1 SAIDA DA CRISE IMPÕE NOVO DESAFIO À

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SAIDA DA CRISE IMPÕE NOVO DESAFIO À RETOMADA GLOBAL
“Saída da crise impõe novo desafio à retomada global. Países enfrentam reflexos das diferentes
receitas que adotaram para combater a turbulência. Mundo desenvolvido tenta contornar a
explosão do endividamento. Emergentes terão de segurar a demanda interna sem estímulos
fiscais”.
Com o pior da maior crise financeira desde os anos 30 ficando pra trás, as principais regiões e
economias de mundo têm pela frente agora o difícil desafio de enfrentar as conseqüências de modelos
diferentes adotados na turbulência.
No mundo desenvolvido, o maior problema é a explosão do endividamento. Na média, segundo o
FMI (fundo monetário internacional), ele será equivalente a 110% do PIB daqui a quatro anos, um recorde no
pós-segunda guerra.
Entre os emergentes, o desafio é sustentar a demanda interna sem tantos problemas de incentivo
fiscal. E evitar que a concessão exagerada de crédito leve a uma explosão do endividamento e da
inadimplência.
Basicamente, as maiores economias ou regiões do mundo adotaram três diferentes modelos para
sair da crise. Na maior delas, os EUA , houve injeção maciça de dinheiro estatal em bancos e empresas um
pacote de US$787 bilhões em gastos públicos e garantias trilionárias do FED(BC americano) para emissão de
dívidas de empresas e do setor financeiro.
Acima de tudo houve um enxugamento brutal nos custos das empresas, com cortes e demissões
que ja elevaram o desemprego no país a 10,2%. É isso o que explica o aumento da lucratividade nas
empresas e a forte valorização da bolsa de Nova York a partir de março.
As empresas lucram mais por terem custos menores, o que se reflete nos preços em alta das ações,
isso não significa que estavam vendendo mais . a recuperação está longe nos EUA
Já entre os 16 paises europeus que tem o euro como moeda, o modelo adotado visou
principalmente preservar empregos a partir da diminuição da jornada de trabalho. Isso foi possível,
principalmente porque , diferentemente dos EUA, o mercado de trabalho europeu é mais regulamentado, e as
políticas sociais , mais generosas.
Houve também a adoção de medidas fiscais. mas dentro da região elas foram bastante
assimétricas. Isso é o que explica a recuperação mais firme de economias como Alemanha e França e os
problemas que ainda prendem Espanha, Irlanda e Grécia, entre outros.
Na China, economia mais dinâmica do mundo, uma combinação de gastos estatais e forte aumento
do crédito ao consumo poderão levar o país a um crescimento de 8% neste ano.
A China não só adotou um pacote de estímulo de US$ 580 bilhões como também os bancos no
país concederam 1,3 trilhões em financiamentos neste ano, elevando o consumo.
A grande dúvida é se isso não trará uma onda de inadimplência mais à frente. E se os fortes gastos
estatais, destinados basicamente a mais investimentos para o aumento da produção , encontrarão , no final da
cadeia, demandas externa e interna para esses produtos.
Já no caso brasileiro, o país soube contornar o pior desarmando temporariamente heranças do
tempo inflacionário. Diminuiu, por exemplo, o total dos depósitos que os bancos têm que deixar no BC , e as
instituições financeiras públicas passaram a ser mais agressivas na conceção de crédito de consumo. O
problema no país continua sendo a falta de investimentos.
Estados Unidos: gasto público amortece recessão, mas não reativa a economia real
Pioneira na área de internet em 1985, a AOL acaba de anunciar que demitirá um terço de seus
funcionários. Serão 2.500 dispensassem um esforço para cortar US$ 300 milhões em custos.
Além da sobrevivência, o objetivo é aumentara remuneração aos acionistas de AOL e TIME
WARNER (que se fundiram em 2000) e os preços das ações.
Entre as maiores empresas norte-americanas, o alvo na atual recessão tem sido esse: cortes. De
custos e, principalmente de salários.
