Saúde Coletiva ISSN: 1806-3365 [email protected] Editorial Bolina Brasil Silva do Nascimento, Jucian; de Lima Sardinha, Ana Hélia; Silva Pereira, Amanda Namíbia Risco cardiovascular em mulheres negras portadoras de hipertensão arterial em uma comunidade de São Luís - MA Saúde Coletiva, vol. 9, núm. 56, 2012, pp. 40-45 Editorial Bolina São Paulo, Brasil Disponível em: http://www.redalyc.org/articulo.oa?id=84223413002 Como citar este artigo Número completo Mais artigos Home da revista no Redalyc Sistema de Informação Científica Rede de Revistas Científicas da América Latina, Caribe , Espanha e Portugal Projeto acadêmico sem fins lucrativos desenvolvido no âmbito da iniciativa Acesso Aberto saúde da mulher negra Silva Nascimento J, Sardinha AHL, Pereira ANS. Risco cardiovascular em mulheres negras portadoras de hipertensão arterial em uma comunidade de São Luís - MA Risco cardiovascular em mulheres negras portadoras de hipertensão arterial em uma comunidade de São Luís - MA As doenças cardiovasculares são uma das maiores causas de morbimortalidade no mundo. O objetivo deste estudo é avaliar o risco cardiovascular em mulheres negras hipertensas de uma comunidade em São Luís - MA. Trata-se de estudo transversal, descritivo com 55 mulheres. Verificou-se que 58,1% apresentavam pressão arterial elevada. Quanto ao risco cardiovascular em dez anos mostrou-se moderado, com predomínio na faixa etária acima de 50 anos, com 74,5%. Observou-se valores elevados no LDL-C em 45,4% e glicemia de jejum em 34,5% das pacientes. Na prevenção de doenças crônicas cabe aos profissionais de saúde estimular hábitos de vida saudáveis para prevenir complicações e promover qualidade de vida. Descritores: Hipertensão; Agentes do Sistema Cardiovascular; Saúde da Mulher. Cardiovascular diseases are a major cause of morbidity and mortality worldwide. The aim of this study is to evaluate cardiovascular risk in hypertensive black women from a community in São Luís, MA, Brazil. This is a transversal, descriptive study, with 55 women. It was found that 58.1% had high blood pressure. With regard to cardiovascular risk, it proved to be moderate in ten years, predominantly in the age group above 50 years, with 74.5%. We observed high levels in LDL-C by 45.4% and fasting glucose in 34.5% of patients. When it comes to preventing chronic diseases, health professionals are responsible for encouraging a healthy lifestyle to prevent complications and promote quality of life. Descriptors: Hypertension; Cardiovascular Agents; Women's Health. Las enfermedades cardiovasculares son una causa importante de morbilidad y mortalidad en todo el mundo. El objetivo de este estudio es evaluar el riesgo cardiovascular en mujeres hipertensas negras de una comunidad en São Luís, MA, Brasil. Este es un estudio descriptivo y transversal, con 55 mujeres. Se encontró que 58,1% tenían presión arterial alta. Con respecto al riesgo cardiovascular, en diez años se mostró moderado, con predominio en el grupo de edad de más de 50 años, con 74,5%. Se observaron niveles elevados de LDL-C de 45,4% y la glucosa en ayunas en el 34,5% de las pacientes. En la prevención de las enfermedades crónicas, es responsabilidad de los profesionales de salud estimular un estilo de vida saludable para prevenir complicaciones y promover la calidad de vida. Descriptores: Hipertensión; Agentes Cardiovasculares; Salud de la Mujer. Recebido: 01/10/2010 Aprovado: 18/12/2011 Jucian Silva do Nascimento Enfermeira. Mestre em Saúde e Ambiente pela Universidade Federal do Maranhão- UFMA. Enfermeira do Hospital Presidente Dutra. Docente do Centro Universitário do Maranhão – UNICEUMA, Maranhão - MA, Brasil. [email protected] Ana Hélia de Lima Sardinha Enfermeira. Doutora em Educação. Docente da UFMA, Maranhão-MA, Brasil. [email protected] Amanda Namíbia Silva Pereira Graduanda de Enfermagem pela UFMA, Maranhão-MA, Brasil. [email protected] 40 INTRODUÇÃO o Brasil, as doenças cardiovasculares respondem por cerca de 250.000 óbitos por ano, constituindo-se no primeiro grupo de causa de morte no país1. Segundo estes autores, as cardiopatias, particularmente a Doença Arterial Coronariana (DAC), registrou aumento de incidência e mortalidade nas primeiras sete décadas do século passado, nos países industrializados. É considerada uma patologia multifatorial, sendo também conhecidas como doenças crônicas não transmissíveis2. A partir dos anos 60, com a entrada das mulheres no mercado de trabalho e, consequentemente, com maior exposição ao estresse, fumo e maus hábitos alimentares, a taxa de mortalidade por causa de doenças cardiovasculares N Saúde Coletiva 2012;09 (56): 40-45 saúde da mulher negra Silva Nascimento J, Sardinha AHL, Pereira ANS. Risco cardiovascular em mulheres negras portadoras de hipertensão arterial em uma comunidade de São Luís - MA em mulheres rapidamente se elevou. No Brasil, esse índice aumentou de 10% para 25% nos anos 1960 a 19703. A Hipertensão Arterial Sistêmica (HAS) é reconhecida como um dos principais fatores de risco das Doenças Cardiovasculares (DCV) e primeira causa de morte nos países industrializados e no Brasil4. A HAS tem sido reconhecida como o principal fator de risco para a morbimortalidade precoce causada por doenças cardiovasculares e, também, considerada um dos maiores problemas de saúde no Brasil5. A HAS representa fator de risco independente para DCV decorrentes de complicações como: Doença Cérebrovascular, Doença Arterial Coronariana, Insuficiência Cardíaca, Insuficiência Renal Crônica e Doença Arterial Obstrutiva Periférica6. No Brasil, em 2003, 27,4% dos óbitos foram decorrentes de doenças cardiovasculares, atingindo 37% quando são excluídos os óbitos por causas mal definidas e a violência”7. A variação populacional da ocorrência e sequelas da HAS, relacionadas às características de raça, sexo, idade é tão comum e mensurável nas sociedades industrializadas que os efeitos destes atributos na hipertensão são, geralmente, considerados como fixos e resultantes de processos biológicos, os quais não podem ser modificados pela exposição ambiental usual ou por experiências de vida. A evidência epidemiológica, entretanto, indica que a associação entre hipertensão e idade, sexo e raça não é casual dentro de uma população e que a designação raça é frequentemente um indicador secundário de nível socioeconômico. Assim, enquanto estas características refletem diferenças quanto ao comportamento, estilo de vida e exposição ambiental, as quais por si só estão relacionadas à HAS, haverá diferenças no risco de desenvolvimento da HAS, na severidade do processo e no prognóstico. Por conseguinte, a associação de HAS com idade, raça e sexo refletirá a inter-relação entre os chamados fatores ambientais e os genéticos8. A incidência de Doenças Cardiovasculares (DCV) aumenta dramaticamente com o envelhecimento populacional, especialmente nas mulheres. De acordo, com dados do Ministério da Saúde, o infarto e o AVC (Acidente Vascular Cerebral) são as principais causas de morte em mulheres com mais de 50 anos no Brasil. Apesar do risco de câncer de mama ser a principal preocupação das mulheres, sabemos que a maior incidência de morte nas mulheres se refere às doenças cardiovasculares, um índice de 53% quando comparado aos 4% do câncer de mama9. O documento diz ainda que