Pró-Reitoria de Graduação Escola de Saúde Curso de Biomedicina Trabalho de Conclusão de Curso A IMPORTÂNCIA DO DIAGNÓSTICO CITOPATOLÓGICO NO RASTREAMENTO DO CÂNCER DO COLO DO ÚTERO Autora: Marina de Matos Pereira do Amaral Orientador: Prof. Esp. Fábio de França Martins cOS C DN Brasília - DF 2015 C MARINA DE MATOS PEREIRA DO AMARAL A IMPORTÂNCIA DO DIAGNÓSTICO CITOPATOLÓGICO NO RASTREAMENTO DO CÂNCER DO COLO DO ÚTERO Monografia apresentado ao curso de graduação em Biomedicina da Universidade Católica de Brasília, como requisito parcial para obtenção do Título de Bacharel em Biomedicina. Orientador: Prof. Esp. Fábio de França Martins Brasília 2015 Monografia de autoria de Marina de Matos Pereira do Amaral, intitulado A IMPORTÂNCIA DO DIAGNÓSTICO CITOPATOLÓGICO NO RASTREAMENTO DO CÂNCER DO COLO DO ÚTERO, apresentado como requisito parcial para a obtenção do grau de Bacharel em Biomedicina da Universidade Católica de Brasília, 04 de novembro de 2015, defendida e aprovada pela banca examinadora abaixo assinada: ____________________________________________________ Prof. Esp. Fábio de França Martins Orientador Biomedicina – UCB _____________________________________________________ Prof. MsC. Fernando Vianna Cabral Pucci Biomedicina – UCB _____________________________________________________ Profa. MsC. Cláudia Mendonça Magalhães Gomes Garcia Biomedicina - UCB Brasília 2015 Dedico este trabalho ao meu avô, Leiber de Jesus Pereira, um dos pioneiros da citologia em Brasília, que dedicou grande parte de sua vida ao exercício da citopatologia, um exemplo de caráter, dignidade e humildade, e a todos os familiares, amigos e professores que estiveram comigo nesta jornada, me apoiando e acreditando em mim. AGRADECIMENTO Agradeço primeiramente a Deus e a Nossa Senhora pelo término dessa jornada, me fazendo compreender mais do que nunca a existência de uma força maior pelo esforço que me foi proporcionado para enfrentar as diversas dificuldades e superá-las da melhor maneira possível. A minha mãe, que me criou com tanto amor para fazer de mim a pessoa que sou hoje. A toda minha família, especialmente minha avó, que me incentivou e fez concretizar esse curso mediante todo suporte e inspiração. Aquele que partiu desta vida e gostaria de presenciar esse momento: obrigada avô por ser minha grande inspiração. Os amigos que me deram apoio nos momentos mais difíceis para que eu nunca desistisse do meu sonho, tornando-o enfim realizado. As amigas do curso que passaram por essa trajetória junto comigo, compartilhando conhecimentos, idéias, desafios e expectativas. Ao meu namorado, Felipe, que sempre me incentivou e acreditou em mim. Ao professor Fábio, que me orientou e ajudou a concretizar um dos desafios mais importantes da minha vida, meu especial muito obrigada. Ao Dr. Regis Sales Azevedo, médico citologista do Laboratório de Patologia e Citologia Aplicada (LAB), que gentilmente cedeu informações e imagens obtidas dos exames de rotina, minha gratidão e reconhecimento. A todos os professores e colegas de curso, que deram sua contribuição à minha formação. Finalmente, a todos aqueles que contribuíram e amenizaram, à sua maneira, minha trajetória. “Talvez não tenha conseguido fazer o melhor, mas lutei para que o melhor fosse feito. Não sou o que deveria ser, mas Graças a Deus, não sou o que era antes.” Marthin Luther King RESUMO Referência: Amaral, Marina. A importância do diagnóstico citopatológico no rastreamento do câncer do colo do útero. 2015. 89 Folhas. Biomedicina – Universidade Católica de Brasília, Brasília, 2015. O câncer do colo do útero é um dos mais comuns na população feminina brasileira, sendo a terceira causa de morte de mulheres por câncer no país e o terceiro tipo de câncer mais comum entre as mulheres. Por possuir alta taxa de incidência e mortalidade e grande relevância epidemiológica e social, é um problema grave de saúde pública. Mas apresenta grande potencial de prevenção e cura se diagnosticado e tratado no início. Por falta de políticas públicas e divulgação, não há uma cobertura eficiente da população de risco, então as mulheres não aderem à rede de atenção básica e não tem conhecimento sobre a importância do diagnóstico citopatológico. E por ainda não existirem estratégias suficientes e efetivas, que compreendam sua promoção, prevenção, diagnóstico precoce, tratamento e reabilitação, ainda há dificuldades de acesso aos serviços de saúde. Por isso, o presente estudo tem como objetivo abordar parte dos estudos já existentes sobre o tema, apresentando as principais recomendações e condutas estabelecidas para o rastreamento e diagnóstico citopatológico das atipias do trato genital feminino e das alterações precursoras do câncer do colo do útero, e demonstrar a importância da elaboração destas estratégias para melhora da qualidade de vida da mulher brasileira. Para isso, foi realizada uma revisão bibliográfica elaborada a partir da pesquisa de estudos já publicados, utilizando legislações, portarias, diretrizes, dados do Ministério da Saúde, do Instituto Nacional de Câncer, jornais e revistas da área da saúde. Foi utilizada uma metodologia de busca baseada nos bancos de dados da LILACS, MEDLINE e SciELO. Palavras-chave: Câncer do colo do útero. Diagnóstico citopatológico. Atipias. Alterações precursoras. ABSTRACT Cervical cancer is the most common in the Brazilian female population and is the third leading cause of cancer death for women in the country and the third most common type of cancer among women. By owning a high rate of incidence and mortality and great epidemiological and social relevance, it is a serious public health problem. But shows great potential for prevention and cure if diagnosed and treated early. For lack of public disclosure and policies, there is no coverage of efficient risk population, so women do not adhere to basic care network and is not aware of the importance of cytological diagnosis. Why has not there are sufficient and effective strategies, to understand their promotion, prevention, early diagnosis, treatment and rehabilitation, there are still difficulties in accessing health services. Therefore, this study aims to address part of the existing studies on the topic, presenting the main recommendations and guidelines established for the screening and cytological diagnosis of atypical female genital tract and starting changes of cervical cancer, and demonstrate the importance of these strategies for improving the quality of life of Brazilian women. For this, a literature review prepared on the basis of studies already published research was conducted using laws, ordinances, guidelines, Ministry of Health, the National Cancer Institute, newspapers and magazines in the health field. A search methodology based on databases LILACS, MEDLINE and SciELO was used. Keywords: Cervical cancer. Cytological diagnosis. Atypicol. Precursor changes. LISTA DE FIGURAS Figura 1. Células superficiais. .............................................................................................. 30 Figura 2. Células intermediárias. .......................................................................................... 31 Figura 3. Células basais. ....................................................................................................... 32 Figura 4. Células parabasais. ................................................................................................ 32 Figura 5. Células endocervicais ciliadas e mucíparas. ........................................................... 33 Figura 6. Células metaplásicas. ............................................................................................ 34 Figura 7. Células endometriais. ............................................................................................ 34 Figura 8. Células de usuária de dispositivo intra-uterino (DIU). ........................................... 40 Figura 9. Metaplasia escamosa imatura. ............................................................................... 41 Figura 10. Células de reparação............................................................................................ 42 Figura 11. Quadro citológico de processo inflamatório. ........................................................ 43 Figura 12. Radiação. ............................................................................................................ 44 Figura 13. Lactobacillus sp. e citólise................................................................................... 45 Figura 14. Células escamosas atípicas de significado indeterminado, possivelmente não neoplásicas. .......................................................................................................................... 48 Figura 15. Células de reserva e metaplásicas imaturas, núcleo aumentado e irregular, hipercromasia e cromatina finamente irregular. .................................................................... 50 Figura 16. Células glandulares atípicas de significado indeterminado, possivelmente não neoplásicas e células glandulares atípicas de significado indeterminado, quando não se pode excluir lesão intraepitelial de alto grau. ................................................................................ 52 Figura 17. Células atípicas de origem indefinida, possivelmente não neoplásicas e células atípicas de origem indefinida, quando não se pode excluir lesão de alto grau. ....................... 54 Figura 18. Células cianofílicas com cavidade perinuclear vazia, circundada por citoplasma condensado e núcleo aumentado de tamanho: coilócitos verdadeiros; discariose. ................. 59 Figura 19. HPV: disceratose e LSIL. .................................................................................... 59 Figura 20. Histopatologia de paciente com HPV. ................................................................. 60 Figura 21. Lesão intraepitelial de alto grau com núcleos aumentados e contornos irregulares. ............................................................................................................................................ 67 Figura 22. Histopatologia de paciente com NIC III. .............................................................. 68 Figura 23. Histopatologia de paciente com carcinoma microinvasor: ruptura da membrana basal. ................................................................................................................................... 70 Figura 24. Histopatologia de paciente com carcinoma in situ................................................ 71 Figura 25. Adenocarcinoma in situ com bordos em plumagem. ............................................ 72 Figura 26. Neoplasia maligna: citoplasma aberrante. ............................................................ 75 Figura 27. Carcinoma invasor. ............................................................................................. 75 Figura 28. Histopatologia de paciente com carcinoma invasor. ............................................. 76 Figura 29. Adenocarcinoma invasor. .................................................................................... 78 SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................ 13 2 DESENVOLVIMENTO ................................................................................................... 15 2.1 ALTERAÇÕES CELULARES BENIGNAS (REATIVAS OU REPARATIVAS) ...... 40 2.2 METAPLASIA ESCAMOSA IMATURA .................................................................. 41 2.3 REPARAÇÃO ............................................................................................................ 41 2.4 ATROFIA COM INFLAMAÇÃO .............................................................................. 42 2.5 RADIAÇÃO ............................................................................................................... 43 2.6 ACHADOS MICROBIOLÓGICOS............................................................................ 44 2.7 CÉLULAS ESCAMOSAS ATÍPICAS DE SIGNIFICADO INDETERMINADO, POSSIVELMENTE NÃO NEOPLÁSICAS - ASC-US .................................................... 45 2.8 CÉLULAS ESCAMOSAS ATÍPICAS DE SIGNIFICADO INDETERMINADO, NÃO PODENDO SE EXCLUIR LESÃO INTRAEPITELIAL DE ALTO GRAU - ASC-H ...... 48 2.9 CÉLULAS GLANDULARES ATÍPICAS DE SIGNIFICADO INDETERMINADO, POSSIVELMENTE NÃO NEOPLÁSICAS – AG-US, E CÉLULAS GLANDULARES ATÍPICAS DE SIGNIFICADO INDETERMINADO, QUANDO NÃO SE PODE EXCLUIR LESÃO INTRAEPITELIAL DE ALTO GRAU .............................................. 50 2.10 CÉLULAS ATÍPICAS DE ORIGEM INDEFINIDA, POSSIVELMENTE NÃO NEOPLÁSICAS E CÉLULAS ATÍPICAS DE ORIGEM INDEFINIDA, QUANDO NÃO SE PODE EXCLUIR LESÃO DE ALTO GRAU ............................................................. 53 2.11 LESÃO INTRAEPITELIAL DE BAIXO GRAU - LSIL .......................................... 54 2.12 LESÃO INTRAEPITELIAL DE ALTO GRAU - HSIL ............................................ 60 2.13 LESÃO INTRAEPITELIAL DE ALTO GRAU, NÃO PODENDO EXCLUIR MICROINVASÃO OU CARCINOMA EPIDERMÓIDE INVASOR ............................... 68 2.14 CARCINOMA IN SITU ............................................................................................ 71 2.15 ADENOCARCINOMA IN SITU .............................................................................. 72 2.16 CARCINOMA EPIDERMÓIDE INVASOR ............................................................ 73 2.17 ADENOCARCINOMA INVASOR .......................................................................... 76 3 CONCLUSÃO .................................................................................................................. 82 4 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ............................................................................... 85 13 1 INTRODUÇÃO O câncer do colo do útero consolida-se cada vez mais como um grave problema de saúde pública. Sua incidência cresce progressivamente e muitos óbitos poderiam ser evitados com ações e programas de prevenção e detecção precoce (TAVARES; PRADO, 2006). A evolução lenta deste tipo de câncer, suas lesões precursoras e as atipias são estudadas através do exame citopatológico de Papanicolaou, cujo nome é referente ao seu criador, o médico grego Geórgios Papanicolaou, considerado o pai da citologia. É um exame seguro e eficiente, que torna possível perceber que o problema não deveria ter a extensão que possui. A prevenção deste tipo de câncer é muitas vezes mais barata que o tratamento de um câncer invasivo, que requer procedimentos de alto custo. (TAVARES; PRADO, 2006). Por ser um país com dimensões continentais e altos índices de desigualdade socioeconômica regional, o Brasil possui grande incidência de câncer do colo uterino, principalmente nas regiões norte e nordeste. É na região norte onde morrem mais mulheres por essa causa (TAVARES; PRADO, 2006). Por falta de políticas públicas, a população feminina do país fica sem saber que as atipias e lesões precursoras deste tipo de câncer podem ser curáveis em até 100% dos casos quando tratadas precoce e adequadamente. A detecção precoce tem sido uma estratégia segura e eficiente para modificar as taxas de incidência e mortalidade deste câncer. Quando o rastreamento é realizado dentro de padrões de qualidade, apresenta uma alta cobertura e as lesões iniciais são tratadas, a redução desta neoplasia pode chegar a 90%. Por isso, a implantação de exames preventivos periódicos deve ser priorizada (TAVARES; PRADO, 2006). Evidências epidemiológicas comprovaram que a infecção pelo vírus do papiloma humano (HPV) é causa necessária, mas não suficiente para a ocorrência do câncer do colo do útero. Baixas coberturas do exame de rastreamento e modificações na exposição aos fatores de risco para infecção pelo HPV tem sido descritos nas análises da situação epidemiológica do câncer do colo do útero (AYRES; SILVA, 2010). As campanhas governamentais de rastreamento criadas até hoje foram importantes, levaram as mulheres a procurar os serviços de saúde, principalmente no período de maior divulgação, entretanto, a conscientização de que o exame preventivo é um exame que se faz de modo sistemático, ainda não está evidente (TAVARES; PRADO, 2006). 14 O ideal seria um trabalho regular, sistematizado, com profissionais qualificados, que valorizassem, além do exame, a educação e a divulgação da prevenção para a população. As articulações entre as instituições ainda não estão claras, falta pactuar compromissos para integrar o sistema de saúde e como resultado disso, tem acontecido a descontinuidade e a ineficiência das ações (TAVARES; PRADO, 2006). Por estas questões, o presente estudo tem como objetivo demonstrar a importância da elaboração de estratégias e da divulgação de informações para adesão da mulher brasileira ao exame preventivo, e apresentar as recomendações e condutas estabelecidas até hoje para o rastreamento de alterações no colo do útero. É importante que estas recomendações estejam adaptadas à realidade epidemiológica de cada população, às condições de estrutura e à organização da rede de serviços de saúde de cada região, pois o objetivo é apresentar informações às mulheres, atualizar profissionais da área, promover a adesão da mulher à rede de atenção desde as ações preventivas até o tratamento, reduzir a incidência das alterações e a progressão para o carcinoma invasor e diminuir as repercussões físicas, psíquicas e sociais, melhorando a qualidade de vida da mulher brasileira. 15 2 DESENVOLVIMENTO O câncer não é uma doença única, é um conjunto de doenças diferentes resultante de alterações que determinam um crescimento celular desordenado, não controlado pelo organismo, que resulta na formação de um tumor, comprometendo tecidos e órgãos, tendo como principal via de disseminação a linfática (BRASIL, 2002). O prognóstico é tanto pior quanto mais indiferenciado é o tumor (SIQUEIRA et al., 2014). No caso do câncer do colo do útero, conhecido também como câncer ou carcinoma cervical, o órgão é acometido em uma parte específica, o colo, que fica em contato com a vagina (BRASIL, 2002). O colo uterino apresenta duas mucosas, a escamosa, que recobre a ectocérvice, o fundo de saco vaginal e a vagina, e é revestida pelo epitélio escamoso estratificado não queratinizado. E a glandular, que recobre a superfície interna do colo, sobretudo na endocérvice, que corresponde ao canal cervical, está situada entre o orifício externo, em sua abertura para a vagina, e o istmo uterino, que leva a cavidade uterina e é revestida por epitélio cilíndrico ou colunar mucíparo, sendo monoestratificado (KOSS; GOMPEL, 2006). O tumor se inicia a partir da replicação desordenada de células anormais na junção escamo colunar, a JEC (área do colo na qual o epitélio do tipo endocervical encontra o epitélio estratificado escamoso não queratinizado), do epitélio de revestimento do órgão, invadindo o tecido adjacente, o estroma (BRASIL, 2013a). Normalmente progride lentamente, por anos, antes de atingir o estágio invasor da doença, quando a cura se torna mais difícil, quando não impossível (BRASIL, 2006). Em casos raros, ele pode se desenvolver em períodos mais curtos, por isso é importante que seja feita sua detecção precoce (BRASIL, 2014a). Na infância e no período pós-menopausa, geralmente, a JEC situa-se dentro do canal cervical. Quando ocorre produção estrogênica, geralmente a JEC situa-se ao nível do orifício externo ou para fora deste (ectopia ou eversão), característica que a torna mais vulnerável às infecções de transmissão sexual. Nesta situação, o epitélio colunar fica em contato com um ambiente vaginal ácido, hostil às suas células. Assim, células subcilíndricas (de reserva) bipotenciais, através de uma metaplasia, se transformam em células mais adaptadas (escamosas), dando origem à um novo epitélio, situado entre os epitélios originais, chamado de terceira mucosa ou zona de transformação (zona T). Nesta região, pode ocorrer obstrução dos ductos excretores das glândulas endocervicais subjacentes, dando origem a estruturas císticas sem significado patológico, chamadas de Cistos de Naboth. É nessa zona onde se 16 localizam mais de 90% dos cânceres do colo do útero (LIMA; ALVES, 2009; BRASIL, 2013a). O processo metaplásico configura a substituição do epitélio cilíndrico original, por outro metaplásico. A metaplasia tem início com uma hiperplasia de células de reserva. Essas células de reserva se organizam em camadas estratificadas e com o tempo, passam a assumir as mesmas características das células escamosas. A área de metaplasia representa a região de reepitelização ou zona de transformação (ZT). Essa região possui grande modificação celular, apresenta