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É isso o que explica em parte a forte valorização da bolsa de valores de Nova York a partir de
março e o aumento na lucratividade nas empresas. Operando com recordes de ociosidade, elas não tendem a
converter lucros em novos investimentos ou empregos, o que aumenta os dividendos aos acionistas.
Nos balanços do terceiro trimestre, os resultados de 78% das empresas superaram as expectativas
dos analistas.
A Alcoa , por exemplo, teve lucro US$ 77 milhões. Mas os gastos com pesquisa e
desenvolvimento foram cortados em US$39 milhões. O Citigroup, que demitiu 52 mil funcionários desde o
início do ano, lucrou US$101 milhões.
Segundo a OIT (Organização Internacional do Trabalho), as empresas norte-americanas
eliminaram no primeiro semestre 45% mais empregos do que as européias e 63% mais que as asiáticas.
A bolsa em alta é resultado ainda de uma explosão do endividamento estatal. Os EUA não só estão
aplicando US$ 787 Bi em gastos estatais como também comprometeram quase US$ 2 trilhões de FED (BC
americano) para garantir a emissão de dívidas de empresas e bancos.
Esse dinheiro não chega, necessariamente, a quem precisa. Como 1 entre cada 7 mutuários hoje na
iminência de ser despejado ou que tem atraso no pagamento de prestações.
Esses recursos fluem, basicamente, para tesouraria de empresas e bancos. Quando eles aplicam
esse dinheiro em ações ou fundos denominados em preços de commodities, há forte valorização desses
ativos. Em resumo, é uma espécie de bolha de preços inflada com dinheiro estatal quase gratuito.
No setor empresarial, no entanto, enquanto os lucros crescem e as ações se valorizam, os EUA
convivem hoje com a maior taxa de desemprego em 26 anos e meio, de 10,2%.
Mesmo a venda de produtos físicos, resultado de empregos e produção industrial, tem mais a ver
com reposição de estoques dilapidados do que com demanda em recuperação.
“O setor comercial cortou os estoques até um nível muito baixo. Talvez achando erroneamente que
os consumidores tivessem entrando em greve por tempo indeterminado . agora, terá de recompor isso” afirma
Christopher Rupkey, economista do Bank of Tokyo-Mitsubishi em NY.
Apesar de a recomposição de estoques ajudar a aumentar a produção, é difícil prever se esse
movimento será acompanhado por aumento da demanda dos consumidores – cada vez mais pressionados pela
alta do desemprego e pela diminuição da oferta de crédito.
Europa: europeus preservam emprego à custa de recuperação mais lenta
A Europa se serviu de uma receita contra a crise similar à dos EUA, concedendo incentivos fiscais
e apurando o sistema financeiro. Mas meteu no meio um ingrediente muito seu: a proteção do emprego. Por
isso , a recessão afetou menos a região. Mas também por isso, sobretudo, ela vai demorar mais a pegar
velocidade na retomada.
Jean-Luc Schneider, economista da OCDE (rich club), lembra que nos EUA a crise produziu uma
onda instantânea de demissões, que com a retomada se reverte. Já na Europa, houve arranjos para reduzir a
jornada e evitar mais cortes, além de subsídios fiscais a empresas que não reproduz sem quadros.
“Com crescimento [da economia], a primeira coisa que as empresas farão é aumentar as horas de
trabalho” disse à folha. “elas não observarão o desemprego imediatamente.”
No total, a UE liberou em injeções ao mercado cerca de € 240 bilhões (dos quais cerca de € 140 bi
foram usados, diz a OCDE).
Houve também outras três ações. A primeira foi a tentativa de uniformizar e endurecer regras e
supervisão do sistema financeiro. Um conjunto de diretrizes que cria um período-teste para instituições extrabloco é discutido na comissão Européia.
As outras, simbióticas, são o incentivo ao consumo e a já mencionada proteção ao emprego. Como
os EUA e o Brasil, a UE adotou mecanismos de isenção para estimular a compra de carros.