a DAC ocorre duas a três vezes mais em mulheres após a menopausa do que aquelas na pré-menopausa. Entre 45-64 anos 1:9 mulheres tem alguma forma de DCV, enquanto esta relação passa a 1:3 após 65 anos de idade. A cada década de vida, a taxa de mortalidade no sexo feminino aumenta de três a cinco vezes9. O clássico Framingham Heart Study classificou como elevado (acima de 20%), intermediário (entre 10 a 20%) ou baixo (inferior a 10%) o risco de “morte ou de apresentar um evento coronariano nos próximos 10 anos” baseado na presença de alguns fatores de risco como idade, nível de colesterol total e fração de baixa densidade do colesterol (LDL), nível de pressão arterial e hábito ou não de fumar. No caso do diabetes, o estudo de Framingham mostrou claramente que este tem um papel mais significativo como fator de risco para mulheres do que para homens sendo que o risco relativo aumenta cerca de cinco vezes nas primeiras e duas vezes nos últimos em comparação com não portadores dessa doença. A presença de diabetes classifica os pacientes como de alto risco para eventos cardiovasculares independente da presença ou não de outros fatores de risco9. Conforme o IPEA, a população feminina no Brasil corresponde a 51% da população e as mulheres negras são 30% da população feminina6. No Brasil, a prevalência de hipertensão arterial é maior nos negros do que em brancos10. Segundo dados do Estudo Corações do Brasil, a porcentagem de sujeitos hipertensos (PA > 140/90 mmHg) é maior na população negra, abrangendo 34,8 % dos participantes da pesquisa. Entre os Pardos/ Mulatos (as) a porcentagem é de 26,3%, Brancos 29,4 %, Indígenas 11,1 % e Amarelos 10%. O Estudo demonstra ainda que homens e mulheres negros apresentam taxas de HAS de duas à quatro vezes maiores que as encontradas em homens e mulheres brancos11. Pessoas de etnia negra parecem apresentar um defeito hereditário na captação celular de sódio e cálcio, assim como em seu transporte renal, o que pode ser atribuído à presença de um gen economizador de sódio que leva ao influxo celular de sódio e ao fluxo celular de cálcio, facilitando deste modo o aparecimento da HAS12. Falando de saúde, doença e vulnerabilidade, as vias pelas quais o social e o econômico, o político e o cultural influem sobre a saúde de uma população são múltiplas e diferenciadas, além da natureza das condições socioeconô- Saúde Coletiva 2012;09 (56): 40-45 41 saúde da mulher negra Silva Nascimento J, Sardinha AHL, Pereira ANS. Risco cardiovascular em mulheres negras portadoras de hipertensão arterial em uma comunidade de São Luís - MA da pressão arterial sistólica e pressão arterial diastólica das três medidas. O perímetro da cintura e do quadril foram identificados com fita métrica inelástica, com o paciente em posição ereta, braços estendidos ao longo do corpo e os pés juntos. O peso e a altura foram obtidos por meio de uma balança antropométrica calibrada e com capacidade METODOLOGIA de até 150 Kg, foi solicitado ao cliente que ficasse sem Estudo transversal e descritivo de base populacional com calçado e com roupas leves. Em posição ereta, aferiu-se a uma abordagem quantitativa, desenvolvido no bairro Cidaaltura com a haste afixada à plataforma da balança. de Olímpica de São Luís – MA, com um grupo de 55 muPara avaliação do risco cardiovascular segundo Escore de lheres negras portadoras de hipertensão arterial cadastradas Risco de Framingham calculou-se o risco de eventos coronae/ ou acompanhadas pela estratégia saúde da família nos rianos em 10 anos. São atribuídos pontos para idade, prestrês postos de saúde do bairro. As participantes foram selesão arterial sistólica, pressão