potencial toxicológico de medicamento de venda livre

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FACIDER Revista Científica
ISSN 2316-5081
POTENCIAL TOXICOLÓGICO DE MEDICAMENTO DE VENDA
LIVRE: ÊNFASE NO PARACETAMOL
DANIELE REFATTI TERRES¹
¹Faculdade de Colider – FACIDER, Av. Senador Júlio Campos, 1039 – Setor Leste, Colider, Centro – MT, 78.500-000.
E-mail: [email protected]
RESUMO: O paracetamol pertence à classe dos analgésicos e antipiréticos, é muito utilizado nos
dias de hoje. É considerado um medicamento de venda livre, por isso se faz necessário a orientação
do profissional farmacêutico. Foi realizado um estudo de revisão bibliográfica, com objetivo de
descrever os efeitos toxicológicos do uso indiscriminado do paracetamol e enfatizar a importância do
profissional farmacêutico no direcionamento do uso racional do mesmo, apontando os sintomas,
diagnóstico e tratamento da sua intoxicação. Esse medicamento, em doses corretas é eficaz e
seguro, mas precisa de cuidados quanto à dose a ser administrada. Quando o cliente não é orientado
de forma adequada sobre sua posologia pode ocorrer o uso de uma dose elevada, podendo levar a
intoxicação, que apresenta inicialmente sintomas como leve mal estar, vômitos e dor abdominal. O
uso prolongado desta alta dose origina uma hepatotoxicidade causando falência hepática,
insuficiência renal e outras complicações, podendo levar a óbito. O tratamento é feito por lavagem
gástrica, carvão ativado e pelo antidoto N – acetilcisteina.
PALAVRAS-CHAVE: PARACETAMOL, INTOXICAÇÃO, INSUFICIENCIA HEPATICA AGUDA.
ABSTRACT: Paracetamol belongs to the painkillers and antipyretics group, it’s widely used
nowadays. It’s considered a counter medicine; therefore it’s necessary to be oriented by a
pharmaceutical professional. It was done a literature review study aiming to describe the toxicological
effects of paracetamol misuse and emphasize the pharmaceutical professional importance to direct its
correct use. Showing the symptoms, diagnostic and treatment of its intoxication. This medicine in
correct doses is effective and safe but it is necessary care on the doses to be administrated. When the
client isn’t correctly oriented on the doses may occur the use of a higher dose, which might lead to an
intoxication, the initially symptoms can be malaise, vomit and abdominal pain. The longstanding use of
this high dose results in a hepatotoxicity, causing liver failure, kidney failure and other complications,
being able to lead to death. The treatment is done by a gastric lavage, activated charcoal and by the
antidote N – acetylcysteine.
KEYWORDS: PARACETAMOL, INTOXICATION, ACUTE LIVER FAILURE
_____________________________________________________________________________________________________
1. INTRODUÇÃO
Os
medicamentos
de
venda
livre
são
conhecidos
também
como
Medicamentos Isentos de Prescrição (MIPs), ou também “over the counter”, que
significa, “sobre o balcão”. Estes são os medicamentos de primeira escolha da
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população para os problemas de saúde. Entretanto é necessário que haja a
orientação do profissional farmacêutico sobre a posologia adequada para o cliente,
uma vez que administrado o medicamento de maneira irracional pode haver danos à
saúde do mesmo, ocasionando possíveis intoxicações, hospitalizações e óbito
(PINTO et al., 2015).
A Resolução da ANVISA RDC Nº 41 de 26 de julho de 2012 determina que os
medicamentos isentos de prescrição possam permanecer ao alcance dos clientes
nas gondolas em farmácias e drogarias de todo o país (BRASIL, 2012). Na área
designada para os MIPs, devem ser colocados cartazes com a orientação seguinte:
“Medicamentos podem causar efeitos indesejados, evite a automedicação: informese com o farmacêutico” (PINTO et al., 2015).
De acordo com Pinto et al (2015), o farmacêutico é o profissional que possui o
conhecimento cientifico para orientar o cliente sobre o uso racional de
medicamentos, incluindo o paracetamol, seja através de palestras ou reuniões em
âmbito público ou privado.
