Revisão da Literatura Caderno Científico Aumento horizontal com osso xenógeno em bloco: alternativa viável ao uso do ósseo autógeno Horizontal augmentation with xenogenic bone: a viable alternative to autogenous bone Isis Carvalho Encarnação* Carolina Enith Medina Bullen** Maria Del Piñal Luna*** Armando Rodrigues Lopes Pereira Neto**** Ernesto Barquero Cordero***** Ricardo de Souza Magini****** RESUMO Uma nova apresentação do osso xenógeno está disponível na forma de bloco para reconstruções ósseas dos rebordos alveolares. A respeito dessa técnica, pesquisas têm demonstrado bons resultados clínicos, como a integração do enxerto, a instalação dos implantes e a manutenção dos tecidos peri-implantares. Entre os estudos analisados, o enxerto ósseo xenógeno mineral em bloco mostra-se uma alternativa viável para a reconstrução horizontal dos rebordos alveolares, porém, um período de reparo maior deve ser respeitado. Diante das vantagens desse material, o objetivo desta revisão da literatura é avaliar e discutir os resultados encontrados com esse biomaterial para o aumento ósseo horizontal. Unitermos - Enxerto ósseo; Osso xenógeno; Aumento horizontal; Implante. ABSTRACT New presentation of xenogenic graft is available in block form for bone reconstruction at alveolar ridges. Research has demonstrated good clinical results such as graft integration, implant installation, and maintenance of peri-implant tissues. Among the studies reviewed, the xenogenic bone graft mineral block appears to be a viable alternative for horizontal reconstruction of alveolar ridges, but an extended healing period must be respected. Given the advantages of this material, the purpose of this review is to evaluate and discuss the results with this biomaterial for horizontal bone augmentation. Key Words - Bone grafting; Xenogenic bone; Horizontal augmentation; Dental Implants. *Especialista em Implantodontia – ABO/SP; Mestranda em Implantodontia – Universidade Federal de Santa Catarina. **Mestranda em Prótese – Universidade Federal de Santa Catarina. ***Mestranda em Implantodontia – Universidade Federal de Santa Catarina. ****Especialista em Periodontia – FOB-USP; Mestre e doutorando em Implantodontia – Universidade Federal de Santa Catarina. *****Mestre e doutorando em Implantodontia – Universidade Federal de Santa Catarina. ******Mestre e doutor em Periodontia – FOB-USP; Coordenador do Programa da Pós-graduação em Odontologia – Universidade Federal de Santa Catarina. REVISTA IMPLANTNEWS 2011;8(2):201-5 339 Encarnação IC • Bullen CEM • Luna MDP • Pereira Neto ARL • Coredero EB • Magini RS Introdução O sucesso do tratamento com implantes depende de volume ósseo adequado para a instalação deles, pois o prognóstico no longo prazo é afetado negativamente por um volume ósseo inadequado1. Várias técnicas têm sido sugeridas para preparar o local para receber os implantes osseointegrados. As técnicas reconstrutivas estão relacionadas ao volume ósseo perdido, seja em espessura, em altura ou em ambos. Aumento ósseo horizontal é qualquer procedimento que tem como objetivo aumentar a espessura do rebordo alveolar para receber implantes de diâmetro adequado; normalmente, maior que 3,5 mm2. O enxerto ósseo autógeno é o mais utilizado e tido como padrão ouro, devido a suas vantagens biológicas e potencial osteogênico. Porém, apresenta desvantagens, como maior período de convalescência, morbidade e susceptibilidade a infecções no sítio doador e reabsorção progressiva e contínua, motivos pelos quais se tem procurado alternativas de substitutos ósseos como os enxertos alógenos, xenógenos e aloplásticos. Esses materiais, que vão desde aloplásticos particulados até blocos autógenos de áreas intrabucais, possuem diferentes propriedades mecânicas e biológicas3. Além disso, a variedade de procedimentos e produtos disponíveis constitui um problema para o cirurgião/implantodontista, que tem a responsabilidade de recomendar a técnica cirúrgica mais indicada e com baixos riscos de complicações e