arterial diastólica, CT, HDL-c, cionadas de forma aleatória, por randomização. O critério fumo (qualquer cigarro no último mês) e presença ou não de de inclusão foi: diagnóstico prévio de Hipertensão Arterial, Diabetes mellitus. Após o cálculo dos pontos é consultado a estar cadastrada e/ou acompanhada por um dos três postos, tabela para estabelecimento do risco6. Após a classificação residirem no bairro e consentir em participar da pesquisa. A pesquisa teve início em junho de 2009. Os dados foram do risco global segundo Escore Framingham se categorizar coletados no período de dezembro de para Eventos Cardiovascular maior (ECV) 2009 a maio de 2010. como: baixo < 10% em 10 anos; modeO instrumento para coleta de dados rado 10 a 20% em 10 anos e alto > 20% foi composto por um questionário conem 10 anos, presentes no quadro 1. “O instrumento para tendo questões abertas e fechadas, Os participantes que desejavam parcoleta de dados foi abrangendo características sócio-demoticipar da pesquisa assinaram o Termo composto por um gráficas (sexo, idade, situação conjugal, de Consentimento Livre e Esclarecido escolaridade em anos de estudo, ativiem cumprimento aos requisitos exigiquestionário contendo dade de trabalho e renda familiar per dos pela resolução 196/96 do Conselho questões abertas e capita em salários mínimos), anteceNacional de Saúde. fechadas, abrangendo dentes familiares e pessoais, questões O projeto foi submetido à aprovareferentes a estilo de vida (tabagismo, ção pelo Comitê de Ética em Pesquisa características sócioetilismo, alimentação, sedentarismo e da UFMA. O protocolo de pesquidemográficas” estresse) e atendimento de saúde, medisa recebeu autorização de número: das antropométricas (pressão arterial, 23115/007640/2009-93. índice de massa corporal, peso, altuO tamanho amostral foi calculado ra, circunferência abdominal e relação pelo programa estatístico Statcalc do Epicintura-quadril) e resultados de exames laboratoriais. Os Info 6.0 (1993) a partir dos seguintes parâmetros: tamanho da exames laboratoriais (glicemia em jejum e lipidograma) população de mulheres hipertensas atendidas nos Centros foram custeados pela pesquisadora e realizados em todas de Saúde da Cidade Olímpica e prevalência de hipertensão as participantes da pesquisa. As participantes tiveram no Maranhão. Nível de significância de 5%, margem de erro orientação prévia para jejum de 12 horas. Antes da coleta tolerável de 8%, poder de teste de 80% e adicionado 10% foi certificado se as clientes permaneciam em jejum de de possíveis perdas. Os dados foram inseridos e analisados no mínimo 12 horas. O sangue coletado era identificado em um programa de computador tipo EPI-INFO-2000 e são com o nome da participante, idade e data da coleta, e apresentados em frequência absoluta e relativa, sendo os com o número de inscrição da entrevista e encaminhado dados apresentados em tabelas. em seguida ao laboratório, acondicionado em recipientes apropriados para o transporte. A PA foi aferida por método RESULTADOS auscultatório, utilizando-se esfigmomanômetros aneroides. Foram entrevistadas 55 pacientes portadoras de HipertenOs valores de PA foram mensurados após a entrevista, possão Arterial negras. A tabela1 mostra que, 58,1% (N=32) sibilitando ao sujeito repouso de, no mínimo, 5 minutos, apresentavam pressão arterial elevada, onde 41,8% devendo ficar sentado com o braço apoiado sobre a mesa. (N=23), 12,7% (N=7) e 3,6% (N=2) encontravam-se nos Foram realizadas três medidas consecutivas, com intervalos estágios I, II e III, respectivamente. As demais pacientes tide 60 segundos entre as aferições, e registrados os valores veram resultado satisfatório compreendendo 18,2% (N=10) micas, o tipo de população, as noções de saúde e agravos enfrentados. No caso da população negra, o meio ambiente, que exclui e nega o direito natural de pertencimento, coloca-a em condições de maior vulnerabilidade13. 