duas fases distintas: imatura e madura, e também sofre agressões de agentes externos veiculados principalmente pelas relações sexuais. Isso possibilita o surgimento de um processo metaplásico atípico, podendo evoluir para uma displasia e até mesmo para um carcinoma, e envolve os processos reativos benignos até o adenocarcinoma in situ. São exemplos destes processos a hiperplasia microglandular, a endometriose, a metaplasia tubária e a reação de Arias Stella (AZEVEDO; SILVA, 2013). O termo displasia significa perda da forma ou forma diferente. Durante o processo de diferenciação, a célula primitiva, comprometida com uma linhagem específica, entra em um processo de amadurecimento através de estímulos externos (inflamatório, físico, químico, viral) ou sem uma causa definida, fazendo com que a expressão gênica do RNA mensageiro, que será sintetizado, seja anômala. As células formadoras dos tecidos que desenvolvem displasia sofrem alterações em suas características morfológicas. As displasias são mais evidentes em tecidos epiteliais, já em outros tecidos (mesoderma e sangue) a morfologia displásica não é tão expressa (AZEVEDO; SILVA, 2013). Nas displasias o processo de diferenciação ocorre dentro da proliferação normal, obedecendo ao ciclo celular. Poderá ocorrer uma hiperplasia, contudo é um processo clonal controlado. Esta é a principal diferença entre processos displásicos e processos neoplásicos: a célula consegue cumprir o seu programa de amadurecimento. A displasia de um modo geral mantém a estrutura do tecido, como esse tecido dá seguimento à estratificação, as células maduras são atingidas. Nas células das camadas inferiores o epitélio é mantido, porém também há displasia em células imaturas. Para que o processo displásico seja refletido nas camadas superiores é necessário que o núcleo discariótico (alterado) da célula imatura seja preservado imaturo, o conteúdo de DNA na célula discariótica é transferido das células imaturas para as células da camada superior do epitélio, permitindo apenas o desenvolvimento citoplasmático, compreendendo uma lesão de baixo grau. É possível também que a displasia se mantenha apenas nas camadas profundas do epitélio. Neste caso a displasia é entendida 17 como de alto grau, devido a maior possibilidade de proliferação das células primitivas (AZEVEDO; SILVA, 2013). Mesmo que a célula basal seja alterada, ela tenta se diferenciar desta forma em uma tentativa do epitélio ser mantido. A evolução desse processo é basicamente funcional, uma modificação gênica determina uma alteração de natureza clonal e pode em alguns casos sofrer regressão (AZEVEDO; SILVA, 2013). O desenvolvimento da lesão pré-cancerosa se dá de acordo com o sentido da proliferação celular, as lesões que são originadas no epitélio escamoso, junto a JEC, avançam para a ectocérvice conservando a maturação do epitélio original, já as lesões que partem do epitélio glandular migram para a endocérvice na forma de metaplasia escamosa, que apresenta uma maturação comprometida (AZEVEDO; SILVA, 2013). Existem duas principais categorias de carcinomas invasores do colo do útero, dependendo da origem do epitélio comprometido: o carcinoma epidermóide, tipo mais incidente e que acomete o epitélio escamoso (representa cerca de 80% dos casos), e o adenocarcinoma, tipo mais raro e que acomete o epitélio glandular (10% dos casos) (BRASIL, 2013a). Raramente produzem sintomas. Mas quando estão presentes, eles podem passar despercebidos como uma fina secreção vaginal aquosa que pode ser notada após a relação sexual. Quando ocorre secreção anormal, sangramento irregular ou sangramento depois da relação sexual, leucorreia e dor abdominal ou pélvica, com queixas urinárias ou intestinais, a doença pode estar em estágio avançado (SIQUEIRA et al., 2014). Sua origem também se dá por condições multifatoriais. Estes fatores causais podem agir em conjunto ou em sequência e determinam a regressão ou a persistência da infecção pelo Papilomavírus Humano (HPV), e também sua progressão para lesões precursoras ou câncer. São eles qualquer situação, hábito, condição ambiental ou fisiológica, que aumente a vulnerabilidade de um indivíduo ou grupo, quanto à doença ou ao estado não saudável. A resposta imune inata e humoral, a associação com Síndrome da Imunodeficiência Adquirida (AIDS), imunossupressão por transplantes de órgão sólidos, a ativação de proto-oncogenes ou inativação dos genes supressores de tumor, o polimorfismo da proteína p53, a idade, o tabagismo (dependendo do número de cigarros fumados por dia e início em idade precoce), o sobrepeso, a obesidade, o sedentarismo, o uso prolongado de contraceptivos orais e corticosteróides, a baixa ingestão de vitamina A e C, beta-caroteno e ácido fólico, o início precoce da atividade sexual, a multiplicidade de parceiros, a baixa escolaridade e o baixo 18 nível socioeconômico, a multiparidade, a higiene íntima inadequada, o histórico de DST e a infecção pelo HPV são alguns exemplos (SIQUEIRA et al., 2014). Já a prática de atividade física é um fator de proteção (FALCÃO et al., 2014). Segundo a Organização Mundial de Saúde, a OMS, a incidência deste tipo de câncer pode ocorrer na faixa etária de 20 a 29 anos, o risco aumenta nas mulheres entre 30 e 39 anos e atinge seu pico na faixa de 40 a 60 anos. Segundo Souto (2005), alguns tipos de Papilomavírus humano (HPV), nos últimos anos, estão sendo responsáveis pelo desenvolvimento de lesões e malignidade nas regiões que comumente infectam (SOUTO; FALHARI; CRUZ, 2005). De acordo com dados da OMS, o HPV é responsável por cerca de 5% a 10% de todos os cânceres do mundo. Sua infecção é considerada a doença sexualmente transmissível mais comum. Seu pico de incidência ocorre aos 20 anos e o pico de detecção de alterações ocorre aos 30 anos. Dados globais demonstraram que quase todas as pessoas entrarão em contato com o vírus em algum momento da vida. Estima-se que cerca de 80% das mulheres sexualmente ativas irão adquirir a infecção ao longo de suas vidas. Aproximadamente 291 milhões de mulheres no mundo são portadoras (BRASIL, 2015c). O HPV é um vírus que pertence à família Papillomaviridae, do gênero Papilomavírus. Não possui envelope, tem simetria icosaédrica e 52-55 nm de diâmetro, com capsídeo composto por 72 capsômeros e um genoma de DNA dupla fita circular, com cerca de 8.000 pares de bases. Mais de 200 tipos já foram identificados, cerca de 40 destes infectam o trato genital feminino e 13 tipos são reconhecidos como oncogênicos para o colo uterino pela Iarc (International Agency for Research on Cancer) (FERRAZ; SANTOS; DISCACCIATI, 2012; SOUTO; FALARI; CRUZ, 2005). É altamente contagioso, sendo possível infectar-se com uma única exposição. Infecta tanto as mucosas quanto os tecidos cutâneos não íntegros, podendo ser classificado segundo seu tropismo como mucosotrópicos (alto risco) ou cutaneotrópicos (baixo risco). A principal forma de contágio é pela via sexual, que inclui contato oral-genital, genital-genital ou mesmo manual-genital, por meio de abrasões ou microlacerações da pele e da mucosa. Também pode ser transmitido da mãe para filho no momento do parto e através das mãos contaminadas pelo vírus, objetos, toalhas e roupas, desde que haja secreção com vírus vivo em contato com pele ou mucosa não íntegra, independendo do sexo (BRASIL, 2015c). 19 Esta infecção, por si só, não representa uma causa suficiente para o surgimento da neoplasia, faz-se necessária sua persistência e, em sua maioria, regride espontaneamente, entre seis meses a dois anos após exposição (BAZZO et al., 2014). O sistema imunológico consegue combater de maneira eficiente alcançando a cura, com eliminação completa do vírus, principalmente entre os mais jovens, não chegando a apresentar manifestações. O vírus pode permanecer no organismo por vários anos também sem causar nenhuma manifestação (BRASIL, 2014a). No pequeno número de casos nos quais a infecção persiste, sendo causada por um subtipo viral oncogênico, pode ocorrer o desenvolvimento de lesões, cuja identificação e tratamento adequado possibilitam a prevenção da progressão para o câncer invasivo (BAZZO et al., 2014). Os tipos são classificados entre vírus de alto ou baixo risco oncogênico, de acordo com a propensão das células infectadas à transformação neoplásica, ou seja, estão relacionados ao comportamento do seu genoma no núcleo da célula hospedeira. HPVs de baixo risco oncogênico tendem a manter o seu DNA íntegro, circular e epissomal, diferente dos HPVs de alto risco oncogênico, cujas fitas de DNA circular se abrem, sofrem deleções e se integram ao genoma da célula hospedeira. Os tipos de HPV considerados de baixo risco oncogênico são representados principalmente pelos tipos 6, 11, 40, 42, 43, 54, 61, 70, 72, 81. Aqueles considerados de alto risco oncogênico, estando frequentemente associados à lesão intraepitelial de alto grau e ao carcinoma invasor, são representados principalmente pelos tipos 16, 18, 31, 33, 35, 39, 45,51, 52, 56, 58, 59, 68, 73 e 82. (SOUTO; FALARI; CRUZ, 2005; FERRAZ; SANTOS; DISCACCIATI, 2012) Os subtipos 16 e 18 são responsáveis por cerca de 70% dos casos de câncer do colo do útero em todo mundo e os subtipos 6 e 11 por 90% das verrugas anogenitais (BRASIL, 2015a). Os tipos de HPV são caracterizados por diferentes sequências de bases de nucleotídeos. Um novo tipo é reconhecido, quando a sequência de DNA difere mais de 10% dos tipos já existentes. Quando essas diferenças encontram-se entre 2 e 10%, define-se um subtipo e quando as diferenças são menores de 2%, define-se uma variante (ANDRADE, 2012). O ciclo normal da infecção pelo HPV passa por cinco etapas consecutivas: a infecção, a manutenção do genoma, a fase proliferativa, a amplificação genômica e a síntese e liberação de novas partículas virais (FERRAZ; SANTOS; DISCACCIATI, 2012). 20 Segundo Ferraro (2011) e Souto (2005), a infecção inicial por HPV ocorre nas células tronco, localizadas nas camadas mais baixas do epitélio estratificado, mediante um lento processo de endocitose, a partir da ligação a um receptor específico na superfície das células basais. As células da camada basal se dividem e, posteriormente, passam por um processo de diferenciação gerando células epiteliais maduras. As células de divisão transitória produzem células filhas que migram da camada basal, direcionando-se às camadas mais externas, diferenciando-se ao longo do trajeto. Após a entrada do HPV na célula, ocorre a perda do capsídeo e o transporte do genoma para o núcleo, onde vai persistir como DNA extracromossomial (epissomal), e o número de cópias virais aumenta, pois o processo de diferenciação celular não ocorre, mas as células continuam sintetizando DNA e expressando marcadores de proliferação. Ao se dividirem, estas células infectadas distribuem o DNA viral entre as células filhas. Uma das células filhas migra da camada basal e inicia o programa de diferenciação celular (ANDRADE, 2012; FERRARO et. al., 2011; FERRAZ; SANTOS; DISCACCIATI, 2012; SOUTO; FALARI; CRUZ, 2005). A montagem das partículas virais, o empacotamento do DNA celular e a liberação das partículas ocorrem na camada superficial. As outras células filhas continuam dividindo-se na camada basal e servem de reservatório de DNA viral para as próximas divisões celulares. Como a produção do HPV é restrita às células suprabasais, as células na camada basal não são lisadas pela produção de novos vírus, continuando a proliferação (ANDRADE, 2012; FERRARO et. al., 2011; FERRAZ; SANTOS; DISCACCIATI, 2012; SOUTO; FALARI; CRUZ, 2005). De acordo com Souto (2005), Ferraro (2011) e Ferraz (2012), o genoma do HPV possui regiões conhecidas como fases de leitura aberta (Open Reading Frames) e uma região não-codificadora. As fases de leitura aberta são organizadas em regiões: a região precoce (early), expressa logo após a infecção, composta pelos genes E1, E2, E4, E5, E6, E7, e a região tardia (late), composta pelos genes L1 e L2, que codificam as proteínas do capsídeo. A região não-codificadora é a LCR (Long Control Region), que varia de 400 a 1000 pares de base e está localizada entre as regiões L1 e E6. Nesta região, existem sequências estimuladoras e repressoras da transcrição viral, além da origem de replicação, sincrônica com o ciclo celular do hospedeiro. (FERRARO et al., 2011; FERRAZ; SANTOS; DISCACCIATI, 2012; SOUTO; FALARI; CRUZ, 2005) A expressão dos genes virais é regulada e dependente da diferenciação das células infectadas pelo HPV. Após entrada nas células hospedeiras, os genes E1 e E2, que codificam 21 proteínas que são vitais para a replicação do DNA viral e controle da transcrição gênica do vírus, são expressos primeiro. Estes genes também são responsáveis por manter o DNA viral como um epissoma. Além disso, regulam um número estável de 20 a 100 cópias do DNA do HPV por célula. E2 facilita a separação do genoma do HPV durante a divisão celular, resultando na distribuição do DNA do HPV nas células filhas, e está envolvido na promoção da montagem da partícula viral. A transcrição de E1 e E2 causa repressão de E6 e E7, permitindo a função de supressão tumoral da proteína retinoblastoma (pRb) e de controle da diferenciação da proteína p53, mantendo a homeostase epitelial. A proteína (ou gene supressor de tumor) p53 atua como uma das principais vias de controle do ciclo celular, interrompendo o ciclo em células com DNA alterado, reparando o DNA e induzindo a apoptose nas células cujo reparo do DNA não foi possível. A proteína E4 é expressa nos estágios tardios da infecção e tem um papel importante na alteração da matriz intracelular, maturação e liberação das novas partículas virais. As proteínas E5, E6 e E7 são importantes para a amplificação do genoma viral (FERRARO et al., 2011; FERRAZ; SANTOS; DISCACCIATI, 2012; SOUTO; FALARI; CRUZ, 2005). As regiões tardias L1 e L2 codificam as proteínas virais dos capsídeos durante os últimos estágios da replicação dos vírus. A proteína L1 é expressa após a L2 no ciclo de replicação viral e atua na montagem das partículas virais. A proteína L2 interage com E2, facilita o transporte da L1 para o núcleo e tem papel no encapsulamento do DNA viral (FERRARO et al., 2011; FERRAZ; SANTOS; DISCACCIATI, 2012; SOUTO; FALARI; CRUZ, 2005). O desenvolvimento da neoplasia está associado à perda da regulação do ciclo produtivo do HPV, evento observado em infecções persistentes pelo HPV de alto risco oncogênico, que tende a integrar o seu genoma ao da célula hospedeira (FERRAZ; SANTOS; DISCACCIATI, 2012). Se não há transcrição de E1 e E2, os genes E6 e E7 estarão disponíveis para, respectivamente, ligarem-se às proteínas p53 e pRb, inibindo a ação destes fatores celulares. A proteína E7 inibe a atividade da pRb, que forma complexos estáveis com o fator de transcrição E2F, resultando em efeitos antiproliferativos. Mas, o E2F quando livre, desencadeia o processo de replicação do DNA. A inativação da pRb pela proteína E7 do HPV resulta em um aumento da expressão de uma proteína conhecida como p16INK4, que tem sua expressão controlada pela pRb, nas células infectadas. A proteína p16INK4a exerce papel fundamental nos mecanismos de regulação do ciclo celular das células eucarióticas. Essa 22 molécula faz parte do controle da transição do ciclo celular, mediada pela pRb. Quando expressa, a p16INK4a tem efeito antiproliferativo. Os produtos dos genes E6 e E7 se ligam à p53, marcando-a para degradação, mediada por um processo proteossômico. Esta degradação compromete a integridade do DNA replicado, causando instabilidade cromossomal, imortalização e proliferação anormal das células transformadas, acúmulo de mutações e inibição da resposta imune das células tumorais, favorecendo o desenvolvimento do tumor (ANDRADE, 2012; FERRARO et al., 2011; FERRAZ; SANTOS; DISCACCIATI, 2012). A alta velocidade de proliferação das células infectadas que já não é mais restrita às camadas inferiores do epitélio, a perda de polaridade e maturação das células com perturbação da arquitetura tecidual, assim como a perda da capacidade de completar o ciclo produtivo do vírus, diferenciam as lesões de baixo grau, das lesões de alto grau e carcinoma provocados por HPV de alto risco oncogênico (FERRAZ; SANTOS; DISCACCIATI, 2012). Estima-se que somente cerca de 5% das pessoas infectadas pelo HPV desenvolverá alguma forma de manifestação, desencadeada pela diminuição da resistência do organismo e pela multiplicação do vírus. O período necessário para surgirem as primeiras manifestações é de aproximadamente 2 a 8 meses, mas pode demorar até 20 anos. Por este motivo não é possível determinar se o contágio foi recente ou antigo (BRASIL, 2014a). Elas podem se manifestar de duas formas: clínica e subclínica. As clínicas podem ser únicas ou múltiplas, restritas ou difusas, se apresentam como verrugas ou lesões exofíticas, são tecnicamente denominadas condilomas acuminados e popularmente chamadas "crista de galo", "figueira" ou "cavalo de crista". Têm aspecto de couve-flor e tamanho variável e são visíveis a olho nu. Nas mulheres podem aparecer no colo do útero, vagina, vulva, região pubiana, perineal, perianal, ânus. E menos comumente podem estar em áreas extragenitais como conjuntiva, mucosa nasal, oral e laríngea. Dependendo do tamanho e localização, podem ser dolorosas, friáveis e pruriginosas. Já as subclínicas (não visíveis ao olho nu) podem ser encontradas nos mesmos locais e não apresentam nenhum sintoma ou sinal. A verruga genital é altamente contagiosa e a infecção subclínica tem menor poder de transmissão. Nas infecções latentes há detecção do DNA, mas não há expressão viral, e por isso, estas infecções não são transmissíveis. O desenvolvimento de qualquer tipo de lesão clínica ou subclínica em outras regiões do corpo é raro (BRASIL, 2002; BRASIL, 2015c). Segundo Ferraro (2011), quando o vírus infecta uma célula epitelial, pode resultar em uma infecção latente, produtiva ou transformante. Na latência, há persistência do DNA circular, com baixo número de cópias epissomais, que se duplicam junto com as células 23 basais. O tempo entre o início da infecção produtiva e a liberação das partículas virais é de cerca de três semanas, tempo necessário para o ceratinócito basal sofrer diferenciação completa e descamação. Já na infecção transformadora, não há formação de partículas virais infectantes e o DNA viral integra-se ao genoma do hospedeiro e, quando interfere na homeostase do ceratinócito, pode transformá-lo e causar alterações morfológicas e/ou funcionais progressivas, que atingem o máximo de dano quando há o estabelecimento do carcinoma (FERRARO, et. al., 2011). O diagnóstico das verrugas ano-genitais pode ser feito por meio do exame clínico e as lesões subclínicas podem ser diagnosticadas por meio de exames laboratoriais ou do uso de instrumentos com poder de magnificação (lentes de aumento), após a aplicação de reagentes químicos para contraste (BRASIL, 2015c). As adolescentes possuem um risco três vezes maior de contrair o vírus. Isso e a elevada frequência de infecções por microrganismos se dão pelo aumento da precocidade nas relações sexuais, aumento no número de parceiros, falta do uso constante do preservativo, uso inadequado de métodos contraceptivos de barreira, como anticoncepcionais orais (associados ao aumento da transcrição de tipos de HPV), e à maior suscetibilidade ao trauma durante a relação sexual devido à produção diminuída de muco cervical (BAZZO et al., 2014). Nesta fase da vida a atividade biológica cervical está em nível máximo. O epitélio colunar da endocérvice está mais exposto. A replicação celular e substâncias presentes no meio cervical facilitam a infecção (PINTO; BARBOSA; PAIVA, 2012). Existe também uma maior exposição da mucosa genital feminina aos fluidos seminais e, nas adolescentes pós-menarca, existe a imaturidade do colo do útero associada a um pH vaginal elevado (LIMA; ALVES, 2009). Além de variáveis como o tabagismo (metabólicos carcinogênicos do tabaco nas secreções cervicais, dano genômico à célula por genotoxinas, imunossupressão local que permite maior facilidade na penetração do vírus nas células), gravidez, higiene íntima inadequada e nível social, citados anteriormente, a desnutrição, o uso de álcool, radiação ultravioleta e história anterior de verrugas genitais, também podem influenciar no aparecimento das infecções subclínicas (PINTO; BARBOSA; PAIVA, 2012). Aspectos relacionados à imunidade e à genética podem influenciar os mecanismos que determinam a regressão ou a persistência da infecção e também a progressão para lesões precursoras ou câncer (BRASIL, 2015c). 