Dupla-Origem do Ramo Descendente Anterior Associada à

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Urzêda et al.
Dupla-origem da ADA Associada à ICC
Relato de Caso
Relato de
Caso
Rev Bras Cardiol. 2014;27(4):283-285
julho/agosto
Dupla-Origem do Ramo Descendente Anterior Associada à Insuficiência Cardíaca
Dual Origin of the Anterior Descending Artery Linked to Heart Failure
Márcio Alves de Urzêda1, Vicente Paulo Resende Junior2, Alan Nascimento Paiva2, Sergio Rodrigo Beraldo2,
José Fábio Fabris Junior3, José Luis Attab dos Santos3,4
Instituto Cardiológico - Hospital Santa Mônica - Imperatriz, MA - Brasil
Hospital da Clínicas Samuel Libânio - Pouso Alegre, MG - Brasil
3
Santa Casa de Misericórdia - Ribeirão Preto, SP - Brasil
4
Santa Casa de Misericórdia - São Sebastião do Paraíso, MG - Brasil
1
2
Resumo
Abstract
Anomalias coronarianas podem ser benignas ou
graves, causando isquemia miocárdica, infarto e morte
súbita. Relata-se o caso de paciente submetido a
cateterismo devido à dispneia progressiva sem
precordialgia. O ecocardiograma apresentou déficit
contrátil global acentuado às custas do déficit contrátil
da parede anterior. A cintilografia apresentou
isquemia discreta e fibrose moderada em grande
território na parede anterior. A cinecoronariografia e
a angio-TC mostraram artéria descendente anterior
com porção proximal em trajeto habitual. Já seus terços
médio e distal originavam-se da coronária direita.
Assim, relata-se um caso de dupla-origem da artéria
descendente anterior relacionada com insuficiência
cardíaca sem angina.
Coronary anomalies may be benign or severe, causing
myocardial ischaemia, infarction and sudden death.
This case report describes a patient undergoing cardiac
catheterization due to progressive dyspnea with no
chest pain. The echocardiogram showed a marked
global contractile deficit due to a contractile deficit in
the anterior wall. The scintigraphy showed discreet
ischaemia and moderate fibrosis in a large area of the
anterior wall. The cinecoronariography and angio-CT
showed the proximal portion of the anterior descending
artery in a normal position, with the center and distal
portions originating in the right coronary artery. This
case report describes a dual-origin anterior descending
artery related to heart failure without angina.
Palavras-chave: Doença das coronárias; Insuficiência
cardíaca; Cateterismo cardíaco
Keywords: Coronary disease; Heart failure; Cardiac
catheterization
Introdução
mais frequente de morte súbita de origem
cardiovascular em atletas competitivos3. Pode ser
causa de insuficiência cardíaca e morte em lactentes4.
As anomalias congênitas das artérias coronárias
podem ser benignas ou potencialmente graves,
causando isquemia miocárdica, infarto do miocárdio
e morte súbita1. A incidência varia de 0,3 % a 1,5 % em
estudos de necropsia ou por coronariografia2.
A origem e o trajeto proximal das artérias coronárias
anômalas são os principais fatores preditivos de
gravidade1. Atualmente, constitui a segunda causa
O diagnóstico dessa anomalia é difícil, pois o indivíduo
pode ser assintomático e seu primeiro evento ser morte
súbita cardíaca 5 . Os exames de imagem são
imprescindíveis para o diagnóstico. O tratamento
cirúrgico, como na artéria coronária esquerda
originando-se da artéria pulmonar, tem excelentes
resultados (Síndrome de Bland-White-Garland)6.
Correspondência: Márcio Alves de Urzêda
Rua Piauí, 772 - Centro - 65901-600 - Imperatriz, MA - Brasil
E-mail: [email protected]
Recebido em: 23/09/2013 | Aceito em: 13/01/2014
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A terapêutica da origem anômala das artérias
coronárias da aorta é objeto de discussão.
A primeira classificação para anomalias das artérias
coronárias foi proposta por Ogden em 1969. Esta
subdividia as anomalias coronarianas em maiores,
menores e secundárias, com base anatômica, mas não
propunha correlação clínica7. Na duplicidade do ramo
descendente anterior, há um ramo curto proximal que
supre a usual distribuição da artéria descendente
anterior e um ramo longo com curso é variável ao lado
do sulco interventricular anterior, retornando a esse
sulco distalmente, originando-se da artéria coronária
direita, superfície epicárdica do ventrículo esquerdo
ou direito8. Quando seu trajeto é interarterial há maior
risco de morte súbita9.
Urzêda et al.
Dupla-origem da ADA Associada à ICC
Relato de Caso
A cintilografia de perfusão miocárdica apresentou
isquemia discreta e fibrose moderada em grande
território da parede anterior do VE. A cinecoronariografia
e a angiotomografia demonstraram artéria coronária
direita dominante, sem lesões obstrutivas, emitindo ramo
anômalo com trajeto anterior ao tronco pulmonar, em
direção ao sulco interventricular anterior em seu terço
médio-distal (Figuras 1 e 2). A porção proximal da artéria
descendente anterior estava sem lesões obstrutivas e em
seu trajeto habitual. O tronco da coronária esquerda e
artéria circunflexa não apresentavam lesões ateroscleróticas
e estavam em seus trajetos anatômicos.
