Produção de tomate para processamento industrial, irrigado por gotejamento, sob diferentes tensões de água no solo, durante os estádios vegetativo e reprodutivo. Waldir A. Marouelli; Washington L.C. Silva Embrapa Hortaliças, Caixa Postal 218, 70359-970, Brasília-DF. E-mail: [email protected]. RESUMO Visando estabelecer estratégia de manejo de água durante os estádios vegetativo e reprodutivo da cultura, três experimentos foram conduzidos na Embrapa Hortaliças. Avaliou-se tensões de água no solo entre 5 e 125 kPa durante os referidos estádios de desenvolvimento. Plantas submetidas a maior déficit hídrico, durante o estádio vegetativo, apresentaram sistema radicular até 10 cm mais profundo que aquelas irrigadas mais freqüentemente. Maior produtividade de frutos foi atingida quando as irrigações foram realizadas de forma a não permitir tensões superiores a 30 kPa durante o estádio vegetativo e 12 kPa durante o reprodutivo. O teor de sólidos solúveis não foi afetado pelos diferentes regimes de irrigação. Palavras-chave: Lycopersicon esculentum, déficit hídrico, potencial matricial. ABSTRACT - Drip-irrigated processing tomato production under several soil water tensions during vegetative and fruit development phases. Aiming to establish irrigation scheduling strategies during vegetative and fruit development phases, three field experiments were carried out at Embrapa Vegetables, in Brasília, Brazil. Soil water tensions ranging from 5 to 125 kPa were evaluated during the two crop growing periods. Plants growing under higher water deficit, during vegetative phase, showed root system up to 10 cm deeper than those irrigated more frequently. Maximum fruit yield was reached when irrigations were performed to not allow soil water tensions above 30 kPa during vegetative phase and 12 kPa during fruit growing period. Total soluble solids content was not affected by the different irrigation treatments. Keywords: Lycopersicon esculentum, water deficit, matric potential. INTRODUÇÃO A irrigação por gotejamento é uma tecnologia poupadora de água e mitigadora de problemas fitossanitários, que começa a ser adotada efetivamente na produção de tomate industrial em áreas de cerrado de Minas Gerais e Goiás (Marouelli & Silva, 2002). Para que seja manejada de forma apropriada, evitando-se deficiência ou excesso de água, é necessário conhecer os efeitos do estresse hídrico nos diferentes estádios de desenvolvimento das plantas. Um parâmetro que possibilita estabelecer o momento adequado da irrigação, bem como estimar a quantidade de água a ser aplicada a cada irrigação, é a tensão crítica da água no solo, que pode variar com o estádio de desenvolvimento das plantas (Marouelli et al., 1991). Na literatura nacional são inexistentes recomendações sobre níveis críticos de tensão para a irrigação por gotejamento do tomateiro (Silva & Marouelli, 1999). O presente trabalho teve como objetivo estabelecer parâmetros para o manejo da irrigação por gotejamento em tomateiro, nas condições de cerrado, por meio da avaliação de tensões de água no solo durante os estádios vegetativo e reprodutivo da cultura. MATERIAL E MÉTODOS O estudo foi conduzido no campo experimental da Embrapa Hortaliças, em Brasília, DF, durante maio a outubro dos anos de 2001 a 2003, em Latossolo Vermelho distrófico, textura argilosa e capacidade de retenção de água de 1,1 mm/cm de solo. No primeiro experimento, foram avaliados nove tratamentos, dispostos em esquema fatorial 3 x 3, onde o primeiro fator correspondeu à tensão de água no solo no estádio vegetativo (15, 30 e 70 kPa) e o