24 A infecção prévia pelo HIV e coinfecções podem atuar como cofatores na ativação de mecanismos de transformação celular ou deprimindo a imunidade local do trato genital (PINTO; BARBOSA; PAIVA, 2012). A ocorrência de infecção pelo HPV durante a gravidez não implica em má formação do feto. O parto normal não é contra-indicado, pois, apesar de ser possível a contaminação do bebê, o desenvolvimento de lesões é muito raro. Pode também ocorrer contaminação antes do trabalho de parto e a opção pela cesariana não garante a prevenção da transmissão da infecção. A via de parto (normal ou cesariana) deverá ser determinada pelo médico após análise individual de cada caso (BRASIL, 2015c). A OMS ressalta que a melhor forma de prevenir a infecção em jovens é a vacinação. Ela prioriza meninas de 9 a 13 anos de idade, que provavelmente não iniciaram atividade sexual, e portanto, nunca entraram em contato com o vírus. Para garantir proteção contra os principais subtipos de HPV, a vacina será ofertada para adolescentes do sexo feminino da faixa etária de 9 a 11 anos, neste ano de 2015, nas unidades básicas de saúde e também em escolas públicas e privadas, de forma articulada com as unidades de saúde de cada região. Sua implantação é gradativa. Em 2014, a população alvo da vacinação foi composta por adolescentes de 11 a 13 anos e a partir de 2016, serão vacinadas as meninas de 9 anos de idade. Elas devem tomar todas as doses previstas na vacinação: a segunda, dois meses depois da primeira, e a terceira seis meses depois. No entanto, o Ministério da Saúde irá adotar o esquema estendido: a segunda, seis meses depois da primeira, e a terceira, de reforço, cinco anos depois (BRASIL, 2015c). Com isso, os meninos passam a ser protegidos indiretamente com a vacinação no grupo feminino (BRASIL, 2014a). Existem duas vacinas profiláticas contra HPV aprovadas e registradas pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária, a ANVISA e que estão comercialmente disponíveis: a vacina quadrivalente, da empresa Merck Sharp & Dohme (nome comercial Gardasil), que confere proteção contra HPV 6, 11, 16 e 18, e a vacina bivalente, da empresa Glaxo-SmithKline (nome comercial Cervarix), que confere proteção contra HPV 16 e 18 (BRASIL, 2015c). A vacina quadrivalente é indicada para mulheres e homens entre 9 e 26 anos de idade e vacina bivalente é indicada para mulheres entre 10 e 25 anos de idade. No momento as clínicas de vacinação ainda não estão autorizadas a aplicar as vacinas em faixas etárias superiores às estabelecidas pela ANVISA (BRASIL, 2015c). 25 O Ministério da Saúde implantou no calendário vacinal, em 2014, a vacina quadrivalente, com 98% de eficácia (BRASIL, 2015c). Ela é contra-indicada para gestantes, indivíduos acometidos por doenças agudas e com hipersensibilidade aos componentes (princípios ativos ou excipientes) de imunobiológicos (BRASIL, 2015c). Na rede privada, as vacinas foram implantadas antes da vacinação chegar na rede pública. O custo é alto, pois o valor das três doses ultrapassa mil reais (BRASIL, 2015c). Para produção desta vacina são utilizadas técnicas moleculares avançadas nas quais a proteína viral L1 de cada tipo de vírus é produzida em laboratório. Estas proteínas se organizam espontaneamente formando os capsômeros e, em seguida, uma estrutura semelhante ao vírus inteiro que é chamada de Partícula Semelhante a Vírus (VLP Virus Like Particules). As VLPs são mais imunogênicas que as proteínas solúveis utilizadas nas vacinas convencionais e não apresentam potencial infeccioso nem oncogênico, pois não possuem material genético viral. Para produção das VLPs, foi feito inicialmente cultivo do HPV de interesse em laboratório, clonagem do gene L1 de cada tipo de HPV e, em seguida, foi feita a expressão de cada uma das proteínas L1 recombinantes, e posterior purificação da VLP (VEZPA JUNIOR, 2006). A imunização não substitui a realização do exame preventivo e nem o uso do preservativo nas relações sexuais. Mas apesar de sempre recomendado, o uso de preservativo (camisinha) durante todo contato sexual, com ou sem penetração, não protege totalmente, pois não cobre todas as áreas passíveis de serem infectadas. Na presença de infecção na vulva, na região pubiana, perineal e perianal ou na bolsa escrotal, o HPV poderá ser transmitido apesar do uso do preservativo. A camisinha feminina, que cobre também a vulva, evita mais eficazmente o contágio se utilizada desde o início da relação sexual (BRASIL, 2015c). As mulheres vacinadas, quando alcançarem a idade preconizada, deverão realizar o exame preventivo, pois a vacina não protege contra todos os subtipos oncogênicos do HPV (BRASIL, 2014a). Nenhuma das vacinas é terapêutica, ou seja, não há eficácia contra infecções ou lesões já existentes (BRASIL, 2014a). Mulheres que iniciaram a atividade sexual ou que foram previamente tratadas podem se beneficiar da vacina e outras não. Nestes casos a decisão sobre a vacinação deve ser individualizada, levando em conta as expectativas e a relação custo-benefício pessoal. Não existe risco à saúde caso uma pessoa que já tenha tido contato com o HPV for vacinada (BRASIL, 2015c). 26 Existem ainda lacunas de conhecimento sobre a vacinação, relacionadas à adesão ao esquema vacinal, à duração da eficácia, à eventual necessidade de dose de reforço e à proteção cruzada para outros tipos virais (BRASIL, 2013a). O Sistema Único de Saúde, o SUS, oferece Unidades Básicas de Saúde, onde as pacientes são atendidas, examinadas, diagnosticadas e encaminhadas, caso apresentem algum tipo de alteração que necessite de encaminhamento (BRASIL, 2011). Na rede privada, as mulheres devem pagar ou utilizarem seus convênios para serem atendidas e examinadas, em consultórios particulares. A vantagem desta rede é que o responsável pela consulta pode fazer o uso de alguns métodos complementares que não estão dispostos no atendimento da rede pública (BRASIL, 2015c). No Brasil, a estratégia adotada no atendimento para rastreamento de alterações é o exame de Papanicolaou, disponível nos postos de coleta em todos os Estados da Federação, conhecido também como exame citopatológico preventivo, citologia oncótica ou colpocitologia oncótica (BRASIL, 2011). É um procedimento gratuito, seguro, simples, de baixo custo para o governo e consultórios, de fácil execução e fácil aceitação pela população, indolor, não-invasivo, rápido, eficaz, com sensibilidade e especificidade comprovadas. Pode, no máximo, causar um pequeno desconforto que diminui se a mulher conseguir relaxar e se o exame for realizado com boa técnica e de forma delicada (BRASIL, 2015c). Seu diagnóstico deve ser confirmado pela histopatologia, através da biópsia incisional (retirada de um ou mais fragmentos de área alterada) dirigida por colposcopia, biópsia em cone, curetagem endocervical ou biópsia excisional através da cirurgia de alta freqüência (CAF). Dependendo do diagnóstico, a paciente deve ser encaminhada para outras Unidades de Saúde (BRASIL, 2013a). É um exame que analisa as células do colo do útero através de um esfregaço ou raspado de células esfoliadas do epitélio cervical e vaginal (SIQUEIRA et al., 2014). Pode detectar alterações celulares de natureza degenerativa, reativa e reparativa, alterações celulares de significado indeterminado (em células escamosas e glandulares), pode também identificar agentes biológicos, detectar lesões intraepiteliais cervicais, detectar neoplasias malignas, avaliar quadros hormonais e dar seguimento dos casos tratados (BRASIL, 2015a). Permite frequentes repetições de amostragem celular, importante para a avaliação da progressão ou da regressão após tratamento de uma enfermidade, porque não provoca dano tecidual (KOSS; GOMPEL, 2006). 27 Os esfregaços representam uma superfície corporal maior que uma biópsia. Este método pode acessar áreas que uma biópsia não alcança, como por exemplo, a pelve renal. As estruturas celulares de uma célula isolada no esfregaço sofrem menor distorção do que na biópsia. Também é um método que permite a visão tridimensional, que é conseguida focalizando-se o microscópio para cima e para baixo (SOLOMON; NAYAR, 2005). A determinação de certos estados hormonais é melhor avaliada pela citologia do que na biópsia. Os esfregaços permitem avaliar melhor a natureza de inflamação e infecções, como por exemplo, fungos, leveduras e outros parasitas, que são facilmente reconhecidos, podendo-se fazer colorações especiais como nos tecidos. As alterações de radiação e outras formas de terapias ficam bem evidenciadas (KOSS; GOMPEL, 2006). Mas este exame possui alguns limites tais como a qualidade da coleta, preparo inadequado dos esfregaços, defeitos de fixação e coloração, inexperiência, fadiga e falta de atenção do observador, células esfoliadas que podem não representar a verdadeira natureza da lesão, como por exemplo, células cancerosas pouco diferenciadas são frequentes, como as células esfoliadas de uma neoplasia de componentes mistos. As amostras de células podem ser originadas de um local não adequado, como por exemplo, obter-se células hepáticas na punção de líquido ascítico. A extensão de uma lesão pode ser calculada pela citologia, pois não há correlação entre o número de células esfoliadas e o tamanho da lesão. Mas a localização exata de uma lesão não pode ser definida, como por exemplo, uma célula escamosa maligna no escarro pode ser da mucosa oral, da faringe, laringe ou brônquios (SOLOMON; NAYAR, 2005). A interpretação citológica é subjetiva, baseada na interpretação individual do patologista ou citopatologista, portanto os critérios morfológicos podem variar de um observador para o outro (SOLOMON; NAYAR, 2005). O teste de Papanicolaou requer uma estrutura de laboratório, com controle de qualidade interno e externo, treinamento de alta qualidade e educação continuada dos profissionais para garantir a eficiência e um sistema de comunicação dos resultados para a mulher. Quando há falhas em uma ou mais dessas áreas, situação comum nos países em desenvolvimento, o rastreamento tem impacto positivo inferior ao esperado (BRASIL, 2010). A coleta dos esfregaços é representada pela coleta para esfregaço vaginal, que consiste em recolher células que descamaram espontaneamente no fundo de saco posterior da vagina e superior (hormonal), e para esfregaço cervical, que consiste em raspar a mucosa de modo a 28 soltar as células da ectocérvice (com auxílio da espatúla de Ayre) ou da endocérvice (escovação endocervical) (SOLOMON; NAYAR, 2005). Para isso, é introduzido um espéculo vaginal e procede-se à escamação ou esfoliação da superfície externa e interna do colo (BRASIL, 2008). Os esfregaços nas lâminas devem ser fixados imediatamente, preferencialmente com álcool a 96%, para preservação do estado morfológico das células e para evitar a dessecação, que deforma as células e altera suas afinidades tintoriais. Os exames devem ser enviados ao laboratório o mais breve possível (SOLOMON; NAYAR, 2005). Uma amostra satisfatória é constituída de um número adequado de células bem preservadas, sem hemácias ou células do estroma devido a uma abrasão excessivamente vigorosa, presença de células endocervicais e/ou metaplásicas (KOSS; GOMPEL, 2006). Já a amostra considerada insatisfatória pode ser rejeitada por alguns motivos, como identificação incorreta, lâmina quebrada, material acelular ou hipocelular, células muito obscuras, muita quantidade de sangue, artefatos de dessecamento, grande número de leucócitos, contaminantes externos, sobreposição celular (KOSS; GOMPEL, 2006). Qualquer amostra com células anormais é, por definição, satisfatório para avaliação. Se existe uma preocupação com a possibilidade do comprometimento da amostra, pode-se anexar um adendo indicando que não é possível excluir uma anormalidade mais grave (SOLOMON; NAYAR, 2005). Nos casos de mulheres grávidas, não se deve perder a oportunidade para a realização do rastreamaento. Pode ser feito em qualquer período da gestação, preferencialmente até o 7º mês. A coleta deve ser feita com a espátula de Ayre, sem usar escova de coleta endocervical. E para mulheres virgens, a coleta não deve ser realizada na rotina. A ocorrência de condilomatose na genitália externa, principalmente vulvar e anal, é um indicativo da necessidade de realização do exame do colo, devendo-se ter o devido cuidado e respeitar a vontade da mulher. E para mulheres submetidas à histerectomia total, recomenda–se a coleta de esfregaço de cúpula vaginal. Na histerectomia subtotal a rotina de coleta deve ser a habitual (BRASIL, 2008). A coleta também deve ser feita quando a mulher não souber informar sobre o resultado do exame anterior, seja por desinformação ou por não ter buscado seu resultado (BRASIL, 2008). É necessário ressaltar que a presença de colpites, corrimentos ou colpocervicites pode comprometer a interpretação da citopatologia. A presença de processo inflamatório intenso 29 prejudica a qualidade da amostra. Nesses casos, a mulher deve ser tratada e retornar para coleta (BRASIL, 2008). Se for improvável o seu retorno, a oportunidade da coleta não deve ser desperdiçada. Nesse caso, quando é possível a investigação para DST, por meio do diagnóstico bacteriológico, por exemplo, bacterioscopia, esta deve ser feita inicialmente. A coleta para exame citopatológico deve ser feita por último (BRASIL, 2008). Nas situações em que não for possível a investigação, o excesso de secreção deve ser retirado com algodão ou gaze, embebidos em soro fisiológico, e só então deve ser procedida a coleta para o exame citopatológico (BRASIL, 2008). O esfregaço pode apresentar inúmeras características. Entre elas estão a discariose, uma atipia nuclear ou núcleo irregular, com citoplasma maduro, e a displasia, que descreve as atipias celulares do epitélio malpighiano ou metaplásico, menos marcadas que as dos carcinomas (AZEVEDO; SILVA, 2013). Como exemplos de alterações nucleares (discariose) estão o aumento da relação núcleo/citoplasma, a hipercromasia, a bi, tri ou multinucleação, a carioteca espessada, por vezes irregular (lobulada), a cromatina uniforme granulosa, podendo ocorrer a presença de cromocentros, a ausência de nucléolos e espaços intercromatínicos, cariomegalia, edema nuclear, espessamento da membrana nuclear, cariopicnose, cariorrexe, cariólise (AZEVEDO; SILVA, 2013). O citoplasma de células escamosas, discarióticas, é preservado de acordo com a estratificação do epitélio. Algumas vezes é possível notar formas poligonais em células maduras. Na metaplasia com discariose predominam as formas redondas ou ovais. Pode apresentar-se denso e/ou cavado (coilócito), com coloração cianofílica. Na displasia queratinizante, o citoplasma é denso, corando-se de cor amarelada. Também são características morfológicas do citoplasma a metacromasia, pseudoeosinofilia, perda da transparência, bordos citoplasmáticos imprecisos, citomegalia, vacuolização, halos perinucleares, esgarçamento do citoplasma (AZEVEDO; SILVA, 2013). Alguns elementos podem ser encontrados na lâmina, como polimorfonucleares, raros são os esfregaços sem; histiócitos gigantes multinucleados, vistos nos esfregaços na pósmenopausa, cervicites crônicas e pós-radioterapia; núcleo redondo, oval ou reniforme; citoplasma delicado, com limite pouco definido; linfócitos, vistos nas cervicites crônicas (foliculares); muco; material amorfo cianofílico ou eosinofílico aprisionando células e leucócitos; hemácias; flora bacteriana; espematozóides; artefatos; fungos de contaminação; 30 mitose; multinucleação com e sem amoldamento; escamas anucleadas; pus; raros fibroblastos; (AZEVEDO; SILVA, 2013). O epitélio escamoso estratificado não queratinizado está presente nos lábios menores da vulva, na vagina e na ectocérvice. Ele é formado por três camadas: a camada profunda, a camada intermediaria e a camada superficial (KOSS; GOMPEL, 2006). A camada superficial é formada por células superficiais, as mais maduras do epitélio escamoso e com alto poder de esfoliação. Quanto maior o teor de estrógeno, maior a quantidade de células superficiais. Possuem atividade mitótica nula, com núcleo único, central e picnótico (pequeno), capacidade reprodutiva nula, capacidade de esfoliação muito alta, descamam em placas e isoladamente, tem o citoplasma eosinofílico (transparente), raras vezes, cianofilico, podendo conter grânulos citoplasmáticos e forma poligonal (bordas citoplasmáticas acentuadas com tendência para linhas retas, bem delineadas). Frequentemente possuem halo perinuclear e relação núcleo/citoplasma diminuída. São células grandes, com aproximadamente 32 a 34 micrômetros de diâmetro (KOSS; GOMPEL, 2006). Podem ser encontradas escamas, células escamosas superficiais anucleadas, hiperqueratinizadas, com coloração alaranjada e citoplasma frequentemente pregueado. Seu aumento representa processo patológico no epitélio escamoso estratificado não queratinizado (leucoplasia) (AZEVEDO; SILVA, 2013). Figura 1. Células superficiais. Fonte: Imagem cedida pelo Laboratório de Patologia e Citologia Aplicada (LAB). A camada intermediária é formada por células intermediarias ricas em glicogênio e se apresentam em grande quantidade na presença de progesterona. Possuem atividade mitótica baixa ou nula, capacidade reprodutiva baixa, capacidade de esfoliação alta, citoplasma 31 cianofílico claro (transparente), mas raras vezes pode ser eosinofílico, pode conter um ou mais vacúolos pequenos e pode ser pregueado, especialmente durante a fase lútea do ciclo menstrual. Possuem forma poligonal (bordas citoplasmáticas acentuadas, com tendência para linhas retas), são células grandes, com aproximadamente 30 a 32 micrômetros de diâmetro, ocasionalmente maiores, com núcleo pequeno em relação às células basais e parabasais, ocupando 1/4 a 1/5 da área celular, vesiculoso e geralmente oval, com cromatina finamente granular e uniformemente distribuída (cordão cromatínico), sem nucléolos, com disposição celular em agrupamentos e isoladas. Há uma célula intermediária pequena denominada navicular (devido sua aparência com um barco). O aumento de glicogênio aumenta a proporção destas células, com núcleo deslocado para a periferia (gravidez e pré-menopausa). A digestão do glicogênio pelos lactobacilos (Bacilos de Doderlein) causa citólise e há aumento de núcleos nus na fase pós-ovulatória e gravidez (KOSS; GOMPEL, 2006). Figura 2. Células intermediárias. Fonte: Imagem cedida pelo Laboratório de Patologia e Citologia Aplicada (LAB). A camada profunda é formada pelas células basais e parabasais. Geralmente, as células basais se apresentam com uma ou duas fileiras de células e as células parabasais com varias fileiras de células (KOSS; GOMPEL, 2006). As células basais (profundas) tem origem embrionária, reprodução constante e intensa e baixa capacidade de esfoliação. São pequenas, com aproximadamente 10 a 16 micrômetros de diâmetro, arredondadas e de citoplasma cianofílico, com núcleo arredondado ou ovalado e com cromatina abundante, finamente granular e uniformemente distribuída. Tem a relação núcleo/citoplasma aumentada (KOSS; GOMPEL, 2006). 32 Figura 3. Células basais. Fonte: Imagem cedida pelo Laboratório de Patologia e Citologia Aplicada (LAB). As células parabasais são pouco diferenciadas e tem capacidade de reprodução menor que as basais, capacidade de esfoliação maior que as basais, e tem aproximadamente 16 a 28 micrômetros de diâmetro. Elas possuem uma leve tendência a forma oval, embora ainda possam ser arredondadas, vistas frequentemete isoladas, na raspagem se apresentam com frequência agrupadas, com aparência estirada, com citoplasma cianofílico e denso, com afinidade por azul (mais claro que as basais), núcleo arredondado ou ovalado, vesiculoso, com cromatina menos ativa, mais ainda granular e uniformemente distribuída (menos que a metade do volume celular), e raramente apresenta um nucléolo. A relação núcleo/citoplasma é ligeiramente aumentada. Estão presentes no esfregaço atrófico ou de mulheres na pósmenopausa, com cervicite com erosão, no pós-parto e na lactação (KOSS; GOMPEL, 2006). Figura 4. Células parabasais. Fonte: Imagem cedida pelo Laboratório de Patologia e Citologia Aplicada (LAB). 33 O epitélio colunar é constituído de células glandulares cilíndricas e mucíparas, células ciliadas e células de reserva pluripotentes (KOSS; GOMPEL, 2006). Células cilíndricas endocervicais apresentam citoplasma transparente e núcleo esférico. Tem formas isoladas ou arranjos paralelos ou paliçadas, forma aplainada (achatada), forma agrupamento de células poligonais “favo de mel”. São colunares ou prismáticas (aproximadamente 15µm no eixo maior). Na fase estrogênica o citoplasma é cianofílico, bem definido e abundante, com núcleo elíptico ou esférico, vesicular e excêntrico. A cromatina é fina. Na fase secretora o citoplasma é claro e edemaciado, o muco desloca o núcleo para a periferia. É considerada por alguns como selo de qualidade da colheita cervical. As ciliadas mostram cílios na placa terminal. Estão localizadas no canal cervical do colo uterino (AZEVEDO; SILVA, 2013). Figura 5. Células endocervicais ciliadas e mucíparas. Fonte: Imagem cedida pelo Laboratório de Patologia e Citologia Aplicada (LAB). As células metaplásicas tem núcleo redondo ou oval, medem 8 a 10mm e situam-se no centro, tem cromatina finamente granular com alguns cromocentros, citoplasma denso, cianofílico e às vezes vacuolizado, com pouco glicogênio, apresentam-se isoladas ou agrupadas (mosaico) (AZEVEDO; SILVA, 2013). 