Distribuição de energia Apoio 60 Capítulo IX Modelo de relatório de qualidade da energia elétrica atendendo aos Procedimentos de Distribuição (Prodist) Por André Luís Grandi e Maria Jovita Siqueira* Este artigo propõe um modelo de análise e (período de integralização) de dez minutos cada, apresentação do relatório da qualidade da energia com elétrica embasado no Módulo 8 – Qualidade da expurgadas conforme o item 2.6.2. Energia Elétrica dos Procedimentos de Distribuição (Prodist), utilizando como exemplo as aferições ser calculado o índice de duração relativa da transgressão de tensão realizadas pelo período de uma semana para tensão precária (DRP) e o índice para tensão crítica no ponto de entrega de energia elétrica de uma (DRC) de acordo com as seguintes expressões: exceção (1) DRP = (2) DRC = Os indicadores analisados são: tensão de regime permanente, flutuação de tensão, desequilíbrio de que eventualmente sejam Após a obtenção do conjunto de leituras válidas, deve siderúrgica alimentada em 13,8 kV (média tensão), que possui um forno a arco de 3,2 MW. das nlp 1088 nlc 1088 *100[ % ] *100[ % ] tensão, distorção harmônica total e individual de tensão e Variações de Tensão de Curta Duração Em que: nlp e nlc representam o número (VTCD). Também são contemplados os indicadores de de leituras situadas na faixa precária e crítica, continuidade do fornecimento (qualidade do serviço). respectivamente. Ressalta-se que, para cada nível de tensão, tem-se as faixas para os cálculos de 1 e 2. Tensão em regime permanente (DRC e DRP) Essas faixas podem ser consultadas nas tabelas de 1 O termo “regime permanente” compreende o a 10 do Anexo I do módulo 8 do Prodist. intervalo de tempo da leitura de tensão, definido Para a análise da tensão em regime permanente, como sendo de dez minutos, em que não ocorrem apresenta-se o gráfico semanal, totalizando as 1.008 distúrbios elétricos capazes de invalidar a leitura. leituras válidas. Em seguida, faz-se uma análise No item 2.7.1.1 do módulo 8 do Prodist, tem-se sob a forma de gráfico de histograma dos registros que o conjunto de leituras para gerar os indicadores de tensão por fase. O comportamento semanal individuais deverá compreender o registro de 1008 da tensão pode ser visualizado na Figura 1 e o leituras válidas obtidas em intervalos consecutivos histograma de tensão na Figura 2. Apoio 61 Após a apresentação do gráfico semanal, bem como do Tabela 1 – Indicadores de DRP e DRC histograma, são apresentados os indicadores calculados, conforme pode ser visualizado na Tabela 1. Indicador Fase A Fase B Fase C DRP 0,00% 0,10% 0,00% DRC 0,00% 0,10% 0,00% Em especial, para o cliente em questão, os indicadores de DRP e DRC se comportaram de modo inferior aos limites máximos estabelecidos pelo órgão regulador, que são: DRPM = 3,0% e Figura 1 – Gráfico semanal com 1.008 leituras. DRCM = 0,5%. Flutuação de tensão A flutuação de tensão é uma variação aleatória, repetitiva ou esporádica do valor eficaz da tensão. Assim, a determinação da qualidade da tensão de um barramento do sistema de distribuição, quanto à flutuação de tensão, tem por objetivo avaliar o incômodo provocado pelo efeito da cintilação luminosa no consumidor final que tenha seus pontos de iluminação alimentados em baixa tensão. Nesse sentido, instalam-se registradores digitais de flutuação de tensão, baseados no protocolo definido pela IEC 61000-4-15 e sincronizados, via GPS, no cliente que se deseja monitorar e na instalação de baixa tensão (BT) adjacente ao cliente, buscando, com isso, a comprovação da origem do fenômeno, ou ainda, a Figura 2 – Histograma de tensão com 1.008 leituras. identificação das contribuições associadas ao cliente medido em Distribuição de energia Apoio 62 relação à baixa tensão (BT). Por meio destas correlações, é possível afirmar que o indicador de PST medido na baixa tensão é consequência única e direta da Utiliza-se para análise de flutuação de tensão o indicador de severidade de curta duração (PST), conforme está descrito no operação das cargas da unidade em