Artigo Estadão - Fernando Reinach

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Desmatamento em Ariquemes
Se você tem estômago forte para sentir o verdadeiro horror, aquele definido pelo Houaiss como “forte
impressão de repulsa ou desagrado, acompanhada ou não de arrepio, gerada pela percepção, intuição,
lembrança de algo horrendo, ameaçador, repugnante”, submeta sua mente ao seguinte experimento.
Instale a última versão do Google Earth em seu computador (http://earth.google.com). Inicie o programa e
na caixa de pesquisa denominada “voar para” digite “Ariquemes, Brazil”. Você será levado para a esta
pequena cidade em Rondônia. Tenha certeza que seu ponto de visão esta a 100 km de altitude (isto pode ser
verificado no canto inferior da tela). Se você estiver mais baixo ou mais alto regule a sua altitude usando o
comando que aparece do lado direito da tela. Agora procure o botão com o desenho de um relógio no
cardápio ative o comando chamado “imagens históricas”. Vai aparecer uma pequena janela que permite
você mudar a foto de satélite que cobre esta região. Pronto você esta preparado para começar o
experimento.
Leve o comando para a primeira foto disponível (18 de junho de 1975). Você vai ver a cidade de
Ariquemes cercada pela floresta intocada. Vá para a próxima imagem (7 de julho de 1989). Quatorze anos
depois você vai observar que foram abertas duas estradas que se dirigem ao sul e uma para o norte de
Ariquemes. Dessas estradas partem estradas paralelas na direção leste oeste, distanciadas exatos 5 km uma
da outra. Na beira de cada estrada centenas de áreas de desmatamento, quadrados de 500 metros de lado
(cada um equivale a 25 quarteirões de São Paulo). Quase 15% da mata foram derrubadas. O Garimpo Bom
Futuro pode ser visto cercado de mata 58 km a oeste de Ariquemes. Agora vá para a imagem seguinte, ela é
de 18 de setembro de 2001 (mais 12 anos se passaram). Os quadrados desmatados se transformaram em
retângulos de 500 por 1500m. Mais de metade da mata provavelmente se foi. A cidade cresceu. O garimpo
agora está cercado de uma área totalmente desmatada. Agora caminhe mais 7 anos até a imagem de 27 de
julho de 2008. É sua vez de tentar descrever a imagem, quanto da mata você estima que sobrou neste
quadrado de 100 por 100 km? Você quer saber quanto é 100 por 100 km? Tente se colocar sobre São Paulo
com seu ponto de visão a uma altitude de 100km. A diagonal do quadrado vai de Jundiai à Bertioga. São 35
anos entre 1975 e 2008, como esta seu estômago?
Cada um de nós pode fazer de maneira precária o que o INPE faz continuamente: acompanhar a destruição
da floresta amazônica utilizando fotos de satélites. A diferença entre ler os números no jornal e examinar as
fotos é brutal. Mas o melhor é que podemos “adotar” uma área da Amazônia. Eu adotei Ariquemes.
Existem leitores desta coluna que conhecem a cidade? Será que alguém da Faculdade de Educação e Meio
Ambiente de Ariquemes quer ser meu correspondente local? As terras são legalizadas? Existem quantos
habitantes, quantas serrarias, qual a fração dos habitantes que dependem do negocio da madeira para
sobreviver? Os quadrados desmatados têm gado, quantas cabeças? Alguém quer criar uma comunidade
virtual dos interessados em Ariquemes?
Que tal incluir este experimento de horror no currículo escolar? Ele pode integrar as disciplinas de
geografia, ecologia, ciências sociais, economia e política. E se cada escola adotar uma área e os alunos
tentarem entrar em contato com uma escola de Ariquemes? E se as escolas trocarem experiências em uma
grande convenção de monitoramento remoto? Se tudo isto ocorrer talvez possamos transformar o horror em
pressão, “influencia coativa, constrangimento moral”.
Fernando Reinach ([email protected])
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