2015, o ano que não terminou

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2015, o ano que não terminou
O ano de 2015 vai demorar a acabar. Já estamos no último mês do ano e as questões
políticas seguem a pleno vapor, como o noticiário diário não nos deixa esquecer. Na
economia, as contas fiscais não estão fechadas, nem a recessão acabou. E a toada deste
ano deve seguir adiante no começo do próximo. A esperança de recuperação, em todos os
sentidos, fica para o futuro menos próximo.
O núcleo do problema continua sendo a simultânea fragilidade fiscal e política. É raro
encontrar uma situação fiscal tão dependente do Legislativo e um Congresso tão
fragmentado para legislar a respeito. A dificuldade política de aprovar o ajuste fiscal paralisa
a economia. Sem saber como será “resolvido” o ajuste de quase 3,5% do PIB (sem contar o
ajuste previdenciário), será difícil destravar o investimento, que vem caindo há nove
trimestres. Ninguém sabe quais projetos privados serão viáveis depois dos ajustes públicos.
Os consumidores também se retraem com essa incerteza. A economia não consegue
recuperar-se. É nesse impasse político/fiscal/econômico que se passam dias, semanas e
meses e, a partir de janeiro, serão anos.
O ano fiscal de 2015 certamente ainda não terminou. Enquanto escrevo este artigo, a nova
meta fiscal de 2015 ainda não foi aprovada. Ainda vale a meta irreal de superávit de mais de
1% do PIB, quando a realidade aponta para um déficit da mesma magnitude. A saída é
cortar todo o permitido por lei ainda este ano, congelando mais de R$ 10 bilhões, como
anunciado recentemente. Isso não será suficiente para atingir a meta antiga, mas demonstra
boas intenções em relação ao Tribunal de Contas da União (TCU). O ideal seria conseguir
aprovar a nova meta de 2015 este mês, para pelo menos o ano fiscal terminar este ano.
O ano fiscal de 2016 terá dificuldades similares. Nem a meta nem o orçamento foram
aprovados no Congresso. E ainda existem os gastos atrasados. O governo enfrenta
resistência para aprovar o pacote fiscal anunciado depois do rebaixamento da nota do Brasil
pela Standard and Poor’s. Sem um pacote robusto, o ano que vem será o terceiro ano de
déficit primário, chamando atenção das outras agências de classificação de risco.
A recessão de 2015 também ainda não terminou. Não há ainda nenhum sinal de
estabilização na economia. As vendas estão em queda (-11,5%, em relação ao ano
anterior), assim como a produção industrial (-10,8%). O PIB deve ter contraído 1% no
terceiro trimestre (mais do que 4% da queda anualizada), e esperamos desempenho não
muito melhor no último trimestre do ano. Com isso, o PIB do ano deve cair mais do que 3%.
O mais difícil é a consequência no desemprego. O dado calculado pela Pesquisa Nacional
por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad Contínua) para todo o Brasil (não somente para
as capitais, como antes) alcançou 9% em setembro (levando em conta a sazonalidade do
mês). Com a queda do emprego e a volta moderada dos que necessitam para o mercado de
trabalho, o desemprego deve alcançar 10% ainda este ano. Ou seja, infelizmente, nem
nesse aspecto o ano acabou: ainda vamos registrar mais 1% de desempregados no último
trimestre.
E a recessão deve continuar no ano que vem. Mesmo que a atividade econômica se
estabilizasse a partir deste mês, a média do PIB no ano que vem seria quase 2% inferior à
deste ano (o chamado carrego estatístico). Mas tudo indica que a queda de atividade deve
continuar pelo menos no início do ano. Com isso, a queda do PIB em 2016 seria de -2,5%,
desde que parasse de cair no segundo semestre. Nesse caso, o desemprego no País
atingiria 12% no ano que vem (novamente segundo a Pnad). Aqui, o desafio será preservar
as conquistas sociais (distribuição de renda, pobreza etc.) num ambiente desfavorável.
Com essa dura perspectiva, a ansiedade poderá aumentar e ideias salvadoras aparecerão.
Uma delas certamente seria a de voltar ao expansionismo do passado recente - leia-se,
gastar ou emprestar o que não se tem. Mas resolver um problema fiscal gastando mais não
é uma boa ideia. Se gastar mais fosse a solução, não haveria governos em dificuldades
fiscais; bastaria mudar a mentalidade. Como se a solução do problema no Brasil pudesse
ser a mesma receita que levou à situação atual: gastos crescentes que viraram déficits
difíceis de reverter. Infelizmente, uma nova recaída no expansionismo levaria a uma crise
fiscal maior, com aumento do risco, rebaixamentos, saídas de capital, depreciação, inflação,
salário real menor, queda na confiança, aprofundamento da recessão e desemprego, enfim,
uma crise econômica e política maior. Seria um verdadeiro "expanicídio", como cunhei no
meu último artigo nesta coluna.
Mas nem tudo é questão fiscal de curto prazo. A recuperação do crescimento depende
também da sinalização correta sobre o futuro. Algumas medidas aprovadas no Congresso
ou sinalizadas pelo governo podem melhorar a confiança e ajudar a destravar a economia
sem mexer no superávit no curto prazo. São vários os exemplos. Aprovar uma idade mínima
de aposentadoria que reequilibrasse a Previdência reduziria o risco Brasil e os juros de
longo prazo. Conseguir mais investimento para infraestrutura é fundamental. Assim como
indicar uma nova postura comercial do Brasil, aberta a novos acordos comerciais, e sair do
isolamento global. Permitir que o acordado entre o empregador e o empregado prevaleça
sobre o legislado.
As consequências do passado não vão terminar em 2015, mas podem acabar em 2016, se
houver uma reação apropriada. A recuperação da confiança é essencial para a retomada da
economia. Mas isso deve ocorrer se e quando o nó político/fiscal for desamarrado.
Expansionismo sem responsabilidade trará efeitos contrários. Enquanto isso, medidas de
médio e longo prazos podem sinalizar um futuro melhor, ajudando a recuperação da
confiança e da economia já a partir do fim de 2015, seja lá quando isso ocorrer.
Ilan Goldfajn é economista-chefe e sócio do Itaú Unibanco.
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