34 Figura 6. Células metaplásicas. Fonte: Imagem cedida pelo Laboratório de Patologia e Citologia Aplicada (LAB). As células endometriais são originadas do endométrio descamado. Estão presentes nos esfregaços cervicovaginais até o 120º dia do ciclo. Após esta data e após menopausa representam uma patologia benigna ou maligna. Podem ser encontrados histiócitos ao seu redor. As formas variam de acordo com o ciclo menstrual, mas são menores que as células endocervicais. É frequente a superposição nuclear. São menores e com citoplasma menos abundante que o das endocervicais, pouco definido (vacúolos raros), núcleo central redondo ou oval e menor, cromatina finamente granular e às vezes hipercromática. Descamam em aglomerados e isoladamente. Estão localizadas na cavidade uterina e estão dispostas em aglomerados tridimensionais ou isoladas (AZEVEDO; SILVA, 2013). Figura 7. Células endometriais. Fonte: Imagem cedida pelo Laboratório de Patologia e Citologia Aplicada (LAB). 35 No conteúdo cervicovaginal normal predominam as células pavimentosas, células colunares em pequeno número. No período menstrual, células colunares endometriais e, excepcionalmente, células tubárias. Há presença de detritos celulares, como a flora bacteriana variada, com predomínio de bacilos de Doderlein, leucócitos polimorfonucleares nos esfregaços da segunda fase do ciclo menstrual e na gestação (em número pequeno), hemácias na menstruação e em número reduzido, podem ocorrer no inter-menstruo (KOSS; GOMPEL, 2006). O volume do conteúdo é variável, sendo mais escasso na infância e senilidade, abundante na mulher grávida. Na infância o epitélio é atrófico, com camadas celulares reduzidas. Quando exagerado, pode caracterizar a leucorréia. A consistência é cremosa e pastosa, em esfregaços citolíticos pode apresentar mais fluido e pode ter cor ligeiramente esbranquiçada (KOSS; GOMPEL, 2006). Um exame complementar ao exame preventivo é a colposcopia, que consiste na visualização do colo através do colposcópico, após a aplicação de soluções de ácido acético, entre 3% e 5%, e lugol (teste de Schiller). É um método óptico para exame do trato genital inferior ou para orientar biópsias iluminado com magnificação intermediária entre o olho desarmado e o pequeno aumento do microscópio (BRASIL, 2010; KOSS; GOMPEL, 2006). O acido acético 3%, utilizado na colposcopia, tem como finalidade afastar o muco e oferecer um acesso melhor. Um filtro esverdeado ajuda a descobrir as mudanças vasculares, que acompanham as mudanças patológicas. Esta técnica de inspeção visual simples é mais sensível e menos específica que a citologia, tendo como vantagens o baixo custo, execução por profissionais não médicos e resultado imediato (BRASIL, 2006). O teste de Schiller ou solução de Lugol é usado para verificar neoplasias no colo do útero. O iodo é glicofílico, captado por epitélios com glicogênio. Ele fixa sobre o revestimento do exocolo resultando assim em uma coloração marrom. Se o exocolo não corar (não ficar um marrom escuro) em algumas regiões, se entende como colo patológico suspeito. Neoplasias não coram (área amarelo-mostarda) (KOSS; GOMPEL, 2006). Recomenda-se que a colposcopia seja sempre diferencial, isto é, não se restrinja à simples observação e descrição dos achados, mas que seja suficientemente rigorosa e pormenorizada para melhor dirigir o ato da biópsia localizando o epicentro da lesão, o ponto mais significante, aquele com maior probabilidade de corresponder ao substrato histopatológico sugerido pelo achado colposcópio. Apresenta alta sensibilidade e baixa especificidade, o que causa alta taxa de diagnósticos e tratamentos desnecessários. Ela é, 36 portanto, um método desfavorável como a primeira escolha na condução das pacientes que apresentam alterações escamosas atípicas de significado indeterminado possivelmente não neoplásico. (BRASIL, 2006) Na colposcopia, a visualização da cérvice com um aumento de 10 a 20x permite avaliar o tamanho e as margens de uma zona de transformação anormal e determinar a extensão no canal endocervical (BRASIL, 2006). O profissional vai utilizar o colposcópio quando obtiver casos anormais de Papanicolaou, ele é um grande aliado no diagnostico e tratamento do HPV. O principal objetivo deste exame é detectar a presença de lesões intraepiteliais de alto grau e neoplasias invasivas (SOLOMON; NAYAR, 2005). A colposcopia é realizada nos serviços de atenção secundária, compostos por unidades ambulatoriais, que podem ou não estar localizadas na estrutura de um hospital, e serviços de apoio diagnóstico e terapêutico, responsáveis pela oferta de consultas e exames especializados. Esses serviços devem fornecer um relatório para a equipe da Atenção Básica em relação à alta. Esse relatório deve informar os procedimentos realizados, o diagnóstico, bem como orientações com relação ao seguimento e ao acompanhamento dessa usuária (BRASIL, 2011). Preferencialmente, a colposcopia não deve se limitar ao estudo do colo do útero, mas também da vagina, vulva, região perineal e perianal, representando, dessa forma, um avanço propedêutico na infecção viral por HPV (BRASIL, 2011). Deve ser considerada normal a ausência de qualquer lesão colposcópica e onde foi possível visualizar a JEC em todos os seus limites. Nos achados colposcópicos normais podem ser visualizados os epitélios escamoso original, colunar e a zona de transformação (BRASIL, 2011). Deve ser considerada anormal o reconhecimento de alterações epiteliais, vasculares ou associações de ambas e a JEC foi visualizada em todos os seus limites. Nos achados colposcópicos anormais podem ser visualizados epitélio aceto-branco plano, epitélio acetobranco denso, mosaico fino, mosaico grosseiro, pontilhado fino, pontilhado grosseiro, área iodo parcialmente positiva, área iodo negativa, vasos atípicos, e encontradas alterações colposcópicas sugestivas de câncer invasivo (BRASIL, 2011). Características colposcópicas sugestivas de alterações metaplásicas são a superfície lisa com vasos finos, de calibre uniforme; alterações aceto-brancas leves; área iodo negativa ou parcialmente positiva com solução de Lugol (BRASIL, 2011). 37 Alguns exemplos de colposcopia podem ser considerados insatisfatórios por conter junção escamocolunar não visível, inflamação severa, atrofia severa, trauma, cérvice não visível (BRASIL, 2011). Pode ser encontrada também uma miscelânea (mistura de coisas), como condiloma, queratose, erosão, inflamação, atrofia, deciduose, pólipo (BRASIL, 2011). Existe também o teste azul de toluidina, que se baseia na afinidade desse corante por estruturas nucleotídicas. Quando for passado no colo uterino e resultar em coloração azulada, o exame é normal. Se o azul for mais intenso em algumas regiões, se entende como sendo um colo suspeito, pois as neoplasias são abundantes em DNA (KOSS; GOMPEL, 2006). A concordância dos métodos utilizados no diagnóstico das lesões cervicais é importante na conduta terapêutica, além de fatores intrínsecos à paciente, pois evita o tratamento cirúrgico para os casos iniciais de neoplasia, diagnosticados pelo exame preventivo antes de confirmá-los por outros métodos, observando assim se há concordância entre eles para então prosseguir ou não com o tratamento (PINHO; MATTOS, 2002). Nas diretrizes brasileiras para o rastreamento do câncer de colo do útero, foi definida a população de risco e ressaltado que o exame deve ser realizado periodicamente, com controles trienais após dois exames negativos com intervalo de um ano (BRASIL, 2011). Esta população de risco inclui mulheres de 25 anos de idade, que já tiveram atividade sexual, até mulheres com 64 anos. A incidência do câncer do colo do útero em mulheres com até 24 anos é muito baixa, a maioria dos casos é diagnosticada nos primeiros estágios e o rastreamento é menos eficiente para detectá-los. Por outro lado, o início mais precoce representaria um importante aumento de diagnósticos de lesões de baixo grau, que têm grande probabilidade de regressão e resultariam em um número significativo de colposcopias e procedimentos diagnósticos e terapêuticos desnecessários (BRASIL, 2011). Após os 64 anos, mulheres que apresentarem pelo menos dois exames negativos consecutivos nos últimos cinco anos podem interromper os exames. Para mulheres com mais de 64 anos e que nunca realizaram o exame citopatológico, deve-se realizar dois exames com intervalo de um a três anos. Se forem negativos, podem ser dispensadas da realização de mais exames. Estas recomendações não se aplicam a mulheres com história prévia de lesões precursoras do câncer do colo uterino (BRASIL, 2011). Para a OMS, uma cobertura de 80% do exame entre mulheres de 35 a 59 anos seria suficiente para impactar os indicadores de incidência e mortalidade desta neoplasia (RIBEIRO; SANTOS; TEIXEIRA, 2011). 38 Para uma melhor interpretação dos diagnósticos e padronização dos laudos citopatológicos, nomenclaturas foram criadas e atualizadas ao longo dos anos (BRASIL, 2012). O médico Geórgios Papanicolaou criou uma nomenclatura que procurava expressar se as células observadas eram normais ou não, atribuindo-lhes uma classificação. Assim, criou as classes I, II, III, IV e V, em que a classe I indicava ausência de células atípicas ou anormais; a II, citologia atípica, mas sem evidência de malignidade; a III, citologia sugestiva, mas não conclusiva, de malignidade; a IV, citologia fortemente sugestiva de malignidade; e a V, citologia conclusiva de malignidade. (BRASIL, 2012) A partir de então, novas nomenclaturas surgiram. O termo displasia foi introduzido na classificação da OMS, levando em conta alterações histológicas correspondentes, identificando displasias leves, moderadas e severas. Todos os graus eram referentes à classe III de Papanicolaou, correlacionando também a IV com carcinomas escamosos in situ. A classe V continuou indicando carcinoma invasor (BRASIL, 2012). Alguns anos depois, surgiu a classificação de Richart, que estabeleceu o conceito de neoplasia intraepitelial e, no caso da cérvice uterina, de neoplasia intraepitelial cervical (NIC) subdividida em três graus, NIC I, II e III, que se mantém para os diagnósticos histológicos (BRASIL, 2012). O Instituto Nacional de Câncer, o INCA, em 1988 patrocinou a criação da terminologia mais atual utilizada nos laudos da colpocitologia oncótica, a Classificação de Bethesda, Maryland, EUA. As recomendações surgidas passaram a ser chamadas de Tratado de Bethesda (LODI et al., 2012). Ela incorporou vários conceitos e conhecimentos adquiridos que incluem o diagnóstico citológico diferenciado para as células escamosas e glandulares; o diagnóstico citomorfológico sugestivo da infecção por HPV, dividindo-as em lesões intraepiteliais de baixo (LSIL) e alto (HSIL) graus, ressaltando o conceito de possibilidade de evolução para neoplasia invasora; e a análise da qualidade do esfregaço. Esta classificação foi revista em 1991 e 2001, porém não houve mudanças estruturais (BRASIL, 2012). Em 1991, foi criada uma nova categoria, a das ASCUS (atipias escamosas de significado indeterminado), compostas pelas alterações nas quais o citopatologista evidenciava distorções citológicas, mais intensas do que as verificadas em alterações inflamatórias, sem preencher os critérios para sua classificação como displásicas ou neoplásicas (LODI et al., 2012). 39 Já em 2001, ASCUS foi redefinida como ASC, e subdividida em duas categorias: ASC-US e ASC-H (LODI et al., 2012). Para orientar a atenção as mulheres no Brasil, foi criada a Nomenclatura Brasileira para Laudos Cervicais e Condutas Preconizadas, que tem sofrido constantes alterações, visando permitir um perfeito entendimento dos processos patológicos envolvidos no desenvolvimento deste câncer pelos profissionais que participam do processo. Além disso, visa facilitar a informatização e a permitir a comparabilidade dos resultados, com o objetivo de aumentar o conhecimento epidemiológico sobre as neoplasias do colo uterino. O país adotou e adaptou o Tratado de Bethesda, facilitando a comparação de resultados nacionais com os encontrados em publicações estrangeiras. Foram introduzidos novos conceitos estruturais e morfológicos, o que contribui para o melhor desempenho laboratorial e serve como facilitador da relação entre a citologia e a clínica (BRASIL, 2012). Segundo esta nomenclatura, o diagnóstico inclui: células dentro dos limites da normalidade, no material examinado; alterações celulares benignas (ativas ou reparativas); atipias celulares (BRASIL, 2012). As alterações celulares benignas envolvem inflamação sem identificação do agente, metaplasia escamosa imatura, reparação, atrofia com inflamação, radiação (BRASIL, 2012). As atipias celulares incluem: em células escamosas, células escamosas atípicas de significado indeterminado, possivelmente não neoplásicas (atypical squamous cells of undertermined significance, possibly non-neoplastic - ASC-US) e células escamosas atípicas de significado indeterminado, não podendo se excluir lesão intraepitelial de alto grau (atypical squamous cells, cannot rule out a high grade lesion – ASC-H). Em células glandulares, células glandulares atípicas de significado indeterminado, possivelmente não neoplásicas (atypical glandular cells of undetermined significance, possibly non-neoplastic – AG-US) e células glandulares atípicas de significado indeterminado, quando não se pode excluir lesão intraepitelial de alto grau (atypical glandular cells, cannot rule out high a high grade lesion). De origem indefinida, células atípicas de origem indefinida, possivelmente não neoplásicas e células atípicas de origem indefinida, quando não se pode excluir lesão de alto grau (BRASIL, 2012). O uso dos acrônimos ASCUS e AGUS é desaconselhado, devendo sempre constar por extenso os diagnósticos nos laudos (BRASIL, 2012). Em células escamosas também podem existir atipias que são classificadas em lesão intraepitelial de baixo grau (Low grade Squamous Intraepithelial Lesion - LSIL), lesão 40 intraepitelial de alto grau (High grade Squamous Intraepithelial Lesion - HSIL), lesão intraepitelial de alto grau, não podendo excluir microinvasão ou carcinoma epidermóide invasor e carcinoma epidermóide invasor (BRASIL, 2011). Foi incluída ainda a possibilidade diagnóstica de suspeição de microinvasão (BRASIL, 2012). Em células glandulares também podem existir atipias que são classificadas em adenocarcinoma in situ e adenocarcinoma invasor (cervical, endometrial ou de origem uterina) (BRASIL, 2012). 2.1 ALTERAÇÕES CELULARES BENIGNAS (REATIVAS OU REPARATIVAS) As alterações celulares benignas são classificadas como inflamações sem identificação de agente, caracterizada pela presença de alterações celulares epiteliais, geralmente determinadas pela ação de agentes físicos, os quais podem ser radioativos, mecânicos ou térmicos e químicos, como medicamentos abrasivos ou cáusticos, quimioterápicos e acidez vaginal sobre o epitélio glandular. Ocasionalmente, podem-se observar alterações, em decorrência do uso do dispositivo intrauterino (DIU), representadas na figura 8, em células endometriais e mesmo endocervicais. Casos especiais com alterações citológicas do tipo exsudato linfocitário ou reações alérgicas, representadas pela presença de eosinófilos, são observados. O exame preventivo apresenta limitações no estudo microbiológico, de forma que tais alterações podem se dever a patógeno não identificado. Os achados colposcópicos comuns são ectopias, vaginites e cervicites (BRASIL, 2011). Deve-se seguir a rotina de rastreamento citológico, independentemente do exame ginecológico. Havendo queixa clínica de leucorreia, a paciente deverá ser encaminhada para exame ginecológico. O tratamento deve seguir recomendação específica (BRASIL, 2011). Figura 8. Células de usuária de dispositivo intra-uterino (DIU). 41 Fonte: Imagem cedida pelo Laboratório de Patologia e Citologia Aplicada (LAB). 2.2 METAPLASIA ESCAMOSA IMATURA A palavra “imatura”, em metaplasia escamosa, foi incluída na Nomenclatura Brasileira para Laudos Citopatológicos, buscando caracterizar que esta apresentação é considerada como do tipo inflamatório, entretanto o epitélio, nesta fase, está vulnerável à ação de agentes microbianos e, em especial, do HPV (BRASIL, 2012). Deve-se seguir a rotina de rastreamento citológico (BRASIL, 2011). Figura 9. Metaplasia escamosa imatura. Fonte: Imagem cedida pelo Laboratório de Patologia e Citologia Aplicada (LAB). 2.3 REPARAÇÃO Decorre de lesões da mucosa com exposição do estroma e pode ser originado por quaisquer dos agentes que determinam inflamação. É, geralmente, a fase final do processo inflamatório, momento em que o epitélio está vulnerável à ação de agentes microbianos e, em especial, do HPV (BRASIL, 2012). Deve-se seguir a rotina de rastreamento citológico (BRASIL, 2011). 42 Figura 10. Células de reparação. Fonte: Imagem cedida pelo Laboratório de Patologia e Citologia Aplicada (LAB). 2.4 ATROFIA COM INFLAMAÇÃO Na ausência de atipias, é um achado normal do período climatérico e somente demanda atenção ginecológica caso esteja associado a sintomas como secura vaginal e dispareunia (BRASIL, 2011). Na citologia é possível observar metacromasia, pseudoeosinofilia, perda da transparência, bordos citoplasmáticos imprecisos, citomegalia, vacuolização, halos perinucleares, esgarçamento do citoplasma, cariomegalia, bi, tri ou multinucleação, edema nuclear, espessamento da membrana nuclear, cariopicnose, cariorrexe, cariólise, representados na figura 11 (AZEVEDO; SILVA, 2013). Deve-se seguir a rotina de rastreamento citológico. Na eventualidade do laudo do exame citopatológico, deve-se mencionar dificuldade diagnóstica decorrente da atrofia e deve ser prescrito um preparo estrogênico, utilizado para tratamento da colpite atrófica. A nova citologia deve ser coletada sete dias após a parada do uso do estrogênio (BRASIL, 2011). O tratamento da colpite atrófica pode ser realizado pela administração vaginal de creme de estrogênios conjugados ou de creme de estriol (BRASIL, 2011). Na situação em que é contraindicado o uso de estrogênios conjugados, parece recomendável o uso de estriol (BRASIL, 2011). 43 Devido à absorção sistêmica do estrogênio tópico ser mínima, não há contraindicação do uso do mesmo nas mulheres com história de carcinoma de mama. O esquema recomendado é o mesmo utilizado para as demais mulheres (BRASIL, 2011). Nas mulheres que fazem uso dos inibidores da aromatase, como os utilizados no tratamento do câncer de mama, a terapia com estrogênios para a melhora da vaginite atrófica está contraindicada (BRASIL, 2011). Figura 11. Quadro citológico de processo inflamatório. Fonte: Imagem cedida pelo Laboratório de Patologia e Citologia Aplicada (LAB). 2.5 RADIAÇÃO Nos casos de câncer do colo do útero, o exame citopatológico deve ser realizado para controle de possível neoplasia residual ou de recidiva da neoplasia após tratamento radioterápico. O tratamento radioterápico prévio deve ser mencionado na requisição do exame (BRASIL, 2012). Deve-se seguir a rotina de rastreamento citológico (BRASIL, 2011). 44 Figura 12. Radiação. Fonte: Imagem cedida pelo Laboratório de Patologia e Citologia Aplicada (LAB). 2.6 ACHADOS MICROBIOLÓGICOS Alguns agentes microbiológicos são encontrados em exames e devem ser especificados. Eles são considerados achados normais, alguns fazem parte da flora vaginal e, na ausência de sinais e sintomas, sua presença não caracteriza infecção que necessite de tratamento. Entre eles estão os Lactobacillus sp, representados na figura 13, os bacilos supracitoplasmáticos (sugestivos de Gardnerella/Mobiluncus) e outros, cocos, Candida sp., Trichomonas vaginalis, Chlamydia sp., Actinomyces sp. e o efeito citopático compatível com vírus do grupo herpes (BRASIL, 2012). Na infância ocorre ausência de lactobacilos e a flora é mista, no ciclo sexual há citólise e flora lactobacilar, na gestação há citólise e flora lactobacilar, no puerpério imediato, flora mista, e na pós-menopausa e selenidade, diminuição dos lactobacilos (KOSS; GOMPEL, 2006). Nas mulheres em fase reprodutiva, o estrógeno promove a maturação e diferenciação do epitélio vaginal em células superficiais maduras ricas em glicogênio. Este glicogênio é metabolizado em ácido láctico pelos Lactobacilos, conferindo um pH ácido à vagina (menor que 4,5). O pH ácido e o Peróxido de Hidrogênio (H2O2), que também é produzido pelos 45 Lactobacillus, conferem a proteção natural da vagina, inibindo o crescimento de organismos como os anaeróbios (KOSS; GOMPEL, 2006). Deve-se seguir a rotina de rastreamento citológico. A paciente com sintomatologia, como corrimento, prurido ou odor genital, deve ser encaminhada para avaliação ginecológica (BRASIL, 2011). Figura 13. Lactobacillus sp. e citólise. Fonte: Imagem cedida pelo Laboratório de Patologia e Citologia Aplicada (LAB). 