Os resultados foram eficazes na Alemanha, na França e na Itália. Já o Reino Unido explica Chris
Williamson, economista-chefe da consultoria Markit, em Londres, acabou beneficiando mais os vizinhos, de
quem importa (no trimestre anterior, o país era o único dos quatro ainda em recessão).
A lentidão na retomada, afirmam os analistas, deriva de um padrão histórico que não se deve a
uma ação específica de governos e mercado locais, mas a tendências particulares.
Há de lembrar que a Alemanha , um dos motores europeus e ainda o maior exportador do mundo,
foi muito abalada pela baixa demanda global, sobretudo pelo fato de sua pauta se basear em produtos mais
caros, ao contrário da chinesa.
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A dívida pública também é uma questão em foco. Os tributos são maiores no bloco que nos EUA,
e uma recessão tende a punir mais seu orçamento.
Se esse freio limita gastos em pacotes, servindo como o que ele chama de “estabilizador
automático”, ele também sofre o ônus de uma rede social mais extensa. “É o caso de alguns países europeus,
sobretudo os nórdicos, onde há indenizações generosas para os empregados”, afirma Schineider.
De qualquer forma, mesmo sendo cedo para avaliar o sucesso das medidas no longo prazo,
Williamson diz que a retomada surpreendeu. “Houve uma reviravolta neste ano maior do que todo mundo
esperava em quase todos os países. Os únicos que ainda patinam em termos de crescimento são aqueles que
tinham problemas domésticos mais profundos, a Espanha e a Irlanda”.
Brasil: investimento não decola no país, apesar de ações do governo
“Medidas anticíclicas apenas impediram retrocesso. Desoneração conseguiu manter consumo
interno em alta e reativar a economia. Falta de aumento da capacidade produtiva é a grande
fragilidade futura do país”
O Brasil não teve uma, mas duas estratégias de enfrentamento da crise mundial.
A primeira envolveu a liberação maciça de recursos para impedir a quebra de instituições
financeiras, restaurar o crédito bancário e assegurar o financiamento às exportações.
A segunda visou preservar o nível de consumo, a qualquer preço. Para isso, o governo reduziu
impostos, como o IPI do setor automotivo, e elevou o volume de empréstimos concedidos por bancos
oficiais.
À primeira estratégia deve-se o fato de os bancos brasileiro os e o comércio exterior terem resistido
a brutal contração de crédito externo com, relativamente, poucas avarias.
Já a segunda estratégia foi responsável pela rápida recuperação do nível de emprego e pelo fato
surpreendente de a massa salarial do país não ter caído durante toda a crise.
É difícil calcular o custo do pacote anticrise porque grande parte do dinheiro liberado não pertencia
ao governo , mas aos próprios bancos – caso do compulsório. O cálculo usado pelo governo é de 1,5% PIB,
cerca de US$ 28 Bi, o menor patamar entre os países do G20.
Pouco investimento
A estratégia brasileira é considerada um sucesso mundo afora. Diferentemente da China, no entanto,
o Brasil não conseguiu fazer decolar sua taxa de investimento. Nesse campo, a ação anticíclica, BNDES
apenas impediu um retrocesso.
“Os investimentos em infraestrutura continuam baixíssimos”, diz o economista Luiz Carlos
Mendonça de Barros. “Aí está a grande fragilidade, olhando para frente: tivemos uma recuperação 100%
movida pelo consumo, sem aumento da capacidade produtiva”.
O tesouro capitalizou BNDES com R$ 100 milhões, destinado a elevar o financiamento de grandes
projetos de infraestrutura. No entanto, questões regulatórias e ambientais, entre outros fatores, têm brecado o
impulso que o governo prometeu que daria nos investimentos.
O economista elogia a forma como o BC lidou com a crise. Mas credita o sucesso brasileiro mais à
característica “do carro” do que “à habilidade dos pilotos”.
“Só foi possível baixar o compulsório dos bancos porque a exigência de compulsório no país era
muito alta”, disse. “e o aumento do crédito público só foi eficiente porque eles já eram fortes no país. Nos
EUA, por exemplo, esses instrumentos não estavam à disposição do governo.”
