratamento radioquimioterápico concomitante inicial, devido a suas elevadas taxas
de morbi-mortalidade, sobretudo entre os pacientes cujo procedimento cirúrgico potencialmente
necessário seja a pneumectomia. O estudo do Intergroup 0139 sugere que a cirurgia pode ser
benéfica em pacientes com doença IIIA (N2) tratados com quimiorradioterapia de indução e
posteriormente submetidos a lobectomia.30 A pneumectomia foi associada a maior mortalidade e
não deve ser realizada.30 Idealmente, antes deste procedimento o paciente deve ser submetido a
pesquisa histológica dos linfonodos mediastinais, uma vez que pacientes cujos linfonodos
mediastinais permanecem comprometidos por neoplasia após o tratamento de indução parecem
não se beneficiar da cirurgia31,32 e devem completar o tratamento quimiorradioterápico até a dose
de 60Gy. As drogas utilizadas no estudo do Intergroup 0139 foram cisplatina e etoposido. Alguns
estudos têm demonstrado que a combinação de carboplatina e paclitaxel também é efetiva e com
toxicidade aceitável.33
Tumores de sulco superior devem ser tratados com esquema multidisciplinar contendo
quimioterapia, radioterapia e cirurgia,34,35 seguindo como modelo o esquema adotado nos estudos
SWOG 880524 e Intergrupo 0139.30
Recomendação
• Pacientes com CPNPC estádio IIIA ressecados devem ser tratados com quimioterapia
adjuvante baseada em cisplatina por 4 ciclos. Em casos selecionados, discutir radioterapia pósoperatória
• Quimiorradioterapia com dose de 60Gy é o tratamento padrão em CPNPC estádio III em
pacientes com boa condição clínica. As drogas sugeridas são a combinação de cisplatina e
etoposido ou carboplatina e paclitaxel
• Em pacientes que não toleram o tratamento concomitante, a opção é a quimioterapia e
radioterapia sequencial ou radioterapia exclusiva
324 |
MA NUA IS D E CO ND UTAS
• Lobectomia após tratamento de indução pode ser considerada em casos selecionados IIIA
18.3.4. Estádio IV - Primeira Linha
A quimioterapia paliativa para câncer de pulmão não-pequenas células estádio IV, quando
comparada à terapia de suporte clínico, demonstra aumento da sobrevida independente da
histologia, idade ou performance status.17,36,37 A quimioterapia com duas drogas determina
resultados superiores em relação a taxa de resposta e sobrevida quando comparada à quimioterapia
com agente único.38 O uso de uma terceira droga quimioterápica, no entanto, não acrescenta
benefício.38 Os esquemas baseados em platina (cisplatina ou carboplatina) são considerados
tratamento padrão. Algumas evidências sugerem que o uso da cisplatina proporciona uma taxa de
resposta superior quando comparado a carboplatina, às custas de maior toxicidade.39
Os esquemas de última geração, incluindo platina associada com vinorelbina, gencitabina,
paclitaxel ou docetaxel mostram taxas de respostas superiores aos esquemas da geração anterior,
além de menor toxicidade, com benefício marginal em relação à sobrevida. Apesar do grande
número de estudos randomizados, nenhum deles foi capaz de mostrar superioridade de um
esquema em especial e nenhuma combinação é considerada a melhor escolha isoladamente.40
Entretanto, a histologia pode ter interferência na atividade da droga. Um grande estudo
randomizado demonstrou que o pemetrexede tem maior atividade contra os adenocarcinomas,
além bom perfil de toxicidade, porém não deve ser utilizado na histologia escamosa.41,42
Gencitabina associado com docetaxel, paclitaxel ou vinorelbina, ou paclitaxel associado à vinorelbina
têm demonstrado taxa de resposta, tempo para progressão do tumor e sobrevida semelhantes
aos esquemas que não utilizam platina.43 Todavia, estes esquemas devem ser indicados apenas
quando houver contra indicação ao uso de platina.
O entendimento da biologia molecular do câncer de pulmão tem possibilitado a descoberta
de alterações genéticas prognósticas e preditivas do tratamento. O avanço mais importante
recentemente foi a detecção da mutação do Receptor do Fator de Crescimento Epidérmico (EGFR),
presente ao redor de 10-15% dos caucasianos e 50% dos asiáticos.44 A incidência é maior na
histologia adenocarcinoma e nunca fumantes. O estudo IPASS randomizou pacientes asiáticos
portadores de adenocarcinoma de pulmão estádio IV para gefitibibe versus quimioterapia com
carboplatina e paclitaxel. Nos pacientes com mutação do EGFR houve importante aumento na taxa
de resposta e sobrevida livre de progressão com o uso do gefitinibe comparada a quimioterapia.
Entretanto, nos pacientes sem mutação, o gefitinibe foi associado a pior taxa de resposta e
sobrevida livre de progressão.45 A sobrevida global não diferenciou provavelmente em virtude do
cruzamento entre os braços.46 Outros estudos confirmaram estes resultados e tornaram o inibidor
tirosino-quinase (erlotinibe ou gefitinibe) como terapia padrão de primeira linha em câncer de
pulmão metastáticos positivos para mutação do EGFR.47-49 As característcias clínicas como histologia
adenocarcinoma, pouco ou nunca fumantes, sexo feminino e origem asiática estão relacionados a
maior incidência da mutação do EGFR, porém, somente o teste genético positivo para mutação é que
deve determinar o uso desta classe de drogas em primeira linha. Estas drogas não devem ser
utilizadas em combinação com quimioterapia devido ausência de benefício com esta combinação.50,51
O uso de anticorpos monoclonais também foi avaliado no tratamento de primeira linha do
CPNPC. A adição de bevacizumabe a quimioterapia foi associado a aumento na taxa de resposta,52,53
aumento na sobrevida libre de progressão52,53 e aumento na sobrevida global.52 Entretanto, é
fundamental a seleção do paciente que vai receber este tratamento em virtude dos potenciais
efeitos colaterais como hipertensão, sangramentos, maior incidência de neutropenia febril e
tromboembolismo. Pacientes com histologia escamosa, história de hemoptise ou presença de
invasão de grandes vasos não devem ser tratados com bevacizumabe. Presença de metástase
cerebral e terapia de anticoagulação não são consideradas contra-indicações absolutas ao
tratamento.54 O uso do anticorpo monoclonal cetuximabe, que bloqueia o receptor do EGFR, foi
MANUAIS D E COND UTAS
| 325
associado a aumento de taxa de resposta em combinação a quimioterapia em dois estudos
randomizados.55,56 Entretanto, um ganho pouco expressivo de sobrevida global sem ganho na
sobrevida livre de progressão só foi demonstrado com a combinação com cisplatina e vinorelbina55.
Os pacientes incluídos eram positivos para EGFR na imunoistoquímica, independente da histologia.
Entretanto marcadores biológicos de resposta ainda estão sendo investigados.
Classicamente, o tempo de tratamento com quimioterapia era restrito a 4 a 6 ciclos devido a
ausência de impacto na sobrevida com esquemas mais prolongado.57,58 Com o surgimento de novas
drogas, estes paradigmas estão sendo questionados e novos estudos têm sugeridos que a terapia
de manutenção/sequencial pode ter impacto positivo na sobrevida. O tratamento de manutenção
com pemetrexede após quimioterapia baseada em platina foi associado a aumento de sobrevida
livre de progressão e sobrevida global em pacientes com histologia não escamosa.59 Outra opção
é o uso dos inibidores tirosina-quinases que foram capazes de aumentar a sobrevida livre de
progressão60,61 e sobrevida global60 independente da histologia ou presença de mutação do EGFR.
Como até 50% dos pacientes não conseguem receber tratamento na progressão devido condições
clínicas, a terapia precoce oferece a chance destes pacientes receberam um segundo tratamento
efetivo e se beneficiarem com isto. Em pacientes que podem ser seguidos de perto, a suspensão
do tratamento e reintrodução na progressão continua sendo uma opção apropriada.
Em pacientes portadores de performance status 2, podemos considerar o emprego de
combinações não contendo platina ou eventualmente até mesmo o emprego de drogas isoladas.
Pacientes idosos deverão ser avaliados predominantemente segundo sua condição clínica
(perfomance status) para que se defina o tratamento quimioterápico a ser empregado. A idade
não deverá ser considerada isoladamente como fator decisório na determinação de conduta.
Embora não exista um limite claro a ser seguido na questão de idade, o emprego de quimioterapia
para indivíduos com idade superior a 75 anos deverá ser considerado de maneira extremamente
individual e criteriosa. Pacientes com idade inferior a 70 anos e bom estado geral (PS 0 ou 1) e sem
contra-indicações para platina poderão receber esquemas terapêuticos semelhantes aos pacientes
mais jovens. Aqueles, com contra-indicação para platina, poderão receber quimioterapia com
agente único (vinorelbina ou gencitabina).
A integração precoce da terapia de suporte em pacientes com câncer de pulmão impacta
positivamente não só na qualidade de vida, mas na sobrevida global.62 O uso de bisfosfanatos em
pacientes com metástases ósseas no CPNPC reduz de forma significativa a incidência de fraturas
patológicas, compressão medular, hipercalcemia e necessidade de cirugia ou radioterapia para
doença óssea.63
Recomendação
• Todo paciente com CPNPC estádio com histologia adenocarcinoma deve ser pesquisado
para presença de mutação do EGFR. Caso positivo, o tratamento inicial pode ser com inibidor
tirosina-quinase (ou quimioterapia, com expectativa de menor taxa de resposta, qualidade de vida
inferior, porém com sobrevida igual, desde que se possa oferecer tratamento com inibidor de
tirosina-quinase como tratamento de segunda linha)
• Pacientes com EGFR não mutado ou indeterminado, devem ser tratados inicialmente com
quimioterapia baseada em combinação com platina. Pemetrexede não deve ser utilizado em
histologia escamosa, sendo uma opção bem tolerada e ativa em adenocarcinomas
• Para pacientes com bom performance status e na ausência de contra-indicação, o bevacizumabe
deve ser adicionado à quimioterapia e mantido até progressão ou toxicidade limitante
• Terapia sequencial (manutenção ou segunda linha precoce) com pemetrexede e erlotinibe
pode ser considerada em pacientes que não progrediram aos regimes de primeira linha, limitando
o pemetrexede a histologia não escamosa
326 |
MA NUA IS D E CO ND UTAS
18.3.5. Estádio IV - Segunda e Terceira Linhas
Alguns agentes quimioterápicos foram avaliados e demonstraram eficácia no tratamento de
segunda linha, proporcionando sobrevida superior ao tratamento de suporte: pemetrexede
(histologia não escamosa),64 docetaxel65 e os inibidores tirosina-quinase, erlotinibe66 e gefitinibe.67
A comparação direta entre as drogas demonstrou eficácia equivalente e diferentes perfis de
toxicidade, o que influencia a escolha do tratamento. Não é necessária a presença de mutação do
EGFR para ter o benefício dos inibidores tirosino-quinase em segunda e terceira linha.
Ao contrário do que ocorre no tratamento quimioterápico de primeira linha, não existem
estudos prospectivos que determinem à duração ideal dos tratamentos de segunda linha. A
duração do tratamento será determinada pela sua eficácia e tolerabilidade, muitas vezes
estendendo-se até progressão de doença.
Recomendação
• As drogas de escolha no tratamento do CPNPC metastático que progrediram a primeira
linha são pemetrexede (histologia não escamosa), docetaxel, erlotinibe e gefitinibe
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MANUAIS D E COND UTAS
| 331
Capítulo 19
Câncer de Cabeça e Pescoço
Editora: Dra. Aline Lauda Freitas Chaves
Autores: Dra. Aline Lauda Freitas Chaves; Dr. Christian Domenge, Dr. Daniel Herchenhorn, Dr. Diego
Chaves Rezende Morais, Dr. Fernando Luiz Dias, Dr. Gilberto de Castro Junior, Dr. João Marcos Arantes
Soares, Dr. Luiz Paulo Kowalski e Dr. Raphael Abreu Sepulcri
332 |
MA NUA IS D E CO ND UTAS
MANUAIS D E COND UTAS
| 333
Capítulo 19
Câncer de Cabeça e Pescoço
19.1. Abordagem Geral do paciente portador de Câncer de cabeça e
pescoço
19.1.1. Introdução
O termo câncer de cabeça e pescoço (CCP) refere-se às neoplasias malignas com sítio primário
no trato aerodigestivo superior, sendo o carcinoma epidermoide a histologia mais comum, que
será o foco deste manual. Apesar de muitas vezes ser tratado como entidade única, possui
comportamento clínico diferente para cada subsítio, sendo fundamental para seu tratamento
diferenciar o subsítio anatômico do tumor, seja cavidade oral, orofaringe, laringe, hipofaringe e
nasofaringe. Além desses, ainda são relativamente frequentes os tumores primários nasosinusais,
de glândulas salivares e de tireóide, que não serão aqui abordados. No global, sua taxa de cura gira
em torno de 50%. Nos estadiamentos iniciais (I e II), o tratamento cirúrgico e/ou radioterápico é a
modalidade de escolha, proporcionando sobrevida em 5 anos em torno de 80%. Para pacientes
com doença localmente avançada (estadiamentos III e IV), que correspondem a maioria dos
pacientes ao diagnóstico, a sobrevida em 5 anos é menor, variando de 10 a 50%, mesmo utilizando
o tratamento multimodal, isto é, combinações de cirurgia, quimioterapia e radioterapia.
Os principais fatores de risco são tabagismo e etilismo. O Papiloma Vírus Humano (HPV) tem
se revelado como importante fator de risco, estando envolvido principalmente, mas não
exclusivamente, na carcinogênese dos tumores da orofaringe. Outros fatores incluem o uso de
maconha, história familiar e infecção pelo vírus de Epstein-Barr, no caso de tumores de nasofaringe.
Alguns fatores de risco identificados em estudos caso-controle com menor evidência estatística
são: higiene oral precária, fatores ocupacionais, dieta rica em gorduras e pobre em verduras e frutas.
Identificar estes fatores e abordá-los na prática clínica é fundamental para o controle adequado do
tumor, pois a reexposição aos mesmos pode aumentar a chance de recidiva, diminuir o controle
local da doença e aumentar a chance de surgimento de segunda neoplasia primária, além de estar
relacionada à maior toxicidade de tratamento, como no caso da má higiene oral. Estima-se que 15
a 25% dos pacientes portadores de câncer de cabeça e pescoço (CCP) desenvolverão uma segunda
neoplasia primária, a maioria nas vias aerodigestivas superiores, pulmão ou esôfago.
É importante salientarmos aqui que está ocorrendo uma mudança no perfil do paciente
portador de CCP. Em sua maioria são pacientes tabagistas e etilistas, na faixa acima de 50 anos. A
infecção pelo HPV tem aumentado a incidência dos tumores de orofaringe em pacientes jovens.
Esse dado é importante para trabalharmos estratégias de tratamento e prevenção.
Os fatores prognósticos podem ser relacionados ao tumor (como subsítio anatômico,
estadiamento clínico, margem comprometida, grau de diferenciação, extravasamento extracapsular,
invasão angiolinfática e perineural) ou relacionados ao paciente (performance status, idade,
comorbidades). Fatores moleculares, como superexpressão do receptor do fator de crescimento
epidérmico (EGFR), conferem pior prognóstico, porém sua pesquisa não é utilizada na prática
clínica. O principal fator prognóstico entre os mencionados é a presença de linfonodos cervicais
metastáticos (principalmente com extravasamento extracapsular), que diminui em 50% a sobrevida
dos pacientes.
334 |
MA NUA IS D E CO ND UTAS
19.2. Diagnóstico e Estadiamento
O diagnóstico inicial é realizado pelo exame clínico e endoscópico (videonasofaringolaringoscopia).
Recomenda-se que o estadiamento inicial seja realizado pelo cirurgião de cabeça e pescoço ou
otorrinolaringologista com experiência em avaliar tumores da cabeça e pescoço. O diagnóstico
definitivo só é firmado após a análise histológica de material obtido por biópsia do tumor primário
ou do linfonodo cervical metastático se o sítio primário não for encontrado. Quanto aos exames de
imagem, a tomografia de pescoço e/ou de face é o exame de escolha, pois permite a avaliação da
extensão da invasão óssea e cartilaginosa e avaliação dos linfonodos cervicais. Ressonância nuclear
magnética é o exame que oferece melhor avaliação da extensão do tumor para partes moles,
sistema nervoso central e base do crânio. Para estadiamento adequado, todos os pacientes deverão
ser submetidos a exame completo da cabeça e pescoço (para afastar tumores sincrônicos) e
radiografia de tórax. Considerar tomografia de tórax nos tumores com metástases cervicais
estadiados como N2-N3. Outros exames de estadiamento deverão ser solicitados de acordo com
a clínica do paciente. PET-CT não é indicado para estadiamento (exceto para nasofaringe), mas tem
sido considerado na avaliação da resposta após tratamento combinado, principalmente na
avaliação da resposta dos linfonodos, para selecionar os candidatos a esvaziamento cervical. Porém,
em estudo prospectivo apresentado pelo Grupo de Oncologia Clínica de Ontário no congresso da
ASCO em 2011, o valor do PET-CT no contexto de avaliação de resposta linfonodal ao tratamento
foi questionado devido a baixa sensibilidade e especificidade. Portanto, não há conclusões
definitivas sobre o PET-CT neste contexto.
O estadiamento é feito pelo AJCC 7ª. Edição (2010). O estadiamento T varia de acordo com o
sítio primário da doença (vide adiante). O estadiamento linfonodal (N) é o mesmo para os tumores
da cavidade oral, laringe, hipofaringe e orofaringe, assim como o estádio agrupado.
T: descrito em cada subsítio;
Nx: Linfonodos regionais não podem ser avaliados;
N0: Sem metástases em linfonodos regionais;
N1: Linfonodo regional único, ipsilateral ao tumor e com ≤ 3cm nas maiores dimensões;
N2a: Linfonodo regional único, ipsilateral ao tumor com tamanho entre 3cm e 6cm;
N2b: Múltiplos linfonodos regionais comprometidos, ipsilaterais ao tumor, nenhum com mais
de 6cm nas suas maiores dimensões;
N2c: Linfonodos regionais bilaterais ou contralaterais comprometidos, nenhum maior que 6cm
em sua maior dimensão;
N3: Linfonodo regional comprometido com mais de 6cm em sua maior dimensão;
M0: Ausência de metástases à distância;
M1: Presença de metástases à distância.