2.7 CÉLULAS ESCAMOSAS ATÍPICAS DE SIGNIFICADO INDETERMINADO, POSSIVELMENTE NÃO NEOPLÁSICAS - ASC-US O termo atipia de significado indeterminado foi introduzido na nomenclatura, sendo definido como achados citológicos mais acentuados que as alterações reativas, caracterizados pela presença de alterações celulares insuficientes para o diagnóstico de lesão intraepitelial (BRASIL, 2011). Não representam uma entidade biológica, mas sim uma mistura de diagnósticos diferenciais e dificuldades diagnósticas, não sendo consideradas anormalidades e sim ambiguidades citopatológicas, nas quais as alterações celulares são maiores que reacionais sugestivas de lesão intraepitelial, porém não quantitativa nem qualitativamente suficientes 46 para o diagnóstico definitivo. Consequentemente, impõe-se a necessidade de definição diagnóstica posterior ou imediata, na dependência da gravidade da suspeita (BRASIL, 2013a). Na rotina, os diagnósticos de ASC surgem quando alterações celulares associadas à inflamação, metaplasia escamosa imatura, atrofia ou pós-radioterapia simulam as alterações citológicas observadas nas displasias de baixo grau ou alto grau. É recomendado que o índice de citologias nesta categoria não deve ultrapassar 5% (ANDRADE, 2012). A proporção destes resultados não deve ultrapassar 60% dos exames alterados e a razão entre elas e demais lesões intraepiteliais escamosas não devem ser maior que três. A proporção de lesões de alto grau identificadas (HSIL) deve ser igual ou superior a 0,4% dos exames satisfatórios. Na maioria das Unidades de Federação os valores de detecção de lesões são inferiores ao desejado (BRASIL, 2015b). Os resultados não devem exceder duas ou três vezes os índices de LSIL, devendo oscilar entre 2% e 6% (SOLOMON; NAYAR, 2005). Atualmente, as atipias escamosas de significado indeterminado representam a atipia citológica mais comumente descrita nos resultados dos laudos citopatológicos do colo do útero (BRASIL, 2011). Depois houve a necessidade de reclassificação para ASC-US. Nestes casos, as atipias são vistas em células maduras. E a maioria dos ASC-US é sugestiva de LSIL (ANDRADE, 2012; SOLOMON; NAYAR, 2005). Em torno de 90% dos ASC são classificados como ASC-US (SOLOMON; NAYAR, 2005). Na citologia são observados núcleos com aproximadamente 2,5 a 3 vezes o tamanho da área do núcleo de uma célula intermediária normal, pálidos, redondos e desnudos, com aspecto anormal. A relação núcleo/citoplasma é ligeiramente aumentada. É possível observar hipercromasia nuclear, bi, tri ou multinucleação, irregularidade na distribuição da cromatina e paraceratose atípica. Estas características estão representadas na figura 14 (AZEVEDO; SILVA, 2013; SOLOMON; NAYAR, 2005). Uma conduta conservadora, pouco invasiva, é recomendável. Fatores como a idade da mulher e a realização de rastreio citológico prévio devem ser considerados nessa decisão. A infecção pelo HPV oncogênico é mais persistente nas mulheres com 30 anos ou mais, essas têm maior probabilidade de apresentarem lesões pré-invasivas diante de um resultado de exame citopatológico de ASC-US, a conduta na mulher com 30 anos ou mais será a repetição do exame citopatológico em um intervalo de seis meses, precedida, quando necessário, do 47 tratamento de processos infecciosos e preparo estrogênico após a menopausa, na Unidade da Atenção Primária (BRASIL, 2011). Para as mulheres com idade inferior a 30 anos, a repetição da colpocitologia está recomendada no intervalo de 12 meses. Se dois exames citopatológicos subsequentes na Unidade da Atenção Primária, com intervalo de seis meses (ou 12 meses se com menos de 30 anos), forem negativos, a paciente deverá retornar à rotina de rastreamento citológico trienal, porém, se o resultado de alguma citologia de repetição for igual ou mais significativa, a paciente deverá ser encaminhada à Unidade de Referência para colposcopia. Se houver um novo resultado diferente de ASC-US, a investigação deverá ser direcionada para o novo resultado (BRASIL, 2011). Na colposcopia sem alterações, o retorno ao rastreio na unidade primária está recomendado com intervalo semestral ou anual dependendo da faixa etária. Na colposcopia com alterações, deve-se realizar a biópsia. Em caso de aspecto colposcópico de baixo grau, a paciente poderá ser apenas acompanhada, considerando-se outros fatores como idade, rastreio prévio e passado de doença cervical de baixo ou alto graus. Considerando-se a baixa prevalência de doença de alto grau e câncer nessas mulheres, a conduta ver-e-tratar (diagnóstico e tratamento excisional em uma única visita, realizado em nível ambulatorial, por meio da exérese da Zona de Transformação (EZT), sob visão colposcópica e anestesia local) é inaceitável. Se, na biópsia, o resultado for de lesão intraepitelial de alto grau ou câncer, a conduta será específica para esse resultado (BRASIL, 2011). A EZT consiste na retirada da zona de transformação por meio da cirurgia de alta frequência, com objetivo terapêutico. É realizada sob anestesia local, sob visão colposcópica em nível ambulatorial. Recomendada para o tratamento de lesões pré-invasivas diagnosticadas por biópsia prévia ou como parte do método ver-e-tratar, quando a zona de transformações está completamente visível e situada na ectocérvice, ou quando a junção escamo colunar estiver localizada até 01 cm no canal endocervical (BRASIL, 2011). Mulheres imunodeprimidas com esse resultado citológico devem ser encaminhadas para colposcopia já no primeiro exame alterado, segundo as recomendações para as demais mulheres nessa situação (BRASIL, 2011). A American Society for Colposcopy and Cervical Pathology (ASCCP) recomenda a realização do teste DNA-HPV no seguimento das pacientes com ASC-US. O exame colposcópico estaria limitado aos casos de ASC-US e teste DNA-HPV positivo. Mulheres 48 com teste DNA-HPV negativo e citologia ASC-US seriam acompanhadas com exame citológico semestral por dois anos (LODI et al., 2012). Em caso de diagnóstico de ASC-US em mulheres na pós-menopausa com atrofia cervicovaginal, é indicada a estrogenioterapia tópica antes de ser realizada nova coleta citológica (LODI et al., 2012). Figura 14. Células escamosas atípicas de significado indeterminado, possivelmente não neoplásicas. Fonte: Imagem cedida pelo Laboratório de Patologia e Citologia Aplicada (LAB). 2.8 CÉLULAS ESCAMOSAS ATÍPICAS DE SIGNIFICADO INDETERMINADO, NÃO PODENDO SE EXCLUIR LESÃO INTRAEPITELIAL DE ALTO GRAU - ASCH ASC-H é uma designação reservada para a minoria dos casos de ASC. A maioria dos ASC-H é sugestiva de HSIL. Nos casos de ASC-H, as alterações são observadas em células imaturas (ANDRADE, 2012; SOLOMON; NAYAR, 2005). Na citologia, as células ASC-H encontram-se geralmente dispersas ou em pequenos fragmentos com menos de 10 células. São do tamanho das células metaplásicas, com núcleo cerca de 1,5 a 2 vezes maiores do que o normal. A proporção da área do núcleo e o citoplasma pode ser aproximadamente a de HSIL. Anormalidades nucleares como hipercromasia, irregularidade da cromatina e formas nucleares anormais podem favorecer uma interpretação de HSIL. Estas alterações estão representadas na figura 15 (SOLOMON; NAYAR, 2005). Todas as mulheres com laudo citopatológico de ASC-H devem ser encaminhadas à unidade secundária para colposcopia. Realizada a colposcopia, deve-se considerar se é satisfatória ou insatisfatória. Para as mulheres em que o exame for satisfatório e sem 49 alterações colposcópicas, uma nova citologia deverá ser obtida em seis meses, na unidade secundária, e deverá retornar à unidade primária após duas citologias negativas seguidas. No resultado de citologia, quando se mantém o mesmo diagnóstico ou mais grave, mesmo na ausência de achados colposcópicos, é recomendável a EZT (BRASIL, 2011). Na presença de alterações colposcópicas, deve-se proceder à biopsia. Caso seja confirmada a presença de lesão intraepitelial de alto grau ou câncer, deverá ser seguida recomendação específica para esses diagnósticos (BRASIL, 2011). Caso o diagnóstico histopatológico da biópsia seja negativo ou compatível com lesão intraepitelial de baixo grau, em colposcopia satisfatória, uma nova citologia deverá ser obtida em seis meses na unidade secundária e deverá retornar à unidade primária após duas citologias negativas seguidas (BRASIL, 2011). Nos casos em que o exame colposcópico é insatisfatório e não revela alterações, deverá ser colhida nova citologia endocervical. Se a nova citologia mantiver o mesmo resultado ou mostrar lesão de alto grau ou suspeita de câncer, é recomendável a conização para diagnóstico. Caso a nova citologia seja negativa, uma nova citologia deverá ser obtida em seis meses na unidade secundária e deverá retornar à unidade primária após duas citologias negativas seguidas (BRASIL, 2011). A conização do colo do útero consiste na remoção da zona de transformação e parte do canal endocervical. É realizada a frio, com bisturi convencional, ou por eletrocirurgia (com eletrobisturi de alta frequência e eletrodos de formatos variáveis), recomendada para o diagnóstico e tratamento de lesões pré-invasivas, suspeitas no exame citopatológico prévio ou diagnosticada por biópsia, quando não se pode afastar doença endocervical (quando a junção escamo colunar estiver localizada a mais de 01 cm no canal endocervical ou quando a zona de transformação não é completamente vista) (BRASIL, 2011). Alternativamente a uma nova citologia, quando for possível, poderá ser solicitada a revisão da lâmina para ser observada por outro laboratório ou por outros profissionais no mesmo laboratório. O resultado dessa revisão será considerado como um novo resultado. Caso a revisão seja negativa, a usuária deverá retornar ao rastreio habitual na atenção primária. Se o diagnóstico de revisão mantiver o mesmo resultado ou alteração mais grave (lesão de alto grau ou suspeita de câncer), é recomendável a conização para diagnóstico. Se presente alteração colposcópica, mesmo no exame insatisfatório, deve ser realizada biópsia (BRASIL, 2011). 50 Sendo confirmada a lesão intraepitelial de alto grau ou câncer, deve-se seguir conduta específica para esses diagnósticos. Caso contrário, deverá manter seguimento com exame citopatológico. Na persistência desse diagnóstico ou outro mais relevante, a paciente deve ser submetida à conização. Com o resultado negativo, após dois exames consecutivos negativos, a paciente deverá retornar ao rastreio trienal. Nos casos de biópsia positiva para lesão intraepitelial de alto grau ou câncer, a conduta será específica (BRASIL, 2011). É recomendável o preparo com estrogênio em pacientes no climatério para o seguimento citológico (BRASIL, 2011). Figura 15. Células de reserva e metaplásicas imaturas, núcleo aumentado e irregular, hipercromasia e cromatina finamente irregular. Fonte: Imagem cedida pelo Laboratório de Patologia e Citologia Aplicada (LAB). 2.9 CÉLULAS GLANDULARES ATÍPICAS DE SIGNIFICADO INDETERMINADO, POSSIVELMENTE NÃO NEOPLÁSICAS – AG-US, E CÉLULAS GLANDULARES ATÍPICAS DE SIGNIFICADO INDETERMINADO, QUANDO NÃO SE PODE EXCLUIR LESÃO INTRAEPITELIAL DE ALTO GRAU Existe uma baixa prevalência de células glandulares atípicas, mas apesar disso, esse diagnóstico se torna muito importante pela alta frequência da associação com alterações neoplásicas como neoplasia intraepitelial escamosa, adenocarcinoma in situ e adenocarcinoma invasor do colo e do endométrio e, mais raramente, com neoplasias extrauterinas. Outros achados benignos como adenose vaginal, pólipos endometriais e endocervicais, quadros 51 inflamatórios e alterações reativas também podem ser responsáveis por essas atipias celulares (BRASIL, 2011). Considerando o conjunto de atipias em células glandulares, temos uma associação com lesão intraepitelial de alto grau ou câncer de 15% a 56% dos casos, sendo as lesões intraepiteliais mais comuns e associadas às pacientes com menos de 40 anos e as neoplasias invasivas mais associadas às pacientes acima dessa idade. Entre as atipias em células glandulares sem especificação, o equivalente às AGC possivelmente não neoplásicas, foi encontrada associação com doença (HSIL ou mais grave) em 29% dos casos. Já nas atipias glandulares favorecendo neoplasia, o equivalente às AGC, em que não se pode excluir lesão de alto grau, esse percentual chegou a 57% (BRASIL, 2011). No esfregaço de células glandulares atípicas de significado indeterminado, possivelmente não neoplásicas, é possível observar células em retalho ou tiras, com menor grau de sobreposição nuclear, aumento do volume nuclear, três a cinco vezes a área do núcleo da célula endocervical normal, discreta variação no tipo e tamanho nuclear, discreta hipercromasia, nucléolos muitas vezes presentes, citoplasma abundante, com bordas celulares bem definidas (SOLOMON; NAYAR, 2005). Já no esfregaço de células glandulares atípicas de significado indeterminado, quando não se pode excluir lesão intraepitelial de alto grau, é comum encontrar células anormais em retalho, tiras ou rosetas, agrupamento e superposição nuclear. Quando em retalhos, perde o padrão em “favo de mel” devido ao aumento da relação núclo/citoplasma e possui citoplasma diminuído e bordas mal definidas. São encontrados arranjos característicos de núcleos em “paliçada”, fazendo protrusão na periferia dos grupos celulares. Aumento, alongamento e estratificação dos núcleos são evidentes em muitos casos. Pode ocorrer variação do tipo e tamanho celular, hipercromasia, com cromatina fina ou moderadamente granulosa, nucléolos pequenos ou diminutos e figuras mitóticas podem ocorrer também. Esses esfregaços estão representados na figura 16 (SOLOMON; NAYAR, 2005). Pacientes com diagnóstico citológico de AGC devem ser encaminhadas para colposcopia. Na colposcopia, deve ser realizada coleta de material para citologia do canal cervical. É recomendável a avaliação endometrial (com ultrassonografia e/ou estudo anatomopatológico) em pacientes acima de 35 anos. Abaixo dessa idade, a investigação endometrial deverá ser realizada se presente sangramento uterino anormal. A investigação de patologia extrauterina também estará indicada nos casos em que, persistente o diagnóstico de 52 AGC, ao final da investigação não for possível concluir pelo diagnóstico de doença do colo do útero, independente da idade (BRASIL, 2011). Durante a colposcopia, se encontradas alterações, quaisquer que sejam, deve ser realizada a biópsia. Caso o exame histopatológico dessa biópsia seja compatível com adenocarcinoma in situ ou invasor, devem ser seguidas as recomendações específicas. No caso de diagnóstico de lesão intraepitelial de alto grau, deve-se buscar excluir doença glandular, considerando o diagnóstico da citologia endocervical, colhida no momento da colposcopia, e outros exames solicitados para avaliação de endométrio ou outros órgãos pélvicos (BRASIL, 2011). Independente do diagnóstico de doença escamosa, nos casos em que a nova citologia mantiver o diagnóstico de AGC, é recomendável a conização do colo, de preferência por meio de uma técnica que produza um espécime íntegro para adequada avaliação. Se a nova citologia sugerir doença escamosa ou for negativa, deve ser seguida a recomendação específica para o diagnóstico obtido pela biópsia ou pela nova citologia (o que for mais grave). Caso o resultado da biópsia seja negativo, ou na ausência de lesão colposcópica, considerar o diagnóstico da nova citologia para definição de conduta. Caso mantenha o diagnóstico de AGC, é recomendável a conização do colo. Se a citologia colhida no mesmo momento da colposcopia for negativa, deverá dar-se seguimento com citologia semestral na unidade secundária. Após dois anos com exames semestrais normais, a paciente deve retornar ao rastreio trienal. Nos casos de persistência de AGC, em que não foi possível concluir um diagnóstico de patologia no colo, mesmo com ultrassonografia normal, estará indicada a avaliação histológica endometrial (BRASIL, 2011). Figura 16. Células glandulares atípicas de significado indeterminado, possivelmente não neoplásicas e células glandulares atípicas de significado indeterminado, quando não se pode excluir lesão intraepitelial de alto grau. Fonte: Imagem cedida pelo Laboratório de Patologia e Citologia Aplicada (LAB). 53 2.10 CÉLULAS ATÍPICAS DE ORIGEM INDEFINIDA, POSSIVELMENTE NÃO NEOPLÁSICAS E CÉLULAS ATÍPICAS DE ORIGEM INDEFINIDA, QUANDO NÃO SE PODE EXCLUIR LESÃO DE ALTO GRAU A categoria “origem indefinida” foi introduzida na Nomenclatura Brasileira de Laudos Cervicais para classificar situações em que não se pode estabelecer com clareza a origem da célula atípica. Essa categoria tem baixa prevalência. Sua abordagem pode ser direcionada para a conduta na presença de células escamosas atípicas ou de células glandulares atípicas, de acordo com os resultados dos exames citopatológicos subsequentes (BRASIL, 2011). O diagnóstico de células atípicas de origem indefinida é muito incomum e requer uma cuidadosa revisão da lâmina, na maioria dos casos, resultará no encontro de campos de atipias de células glandulares (mais provável) ou mesmo escamosas (menos provável). (BRASIL, 2011). Na citologia é possível encontrar células indiferenciadas, com citoplasma escasso, pleomorfismo celular, células pequenas atípicas, sobreposições, núcleos hipercromáticos, células de reserva, representados na figura 17 (PINTO et al., 2006). Deve-se encaminhar para a unidade secundária para investigação. Além da avaliação colposcópica, deve-se realizar a investigação de endométrio e anexos por meio de exame de imagem em mulheres com mais de 35 anos, mesmo sem irregularidade menstrual, assim como nas mais jovens com sangramento uterino anormal (BRASIL, 2011). Em colposcopia satisfatória ou não, com achados sugestivos de lesão intraepitelial ou câncer, deve-se realizar biópsia. Caso o diagnóstico histopatológico da biópsia seja negativo ou compatível com lesão intraepitelial de baixo grau, uma nova citologia deverá ser obtida em três meses na unidade secundária e a paciente deverá retornar à unidade primária após duas citologias negativas seguidas. Se o diagnóstico histopatológico for lesão intraepitelial de alto grau ou mais grave, deve-se seguir recomendação específica (BRASIL, 2011). Quando a colposcopia não apresentar lesão, realizar imediatamente nova coleta de canal para exame citopatológico. Nos casos em que a nova citologia definir a origem da alteração (escamosa ou glandular), a conduta será de acordo com o novo resultado. Para o caso de o novo exame citopatológico, manter indefinição quanto à origem e reiniciar a investigação em três meses, incluindo a busca de patologia endometrial ou extrauterina (BRASIL, 2011). 54 Quando, na investigação, for detectada patologia endometrial, esta deverá ser tratada antes de nova colheita citológica (BRASIL, 2011). Figura 17. Células atípicas de origem indefinida, possivelmente não neoplásicas e células atípicas de origem indefinida, quando não se pode excluir lesão de alto grau. Fonte: Imagem cedida pelo Laboratório de Patologia e Citologia Aplicada (LAB). 