A resposta mais imediata à crise, do BC, envolveu a liberação de depósitos compulsórios (R$ 98,8
bi), o uso de reservas para financiar os exportadores (US$ 24,4 bi), a venda de dólares no mercado à vista
(US$ 14,5 bi) e a oferta de swaps cambiais (US$ 33 bi).
Quando a crise veio, o Brasil tinha US$ 205,1 bi em reservas internacionais. Em fevereiro, elas
caíram para US$ 199 bi , o menor valor desde então. Depois voltaram a subir. Na última terça-feira, estavam
em US$235,8 bi.
No campo fiscal, a desoneração de impostos para estimular a economia custou R$ 25 bi. As medidas
concentram-se nos setores automotivo e eletroeletrônico.
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China: crédito ilimitado agrava desequilíbrio chinês
A China, terceira maior economia do mundo, deve superar os 8% de crescimento do PIB em 2009.
Mas a dúvida entre economistas é até quando o sistema bancário do país vai continuar concedendo crédito
ilimitado para manter esse crescimento – e se isso não esta aumentando ainda mais os desequilíbrios do
modelo chinês.
De janeiro a setembro, o PIB cresceu 7,7% (7,3 pontos percentuais foram por investimentos em
ativos fixos e 4 pontos por consumo; a queda nas exportações teve impacto negativo de 3,6 pontos).
Um pacote de estímulo de US$ 580 bi foi lançado em novembro do ano passado e, apenas entre
janeiro e outubro deste ano, os bancos concederam empréstimos de US$ 1,3 tri (para comparação, o PIB do
Brasil é US$ 1,6 tri).
O aumento do crédito foi 143,6% superior ao do mesmo período de 2008. Críticos afirmam que a
maior parte dele foi parar nas grandes empresas estatais e nos governos locais, sobrando pouco crédito para
pequenas e médias empresas.
“A questão é até quando os bancos chineses continuarão emprestando para criar esse crescimento”,
questiona o economista americano Michael Pettis, professor da Universidade de Pequim. “eles precisariam
contar com um retorno da demanda americana para promover as exportações chinesas em queda. Se isso
acontecer, o crescimento chinês vai continuar dependente de investimentos”, completa.
“Mas, com 10,2% de desemprego nos EUA, não acredito que vá haver uma grande retomada de
consumo lá.
Para o economista-chefe do escritório nacional de estatísticas, Yao Jingyuan, o desafio para a
economia é ajustar a sua estrutura. “Precisamos estimular o consumo doméstico como fator de crescimento:
95% do crescimento do nosso PIB neste ano depende de investimentos em ativos fixos”, disse em um fórum
em Pequim.
O consumo doméstico representa menos de 30 % do PIB - era 50 % há 20 anos. Boa parte dos
empréstimos foi parar nas estatais, que continuam a investir em mais capacidade: mais fábricas, mais
equipamentos, mais tecnologias.
Como a renda das famílias chinesas não cresceu esse excedente deve continuar a se espalhar pelo
mundo inteiro em forma de produtos baratos.
“O modelo dos últimos anos tira da poupança familiar chinesa para subsidiar o setor produtivo,
que tem todas as vantagens: acesso a crédito barato, mão de obra barata, pode poluir sem medo e ainda tem
uma moeda subvalorizada [o Yuan]”, analista M. Pettis.
“O problema não é que os chineses poupam demais por não terem previdência ou saúde gratuita, a
questão é que a renda é pequena”, completa.
Outros números revelam ceticismo quanto à qualidade do crescimento do país em 2009. Apesar da
expansão do PIB, o consumo de eletricidade e mesmo o de gasolina estão estagnados neste ano – mesmo com
a venda recorde de 10 mi de veículos entre janeiro e outubro de 2009. “Ou é o governo que está comprando
ou o consumidor aproveita os incentivos, mas o deixa na garagem.”
A China terá o maior crescimento entre as 15 maiores economias globais – mas registra a segunda
pior renda per capita entre elas,à frente da Índia.
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