Estádio Clínico
0
I
II
III
IVA
IVB
IVC
TNM
Tis N0 M0
T1 N0 M0
T2 N0 M0
T3 N0 M0, T1-3 N1 M0
T4a N0-2 M0, T1-3 N2 M0
Tqquer N3 M0, T4b Nqquer M0
Tqquer Nqquer M1
MANUAIS D E COND UTAS
| 335
As modalidades terapêuticas disponíveis são:
• Cirurgia: é a modalidade padrão para controle locorregional com intenção curativa e inclui
desde cirurgias com preservação de órgão até procedimentos radicais extensos, envolvendo a
execução concomitante de ressecção e reconstrução, muitas vezes realizadas por equipes cirúrgicas
diferentes. O principio básico da cirurgia com intenção curativa é a ressecção do tumor primário
com margens de segurança, tratamento das cadeias linfáticas cervicais e reconstrução imediata.
Considera-se tumor irressecável quando há envolvimento circular de carótida, invasão de fáscia
pré-vertebral e invasão de base de crânio.
• radioterapia: pode ser utilizada como modalidade de tratamento curativo de forma isolada
nos tumores iniciais ou em associação à quimioterapia em tumores localmente avançados.
Desempenha também papel importante no tratamento adjuvante de tumores localmente
avançados submetidos à cirurgia (tumores T3, T4 ou com linfonodos positivos) ou como tratamento
paliativo para alívio de sintomas locais (sangramento, dor ou obstrução de vias áreas e/ou
alimentar). O fracionamento habitual da radioterapia consiste em uma única fração diária, embora
em alguns casos se possa utilizar o hiperfracionamento (mais de uma aplicação ao dia). O
tratamento utilizando modulação da intensidade do feixe de radiação (IMRT) oferece menor
toxicidade.
• Quimioterapia: inicialmente usada para os tumores metastáticos, aos poucos foi sendo
incorporada ao arsenal terapêutico da doença localmente avançada. Seu papel foi melhor definido
a partir da meta-análise publicada por Pignon et al em 2000 e atualizada em 2009. Nela se
demonstrou ganho absoluto de 4,5% na sobrevida global com a adição da quimioterapia à
radioterapia, sendo o ganho principalmente visto nos casos em que a quimioterapia e a
radioterapia foram feitas de forma concomitante, com ganho absoluto de 6,5%. A indicação de
quimioterapia atualmente incluiu os seguintes cenários: 1) quimioterapia na doença recidivada
e/ou metastática, 2) quimioterapia concomitante à radioterapia, 3) quimioterapia neoadjuvante.
Não há papel atualmente para a quimioterapia adjuvante, como modalidade exclusiva, com
exceção da nasofaringe. A principal droga estudada/utilizada é a cisplatina, sendo que sua eficácia
parece ser superior à da carboplatina. A dose de cisplatina utilizada parece ser importante no
controle de doença, sendo a dose cumulativa de 300mg/m2 considerada padrão atualmente (ou
100mg/m2 no D1, D22 e D43). Os taxanes têm papel no tratamento neoadjuvante. Cetuximabe é
um inibidor de EGFR incluído no arsenal terapêutico nos últimos anos, na doença localmente
avançada e irressecável, para pacientes com contra-indicação à cisplatina ou na doença metastática.
Os protocolos de quimioterapia serão discutidos em cada subsítio da doença.
Os pacientes portadores de CCP podem estar debilitados, com estado nutricional comprometido,
dentição precária e socialmente restritos. Associa-se a estas características o fato de o tratamento
ser tóxico e muitas vezes mutilante. Por isso, é fundamental a abordagem multidisciplinar. A
integração entre os profissionais médicos que abordam estes pacientes, cirurgião de cabeça e
pescoço, radioterapeuta e oncologista é indispensável assim como o trabalho interdisciplinar com
odontologia, fonoaudiologia, nutrição, fisioterapia, serviço social e psicologia. Desde o início do
tratamento, deve-se proporcionar ao paciente suporte clínico, nutricional, psicológico e de
enfermagem. Frequentemente, eles necessitam de fonoterapia e fisioterapia para reabilitação
funcional. Um capítulo especial é a prevenção e o manejo das mucosites durante quimio e/ou
radioterapia, que são abordados por odontólogos. Importante ressaltar também a integração com
radiologistas e patologistas para melhor definição dos casos.
Pelo exposto, a condução do tratamento é complexa, sendo que deve ser considerado sempre
um equilíbrio entre a eficácia e as sequelas, principalmente funcionais, que o tratamento pode
causar ao paciente. A decisão terapêutica final deve sempre envolver o paciente, que deve estar
ciente de todas as variáveis (eficácia, toxicidade, sequelas funcionais e estéticas, agudas e tardias)
envolvidas no seu tratamento.
336 |
MA NUA IS D E CO ND UTAS
19.2.1. recomendações gerais para abordagem do paciente com CCP
Diagnóstico: Exame clínico completo das vias aerodigestivas superiores incluindo exame visual
da cavidade oral e orofaringe associado a palpação de todas essas regiões assim como uma
avaliação endoscópica (laringe/hipofaringe/nasofaringe) e palpação das cadeias linfáticas
cervicais e submentonianas. O exame fundamental obrigatório para confirmação diagnóstica
é a biópsia do tumor primário (se não localizado, biópsia de linfonodo cervical metastático).
Estadiamento: Importante avaliação e estadiamento clínico pelo cirurgião de cabeça e
pescoço ou otorrinolaringologista. TC de face e/ou pescoço deve ser sempre solicitada, assim
como radiografia de tórax. TC de tórax é sugerida para pacientes com metástases cervicais
estadiadas como N2-N3. Outros exames: baseados na sintomatologia do paciente.
Tratamento por equipe multidisciplinar: cirurgião de cabeça e pescoço, radioterapeuta,
oncologista, odontologista, nutricionista, fonoaudióloga, enfermeiro, assistente social,
fisioterapeuta e psicólogo.
Seguimento: história clínica e exame físico da cabeça e pescoço, incluindo nasofaringolaringoscopia. No primeiro ano deve ser feito a cada três meses. No segundo ano a cada quatro
meses. Do terceiro ao quinto ano a cada seis meses. A partir de cinco anos, a revisão passa a ser
anual. Em casos de sintomas novos no intervalo entre consultas de seguimento programadas,
recomenda-se que o paciente retorne para avaliação e deve-se iniciar a investigação pertinente.
Em casos de pacientes que tiveram o pescoço irradiado, deve ser solicitado TSH (hormônio
tireoestimulante) anualmente devido ao risco de hipotireoidismo. Em todos os casos, solicitase radiografia de tórax anualmente. Outros exames devem ser solicitados de acordo com a
queixa clínica do paciente ou se o exame físico estiver alterado. Sugerimos tomografia
computadorizada de face e pescoço anualmente pelo menos nos primeiros 2-3 anos de
seguimento.
19.3. Câncer de cavidade oral
19.3.1. Introdução
A boca compreende os subsítios: lábio (inferior, superior e comissuras), regiões jugais,
gengivas (superior e inferior), área retromolar, palato duro, língua e soalho bucal. Os tumores labiais
apresentam fatores de risco, história natural, tratamento e prognóstico diferentes, e por isso, não
são estudados em conjunto com as neoplasias bucais. Embora o palato mole seja anatomicamente
parte da boca, os tumores aí localizados apresentam comportamento semelhante aos da orofaringe
e oncologicamente são classificados entre os tumores desta região. De um modo geral, os tumores
mais frequentes da boca, os carcinomas epidermoides, são mais frequentemente observados na
língua e no soalho bucal. Tumores destas duas regiões e os localizados na gengiva inferior, área
retromolar e regiões jugais apresentam risco de metástases linfonodais maiores que os localizados
no palato duro. Outros tumores são menos frequentes, entre eles os tumores de glândulas salivares
menores, melanomas de mucosa, sarcomas, linfomas e metástases de outros sítios.
A maioria (>70%) dos carcinomas epidermoides da cavidade oral se origina no soalho da boca
ou na língua e predominam em homens na faixa etária acima dos 50 anos. No entanto, a incidência
tem aumentado em mulheres e nas faixas etárias mais jovens. Os principais fatores de risco são o
tabagismo e o etilismo. Os carcinomas de lábio estão associados ao tabagismo e à exposição ao sol.
Apesar de se originarem em localização de fácil acesso ao exame clínico, em nosso meio mais de
75% dos pacientes ainda são diagnosticados com tumores nos estádios III e IV, localmente
avançados.
MANUAIS D E COND UTAS
| 337
19.3.2. Diagnóstico
O quadro clínico dos tumores da cavidade oral depende da localização e da extensão da lesão
primária. Poucas vezes o carcinoma é precedido de lesões cancerizáveis (queilite actínica, leucoplasia,
eritroplasia ou líquen plano). É importante atentar para alterações sutis na cor (mucosa avermelhada
ou esbranquiçada) e na textura (erosão, fissuras, granulação ou nódulos) da mucosa especialmente
quando os fatores de risco acima mencionados estão presentes. Os tumores desta região podem
se apresentar acima da superfície da mucosa (lesões exofíticas), infiltrar profundamente os tecidos
adjacentes (lesões endofíticas) ou mesmo se apresentar como úlceras (lesões ulceradas).
A sintomatologia inicial é quase inexistente. Com a progressão da doença, os sinais e sintomas
que aparecem estão relacionados à região acometida pelo tumor, caracterizando-se pela
persistência e progressão de: dor, odinofagia, disfagia, sensação de corpo estranho, sangramento,
dificuldade para ajustar próteses dentárias, perda dentária, aumento no volume da língua ou
alteração na sua mobilidade, trismo, otalgia e adenopatia cervical. Em casos mais avançados, perda
de peso, caquexia, anemia e adenomegalia cervical volumosa podem estar presentes.
O diagnóstico é feito após exame físico e biópsia incisional da lesão suspeita. A avaliação da
extensão locorregional do tumor deve ser realizada com exame clínico detalhado (oroscopia,
laringoscopia e palpação da cavidade oral, base da língua e do pescoço) e tomografia computadorizada
ou ressonância nuclear magnética de face e pescoço, que permite avaliar adequadamente a
extensão em partes moles, invasão óssea e de estruturas vasculares, além do acometimento
linfonodal. A faringolaringoscopia flexível é empregada para avaliar áreas de difícil visualização
(como base da língua) além de permitir melhor delimitação da extensão tumoral para a faringe. Às
vezes, exame sob narcose da base da língua é necessário.
Todas as lesões suspeitas para malignidade devem ser biopsiadas e material enviado para
exame anatomopatológico. No caso de confirmada a neoplasia maligna, carcinoma epidermoide
na maioria absoluta das vezes, completa-se o estadiamento com radiografia de tórax (ou mesmo
tomografia de tórax, nos casos de estádios N2-N3). Endoscopia digestiva alta, esofagoscopia e
broncoscopia na busca de eventual segundo tumor primário podem ser indicados, particularmente
nos pacientes com tumores iniciais
19.3.3. Estadiamento
Tx: Tumor primário não pode ser avaliado; T0: Sem evidências do tumor primário; Tis:
Carcinoma in situ; T1: Tumor ≤ 2cm nas maiores dimensões; T2: Tumor > 2cm e ≤ 4cm nas maiores
dimensões; T3: Tumor > 4cm nas maiores dimensões; T4a: Tumor invade somente as estruturas
adjacentes (ex., através do osso cortical da mandíbula ou da maxila até musculatura profunda
extrínseca da língua, como músculos genioglosso, hioglosso, palatoglosso e estiloglosso, ou seios
maxilares, ou pele da face); T4b: Tumor invade espaço mastigatório, placas pterigoideas ou base do
crânio ou envolve circunferencialmente a artéria carótida interna.
Estadiamento linfonodal e agrupamento: vide diagnóstico e estadiamento
19.3.4. Tratamento
Tratamento da doença localizada inicial
Os carcinomas da cavidade oral nos estádios iniciais (T1-T2) são tratados com cirurgia,
preferencialmente, ou radioterapia isolada. Esvaziamento linfonodal cervical está indicado naqueles
casos onde há linfonodos comprometidos pela neoplasia (N1-N3) ou mesmo nos pacientes com
pescoço negativo com lesão primária considerada de alto risco para acometimento linfonodal,
como tumores do andar inferior da boca medindo mais de 2 cm de extensão ou 4 mm de espessura.
A pesquisa de linfonodo sentinela ainda é procedimento experimental. Associa-se radioterapia
338 |
MA NUA IS D E CO ND UTAS
adjuvante nos casos com infiltração perineural, embolização vascular ou metástases cervicais sem
comprometimento extracapsular, ou quimiorradioterapia adjuvante nos casos onde haja margens
positivas ou extravasamento extracapsular da doença nodal (vide protocolo abaixo).
Tratamento da doença loco-regional avançada
Nos casos mais avançados (T3-T4, N+), quando ressecáveis e com paciente clinicamente apto
e concordante com a ressecção, indica-se a cirurgia radical (sempre acompanhada de esvaziamento
cervical uni- ou bilateral e frequentemente de reconstrução imediata com retalhos locais,
miocutâneos ou transplante microcirúrgico) seguida de radioterapia ou quimiorradioterapia
adjuvante, onde são tratados o leito do tumor primário e as drenagens cervicais na dose mínima
de 60-66Gy. Cabe enfatizar que na presença de fatores de alto risco para recidiva, como
extravasamento extracapsular da doença nodal e no caso de margens comprometidas, devemos
associar a quimioterapia (cisplatina 100mg/m2, dias 1, 22 e 43) de modo concomitante à
radioterapia adjuvante, o que diminuiu o risco de recaída locorregional e aumentou a sobrevida
livre de doença e a sobrevida global em estudos prospectivos randomizados.
O tratamento padrão da doença localmente avançada irressecável é a quimiorradioterapia
concomitante nos pacientes que se apresentam com bom performance status que não são
candidatos à cirurgia radical com intenção curativa (devido invasão circular de carótida interna ou
fáscia pré-vertebral). A quimiorradioterapia concomitante oferece um ganho de 8% em termos de
sobrevida global em cinco anos, com uma diminuição de 19% do risco relativo de morte, em
comparação com a radioterapia exclusiva [hazard ratio (HR) 0,81; p<0,0001]. A magnitude deste
benefício foi maior para os esquemas baseados em platina (HR 0,75 vs. 0,86; p<0,01).
Sugere-se radioterapia na dose de 70Gy aplicados ao tumor primário e doença macroscópica
cervical, e de 50Gy em áreas de doença subclínica, administrada de modo concomitante à cisplatina
(100mg/m2, dias 1, 22 e 43) naqueles pacientes com performance status ECOG 0 ou 1, idade inferior
a 70 anos, adequadas funções orgânicas e motivados para o tratamento. A toxicidade associada a
este regime é elevada, na forma de disfagia, mucosite, dermatite, vômitos, infecção e/ou anemia
de graus 3 e 4 na maioria dos pacientes. Equipe multidisciplinar experiente na condução destes
casos e prevenção, diagnóstico precoce e tratamento agressivo destas toxicidades são essenciais.
Nos casos não elegíveis para quimiorradioterapia concomitante, uma alternativa é a
biorradioterapia, administrando-se o anticorpo monoclonal quimérico cetuximabe, direcionado à
porção extracelular do EGFR, concomitante à radioterapia. É importante ressaltar que o principal
estudo sobre a adição de cetuximabe à radioterapia (“Bonner trial”) não incluiu tumores da cavidade
oral. A indicação de cetuximabe neste contexto, portanto, é uma extrapolação de dados e deve
ser individualizada.
Uma opção ainda considerada investigacional é o uso de quimioterapia neoadjuvante. Neste
cenário, estudos clínicos aleatorizados de fase III mostraram que o uso de quimioterapia
neoadjuvante, contendo três drogas – esquema TPF (docetaxel, cisplatina e 5-fluorouracil) - seguida
por radioterapia ou quimiorradioterapia, é superior ao esquema com cisplatina e 5-fluorouracil
(PF) neoadjuvante. Naqueles pacientes com grande volume tumoral e/ou acometimento cervical,
a quimioterapia neoadjuvante pode ser especialmente útil, precedendo a (quimio-)radioterapia. É
importante ressaltar que este é um tratamento tóxico e deve ser indicado a pacientes com bom
performance status e que nenhum dos trabalhos disponíveis atualmente comparou tal esquema ao
tratamento ainda considerado padrão com radioquimioterapia concomitante baseada em platina.
MANUAIS D E COND UTAS
| 339
19.3.5. Tumores de cavidade oral: recomendações
Diagnóstico: baseia-se nos achados de exame clínico, podendo incluir endoscopia. Sempre há
necessidade de confirmação histopatológica de material obtido por biópsia incisional.
Estadiamento: baseia-se nos achados de exame clínico detalhado e exames de imagem (CT
ou ressonância magnética de face e pescoço), radiografia ou tomografia de tórax.
Tratamento da doença inicial: cirurgia ou radioterapia, com preferência pela primeira pela
menor morbidade e menor custo (além de melhor avaliação – isto é, avaliação patológica - do
tumor e dos linfonodos). Realiza-se a ressecção local com margens de segurança e em casos
selecionados indica-se esvaziamento cervical eletivo e ocasionalmente radioterapia ou
radioquimioterapia pós-operatória.
Tratamento da doença avançada: o tratamento de escolha para pacientes em boas condições
clínicas e com doença ressecável é a cirurgia (sempre realizando-se esvaziamento cervical uni
ou bilateral), reconstrução imediata e radioterapia ou radioquimioterapia pós-operatória.
Nesses casos utiliza-se geralmente a cisplatina. Para pacientes com tumores avançados
irressecáveis indica-se a associação de radioterapia com quimioterapia concomitante.
Quimioterapia de indução seguida de radioterapia (associada ou não a quimioterapia) pode ser
opção para pacientes com tumores irressecáveis com bom estado geral.
19.4. Câncer de laringe
19.4.1. Introdução
O carcinoma epidermoide de laringe é o segundo tumor mais frequente da cabeça e pescoço.
Anualmente, estimam-se 151.000 novos casos em todo mundo. Este órgão possui características
funcionais que são extremamente relevantes na tomada de decisão terapêutica, isto é, fonação,
respiração e deglutição, contribuindo também para paladar e olfato.