2.11 LESÃO INTRAEPITELIAL DE BAIXO GRAU - LSIL A lesão intraepitelial de baixo grau reflete a manifestação citológica da infecção pelo HPV e não representa lesões verdadeiramente precursoras do câncer do colo do útero, regredindo espontaneamente na maior parte dos casos, e tendo menor probabilidade de persistência ou progressão. As alterações de diferenciação celular se limitam ao terço do epitélio de revestimento da cérvice sendo praticamente unânime a presença do efeito citopático compatível com o HPV (BRASIL, 2013a). É o segundo diagnóstico citopatológico mais frequente (BRASIL, 2011). Mulheres que desenvolvem infecção persistente por HPV do tipo 16 têm cerca de 5% de risco de desenvolverem lesão de alto grau ou lesão mais grave em três anos e 20% de risco em dez anos. Quando a infecção persistente for por outros tipos de HPV oncogênico, esse risco reduz pela metade (BRASIL, 2011). A prevalência do HPV na população em geral é alta e este aumento tem sido coincidente não só com o aumento do uso de contraceptivos orais e a diminuição do uso de outros métodos de barreira, mas também com o avanço tecnológico nos métodos diagnósticos (BRASIL, 2002). A prevalência da infecção pelo HPV e a persistência viral, assim como a infecção múltipla (por mais de um tipo de HPV), são mais frequentes em mulheres infectadas pelo 55 HIV. O desaparecimento do HPV parece ser dependente da contagem de células CD4+ e lesões precursoras tendem a progredir mais rapidamente e a recorrer mais frequentemente do que em mulheres não infectadas pelo HIV. Entretanto, mulheres infectadas pelo HIV, imunocompetentes, tratadas adequadamente com terapia antiretroviral de alta atividade, apresentam história natural semelhante às demais mulheres (BRASIL, 2011). Na citologia é possível encontrar células isoladas, em retalhos ou em grupos. As alterações citológicas estão geralmente restritas a células com citoplasma “maduro” ou do tipo superficial. O tamanho celular global é grande, com citoplasma bastante abundante, “maduro” e bem definido. O aumento nuclear é pelo menos três vezes a área do núcleo de uma célula intermediária normal, resultando em aumento da relação núcleo citoplasma. Graus variáveis de hipercromasia nuclear são acompanhados por variações no tamanho do nuclear, número e formato. A bi, tri ou multinucleação estão geralmente presentes. O núcleo pode ser jogado para a periferia da célula. A cromatina apresenta em geral uma distribuição regular, fina e uniforme, apesar de ser grosseiramente granular, por outro lado, a cromatina pode aparecer borrada, apagada ou degenerada, associada às alterações citopáticas do HPV. Os nucléolos estão ausentes ou são diminutos, se estiverem presentes. O contorno das membranas nucleares é frequentemente e ligeiramente irregular, mas pode ser liso, e são bem vivíveis. As células apresentam bordas citoplasmáticas distintas. A presença de células com cavitação citoplasmática perinuclear (coilocitose), consistindo em zona perinuclear nitidamente delineada e borda periférica de citoplasma com coloração densa, é um aspecto característico, mas não é necessária para a interpretação da LSIL, por outro lado, o citoplasma pode ter aspecto denso e orangiofílico (queratinizado), e apresentar vacúolos. As células com cavitação citoplasmática perinuclear ou orangeofílica também devem mostrar anormalidades nucleares para serem diagnosticadas de LSIL. Halos perinucleares na ausência de anormalidades nucleares não se qualificam para a interpretação de LSIL (AZEVEDO; SILVA, 2013; SOLOMON; NAYAR, 2005). São encontrados outros aspectos citológicos da infecção, discariose, disceratose, paraceratose, citomegalia e cariomegalia. Na coilocitose, a célula apresenta o seu citoplasma vacuolizado, com o núcleo localizado na periferia (halo claro perinuclear), na discariose, os núcleos se encontram mais hipercrômicos e alterados em sua forma (divididos em dois, disformes) e na disceratose, há queratinização alterada (hiperqueratose ou paraqueratose). As alterações estão representadas nas figuras 18, 19 e 20 (AZEVEDO; SILVA, 2013; SOLOMON; NAYAR, 2005). 56 Pode ocorrer elevação da pele ou mucosa e surgirem verrugas únicas ou múltiplas, pápulas, manchas hipercrômicas, microverrugas ou micropápulas únicas ou múltiplas, lesões acetopsitivas únicas, como micropontilhado, em placas (SOLOMON; NAYAR, 2005). Como características colposcópicas sugestivas de alterações de baixo grau (alterações menores), tem-se superfície lisa com borda externa irregular; alteração aceto-branca leve, que aparece lentamente e desaparece rapidamente; área iodo negativa, frequentemente com parcial captação de iodo; pontilhado fino e mosaico fino regular (BRASIL, 2011). As condutas preconizadas internacionalmente para abordagem inicial de pacientes com diagnóstico citopatológico de LSIL variam entre o encaminhamento imediato para a colposcopia e a repetição da citologia em intervalos variáveis, com encaminhamento para colposcopia caso o resultado subsequente mantenha atipia (BRASIL, 2011). O encaminhamento imediato para colposcopia como o seguimento citológico, são condutas aceitáveis nessa situação. O encaminhamento imediato para colposcopia, como abordagem inicial de pacientes com diagnóstico citológico de LSIL, é apoiado no argumento de que há, nesses casos, a possibilidade da presença de lesões mais graves (BRASIL, 2011). Contudo, essa conduta desconsidera o conceito vigente de que a LSIL representa a manifestação citológica da infecção causada pelo HPV, altamente prevalente e com potencial de regressão frequente, especialmente em mulheres com menos de 30 anos. A compreensão da história natural da infecção pelo HPV embasa o adiamento da investigação, evitando o sobrediagnóstico ou sobretratamento induzido pela abordagem de lesões que tendem à regressão espontânea (BRASIL, 2011). O comportamento benigno desse grau de alteração, associado ao risco de ocorrência de efeitos adversos psíquicos e físicos, como hemorragia, infecção e desfechos obstétricos significativos, tem levado a recomendações mais conservadoras (BRASIL, 2011). Mulheres com diagnóstico citopatológico de LSIL devem repetir o exame citopatológico em seis meses na unidade de atenção primária. Processos infecciosos ou atrofia genital identificados devem ser tratados antes dessa nova coleta. Se a citologia de repetição for negativa em dois exames consecutivos, a paciente deve retornar à rotina de rastreamento citológico trienal na unidade de atenção primária (BRASIL, 2011). Se qualquer citologia subsequente for positiva, encaminhar à unidade de referência para colposcopia (BRASIL, 2011). Na colposcopia, satisfatória ou insatisfatória, se presentes alterações no colo do útero, deve-se realizar a biópsia, seguindo-se conduta específica a partir do resultado do exame 57 histopatológico. Quando presentes alterações menores, a biópsia poderá ser dispensada, considerando-se outros fatores como idade menor do que 30 anos, rastreio prévio negativo e ausência de história de doença cervical de baixo ou alto grau. As pacientes não submetidas à biópsia devem ser mantidas em seguimento com citologia e colposcopia semestral, seguindose conduta específica a partir dos resultados subsequentes (BRASIL, 2011). Na colposcopia sem alterações visíveis, é recomendado o controle citológico semestral. O exame da vagina, embora rotineiro, deve ser enfatizado nessa situação. Após dois exames citopatológicos consecutivos negativos, a paciente deve retornar à rotina de rastreamento citológico trienal na unidade de atenção primária (BRASIL, 2011). Mantido o diagnóstico citopatológico de LSIL, a mulher deverá continuar em seguimento citológico até que os exames retornem à normalidade. Caso, nesse seguimento, seja obtido um diagnóstico mais relevante (ASC-H, HSIL, AGC ou câncer), a conduta deverá ser definida em função desse novo resultado (BRASIL, 2011). Frente ao diagnóstico histopatológico de LSIL, recomenda-se o seguimento citológico semestral ou anual (BRASIL, 2011). Nas mulheres com 21 anos ou mais, com persistência da LSIL por 24 meses, a manutenção do seguimento citológico ou tratamento são aceitáveis. Se a opção for pelo tratamento, nos casos de colposcopia satisfatória (zona de transformação completamente visível), pode-se optar por métodos destrutivos (eletrocauterização, criocauterização ou laserterapia) ou EZT. Nos casos de lesão recorrente, o tratamento excisional se faz necessário. Na colposcopia insatisfatória, a conização estará indicada (BRASIL, 2011). Até 20 anos de idade, existem evidências de maior incidência, maior probabilidade de regressão de LSIL e raridade de lesões invasivas, o que vem norteando recomendações de conduta mais conservadora, expectante e menos invasiva (BRASIL, 2011). A alta prevalência de DNA-HPV em adolescentes exclui a utilização desse teste na prática clínica. Cerca de 90% das infecções por HPV na adolescência são transitórias e o HPV não é mais detectado em até dois anos. Recomendações internacionais têm sido modificadas no sentido de evitar tratamentos desnecessários (BRASIL, 2011). Mulheres até 20 anos, caso tenham sido submetidas ao exame citopatológico e apresentem alterações sugestivas de LSIL, deverão repetir o exame citopatológico a cada 12 meses, sendo referidas para colposcopia somente se houver persistência desse diagnóstico citopatológico por 24 meses. A qualquer momento, caso apresentem citologia com alterações mais graves, deverão ser encaminhadas à colposcopia (BRASIL, 2011). 58 Frente ao diagnóstico histopatológico de LSIL em mulheres até 20 anos, o tratamento deve ser evitado e mantido o seguimento citológico anual até que completem os 21 anos. Neste momento, devem ser abordadas como as demais mulheres. Métodos excisionais não estão indicados antes dos 21 anos (BRASIL, 2011). Mulheres com 30 ou mais semanas de gestação deverão ser encaminhadas para colposcopia somente após três meses do parto. Só deverão ser submetidas à biópsia as gestantes com alterações colposcópicas sugestivas de invasão. Pacientes gestantes com diagnóstico histopatológico de LSIL devem aguardar até três meses após o parto para reavaliação (BRASIL, 2011). Pacientes na pós-menopausa, em razão da deficiência de estrogênio, sofrem alterações celulares importantes no colo uterino e vagina. A terapia através de estrogênio tópico melhora a qualidade do exame citológico. Mulheres na pós-menopausa com diagnóstico citopatológico de LSIL devem ser abordadas como as demais, mas a segunda coleta deve ser precedida de tratamento da colpite atrófica (BRASIL, 2011). Mulheres imunossuprimidas, como as infectadas pelo HIV, transplantadas, com doenças autoimunes ou em uso de drogas imunossupressoras, devem ser encaminhadas para colposcopia após o primeiro exame citopatológico mostrando LSIL (BRASIL, 2011). As lesões persistentes devem ser tratadas excisionalmente (EZT no caso das mulheres com zona de transformação ectocervical ou que não ultrapassa o primeiro centímetro do canal endocervical, ou conização, naquelas que a zona de transformação não é completamente visível). O seguimento pós-tratamento pode ser anual e deve incluir citologia e colposcopia por dois anos, passando a citológico anual após esse período (BRASIL, 2011). O teste para detecção do DNA-HPV pode ter papel potencial na detecção de uma infecção viral de alto risco e persistente nas pacientes portadoras de lesão intraepitelial. (SOLOMON; NAYAR, 2005). 59 Figura 18. Células cianofílicas com cavidade perinuclear vazia, circundada por citoplasma condensado e núcleo aumentado de tamanho: coilócitos verdadeiros; discariose. Fonte: Imagem cedida pelo Laboratório de Patologia e Citologia Aplicada (LAB). Figura 19. HPV: disceratose e LSIL. Fonte: Imagem cedida pelo Laboratório de Patologia e Citologia Aplicada (LAB). 60 Figura 20. Histopatologia de paciente com HPV. Fonte: Imagem cedida pelo Laboratório de Patologia e Citologia Aplicada (LAB). 2.12 LESÃO INTRAEPITELIAL DE ALTO GRAU - HSIL A lesão intraepitelial de alto grau resulta de anormalidades epiteliais conhecidas como neoplasias intraepiteliais cervicais de graus II e III (NIC II - desarranjo celular em até três quartos da espessura do epitélio pavimentoso de revestimento do colo com preservação das camadas mais superficiais, displasia moderada), (NIC III - desarranjo celular acomete todas as camadas do epitélio, sem que haja invasão do tecido conjuntivo subjacente, displasia acentuada). Apesar de muitas dessas lesões poderem regredir espontaneamente, sua probabilidade de progressão é maior, tornando sua detecção o objetivo primordial da prevenção secundária do câncer do colo do útero, e justificando seu tratamento (BRASIL, 2011). HSIL sem tratamento são reais precursores para o câncer do colo do útero. Esse é um tipo de lesão classificada como pré-invasiva. Grande parte das mulheres que apresentam diagnóstico citopatológico de HSIL tem confirmação desse grau de doença pela histologia, e uma pequena parte tem confirmação de carcinoma invasor (BRASIL, 2011). Na citologia são observadas alterações que afetam células menores e menos maduras do que nas células na LSIL, as células da camada profunda. As células ocorrem isoladas, em grupos, em agregados do tipo sincicial, ou formam “fila indiana”. Agrupamentos hipercromáticos devem ser avaliados cuidadosamente. O tamanho celular global é variável, e 61 varia desde células similares no tamanho, observadas na LSIL, até células bastante pequenas do tipo basal. A hipercromasia nuclear é acompanhada por variações no tamanho nuclear e na sua forma. O grau de aumento nuclear é mais variável do que visto na LSIL. Algumas células HSIL apresentam o mesmo grau de aumento nuclear como na LSIL, mas a área do citoplasma está diminuída, levando ao aumento acentuado da proporção núcleo/citoplasma. Outras células apresentam uma proporção núcleo/citoplasma muito elevada, mas o tamanho real dos núcleos pode ser consideravelmente menor do que na LSIL. A cromatina pode ser fina ou grosseiramente granular e com distribuição regular. O contorno da membrana nuclear é bastante irregular e frequentemente demonstra sulcos. Os nucléolos estão geralmente ausentes, mas podem ocasionalmente ser vistos, especialmente quando HSIL se estende para os espaços glandulares endocervicais. O aspecto do citoplasma é variável, pode parecer “imaturo” e delicado ou densamente metaplásico, ocasionalmente o citoplasma é “maduro” e densamente queratinizado (HSIL queratinizante) (KOSS; GOMPEL, 2006). Nas lesões queratinizantes, as células tem citoplasma mais abundante, mas normalmente queratinizadas, podem ser descamadas isoladas ou em grupos tridimensionais, com núcleos hipercromáticos aumentados, com cromatina densa obscurecendo outras características nucleares. É comum observar anisocariose e pleomorfismo (células alongadas, fusiforme, caudadas, e girino). Os nucléolos e diáteses tumorais estão em geral ausentes. As alterações estão representadas nas figuras 21 e 22 (KOSS; GOMPEL, 2006). Como características colposcópicas sugestivas de alterações de alto grau (alterações maiores), tem-se superfície lisa com borda externa bem marcada; alteração aceto-branca densa, que aparece rapidamente e desaparece lentamente, podendo apresentar um branco nacarado que lembra o de ostra; área iodo negativa (coloração amarelo-mostarda) em epitélio densamente aceto-branco; pontilhado grosseiro e mosaico de campos largos e irregulares e de tamanhos diferentes; aceto-branqueamento denso no epitélio colunar pode indicar doença glandular (BRASIL, 2011). Os métodos excisionais têm a vantagem de excluir a microinvasão e a invasão não suspeitada pela citologia ou colposcopia, possibilitar o diagnóstico de algumas lesões préinvasivas glandulares e, ainda, pressupor a retirada de toda a lesão, quando há relato de margens de ressecção livres de doença (BRASIL, 2011). No Brasil, é utilizada a técnica chamada ver-e-tratar, em que é realizado o diagnóstico e o tratamento em apenas uma visita ao ambulatório, reduzindo o tempo entre a captação e o tratamento, ansiedade, custos e biópsias desnecessárias. A desvantagem desse método é a 62 ocorrência de tratamentos desnecessários, todavia isso é muito reduzido se seguidas as recomendações, ou seja, exame citopatológico com diagnóstico de HSIL e colposcopia com alterações maiores (BRASIL, 2011). É feita a EZT, método de excisão, através da colposcopia, após anestesia local. Pode ser desvantajosa por proporcionar tratamento desnecessário. Mas podem excluir microinvasão ou invasão não detectada pela citologia e pela colposcopia e serem utilizadas para lesão restrita ao colo do útero e colposcopia satisfatória com JEC no máximo até o primeiro centímetro do canal endocervical. Os riscos de complicações são o sangramento excessivo e a infecção pós-operatória e deve ser evitada na presença de processos infecciosos, hipertensão arterial, gestação e coagulopatias. Para avaliação da doença do canal endocervical, o método de excisão a ser usado deve ser a conização, para retirar 2,0 cm a 2,5 cm de canal endocervical. Na presença de alteração colposcópica sugestiva de invasão, é feita biópsia, que se confirmada dispensa a EZT ou a conização. Um maior número de biópsias é capaz de melhorar a sensibilidade desse diagnóstico (BRASIL, 2011). Pacientes que apresentarem citologia sugestiva de lesão intraepitelial de alto grau deverão ser encaminhadas à Unidade de Referência Secundária para realização de colposcopia em até três meses após o diagnóstico. Quando a colposcopia for satisfatória, com alterações maiores, sugestivas de lesão intraepitelial de alto grau, restritas ao colo do útero, lesão totalmente visualizada e não se estendendo além do primeiro centímetro do canal, a conduta recomendada é a EZT. Quando não for possível devido a processo inflamatório ou outras contraindicações temporárias, essa deve ser realizada logo após sua correção (BRASIL, 2011). Nos casos em que a técnica de ver-e-tratar estiver indicada, mas não for possível em ambiente ambulatorial, a paciente deve ser encaminhada para unidade hospitalar para procedimento de excisão em centro cirúrgico (BRASIL, 2011). Se a alteração colposcópica se estender à periferia do colo ou para a vagina, deve-se considerar a possibilidade de lesão intraepitelial de baixo grau concomitante. Nesse caso, é preciso avaliar a necessidade de biópsia para diagnóstico nesses locais. Caso confirmada a concomitância de LSIL ou a alteração colposcópica for menor, o procedimento excisional deve ser direcionado para as alterações maiores e as demais áreas podem ser tratadas de forma destrutiva ou deixadas sem tratamento (BRASIL, 2011). 