segundo à tensão no estádio reprodutivo (15, 30 e 70 kPa). No segundo, os tratamentos, aplicados durante o estádio vegetativo, consistiram de seis tensões de água no solo (6, 10, 15, 30, 60 e 120 kPa). No terceiro, os tratamentos consistiram de seis tensões de água no solo (5, 8, 12, 20, 45 e 100 kPa) aplicados durante o estádio reprodutivo. O estádio vegetativo correspondeu ao período entre o estabelecimento da cultura e o início da frutificação (do 8o ao 33o dia após o transplante), enquanto o reprodutivo daí até o início da maturação de frutos (do 34o ao 90o dia). Mudas de tomateiro foram transplantadas no espaçamento de 30 x 120 cm. As parcelas experimentais foram de 28,8 m2 (4 fileiras de 6,0 m), tendo sido colhido 5,0 m de cada uma das duas linhas centrais da parcela. No primeiro experimento foi utilizado o híbrido H9498, no segundo o AP533, e no terceiro o H9992. A adubação no sulco de plantio e via fertirrigação foi conforme Marouelli & Silva (2002). A irrigação foi realizada instalando-se uma lateral de gotejadores por linha de plantas. Os gotejadores, com vazão de 1,2 L.h-1, foram espaçados de 30 cm. Durante os estádios em que os tratamentos não foram aplicados, as irrigações foram uniformes, em todos os experimentos (Marouelli & Silva, 2002). O manejo de água durante os estádios em que os tratamentos foram aplicados foi com base na da tensão de água no solo, avaliada por tensiômetros instalados a 50% da profundidade efetiva do sistema radicular. As colheitas foram realizadas quando a taxa de maturação atingiu cerca de 95%. O delineamento experimental em todos os experimentos foi blocos ao acaso, com quatro repetições. As variáveis afetadas pelos tratamentos foram analisadas com regressão linear pelo método de polinômios ortogonais, tendo sido as tensões transformadas usando logaritmo com base decimal. RESULTADOS E DISCUSSÃO O número de irrigações ao longo do ciclo do tomateiro variou entre 30 e 235, enquanto a lâmina líquida total de água aplicada entre 230 a 360 mm. Durante a condução dos experimentos ocorreu, em média, 60 mm de chuva, sendo que durante os estádios em que os tratamentos foram aplicados a quantidade foi não significativa. No primeiro experimento, não houve interação significativa (p>0,05) entre os fatores estudados para nenhuma das variáveis avaliadas, o que permitiu que os fatores fossem avaliados independentemente. Embora tenham sido utilizados cultivares distintos em cada experimento, a resposta relativa dos mesmos foi semelhante, o que permitiu avaliar conjuntamente os efeitos para cada estádio. Para tal, os dados de cada variável foram normalizados tomando como base as médias das máximas de cada experimento. Estádio vegetativo A profundidade efetiva do sistema radicular do tomateiro, avaliada após a colheita, apresentou resposta linear positiva com a tensão de água no solo (Figura 1a), indicando que plantas submetidas a um maior déficit hídrico durante o estádio vegetativo apresentam raízes mais profundas do que aquelas irrigadas mais freqüentemente. O estande final apresentou resposta quadrática às tensões de água no solo durante o estádio vegetativo (Figura 1a), sendo que o maior número de plantas por unidade de área ocorreu para a tensão de 19 kPa. Para a tensão de 120 kPa houve expressiva redução de estande devido ao maior estresse hídrico a que as plantas foram submetidas. A produção de biomassa (massa seca da parte aérea, sem os frutos) foi reduzida linearmente quanto maior o déficit de água no solo a que as plantas foram submetidas (Figura 1b). Pela função de resposta