O paracetamol, também conhecido como Acetaminofem®, derivado do paminofenol, é o metabolito ativo da fenacetina, responsável pelo efeito analgésico do
composto (JUNIOR, DUTRA e FRITZEN, 2013).
Esse composto pertence à classe dos analgésicos e antipiréticos, tendo uma
media ação analgésica e alta ação antipirética. É muito utilizado atualmente, sendo
de venda livre (LOPES e MATHEUS, 2012). É um medicamento que se encaixa
também como anti-inflamatório, na classe dos AINEs (anti-inflamatório não
esteroidais), porém tem baixa ação anti-inflamatória (ARAÚJO, BITTENCOURT e
BRITO, 2013). Tem o mecanismo de ação que inibe a ciclo-oxigenase 2 (COX – 2),
e possui menos efeitos adversos sobre o trato gastrintestinal (LOPES e MATHEUS,
2012). Pode ser administrado tanto em neonatos, crianças como em adultos. É um
medicamento
não
opióide,
portanto
não
causa
dependência
(ARAÚJO,
BITTENCOURT e BRITO, 2013). É indicado para alivio de dores leve à moderada,
como cefaleia e mialgia (KATZUNG, 2010).
Von Mering foi quem prescreveu o paracetamol pela primeira vez na medicina
em 1893 (GOODMANN e GILMAN, 2010). Na década de 1950 Brodie e Axelrod
estudaram a substância, desde então, o paracetamol passou a ser conhecido
popularmente (SANTOS, 2014). Em 1955 foi registrado com o nome de Tylenol®, já
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em 1956 foi registrado o Panadol®, que era vendido em comprimidos com 500 mg.
Em 1958 foi comercializado o Elixir Panadol®, que era uma formulação infantil e em
1963 foi adicionado a Farmacopeia Britânica (ARAÚJO, BITTENCOURT e BRITO,
2013).
Quanto a dose, é indicado a ingestão máxima de 4000 mg/dia com
administração em intervalo de quatro a seis horas em adultos acima de 12 anos e a
duração do tratamento depende da patologia existente (LANDIM, 2013),
e para
crianças o tratamento é de dois a três dias intercalando com outros medicamentos
para mesma finalidade terapêutica (BUCARETCHI et al., 2013).
O paracetamol é administrado por via oral, podendo ser encontrado em
formulação sólida como as capsulas, drágeas, pastilhas e comprimidos. Também em
formulação líquida como em gotas e xarope (LOPES e MATHEUS, 2012).
Esse fácil acesso da população com o medicamento e a falta de
conhecimento sobre a toxicidade do produto, deixa o cliente suscetível à intoxicação
por alta dosagem, podendo causar a principio sintomas como náuseas, vômitos,
sudorese intensa e icterícia. O uso prolongado pode acometer o fígado com
insuficiência hepática aguda (IHA) e os rins com insuficiência renal, levando até ao
óbito (MEIRA et al., 2013).
Segundo estudos a IHA é causada, em 50% dos casos, pela hepatotoxicidade
proveniente de fármacos, incluindo o paracetamol. Nos Estados Unidos a
intoxicação por paracetamol é a causa mais frequente de IHA (ALBERTO,
FIGUEIREDO e DEUS, 2009). A IHA é uma síndrome potencialmente reversível,
caracterizada por um rápido desgaste da função hepática em consequência de uma
lesão hepatocelular. A característica principal que define a IHA é a manifestação de
coagulopatia e encefalopatia (SANTOS, 2012).
“[...] O pico de concentração plasmática ocorre entre 15 minutos e 2 horas,
dependendo da formulação [...]” (OGA, CAMARGO e BATISTUZZO, 2008, p. 544 e
545).
O paracetamol é quase que completamente absorvido no trato digestivo
(OGA, CAMAEGO e BATISTUZZO, 2008), sendo metabolizado pelo fígado (MEIRA
et al., 2013). A biotransformação ocorre por três mecanismos: a conjugação com o
acido glicurônico, a sultafação e a oxidação (SEBBEM et al., 2010).