Anatomicamente a laringe é dividida em supraglote, glote e subglote. Esta divisão apresenta
relevância para o tratamento, tendo em vista que o comportamento clínico dos tumores de cada
subsítio é diferente, assim como suas vias de disseminação local, regional e sistêmica, o que tem
implicação no planejamento terapêutico. A região supraglótica (40% dos casos) é rica em vasos
linfáticos, o que resulta em altas taxas de metástases cervicais (variando entre 25 e 75% para todos
os estadiamentos). Diferentemente, a região glótica (59% dos casos) é pobre em vasos linfáticos,
sendo a disseminação tumoral principalmente por invasibilidade local. Os tumores de subglote
são muito raros (1%) e seu tratamento habitualmente será cirúrgico.
A definição exata da extensão da doença na laringe é fundamental para o planejamento
terapêutico. Não apenas o subsítio da laringe, mas também o comprometimento de cada região
da supraglote ou glote. Dados relevantes, como invasão da comissura anterior nos tumores glóticos,
indicam maior propensão ao tratamento cirúrgico ou a necessidade de planejamento da radioterapia
levando-se em conta estes achados. O comprometimento do espaço interaritenoideo significa que
não existe modalidade de tratamento conservador com a cirurgia.
Além do subsítio anatômico da laringe, o tratamento é baseado no estadiamento clínico do
tumor. Podemos dividir, em termos práticos, como nos demais subsítios de cabeça e pescoço, o
tratamento em: tratamento da doença inicial (T1 ou T2N0M0) e da doença avançada (T3 ou T4 e/ou N+).
19.4.2. Diagnóstico
Para diagnóstico e estadiamento é indicado o exame clínico e endoscópico da laringe sendo
importante observar a mobilidade da corda vocal, permeabilidade da via aérea e extensão local da
doença. Deve ser feito inicialmente pelo cirurgião de cabeça e pescoço ou otorrinolaringologista
para melhor estadiamento da doença local. O pescoço deve ser palpado a procura de linfonodos
340 |
MA NUA IS D E CO ND UTAS
metastáticos, com muita atenção às cadeias de drenagem linfática (cadeias jugulares altas, média
e baixa, respectivamente níveis II, III e IV do pescoço). O diagnóstico definitivo é estabelecido pelo
estudo histológico de material de biópsia obtido por nasofaringolaringoscopia ou laringoscopia
direta (sob sedação ou anestesia geral). A laringoscopia direta pode ser recomendada para
estadiamento de lesões de difícil avaliação ao exame endoscópico ambulatorial.
19.4.3. Estadiamento
Tx: Tumor primário não pode ser avaliado; T0: Sem evidências do tumor primário; Tis:
Carcinoma in situ;
Supraglote:
T1: Tumor limitado a um subsítio da supraglote com mobilidade de corda vocal normal; T2:
Tumor invade a mucosa de mais de um subsítio da supraglote ou glote ou alguma região fora da
supraglote (mucosa da base da língua, valécula, parede medial do seio piriforme) sem fixação da
laringe; T3: Tumor limitado à laringe com fixação da corda vocal e/ou invasão de uma das seguintes
estruturas: área pós-cricoide, espaço pré-epiglótico, espaço paraglótico e/ou córtex interna da
cartilagem tireoidiana; T4a: Tumor invade a cartilagem tireóide e/ou estruturas além da laringe,
como traqueia, partes moles do pescoço incluindo musculatura extrínseca profunda da base da
língua, alça muscular, tireóide ou esôfago; T4b: Tumor invade espaço pré-vertebral, engloba a
artéria carótida ou estruturas mediastinais.
Glote:
T1: Tumor limitado a corda vocal com mobilidade normal da mesma (pode envolver comissura
anterior ou posterior); T1a: tumor limitado a uma corda vocal; T1b: tumor envolve ambas as cordas
vocais; T2: Tumor invade a supraglote e/ou subglote e/ou com mobilidade diminuída da corda
vocal; T3: Tumor limitado à laringe com fixação da corda vocal e/ou invasão do espaço paraglótico
e/ou invasão da córtex interna da cartilagem tireoidiana; T4a: Tumor invade além da córtex interna
da cartilagem tireóidea e/ou estruturas além da laringe, como traquéia, partes moles do pescoço
incluindo musculatura extrínseca profunda da base da língua, alça muscular, tireoide ou esôfago;
T4b: Tumor invade espaço pré-vertebral, engloba a artéria carótida ou estruturas mediastinais.
Subglote:
T1: Tumor limitado a subglote; T2: Tumor se estende à corda vocal, com mobilidade normal
ou diminuída; T3: Tumor limitado à laringe com fixação da corda vocal; T4a: Tumor invade a
cartilagem tireóide ou cricoide e/ou invade tecidos além da laringe (traqueia, partes moles do
pescoço incluindo musculatura extrínseca profunda da base da língua, alça muscular, tireoide ou
esôfago); T4b: Tumor invade espaço pré-vertebral, engloba a artéria carótida ou estruturas
mediastinais.
Estadiamento linfonodal e agrupamento: vide diagnóstico e estadiamento
19.4.4. Tratamento
Tratamento da doença inicial
O objetivo primário do tratamento é a cura do paciente. Como citado anteriormente, estadiamento
e subsítio assim como estado geral (performance status) e idade do paciente são variáveis a serem
consideradas na escolha da modalidade de tratamento. As duas opções aceitas são: cirurgia local
ou radioterapia. Foge do escopo deste manual discorrer sobre as várias formas de cirurgia e
radioterapia. Porém é importante considerar:
MANUAIS D E COND UTAS
| 341
• Cirurgia: indicada, preferencialmente, cirurgia para preservação de órgão. Fundamental:
margens cirúrgicas livres. Elas podem ser realizadas pelas técnicas clássicas de laringectomias
verticais, horizontais ou subtotal com cricohioidopexia, ou por meio de acessos endoscópicos com
o sem a utilização de laser de CO2. Para tumores glóticos iniciais não se indica esvaziamento
cervical, mas para tumores supraglóticos indicam-se esvaziamentos cervicais seletivos uni ou
bilaterais.
• radioterapia: independente da modalidade adotada é fundamental a dose total na laringe,
pois há uma relação direta entre dose total e taxa de controle de doença. Nos tumores de laringe
glóticos iniciais (T1-T2) a chance de acometimento linfonodal é muito baixa, pois a glote possui
somente uma drenagem linfática reduzida. Sendo assim, estamos autorizados a utilizar campos
pequenos, restritos ao estojo laríngeo, sem haver a necessidade de irradiação eletiva das cadeias
de drenagem. Nestes casos, podem ser utilizadas doses superiores a 2Gy/dia, havendo evidências
na literatura, a partir de trabalhos retrospectivos, que o uso de fracionamento superior a 2Gy/dia
proporcionaria melhor controle local. São assim recomendadas doses em torno de 63Gy em 28
frações de 2,25Gy/dia para tumores glóticos T1 e doses em torno de 65,25Gy em 29 frações de
2,25Gy/dia para tumores glóticos T2. Em todos os outros casos de tumores iniciais (tumores de
hipofaringe, laringe supraglótica ou laringe subglótica), há risco de acometimento linfonodal que
não deve ser desprezado, principalmente em tumores T2 e, como consequência, o campo de
tratamento deve ser maior incluindo pelo menos o primeiro escalão de drenagem (níveis II, III e IV).
Sendo assim, o uso de um fracionamento superior a 2Gy/dia se torna difícil pelo risco de toxicidade
aguda e tardia. A dose padrão é 70Gy em 35 frações (2Gy/dia).
Embora haja vários estudos retrospectivos e alguns prospectivos não controlados mostrando
a igualdade de eficácia entre cirurgia e radioterapia, até o momento não há nenhum estudo
definitivo, prospectivo, randomizado e controlado comparando as duas modalidades de tratamento.
Porém, este estudo é de difícil realização tendo em vista a alta taxa de cura e a necessidade de grande
número de casos para se detectar uma possível diferença estatisticamente significativa. Considerase, portanto, baseado nos vários estudos publicados até o momento, a igualdade entre os
tratamentos, sendo fundamental avaliar as possíveis sequelas funcionais decorrentes dos mesmos.
Quimioterapia adjuvante (pós-cirurgia e concomitante à radioterapia) não está indicada nos
casos de tumores iniciais de laringe.
Tumores glóticos
T1: cirurgia conservadora, endoscópica ou não, ou radioterapia
T2: cirurgia conservadora, endoscópica ou não, ou radioterapia.
Tratamento do pescoço: não indicada dissecção linfonodal, nem radioterapia cervical nos
casos de tumores glóticos iniciais.
Comissura anterior: Tumores glóticos com envolvimento da comissura anterior (cerca de
20% dos casos) têm pior prognóstico, com menor resposta à radioterapia (devido ao risco de
subdosagem se planejamento inadequado) e cirurgia microinvasiva. Deve-se considerar ressecção
cirúrgica por cervicotomia.
Se optado por cirurgia, indicar radioterapia adjuvante se margens comprometidas.
Pacientes idosos podem ter pior reabilitação funcional com cirurgias parciais de laringe. A
indicação cirúrgica nesse grupo deve ser feita somente em pacientes com poucas comorbidades
e com boas condições pulmonares.
Tumores supraglóticos
T1: cirurgia conservadora, endoscópica ou não, ou radioterapia
T2: cirurgia conservadora, endoscópica ou não, ou radioterapia
Tratamento do pescoço: Nos casos de tratamento cirúrgico, incluir esvaziamento cervical
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MA NUA IS D E CO ND UTAS
dos níveis II, III e IV. Unilateral ou bilateral de acordo com localização do tumor primário. Nos últimos
anos, o esvaziamento tem se restringido aos níveis IIa e III dado o baixo risco de metástases nas
cadeias IIb e IV em tumores supraglóticos puros, sem metástases clinicamente detectadas. No caso
da radioterapia, o campo de radiação deverá incluir os linfonodos dos níveis citados anteriormente.
Radioterapia adjuvante deve ser indicada nos casos submetidos à cirurgia com margens
comprometidas ou com linfonodos patologicamente comprometidos.
Tratamento da doença avançada
Considera-se tumor avançado de laringe aqueles estadiados como T3 ou T4 e/ou com linfonodos
positivos. Dos tumores da laringe, este subgrupo de doença avançada é o que mais tem sido
discutido nos últimos anos, principalmente pela possibilidade de preservação do órgão, seja pela
cirurgia conservadora, seja pelos protocolos de radioterapia associada à quimioterapia. Para
preservação de órgão, o principal pré-requisito é que a laringe esteja funcionante: não se justifica
manter um órgão não funcionante. É importante também excluir invasão grosseira da cartilagem
tireoidiana e casos em que foi realizada traqueostomia devido à insuficiência respiratória. Outro
aspecto a ser considerado na indicação de preservação de órgão é a possibilidade por parte do
paciente e do médico de realizarem seguimento ativo, para assegurar resgate cirúrgico imediato
ao caso de recidiva a fim de não comprometer a chance de cura do paciente. O tratamento ideal
para os tumores avançados de laringe deve promover a cura com a menor morbidade possível, ou
seja, menores sequelas a curto, médio e longo prazo.
Nos casos em que se indica a cirurgia conservadora, é importante considerar a melhor técnica
cirúrgica para cada subsítio (glote/supraglote). Para os casos de preservação de órgão através da
quimioterapia associada à radioterapia, não há diferenciação entre os tumores glóticos e
supraglóticos.
Tumores glóticos e supraglóticos
• T3: paciente com laringe funcionante no qual a cirurgia indicada é a laringectomia total, ou
seja, não candidato a tratamento cirúrgico conservador: radioterapia (35 frações de 2Gy/dia)
associada à quimioterapia (cisplatina 100mg/m2 D1, D22 e D43). Para pacientes inaptos a usar
cisplatina (por exemplo: baixo performance status, função renal comprometida) é indicada a
associação da radioterapia com cetuximabe na dose de 400mg/m2 na semana zero de tratamento
(uma semana antes de iniciar a radioterapia) seguido por doses semanais de 250mg/m2 durante a
radioterapia (total de 7 doses). O benefício da radioterapia concomitante à quimioterapia ou
cetuximabe diminui com a idade. Nos pacientes acima de 70 anos, os resultados dos estudos são
negativos e, portanto, não se recomenda essa associação nessa faixa etária. Indica-se laringectomia
total ou então radioterapia isolada.
• T4 ressecável: laringectomia total seguida de radioterapia ou radioquimioteapia adjuvante.
• Tumores irressecáveis: se paciente com performance status 0 ou 1: radioterapia concomitante
à cisplatina nas doses citadas acima. Se paciente com performance status comprometido ou inapto
ao uso de cisplatina, considerar cetuximabe associado à radioterapia. Se cetuximabe não disponível,
indicada radioterapia isolada preferencialmente hiperfracionada.
• Tratamento do pescoço positivo: radioterapia adjuvante. Indicada quimioterapia
adjuvante concomitante à radioterapia nos casos com margens positivas e/ou linfonodos positivos
com extravasamento extracapsular. Protocolo de adjuvância nestes casos: radioterapia (60Gy –
dose total, com ou sem boost) associada à cisplatina 100mg/m2 D1, 22 e D43. Pacientes com
linfonodos cervicais comprometidos (N2 ou N3) submetidos à quimio e radioterapia concomitantes
para preservação de órgão devem ser avaliados para esvaziamento cervical. Se PET-CT disponível:
considerar esvaziar se doença residual ao PET-CT. Se não disponível, considerar esvaziamento
cervical programado após o término do tratamento.
MANUAIS D E COND UTAS
| 343
A quimioterapia neoadjuvante é uma modalidade estudada há vários anos que voltou a ser
discutida nos últimos tempos, principalmente pela inclusão de taxanes nos protocolos quimioterápicos.
Apesar de ainda ser considerada investigacional, pode ser considerada nos casos de pacientes com
bom performance status e com tumores irressecáveis. O protocolo padrão é docetaxel 75mg/m2
D1 seguido por cisplatina 75mg/m2 D1 e fluorouracil 750mg/m2 em infusão contínua, D1 a D5
seguido de radioterapia associada ou não à quimioterapia.
É importante pontuar neste momento a indicação precisa do tratamento. Considerar
tratamentos menos radicais, incorporar tecnologias, diminuir sequelas nos pacientes são questões
fundamentais. Mas esses benefícios não podem competir com a eficiência terapêutica, isto é, a
cura do paciente. Dentro os tumores avaliados pelo SEER (Surveillance Epidemiology and End Results
Program), o câncer de laringe é o único cuja mortalidade não diminuiu nos últimos anos. Esse dado
é de extrema importância e nos faz refletir sobre a indicação precisa de cada tratamento.
19.4.5. Tumor de laringe: recomendações
Diagnóstico: baseia-se na história clínica, achados de exame físico, endoscópico e sempre
deve ser confirmado por biópsia.
Estadiamento: exame físico, endoscopia, tomografia computadorizada e radiografia de tórax
são exames obrigatórios para estadiamento pré-tratamento.
Tumores iniciais: cirurgia conservadora ou radioterapia exclusiva.
Tumores avançados: tumores T3 não candidatos a cirurgias conservadoras devem ser
considerados para quimiorradioterapia visando à preservação de órgão. Tumores T4 ressecáveis
devem ser submetidos à laringectomia total com esvaziamento cervical seguida de radioterapia
com ou sem quimioterapia adjuvante. Tumores T4 irressecáveis indicada quimiorradioterapia
concomitante. Quimioterapia de indução seguida de radioterapia (concomitante ou não à
quimioterapia) é uma opção para estes casos.
19.5. Câncer de Hipofaringe
19.5.1. Introdução
A hipofaringe anatomicamente é dividida em seios piriformes, parede posterior e área
retrocricoidea. Mais de 90% dos tumores da hipofaringe estão localizados nos seios piriformes. Os
tumores de hipofaringe são tratados como os tumores de laringe porque em muitas vezes os
tumores da supraglote se estendem para a hipofaringe assim como tumores da hipofaringe
acometem a laringe, sendo algumas vezes difícil diferenciar o local de origem do tumor. Como na
laringe, a definição dos subsítios comprometidos também terá influência direta na escolha do
tratamento. Tumores com extensão para área retrocricoidea não são candidatos a procedimentos
cirúrgicos conservadores. Tumores de qualquer localização na hipofaringe estão associados a alto
risco de metástases linfonodais dada à rica rede linfática desta região.
19.5.2. Estadiamento
T1: tumor limitado a um subsítio da hipofaringe e/ou menor que 2cm em sua maior dimensão;
T2: Tumor invade mais de um subsítio ou sítios adjacentes ou mede entre 2 e 4cm, sem fixação da
hemilaringe; T3: Tumor com mais de 4cm na sua maior dimensão ou com fixação da hemilaringe
ou extensão para o esôfago; T4a: Tumor invade cartilagem tireóide ou cricoide, osso hioideo,
glândula tireóide ou tecidos de partes moles do compartimento central; T4b: Tumor invade espaço
pré-vertebral, engloba a artéria carótida ou estruturas mediastinais.
Estadiamento linfonodal e agrupamento: vide capítulo 1
344 |
MA NUA IS D E CO ND UTAS
19.5.3. Tratamento
Tratamento da doença inicial
Os tumores iniciais de hipofaringe são raros e podem ser tratados tanto por faringectomias
parciais abertas ou endoscópicas, sempre associadas a esvaziamento cervical uni ou bilateral.
• T1: cirurgia conservadora, aberta ou endoscópica a laser ou radioterapia
• T2: cirurgia conservadora, aberta ou endoscópica a laser ou radioterapia
• Tratamento do pescoço: Nos casos de tratamento cirúrgico, incluir esvaziamento cervical
dos níveis II, III e IV. Unilateral ou bilateral de acordo com localização do tumor primário. No caso
de radioterapia, o campo de radiação deverá incluir os linfonodos dos níveis citados anteriormente.
Radioterapia adjuvante deve ser indicada nos casos submetidos à cirurgia com margens
comprometidas ou com linfonodos patologicamente comprometidos.
