42º Congresso Bras. de Medicina Veterinária e 1º Congresso Sul-Brasileiro da ANCLIVEPA - 31/10 a 02/11 de 2015 - Curitiba - PR 1 INTOXICAÇÃO POR INGESTÃO RECORRENTE DE Dieffenbachia picta Schott (COMIGO-NINGUÉM-PODE) EM UM CANINO – RELATO DE CASO BEATRIZ GUERREIRO GIESE1, VICTOR HUGO FLORES BERNARDES1, LAIZ GALVÃO E SILVA DE MOURA1, LEONY SOARES MARINHO1, RUTH HELENA FALESI PALHA DE MORAES BITTENCOURT1 1 Universidade Federal Rural da Amazônia Resumo Relata-se intoxicação por ingestão recorrente de Dieffenbachia picta Schott (comigo-ninguém-pode) em um cão, o qual apresentou episódios de vômito e melena. Durante 48 horas de internamento o mesmo apresentou oligúria, inapetência, dispneia, ronco, convulsão e mioclonias, além da observação de outros sintomas clássicos de intoxicação por essa planta chegando a óbito. A ingestão recorrente de Dieffenbachia picta Schott, independente de quantidade, deve ser levada em consideração, tornando-se essencial o acompanhamento do histórico clínico. Palavras-chave: Canino. Dieffenbachia picta Schott. Intoxicação. INTOXICATION BY RECURRENT INGESTION OF Dieffenbachia picta Schott (DUMB CANE) IN A CANINE – CASE REPORT Abstract Is reported a intoxication by recurrent ingestion of Dieffenbachia picta Schott (Dumb cane) in a dog, with episodes of vomiting and melena. For 48 hours of admission, the animal presented oliguria, loss of appetite, dyspnoea, snoring, convulsions and myoclonus, as well as observation 1416 42º Congresso Bras. de Medicina Veterinária e 1º Congresso Sul-Brasileiro da ANCLIVEPA - 31/10 a 02/11 de 2015 - Curitiba - PR 2 of other classic symptoms of poisoning by this plant, reaching to death. The recurring intake of Dieffenbachia picta Schott, regardless of quantity, must be taken in consideration, making it essential to monitor the clinical history. Key-words: Canine. Dieffenbachia picta Schott. Intoxication. INTRODUÇÃO Devido a grande prevalência em acidentes, a Dieffenbachia picta Schott, conhecida popularmente por comigo-ninguém-pode ou aninga-do-pará (Silva; Takemura, 2006), se destaca entre as 16 plantas que mais causam intoxicação no Brasil (Sinitox, 2012). Em 2007, o Centro de Informação Toxicológica do Rio Grande do Sul, registrou 11 casos de intoxicação por D. picta Schott, dentre os quais 9 (81%) acometeram cães e 2 (18%) gatos (Brasil, 2009). As plantas do gênero Dieffenbachia apresentam diversos princípios ativos na sua constituição, entre eles, os cristais de oxalato de cálcio solúveis e insolúveis. Os cristais de oxalato de cálcio solúveis tendem a provocar injúria renal e hipocalcemia, enquanto que os insolúveis causam efeitos locais, em especial no trato gastrintestinal, devido impedir a formação do ácido oxálico, o qual funciona prevenindo hemorragias (Lazzeri, 1977; Silva; Takemura, 2006). Saponinas presentes na planta são princípios ativos tóxicos que causam dermatite, sinais digestivos, entre outros, tais como anorexia, sialorréia, dispneia e convulsão (Amstutz, 2008), além de atuarem a nível hepático, podendo causar alterações funcionais (Melo et al., 2008). RELATO DE CASO Foi atendido em uma clínica veterinária na cidade de Belém, Estado do Pará, um canino fêmea, sem raça definida e com 11 anos de idade. O 1417 42º Congresso Bras. de Medicina Veterinária e 1º Congresso Sul-Brasileiro da ANCLIVEPA - 31/10 a 02/11 de 2015 - Curitiba - PR 3 responsável relatou que o animal, após ingestão da planta comigoninguém-pode passou o dia triste, não quis comer, bebeu muita água, começou a apresentar vômito e eliminação de sangue e coágulos cruóricos por via retal. Foi relatado também que sempre houve interesse por parte do animal em comer o vegetal e que frequentemente ingeria