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O paracetamol desenvolve lesão hepática através de seu metabólito
intermediário, resultante da biotransformação hepática. Na biotransformação
desse fármaco, uma pequena parte da dose, após N – hidroxilação mediada
pelo citocromo P-450, dá origem ao N-acetil-benzoquinonaimina, que é
altamente reativo. Normalmente, este metabólito reage com o grupamento
sulfidril da glutationa e é excretado como mercapturato. No entanto, após o
uso de altas doses de paracetamol, ocorre saturação nas reações de
conjugação com ácido glicurônico e sulfato, fazendo com que este
metabólito, ao consumir cerca de 70% de glutationa hepática, possa reagir
com as proteínas hepáticas, através de ligação covalente, levando à
necrose hepática. (OGA, CAMARGO e BATISTUZZO, 2008, p. 545).
O diagnóstico da intoxicação é feito pelo método do nomograma de RumackMatthew, que estima o tempo da ingestão e a concentração do fármaco no paciente,
onde se avalia também o risco da hepatotoxicidade (SEBBEM et al., 2010). É
realizado exames de bioquímica, utilizando o soro do sangue (OGA, CAMAEGO e
BATISTUZZO, 2008), esses exames são AST (Aspartato aminotransferase) e ALT
(alanina aminotransferase), são indicados para observar se as enzimas hepáticas
estão alteradas (BARBOSA, 2013).
O tratamento é feito pelo antídoto N-acetilcisteína (BUCARETCHI et al.,
2013), e se a ingestão foi inferior a quatro horas, antes de se administrar Nacetilcisteína se deve administrar carvão ativado, 1g/Kg (ALBERTO, FIGUEIREDO e
DEUS, 2009). Contudo, pela falta de conhecimento da população, é necessário que
o profissional farmacêutico, no ato da venda, oriente seu cliente sobre como utilizar
de maneira correta este medicamento sem danos à saúde do mesmo (LOPES e
MATHEUS, 2012).
Desta forma, o presente trabalho tem por objetivo descrever os efeitos
toxicológicos do uso indiscriminado do paracetamol e enfatizar a importância do
profissional farmacêutico no direcionamento do uso racional do mesmo, apontando
os sintomas, diagnóstico e tratamento da sua intoxicação.
2. METODOLOGIA
Tratou-se de um estudo de levantamento bibliográfico de revisão, com o
intuito de descrever os efeitos toxicológicos do uso indiscriminado do Paracetamol.
Foram utilizadas algumas fontes bibliográficas, tais como artigos, monografias, livros
de farmacológica e toxicologia. Foram encontrados 46 trabalhos, dos quais somente
25 foram utilizados. Os demais foram excluídos por não estarem em consonância
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com o objetivo deste trabalho. A seleção bibliográfica teve como enfoque o uso das
palavras-chave Paracetamol, intoxicação e insuficiência hepática aguda.
3. DESENVOLVIMENTO
3.1 Contexto histórico
Em 1886 usava-se o composto chamado Acetanilida, indicada para alivio da
febre, foi descoberta por Cahn e Hepp, era comercializado com o nome de
Antifebrina®, entretanto começou a apresentar uma alta toxicidade e alguns de seus
derivados passaram a ser estudados. A Fenacetina, então derivada da Acetanilida,
foi mais aceitável e em 1887 sua formulação foi empregada em varias misturas
analgésica. Já na década de 1980 a fenacetina foi retirada do mercado por ser
implicada na gênese da nefropatia. Von Mering, em 1893, foi quem usou o
paracetamol pela primeira vez na medicina (GOODMANN e GILMAN, 2010).
Na década de 1950, Brodie e Axelrod identificaram o paracetamol como
principio ativo da Acetanilida e da Fenacetina, desde então este medicamento ficou
conhecido popularmente (SANTOS, 2014).
3.2 Indicações do paracetamol e posologia
O paracetamol é indicado como analgésico e antipirético, e possui efeito antiinflamatório, porém é muito fraco. É indicado para alivio da dor em paciente com
osteoartrite não inflamatória (GOODMAN e GILMAN, 2010), para alivio de cefaleia
tensional, dor dental e outras dores de intensidade leve a moderada, além da
indicação para tratamento de dor oncológica (FUCHS, WANNMACHER e
FERREIRA, 2006).
Embora seja considerado um anti-inflamatório fraco, apresenta bons
resultados em situações restritas, como inflamação após extração dentária.