MT. módulo 8 do Prodist, no item número 6, que trata do indicador Desequilíbrio de tensão de flutuação de tensão. A Figura 3 apresenta o gráfico semanal comparativo entre a corrente máxima de carga do cliente e o indicador de PST. dos padrões trifásicos do sistema de distribuição. Para esse O desequilíbrio de tensão é o fenômeno associado a alterações indicador, o Prodist, em seu módulo 8, estabelece para cálculo a seguinte expressão (3) quando das medições entre fase-neutro: V FD% = *100 V+ (3) Em que as terminologias são as da Tabela 3, a seguir. O limite de referência estabelecido para o fator de desequilíbrio (FD%) deve ser igual ou inferior a 2% para os barramentos do sistema de distribuição. Para o desequilíbrio de tensão, a exemplo da flutuação de tensão, também pode ser visualizada a relação existente entre a corrente da unidade e indicador (FD%) pela Figura 5. Posteriormente, esses Figura 3 – Comparativo entre corrente média do cliente e PST. valores podem ser correlacionados para que se verifiquem suas relações de interdependência. Visando a uma identificação mais precisa da relação entre corrente e PST, foi utilizada também a estatística descritiva pelo coeficiente de correlação de Pearson (R), que mede o grau de relacionamento entre duas variáveis quaisquer. As amplitudes de correlação entre duas variáveis podem variar de 0% a 100%, sendo (R = 0) como correlação nula e (R = 100) uma correlação total. A correlação entre a corrente e o PST pode ser verificada na Tabela 2. Logo, fica claro que existe uma forte correlação entre o indicador de PST e a operação das cargas da unidade fabril, comprovando que quase a totalidade da composição do indicador é consequência da operação das cargas da unidade medida. Complementando as análises, faz-se uma correlação dos valores de PST medidos na média tensão e os valores de PST medidos na baixa tensão. Com o intuito de se obter uma melhor visualização da correlação, é reproduzido a seguir um gráfico comparativo diário das duas medições. Tabela 2 – Correlação PST versus corrente Correlação Pst x Corrente Dia Fase A Fase B Fase C 18/07/08 57,46% 50,48% 53,51% 19/07/08 83,91% 83,08% 84,05% 20/07/08 74,36% 74,79% 72,56% 21/07/08 76,61% 76,19% 74,53% 22/07/08 66,61% 69,74% 73,08% 23/07/08 92,80% 92,46% 2407/08 85,00% 90,16% Semanal 89,14% 88,69% Figura 4 – Comparativo entre PST de média e baixa tensão. Tabela 3 – Terminologia Identificação da grandeza Símbolo 93,53% Fator de desequilíbrio FD 94,12% Magnitude da tensão de sequência negativa (RMS) V- 89,12% Magnitude da tensão de sequência positiva (RMS) V+ Distribuição de energia Apoio 64 Também para o indicador de DTT teve-se uma correlação alta, como pode ser visualizado na Tabela 4. Tabela 4 – Correlação DTT% versus corrente Correlação Pst x Corrente Dia Figura 5 – Gráfico de desequilíbrio de tensão e gráfico de corrente. A Figura 6 traz o histograma de desequilíbrio dos valores médios ao longo dos sete dias de medição, totalizando 1.008 leituras válidas. Fase A Fase B Fase C 18/07/08 46,24% 41,13% 43,19% 19/07/08 71,27% 62,86% 62,31% 20/07/08 65,77% 66,15% 66,37% 21/07/08 58,51% 60,62% 59,69% 22/07/08 42,14% 52,24% 51,78% 23/07/08 79,71% 80,44% 78,96% 24/07/08 77,83% 69,93% 68,15% Semanal 76,20% 78,30% 76,76% Esta correlação alta comprova que o indicador de DTI% é consequência da operação das cargas da unidade. Para a DIT%3, foi feita a mesma análise, como pode ser visualizado na Figura 8. Figura 6 – Histograma de desequilíbrio. Destes valores, teve-se FD% de até 3,71%, como pode ser visualizado na Figura 6, pois nesse histograma constam os valores máximo, médio e mínimo dos valores integralizados a cada dez minutos. O valor do FD% registrado é acima do limite referencial de 2% do Módulo 8 do Prodist. Distorção total de ensaio (DTT%) e distorção individual de tensão (DIT%) Em relação a harmônicos, foi analisada a distorção total de tensão (DTT%) e, para os harmônicos individuais, foram analisadas Figura 8 – Comparação entre DIT3% e corrente máxima do cliente. Para as demais ordens