Tratamento da doença avançada
Para pacientes com tumores T3 ressecável, mas com indicação de laringectomia indica-se
quimioterapia concomitante à radioterapia. Porém, é importante ressaltar que tumores T3 da
hipofaringe são difíceis de serem definidos como tal e, na maior parte das vezes, acabam sendo
operados. Para tumores T4, a ressecção cirúrgica está indicada com reconstrução do trânsito
faríngeo primariamente, por meio de fechamento primário ou uso de retalhos. Pacientes com
tumores irressecáveis: o tratamento padrão é a quimioterapia concomitante à radioterapia.
Quimioterapia de indução com taxane associado a 5-fluorouracil e cisplatina é uma opção.
Pacientes com contraindicação ao uso da cisplatina associada à radioterapia: considerar cetuximabe
concomitante à radioterapia.
19.5.4. Tumores de Hipofaringe: recomendações
Diagnóstico: baseia-se na história clínica, achados de exame físico, endoscópico e sempre
deve ser confirmado por biópsia.
Estadiamento: exame físico, endoscopia, tomografia computadorizada e radiografia de tórax
são exames obrigatórios para estadiamento pré-tratamento.
Tumores iniciais: cirurgia conservadora ou radioterapia exclusiva.
Tumores avançados: tumores T3 não candidatos a cirurgias conservadoras devem ser
considerados para quimioradioterapia visando à preservação de órgão. Tumores T4 ressecáveis
devem ser submetidos à laringectomia total com esvaziamento cervical seguido de
radioterapia (associar quimioterapia se extravasamento extracapsular e/ou margem positiva).
Tumores T4 irressecáveis indicada quimiorradioterapia concomitante. Quimioterapia de indução
seguida de radioterapia (concomitante ou não à quimioterapia) é uma opção para estes casos.
Pacientes com contra-indicação ao uso de cisplatina considerar cetuximabe concomitante à
radioterapia.
19.6. Câncer de Orofaringe
19.6.1. Introdução
Nos Estados Unidos são diagnosticados anualmente cerca de 5.000 novos casos de câncer de
orofaringe, dos quais 85-90% são carcinomas de células escamosas (CCE). A incidência dessa
neoplasia está intimamente associada ao consumo do tabaco e ao uso excessivo de bebidas
alcoólicas. A influência desses fatores sobre a gênese do carcinoma de orofaringe é, geralmente,
dose dependente de acordo com a maioria das publicações. Embora o CCE de orofaringe seja
diagnosticado predominantemente em indivíduos acima dos 45 anos, recentes publicações
européias e norte americanas têm observado um aumento na incidência dessa neoplasia em
MANUAIS D E COND UTAS
| 345
indivíduos com menos de 45 anos, nos últimos 20-30 anos. Novos achados epidemiológicos
associados ao conhecimento de novos fatores de risco, modificaram o entendimento a cerca dos
tumores de orofaringe. Em parte, a observação de que 15-20% dos carcinomas escamosos de
cabeça e pescoço ocorrem em indivíduos que não consomem tabaco e/ou álcool, sugeria a
existência de outros fatores de risco, como a presença de infecção por HPV, evidenciada pelo
tropismo deste vírus e às similaridades morfológicas entre os epitélios genital e orofaríngeo. O HPV
é o vírus mais transmitido sexualmente e tem grande importância na etiopatogenia do câncer do
colo uterino, enquanto na mucosa oral seu papel etiológico não está completamente esclarecido.
Atualmente, a prática do sexo oral e a variação de parceiros contribuíram muito para elevar a
transmissão do HPV na mucosa oral. A importância do conhecimento a cerca da infecção por HPV
é reforçada por estudos sugerindo fortemente que os carcinomas de orofaringe HPV positivos e
HPV negativos se comportam como entidades distintas no que diz respeito a características
moleculares, histopatológicas e principalmente prognósticas, sendo os carcinomas HPV positivos,
mais indiferenciados e basaloides, e com evolução mais favorável com tratamentos quimio e/ou
radioterápicos. Pacientes com tumores HPV positivos apresentam mortalidade em 05 anos
aproximadamente 60% menor quando comparado a pacientes com tumores HPV negativos e
probabilidade 51% menor de recidiva da doença. Pacientes HPV positivos, porém tabagistas, têm
pior prognóstico do que os pacientes HPV positivos não tabagistas. Com o objetivo de melhor
avaliar o comportamento biológico dos tumores da orofaringe e, consequentemente, analisar as
opções terapêuticas disponíveis dividimos essa região em quatro subsítios: parede posterior da
orofaringe, palato mole, lojas amigdalianas (amígdalas e pilares anteriores e posteriores) e base
de língua. Existem dois importantes espaços potenciais adjacentes à orofaringe cujo comprometimento
pelo tumor pode alterar a estratégia terapêutica: posteriormente, o risco de invasão do espaço
retrofaríngeo (atrás dos músculos constrictores), e lateralmente, o risco de invasão do espaço
parafaríngeo (pirâmide invertida lateral aos músculos constrictores que contém os músculos
pterigóides, ramos do nervo trigêmeo e artéria maxilar interna). A extensão da doença para o
espaço retrofaríngeo aumenta a possibilidade de metástases regionais contralaterais e a invasão
do espaço parafaríngeo torna mandatória a indicação de radioterapia adjuvante em tumores de
palato mole estádio T2. A orofaringe é ricamente drenada por linfáticos que, habitualmente,
drenam para os níveis cervicais mais altos (níveis II e III). Seus tumores apresentam alta
probabilidade de disseminação linfática, mesmo nos casos iniciais, fazendo com que o tratamento
das cadeias linfáticas regionais seja uma preocupação nesse cenário
19.6.2. Diagnóstico
Anamnese minuciosa associada a exame físico com ênfase no segmento anatômico da cabeça
e pescoço. Essa avaliação preliminar é seguida de pan-endoscopia com colheita de biópsias de
todas as áreas suspeitas. Alguns pontos importantes na colheita da história da doença atual pelo
paciente são: presença/ausência de trismo, disfagia, odinofagia, alteração da mobilidade lingual,
otalgia ou uma associação desses sinais e sintomas. A identificação dessas queixas/sinais durante
a anamnese chamará a atenção para a possível extensão da neoplasia para áreas anatômicas
adjacentes ou, em última análise, para o comprometimento de estruturas profundas na região
estudada. No exame físico e na avaliação endoscópica, o tamanho e o aspecto (ulcerado,
infiltrante,...) das lesões, assim como sua localização de acordo com os diversos subsítios da
orofaringe, deverão ser cuidadosamente documentados. Da mesma forma, o exame clínico
(palpação) minucioso das cadeias linfáticas regionais é mandatório para o estadiamento adequado
da doença. Tomografia computadorizada (idealmente com contraste endovenoso) ou ressonância
magnética são métodos de imagem adequados para avaliação locorregional no câncer de
orofaringe. A avaliação do comprometimento de sítios distantes é feita através de radiografia de
tórax nos casos assintomáticos.
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MA NUA IS D E CO ND UTAS
19.6.3. Estadiamento
Tx: Tumor primário não pode ser avaliado; T0: Sem evidências do tumor primário; Tis:
Carcinoma in situ; T1: Tumor ≤ 2cm nas maiores dimensões; T2: Tumor > 2cm e ≤ 4cm nas maiores
dimensões; T3: Tumor > 4cm nas maiores dimensões; T4a: Tumor invade a laringe, musculatura
extrínseca da língua, pterigoide medial, palato duro ou mandíbula (extensão mucosa para
superfície lingual da epiglote a partir do tumor primário da base da língua e valécula não constitui
invasão de laringe); T4b: tumor invade musculatura pterigoide lateral, placas pterigoideas,
nasofaringe lateral ou base de crânio ou encarcera a artéria carótida.
Estadiamento linfonodal e agrupamento: vide introdução e diagnóstico
19.6.4. Tratamento da doença locorregional avançada
É fundamental destacar que os pacientes deverão sofrer uma seleção em que pese o estado
geral (performance status), as comorbidades associadas, a idade e expectativa de vida, além de
outros critérios a serem melhor estudados, como: fatores prognósticos moleculares ou fatores
preditivos de melhor resposta à terapia combinada, especialmente no que diz respeito a adição da
terapia alvo-molecular.
Os tumores iniciais da orofaringe (T1 – 2) são, habitualmente, tratados efetivamente tanto
por cirurgia quanto por radioterapia exclusiva. Nesse contexto, um planejamento para o manejo das
cadeias linfáticas regionais também deverá ser feito. Tumores avançados (T3 – 4, N > 2 ou ambos),
por outro lado, vão requerer uma abordagem multimodal que consistirá em cirurgia radical com
radioterapia com ou sem quimioterapia adjuvante ou radioquimioterapia concomitante com a
cirurgia ficando como opção de resgate (se necessário).
A possibilidade da ressecção do tumor pela via peroral (sem necessidade de acesso cirúrgico
transfacial ou cervical), assim como a possibilidade de reconstrução satisfatória pós-ressecção
tumoral (manutenção da fala e da alimentação fisiológicas) deverão ser avaliadas na decisão
terapêutica dos tumores iniciais. Quanto aos tumores avançados, avaliação cuidadosa das sequelas
(estéticas e funcionais) associadas às grandes ressecções combinadas (cirurgias de comando)
deverá ser feita para a escolha da estratégia terapêutica mais adequada.
19.6.4.1. Tratamento da doença inicial
• Tumores da parede posterior da orofaringe: Pela localização próxima à linha média, esses
tumores frequentemente metastatizam para as cadeias linfáticas cervicais bilaterais. A extensão
lateral é pouco frequente, porém a invasão do espaço retrofaríngeo e, posteriormente, dos espaços
pré-vertebrais são vistas com frequência. A associação de TC e RNM é uma ferramenta importante
na avaliação do comprometimento dos corpos vertebrais e do espaço intraespinhal. Tumores
iniciais sem linfadenomegalias são tratados habitualmente por radioterapia exclusiva.
• Tumores da base da língua: São, habitualmente, mais agressivos em comparação com os
outros subsítios da orofaringe. Nessa localização as variantes pouco diferenciadas são mais
frequentemente encontradas. Da mesma forma, a disseminação linfática regional é frequente e
bilateral mesmo em tumores iniciais (T1–2). Cerca de 30% - 50% dos CCE de base de língua não
controlados locorregionalmente evoluem para o desenvolvimento de metástases a distancia. A
RNM com o gadolínio oferece a melhor forma de avaliação da extensão dos tumores nessa
localização. Tanto a cirurgia quanto a radioterapia oferecem condições semelhantes para o controle
regional de tumores T1–2. O papel do esvaziamento cervical é controverso nesses casos. Na
associação de tumores primários iniciais, pouco invasivos, porém associados a metástases linfáticas
cervicais volumosas, a utilização da cirurgia para o controle da doença cervical (esvaziamento
cervical radical modificado) seguida por radioterapia para o controle do tumor primário e
complementarmente à cirurgia cervical, continua sendo uma opção viável.
MANUAIS D E COND UTAS
| 347
• Tumores do palato mole: Embora diagnosticados em fase precoce, sua extensão além do
sitio primário é de importância critica. Uma vez que não existem barreiras naturais para sua
extensão medial ou lateral, a invasão do hemipalato contralateral ou da loja amigdaliana ipsilateral
é frequente. A avaliação por imagem com utilização da RNM com gadolínio é de particular
importância na identificação dessa extensão. Mais uma vez, tanto a cirurgia quanto a radioterapia
oferecem condições semelhantes de controle locorregional em tumores iniciais (T1-2).
• Tumores da loja amigdaliana: O tratamento dos tumores nesse subsítio anatômico da
orofaringe é baseado no estádio clínico, fatores individuais do paciente (associação com HPV,
comorbidades, preferências do paciente) além da experiência da instituição que abriga o paciente.
Metástases linfáticas clinicamente detectáveis são observadas em 60-76% dos tumores nessa
localização. Metástases linfáticas contralaterais têm sido observadas em até 22% dos pacientes
quando o pilar posterior se mostra invadido pelo tumor. Tumores iniciais (T1–2) podem ser tratados
por cirurgia ou radioterapia, com controle locorregional semelhante. Nesses casos, a indicação de
radioterapia exclusiva parece prevalecer pela possibilidade de tratamento conjunto das cadeias
linfáticas cervicais assim como pelo risco considerável de morbidade (funcional e estética) associada
ao ato cirúrgico. A cirurgia tem sido relegada aos casos de doença persistente ou recidivada após
radioterapia.
19.6.4.2. Tratamento da doença avançada
Para os pacientes portadores de tumores T3 ou T4 e/ou linfonodo positivo, a terapêutica
multimodal é fundamental. A definição entre cirurgia ou quimiorradioterapia para a abordagem
dos tumores localmente avançados é complexa e desperta a polêmica sobre a possibilidade de
preservação do órgão. O verdadeiro objetivo da preservação de órgão é a manutenção de sua
função e não única, nem simplesmente, evitar a perda anatômica. Deve-se salientar que o
tratamento inicial com quimiorradioterapia pode resultar em disfunções faríngeas e laríngeas com
episódios repetidos de aspiração, além de estenose esofagiana e outros distúrbios na deglutição
e na fala. Diante de tais complicações, a cirurgia de resgate, e principalmente, o suporte com
reabilitação apropriada, tornam-se obrigatórios, assim como nos casos de doença residual ou
recidiva após a terapia primária não cirúrgica. A abordagem cirúrgica eletiva do pescoço em
pacientes que se apresentam com doença cervical inicial N2 ou N3, apesar de ainda controversa,
tem sido amplamente utilizada de rotina na maioria dos estudos de fase III, e certamente é
empregada em todos os pacientes com doença residual ou recidiva cervical após o tratamento
quimiorradioterápico ou naqueles que apresentem PET-CT positivo após 12 semanas da radioterapia.
Se a opção terapêutica para o caso for cirurgia radical, deve ser considerada obrigatória
radioterapia adjuvante. Está indicado associar quimioterapia à radioterapia adjuvante nos casos
com margens positivas ou extravasamento extracapsular.
Para pacientes com tumores avançados nos quais se indica a preservação de órgão está indicada
radioterapia concomitante à quimioterapia. Diversos estudos prospectivos e randomizados confirmam
a superioridade dos esquemas envolvendo administração concomitante de quimioterapia e
radioterapia, frente à radioterapia isolada. Houve benefício significativo em sobrevida global e em
preservação de órgão com a associação de cisplatina em altas doses (100mg/m2) no D1, D22, D43
e radioterapia externa conformacional na dose de 70Gy (2Gy/fração). Apesar do sucesso da terapia
concomitante, os resultados a longo prazo ainda são limitados e desanimadores quanto à sobrevida
global, além de se observar um aumento nas taxas de recidiva à distância.
Em relação à quimioterapia de indução, Hitt et al estudaram 382 pacientes portadores de
câncer de cabeça e pescoço, estádios III ou IV. Um grupo foi submetido à combinação de cisplatina
e fluorouracil neoadjuvante e o outro à cisplatina, fluorouracil e paclitaxel na indução. Aqueles que
apresentaram resposta completa ou resposta parcial superior a 80% foram conduzidos ao
tratamento de radioterapia. Os resultados de taxa de resposta completa e tempo mediano para
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MA NUA IS D E CO ND UTAS
progressão foram superiores no grupo que se submeteu à indução com três drogas (14 vs 33%,
p<0,001; 12 vs 20 meses, p=0,006, respectivamente). Em relação à análise de sobrevida, com
seguimento mediano de 23,2 meses, observou-se tendência favorável ao grupo submetido à
indução com três drogas (37 vs 43 meses, p=0,06). Em pacientes com doença irressecável, a
sobrevida média foi de 26 meses para duas drogas contra 36 meses para três drogas (p=0,04). Em
relação às toxicidades, observou-se maior incidência de mucosite graus 2 a 4 no grupo que fez
somente cisplatina e fluorouracil (53 vs 16%, p<0,001), possivelmente pela dose maior de
fluorouracil neste grupo. Estes dados foram reforçados pelo estudo do EORTC, no qual a adição de
docetaxel à cisplatina e fluorouracil aumentou significativamente o tempo para progressão e a
sobrevida global, com redução de risco de morte em 27%, sendo que todos os pacientes foram
submetidos posteriormente à radioterapia exclusiva ao invés de quimiorradioterapia.
Alguns outros estudos foram recentemente apresentados e demonstram o potencial benefício
da terapia de indução com três drogas, seguida de terapia local (radioterapia exclusiva ou
quimioterapia e radioterapia combinadas). Baseado nos resultados positivos em termos de resposta
e sobrevida, de diversos estudos de fase III, a incorporação da terapia de indução passa a ser mais
uma opção, seguida obrigatoriamente de tratamento radioterápico (combinado ou não à
quimioterapia), tendo esta estratégia benefício adicional de reduzir o tumor, a dor e desconforto
associados, e permitir o melhor preparo nutricional do paciente antes do início da terapia
combinada. Porém, não foi feita até o momento comparação com o tratamento considerado padrão
com radioquimioterapia concomitante, o que limita o valor dos dados até o momento publicados
Para pacientes com contra-indicação ao uso da cisplatina, pode ser indicado o uso de
radioterapia associada à cetuximabe conforme estudo de Bonner et al, nas doses de cetuximabe
400mg/m2 EV uma semana antes do início da radioterapia, seguido por cetuximabe 250mg/m2 EV
semanal, por 7 semanas durante a radioterapia.
Em conclusão, os tumores de orofaringe devem ser abordados por equipes multidisciplinares
com experiência no manejo dessas neoplasias. No caso de tratamento não cirúrgico, optar pela
associação de cisplatina e radioterapia ou cetuximabe e radioterapia em pacientes não candidatos
à quimioterapia. A identificação da presença de HPV em parcela considerável de pacientes é capaz
de identificar subgrupo importante de pacientes com prognóstico mais favorável.
19.6.5. Tumores de orofaringe: recomendações
Diagnóstico: exame físico associado à nasofaringolaringoscopia com colheita de biópsia de
locais suspeitos. TC de face/pescoço.
Estadiamento: radiografia de tórax. Se paciente com estadiamento N2 ou N3, considerar TC
de tórax.
Tratamento da doença inicial: cirurgia ou radioterapia. Considerar radioterapia adjuvante se
linfonodo positivo na patologia. Se extravasamento extracapsular ou margem positiva,
considerar radioterapia adjuvante concomitante à quimioterapia.