“Demonstrou-se que o paracetamol inibe a biossíntese de prostaglandinas em
algumas condições experimentais (p. ex., durante a febre), mas não em outras”
(RANG et al., 2011, p. 319).
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A posologia do paracetamol varia de 40 a 500 mg em intervalos de quatro a
seis horas, dependendo da idade do cliente. Para recém-nascidos até três meses é
indicado a administração de 40 mg/dose, em adultos acima de 11 anos é indicado a
administração de 500 mg/dose (FUCHS, WANNMACHER e FERREIRA, 2006).
3.3 Estrutura e atividade
As enzimas COX são sensíveis em ambiente de oxidação, por isso é
necessário um agente redutor ou oxidante para converter a COX da forma ativa
(Fe4+) para a forma inativa (Fe3+). Por sua vez o fenol tem ação redutora, e o
paracetamol
(p-aminofenol), funciona como o
agente redutor. Portanto
o
paracetamol (figura 1) inibe seletivamente a COX nas células em que os níveis de
ácido araquidônicos são baixos, pois inibe a síntese das prostaglandinas, explicando
assim sua baixa ação anti-inflamatória (SANTOS, 2014).
Figura 1 - Estrutura química do paracetamol. Fonte: SANTOS, 2012.
Quanto ao efeito analgésico do composto, este pode estar relacionado na
ativação indireta dos receptores canabinóides do tipo 1 (CB1). Levando em
consideração que o paracetamol por si só se liga a esses receptores. O paracetamol
então é desacetilado formando uma amina primaria que vai sofrer conjugação com o
ácido araquidonico através da ação de enzimas, formando metabolitos, os quais
ativam indiretamente os receptores CB1, que aumentam a biodisponibilidade desse
composto na fenda sináptica para que se ligar a mais receptores, produzindo uma
maior analgesia (SANTOS, 2014).
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3.4 Propriedades farmacológicas
O paracetamol, também conhecido como Acetaminofem® nos Estados
Unidos, pertence à classe dos analgésico e antipirético. Possui ação antipirética alta,
analgésica media e anti-inflamatória baixa. É um dos medicamentos populares mais
seguro quando administrado em doses terapêuticas recomendadas (GUIMARÃES,
SOARES e CARVALHO, 2015).
Atualmente o paracetamol é o analgésico mais utilizado em pediatria
(SEBBEN et al., 2010). Sua absorção ocorre no trato gastrointestinal, e alcança o
pico plasmático após 40 a 60 minutos se administrado em formulação solida e de 30
minutos se for administrado em formulação líquida. A biodisponibilidade é
considerada boa, cerca de 60% a 95%. A ligação com proteína plasmática é de 10%
a 30% e em caso de altas doses pode chegar a 50%. Apresenta também
capacidade de atravessar a barreira placentária e hemato-encefálica. A eliminação é
renal (LOPES e MATHEUS, 2012).
A variação da biodisponibilidade e o tempo para atingir a c oncentração
plasmática máxima dependem da via de administração deste medicamento. Na via
endovenosa o processo de absorção é rápido, atinge a concentração plasmática
máxima em 15 minutos e a biodisponibilidade é excelente. Se a administração for
por via oral, na forma de comprimidos, o tempo varia de 45 a 60 minutos, porem na
forma de gotas ou xarope o tempo de concentração plasmática máxima ocorre em
30 minutos e a biodisponibilidade por essa via é considerada boa. Já administração
por via retal tem a biodisponibilidade imprevisível, pois o tempo decorrido entre a
administração do supositório e a absorção do mesmo é um fator que dificulta a
dosagem por essa via. O tempo para atingir a concentração plasmática máxima
varia de duas a quatro horas (SANTOS, 2014).
De
acordo com
Santos
(2014),
devido
os
fármacos
apresentarem
propriedades lipofílicas, as quais permitem sua passagem através das membranas
biológicas e a sua difusão até o sitio de ação, acaba dificultando sua excreção.
Portanto para que ocorra essa eliminação do organismo e seja concluída sua
atividade terapêutica, é necessário que esses fármacos sejam metabolizados em
compostos mais hidrofílicos. “Como regra geral, as reações de biotransformação
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geram metabolitos mais polares e inativos que são mais facilmente excretados.