42 Saúde Coletiva 2012;09 (56): 40-45 saúde da mulher negra Silva Nascimento J, Sardinha AHL, Pereira ANS. Risco cardiovascular em mulheres negras portadoras de hipertensão arterial em uma comunidade de São Luís - MA Tabela 1 - Níveis tensionais, segundo critérios de classificação em mulheres Negras Hipertensas atendidas em Unidades de Saúde da Família, São Luís- MA, 2010 Niveis de pressão arterial sistólica e diastólica Sistólica <120mmHg e diastólica <80mmHg Sistólica <130mmHg e diastólica <85mmHg Sistólica 130-139mmHg e diastólica 85-89mmHg Sistólica 140-159mmHg e diastólica 90-99mmHg Sistólica 160-179mmHg e diastólica 100-109mmHg Sistólica ≥180mmHg e diastólica ≥110mmHg TOTAL 9 4 10 23 7 2 55 N% 16,4% 7,3% 18,2% 41,8% 12,7% 3,6% 100% Classificação Ótimo Normal Limítrofe Estágio I Estágio II Estágio III Tabela 2 - Faixas etárias, segundo valores de Pressão Arterial Sistólica e Diastólica em mulheres Negras Hipertensas atendidas em Unidades de Saúde da Família, São Luís- MA, 2010 Idade 30-39 anos 40-49 anos 50-59 anos 60-69 anos ≥ 70 anos TOTAL % Sistólica <120 mmHg e diastólica <80mmHg 1 3 3 1 1 9 16,36% Sistólica <130 mmHg e diastólica <85 mmHg 1 3 4 7,27% Sistólica 130139 mmHg e diastólica 8589 mmHg 1 4 3 2 10 18,18% limítrofe, 7,3% (N=4) normal e 16,4% (N=9) ótimo. A tabela 2 mostra que, a partir 40 anos de idade, ocorreu elevação da Pressão Arterial acima dos limites desejáveis, e que, na classificação estágio I, encontram-se a maioria das pacientes 41,81% (N=23) no total, incluindo todas as faixas etárias. Na tabela 3, se verifica a estratificação do risco cardiovascular global segundo Escore de Framingham, onde o risco baixo foi de 43,64% (N=24) do total de pacientes, enquanto que o médio e o alto risco foram de 45,46% (N=25) e 10,9% (N=06), respectivamente. A tabela 4 mostra que o alto risco para evento cardiovascular esteve ausente nas médias das faixas etárias, enquanto que o risco moderado esteve presente nas faixas etárias mais avançadas, ou seja, nas pacientes com 50 anos ou mais, totalizando 74,5% (N=41) das pacientes entrevistadas, e as faixas etárias de 30 a 49 anos apresentaram risco baixo para ECV (Eventos Cardiovascular), compreendendo 25,5% (N=14). A tabela 5 mostra valores elevados de PA em 76,36% (N=42) das pacientes; 45,45% (N=25) apresentam níveis elevados de LDL-Colesterol; 87,27% (N=48) níveis séricos de HDL-Colesterol abaixo do limite desejável; 34,55% (N=19) apresentam glicemia em jejum acima de 100mg/dl; 83,64% (N=46) das pacientes tem idade acima de 45 anos e 3,64% (N=2) são tabagistas. Sistólica 140159 mmHg e diastóli-ca 9099 mmHg 2 5 5 9 2 23 41,82% Sistólica 160179 mmHg e diastólica 100109 mmHg 2 2 2 1 7 12,73% Sistólica ≥180 mmHg e diastólica ≥110 mmHg 2 2 3,64% Total N % 4 10 17 18 6 55 7,3% 18,2% 31,0% 32,8% 10,9% 100% Tabela 3 - Risco Cardiovascular global em mulheres Negras Hipertensas atendidas em Unidades de Saúde da Família, São Luís- MA, 2010. Risco Cardiovascular segundo Escore de Framingham Baixo (<10%) Moderado (10 a 20%) Alto (>20%) Total N % 24 43,64% 25 45,46% 06 10,9% 55 100% DISCUSSÃO A hipertensão arterial é a doença cardiovascular mais comum. Quase 40% de todos os negros adultos e mais da metade de toda a população com mais de 60 anos apresentam hipertensão arterial14. Os negros tendem a apresentar uma hipertensão mais severa. Sabe-se atualmente que por questões genéticas a