63 Caso confirmada a presença de lesão intraepitelial de alto grau na periferia do colo ou vagina, encaminhar a mulher para unidade hospitalar para avaliação e tratamento (BRASIL, 2011). Se a colposcopia for satisfatória e sugerir lesão de baixo grau ou for sugestiva para câncer, uma biópsia deve ser realizada. No caso de lesões extensas ou presença de mais de uma área de atipia, mais de uma biópsia ou amostras mais representativas e direcionadas às áreas de alterações mais marcantes devem ser obtidas. Se a biópsia for negativa ou apresentar diagnóstico de menor gravidade, deve-se repetir a citologia e a colposcopia entre três e seis meses a contar do dia da realização da biópsia e adotar conduta específica de acordo com esse novo laudo citopatológico (BRASIL, 2011). Quando o resultado da biópsia for compatível com lesão de intraepitelial de grau alto grau ou sugestiva de microinvasão, um método excisional deverá ser realizado (EZT, no caso de colposcopia satisfatória, ou conização, no caso de colposcopia insatisfatória). Caso o diagnóstico seja de doença invasiva, a paciente deve ser encaminhada para unidade terciária (BRASIL, 2011). Se a colposcopia não mostrar lesão, uma nova citologia, com ênfase para o canal endocervical, deve ser realizada após três meses, a contar da data da coleta da citologia anterior. O espécime do canal deve ser obtido por escova e disposto em lâmina separada. O exame da vagina, apesar de rotineiro em todos os casos com indicação de colposcopia, deve ser minucioso nesta situação. Se a nova citologia apresentar o mesmo resultado (lesão de alto grau), uma EZT deverá ser realizada, no caso de colposcopia satisfatória; ou um cone do colo, no caso de colposcopia insatisfatória. Se o resultado do novo exame citopatológico for diferente de lesão de alto grau, seguir conduta de acordo com o novo laudo (BRASIL, 2011). Quando a colposcopia for insatisfatória e sugerir lesão intraepitelial de qualquer grau (alteração colposcópica maior ou menor), deve ser realizada uma conização. A biópsia somente será útil caso o aspecto colposcópico seja sugestivo de lesão invasiva, pois, caso confirmado câncer, dispensará a conização. Nesta situação, a biópsia deve ser realizada. Se o resultado da biópsia for de lesão de alto grau ou de lesão de menor gravidade, a recomendação é realizar a conização. Se a biópsia mostrar câncer, a paciente deve ser referenciada para unidade terciária para procedimento específico (BRASIL, 2011). Várias evidências demonstram um pequeno risco de recorrência de lesões préinvasivas do colo do útero, assim como para carcinoma invasor, no longo prazo, após tratamento conservador, apontando para a necessidade de seguimento dessas mulheres de 64 forma diferente do rastreio para as demais. O principal fator de risco para doença residual ou recorrente tem sido o relato de margens comprometidas no espécime resultante de tratamentos excisionais. Uma adequada seleção de pacientes candidatas à EZT, assim como a utilização de uma técnica apurada, por colposcopista experiente e sob visão colposcópica reduzem o risco dessa ocorrência. Apesar de o relato de margens comprometidas por lesão intraepitelial de alto grau aumentar o risco de lesão residual ou recorrente, a maioria das pacientes com relato de margens comprometidas não terá uma lesão residual e, assim, não há justificativa para retratamento imediato. Outros fatores se mostram relacionados à recorrência, tais como idade acima de 50 anos, grau de doença tratada, persistência de HPV oncogênico, tabagismo, multiparidade, imunocomprometimento e existência de lesões fora da zona de transformação. No rastreio de lesões residuais ou recorrentes, podem ser empregados a citologia, a colposcopia ou o teste de DNA-HPV oncogênico. Este teste tem demonstrado maior sensibilidade do que a citologia no rastreio de lesão residual ou recorrente. Todavia a citologia tem demonstrado valor preditivo negativo muito próximo daquele obtido pelo teste de DNAHPV oncogênico, em ambos os testes, este valor está próximo de 99% (BRASIL, 2011). Isso significa que, quando um ou outro teste é negativo, uma nova lesão é muito improvável. Além disso, o uso simultâneo de ambos, ou a adição da colposcopia nesse seguimento, acrescenta muito pouco ao desempenho diagnóstico e aumenta, de forma significativa, os custos e procedimentos. A opção pelo seguimento com o exame citopatológico determina um menor número de mulheres referidas para colposcopia após o tratamento e aponta para melhor relação custo-benefício (BRASIL, 2011). Na situação em que o exame histopatológico de procedimento excisional mostra margens comprometidas por lesão intraepitelial de alto grau, a mulher deverá ser mantida em seguimento com exame citopatológico e colposcópico semestral por dois anos. Após este período, assegurada inexistência de lesão residual, deve manter seguimento citopatológico trienal (BRASIL, 2011). Quando se está frente a margens positivas por lesão intraepitelial de baixo grau ou estas se mostrarem livres de doença intraepitelial, o seguimento deverá ser feito com exames citopatológicos semestrais por um ano. Após dois exames citopatológicos negativos, com intervalo de seis meses, assegurada inexistência de lesão residual, deve manter seguimento citopatológico trienal (BRASIL, 2011). Um novo procedimento excisional estará indicado quando uma nova citologia mostrar HSIL, ou na evidência de NIC II/III residual ou recorrente obtida por biópsia. O novo 65 procedimento também estará indicado quando o seguimento adequado não for possível (BRASIL, 2011). Mulheres com até 20 anos de idade apresentam elevada prevalência de infecção pelo HPV de alto e baixo risco e de LSIL e atipias de significado indeterminado, no entanto, mostra baixa incidência de HSIL. O carcinoma invasor, em geral, é extremamente raro em mulheres com menos de 21 anos. Sabe-se que a maioria das infecções pelo HPV, assim como as lesões intraepiteliais, se resolve espontaneamente em cerca de dois anos, sendo, portanto, de reduzida significância clínica. Mulheres até esta idade não estão incluídas na faixa etária alvo do rastreamento do câncer do colo do útero, mas é importante orientar os profissionais quanto às condutas adequadas nessa situação para reduzir a probabilidade de malefícios decorrentes de procedimentos diagnósticos e terapêuticos desnecessários (BRASIL, 2011). Apesar de ser considerada lesão de alto grau, a NIC II nas adolescentes comporta-se como uma doença transitória, com elevadas taxas de regressão em pacientes com menos de 20 a 24 anos e com mínimo potencial oncogênico. Estudos mostram que a história natural da NIC II nesta população está muito próxima daquela da LSIL (BRASIL, 2011). As diretrizes brasileiras foram estabelecidas para minimizar os potenciais efeitos deletérios que o tratamento das lesões pré-invasivas (lesões intraepiteliais de alto grau) pode ocasionar sobre o futuro reprodutivo das mulheres em geral. Na vigência de exame citopatológico sugerindo HSIL, deve-se encaminhar a mulher até 20 anos para colposcopia, em até três meses após o resultado. A repetição da citologia é inaceitável como conduta inicial. Ver-e-tratar também é inaceitável como uma regra geral nessas mulheres (BRASIL, 2011). Na ausência de alteração colposcópica ou na ausência de alteração colposcópica maior, o que inclui minucioso exame da vagina, a mulher deverá repetir o exame citopatológico em três a seis meses e uma nova conduta deverá ser adotada em função do novo resultado. Após dois exames consecutivos negativos com intervalo de seis meses, a mulher poderá retornar ao rastreio trienal (BRASIL, 2011). Na presença de alteração colposcópica maior, deve ser realizada a biópsia. Se a biópsia for negativa ou apresentar diagnóstico de menor gravidade, deve-se repetir a citologia entre três e seis meses a contar do dia da realização da biópsia e adotar conduta específica, de acordo com esse novo laudo citopatológico. O exame da vagina deve ser minucioso nesta situação (BRASIL, 2011). 66 Se a biópsia mostrar lesão intraepitelial de alto grau, a paciente deverá ser seguida com citologia semestral por até dois anos (BRASIL, 2011). Após este período, na persistência da lesão, poderá ser mantida em seguimento ou tratada de forma excisional ou destrutiva. Durante esse período, caso seja constatada ausência de lesão, a mulher deverá ser mantida em seguimento citológico até que apresente dois exames consecutivos negativos com intervalo de seis meses e, a seguir, trienal. Uma nova conduta deverá ser definida se houver um novo resultado de exame citopatológico alterado. No caso de colposcopia insatisfatória com biópsia mostrando NIC II/III estará indicada a conização (BRASIL, 2011). A paciente deverá retornar ao rastreamento trienal após dois exames citopatológicos consecutivos e normais (BRASIL, 2011). As lesões de alto grau detectadas na gestação possuem mínimo risco de progressão para invasão neste período e algum potencial de regressão após o parto (BRASIL, 2011). A colposcopia pode ser realizada em qualquer época da gestação, mas costuma apresentar maiores dificuldades a partir do segundo trimestre. A biópsia pode ser realizada com segurança, não havendo risco de eventos adversos sobre a gestação, existindo apenas maior probabilidade de sangramento excessivo (BRASIL, 2011). Na prática, ao serem encaminhadas para colposcopia durante a gravidez, muitas mulheres já estarão na segunda metade da gestação, dificultando a avaliação colposcópica. As condições habituais de exame colposcópico costumam ser retomadas 90 dias após o parto (BRASIL, 2011). Os procedimentos excisionais, quando realizados neste período, aumentam risco de abortamento, parto prematuro e, frequentemente, apresentam complicações como sangramento excessivo (BRASIL, 2011). Na vigência de exame citopatológico mostrando HSIL, deve-se encaminhar a gestante para colposcopia (BRASIL, 2011). A biópsia só deve ser realizada caso a colposcopia apresente aspecto sugestivo de invasão. Na ausência de suspeita colposcópica de invasão a mulher deve ser reavaliada com novo exame citopatológico e colposcopia 90 dias após o parto. No caso de avaliação colposcópica no primeiro trimestre, e, presentes alterações maiores, uma nova avaliação durante a gestação poderá ser feita, a critério clínico. Caso o exame citopatológico ou os aspectos colposcópicos sugiram agravamento, novas biópsias podem ser realizadas e um 67 procedimento excisional somente deve ser realizado se houver suspeita de doença invasiva e se este diagnóstico for mudar a conduta durante a gestação (BRASIL, 2011). Diante do diagnóstico histopatológico de lesão intraepitelial de alto grau, recomendase conduta expectante com reavaliação de novo exame citopatológico e colposcopia em 90 dias após o parto. No diagnóstico de invasão, a gestante deve ser encaminhada para unidade terciária. Não há contraindicação ao parto vaginal para pacientes com lesões intraepiteliais (BRASIL, 2011). A citologia pode ter pior desempenho diagnóstico de mulheres na pós-menopausa, devido à escassez de estrogênios, o que resulta em uma diminuição do número de células ectocervicais e endocervicais disponíveis para a amostragem (BRASIL, 2011). A conduta para pacientes na menopausa é a mesma para as demais mulheres. Com o intuito de melhorar a condição do exame colposcópico ou de um novo exame citopatológico, a mulher deve ser preparada com estrogênio (BRASIL, 2011). Mulheres imunossuprimidas, especialmente as infectadas pelo HIV, têm maior chance de desenvolver lesão intraepitelial cervical e existe maior frequência de recidiva após o tratamento. A conduta inicial para pacientes imunossuprimidas com exame citopatológico de HSIL é a mesma que para as demais mulheres. Como este grupo tem maior risco de recidiva, o cuidado deve ser diferente no seguimento, com exame citopatológico semestral por dois anos, e anual após este período (BRASIL, 2011). Figura 21. Lesão intraepitelial de alto grau com núcleos aumentados e contornos irregulares. Fonte: Imagem cedida pelo Laboratório de Patologia e Citologia Aplicada (LAB). 68 Figura 22. Histopatologia de paciente com NIC III. Fonte: Imagem cedida pelo Laboratório de Patologia e Citologia Aplicada (LAB). 2.13 LESÃO INTRAEPITELIAL DE ALTO GRAU, NÃO PODENDO EXCLUIR MICROINVASÃO OU CARCINOMA EPIDERMÓIDE INVASOR O diagnóstico citopatológico de lesão de alto grau, não podendo excluir microinvasão ou carcinoma epidermóide invasor é infrequente (BRASIL, 2011). Na situação deste diagnóstico citopatológico, ou quando existe suspeita clínica de doença invasiva, impõe-se a confirmação histológica ou sua exclusão por meio de investigação especializada (BRASIL, 2011). A forma minimamente invasiva está no estadiamento IA da Federação Internacional de Ginecologia e Obstetrícia (FIGO) e é denominado microcarcinoma ou carcinoma microinvasor. É uma lesão definida microscopicamente e subdivide-se em duas categorias ou estádios: IA1 (profundidade de invasão do epitélio neoplásico no estroma até 3 mm e extensão menor ou igual a 7 mm no epitélio) e IA2 (profundidade de invasão maior do que 3 mm e menor ou igual a 5 mm e extensão menor ou igual a 7 mm no epitélio). Medidas de invasão superiores às definidas para microcarcinoma passam para os estádios a partir de IB. A invasão do espaço linfovascular não está incluída como parte do estadiamento, mas muda a conduta (BRASIL, 2011). Na citologia é comum um esfregaço semelhante ao do carcinoma in situ, com disposição celular de forma sincicial, disceratose atípica, diátese tumoral menos intensa que a do carcinoma invasor, hemácias sempre, manifestações de diferenciação celular como células 69 bizarras malignas e células bizarras com citoplasma orangiofílico, núcleo aumentado e hipercromático. As alterações estão representadas na figura 23 (AZEVEDO; SILVA, 2013). O diagnóstico do carcinoma microinvasor deve ser confirmado em espécime obtido por EZT ou conização, desde que as margens estejam livres, e o tratamento é definido com base no histopatológico deste espécime. Entretanto, recomenda-se que a conização seja efetuada utilizando-se técnicas clássicas, pois existe maior probabilidade de fragmentação do espécime e artefatos térmicos nos espécimes obtidos por técnicas eletrocirúrgicas, dificultando avaliação de parâmetros como profundidade de invasão envolvimento de espaço linfovascular (BRASIL, 2011). A conização pode ser considerada o tratamento definitivo para carcinoma microinvasor estádio IA1, independente de idade ou prole, podendo ser usada a eletrocirurgia ou lâmina fria, contanto que a peça cirúrgica tenha de 2,0 mm a 2,5 mm de medida na profundidade no canal endocervical (BRASIL, 2011). O envolvimento do espaço linfovascular e o comprometimento das margens da peça do cone são importantes fatores prognósticos para recorrência e definem a necessidade de nova conização ou histerectomia. Nos casos de estádio IA2, a histerectomia radical (classe II de Piver) é o tratamento mais adequado, principalmente nos casos de envolvimento do espaço linfovascular. Quando existe desejo de engravidar, a traquelectomia radical (retirada do colo do útero) com linfadenectomia pélvica pode ser uma opção cirúrgica para preservação da fertilidade (BRASIL, 2011). O seguimento deve ser regular e periódico por meio de citologia e colposcopia, com intervalos mais curtos no primeiro ano (três a quatro meses) e, a cada seis meses, por três a cinco anos. Após os cinco anos, passar a acompanhamento anual e realizar biópsia em caso de lesão suspeita (BRASIL, 2011). Todas as pacientes que apresentem exame citopatológico sugestivo de lesão de alto grau, não podendo excluir microinvasão ou carcinoma epidermóide invasor, ou, ainda, com suspeita clínica de doença invasiva, na unidade primária, devem ser encaminhadas imediatamente à unidade secundária para colposcopia como conduta inicial. Quando a colposcopia não mostrar lesão ou estejam presentes alterações não sugestivas de invasão, a conduta recomendada é a EZT (na colposcopia satisfatória) ou conização (na colposcopia insatisfatória). Caso presentes alterações sugestivas de invasão, uma ou mais biópsias, com espécimes representativos da lesão, devem ser realizadas. Se o resultado de biópsia comprovar lesão pré-invasiva (NIC II ou III), sugerir carcinoma microinvasor ou não 70 comprovar lesão francamente invasiva, realizar a EZT (na colposcopia satisfatória) ou conização (na colposcopia insatisfatória). Nos casos de carcinoma microinvasor IA1 na peça do cone com margens livres, sem comprometimento do espaço linfovascular, a paciente com prole incompleta poderá ser considerada tratada. Se esse diagnóstico for obtido em peça de EZT, um cone deverá ser realizado. Preferencialmente devem ser utilizadas técnicas de conização a frio. Após esse diagnóstico, a paciente deverá ser seguida a cada quatro ou seis meses nos dois primeiros anos e anual nos próximos três a cinco anos, na unidade secundária. Realizar biópsia em caso de suspeita de recidiva (BRASIL, 2011). A paciente com diagnóstico de carcinoma microinvasor deverá ser encaminhada para unidade terciária em uma das três situações como ter prole completa, apresentar comprometimento do espaço linfovascular, ou margens comprometidas na peça do cone ou com estadiamento IA2. Caso o resultado do exame de um espécime resultante de EZT ou conização excluir invasão, a paciente deve ser seguida conforme o diagnóstico obtido. Se o resultado do exame histopatológico da biópsia ou de espécime obtido pela EZT ou conização for de carcinoma invasor, a paciente deverá ser encaminhada para unidade terciária (BRASIL, 2011). Na presença de indícios clínicos de invasão, sem a possibilidade de biópsia ou conização para confirmação histopatológica, a paciente deverá ser encaminhada para unidade terciária (BRASIL, 2011). Para as gestantes, somente na presença de alteração colposcópica sugestiva de invasão, deve ser realizada uma biópsia. Na sua ausência, os demais procedimentos diagnósticos (EZT ou conização) devem ser realizados somente 90 dias após o parto (BRASIL, 2011). Figura 23. Histopatologia de paciente com carcinoma microinvasor: ruptura da membrana basal. 71 Fonte: Imagem cedida pelo Laboratório de Patologia e Citologia Aplicada (LAB). 2.14 CARCINOMA IN SITU Reagan introduziu o conceito de carcinoma in situ porque não havia invasão do estroma conjuntivo, isto é, a membrana basal estava íntegra. Então, compreenderia lesões de evolução imprevisível, que podem regredir ou evoluir (AZEVEDO; SILVA, 2013). Na citologia é possível observar discariose moderada e acentuada, células isoladas, descamadas, em retalhos ou sincício, em lençóis ou rosetas. Alterações nucleares predominam nas células com citoplasmas metaplásicos imaturos. Ocasionalmente é maduro e densamente queratinizado, há aumento nuclear, mas a área citoplasmática está diminuída, e a relação núcleo/citoplasma (RNC) está aumentada. Nas células com RNC muito alta, o aumento nuclear e as células podem ser menores que as observadas nas lesões intraepiteliais de baixo grau. Há hipercromasia evidente, cromatina fina ou grosseira granulosa, com distribuição regular, nucléolos geralmente ausentes e pequenos, contornos nucleares irregulares, citoplasma prolongado (aspecto de penacho). As alterações podem ser observadas na figura 24 (AZEVEDO; SILVA, 2013; KOSS; GOMPEL, 2006). É recomendado o exame preventivo a cada seis meses até dois anos (BRASIL, 2011). Figura 24. Histopatologia de paciente com carcinoma in situ. Fonte: Imagem cedida pelo Laboratório de Patologia e Citologia Aplicada (LAB). 72 2.15 ADENOCARCINOMA IN SITU É uma lesão que deriva do epitélio colunar muco secretor que reveste a endocérvice. Assim como HSIL, o adenocarcinoma in situ (AIS) é considerado lesão verdadeiramente precursora do câncer do colo do útero, caso não detectada e tratada (BRASIL, 2013a). Na citologia é possível encontrar células descamadas em lençóis ou rosetas, células altas em paliçada e na periferia aglomerado celular mostram prolongamentos do citoplasma (aspecto de penacho), núcleos hipercromáticos, nucléolos pequenos. Podem ser observadas na figura 25 (AZEVEDO; SILVA, 2013). A conização é inicialmente requerida para seu diagnóstico. Pacientes com margens cirúrgicas negativas e desejosas de terapia conservadora, com intuito de gestações futuras, devem ser orientadas a acompanhamento rigoroso com coleta de citologia e de colposcopia a cada 3 a 6 meses e curetagem endocervical caso se faça necessário. Em casos de margens cirúrgicas positivas recomenda-se a histerectomia simples ou a repetição da conização (conduta de exceção para manutenção da fertilidade), em virtude da elevada probabilidade de doença residual ou recorrente e até mesmo da presença de lesões invasivas ocultas, além do fato de que a propedêutica diagnóstica empregada não ser totalmente confiável. Em todas as situações, as pacientes devem ser esclarecidas quanto à necessidade de acompanhamento rigoroso, do risco de recidivas e da possível evolução para o adenocarcinoma invasivo (CAMPANER et al., 2007). Figura 25. Adenocarcinoma in situ com bordos em plumagem. Fonte: Imagem cedida pelo Laboratório de Patologia e Citologia Aplicada (LAB). 73 2.16 CARCINOMA EPIDERMÓIDE INVASOR É um tumor maligno invasivo mostrando diferenciação nas células escamosas. Representa também uma lesão na qual o epitélio neoplásico invade francamente o estroma conjuntivo em um ou mais lugares e há envolvimento de vasos linfáticos e sanguíneos. O Tratado de Bethesda não subdivide o carcinoma de células escamosas, contudo, com fins descritivos, os carcinomas não queratinizantes e queratinizantes são discutidos separadamente (AZEVEDO; SILVA, 2013; KOSS; GOMPEL, 2006). Na citologia é possível observar células escamosas extremamente discarióticas associadas com diátese (células inflamatórias, sangue e restos celulares necróticos). As células discarióticas podem ser pequenas (e de difícil identificação) ou grandes com citoplasma queratinizado e formatos celulares atípicos e bizarros. As alterações cromatínicas são mais acentuadas que na lesão intraepitelial. Nucléolos podem estar presentes. As alterações podem ser observadas nas figuras 26, 27 e 28 (KOSS; GOMPEL, 2006). O carcinoma não queratinizante é representado por células isoladas, com arranjos irregulares ou em sincício, com características das lesões intraepiteliais escamosas, mas com macronucléolos proeminentes, cromatina com distribuição muito irregular, opaca, hipercromática e com grumos grosseiros, áreas claras na paracromatina, relação núcleo/citoplasma frequentemente aumentada, presença de diátese tumoral (restos necróticos e sangue de aspecto envelhecido), anisocitose (variação da forma da célula), mitoses aberrantes, pleomorfismo nuclear, hemácias, leucócitos, histiócitos (AZEVEDO; SILVA, 2013; KOSS; GOMPEL, 2006). Já o queratinizante é caracterizado por células isoladas, raros agrupamentos; variação acentuada no tamanho e tipos celulares (pleomorfismo), como células caudadas, em girino, fusiformes; citoplasma denso e orangeofílico; núcleos muito aumentados de tamanho, com grande variação de forma, muitas vezes de aspecto denso e opaco; cromatina granulosa grosseira, irregularmente distribuída; áreas claras na paracromatina; macronucléolos podem ser vistos, porém são menos comuns que nos carcinomas não queratinizantes; diátese tumoral pode estar presente (KOSS; GOMPEL, 2006). Como características colposcópicas sugestivas de câncer invasivo, tem-se superfície irregular, erosão, ou ulceração; aceto-branqueamento denso; pontilhado grosseiro e irregular e mosaico grosseiro de campos largos desiguais; vasos atípicos (BRASIL, 2011). 