Contudo, em alguns casos, geram-se metabolitos ativos, alguns com propriedades
tóxicas” (SANTOS, 2014).
A biotransformação é via hepática, ocorrendo por meio de três mecanismos: A
conjugação com o acido glicurônico é de 40% a 67%, ocorre por meio da ação da
glicuroniltransferase. A sulfatação é de 20% a 46%, reação mediada pela ação da
sulfotransferase. E a oxidação que é de 5% a 15%, ocorre por ação das enzimas do
citocromo P450 (CYP450). Os dois primeiros mecanismos, a conjugação e a
sulfatação, normalmente produzem metabolitos que não são tóxicos e são
excretados pela urina. Porem a oxidação é capaz de produzir um metabolito tóxico
conhecido como NAPQI (N-acetil-p-benzo-quinonaimina) que quando o paracetamol
é administrado em doses terapêuticas habituais, se liga com a glutationa e formam
conjugados não tóxicos. Quando ocorre a depleção da glutationa, como nos casos
de altas doses de paracetamol, alcoolismo e má nutrição, ocorrem então um
acumulo do metabolito de NAPQI, que se liga covalentemente com as moléculas
hepáticas, gerando a lesão do tecido hepático (GUIMARÃES, SOARES e
CARVALHO, 2015).
3.5 Mecanismos de ação do paracetamol
O mecanismo de ação exato do paracetamol ainda não é conhecido, pois há
evidências de diferentes mecanismos centrais, entre eles os efeitos na produção de
prostaglandinas e na neurotransmissão serotonérgica. Há relatos também nas vias
do oxido nítrico e em canabinóides (GUILOSKI, 2014).
Segundo Queiroz et al (2013), o paracetamol é um analgésico não opióide,
que possui propriedade antipirética. O mecanismo de ação dos analgésicos se
baseia na inibição da síntese de prostaglandinas, que são responsáveis por dores
leves e moderadas, também pela vasodilatação local e pelo aumento da
permeabilidade vascular. O mecanismo de ação do paracetamol se baseia na
ativação indireta de receptores CB1 do sistema canabidioide, um sistema de
neurotransmissores ligados a alterações emocionais, dor e hipertermia.
A temperatura corporal é controlada pelo hipotálamo, que controla o equilíbrio
entre perda e produção de calor. Ocorre a febre quando há um desequilíbrio
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termostático no hipotálamo. O paracetamol, como antipirético, atua na inibição da
produção das prostaglandinas no hipotálamo (RANG et al., 2007).
O paracetamol, também classificado como AINE, age inibindo seletivamente a
COX - 2. Porem algumas bibliografias relatam a hipótese de uma isoforma, a COX 3, estar ligada em seu mecanismo de ação. Deste modo, impede que o ácido
araquidônico seja convertido em prostaglandinas, envolvido no processo inflamatório
(BARBOSA, 2013).
3.6 Fígado
Segundo Flexa e Silva (2012), o fígado é considerado o maior e mais pesado
dos órgãos internos, sendo também o mais versátil e vascularizado, apresentando
funções endócrinas e exócrinas. Os hepatócitos, que são as células do fígado,
realizam a desintoxicação do organismo, transformando substâncias nocivas em
metabolitos não tóxicos, que são excretados pela bile. O fígado é responsável pelo
metabolismo de carboidrato, lipídeo, proteína e armazenamento de glicogênio, ferro
e vitaminas.
Conforme Santos e Moraes (2014), o fígado possui grande fluxo sanguíneo e
pouca resistência vascular, onde 1,350 mililitros de sangue fluem a cada minuto. O
fígado possui 50 a 100 mil lóbulos individuais, sendo construídos em torno de uma
veia central que drena para as veias hepáticas em seguida para a veia cava.
Por possuir grande importância na manutenção da homeostasia do corpo, se
houver uma lesão nele, pode gerar diversos problemas como a cirrose, a qual é
responsável por perda de parte do tecido, contudo, o fígado tem grande capacidade
de regeneração (SANTOS e MORAES, 2014).