pequenas partes do mesmo. Ao exame físico verificou-se animal agitado, apresentando mucosa oral e face ventral do abdome hiperêmicas, temperatura retal de 38,8oC, taquipnéia, taquicardia e dor abdominal à palpação. Exames laboratoriais revelaram alterações como leucopenia (3.590 U/mm3), trombocitopenia (47.000 U/mm3), elevação de uréia (101 mg/dL), creatinina (5,11 mg/dL), ALT (1.103 U/L) e AST (115 U/L). O diagnóstico de intoxicação recorrente por D. picta Schott baseou-se nas informações cedidas pelo proprietário, nos sinais clínicos entéricos apresentados e, em parte, nos resultados dos exames laboratoriais. Proprietário não autorizou exame necroscópico. Nas primeiras 24 horas de internamento, além dos sinais clínicos supracitados, o animal apresentou ainda, erupções cutâneas na região ventral do abdome, oligúria, inapetência, dispneia e edema de laringe, com consequente diminuição da luz do órgão e ronco. Após 48 horas de tratamento sintomático, verificou-se regressão do quadro hemorrágico, ictérica, e o animal começou a apresentar episódios convulsivos e mioclonias que persistiram por aproximadamente 5 horas, seguidas do óbito. DISCUSSÃO Os sinais comumente observados na cavidade oral como irritação e salivação abundante, não foram referidos na anamnese. A ingestão hídrica pode estar relacionada ao alívio da dor provocada pelos cristais 1418 42º Congresso Bras. de Medicina Veterinária e 1º Congresso Sul-Brasileiro da ANCLIVEPA - 31/10 a 02/11 de 2015 - Curitiba - PR 4 de oxalato de cálcio presente nas folhas da planta, conforme descreveram Cumpston et al. (2003) e Wilkerson et al. (2005). A diminuição da luz traqueal e a melena decorreram, respectivamente, da ação física dos cristais sobre as células, que promovem a liberação de histamina (Górniak, 2008), e da ação dos cristais na forma insolúvel (Lazzeri, 1977; Silva; Takemura, 2006). As lesões cutâneas observadas foram semelhantes às referidas por Górniak (2008) em cães após ingestão de D. picta Schott. A elevação de AST, provavelmente, foi causada pelas lesões celulares, devida a penetração dos cristais de oxalato de cálcio e, as lesões celulares no trato gastrintestinal (Cumpston et al., 2003). Enquanto que, a lesão renal, segundo descrito por Davalos et al. (2010), ocorre devido ao estresse oxidativo em função da citotoxicidade do oxalato de cálcio. As saponinas presentes na planta são princípios ativos tóxicos que causam entre outros sintomas, convulsões (Amstutz, 2008), podendo justificar a crise convulsiva e as mioclonias, que podem também ser decorrente do quadro de azotemia instalado (Vanholder et al., 2003). Diversos autores relataram que o principal sintoma e causa de morte por intoxicação pela D. picta Schott é o edema de glote seguida por asfixia (Cumpston et al., 2003; Górniak, 2008). CONCLUSÃO A ingestão recorrente de Dieffenbachia picta Schott deve ser levada em consideração pelo Médico Veterinário em decorrência dos sintomas clássicos apresentados pelo paciente, independente da quantidade, tornando-se essencial o acompanhamento do histórico clínico. 1419 42º Congresso Bras. de Medicina Veterinária e 1º Congresso Sul-Brasileiro da ANCLIVEPA - 31/10 a 02/11 de 2015 - Curitiba - PR 5 REFERÊNCIAS AMSTUTZ, H.E. Manual Merck de veterinária. 9 ed. São Paulo: Roca, 2008 BRASIL. Centro de Informações Toxicológicas - Rio Grande do Sul. 2009. Acesso em: 13 ago 2013. Disponível em: < http://www.cit.rs.gov.br/> CUMPSTON, K.L.; VOGEL, S.N.; LEIKIN, J.B. et al. Acute airway compromise after brief exposure to a Dieffenbachia plant. Journal of Emergency Medicine, v. 25, n. 4, p. 391-397, 2003. DAVALOS, M.; KONNO, S.; ESHGHI, M. et al. 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