população negra tem maior sensibilidade ao sal e que esta poderia ser uma das explicações da maior incidência15. Dentre os fatores de risco para a hipertensão arterial estão a idade, sexo, e etnia, fatores socioeconômicos, consumo excessivo de sal, obesidade, etilismo e sedentaris- Saúde Coletiva 2012;09 (56): 40-45 43 saúde da mulher negra Silva Nascimento J, Sardinha AHL, Pereira ANS. Risco cardiovascular em mulheres negras portadoras de hipertensão arterial em uma comunidade de São Luís - MA Tabela 4 - Faixa etária, segundo média de Risco Cardiovascular em dez anos, em mulheres Negras Hipertensas atendidas em Unidades de Saúde da Família, São Luís- MA, 2010 Faixa etária 30-39 anos 40-49 anos 50-59 anos 60-69 anos ≥ 70 anos Resultado Média de ECV <10%/ 10 anos 1% 4% Baixo Média de ECV 10 a 20%/10 anos 13% 17% 20% Moderado Média de ECV >20%/ 10 anos Alto Total N % 4 10 17 18 6 55 7,3% 18,2% 30,8% 32,8% 10,9% 100% Tabela 5 - Fatores de Riscos Cardiovasculares segundo critério de Framingham em mulheres Negras Hipertensas atendidas em Unidades de Saúde da Família, São Luís-MA, 2010 Presença de Fatores de Riscos Cardiovasculares Pressão Arterial Sistólica >139mmHg e diastólica <89mmHg LDL-colesterol >200m/dl Idade > 45 anos HDL-colesterol <50mg/dl Glicemia em jejum ≥100mg/dl Tabagismo SIM (N) 42 25 46 48 19 02 % Total N % 76,36% 23,64% 55 100% 45,45% 83,64% 87,27% 34,55% 3,64% 30 09 07 36 53 54,55% 16,36% 12,73% 65,45% 96,36% 55 55 55 55 55 100% 100% 100% 100% 100% mo7. No presente estudo, a idade mostrou-se uma variável importante tanto para Hipertensão isoladamente, quanto para fatores de riscos cardiovasculares, 41,81% das pacientes já encontravam-se no estágio I da doença todas acima dos 40 anos de idade, e a média de risco cardiovascular moderado estava presente em 74,5% das pacientes acima dos 50 anos de idade. O envelhecimento de nossas artérias é proporcional ao envelhecimento do organismo16. Hipertensão arterial (HAS) e diabetes mellitus (DM) são condições clínicas que frequentemente se associam17,18. A HAS e o DM constituem os principais fatores de risco populacional para as doenças cardiovasculares, motivo pelo qual representam agravos de saúde pública. Neste estudo além das pacientes serem portadoras de HA, 34,55% mostrou também valores elevados de glicemia. Quanto ao perfil lipídico a The Adult Treatment Panel III (ATP III), descreve que a meta consiste em um baixo nível de LDL-C, que reduziria o risco de eventos cardiovasculares e valores aumentados de HDL-C, que atuaria como fator protetor16. No presente estudo se verificou que 87,27% das pacientes encontravam-se com níveis séricos de HDL-C abaixo do valor de referência desejável, ou seja, maior que 50mg/dl e LDL-C aumentado (acima de 200mg/ dl) em 45,45% das mulheres. O tratamento da hipertensão arterial pode modificar o perfil lipídico19 e a aterosclerose 44 % NÃO (N) 13 induzida pela hiperlipidemia20. Os achados laboratoriais de glicemia, HDL-C, LDL-C estavam relacionados com risco moderado e alto encontrados no grupo de estudo. A revisão da ATP III (2004) ratificou o benefício na redução dos níveis de colesterol como prevenção da doença arterial coronariana. Entretanto, novos estudos sugeriram que nos pacientes com alto risco para DCV, a redução nos níveis sanguíneos de LDL-C deveria ser para < 100 mg/dl e pacientes com altíssimo risco para a doença com níveis séricos inferiores a 70 mg/dl seriam o recomendado16. Uma investigação realizada nas Regiões Sul, Sudeste, Centro-Oeste e Nordeste do Brasil, que avaliou 81.262 pessoas mostrou que a prevalência de hipercolesterolemia foi de 40% (média de todas as regiões) e de 44% em