Tchaadaev, Piotr (1794-1856) Antigo hussardo que em Carta

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Tchaadaev, Piotr (1794-1856) Antigo hussardo que em Carta Filosófica, de
1829-1831, tenta construir, mas ainda à maneira germanista de Herder, a
primeira história do mundo em redor do povo russo. Com efeito, até então, os
eslavos eram considerados povos sem história, circunstância que andava
directamente ligada à circunstância de não haver um suficiente
desenvolvimento da teoria da linguagem. Na verdade, só em 1783 é que a
Academia decidiu elaborar um dicionário e uma gramática da língua russa,
desencadeando um processo que vai levar a que, logo nos começos do século
XIX, o russo se tenha transformado em língua literária. É a partir de meados da
década de trinta do século XIX que Tchaadaev vai lançar o movimento de
defesa da comunidade (soborrnost'), ponto de partida para o esforço de
russificação que, meio século depois, levará Alexandre III, a partir de 1887, a
determinar que, nas universidades, apenas possa ensinar-se em russo. Para
Tchaadaev, todos reconhecerão que o homem não tem outro destino neste
mundo senão trabalhar pela destruição da sua personalidade e sua
substituição por uma existência social e impessoal. Dizia também que metidos
no nosso casulo [...] permanecemos fora das grandes aventuras do mundo [...]
mantivemo-nos abrigados debaixo dos nossos telhados de madeira e de colmo.
Mais: vindos ao mundo como filhos ilegítimos, sem herança e sem ligação com
os homens que nos precederam à face da terra, nada temos nos nossos
corações dos ensinamentos anteriores às nossas próprias existências. O que é
hábito e instinto nos outros povos, temos nós de meter às marteladas nas
nossas cabeças. Somos, a bem dizer, estrangeiros a nós próprios. Marchamos
no tempo, por forma tão singular que, à medida do nosso avanço, a véspera
foge-nos para sempre  consequência natural duma cultura de importação e de
imitação. Entre nós não há desenvolvimento íntimo, progressão natural; as
ideias novas varrem as antigas, porque não provêm delas: surgem não se sabe
donde. Porque não acolhemos senão ideias feitas, não marca as nossas
inteligências o sulco inapagável que todo movimento progressivo grava nos
espíritos e que faz a sua força. Crescemos, mas não amadurecemos. Contudo,
baseado nestas razões, acaba, paradoxalmente, por ser favorável a uma
conversão da Rússia ao catolicismo. Trata-se, como assinala Besançon, de
uma historiografia de tipo gnóstico, com os dois princípios e os três tempos do
maniqueísmo, mas, em vez de serem apresentados através de uma mitologia,
são-no através de uma história pretensamente real, objecto de ciência
constatável. É o que assinala a passagem de um pensamento gnóstico a um
pensamento ideológico. Assim, esta ficção que se recusa a ser uma ficção, que
se apoia nos Padres e na realidade, torna-se uma ficção em dois graus, quase
impossível de assinalar. No fundo, Tchaadaev pretendia aplicar à Rússia, de
forma bem patriótica, as teses do destino manifesto e da missão nacional que o
nascente romantismo ocidental ensaiava para outras pátrias. Assim, vem falar
na potencialidade da Rússia e da sua não revelação, correspondendo-se com
personalidades ocidentais como Joseph de Maistre e Louis Bonald, dois
eminentes teóricos contra-revolucionários, bem como com Schelling. Para o
autor russo em análise, nunca marchámos com os outros povos, não
pertencemos a nenhuma das outras famílias do género humano. Não somos
nem do Oriente nem do Ocidente, nem nos dizem respeito as tradições de um
ou do outro. Apesar destas relações de filiação ideológica, as teses da Rússia
como explosão retardada foram consideradas pelas autoridades russas como
revolucionárias, pelo que o respectivo autor não só foi silenciado pela censura,
como também considerado oficialmente louco, sendo condenado a vigilância
médica.
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