A Europa expulsora - Editora do Brasil

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Texto complementar
A Europa expulsora
Zuleika Alvim
GEOGRAFIA
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Geografia
Assunto: Emigração europeia
A Europa expulsora
[…] A passagem do sistema de produção feudal para o de produção capitalista seguiu linhas básicas
em todos os países que se industrializaram; o que variou foi a época em que isso aconteceu. Os pilares dessa
passagem foram: concentração da terra nas mãos de poucos proprietários; altas taxas de impostos sobre
a propriedade, que impeliram o pequeno proprietário a empréstimo e consequente endividamento; oferta
por parte da grande propriedade de produtos a preços inferiores no mercado, eliminando a concorrência do
pequeno agricultor; e, por fim, a transformação do pequeno agricultor em mão de obra para a indústria nascente.
À medida que se implantava tal processo, foi liberando um excedente de mão de obra que a industrialização
tardia de países como a Itália e a Alemanha, por exemplo, não tinha condições de absorver. Isso, aliado a um crescimento demográfico nunca visto, como o ocorrido no século XIX, quando a população da Europa aumentou
em duas vezes e meia, ao avanço da tecnologia que permitiu que tarefas antes executadas pelo homem pudessem
ser realizadas por máquinas e à melhoria sem precedentes dos transportes, pôs à disposição do mercado
verdadeiras hordas de camponeses sem terra e desocupados.
Foi exímia a habilidade do capital em gerar um exército de trabalhadores, condição sine qua non para
sua multiplicação incessante. Mas quando o número de desempregados, impossível de ser absorvido no
novo sistema, começou a constituir ameaça, foi preciso tomar providências imediatas. A fome, associada à
miséria e ao desespero, poderia com certeza desencadear revoltas populares em escala incontrolável, o que
os donos de indústrias queriam evitar a qualquer custo.
Emigrar foi a solução ideal encontrada, uma vez que esse panorama geral harmonizava-se perfeitamente
com as necessidades dos novos países – Estados Unidos, Argentina e Brasil –, que por motivos variados iniciaram
um grande movimento de atração de imigrantes para suas terras.
Mais de 50 milhões de europeus [...] deixaram o continente entre 1830 e 1930. Grande parte teve como
destino a América do Norte, [...] mas 11 milhões (ou seja, 22% do total) foram para a América Latina, dos quais
38% eram italianos, 28% espanhóis, 11% portugueses e 3% da França e Alemanha.
Desses 11 milhões que foram para a América Latina, 46% foram para a Argentina, 33% para o Brasil, 14%
para Cuba e o restante dividiu-se entre Uruguai, México e Chile.
Esse foi o panorama expulsor em linhas gerais. No entanto, a dificuldade está em compreender como
um processo dessa dimensão mudou a vida de seus protagonistas, sobretudo no âmbito do privado. Afinal,
não estamos falando de um único grupo, mas de alemães, italianos, espanhóis, portugueses, poloneses,
enfim, de uma gama de nacionalidades cujo modo de vida, hábitos e costumes foram pautados por uma
história diversa.
Sem prescindir do fato de que tais diferenças devem ser levadas em conta em análises de inserção do
Novo Mundo, é preciso um esforço para buscar o similar, o que transformou o pacato homem do campo,
independentemente da sua nacionalidade, em um emigrante.
ALVIM, Zuleika. Imigrantes: a vida privada dos pobres do campo. In: ARIÈS, Philippe; CHARTIER, Roger (Org.).
História da vida privada no Brasil. São Paulo: Companhia das Letras, 1998. v. 3. p. 219-222.
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