Curitiba – Paraná21. Estudos realizados na Cidade de São Paulo constataram prevalência de dislipidemias de 50 a 60% da população, sendo a mais frequente aquela devido aos baixos níveis sanguíneos de HDL-colesterol22. O estudo tratou, portanto, de uma população com hipercolesterolemia, com provável predominância de mulheres na pós menopausa. O escore de Framingham continua sendo até os dias atuais uma forma confiável, simples e de baixo custo de identificação de pacientes ambulatoriais sob maior risco de doença CV, o que possibilita a introdução de rastreamento mais Saúde Coletiva 2012;09 (56): 40-45 saúde da mulher negra Silva Nascimento J, Sardinha AHL, Pereira ANS. Risco cardiovascular em mulheres negras portadoras de hipertensão arterial em uma comunidade de São Luís - MA rigoroso e terapias mais agressivas como forma de prevenção de eventos coronarianos futuros5. O estudo de San Antonio demonstrou maior mortalidade por doença cardiovascular nas mulheres diabéticas23, provavelmente decorrente de características étnicas e demográficas da população. CONCLUSÃO A avaliação do risco para eventos cardiovasculares é de fácil aplicação e pode ser realizado nas Unidades de Saúde da Família, os exames laboratoriais já encontram-se preconizados pelo Programa de Hipertensão e Diabetes da Atenção Primária e são disponibilizados pelo Sistema Único de Saúde. A aplicação do escore é prática e não invasiva, e permite um melhor direcionamento das ações de Promoção da Saúde, prevenção de agravos e reabilitação do cliente. O estudo demonstrou um percentual elevado de riscos para eventos cardiovasculares em 10 anos, ou seja, mais da metade das pacientes tiveram riscos avaliados em moderado e alto. Se observou também que o perfil lipídico das mulheres participantes do estudo é desfavorável, ou seja, o HDL-C (considerado colesterol bom e protetor) baixo em quase totalidade das pacientes, enquanto o LDL-C (considerado colesterol ruim) aumentado em quase metade da clientela estudada, e outro fator de risco importante como a glicemia estava aumentada em 1/3 das pacientes. A idade elevada também se mostrou um indicador desfavorável neste grupo. A Hipertensão é uma das doenças mais comuns, porém como citado na literatura, ela tende a ser mais severa na população negra por questões genéticas, sócioeconômicas e culturais. Boa parte da população negra se concentra nas áreas mais insalubres das regiões urbanas, lotadas nas periferias dos grandes centros, espaços estes, carentes de políticas públicas que atendam as necessidades destes grupos, o que contribui decisivamente para o adoecimento. Todas as pacientes do estudo possuíam diagnóstico prévio de Hipertensão Arterial e encontravam-se em tratamento, mesmo assim, estavam com níveis tensionais elevados, o que demonstra necessidade imediata de intervenções por parte da equipe de saúde que assiste estes clientes. Estas intervenções poderão ser realizadas mais precocemente, a fim de controlar, tratar, reduzir e, principalmente, impedir o aparecimento de complicações. Referências 1. Fonseca LAM, Laurenti R. Epidemiologia das Cardiopatias nas duas últimas décadas: dados internacionais, dados brasileiros. In: Giannini SD. Cardiologia preventiva. São Paulo: Atheneu, 2000. cap. 1. 2. World Health Organization. World heart day 2002: the international burden of cardiovascular disease: responding to the emerging global epidemic. Circulation, 2002 106 (s.n.): 1602-5. 3. Castanho VS, Oliveira LS, Pinheiro HP, Oliveira HCF, Faria EC. Sex differences in risk factors for coronary heart disease: a study in a braziliam population. 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