Tratamento da doença avançada: cirurgia radical se ressecável ou radioterapia concomitante
à quimioterapia (preferencialmente). Se cirurgia, indicar radioterapia pós-operatória. Se
extravasamento extracapsular ou margem positiva considerar radioterapia adjuvante
concomitante à quimioterapia. Se tumor irressecável, considerar radioquimioterapia
concomitante (tratamento padrão) ou quimioterapia de indução seguida de radioterapia
concomitante ou não à quimioterapia. Se paciente com N2 ou N3 considerar esvaziamento
cervical após tratamento combinado. Se paciente com contra-indicação ao uso de cisplatina,
considerar cetuximabe concomitante à radioterapia, se disponível.
MANUAIS D E COND UTAS
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19.7. Câncer de Nasofaringe
19.7.1. Introdução
O câncer de nasofaringe (também chamada de rinofaringe) é um tumor epitelial maligno da
cabeça e pescoço. Representa entidade clínica, biológica e histológica diferente dos outros tumores
de cabeça e pescoço pela sua relação com o vírus Epstein-Barr, sua história natural, sua distribuição
geográfica e sua radiossensibilidade. Pouco frequente nos países não-endêmicos (incidência de
0,5 a 2 casos/100.000 habitantes por ano), nos países endêmicos apresenta incidência de 30 a 80
casos/100.000 habitantes por ano como acontece no sudeste da Ásia, particularmente na região
do Cantão, assim como em Taiwan, Vietnã, Malásia, norte da África, Alasca, Groenlândia e nas
populações de esquimós. A distribuição geográfica dos tumores da nasofaringe está relacionada
com uma interação complexa de fatores etiológicos genéticos, ambientais, dietéticos (exposição
à nitrosaminas presentes em defumados) e virais.
O EBV (vírus Epstein-Barr) é membro da família do herpes vírus e representa o agente causal
da mononucleose infecciosa. O EBV apresenta dois alvos celulares in vivo que são as células linfóides
B e as células epiteliais faríngeas. Como os outros herpes vírus, o EBV tem a característica de persistir
durante toda a vida do ser humano e está associado aos tumores da nasofaringe (NPC) e outros
tipos de câncer como linfoma de Burkitt, doença de Hodgkin, bem como a outras síndromes
linfoproliferativas associadas a déficit imune congênito ou adquirido. A elevação consistente dos
títulos do anticorpo contra o EBV é um fator de risco bem estabelecido para o desenvolvimento do
NPC. O vírus Epstein-Barr está associado em 100% dos casos às formas menos diferenciadas do
NPC. Fatores genéticos, como a observação de casos familiares de carcinoma indiferenciado de
nasofaringe, sugerem uma possível predisposição genética.
19.7.2. Diagnóstico
Os tumores da nasofaringe acometem principalmente adultos jovens. Têm elevada incidência
de metástases linfonodais e viscerais e crescem invadindo a mucosa e submucosa de regiões
adjacentes tais como fossas nasais, orofaringe, espaço parafaríngeo e base do crânio. A extensão
para a base do crânio está presente ao diagnóstico em quase 30% dos casos, podendo ser associada
à infiltração dos nervos cranianos IX, X e XI no caso de invasão do forâmen jugular; III, IV e V no
caso de invasão das paredes laterais do seio cavernoso e terceiro ramo do trigêmeo no caso de
infiltração do forâmen oval. Cerca de 80% dos pacientes têm linfonodos comprometidos ao
diagnóstico devido à rica rede linfática na submucosa da nasofaringe e aproximadamente 10%
têm metástases viscerais, sendo mais frequentes as metástases ósseas, seguidas de metástases
pulmonares e hepáticas. Quanto à histologia, os tumores epiteliais malignos (ou carcinomas da
nasofaringe, NPC ou carcinoma epidermoide) representam mais de 90% dos casos. A classificação
utilizada pela OMS (Organização Mundial de Saúde) é baseada no grau de diferenciação:
• OMS tipo 1: carcinoma epidermoide queratinizante
• OMS tipo 2: carcinoma epidermoide não queratinizante
• OMS tipo 3: carcinoma indiferenciado do tipo nasofaringe, anteriormente denominado
linfoepitelioma de Regault-Schmincke (descrição de 1921). Essa denominação não deve de ser
mais usada.
Outros tipos histológicos podem ser encontrados como o linfoma não-Hodgkin, que
representa 15% dos tumores malignos da nasofaringe nas zonas não-endêmicas.
• Exame clínico: inclui o exame locorregional da nasofaringe com fibronasolaringoscopia e
biópsia. O exame geral dos pares cranianos, assim como, a palpação de todas as áreas ganglionares
cervicais são obrigatórios; exame da cavidade oral é indispensável antes do tratamento com
radioterapia.
350 |
MA NUA IS D E CO ND UTAS
Exames complementares indispensáveis para o estadiamento:
• Para todos os pacientes: pelo menos tomografia de face em incidência axial e frontal para
precisar a sede e, sobretudo, a extensão do tumor para os espaços parafaríngeos e base do crânio,
a extensão lateral e anterior para os músculos pterigoidianos medial e lateral e a extensão para as
órbitas. Se possível, RNM em incidência axial, frontal e sagital permite apreciar melhor o volume
tumoral, porque diferencia o tumor do tecido inflamatório reacional e avalia com mais precisão
possível extensão intracraniana. Audiometria tonal com timpanometria pré e pós-radioterapia.
• Para os pacientes T3, T4 ou N1, N2, N3: cintilografia óssea, radiografia do tórax ou
tomografia se radiografia anormal, além ultrassonografia abdominal. PET-CT pode substituir esses
exames para a detecção de metástases à distância. Foi provado que é um exame mais sensível e
mais específico do que a cintilografia
19.7.3. Estadiamento
Tx: Tumor primário não pode ser avaliado; T0: Sem evidências do tumor primário; Tis:
Carcinoma in situ; T1: Tumor confinado à nasofaringe com ou sem extensão para orofaringe, fossa
nasal, mas sem extensão parafaríngea*; T2: Tumor com extensão parafaríngea*, T3: Tumor que
invade estruturas ósseas do crânio e/ou seios paranasais; T4: Tumor com extensão intracraniana e/ou
envolvimento de nervos cranianos, fossa infratemporal, hipofaringe, órbita ou espaço mastigador.
Nota: * A extensão parafaríngea indica infiltração pósterolateral do tumor além da fáscia faringobasilar.
NX: Os linfonodos regionais não podem ser avaliados; N0: Ausência de metástases em
linfonodos regionais; N1: Metástase cervical unilateral, com 6 cm ou menos em sua maior dimensão,
acima da fossa supraclavicular ou linfonodo(s) retrofaríngeo(s), unilateral ou bilateral, com menos
de 6 cm em sua maior dimensão; N2: Metástases em linfonodos cervicais bilaterais, com 6 cm ou
menos em sua maior dimensão, acima da fossa supraclavicular, N3: Metástase em linfonodo(s) com
mais de 6 cm em sua maior dimensão ou em fossa supraclavicular; N3a: linfonodo(s) com mais de
6 cm em sua maior dimensão; N3b: linfonodo(s) na fossa supraclavicular
Nota: Os linfonodos de linha média são considerados linfonodos homolaterais.
MX: A presença de metástase à distância não pode ser avaliada; M0: Ausência de metástase
à distância; M1: Metástase à distância
• Estádio 0
• Estádio I
• Estádio II
• Estádio III
• Estádio IVA
• Estádio IVB
• Estádio IVC
Tis N0 M0
T1 N0 M0
T1 N1 M0, T2 N0-1 M0
T1-2 N2 M0, T3 N0-2 M0
T4 N0-2 M0
qualquer T N3 M0
qualquer T qualquer N M1
19.7.4. Tratamento
19.7.4.1. Tratamento da doença inicial
A radioterapia é o tratamento de escolha dos tumores não disseminados, justificada pela
grande radiossensibilidade dos mesmos. A topografia profunda e próxima das estruturas nobres
torna estes tumores habitualmente inacessíveis à cirurgia.
• Estádios I: radioterapia exclusiva
• Estádios II: radioterapia exclusiva, ou com quimioterapia concomitante para tumores T2N1
A radioterapia externa pode ser clássica conformacional ou idealmente com modulação de
intensidade do feixe (IMRT) a qual oferece melhor controle local e diminuição da xerostomia
MANUAIS D E COND UTAS
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radioinduzida. O volume de tratamento deve incluir o volume tumoral, assim como as regiões
adjacentes consideradas de risco para propagação microscópica do tumor. É necessário tratar com
eficiência o tumor, porém minimizar o risco de toxicidade a longo prazo, particularmente
relacionada às estruturas neurológicas adjacentes.
Campo de tratamento:
• o volume do tumor primário deve ser definido pela TC ou RNM, e, no mínimo, devem ser
incluídos:
• superiormente, a metade inferior do seio esfenoidal e o andar médio da base do crânio;
• inferiormente, o volume inclui as extensões da mucosa faríngea e posteriormente os
linfonodos retrofaríngeos;
• lateralmente, espaços faríngeos e carotídeos;
• anteriormente, dois terços posteriores das fossas nasais, terço superior do seio maxilar e
fossas ptérigomaxilares.
• posteriormente, o clivo
• os linfonodos bilaterais: a nasofaringe tem uma situação mediana e apresenta rica drenagem
linfática. Por isso, são sistematicamente inclusas as áreas jugulocarotídeas II, III e IV assim como as
áreas espinhais posteriores (nível V) e parafaríngeas no volume de irradiação profilática. A fossa
supraclavicular também deve ser incluída quando existe invasão linfonodal.
19.7.4.2. Tratamento para os tumores localmente avançados
A integração da quimioterapia com a radioterapia está bem estabelecida devido aos resultados
de três meta-análises que mostram benefício da associação da quimioterapia com radioterapia na
sobrevida livre de doença e na sobrevida global. A primeira foi realizada com dados individuais
incluindo oito estudos randomizados e demonstra o benefício da quimioterapia dentro do tratamento
do câncer da nasofaringe, HR para óbito de 0,82 (IC 0,71-0,94; p=0,006), que corresponde a ganho
na sobrevida em cinco anos de 6% (56 vs 62%) e benefício de 10% na sobrevida livre de doença (42
vs 52%), sendo que o maior benefício ocorreu com associação quimiorradioterapia concomitante.
Na segunda meta-análise, com dados da literatura de 18 estudos que comparam radioterapia
exclusiva com quimiorradioterapia concomitante, a sobrevida global em três anos em favor da
quimiorradioterapia foi de 68,47 vs 56,38%, e em cinco anos, de 51,91 vs 41,09%. O estudo também
demonstrou redução de 12% na incidência de metástases à distância. E a terceira meta-análise,
que incluiu sete estudos randomizados realizados em zonas endêmicas para câncer da nasofaringe,
mostrou HR para óbito de 0,74 (IC 0,62-0,89) em cinco anos em favor da quimiorradioterapia.
• Quimiorradioterapia concomitante
Está bem estabelecido que o maior benefício da quimioterapia é obtido com a associação de
quimioterapia concomitante à radioterapia. O protocolo indicado é cisplatina na dose de 100mg/m2
a cada 3 semanas durante a radioterapia, por 3 ciclos.
• Quimioterapia adjuvante
Não há dados para seu uso exclusivo, mas a associação quimiorradioterapia concomitante,
seguida de quimioterapia adjuvante trouxe benefício na sobrevida livre de doença e na sobrevida
global. Indicado três ciclos adjuvantes de cisplatina (80mg/m2 D1) associada à fluorouracil em
infusão contínua (1000mg/m2 EV D1 a D4)
• Quimioterapia neoadjuvante
Apesar de trazer benefício na sobrevida livre de doença, ela não é considerada como um
tratamento padrão. Os dados recentemente publicados com a associação de cisplatina, docetaxel
e fluorouracil não podem ser considerados como conduta padrão.
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MA NUA IS D E CO ND UTAS
19.7.4.3. Tratamento da doença recidivada
• Recidiva local: várias opções podem ser escolhidas em função do tamanho do tumor, da
extensão, do intervalo livre de doença e do tratamento inicial.
• Se recidiva de pequeno volume, pode ser indicada braquiterapia. Eventualmente pode ser
feita nasofaringectomia ou radiocirurgia estereotáxica
• Se recidiva de maior volume, pode ser feita cirurgia seguida de nova radioterapia exclusiva
ou associada à quimioterapia. Também radioquimioterapia exclusiva pode ser uma opção
• Recidiva linfonodal é tratada por cirurgia com esvaziamento cervical radical, se possível
• Recidiva metastática, recomendamos para os pacientes com bom estado geral quimioterapia
paliativa exclusiva.
• Na primeira linha de tratamento, a escolha recai sobre os protocolos incluindo combinações
de quimioterapia baseadas em platina. A mais usada é a associação de platina e 5-FU.
• A combinação de três drogas não é superior em termos de resposta ao uso de duas drogas,
mas aumenta significativamente a toxicidade.
• A combinação de quimioterapia com cisplatina e gencitabina ou paclitaxel mostrou boas
taxas de respostas.
• Para os pacientes que já receberam quimioterapia com cisplatina, podem ser usados
docetaxel, paclitaxel, gencitabina, vinorelbina ou ifosfamida.
• Não há indicações de terapia alvo fora de estudos clínicos.
• Suporte clínico é uma opção para pacientes com baixo performance status.
19.7.5. Tumores de Nasofaringe: recomendações
Diagnóstico: exame clínico associado à fibronasolaringoscopia e biópsia.
Estadiamento: TC ou RNM de face. Pacientes com linfonodos comprometidos: Cintilografia
óssea e ultrassom abdominal.
Tratamento da doença inicial: radioterapia exclusiva.
Tratamento da doença avançada: quimioterapia concomitante à radioterapia seguida de
quimioterapia adjuvante.
19.8. Tratamento da Doença Metastática ou recidivada
Locorregionalmente
19.8.1. recidiva local ou regional
Recidiva local é a principal causa de falha terapêutica nos pacientes portadores de câncer de
cabeça e pescoço. O tratamento de escolha, se factível, é a cirurgia de resgate, sendo as taxas de
controle diretamente dependentes do sítio primário da doença. Se irressecável, a opção terapêutica
deve ser personalizada, sendo possível: reirradiação para casos selecionados, quimioterapia paliativa
ou cuidados paliativos. O diagnóstico da recidiva ou doença residual é feito através do exame clínico,
endoscópico ou por imagem, de acordo com as queixas do paciente.
Cirurgia de resgate
No caso de recidiva após tratamento cirúrgico prévio, deve-se sempre considerar a
possibilidade de resgate cirúrgico, pois cerca de 30 a 60% destes pacientes permanecem vivos e sem
evidências de recidiva a longo prazo após este resgate. Após quimiorradiação, também se deve
sempre considerar a possibilidade de resgate cirúrgico.
MANUAIS D E COND UTAS
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• Recidiva cervical
O paciente que inicialmente apresentava linfonodos clinicamente negativos e foi submetido
à radioterapia no pescoço possui taxas de recidivas cervicais em torno de 2%. Portanto, dificilmente
irá precisar de abordagem cirúrgica. Nos pacientes com linfonodos positivos prévios a qualquer
tipo de tratamento, há um maior risco de recidiva cervical. Para estes pacientes, é recomendado o
esvaziamento cervical radical de resgate, ou mesmo esvaziamento cervical seletivo em casos
específicos.
• Recidiva local
A extensão da cirurgia depende da localização e do estadiamento da recorrência.
Reirradiação
Nos pacientes com recidiva local após radioterapia, a cirurgia de resgate deve ser considerada
o tratamento de escolha. Entretanto, nos casos de doença inoperável ou irressecável, a reirradiação
pode ser utilizada, em associação ou não à quimioterapia, podendo oferecer controle local, a longo
prazo, em casos bem selecionados. Dois grandes problemas são importantes e evidentes dentro do
contexto da reirradiação. O primeiro seria o risco não desprezível de toxicidade aguda e tardia,
uma vez que a maioria dos órgãos já terá recebido, durante o primeiro tratamento, a dose plena de
radioterapia tolerada por eles. Entre as principais toxicidades podem ser citadas úlceras de difícil
cicatrização, osteorradionecrose, lesões à medula espinhal, entre outras. Sendo assim, é fundamental
que sejam utilizadas técnicas modernas de tratamento nos casos de reirradiação dos tumores de
cabeça e pescoço, buscando proteger ao máximo os órgãos adjacentes ao tumor e, dessa forma,
minimizar os riscos de sequelas decorrentes do tratamento. O segundo problema seria a provável
existência de clones tumorais radiorresistentes uma vez que a recidiva ocorre em região previamente
irradiada. Esse fato restringe a chance de sucesso da reirradiação, tornando o prognóstico destes
pacientes ainda mais reservado. Sendo assim, consideramos muitas vezes que pacientes com recidiva
tumoral antes dos seis primeiros meses após o primeiro tratamento, teriam tumores radiorresistentes
e, portanto, não iriam desfrutar de grandes benefícios com a reirradiação. Essas recidivas precoces
(isto é, no primeiro ano após o tratamento) não são consideradas recidivas propriamente ditas,
mas não esterilização da doença. Por isso, o benefício da reirradiação é muito limitado.
Em suma, é importante que os pacientes encaminhados para reirradiação sejam bem
selecionados, a fim de que desfrutem dos possíveis benefícios do retratamento com riscos de
toxicidade aceitáveis. Entre os fatores que indicam melhor prognóstico e, portanto, maior chance
de sucesso nos casos de reirradiação teríamos: tumor de pequeno volume, ausência de doença em
mucosas com recidiva isolada em região cervical, longo intervalo entre o primeiro tratamento e a
recidiva, uso de novas tecnologias e de doses mais altas de radioterapia.
Outro contexto no qual a reirradiação pode ser empregada é nos casos de tumores recidivados
submetidos à cirurgia com critérios de alto risco para nova recidiva. Resultado de estudo
prospectivo randomizado de fase III demonstra que o uso da reirradiação adjuvante em concomitância
com a quimioterapia proporcionaria ganho na sobrevida livre de doença com HR 1,68 (IC 1,13-2,5;
p=0,01), sem alterar a sobrevida global e com aumento da toxicidade aguda e crônica (39 vs 10%
de toxicidade tardia grau III e IV em 02 anos). Entre os critérios para se considerar o uso da
reirradiação adjuvante podem ser citados: margens positivas, invasão perineural e/ou linfovascular
e extensão extranodal.