ajustada, a maior produtividade de frutos comercializáveis foi obtida para a tensão de 30 kPa (Figura 1b). A massa de fruto (média de 78,0 g) e o número de frutos por planta (média de 44,7) não foram afetados pelos tratamentos. Nenhuma das variáveis de qualidade foi afetada pelos tratamentos. A taxa média de frutos podres foi de 3,4%, a de fruto verde de 5,6%, a acidez titulável de 0,31% de ácido cítrico, a firmeza de fruto de 0,34 kgf cm-2 e o teor de sólidos solúveis totais de 4,4%. As colheitas foram realizadas, em média, aos 113 dias após o transplante das mudas. Estádio reprodutivo O estande final (2,7 plantas/m2) não foi afetado pelos tratamentos. A produção de biomassa e o número de frutos comercializáveis, por unidade de área, foram reduzidas com o aumento da tensão (Figura 1c, d), enquanto a massa média de frutos foi maximizada para a tensão de 11 kPa (Figura 1d) e a produtividade de frutos foi maximizada para a tensão de 12 kPa (Figura 1c). A incidência de frutos podres (FP) apresentou resposta linear negativa com a tensão de água no solo [%FP = 7,0 - 2,204 Log(kPa); R2 = 0,56]. A mais alta taxa de frutos podres nos tratamentos irrigados mais freqüentemente deve-se, basicamente, ao maior tempo de contato dos frutos com a superfície molhada do solo e ao maior crescimento vegetativo da parte aérea, o que favoreceu um ambiente mais úmido no dossel vegetativo do tomateiro. A ocorrência de frutos verdes (média de 4,2%), a acidez titulável (média de 0,33% de ácido cítrico), o teor de sólidos solúveis totais (média de 4,8%) e a firmeza de fruto (média de 0,329 kgf cm-2) não foram afetados pelos tratamentos. As colheitas foram realizadas, em média, 117 dias após o transplante das mudas. LITERATURA CITADA MAROUELLI, W.A.; SILVA, H.R.; OLIVEIRA, C.A.S. Produção de tomate industrial sob diferentes regimes de umidade no solo. Pesquisa Agropecuária Brasileira, Brasília, v. 26, n. 9, p.1531-1537, 1991. MAROUELLI, W.A.; SILVA, W.L.C. Tomateiro para processamento industrial: irrigação e fertirrigação por gotejamento. Brasília: Embrapa Hortaliças, 2002. 32p. (Embrapa Hortaliças. Circular Técnica, 30). SILVA, W.L.C.; MAROUELLI, W.A. State of the art of irrigation research on processing tomatoes in Brazil. Acta Horticulturae, Leuven, Belgium, n.487, p.487-491, 1999. 1,3 1,5 Prod. comercial 1,7 1,9 Biomassa Tensão [log(kPa)] 135 -1 125 115 0,6 0,8 1,0 1,2 1,4 1,6 Tensão [log(kPa)] 1,8 2,0 -1 Biomassa (t.ha ) -1 115 2,2 Biom. = 2,900 - 0,336X Prod. = 100,3 + 66,848X - 30,914X2 72 2,3 105 120 2,9 120 Prod. = 170,7 - 140,010X + 137,820X2 - 40,682X3 (R2 = 0,85) Biom. = 3,02 - 0,429X (R2 = 0,79) 125 2,4 1,9 2,1 2,5 110 130 2,0 2,7 130 135 0,7 0,9 1,1 (D) 1,3 2 (R = 0,43) (R2 = 0,90) 1,5 1,7 110 1,9 Massa fruto Tensão [log(kPa)] N. fruto/m2 70 68 105 2,1 205 200 195 66 190 64 2,1 62 1,9 60 Massa = 60,9 + 18,589X - 8,785X2 N./m2 = 212,5 - 14,325X 0,7 0,9 1,1 1,3 185 (R2 = 0,74) (R2 = 0,68) 1,5 1,7 1,9 180 2,1 Tensão [log(kPa)] Figura 1. Profundidade efetiva do sistema radicular, estande final de plantas, produção de biomassa, produtividade, massa e número de frutos comercializáveis por unidade de área conforme a tensão de água no solo aplicada nos estádios vegetativo (1A e 1B) e reprodutivo (1C e 1D) do tomateiro. 2 (B) 1,1 140 o 0,9 (R = 0,84) (R2 = 0,75) 2,6 2,1 -1 2 o -2 2,3 40 35 1400,7 Produtividade (t.ha ) Stand (n .m ) 2,5 Biomassa Produtividade 2,7 45 Raiz = 31,1 + 7,045X Stand = 1,72 + 1,736X - 0,681X2 (C) 2,9 N fruto/m Stand final Massa fruto (g) Prof. raiz (cm) Produtividade (t.ha ) 2,8 (A) Biomassa (t.ha ) Prof, raiz (cm) 50