harmônicas, 5º e 7º ordens, foram feitas as mesmas análises que para a de 3ª ordem. Adicionalmente, além dos gráficos semanais e da correlação existente entre a corrente do cliente, para cada ordem harmônica apresenta-se o histograma com o resumo dos valores, como pode ser visualizado como exemplo para DIT%3. as ordens de maior relevância, que, para o caso específico, foram as ordens 3ª, 5ª e 7ª. A seguir, reproduz-se o gráfico comparativo entre o indicador de DTT% e a corrente máxima de carga do cliente. Figura 7 – Comparação entre DTT e corrente de carga. Figura 9 – Histograma DIT3% médios. Apoio 65 Variações de tensão de curta duração (VTCDs) contempladas nas possíveis soluções deste fenômeno, o qual, em As variações de tensão de curta duração são desvios função das sensibilidades dos equipamentos eletroeletrônicos, é um dos significativos no valor eficaz da tensão em curtos intervalos de fenômenos que mais impacta o sistema produtivo dos clientes. tempo. As variações de tensão de curta duração são classificadas conforme a Tabela 5 a seguir: tensão com amplitude de 0,85 pu e com duração de 36 ciclos. Quando as oscilografias de tensão e as correntes são disponibilizadas Na Figura 10, observa-se um evento de um afundamento de A oscilografia de corrente, vista na Figura 11, é importante para pelo medidor de qualidade da energia elétrica, sugerimos que seja identificar o nível de elevação da corrente e propor soluções para o realizada uma correlação entre estas informações visando a serem afundamento de tensão. Tabela 5 – Classificações das variações de tensão Amplitude da tensão em relação Classificação Denominação Duração da variação à tensão de referência Interrupção momentânea de tensão Inferior ou igual a Inferior a 0,1 pu Variação momentânea três segundos Afundamento momentâneo de tensão de tensão Superior ou igual a um ciclo e inferior ou igual Superior ou igual a 0,1pu e inferior a 0,9pu a três segundos Elevação momentânea de tensão Superior ou igual a um ciclo e inferior ou igual Superior a 1,1 pu a três segundos Variação temporária de tensão Interrupção temporária de tensão Superior a três segundos e inferior Afundamento temporário de tensão Superior a três segundos e inferior Inferior a 0,1pu ou igual a um minuto Superior ou igual a 0,1pu e inferior a 0,9pu ou igual a um minuto Elevação temporária de tensão Superior a três segundos e inferior ou igual a um minuto Superior a 1,1pu Distribuição de energia Apoio 66 Parâmetros de análise da qualidade do serviço Nesse sentido, sob o aspecto das instalações individuais, são definidos os seguintes indicadores de continuidade individuais: a)DIC – Duração de interrupção individual por unidade consumidora: compreende o intervalo de tempo em que, no período de observação, em uma determinada unidade consumidora, ocorreu descontinuidade no fornecimento de energia elétrica. b) FIC – Frequência de interrupção individual por unidade Figura 10 – Oscilografia de tensão. consumidora: compreende o número de interrupções ocorridas, no período de observação, em uma determinada unidade consumidora. c) DMIC – Duração máxima de interrupção contínua por unidade consumidora: compreende o tempo máximo de interrupção contínua de energia elétrica em uma determinada unidade consumidora. Para efeito da resolução, a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) considera- se como interrupção um tempo Figura 11 – Oscilografia de corrente. superior a três minutos associado à descontinuidade do A proposta é que todos os eventos de VTCDs, registrados em uma condutor neutro ou da tensão disponível em qualquer uma campanha de medição, sejam identificados e quantificados em uma das fases do circuito elétrico que atende a uma determinada tabela, conforme indicado na Tabela 6, visando à sua correlação com o unidade consumidora. No caso específico do cliente de média impacto produtivo relatado pelo cliente. tensão, os padrões de desempenho de continuidade individuais estabelecidos pela Aneel são os da Tabela 7. Tabela 6 – Detalhes do evento Tabela 7 – Padrões de desempenho de continuidade individuais Duração Reg Data Hora Amplitude (pu) Ciclos ms 1 9/10/2008 15h13m 0,85 36 600 A curva ITIC, demonstrada na Figura 12, representa o envelope de tolerância de tensão para equipamentos microprocessados. Todos os eventos de VTCD ocorridos durante o período de aferição devem ser contemplados nesta curva. O único evento registrado na Tabela 6 encontra-se dentro da região de normalidade da curva ITIC indicando que não houve desligamento dos equipamentos microprocessados. Figura 12 – Evento na ITIC . Período de Apuração DIC(horas) FIC(Qtde) DMIC(horas) Mensal 10 6 5 Trimestral 15 9 Anual 30 18 Os resultados apurados, comparados com os padrões, acerca dos indicadores individuais de continuidade do fornecimento para a unidade consumidora estão na Tabela 8. Como pode ser observado a partir dos valores apurados na Taabela 8 – Indicadores de continuidades individuais. índices Período jan/08 fev/08 mar/08 1° Trim 2008 abr/08 mai/08 jun/08 2° Trim 2008 jul/08 ago/08 set/08 3° Trim 2008 out/08 nov/08 dez/08 4° Trim 2008 ano civil 2008 jan/09 fev/09 mar/09 1° Trim 2009 ano movel 2009 DIC DIC FIC FIC DMIC DMIC padrão apurado padrão apurado padrão apurado 10 10 10 15 10 10 10 15 10 10 10 15 10 10 10 15 30 10 10 10 15 30 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 6 6 6 9 6 6 6 9 6 6 6 9 6 6 6 9 18 6 6 6 9 18 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 5 5 5 0 0 0 5 5 5 0 0 0 5 5 5 0 0 0 5 5 5 0 0 0 5 5 5 0 0 0 67 tabela anterior, os indicadores de continuidade individuais para as instalações da unidade consumidora em análise encontram-se em total conformidade com os valores referenciais estabelecidos pelo módulo 8 do Prodist. Conclusões Este artigo propõe um modelo de relatório da qualidade da energia elétrica com base no módulo 8 do Prodist, tendo como base uma aferição real dos níveis de tensão realizada no ponto de entrega de uma siderúrgica alimentada em 13,8 kV localizada na área de concessão da EDP Bandeirante e empregando-se um medidor da qualidade da energia elétrica, homologado pelo Operador Nacional do Sistema (ONS). As análises são realizadas por fenômeno, correlacionado com a contribuição da carga industrial aferida. Embora este procedimento não seja contemplado no Prodist, é importante estabelecer este parâmetro de correlação, principalmente para a concessionária visando eventuais acréscimos de carga e seu respectivo impacto no sistema distribuidor. Recomenda-se que os parâmetros que ultrapassam os valores de referência previstos no Prodist sejam enfatizados, pois eles podem subsidiar contratos de comanda com cláusulas específicas de qualidade da energia (conforme ocorreu no processo avaliado pela EDP Bandeirante). Tendo sido estabelecido um modelo de relatório de qualidade da energia é possível promover a sua automatização do processo de análise pelas concessionárias, clientes e até pelos próprios fabricantes de medidores, com o intuito de agilizar os estudos de qualidade e a campanha de medições amostrais conforme prevista no Prodist a serem regulamentadas pela Aneel. Referências IEC 61000-4-15:2003, Edition 1.1. “Electromagnetic compatibility (EMC) – Part 4-15: Testing and measurement techniques – functional and design specifications”. Procedimentos de distribuição (Prodist). Módulo 8 – Qualidade da energia elétrica. Agência nacional de energia elétrica (Aneel), última revisão (revisão 4/2011). *André Luis Zago de Grandi é engenheiro eletricista, mestre em engenharia elétrica pela Escola Politécnica da Universidade de São Paulo. É engenheiro da Bandeirante Energia. Maria Jovita Vilela Siqueira é engenheira eletricista com especialização em conservação de energia elétrica na indústria e em sistemas de energia, com MBA em gestão empresarial pela Fundação Getúlio Vargas. É engenheira da área de qualidade da EDP Bandeirante Energia. Continua na próxima edição Confira todos os artigos deste fascículo em www.osetoreletrico.com.br Dúvidas, sugestões e comentários podem ser encaminhados para o e-mail [email protected]