Anomalias do ramo descendente anterior são achados
de angiografia, geralmente associados a cardiopatias
congênitas, como tetralogia de Fallot e transposição dos
grandes vasos. A origem do ramo descendente anterior
no seio de Valsalva direito ou na artéria coronária direita
é uma anomalia rara, com taxa de 0,03 % a 0,2 % dos
pacientes vistos em cateterismos de rotina10.
Dupla-origem do ramo descendente anterior é uma
entidade excepcionalmente rara, tendo sido encontrados
descritos apenas 23 casos na literatura pesquisada e
manifestando-se sempre como síndrome anginosa10.
Relata-se um caso de dupla-origem do ramo
descendente anterior associado à isquemia miocárdica
e insuficiência cardíaca, sem placas ateroscleróticas
ou síndrome anginosa associada, fato ainda não
descrito na literatura.
Figura 1
Coronariografia em OAE mostrando a artéria coronária
direita e a origem do trajeto do ramo anômalo fazendo o
contorno anterior ao tronco pulmonar.
Relato do Caso
Paciente masculino, 46 anos, branco, trabalhador rural,
encaminhado para realização de cateterismo cardíaco
devido à dispneia aos esforços habituais, com piora
progressiva no último ano. Estava em tratamento
conservador na cidade de origem. O paciente não era
portador de quaisquer doenças, bem como não fazia
uso de qualquer medicamento.
À admissão ao setor de Hemodinâmica encontrava-se
assintomático. Ao exame físico, encontrava-se em
bom estado geral, normotenso, com ausculta
cardíaca apresentando hiperfonese da segunda
bulha (componente P2) e ausculta pulmonar normal.
O eletrocardiograma apresentava área elétrica inativa
em parede anterior e o ecocardiograma mostrava
aumento do ventrículo esquerdo (VE), déficit contrátil
global acentuado à custa de hipocinesia severa em
parede anterior e insuficiência mitral discreta, bem
como fração de ejeção de 35 %.
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Figura 2
Angio-TC em vista anterior mostrando todo o trajeto do
ramo anômalo (anteriormente ao tronco pulmonar) e sua
composição final no sulco interventricular anterior.
Urzêda et al.
Dupla-origem da ADA Associada à ICC
Relato de Caso
Discussão
Encontram-se artérias coronárias de origem anômala
em 1-2 % da população submetida a cateterismo
cardíaco3,6. Dessas, a mais comum é a origem da artéria
circunflexa a partir do seio de Valsalva direito ou da
artéria coronária direita4. Acreditava-se que esses
achados não tinham consequências clínicas, já que o
fluxo sanguíneo na coronária anômala é, na maioria
das vezes, normal. Anomalias que estejam associadas
com alteração do fluxo sanguíneo podem resultar em
morte súbita, isquemia miocárdica e infarto agudo do
miocárdio. Em corações humanos, o ramo descendente
anterior é o vaso que tem a mais constante origem,
curso e distribuição10. Seu trajeto anômalo passa entre
a aorta e o tronco pulmonar (aumentando a chance de
morte súbita por compressão desses dois grandes
vasos), ou anteriormente ao tronco pulmonar
(aumentando discretamente a chance de morte súbita
por angulação aguda de seu trajeto inicial), antes de
atingir o sulco interventricular anterior6.
O caso descrito é de duplo-ramo descendente anterior
com trajeto proximal do ramo descendente anterior
originando-se do tronco da coronária esquerda, e seus
terços médio e distal originando-se da porção proximal
da artéria coronária direita, fazendo trajeto anterior
ao tronco pulmonar (Figuras 1 e 2).
Há controvérsias na literatura quanto à influência
clínica desta anomalia, sendo considerada inicialmente
de baixo risco para morte súbita2, mas alguns autores
associam-na a quadros de angina estável, infarto do
miocárdio e angina pós-infarto por alteração no fluxo
sanguíneo. Oliveira et al.1 relataram que a origem do
ramo descendente anterior no lado direito é anomalia
significante podendo causar isquemia miocárdica.
Coyle e Thomas10 relacionaram a origem do ramo
descendente anterior no seio Valsalva direito ou na
artéria coronária direita a infarto do miocárdio.
Assim, optou-se por tratamento clínico devido ao
acometimento de fibrose moderada no território da
artéria descendente anterior e ao trajeto desse ramo
anômalo anterior ao tronco pulmonar, trazendo menor
risco de morte súbita apesar de haver um ângulo
agudo no seu trajeto inicial9.
Avaliou-se também o risco/benefício da cirurgia em
portador de fração de ejeção rebaixada. Assim, foi feita
a otimização medicamentosa para insuficiência
cardíaca associada à antiagregação plaquetária.
Assim, a hipótese de anomalia do ramo descendente
anterior deve ser aventada no diagnóstico diferencial
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julho/agosto
de angina, isquemia miocárdica e insuficência cardíaca
à custa da hipocinesia em parede anterior.
Potencial Conflito de Interesses
Declaro não haver conflitos de interesses pertinentes.
Fontes de Financiamento
O presente estudo não teve fontes de financiamento externas.
Vinculação Acadêmica
O presente estudo não está vinculado a qualquer programa
de pós-graduação.
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