Dentre as funções do fígado, está a metabolização, possuindo vários
mecanismos de processamento e sintetização de substancias e as transportando
para outras extensões do corpo. Os medicamentos são então metabolizados no
reticulo endoplasmático das células hepáticas, onde se encontram enzimas
microssômais,
estas
são responsáveis
pela metabolização
do
mesmo. A
metabolização de substâncias ocorre por duas etapas, a primeira etapa ocorre
oxidação, reduzindo a substância. Já a segunda etapa envolve junção com outra
molécula, para deixar a substância mais hidrossolúvel. Esta etapa envolve também
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os processos de glicuronidação, sulfatação, conjugação com a glutationa, acetilação
e a metilação. Um dos motivos da intoxicação é quando ocorre a diminuição
significativa da glutationa, isso ocorre por um acumulo de produtos oxidados ou por
substâncias químicas tóxicas (SANTOS e MORAES, 2014).
3.7 Hepatotoxicidade
O paracetamol, de modo geral, é considerado um fármaco seguro. No
entanto, em casos da administração de altas doses, pode causar hepatotoxicidade.
Existem dois métodos de intoxicação, uma acidental outra intencional. A
hepatotoxicidade acidental ocorre devido à ingestão de doses tóxicas de
paracetamol com finalidade curativa. Já a hepatotoxicidade intencional é quando o
individuo tenta o suicídio utilizando uma alta dosagem do paracetamol, gerando IHA,
insuficiência renal e falência de vários órgãos. Quando o paracetamol é utilizado em
doses corretas, a quantidade de NAPQI formada é inativada pela conjugação com
Glutationa, entretanto quando utilizado altas doses, o metabolismo e a excreção
sofrem alterações. Em adultos a administração de 15g de paracetamol leva á
saturação das vias do acido glicurônico e sulfatação hepática, assim a produção de
NAPQI é aumentada. A depleção da Glutationa acima de 70% favorece o acumulo
deste metabolito, levando a um processo irreversível de lesão hepática (SANTOS,
2014).
O CYP450 se localiza no reticulo endoplasmático hepático, o subtipo
envolvido na biotransformação do paracetamol é o CYP2E1 (BARBOSA, 2013). As
isoenzimas do sistema CYP450 são responsáveis pela oxidação do paracetamol,
que resultara na formação do metabolito NAPQI (SANTOS, 2014).
Geralmente o quadro clínico da intoxicação pelo paracetamol apresenta três
etapas bem definidas, podendo chegar a um quarto, resolutivo. No primeiro dia (24
horas), o paciente pode manifestar alguns sintomas como leve mal-estar, náuseas,
vômitos, palidez e epigastralgia ou permanecer assintomático. Após o primeiro dia
(24 a 72 horas), o paciente pode continuar assintomático ou apresentar
sintomatologia semelhante à primeira etapa, ou ainda manifestar dor no hipocôndrio
direito. A terceira etapa (72 horas a cinco dias) é de máxima manifestação da
hepatotoxicidade, pois pode se agravar para falência hepática aguda. O
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aparecimento dos sintomas pode variar de pouco significativo a ocasionar quadro de
encefalopatia, coma, transtornos de coagulação, esses últimos sintomas vão
depender do grau do comprometimento hepático (SEBBEN et al., 2010). Nesta fase
é possível também observar, em âmbito laboratorial, alterações de AST e ALT
(PINTO et al., 2015). Também se detecta aumento de bilirrubina total e tempo de
protrombina. Se a IHA não levar a óbito, a reversibilidade é total, encontrando o
tecido hepático regenerado por completo entre cinco e sete dias podendo chegar a
duas semanas (SEBBEN et al., 2010).
É preciso realizar uma analise da concentração sérica de paracetamol para
que haja a confirmação do diagnostico de intoxicação e para avaliar o grau de
hepatotoxicidade. Para este diagnostico utiliza-se o nomograma de RumackMatthew (figura 2). Este nomograma relaciona as concentrações plasmáticas de
paracetamol, o tempo transcorrido desde a sua ingestão e a probabilidade do risco
hepático (SEBBEN et al., 2010; GUIMARÃES, SOARES e CARVALHO, 2015).