19.8.2. Doença metastática
Cerca de 20 a 30% dos pacientes desenvolverão doença metastática ao longo do curso de
sua doença. A escolha do melhor tratamento para o paciente deve ser baseado no seu performance
status, idade, comorbidades, tratamentos anteriores e preferência do paciente. Os objetivos do
tratamento nesta circunstância é o controle de sintomas, melhorar a qualidade de vida e se possível
354 |
MA NUA IS D E CO ND UTAS
aumentar a sobrevida global e a sobrevida livre de doença. A sobrevida mediana para os pacientes
submetidos à quimioterapia paliativa gira em torno de 7,8 meses, sendo a sobrevida em 1, 2, 3 e 5
anos de 32%, 12%, 7% e 3,6% respectivamente. A taxa de resposta global é de aproximadamente
30%. Os fatores prognósticos são: grau de diferenciação tumoral, performance status, perda de
peso, localização do tumor primário, radioterapia prévia e resposta à quimioterapia paliativa.
Quimioterapia
Drogas ativas no câncer de cabeça e pescoço são aquelas que produzem taxa de resposta
maior que 15% quando usadas isoladamente. Neste contexto, temos as seguintes drogas ativas:
fluorouracil bleomicina, cisplatina e metotrexato como drogas clássicas no tratamento do CCP e
mais recentemente incorporadas: taxanes (paclitaxel e docetaxel), capecitabina, vinorelbina,
pemetrexato e irinotecano. Em geral, a taxa de resposta gira em torno de 15 a 30%, com curta
duração (cerca de 3 a 5 meses) Os taxanes são as drogas mais ativas isoladamente com taxas de
respostas que variam entre 20 e 43%. Há poucos estudos prospectivos randomizados no contexto
de doença metastática com o uso de drogas isoladas. O que se conclui com a escassa literatura
disponível é que nenhum dos tratamentos acima mostrou superioridade (relativa à sobrevida)
quando comparado ao metotrexato em baixa dose administrado semanalmente por via
intramuscular. Também é escassa a literatura comparando droga isolada versus melhor cuidado
suportivo. Em pequeno estudo randomizado, cisplatina mostrou sobrevida superior quando
comparada ao melhor cuidado suportivo.
Em relação aos esquemas de poliquimioterapia, o mais usado e estudado é o esquema com
fluorouracil infusional combinado à platina. Este esquema demonstra maior taxa de resposta
quando comparado com droga isolada, porém a sobrevida não é superior, com o custo de maior
toxicidade. É importante ressaltar que a carboplatina tem resposta inferior à cisplatina neste
contexto. O estudo do ECOG E1395 comparou paclitaxel associado à cisplatina versus fluorouracil
infusional associado à cisplatina: as taxas de resposta e sobrevida foram semelhantes entre os dois
esquemas (em torno de 27% e 8 meses, respectivamente), assim como o perfil de toxicidade.
Esquemas tríplex, incluindo ao tradicional fluorouracil e cisplatina o docetaxel, ou docetaxel
associado à ifosfamida e cisplatina, produzem a maior taxa de resposta entre os esquemas de
quimioterapia (60 a 95% de resposta global), porém com alta toxicidade hematológica e outras
complicações.
Em 2008, foi publicado por Vermoken et al os resultados do estudo prospectivo randomizado
EXTREME, que associava ou não ao esquema tradicional de fluorouracil infusional e platina o
inibidor de EGFR cetuximabe para pacientes com doença metastática ou recidivada, em primeira
linha paliativa. A adição de cetuximabe prolongou a sobrevida mediana de 7,4 para 10,1 meses
(HR 0,80, p=0,04). A sobrevida livre de progressão também foi estatisticamente maior no grupo que
usou cetuximabe (3,3 x 5,6 meses (HR 0,54, p<0,0001) assim como a taxa de resposta (20 x 36%,
p<0,0001).
Esquemas de poliquimioterapia somente deverão ser indicados para pacientes com PS 0 ou
1, e com doença sintomática. Para pacientes com baixo performance status, a indicação de
monoquimioterapia ou cuidados paliativos exclusivos deve ser a primeira escolha.
Cuidados Paliativos
Para pacientes com baixo performance status, idosos, apresentando comorbidades significativas,
melhor cuidado suportivo (ou cuidados paliativos) pode ser a escolha em relação à quimioterapia
ou radioterapia paliativas. Isso significa dar conforto físico, emocional e espiritual ao paciente.
Alívio de sintomas como analgesia adequada é o mínimo que deve ser oferecido. Se necessário,
considerar sedação para sintomas refratários.
MANUAIS D E COND UTAS
| 355
19.8.3. Doença Metastática ou recidivada: recomendações
recidiva loco-regional operável: resgate cirúrgico.
recidiva loco-regional inoperável: reirradiação, se possível, associada ou não à quimioterapia
(se platino sensível considerar esquema padrão de cisplatina a cada 21 dias).
Doença metastática ou recidiva loco-regional não apta a tratamentos locais: quimioterapia
sistêmica:
Se paciente jovem e PS 0 ou 1: poliquimioterapia. Incluir cetuximabe se disponível.
Se pacientes idosos ou com PS 2: monoquimioterapia ou cuidados paliativos exclusivos
19.9. Esquemas de Tratamento
• Cisplatina concomitante a radioterapia
Cisplatina 100mg/m2 EV D1, D22, D43
• Cetuximabe concomitante a radioterapia
Cetuximabe 400mg/m2 EV semana 0, seguido por cetuximabe 250mg/m2 EV semana 1 a 7
• PF
Cisplatina 100mg/m2 EV D1
Fluorouracil 1000mg/m2 EV D1 a D5
A cada 3 semanas
• PCF
Paclitaxel 175mg/m2 EV D1
Cisplatina 100mg/m2 EV D1
Fluorouracil 1000mg/m2 EV D1 a D5, em infusão contínua.
A cada 3 semanas
• DCF
Docetaxel: 75mg/m2 EV D1
Cisplatina 100mg/m2 EV D1
Fluorouracil 1000mg/m2 EV D1 a D4, infusão contínua
A cada 3 semanas
• DCF
Docetaxel 75mg/m2 EV D1
Cisplatina 75mg/m2 EV D1
Fluorouracil 750mg/m2 EV D1 a D5, infusão contínua
A cada 3 semanas
• Paclitaxel semanal
Paclitaxel 100mg/m2 EV
• Methotrexate semanal
Methotrexate 30 a 50mg/m2 EV ou IM
• CFC
Cisplatina 100mg/m2 EV D1 (ou carboplatina AUC 5 EV D1)
356 |
MA NUA IS D E CO ND UTAS
Fluorouracil 1000mg/m2 EV D1 a D5 por infusão contínua
Cetuximabe 400mg/m2 EV na semana 1, seguido por 250mg/m2 EV semanalmente.
A cada 3 semanas
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MANUAIS D E COND UTAS
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Capítulo 20
Câncer do Sistema Nervoso
Central (Gliomas em adultos)
Editor: Dr. Artur Katz
Autores: Dr. Olavo Feher, Dra. Aknar Freire de Carvalho Calabrich, Dr. Aurélio Julião de Castro
Monteiro, Dr. Stephen Doral Stefani, Dr. Sebastião Correia, Dr. Marcos Augusto Stavale Joaquim e
Dr. Artur Katz
360 |
MA NUA IS D E CO ND UTAS
MANUAIS D E COND UTAS
| 361
Capítulo 20
Câncer do Sistema Nervoso Central
(Gliomas em adultos)
20.1. Introdução
Gliomas constituem o tipo mais comum de tumores primário cerebrais, com cerca de 12.500
casos novos diagnosticados anualmente nos EUA1. Sob denominação genérica de gliomas,
incluímos diversas entidades clínico-patológicas que apresentam marcadores de diferenciação
glial e que podem surgir em qualquer localização do sistema nervoso central. Fazem parte deste
conjunto de neoplasias os astrocitomas, oligodendrogliomas, gliomas mistos (que combinam
elementos astrocíticos e de oligodendrogliais), e ependimomas. Uma vez que os ependimomas
têm comportamento biológico e terapêutico muito distinto dos demais gliomas, eles não serão
incluídos neste documento.
De acordo com a classificação da Organização Mundial da Saúde (WHO), os gliomas são
classificados em graus distintos de acordo com seu grau de diferenciação e anaplasia (Tabela 1 e
2 ). Esta classificação tem importantes implicações prognósticas e terapêuticas. Os gliomas grau I
são tipicamente localizados e não infiltrativos, ocorrendo predominantemente em crianças. Entre
adultos, mais de 50% dos casos são constituídos de gliomas de alto grau, também denominados
frequentemente na literatura como gliomas malignos. Fazem parte deste grupo os glioblastoma
multiformes (grau IV pela classificação da WHO), os astrocitomas anaplásicos (grau III pela
classificação da WHO), os oligodendrogliomas anaplásicos (grau III pela classificação da WHO) e os
oligoastrocitomas anaplásicos (grau III pela classificação da WHO). Os gliomas de alto grau tendem
a ocorrer em indivíduos de 40 a 65 anos de idade. Os gliomas de baixo grau (grau I e II pela
classificação da WHO), por sua vez, tendem a ocorrer em indivíduos mais jovens, têm melhor
evolução, com história natural mais indolente, porém tendem, com o tempo, a sofrer transformação
para um glioma de alto grau.
O tratamento dos gliomas envolve obrigatoriamente uma estratégia multidisciplinar, da qual
participam o neurologista, o neurocirurgião, o radioterapeuta e o oncologista clínico. A natureza
infiltrativa destes tumores, bem como a eloquência do tecido cerebral normal são fatores que impõem
importantes restrições ao manejo cirúrgico e radioterápico destes tumores. Por outro lado, o edema
(levando ao aumento da pressão intersticial e consequentemente dificultando a difusão de drogas),
a presença de uma rede microvascular extensa e desorganizada, bem como a barreira hematoencefálica, constituem obstáculos que limitam sobremaneira o acesso dos agentes antineoplásicos
a estes tumores. Dificuldades adicionais no tratamento dos gliomas incluem ainda a toxicidade
sobre o tecido cerebral normal, e a freqüente resistência intrínseca destes tumores à quimioterapia.
Tabela 1 - Classificação de Gliomas
Grau
I/II Astrocitomas bem diferenciados
III Astrocitomas anaplásicos
IV Glioblastoma multiforme
% Gliomas
15-20
30-35
40-50
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Tabela 2 - Prognóstico dos Gliomas
Tumor
Oligodendroglioma
Astrocitoma grau II
Oligodendroglioma anaplásico
Perda de 1p e 19q
Sem perda de 1p e 19q
Astrocitoma anaplásico (G III)
Glioblastoma multiforme (G IV)
Sobrevida Mediana
10 a 16 anos
5 anos
> 6 a 7 anos
2 a 3 anos
2 a 3 anos
6 a 19 meses
20.2. Gliomas de Alto Grau
20.2.1. Tratamento primário
Princípios do tratamento cirúrgico
Habitualmente, a primeira etapa do tratamento dos glioma envolve um procedimento
cirúrgico. Entretanto, poucos estudos clínicos prospectivos abordam a questão da extensão da
ressecção cirúrgica dos gliomas2. Por serem habitualmente tumores infiltrativos, que se extendem
muito além de suas margens macroscópicas, os gliomas são tradicionalmente considerados
cirurgicamente incuráveis. Há evidente necessidade de contrabalançar-se a extensão da ressecção
com a necessidade de preservar o status funcional neurológico do paciente 3,4,5.
Dados retrospectivos sugerem um benefício em termos de sobrevida para pacientes submetidos
à ressecção cirúrgica macroscópica completa6.
Fatores que afetam a ressecabilidade de um tumor incluem a proximidade de área eloqüente,
a idade e performance status do paciente e o efeito de massa e desvio da linha média presentes em
cada caso. A cirurgia é eficaz em reduzir a massa tumoral, proporcionando um menor volume
remanescente de doença a ser tratada pelas outras modalidades terapêuticas. Além disto, a
ressecção tumoral permite uma definição diagnóstica mais precisa do que aquela proporcionada
por biópsias estereotáxicas. Um estudo recente mostra que o diagnóstico histológico pode mudar
em até 40% dos casos quando a cirurgia é realizada após uma biópsia7.
A despeito da ausência de estudos prospectivos e aleatorizados, procura-se realizar uma
ressecção cirúrgica máxima no tratamento dos gliomas de alto grau, sendo este procedimento
habitualmente proposto aos pacientes com bom performance status, sintomáticos, portadores de
tumores acessíveis cirurgicamente e distantes de áreas eloquentes. Uma RNM. pós-operatória
deverá ser realizada até 48 horas após a cirurgia a fim de documentar o grau de ressecção cirúrgica
e avaliar a extensão de doença residual pós neurocirurgia. O papel da cirurgia nos gliomas de baixo
grau será discutido adiante. Quando um tumor é considerado inoperável, seja pela sua localização,
seja pelo seu volume, uma biópsia esterotáxica pode ser utilizada para que se possa estabelecer um
diagnóstico histológico. Uma possível exceção a esta regra se aplica aos gliomas difusos de tronco
cerebral. Nestes casos, os achados de imagem, proporcionados pela RNM, associados à história
clínica são suficientes para o estabelecimento do diagnóstico. Ressecção cirúrgica não é possível
nestes casos e o diagnóstico histológico, acaba por não ter influência prognostica ou terapêutica,
visto que os gliomas difusos de tronco cerebral, independentemente de sua histologia, exibem
história natural agressiva, compatível com a evolução de um glioma maligno. Por outro lado, os
tumores localizados (não difusos), especialmente os císticos são cirurgicamente acessíveis com o
emprego de técnicas neurocirúrgicas modernas. A ressecção de gliomas dorsais exofíticos do tronco
cerebral podem também proporcionar sobrevida longa livre de doença. 8
MANUAIS D E COND UTAS
| 363
Princípios do tratamento Radioterápico
O benefício do tratamento radioterápico pós-operatório foi inicialmente demonstrado já no
final da década de 70 9. O conhecimento de que as recidivas tumorais tendem na maioria das vezes
a ser locorregionais levou à adoção de tratamento cerebral parcial, também conhecido como de
campo envolvido, como padrão de tratamento10,11. O prognóstico dos pacientes portadores de
gliomas malignos pode ser previsto através de variáveis clínicas que foram avaliadas através da
metodologia de “Recursive Partioning Analysis”, conhecida como RPA 12 (Tabela 3). O grupo de
melhor prognóstico (sobrevida mediana de aproximadamente 5 anos) inclui pacientes portadores
de astrocitoma anaplásico com idade inferior a 50 anos, bom performance status e boa condição
neurológica. Já os pacientes portadores de glioblastoma multiforme, com idade superior a 50
anos, com estado geral comprometido e submetidos apenas a procedimento de biópsia têm
sobrevida mediana inferior a cinco meses.
Radioterapia pós-operatória é rotineiramente oferecida aos pacientes com melhor condição
clínica e melhor prognóstico. O tratamento habitualmente inclui a administração de 60Gy de
radioterapia externa administrados em frações de 1,8 a 2,0Gy , 5 vezes por semana. O volume de
tratamento é baseado nas alterações visualizadas na RNM, incluindo a área ocupada pelo tumor no
T2 ou FLAIR (“fluid-attenuated inversion recovery”) acrescido de 1 a 2cm de margem, algumas vezes
seguido de reforço (boost) na área contrastante. Um estudo prospectivo randomizado recente
demonstrou que mesmo indivíduos idosos, com idade igual ou superior a 70 anos alcançam ganho
de sobrevida significante quando submetidos a radioterapia pós-operatória 13. Por outro lado,
pacientes mais idosos estão sujeitos a apresentarem maior toxidade aguda ao tratamento
radioterápico 14.
A utilização de técnicas modernas de radioterapia, com planejamento tridimensional
utilizando CT/RM/PET-CT permite melhor homogeneização de dose, diminuição de áreas de
sobreposição de dose e proteção de tecidos sadios. Técnicas como a IMRT (radioterapia com
intensidade modulada de feixe) são úteis para melhorar proteção de estruturas críticas próximas
do campo (ex. quiasma, tronco cerebral – no caso sem infiltração tumoral) permitindo alcançar
um aumento de dose no centro do tumor (área hipóxica).
O planejamento radioterápico deverá obrigatoriamente levar em consideração a tolerância
dos tecidos sadios à irradiação, conforme descrito abaixo:
• Cérebro total – 50Gy
• Volume parcial cérebro – 60Gy
• Tronco cerebral – 54 Gy
• Medula espinhal – 45 Gy
• Quiasma – 50 - 54 Gy
• Retina – 45 Gy
• Cristalino – 10 Gy
• Epilação – 20 – 30 Gy
Possíveis complicações do tratamento radioterápico incluem:
• Agudas: alopecia, fadiga, síndrome hipertensão endocraniana pelo edema (mais comum em
tratamentos dirigidos ao tronco cerebral e à fossa posterior), otite externa, sonolência.
Mucosite, esofagite, mielosupressão (mais frequentemente associada à irradiação do
neuroeixo ou uso concomitante de quimioterapia).
• Tardias: radionecrose, leucoencefalopatia (pode manifestar-se de 3 meses a 3 anos após
radioterapia) especialmente quando associado à quimioterapia, retinopatia, alterações endócrinas,
alteração de memória recente.
364 |
MA NUA IS D E CO ND UTAS
Tabela 3 - Grupos prognósticos propostos pelo rTOG (Radiation Therapy Oncology Group) com
base no RPA (Recurssive Partitioning Analysis) 12
Classe rTOG
I
II
III
IV
Classe V
Classe V
Fatores Prognósticos
Sobrevida Mediana (meses)
Idade <50, AA, status mental normal.
58,6
Idade>50, AA, KPS >70 com pelo menos 3
37,4
meses entre início dos sintomas e
tratamento.
17,9
Idade <50, GBM, KPS >90 OU Classe I com
status mental alterado
Idade <50, GBM, KPS <90 OU Classe II com
11,1
sintomas <3 meses OU Classe V com
ressecção e capaz de trabalhar
Idade >50, GBM, KPS >70, seja com
8,9
ressecção, mas incapaz de trabalhar seja
submetido à biópsia apenas seguido de RT
com pelo menos 54,4Gy OU Idade >50, KPS
<70, status mental normal.