morbidade ao paciente. Diversas pesquisas têm demonstrado, a partir de resultados promissores, que o enxerto xenógeno é uma alternativa a ser considerada em procedimentos reconstrutivos para reabilitação de defeitos ósseos4-5. Inicialmente, o enxerto de osso bovino mineral desproteinizado particulado foi muito utilizado e estudado para regeneração tecidual guiada com o uso de membranas e levantamento de seio maxilar, por suas propriedades osteocondutoras e biocompatibilidade6. Ao utilizar esse tipo de material em bloco para aumento ósseo horizontal, aliam-se suas propriedades biológicas anteriormente citadas à redução do tempo operatório, dos riscos de contaminação, do trauma causado na área doadora, além de ser um material de custo reduzido7-8. Ante as vantagens desse material em bloco e de seus resultados promissores, o objetivo desta revisão da literatura foi avaliar e discutir os estudos realizados com esse biomaterial para o aumento ósseo horizontal. Revisão da Literatura O uso de materiais inorgânicos, de origem bovina, particulados para levantamento do assoalho do seio maxilar e regeneração tecidual guiada está bem documentado e 340 REVISTA IMPLANTNEWS 2011;8(2):201-5 utilizado6, mas, embora algumas pesquisas já demonstrem bons resultados4-5, pouco se sabe sobre o potencial desse tipo de material como enxerto em bloco. Em um relato de caso em humanos observou-se a formação de novo osso em contato íntimo com as partículas residuais do substituto quando utilizadas para técnica de enxerto horizontal onlay sem o uso de membranas, servindo como arcabouço osteocondutor9-10. A propriedade de osteocondução refere-se à habilidade de servir como arcabouço para migração, adesão e proliferação de células osteoprogenitoras e à maturação destas em osteoblastos para a produção de matriz extracelular11. Quando incorporado ao tecido ósseo, o osso bovino inorgânico é mantido como material de preenchimento inativo e é reabsorvido quando o tecido passa por uma extensa remodelação12. Além disso, o material apresenta vantagens como fácil manuseio intraoperatório, disponibilidade em grande quantidade e custos acessíveis5. A configuração do osso bovino inorgânico em bloco, obviamente, tem menores propriedades osteocondutoras quando aplicada para reconstrução lateral8 ou vertical13. Em um estudo in vivo, esses blocos não mostraram alterações dimensionais, mas, em contraste, estavam principalmente preenchidos por tecido conjuntivo e somente uma quantidade mínima (26%) de novo osso formado era observada na base do enxerto8,13. Estudos experimentais em cães, empregando osso bovino inorgânico em bloco para aumento ósseo vertical e comparando a formação óssea com ou sem o uso de barreiras de membrana, mostraram que houve maior formação de osso naqueles grupos nos quais foram recobertos com membrana. Porém, as amostras histológicas demonstraram que houve pouca formação de novo osso e que sua formação estava entre o parafuso de fixação e a base do osso receptor, a parte mais externa do material enxertado estava preenchido com tecido conjuntivo14. Em um relato de caso com a utilização de bloco de osso mineral bovino (Bio-oss spongiosa block, Geistlich Biomaterials, Wolhusen, Suíça) e recobrimento com membrana de colágeno (Bio-Guide, Geistlich Biomaterials), aguardou-se um período de cicatrização de seis meses previamente à instalação do implante. Durante a instalação do implante foi observada, clinicamente, a eliminação do defeito ósseo e integração do enxerto até o nível ósseo dos dentes adjacentes com excelente integração às margens da área receptora, tendo-se aguardado também seis meses para a cirurgia de segundo estágio e reabilitação protética. Com um ano de controle após a instalação dos implantes, houve perda óssea marginal menor que 1 mm; em dois anos de função, não foram observadas modificações adicionais5. Em um relato de 12 casos, com 15 áreas receptoras utilizando bloco de osso mineral bovino (Bio-oss spongiosa block, Geistlich Biomaterials, Wolhusen, Suíça) e