Figura 2 – Ilustração do Nomograma de Rumack-Matthew. Fonte: SEBBEN et al., 2010.
Produtos
metabólicos
como
a 3-(cisteina-S-yl)-paracetamol-aduto, são
liberados na corrente sanguínea após a lise das células do fígado, os hepatócitos.
Deste modo são conhecidas como biomarcadores específicos de hepatotoxicidade e
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são detectadas em exames como a de cromatografia liquida de alta eficiência
(BUCARETCHI et al., 2013).
De acordo com estudos de Guimarães, Soares e Carvalho (2015), os
resultados obtidos no nomograma para avaliação das concentrações plasmáticas
normais de paracetamol são de 10 a 20 μg/ml em quatro horas. É considerado dano
hepático mínimo ou ausente quando se encontra concentrações plasmáticas de 120
μg/ml em quatro horas ou 30 μg/ml em doze horas, 300 μg/ml em quatro horas ou 45
μg/ml em quinze horas são concentrações tóxicas e letais.
Quando se conhece a hora da ingestão do medicamento, os níveis da
concentração devem ser determinados após quatro horas. Já quando se
desconhece a hora da ingestão, assim que o paciente chegar à unidade de saúde
deve ser realizado uma determinação plasmática, e outra após quatro horas. A
determinação
sérica
de
paracetamol
é
feita
através
dos
métodos
espectrofotométricos e cromatografia líquida de alta eficiência (GUIMARÃES,
SOARES e CARVALHO, 2015).
Segundo Alberto, Figueiredo e Deus (2009), na intoxicação por paracetamol
se deve administrar o antidoto N-acetilcisteina. Por via oral por sonda nasogástrica:
140 mg/kg em solução de 5%, seguido de 70 mg/kg de quatro em quatro horas até
um chegar a um total de 17 administrações. Por via endovenosa: administrar uma
dose de impregnação de 140 - 150 mg/kg em Dextrose a 5% deixar correr em 15
minutos, seguido de 70 mg/kg de quatro em quatro horas num total de 17
administrações. Caso a ingestão do paracetamol tenha acontecido em um tempo
inferior a quatro horas, antes da administração da N-acetilcisteina deve-se
administrar por via oral ou por sonda nasogástrica carvão ativado (1g/kg).
A lavagem gástrica é recomendada se a ingestão do paracetamol ocorrer até
duas horas antes do processo, diminuindo assim sua absorção (LOPES e
MATHEUS, 2012).
4. CONCLUSÃO
O paracetamol é o fármaco de primeira escolha para o tratamento de dores
de intensidade leve a moderada e para estado febril, considerado seguro e eficaz se
administrado em doses terapêuticas. Por apresentar-se como um medicamento livre
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e ter um custo muito baixo além da falta de orientação de um profissional
farmacêutico, casos de intoxicação pelo uso indiscriminado do paracetamol,
causando hepatotoxicidade tem aumentado. Por isso existe a necessidade de um
farmacêutico em farmácias e drogarias, para orientar os clientes a como utilizar, de
maneira correta, os medicamentos dispensados.
A ação hepatotóxica do paracetamol esta associada a atividade do sistema
enzimático do CYP2E1 e a produção de NAPQI. A intoxicação por paracetamol pode
levar ao aparecimento de manifestações clinicas e laboratoriais que variam desde
elevações assintomáticas de AST e ALT até o desenvolvimento de IHA, e outras
complicações sistêmicas que podem levar o paciente a óbito. Então o tratamento da
intoxicação por este fármaco é considerada urgência médica, que pode ser
complexa e custosa depende da gravidade e da quantidade ingerida, fatores de risco
para hepatotoxicidade e do tempo decorrido pós-intoxicação.
Portanto, se a administração da dose de paracetamol for superior a 4 g/dia,
ela tem potencial hepatotóxico. A hepatotoxicidade ainda é aumentada quando há o
consumo de álcool e tabaco, a idade e estado nutricional também influenciam neste
processo. Em doses terapêuticas este fármaco não causa danos gástricos nem
nefropatias. O tratamento precoce da intoxicação pelo paracetamol é de extrema
importância. O N-acetilcisteina é uma antidoto seguro e eficaz para o tratamento
dessa intoxicação.
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