Idade >50, GBM, KPS >70, submetido a
4,6
biópsia apenas, menos de 54,4Gy OU Idade
> 50, KPS <70 e status mental anormal
AA: astrocitoma anaplásico; GBM: glioblastoma multiforme; KPS: Karnofsky performance status.
Princípios da Quimioterapia
• Glioblastoma Multiforme
Vários estudos prospectivos e aleatorizados foram conduzidos ao longo da década de 80 e
início da década de 90, buscando avaliar o papel da quimioterapia adjuvante no tratamento dos
gliomas de alto grau. Nestes estudos, as drogas mais frequentemente utilizadas foram as
nitrosuréias (carmustina ou BCNU e lomustina ou CCNU). Estas drogas foram selecionadas pela sua
lipossolubilidade e pela sua capacidade de atravessarem a barreira hemato-encefálica. Estes
estudos sugeriam que a adição de quimioterapia adjuvante à cirurgia e à radioterapia pudesse
proporcionar um modesto ganho de sobrevida aos pacientes 15,16.
Posteriormente, duas meta-análises foram publicadas, respectivamente nos anos de 1994 e
2002, confirmando a informação de que o emprego da quimioterapia adjuvante está associado a
um ganho absoluto de sobrevida de um ano de 6 a 10% 17,18. Com base nestes resultados, muitos
grupos passaram a adotar rotineiramente a quimioterapia adjuvante como parte da estratégia
terapêutica inicial dos gliomas malignos. Um estudo conduzido em conjunto pelo EORTC e NCI-C
avaliou prospectivamente o emprego da temozolomida adjuvante no tratamento inicial dos
glioblastomas multiformes 19. Temozolomida é um agente alquilante metilante com excelente
biodisponibilidade oral e que atravessa com facilidade a barreira hemato-encefálica. A
temozolomida foi administrada inicialmente na dose de 75mg/m2/dia, sem interrupção, do
primeiro ao último dia da radioterapia, ou seja, por 6 semanas. Após quatro semanas de intervalo,
os pacientes voltaram a receber temozolomida na dose de 150 a 200mg/m2/dia por 5 dias,
repetindo o tratamento a cada 28 dias, num total de 6 ciclos. Este tratamento determinou um
aumento significativo de sobrevida mediana (12,1 versus 14,6 meses), além de aumentar a
sobrevida de 2 anos de 10,4% para 26,5% (P < 0,001), tornando este tratamento um novo padrão
no tratamento dos glioblastomas. Dos pacientes alocados para receber temozolomida concomitante
MANUAIS D E COND UTAS
| 365
à radioterapia, 50% continuava livre de progressão ao cabo dos 6 ciclos de tratamento, razão pela
qual nos novos estudos prospectivos que estão em andamento, a duração do tratamento adjuvante
é de 12 a 24 meses. Da mesma forma, importantes centros neuro-oncológicos ao redor do mundo
adotam até 24 meses de tratamento, para os pacientes que permanecem livres de progressão 20. De
maneira geral, este tratamento foi bem tolerado, com mielotoxicidade graus 3 e 4 ocorrendo em
apenas 7% dos pacientes. Outros efeitos colaterais incluem náusea e vômito, fadiga e anorexia.
Entretanto, a administração diária contínua da temozolomida pode determinar a ocorrência de
linfopenia importante, razão pela qual é imperioso administrar profilaxia com trimetoprim/
sulfametoxazol (80 mg de trimetoprim associado a 400mg de sulfametoxazol duas vezes ao dia, três
vezes por semana) ou pentamidina inalatória para pacientes alérgicos a sulfa, a fim de reduzir o
risco de pneumonia por Pneumocystis jerovecii . Esta profilaxia deverá ser iniciada ao iniciarmos a
temozolomida diária concomitante à radioterapia, devendo ser mantida até que ocorra resolução
da linfopenia. A temozolomida deverá ser administrada longe de refeições, com estômago vazio
preferencialmente ao deitar e precedida de um anti-emético oral. A presença de metilação do
promotor do MGMT (methyl guanine methyl transferase) foi um grande fator prognóstico para
aumento de sobrevida e preditor de resposta a quimioterapia. Porém este teste ainda não está
disponível e validado em nosso meio e não deve ser utilizado para decisões terapêuticas.
Pacientes idosos (idade superior a 70 anos) portadores de glioblastoma multiforme, tendem
a tolerar pior o tratamento combinado nas doses citadas acima. Além disto, estes pacientes não
foram incluídos no estudo EORTC/ NCIC, sendo, portanto sua aplicação neste contexto uma
extrapolação dos resultados. Assim consideramos que a melhor conduta terapêutica nestes
pacientes ainda seja motivo de intensa controvérsia e que não há um “padrão ouro” definido.
Portanto, sugerimos que as decisões de tratamento destes pacientes sejam individualizadas. Em
casos selecionados, podemos optar por evitar a radioterapia, em situações nas quais seja desejável
evitar efeitos colaterais da irradiação, tais como fadiga e possível piora de déficits neurológicos ou
ainda em condições nas quais, por seja problemático realizar o deslocamento do paciente para
tratamento radioterápico diário. Em tais ocasiões, podemos utilizar a temozolomida no esquema
convencional (150 a 200mg/m2 por 5 dias a cada 28) de forma isolada 21. Alternativamente, a
radioterapia isolada em esquema hipofracionado ou convencional seguida de quimioterapia
adjuvante com temozolomida nas doses convencionais é uma opção para pacientes idosos em
condições para a radioterapia 22,23. Por outro lado, devemos salientar que em pacientes idosos em
bom status de desempenho, o tratamento recomendado continua sendo a associação radioterapia
e temozolamida 24,25.
Outra opção quimioterápica consiste na administração quimioterapia intersticial intraoperatória, com a aplicação de um polímero biodegradável de BCNU na cavidade cirúrgica, após a
ressecção do tumor. Esta estratégia utiliza polímeros biodegradáveis contendo carmustina
(Gliadel®), aprovado pelo FDA para esta indicação (não disponível comercialmente no Brasil, exceto
caso seja importado para um paciente individual). Um estudo prospectivo e aleatorizado incluiu
240 pacientes portadores de gliomas malignos tratados com radioterapia externa, randomizados
para a introdução intra-operatória de um wafer contendo carmustina ou placebo 26. O grupo tratado
com o polímero de BCNU alcançou aumento significativo de sobrevida mediana (13,9 meses versus
11,6 meses). Vale ressaltar que esta estratégia é mais indicada para os glioblastomas, uma vez que
os gliomas anaplásicos constituíam apenas aproximadamente dez por cento de toda a população
deste estudo. Esta estratégia é muito raramente empregada em nosso país devido à dificuldade
na obtenção do Gliadel® e nos resultados alcançados com a utilização de temozolomida.
• Astrocitomas anaplásicos, oligodendrogliomas anaplásicos e oligoastrocitomas anaplásicos
O grupo dos gliomas anaplásicos (WHO Grau 3) é composto pelos astrocitomas (AA), os
oligodendrogliomas (AO) e os oligoastrocitomas anaplásicos (OAA). A definição do melhor tratamento
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MA NUA IS D E CO ND UTAS
para os astrocitomas anaplásicos ainda é matéria bastante controversa. O papel da radioterapia é
certamente importante e é considerada como padrão-ouro. Já o papel da quimioterapia não se
encontra tão bem definido. Questões como o papel do tratamento concomitante com a
radioterapia, bem como qual o melhor esquema quimioterápico ainda estão em aberto. No
tratamento pós- operatório dos gliomas anaplásicos, o regime PCV (procarbazina, CCNU e
vincristina), foi o regime mais frequentemente estudado. Um estudo fase III comparando pacientes
tratados com BCNU ou PCV mostrou benefício de sobrevida para pacientes tratados com PCV 27.
Entretanto, uma análise retrospectiva dos estudos do RTOG utilizando BCNU ou PCV verificou que
a diferença entre o BCNU e o esquema PCV não parecia ser muito relevante 28. Ainda não há
resultados de estudos específicos em pacientes portadores de astrocitoma anaplásico que
justifiquem o tratamento com temozolomida em detrimento aos regimes baseados em nitrosuréias.
Estudo conduzido pelo RTOG (RTOG 98-13) compara tratamento baseado em nitrosuréias com o
mesmo utilizando temozolomida, porém os resultados ainda não foram divulgados.
Com base no perfil de toxicidade favorável à temozolomida em relação às nitrosuréias e nos
resultados alcançados no estudo conduzido em pacientes portadores de glioblastoma multiforme,
muitos centros adotam este mesmo esquema terapêutico em pacientes portadores de astrocitomas
anaplásicos puros. Os tumores anaplásicos que apresentam componente oligodendroglial
representam um subgrupo que merece ser avaliado de maneira individual. De forma geral estes
tumores tendem a ser mais sensíveis à quimioterapia 29,30. Alguns estudos sugerem que a presença
de perdas alélicas concomitantes (codeleção) dos cromossomos 1p e 19q ocorrem em 61% a 89%
dos OA e 13 a 20% dos OAA31, 32. e estão associadas a um melhor prognóstico e também maior
responsividade a quimio e radioterapia 33. A perda cromossômica de 1p, isolada ou associada à
perda de 19q está significativamente associada à resposta ao tratamento com PCV e a aumento
significativo de sobrevida livre de recorrência e sobrevida global 34. A perda de material
cromossômico combinado de 1p e 19q constitui também um importante fator prognóstico em
lesões de baixo grau 35. Por outro lado, pacientes cujos tumores não exibem perdas nestes
cromossomos apresentam tumores de pior prognóstico e provavelmente menos sensíveis à
quimioterapia 36. A temozolomida é ativa em pacientes portadores de OA 37, proporcionado
respostas radiológicas objetivas em 53% dos pacientes participantes em um estudo europeu, com
tempo mediano para progressão de 13 meses.
Dois grandes estudos prospectivos randomizados avaliaram a eficácia da associação de
quimioterapia com o esquema PCV (adjuvante ou neoadjuvante) à radioterapia como tratamento
pós operatório nos tumores oligodendrogliais anaplásicos. O primeiro destes estudos, RTOG 940238
randomizou pacientes para receber quatro ciclos de PCV (intensificado) seguido de radioterapia à
dose de 60 Gy ou radioterapia isolada. O segundo estudo (EORTC 26951) 39 randomizou pacientes
para radioterapia na dose de 60 Gy seguida de PCV adjuvante por seis ciclos ou radioterapia isolada.
Ambos os estudos mostraram um prolongamento na sobrevida livre de progressão, mas não na
sobrevida global, o que talvez se explique pelo fato de que a maioria dos pacientes tratados
inicialmente com radioterapia veio a receber posteriormente quimioterapia com PCV. Tampouco
o subgrupo de pacientes portadores de deleção cromossômica conjunta 1p19q apresentou
benefícios em prolongamento da sobrevida global com a quimioterapia neo ou adjuvante, quando
comparados com os portadores da codeleção no braço controle. Portanto, a conclusão de ambos
os estudos é de que a quimioterapia com PCV administrada precocemente não prolonga a
sobrevida destes pacientes, o que sugere que a administração sequencial de rádio e quimioterapia
poderia ser uma estratégia apropriada para tratamento de gliomas anaplásicos. Esta foi testada
no estudo NOA-04 40, que é um estudo de fase III no qual foram incluídos pacientes portadores de
gliomas anaplásicos (astrocitomas anaplásicos (AA), oligoastrocitomas (OAA) e oligodendrogliomas
(OA), sem tratamento prévio. Estes foram randomizados para radioterapia (60 Gy) ou quimioterapia,
sendo que no braço de quimioterapia os pacientes foram por sua vez randomizados entre o
MANUAIS D E COND UTAS
| 367
esquema PCV ou temozolomida administrado de forma convencional. O desenho do estudo incluía
cruzamento entre os braços à progressão tumoral. Os resultados mostraram que nem o tipo de
tratamento inicial (radio versus quimioterapia), nem o esquema quimioterápico tiveram impacto
na sobrevida global. Este estudo incluía análise de biomarcadores (presença de codeleção 1p19q
ou alterações cromossômicas isoladas 1p ou 19q; metilação do promotor da MGMT e mutação nos
genes IDH1 e IDH2) no seu desenho. A codeleção 1p19q foi encontrada em 40,9% dos pacientes
avaliáveis, sendo em 14,9% dos AA, 58,7% dos OAA e em 77,4% dos OA. Deleção parcial ou
completa de 1p e 19q isoladas foi encontrada respectivamente em 26,5% e 20,4% dos pacientes
avaliáveis. A metilação do promotor da MGMT foi encontrada em 60,9% dos tumores avaliáveis,
sendo em 50% dos AA, 70,7% dos OAA e 71% dos AO. Mutações no gene IDH1 foram detectadas
em 65,6% dos tumores avaliáveis e tinham a seguinte distribuição: AA 57%, OAA 73% e AO 71%.
Mutação de IDH2 foi encontrada em apenas 3% dos pacientes avaliáveis. Na análise multivariada
de fatores prognósticos associados aos desfechos principais (SLP e TFT) foram identificados:
extensão da ressecção, idade (< 50 anos), histologia (OA e OAA vs. AA), mutação do gene IDH1 e
metilação do promotor da MGMT. A presença da codeleção 1p19q foi fator prognóstico apenas
para a SLP. Interessante foi o achado de que apesar de todas as evidências em contrário, os
oligodendrogliomas e os oligoastrocitomas apresentaram um curso clínico indistinguível.
Assim, em relação aos gliomas anaplásicos, concluímos que até o momento não existem
evidências que justifiquem a adoção de tratamento combinado quimio e radioterápico, mesmo
em se tratando do astrocitoma anaplásico puro. Recomendamos, portanto o emprego da rádio e
da quimioterapia de forma sequencial na medida em que se observa progressão do tumor. O
tratamento inicial (quimio ou radioterapia) deve ser adotado em bases individuais. Ressaltamos
que não parece haver diferença de eficácia entre a temozolomida e o regime PCV, embora a
primeira seja mais bem tolerada.
20.2.2. Tratamento de recidiva
Infelizmente, as estratégias terapêuticas atuais não impedem que a imensa maioria destes
pacientes desenvolva progressão de doença após seu tratamento inicial. A estratégia terapêutica
a ser utilizada envolve a realização de novas cirurgias, realização de radioterapia focal e o emprego
de tratamento sistêmico. O prognóstico destes pacientes é infelizmente muito reservado e poucos
sobrevivem mais do que alguns poucos meses.
A cirurgia dos gliomas recorrentes de alto grau pode ser considerada no caso de recidivas
“focais” especialmente quando o cirurgião considera haver a possibilidade de uma ressecção
citorredutiva significativa do tumor. Além disto, há outras situações em que se pode considerar
reabordagem cirúrgica como, por exemplo, quando há dúvida diagnóstica entre recidiva tumoral
ou radionecrose, ou ainda para promover alívio de efeito de massa. Os pacientes que alcançam
maior benefício são aqueles que apresentam grande efeito de massa. Neste sentido, a cirurgia
pode permitir que se ganhe tempo a fim de instituir outras formas de tratamento. Uma alternativa
interessante é a possibilidade de colocação de polímeros biodegradáveis embebidos em
carmustina, associados a um incremento na sobrevida global nos gliomas de alto grau recorrentes,
após a ressecção máxima do tumor 41. È importante estar atento para o fenômeno da pseudoprogressão (PsP), que em geral ocorre após o término da rádio e quimioterapia. Trata-se de um
tipo de toxicidade subaguda relacionada à terapia que consiste em alterações da RNM (aparecimento
ou aumento da captação de contraste e edema no sítio do tumor primário), acompanhado ou não
de deterioração clínica. O tempo de aparecimento para a PsP é de em geral até três meses do
término da radioterapia e não deve ser confundido com radionecrose que tende a ser mais tardio.
A despeito do quadro clínico ou radiológico sugerir progressão, estes pacientes se recuperam ou
estabilizam espontaneamente, em geral sem novos déficits neurológicos permanentes 42.
O emprego da radioterapia fica limitado pelo fato de que virtualmente todos os pacientes
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MA NUA IS D E CO ND UTAS
portadores de gliomas de alto grau já deverão ter sido submetidos à radioterapia no passado. A
reirradiação é mais complexa e potencialmente muito mais tóxica do que um tratamento inicial,
porém pode beneficiar pacientes selecionados.
Após a publicação do estudo de Stupp e colaboradores 19, praticamente todos os pacientes
recebem tratamento com temozolomida logo após o diagnóstico inicial de um glioblastoma. Do
ponto de vista do tratamento sistêmico, não há consenso ou evidências de nível I que definam a
estratégia ideal a ser adotada para paciente s nesta condição.
Quimioterapia com nitrosuréias produz taxas de respostas entre 8 a 27%. A temozolomida
mostrou-se superiora à procarbazina em estudo de fase II randomizado 43 em pacientes
previamente não expostos. Muito embora, a temozolomida não tenha se mostrado superiora ao
esquema PCV, em estudo de fase III 44, deve-se ressaltar que o grupo tratado com o esquema
convencional mostrou SLP superior ao PCV (5,0 versus 3,6 meses).
Em pacientes previamente expostos, Wick e colaboradores reportaram sua experiência
baseada na reintrodução da temozolomida como agente isolado em pacientes que já haviam
interrompido o tratamento há pelo menos oito semanas, com 57,9% dos pacientes portadores de
gliomas anaplásicos e 28,6% dos pacientes com glioblastoma ficando livres de progressão tumoral
em 6 meses 45. Outra estratégia que vem sendo estudada é a utilização da temozolomida em
regimes denominados de “dose densa”, ou seja, em esquemas protraídos com doses menores
diárias mantidas por períodos de tempo mais prolongados. Estudo canadense 46 utilizando esta
estratégia em gliomas malignos, observou atividade significativa gliomas anaplásicos e nos
glioblastomas recorrentes, naqueles pacientes que apresentavam progressão precocemente
(antes do término dos 6 meses iniciais), nos pacientes que progrediram após o término e
descontinuação do tratamento adjuvante. O esquema utilizado neste estudo foi 50 mg/m2 ao dia
continuamente.
Mais recentemente, a utilização de bevacizumabe isolado ou associado ao irinotecano
mostrou atividade importante principalmente em principalmente em glioblastomas47,48.