recobrimento com membrana de colágeno (Bio-Guide, Revisão da Literatura Caderno Científico Geistlich Biomaterials), aguardaram-se entre nove e dez meses previamente à instalação do implante e quatro meses para a cirurgia de segundo estágio. Os resultados deste estudo mostram que a combinação deste biomaterial e a membrana de colágeno é uma opção de tratamento efetivo para aumento ósseo horizontal previamente a instalação de implantes com redução da morbidade ao paciente15. O uso de membranas absorvíveis evita uma nova exposição cirúrgica para remoção de membranas não absor- Figura 1 Osso bovino mineral desproteinizado particulado (Bio-oss Spongiosa small granules, Geistlich Biomaterials, Switzerland). Figura 3 Defeito ósseo horizontal na região de 22 a 12, observe a espessura do rebordo alveolar, necessitando de reconstrução para a futura instalação dos implantes. víveis e também os riscos de deiscências e contaminações, que poderiam comprometer o enxerto4. O uso do osso bovino desproteinizado mineral particulado utilizado isolado ou associado a osso autógeno e/ ou membranas tem mostrado baixas taxas de reabsorção. A hidroxiapatita é integrada ao novo osso formado, com contato íntimo do osso lamelar à superfície das partículas16. Um comportamento semelhante é observado no material com configuração em bloco17. Figura 2 Osso bovino mineral desproteinizado em bloco (OrthoGen, Genius Biomaterials, Baumer). Figura 4 Reconstrução com dois blocos de osso bovino mineral desproteinizado em bloco (OrthoGen, Genius Biomaterials, Baumer), já fixados em posição e preenchido com osso particulado na região de 22 a 12. REVISTA IMPLANTNEWS 2011;8(2):201-5 341 Encarnação IC • Bullen CEM • Luna MDP • Pereira Neto ARL • Coredero EB • Magini RS Discussão Dentre as técnicas disponíveis para o aumento da espessura do rebordo alveolar, a utilização de blocos de osso autógeno com ou sem membranas resulta em maiores ganhos em largura de crista e menores taxas de complicações que o uso de materiais particulados com ou sem membrana3,18. As taxas de sobrevivência de implantes colocados em regiões que receberam reconstruções horizontais são elevadas2-3,5,15. Enxertos ósseos autógenos em bloco são a escolha mais comum para reconstruir rebordos deficientes para futura reabilitação com implantes osseointegrados19. Suas propriedades de osteogênese, osteoindução e osteocondução promovem rápida integração do material enxertado, entretanto, o osso é reabsorvido em uma porcentagem considerável, a quantidade da área doadora é limitada e há maiores riscos de complicações20. O comportamento ideal dos materiais de enxerto é que ocorra sua reabsorção e completa remodelação para o novo osso, entretanto, a taxa de reabsorção varia de um material para outro, o que pode comprometer sua utilização, principalmente em áreas estéticas20. Uma reabsorção relativamente rápida dos enxertos ósseos autógenos tem levado à procura por substitutos ósseos mais estáveis ao longo do tempo21. Porém, nenhum dos biomateriais disponíveis comercialmente combina todas as características definidas como ideais para os materiais de enxerto22. A capacidade dos enxertos autógenos em manter seu volume original é variável, os estudos que avaliam essa variação mostram resultados contraditórios devido a fatores relevantes nos períodos em que as áreas enxertadas são observadas, como: tipo e local de reconstrução; tempo de carregamento dos implantes; uso ou não de próteses totais sobre as áreas reconstruídas; área doadora escolhida23. Existem dados que reportam variação da reabsorção óssea horizontal do enxerto de 10% a 50%24-25. O sucesso do aumento ósseo vertical pode também ser baseado na taxa de sucesso/sobrevivência dos implantes instalados nesses locais, porque reflete, em último caso, o resultado do tratamento, que inclui função mastigatória, saúde e estética ao paciente26. A instalação dos implantes parece inibir a reabsorção do osso residual, assim como do osso enxertado24. Uma característica dos