74 A diferenciação citopatológica entre carcinoma in situ, microinvasivo ou invasivo pode ser impossível, necessitando da comprovação histopatológica, que irá determinar a invasão quando presente (BRASIL, 2002). O tratamento do câncer do colo do útero, conforme prevê a Política Nacional de Atenção Oncológica, deve ser feito nas Unidades de Assistência de Alta Complexidade em Oncologia (Unacon) e nos Centros de Assistência de Alta Complexidade em Oncologia (Cacon), que fazem parte de hospitais de nível terciário. Este nível de atenção deve estar capacitado para determinar a extensão da neoplasia (estadiamento), tratar, cuidar e assegurar a qualidade da assistência oncológica (BRASIL, 2015c). Entre os tratamentos mais comuns para o câncer do colo do útero estão a cirurgia e a radioterapia. O tipo de tratamento dependerá do estadiamento da doença, tamanho do tumor e fatores pessoais, como idade e desejo de preservação da fertilidade (BRASIL, 2015c). Nos estádios iniciais do câncer, os tratamentos cirúrgicos conservadores, como a conização ou traquelectomia radical com linfadenectomia por via laparoscópica, podem ser considerados. Para lesões invasivas pequenas, menores do que 2 cm, devem ser consideradas as cirurgias mais conservadoras, evitando-se assim as complicações e morbidades provocadas por cirurgias mais radicais (BRASIL, 2015c). Para os estádios IB2 e IIA volumosos (lesões maiores do que 4cm), IIB, IIIA, IIIB e IVA, as evidências científicas atuais orientam para tratamento quimioterápico combinado com radioterapia (BRASIL, 2015c). A podofilina a 25% em solução alcoólica é um método tradicional, mas associado a um pequeno percentual de cura e a um grande índice de complicações, tais como neurotoxicidade, fístulas, ulcerações vaginais, mielotoxicidade e teratogenicidade, quando usada na gravidez. O ácido tricloroacético a 70% pode ser utilizado em aplicações semanais em consultório para destruição de lesões de vulva ou do fundo do saco vaginal, sendo indicada na gravidez (BRASIL, 2002). Entre os meios físicos, a crioterapia destrói as camadas superficiais do epitélio cervical no colo do útero pela cristalização da água intracelular, que leva à rotura da célula e de suas organelas e a distúrbios bioquímicos. Deve-se observar a profundidade adequada de congelamento tecidual, senão falhas terapêuticas poderão ser produzidas pela falta de destruição das criptas glandulares. O laser de dióxido de carbono pode ser utilizado para vaporizar o tecido ou para corte, mas o equipamento é caro e complexo, o que limitou sua expansão. A eletrocauterização consiste no tratamento do colo com a extremidade quente de 75 um cautério, mas hoje em dia é uma técnica em desuso, pela necessidade de repetidas aplicações para destruição de toda zona de transformação (BRASIL, 2002). Figura 26. Neoplasia maligna: citoplasma aberrante. Fonte: Imagem cedida pelo Laboratório de Patologia e Citologia Aplicada (LAB). Figura 27. Carcinoma invasor. Fonte: Imagem cedida pelo Laboratório de Patologia e Citologia Aplicada (LAB). 76 Figura 28. Histopatologia de paciente com carcinoma invasor. Fonte: Imagem cedida pelo Laboratório de Patologia e Citologia Aplicada (LAB). 2.17 ADENOCARCINOMA INVASOR É o conjunto de alterações celulares semelhantes às do carcinoma invasor, mas detectadas nas células glandulares do colo do útero. A presença de células endometriais no esfregaço deve ser valorizada de acordo com a época do ciclo e com a presença de atipias nucleares (BRASIL, 2011). Na citologia é comum observar células isoladas, retalhos bidimensionais ou agrupamentos, células com núcleos aumentados e distribuição irregular da cromatina, áreas claras na paracromatina. Podem estar presentes macronucléolos, diátese tumoral necrótica pode ser evidente, células do tipo colunar com citoplasma eosinofílico ou cianofílico, células escamosas anormais, representando a coexistência de lesão escamosa, ou componente escamoso de um adenocarcinoma. É comum o aspecto típico em plumagem (feathering) e paliçada, representado na figura 29 (KOSS; GOMPEL, 2006). A prevalência do diagnóstico citopatológico deste tipo, no Brasil, é menor do que 0,01% dentre todos os exames considerados satisfatórios. Todavia, 50% dos casos podem coexistir com lesões escamosas pré-invasivas ou carcinoma invasivo, o que pode dificultar o diagnóstico, já que os fatores de risco para AIS são semelhantes àqueles para as doenças préinvasivas escamosas. Cerca de 48% a 69% das mulheres com laudo citopatológico sugestivo de AIS apresentam confirmação da lesão no exame de histopatologia e, dessas, 38% apresentam laudo de invasão. Em cerca de 5% a 15% dos casos de AIS, as lesões são multifocais. Ademais, as lesões podem não ser contíguas, implicando no fato de que, mesmo 77 se as margens forem negativas em espécimes obtidos por conização, não há garantia de que a lesão tenha sido totalmente extirpada. Consequentemente, a recidiva da doença é identificada em, aproximadamente, 15% a 19% das pacientes submetidas à conização com margens livres e atinge 50% a 65% dos casos, quando as margens estão comprometidas (BRASIL, 2011). Existe controvérsia quanto à possibilidade de uso de técnicas eletrocirúrgicas para tratamento excisional de doença pré-invasiva glandular, devido a relatos de danos térmicos significativos, dificultando a análise das margens cirúrgicas. Ainda, a conização com bisturi mostra proporção mais elevada de margens livres quando comparada com a eletrocirurgia. O tratamento considerado definitivo para AIS é a histerectomia. No entanto, a conização do colo pode ser considerada suficiente para o tratamento do AIS em pacientes sem prole constituída e com margens livres (BRASIL, 2011). Pacientes com exame citopatológico sugestivo de AIS ou adenocarcinoma invasor devem ser encaminhadas para colposcopia na atenção secundária. Essas pacientes terão indicação de conização exceto se, à colposcopia, for observada alteração sugestiva de invasão. Nessa situação, a biópsia deve ser realizada. Caso o diagnóstico histopatológico confirme essa suspeita, encaminhar para atenção terciária. Caso a biópsia seja negativa ou tenha outro diagnóstico que não de doença invasiva, a indicação de conização do colo uterino deve ser mantida. A escolha da técnica de conização deve considerar a necessidade de fornecer um espécime com margens adequadas para avaliação. É recomendável a avaliação endometrial (com ultrassonografia e/ou estudo anatomopatológico) em pacientes acima de 35 anos (BRASIL, 2011). Abaixo dessa idade, a investigação endometrial deverá ser realizada se presente sangramento uterino anormal. O resultado de AIS no espécime de conização indica a histerectomia simples, exceto nas pacientes com prole incompleta. Na eventualidade de margens comprometidas na conização, e com prole completa, um novo cone deverá ser realizado, sempre que possível, para excluir doença invasiva. No diagnóstico de câncer, a mulher deve ser encaminhada para unidade terciária. No seguimento, após tratamento por conização, uma nova citologia deve ser obtida em seis meses e, após dois anos com exames semestrais normais, a paciente deve retornar ao rastreio trienal. Uma nova conização, ou histerectomia, na impossibilidade de uma nova conização, estará indicada na evidência de lesão residual (BRASIL, 2011). Gestantes devem ser investigadas da mesma maneira, exceto pelo estudo endometrial, que não é factível. A biópsia do colo do útero deverá ser realizada apenas na suspeita de 78 doença invasiva e a conização, caso indicada, deverá ser realizada 90 dias após o parto (BRASIL, 2011). Figura 29. Adenocarcinoma invasor. Fonte: Imagem cedida pelo Laboratório de Patologia e Citologia Aplicada (LAB). Desde 1999 têm-se disponível um sistema de informação que registra os dados informatizados dos procedimentos de citopatologia, histopatologia e controle de qualidade do exame preventivo, referentes ao programa de controle do câncer do colo do útero no Brasil, o SISCOLO (BRASIL, 2013b). Está implantado nos laboratórios de citopatologia que realizam o exame citopatológico pelo SUS e nas coordenações estaduais, regionais e municipais de detecção precoce do câncer (BRASIL, 2015c). O Sistema de Informação do Câncer do Colo do Útero (SISCOLO) é um subsistema do Sistema de Informações Ambulatoriais do Sistema Único de Saúde (SAI-SUS), desenvolvido pelo INCA, em parceria com o Departamento de Informática do SUS (Datasus). É composto por dois módulos operacionais: o módulo prestador de serviço, que registra os dados referentes aos procedimentos de citopatologia, histopatologia e monitoramento externo da qualidade, e o módulo coordenação, que registra as informações de seguimento das mulheres que apresentam resultados de exames alterados. Permite acompanhar o desenvolvimento das ações de controle do câncer, ou seja, avaliar por meio de indicadores se a população alvo está sendo atingida, qual a prevalência das lesões precursoras entre as mulheres diagnosticadas, qual a qualidade da coleta destes exames, adequabilidade, qual o percentual de mulheres que estão sendo tratadas e acompanhadas, permite fornecer 79 indiretamente dados para avaliar a captação, mulheres novas, mulheres atingidas e cobertura do programa de rastreamento (BRASIL, 2013b). É importante que este sistema tenha o cadastro das mulheres e interface com os sistemas de cadastros da atenção primária, que garanta exames vinculados às mulheres cadastradas, identifique o tempo decorrido do último exame e a necessidade de novo convite para rastreamento (periodicidade), emita convites e listas para as mulheres realizarem os exames e o laudo do SISCOLO via web (BRASIL, 2010). Existe também o Sistema de Informações do Câncer (SISCAN), uma versão em plataforma web que integra o SISCOLO. Ele permite o acompanhamento das ações de rastreamento do câncer, e, a partir da identificação da usuária, a interoperabilidade com outros sistemas de informação do Ministério da Saúde (BRASIL, 2013b). O SISCAN é destinado a registrar a suspeita e a confirmação diagnóstica, registrar informações sobre condutas diagnósticas e terapêuticas relativas aos exames alterados, fornecer o laudo padronizado, arquivar e sistematizar as informações referentes aos exames de rastreamento e diagnóstico e selecionar amostras para monitoramento externo da qualidade dos exames citopatológicos (BRASIL, 2013b). Assim como o SISCOLO, é um sistema brasileiro, único, com características próprias e que permite coletar informações, emitir laudos, gerenciar recursos e auditar resultados (BRASIL, 2013b). É integrado ao Cadastro Nacional de Usuários do SUS (CADWEB), permitindo a identificação dos usuários pelo número do cartão SUS e a atualização automática de seu histórico de seguimento, e ao Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde (CNES), o que permite aos profissionais dos estabelecimentos de saúde habilitados para coleta, solicitação e emissão de laudos de exames, estarem automaticamente disponíveis no sistema como responsáveis por estas ações. Disponibiliza, em tempo real, as informações inseridas no sistema pela internet. No momento em que a unidade de saúde fizer a solicitação do exame, esta ficará visível para o prestador incluir o resultado. Quando o laudo estiver liberado pelo prestador de serviço, a unidade de saúde solicitante poderá visualizá-lo. Ao final da competência, quando o prestador encerrá-la, automaticamente as informações epidemiológicas serão exportadas para a base nacional. Este recurso permitirá a unidade de saúde agilizar a rotina no seu processo de trabalho, entretanto é importante ter claro que o recurso de disponibilizar o laudo pela internet não é uma assinatura eletrônica e não substitui o laudo impresso e assinado (BRASIL, 2015a). 80 Segundo o INCA, o câncer do colo do útero é um dos mais comuns na população feminina brasileira, sendo a terceira causa de morte de mulheres por câncer no país. Por possuir altos índices de incidência e mortalidade e alta relevância epidemiológica e social, é um problema grave de saúde pública. Mas, com exceção do câncer de pele, é o que apresenta maior potencial de prevenção e cura se diagnosticado e tratado no início (BRASIL, 2014b). Segundo estimativas mundiais, é o terceiro tipo de câncer mais comum entre as mulheres, sendo apenas ultrapassado pelo câncer de pele não melanocítico e pelo câncer de mama, e surgem aproximadamente 530 mil casos novos por ano. As taxas de incidência estimada e de mortalidade no Brasil apresentam valores intermediários em relação aos países em desenvolvimento, mas são elevadas quando comparadas às de países desenvolvidos com programas de detecção precoces bem estruturados. Para o ano de 2014, no Brasil, foram esperados 15.590 casos novos, com um risco estimado de 15,33 casos a cada 100 mil mulheres (BRASIL, 2014b). Sem considerar os tumores de pele não melanoma, o câncer do colo do útero é o mais incidente na região Norte (23,57/ 100 mil). Nas regiões Centro-Oeste (22,19/ 100 mil) e Nordeste (18,79/ 100 mil), é o segundo mais frequente. Na região Sudeste (10,15/100 mil), o quarto e, na região Sul (15,87 /100 mil), o quinto mais frequente (BRASIL, 2014b). Estimativas da OMS indicam que 290 milhões de mulheres no mundo são portadoras da doença, sendo 32% infectadas pelos tipos 16 e 18 de HPV. E 270 mil mulheres morrem devido à doença, o que gera custos sociais de repercussão familiar e na economia do país, interrompendo a vida de um grande contingente de mulheres em idade útil, social e economicamente ativa. Dentre as doenças que comumente ocorrem entre as mulheres, as que ganham maior expressão são as infecções do trato geniturinário, sendo as maiores causas de morbidade entre indivíduos sexualmente ativos em todo o mundo. Considerando as doenças para as quais existe tratamento, as doenças sexualmente transmissíveis (DSTs) representam o segundo grupo mais importante de doenças entre mulheres (BRASIL, 2015c). Segundo o estudo feito por OLIVEIRA et al. (2014), a mudança de hábitos, aliada ao estresse gerado pelo estilo de vida do mundo moderno, contribui diretamente na incidência deste câncer na população feminina. Os fatores culturais, sociais, econômicos e comportamentais, como vergonha e constrangimento, são vilões a não adesão ao exame preventivo, o que ocasiona o diagnóstico em estágio avançado, comprometendo a cura (OLIVEIRA et al., 2014). 81 A partir dos anos 80, o controle deste câncer se fortaleceu com a criação de ações e programas voltados para prevenção e controle, como o Viva Mulher: Programa Nacional de Controle do Câncer do Colo do Útero e da Mama, com o objetivo de reduzir, substancialmente, o número de mortes causadas pelo câncer de colo e de mama, através do acesso mais efetivo ao diagnóstico precoce, e exame clínico das mamas, além de disponibilizar tratamento adequado para as mulheres que apresentassem tumores. Mas isso ainda não foi suficiente para reduzir a tendência de mortalidade e, em muitas regiões, o diagnóstico ainda é feito em estádios mais avançados da doença (BRASIL, 2006; TAVARES; PRADO, 2006). 82 3 CONCLUSÃO Os estudos apresentados tratam das recomendações para rastreamento e diagnóstico de atipias do trato genital feminino e alterações precursoras do câncer do colo do útero e fazem uma relação do saber científico com as medidas de cuidado preventivo, que é essencial na atuação dos profissionais. As principais contribuições desta revisão foram ressaltar estas recomendações e as condutas, bem como a importância do diagnóstico precoce das lesões, visto que auxilia na regressão ou previne a progressão de câncer invasor. Além disso esta revisão pretende mostrar o quanto é necessário, para a diminuição das taxas de incidência de lesões e do índice de mortalidade por câncer no país, a implantação de um sistema de informação mais organizado que os existentes (Sistema de Informação do Câncer do Colo do Útero – SISCOLO e Sistema de Informações do Câncer - SISCAN). Para tanto, é fundamental um sistema organizado que assegure à mulher o acesso integral às ações e serviços, em todos os níveis de atenção básica de saúde. É necessário que estas ações e serviços sejam qualificados e humanizados, realizados por equipes multiprofissionais capacitadas, em um sistema que defina estratégias para o aumento da cobertura da população de risco para realização do exame periódico, a identificação desta população que deve ser incluída em um cadastro sistemático, com o controle de comparecimento das mulheres, que realize convocação e reconvocação das que estão em falta com os exames, com registro de todo o histórico das pacientes, qualidade nas coletas e na interpretação de material, com assistência adequada e ampliação do acesso às informações sobre o câncer do colo do útero para todas, sempre ressaltando que é prevenível pela detecção e pelo tratamento das lesões precursoras, e com o encaminhamento de mulheres com alterações, avaliando sua compreensão sobre a doença, oferecendo tratamento o mais breve possível, em um ambiente hospitalar que respeite sua autonomia, dignidade e confidencialidade, e oferecendo acompanhamento adequado. Estas mulheres devem ser atendidas levando-se em consideração sua história de vida, condições socioculturais, étnicoraciais e religiosas, seus anseios e suas expectativas. A abordagem das que portarem a doença deve acolher as diversas dimensões do sofrimento (físico, espiritual e psicossocial). A falta de investimentos em educação permanente, recursos humanos e materiais causam desmotivação nos profissionais, que, em alguns momentos, passam a atender de forma descuidada, sem envolvimento com as questões de saúde do usuário, gerando 83 insatisfação em ambos. O que não se pode esquecer é o atendimento humanizado e a responsabilização. Isso é uma questão de ética profissional e respeito à cidadania do usuário. Assim, há necessidade de maior adesão dos profissionais às recomendações técnicas que chama a atenção e deve ser enfrentada por meio do contínuo trabalho de informação e pela busca de alinhamento das práticas em prol da maior efetividade das ações. Nos últimos anos o jovem tem passado a ter mais acesso as diversas fontes de informação no que diz respeito às questões sexuais, mas ainda existem os adolescentes com baixa escolaridade, menor nível sócio-econômico-cultural e de menor idade que possuem menos conhecimento sobre os métodos anticoncepcionais e iniciam a vida sexual precocemente. Por isso, práticas educativas, assistenciais e programas governamentais de prevenção, que possam atuar sobre a realidade cultural das adolescentes e que motivem a mulher a cuidar de sua saúde devem ser realizadas. Homens desempenham o papel de transmissores do vírus para as mulheres e, dessa forma, é importante ressaltar que também devem ser alvos da educação preventiva. A oferta de exames pelo SUS atualmente seria suficiente para a cobertura da população feminina na faixa etária prioritária, porém observa-se que grande parte dos exames é ofertada como repetições desnecessárias, em intervalos menores do que o recomendado e para mulheres com faixa etária de baixo risco. Os problemas de saúde mais prevalentes e significativos de cada Estado e município do Brasil devem ser levados em conta na sua diversidade para o estabelecimento das prioridades e políticas em saúde, visto que um problema de saúde considerado prevalente e relevante em um Estado pode não ser em outro e, desse modo, a construção de programas de rastreamento deve reconhecer as diversidades, as prioridades e necessidades locais e regionais. Como apresentado, muito ainda há de ser feito para se chegar a este patamar desejado de oferta e qualidade das ações de detecção precoce do câncer colo do útero no Brasil. Esperase que os estudos apresentados contribuam para esse reconhecimento e que motivem, em todos os níveis, a busca permanente das condições necessárias para o adequado desempenho das ações de controle dessa neoplasia. A partir desta contribuição esperamos também que novos estudos possam surgir com atualizações e recomendações, sempre de acordo com as características socioeconômicas regionais, corroborando também para o aperfeiçoamento ou elaboração de estratégias políticas de governo. O amplo acesso da população a informações claras, consistentes e culturalmente 84 apropriadas a cada território deve ser uma iniciativa dos serviços de saúde em todos os níveis do atendimento. 85 4 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ANDRADE, L. B. Análise morfométrica, imunocitoquímica e molecular das citologias cérvico-vaginais com atipias de significado indeterminado. São Paulo. 2012. 87F. Tese (Doutorado em Ciências). Programa de Pós-Graduação em Ciências, Fundação Antônio Prudente. São Paulo, 2012. 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