Vredenburgh et cols reportaram taxas de resposta tumoral de 57% e ausência de progressão
tumoral em 6 meses em 46%. Para este estudo a taxa de sobrevida global foi de 42 semanas.
Apenas um episódio de hemorragia intracraniana foi observado; fenômenos tromboembólicos
ocorreram em quatro pacientes. Apesar da atividade marcante observada com a combinação, ainda
não está clara qual a importância da associação com o irinotecano, que possui atividade bastante
discreta como agente isolado . Um estudo de fase II randomizado não comparativo utilizando o
bevacizumabe como agente isolado ou em associação ao irinotecano 49, mostrou taxas de sobrevida
livre de progressão (42,6 e 50,3%) e taxas de resposta tumoral (28.2% e 37.8%), ligeiramente
superiores com a combinação, mas taxas de sobrevida global similares (9,2 e 8,7 meses). Outro
estudo de fase II utilizando bevacizumabe como agente isolado mostrou que à progressão, a adição
do irinotecano não parece agregar benefício 50. Outras terapias “alvo específicas” têm sido estudadas
nestes últimos anos sem alcançar grande sucesso. O imatinibe, um inibidor de tirosina quinase
com atividade anti bcl, PDGFR e c-kit entre outros, foi utilizado em diferentes dosagens, associado
ou não a hidroxiuréia em diversos estudos. O resultado verificado nos estudosde fase III demonstrou
que a adição do imatinibe à hidroxiuréia não adiciona benefício 51. Avaliado em conjunto com estudos
de fase II, os resultados parecem sugerir que a droga talvez seja proporcione maior chance de
resposta aos pacientes mais jovens ou que estejam em uso de anticonvulsivantes, sugerindo que
talvez, a droga possa ser mais eficaz entre pacientes portadores de gliomas malignos secundários
que evoluíram a partir de um glioma de baixo grau, nos quais talvez em alguns subgrupos, a
ativação da via do PDGFR pode ter papel mais relevante tanto na gênese como na progressão da
doença 52,53,54.
Em conclusão, embora a escassez de evidências de melhor nível não permita emitir
recomendações melhor embasadas, nos parece razoável recomendar para os gliomas recorrentes,
especialmente os glioblastomas:
MANUAIS D E COND UTAS
| 369
• Ressecção cirúrgica nas situações supracitadas.
• Temozolomida no esquema clássico ou alternativamente em esquemas doses densos ou
metronômicos em pacientes que não foram expostos previamente à droga ou para pacientes que
“progrediram” precocemente e tiveram a medicação descontinuada, ou ainda para pacientes que
concluiram o esquema padrão e tieveram um período livre de tratamento antes da progressão.
• Associação de bevacizumabe e irinotecano para pacientes com glioblastomas recorrentes ou
progressivos durante ou após o tratamento padrão e nos quais a expectativa de benefício ao
retratamento com a temozolomida ou outras drogas seja muito baixa.
• Esquemas baseados em nitrosuréias (lomustina, carmustina ou a associação lomustina,
procarbazina e vincristina) em situações nas quais não haja disponibilidade dos esquemas citados
acima.
• A decisão de se reirradiar deve ser individualizada e decidida de preferência em contexto
multidisciplinar, envolvendo também o cirurgião e o oncologista ou neuro-oncologista envolvidos
no caso.
• A inclusão de pacientes portadores de gliomas malignos graus III e IV em estudos clínicos,
quando disponíveis atualmente parece ser a melhor alternativa.
20.3. Gliomas de Baixo Grau
Os gliomas de baixo grau mais comuns são os astrocitomas difusos, oligodendrogliomas e
oligoastrocitomas. Juntos, estes gliomas, que são classificados pela OMS como de grau II,
representam aproximadamente 20% dos gliomas. Têm comportamento indolente, porém, com o
passar do tempo tendem a progredir, transformando-se em gliomas de alto grau, os quais, por sua
vez, são uniformemente fatais. A maior parte dos pacientes apresenta história de convulsões,
cefaléia e ocasionalmente sintomas localizatórios. Habitualmente os sintomas estão presentes por
6 a 18 meses, antecedendo o diagnóstico definitivo. Caracteristicamente, estes tumores não
apresentam contrastação e têm aparência hipoatenuante tanto no exame de CT quanto de RNM.
Características clínicas associadas a pior prognóstico incluem idade superior a 40 anos, grande
extensão e presença de déficits neurológicos antecedendo a cirurgia. Pacientes que não
apresentam estas características podem chegar a ter sobrevida mediana próxima de 10 anos, ao
passo que pacientes portadores de características adversas podem ter sobrevida mediana
semelhante à de um glioma de alto grau de malignidade 55.
Princípios da cirurgia
Muito embora a cirurgia constitua parte integrante da estratégia de manejo dos pacientes
portadores de gliomas de baixo grau, existe considerável controvérsia envolvendo a determinação
do momento ideal de sua realização, bem como de sua extensão, discutindo-se qual o impacto da
cirurgia na história natural destas neoplasias.
A cirurgia é essencial para a determinação do diagnóstico histológico destes tumores,
devendo proporcionar material adequado à correta determinação do tipo histológico e grau do
tumor. A obtenção de pequena quantidade de tecido, ocasionalmente inevitável, especialmente
em lesões localizadas profundamente ou em áreas eloquentes pode levar a um diagnóstico
incorreto, pois estes tumores frequentemente são heterogêneos, com áreas distintas exibindo
graus distintos de celularidade, mitoses ou necrose que podem induzir o patologista a um
diagnóstico equivocado 7.
A extensão ideal da ressecção dos gliomas de baixo grau constitui ainda hoje um tópico sujeito
a considerável controvérsia. A maior parte dos estudos que discute esta questão é de natureza
retrospectiva e sugere um benefício de sobrevida associado á ressecção agressiva. Entretanto, a
370 |
MA NUA IS D E CO ND UTAS
natureza infiltrativa destas lesões, assim como a possibilidade de proximidade ou presença do
tumor junto à área cerebral eloqüente limita a possibilidade de ressecções extensas. Consequentemente, alguns neurocirurgiões defendem a simples realização de biópsia esterotáxica. Não há
dados de estudos prospectivos e aleatorizados que permitam a resolução desta controvérsia.
Por outro lado, o desenvolvimento tecnológico ligado à neurocirurgia vem permitindo
frequentemente a ressecção segura destes tumores. Consequentemente, grande parte dos
neurocirurgiões limita a utilização de biópsias estereotáxicas a lesões difusas com extensão para
o tronco cerebral ou confinada a áreas cerebrais eloqüentes. Há evidências sugerindo que as
ressecções radicais colaboram para melhor controle sintomático, especialmente das crises
convulsivas 7, 56.
Diversas séries retrospectivas discutem a importância da extensão da ressecção tumoral e
sua relação com a evolução dos pacientes. Revisão extensa da literatura neurocirúrgica 57 mostra
existir uma tendência, entre as séries mais recentes, a dar suporte às ressecções mais extensas.
Consequentemente, grande parte dos especialistas acredita que sempre que possível e segura, as
ressecções extensas devem ter preferência sobre as biópsias estereotáxicas, especialmente em
pacientes portadores de massas grandes que determinem déficits funcionais.
Princípios da radioterapia
Não há consenso quanto ao momento ideal de utilizar-se radioterapia no tratamento dos
gliomas de baixo grau. Três estudos randomizado trazem informações importantes a respeito de
questões envolvendo o tratamento radioterápico:
• Dose da radioterapia:
Os estudos EORTC 22844 58 e NCCTG/RTOG/ECOG 59 compararam, em estudos prospectivos e
aleatorizados, doses distintas de radioterapia. Nos dois estudos não se verificou benefício em
utilizar doses mais elevadas de irradiação, ocorrendo inclusive maior incidência de neurotoxicidade
ente os pacientes tratados com doses mais elevadas de irradiação. Consequentemente, as doses
consideradas padrão atualmente variam de 50 a 54Gy, administradas em frações de 1,8Gy.
• Momento ideal de iniciar o tratamento radioterápico:
Existe considerável controvérsia quanto ao momento ideal de utilizarmos a radioterapia.
Alguns especialistas advogam a indicação do tratamento no momento do diagnóstico enquanto
outros sugerem que se deva aguardar até a progressão da doença. O EORTC conduziu um estudo
avaliando esta questão. Neste estudo os pacientes foram alocados para receberem radioterapia
pós-operatória imediata (54Gy administrados dentro das primeiras 8 semanas da cirurgia) ou
apenas na progressão de doença 60. Com um seguimento mediano de cinco anos, a proporção de
pacientes livres de progressão em cinco anos favoreceu o grupo que recebeu radioterapia imediata
(44% versus 37%, P=0,02). Entretanto a sobrevida global em cinco anos foi idêntica nos dois grupos
(63% versus 66%), indicando que a radioterapia pós-operatória imediata pode não ser necessária
para todos os pacientes. Críticas a este estudo incluem o fato de que grande parte os pacientes foi
acompanhada exclusivamente com tomografias e não com RNM, além da ausência de avaliação
neurocognitiva ou de qualidade de vida.
Por outro lado, ao contrário do que se esperava, a radioterapia precoce não contribuiu para
o aumento de transformação para glioma de alto grau. O controle de crises convulsivas foi superior
entre os pacientes que receberam tratamento radioterápico. Com base no resultado deste estudo,
os autores sugerem que a radioterapia pós-operatória imediata deva ser considerada para
pacientes sintomáticos e portadores de lesões residuais volumosas.
Por outro lado, a preocupação ligada à possível deterioração neurocognitiva ligada ao
emprego da radioterapia e ao fato de que o adiamento da radioterapia não afetou a sobrevida dos
MANUAIS D E COND UTAS
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pacientes vem estimulando os radioterapeutas a adotarem conduta expectante em pacientes mais
jovens, com idade inferior a 40 anos ou que tenham submetidos à ressecção tumoral máxima.
Quando administrada, a radioterapia deve incluir o tumor acrescido de uma margem de 2
centímetros, administrando 54Gy com frações diárias de 1,8Gy.
Princípios da Quimioterapia
Atualmente, a quimioterapia não é utilizada no tratamento inicial dos pacientes portadores
de gliomas de baixo grau, sobretudo quando se consegue realizar ressecção máxima. A quimioterapia
fica reservada para os casos de recorrência, progressão radiológica ou transformação para glioma
de alto grau. Entretanto, pacientes portadores de oligodendrogliomas portado a codeleção de
1p/19q podem constituir uma exceção a esta regra. Entretanto deve-se frisar que a codeleção é
um marcador prognóstico, porém seu valor preditivo ainda é motivo de controvérsia. Diversos
estudos retrospectivos de fase II sugerem que pacientes portadores de oligodendrogliomas podem
responder bem a quimioterapia. Entretanto, estes estudos devem ser vistos com cautela em função
da heterogeneidade dos pacientes incluídos nestas análises 61,62,63,64. O estudo de fase III RTOG 9802,
cuja análise final foi apresentada recentemente, sugere nos pacientes considerados de alto risco,
que a adição do esquema PCV após a radioterapia pode incrementar a sobrevida global nos
pacientes que se mantiveram vivos após dois anos do tratamento. Aguarda-se ansiosamente a
publicação do estudo 65.
Estudos de fase II publicados procuraram avaliar o papel da temozolomida no tratamento
dos gliomas de baixo grau 66,67,68,69,70. Analisados em conjunto, embora apresentem importantes
diferenças no que diz respeito aos critérios de inclusão utilizados em cada um deles, torna-se claro
que a temozolomida é ativa no tratamento destes tumores, podendo ser empregada nos casos em
que ocorre progressão clínica ou radiológica do tumor
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Capítulo 21
Tumores Neuroendócrinos
Editora: Dra. Rachel Simões Pimenta Riechelmann
Autores:
Tumores Neuroendócrinos - Dra. Rachel Simões Pimenta Riechelmann
Tumores Neuroendócrinos Pancreáticos - Dra. Aline Chaves Andrade e Dra. Rachel Simões
Pimenta Riechelmann
Tumores Carcinoides - Dr. Bruno dos Santos Vilhena Pereira e Dr. Riad Younes
Carcinomas neuroendócrinos pouco diferenciados extrapulmonares - Dr. Rui Fernando
Weschenfelder
Carcinoma Medular de Tireoide Esporádico - Dr. Duílio Reis da Rocha Filho e Dra. Ana Amélia
Oliveira Hoff
Carcinoma da Adrenal, Feocromocitoma e Paraganglioma - Dra. Ana Carolina Guimarães de Castro
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Capítulo 21
Tumores Neuroendócrinos
21.1.Introdução
Os tumores neuroendócrinos (TNE) são neoplasias raras, que se originam de células
endócrinas localizadas em diferentes órgãos. Constituem uma família grande de tumores, que,
apesar de terem várias características morfológicas, imunoistoquímicas (IHQ) e laboratoriais
semelhantes, também diferem quanto a sua biologia e comportamento clínico. A família TNE inclui
os tumores carcinoides (gastrointestinais e pulmonares), TNE pancreáticos, carcinoma adrenal,
feocromocitoma e paraganglioma, tumores hipofisários e carcinoma medular da tireoide (produtor
de calcitonina). Ainda que a maioria seja esporádica, os TNE podem estar associados a síndromes
hereditárias como a Neoplasias Endócrinas Múltiplas (tipos 1 e 2), Síndrome de Von-Hippel Lindau,
Neurofibromatose e Síndrome da Esclerose Tuberosa. Os TNE mais comuns são representados pelos
tumores carcinoides (gastrointestinais) e TNE pancreáticos.
Existem vários sistemas de classificação distintos, podendo agrupar os TNE em: TNE funcionantes
ou não-funcionantes (dependendo da produção de aminas e hormônios que causem sintomas); de
acordo com origem embriológica do sítio primário (intestino anterior, médio e posterior) e quanto
ao grau de diferenciação. Esta última é uma das mais relevantes clinicamente porque o grau de
diferenciação parece predizer o tratamento e o prognóstico dos pacientes com TNE. A classificação
histopatológica permite subdividir a doença em graus baixo, intermediário e alto.
De maneira geral, o estadiamento TNM segue aquele do órgão de origem, em analogia aos
adenocarcinomas ou carcinomas, levando-se em conta o grau de diferenciação. Não há uma
padronização de estadiamento, podendo-se utilizar a classificação da Organização Mundial de
Sáude (OMS), o American Joint Committee on Cancer (AJCC), em associação com a do grupo europeu de
TNE (ENETS). Ainda que não saibamos o real impacto prognóstico destes estadiamentos, recomendase a classificação do pacientes com TNE em três grupos de acordo com a histopatologia (OMS).
Grupo de risco Grau de diferenciação
Baixo risco
<10 mitoses por campo ou ki-67 <3%
Tumor neuroendócrino bem diferenciado
Intermediário
10 a 20 mitoses por campo ou ki-67 3 a 20%
Carcinoma neuroendócrino bem diferenciado
Alto risco
>20 mitoses por campo ou ki-67 >20%
Carcinoma neuroendócrino pouco diferenciado (células pequenas ou grandes)
De maneira geral, quanto maior o grau histológico e ki-67 (avaliado pela percentagem de
células tumorais que expressam este marcador em imunoistoquímica), pior é o prognóstico.
Muito provavelmente, devido ao maior acesso à saúde e qualidade das técnicas diagnósticas,
temos observado um aumento da incidência de TNE no mundo. No Brasil, não temos dados
epidemiológicos precisos. Dados de outras populações mostram que boa parte dos TNE é
diagnosticada tardiamente, e comumente, vários anos após início dos sintomas. Nesta situação,
muitos pacientes apresentam doença avançada, não sendo mais passíveis de cura. Portanto, a
suspeita clínica é fundamental para o diagnóstico precoce. Uma vez feito o diagnóstico, o tratamento
dos TNE em centros especializados e com equipe multidisciplinar é altamente recomendado.
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A seguir, descrevemos os grupos de TNE que fazem parte da população sob os cuidados do
oncologista clínico.
21.2. Tumores Neuroendócrinos Pancreáticos
Tumores neuroendócrinos pancreáticos (pTNE) são pouco frequentes com cerca 200 a 1.000
novos casos ano e somente 1,5% de achados de necropsia, segundo literatura internacional. Podem
se manifestar como síndromes clássicas secundárias a liberação hormonal, como o insulinoma,
gastrinoma (os dois mais comuns), Vipoma ou glucagonoma. Porém, cerca de metade é do tipo
não-funcionante, ou seja, não secretam peptídeos que causem sintomas. Nestes casos, os sintomas
são relacionados ao volume tumoral local ou disseminação. Cerca de 50% a 60% já se apresenta
doença metastática ao diagnostico inicial. Os pTNE podem ser esporádicos ou podem estar
associados a síndromes genéticas como a neoplasia endócrina tipo I, Von Hippel-Lindau,
neurofibromatose tipo 1 e síndrome da esclerose tuberosa .
Os pNET também podem ser classificados quanto a diferenciação (proposta pela Organização
Mundial de Saúde), em tumores G1, G2 ou G3, sendo G1 tumores bem diferenciados e G3, pouco
diferenciados. O prognóstico depende principalmente do estádio inicial e grau de diferenciação/ki67, onde a sobrevida mediana de pacientes com doença metastática variando de aproximadamente
24 a 30 meses para os tumores G1 e G2, até 8 a 10 meses, para os tumores G3. Neste capítulo,
focaremos nos tumores G1 e G2 apenas.
21.2.1. Diagnóstico
Clínico-Laboratorial
O diagnóstico dos pTNE costuma ser tardio, especialmente no tipo não-funcionante, devido
a evolução relativamente indolente destes tumores, quando comparados com os adenocarcinomas
de pâncreas. Nos casos de tumores funcionantes, o quadro clínico depende do tipo hormonal
secretado pelo tumor. Os gastrinomas ou a síndrome de Zollinger-Ellison (TNE produtores de
gastrina) caracterizam–se pela hipersecreção gástrica ácida associada a aumento da incidência de
ulceras gástricas, duodenais e jejunais. Diarreia pode ser secúndaria a hipergastrinemia que acelera
o trânsito intestinal, ou também pela baixa ativação das enzimas pancreáticas, cuja ação enzimática
depende do pH básico. A Tabela 1 resume as principais características clínicas dos pNET.
O diagnóstico laboratorial pode ser feito pela dosagem dos hormônios específicos (Tabela 1)
e cromog
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