biomateriais xenogênicos é ter sua estrutura tridimensional semelhante à do osso; suas partículas devem estar ausentes de proteínas, já que poderia ocasionar uma reação imune às proteínas bovinas em indivíduos sensíveis a elas20. Porém, existem dados que indicam a presença desses fatores bioativos, como TGFb e BMP-2, em algumas amostras pesquisadas10. A presença dessas proteínas pode explicar a impressão clínica de que esse material é mais efetivo do que os substitutos que apresentam somente a estrutura tridimensional semelhante à do osso10. Apesar de não provocar resposta imunológica 342 REVISTA IMPLANTNEWS 2011;8(2):201-5 Uma preocupação com respeito ao uso desse tipo de material era o contágio de encefalopatia espongiforme (doença da vaca-louca), mas comprovou-se que um tratamento acima de 300ºC ou com álcalis, seguido de neutralização, remove praticamente qualquer príon que porventura exista na amostra27. crônica, o número de procedimentos e exposição a esse tipo de material tem aumentado; consequentemente, a antigenicidade se torna mais crítica10. Uma preocupação com respeito ao uso desse tipo de material era o contágio de encefalopatia espongiforme (doença da vaca-louca), mas comprovou-se que um tratamento acima de 300ºC ou com álcalis, seguido de neutralização, remove praticamente qualquer príon que porventura exista na amostra27. O osso bovino inorgânico é um osso natural desproteinizado com alto grau de biocompatibilidade28. Esse substituto sofre um processo lento de remodelação ao longo do tempo e se torna incorporado ao osso nativo29, o que justifica a manutenção do volume do enxerto, promovendo maior estabilidade da altura do osso interproximal, até que os implantes recebam cargas e a remodelação natural aconteça5. Essa manutenção pode ser a responsável por maior previsibilidade nos tecidos peri-implantares, que é crítica em áreas estéticas e defeitos ósseos extensos. O recobrimento dos enxertos com membranas, absorvíveis ou não, está baseado no fato de isolar a área de reparo (enxerto) para evitar a migração e proliferação de células indesejadas (nesse caso, células do tecido conjuntivo), permitindo o povoamento do enxerto com células ósseas30. Revisão da Literatura Caderno Científico Embora a literatura não apresente estudos comparando in vivo a formação óssea dos enxertos xenógenos em blocos associados ao uso das membranas para aumento ósseo horizontal; quando este enxerto foi testado para aumento ósseo vertical concluiu-se que eles podem ser utilizados como arcabouço, por revelar propriedades osteocondutoras e organização a um nível equivalente ao enxerto autógeno e que, além disso, a sua combinação com membranas de colágeno não mostrou diferenças significativas quanto ao resultado do tratamento17. As pesquisas apresentadas mostram resultados promissores, porém, utilizam tempos diferentes entre a instalação do enxerto e do implante e diferentes tempos de controle pós-operatório em amostras pequenas. Por isso, mais pesquisas devem ser realizadas em relação ao papel das membranas absorvíveis associadas ao enxerto, ao potencial de formação óssea no enxerto e ao comportamento dos implantes instalados nessas áreas no longo prazo. Referências 1. Lekholm UE, Adell R, Slots J. The condition of the soft tissues at tooth and fixture abutments supporting fixed bridges. J Clin Periodontol 1986;13:558-62. 2. Esposito MGG, Felice P, Karatzopoulos G, Worthington HV, Coulthard P. The efficacy of horizontal and vertical bone augmentation procedures for dental implants: a Cochrane systematic review. Eur J Oral Implantol 2009;2(3):167-84. 3. Chen JB, Jensen SS, Chiapasco M, Darby I. Consensus statements and recommended clinical procedures regarding surgical techniques. Int J Oral Maxillofac Implants 2009;24(Suppl):272-8. 4. Moses O, Pitaru, S, Artzi Z, Nemcovsky CE. Healing of dehiscence type defects in implants placed together with different barrier membranes: a comparative clinical study. 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