Um Estudo sobre o Conhecimento

Propaganda
Um Estudo sobre o Conhecimento
Gerardo Valdisio Rodrigues Viana
Universidade Federal do Ceará - Universidade Estadual do Ceará
Eliéser Sales Pereira
Faculdade Lourenço Filho
Resumo:
Este artigo apresenta uma revisão sobre os conceitos de conhecimento. Descreve a teoria e discute a
natureza e origem do conhecimento do ponto de vista das três doutrinas: o Racionalismo, o Empirismo e o
Criticismo. Conclui que a ciência não é dependente de um sistema filosófico, podendo fazer a aplicação
livre e integral de seu método de pesquisa e que as grandes realizações científicas não dependem das
genialidades individuais, mas do trabalho da comunidade científica.
Palavras-chave: Epistemologia, dogmatismo, empirismo, ceticismo, racionalismo.
1 INTRODUÇÃO
Epistemologia (do grego, episteme, “conhecimento”; logos, “teoria”), é o ramo da
filosofia que trata dos problemas filosóficos relacionados à teoria do conhecimento .
O sentido da palavra episteme é melhor compreendido se comparado com seu oposto,
doxa, ou “opinião” cujo significado é bem próximo a “senso-comum”; essa opinião tem a
conotação de conhecimento falso, ou baseado em algo falso, mal-construído ou inconsistente;
assim, doxa é aquele tipo de conhecimento que expressa não a verdade, mas sim determinado
ponto de vista parcial, mais comprometido com a subjetividade de quem o emite do que com a
verdade do assunto do qual trata.
Contrário à doxa, a episteme é o conhecimento, ou um enunciado comprometido com o
verdadeiro, e não com um ponto de vista subjetivo e parcial. Este termo foi introduzido por
filósofos alemães dentro da denominada Erkenntnistheorie ou teoria do conhecimento.
O ato de conhecer é a relação que se estabelece entre a consciência de quem conhece e o
objeto a ser conhecido (ARANHA e MARTINS, 2003).
O ponto de partida do conhecimento é a intuição que possibilita a invenção, a descoberta
e os grandes “saltos” do saber humano. A intuição pode ser sensível (conhecimento imediato
94
Revista Científica da Faculdade Lourenço Filho - v.6, n.1, 2009
dado pelos órgãos dos sentidos), inventiva (proveniente dos sábios, dos artistas ou dos
cientistas) e intelectual (esforço para captar diretamente a essência do objeto).
Outra forma é o conhecimento discursivo que se dá por meio de conceitos organizados
por etapas, encadeamento de idéias, juízos e raciocínios que levam à conclusão.
Todo conhecimento coloca o problema da verdade quando se verifica se o que está sendo
enunciado corresponde, ou não, à realidade. Os conceitos de “verdade” e “realidade” são
distintos; quando nos referimos a um objeto dizemos que ele é “real” e não que ele é
“verdadeiro” ou “falso”, pois estas denominações não estão no objeto e sim no juízo, ou no
valor de verdade da afirmação. “Algo é verdadeiro, quando é o que parece ser” (ARANHA e
MARTINS, 2003).
Tradicionalmente, na história da filosofia, o critério da verdade é a evidência; os gregos a
chamavam de aletheia, que significa “não-oculto”, ou o que é visto, ou ainda o que é evidente.
Para os filósofos medievais “a verdade é a adequação do nosso pensamento às coisas”;
nesse sentido o juízo é verdadeiro quando a representação é uma cópia fiel do objeto
representado.
Para René Descartes (1596–1650) “evidente” é toda idéia clara e distinta resultante da
intuição intelectual. Para Friedrich Nietzsche (1844–1900) é verdadeiro o que contribui para
fomentar a vida da espécie e falso tudo que é obstáculo ao seu desenvolvimento.
No pensamento contemporâneo, os filósofos se voltam para os estudos da linguagem e da
lógica, e buscam o critério da verdade na coerência interna dos argumentos, de modo que o
raciocínio seria válido se não apresentasse contradições.
O problema da possibilidade do conhecimento tornou-se fundamental para abordar o
conhecimento, em geral, na medida em que antes de perguntarmos “como se conhece ?” e “o
que se pode conhecer ?” devemos perguntar se “é ou não possível conhecer”. Os termos usados
pela Filosofia para as respostas possíveis à esta questão são: Dogmatismo, Ceticismo e
Pragmatismo .
O Dogmatismo é a doutrina ou atitude segundo a qual é possível atingir a certeza; ou seja,
dogma é a verdade absoluta e indiscutível de uma doutrina. Segundo Descartes “podemos
Revista Científica da Faculdade Lourenço Filho - v.6, n.1, 2009
95
adquirir conhecimentos seguros e universais e ter absoluta certeza disso” (WIKIPEDIAEpistemologia, 2008).
Na Religião, o dogmatismo corresponde ao conjunto de crenças que não admitem
contestação; na Filosofia, pode ser entendido de três formas: “a possibilidade de se conhecer a
verdade”, “a confiança nesse conhecimento” e a “submissão a essa verdade, sem
questionamentos”. O dogmático, de posse da verdade, se fixa nela e abdica de continuar a busca
de novos conhecimentos.
Desde a antiguidade, existem filósofos dogmáticos, como Parménides (515–440 a.C),
Platão (427–347 a.C) e Aristóteles (384–322 a.C). Para Immanuel Kant (1724–1804), o
dogmatismo é “toda atitude de conhecimento que consiste em acreditar na posse da certeza ou
da verdade antes de fazer a crítica da faculdade de conhecer”.
O Ceticismo é a atitude filosófica oposta ao dogmatismo, defendida por Pirro de Elis
(360–270 a.C), que duvida que seja possível um conhecimento firme e seguro. O termo
significa “investigação” ou “procura”, de forma que, o saber não consiste em alcançar a
verdade, mas somente procurá-la. O cético tanto “observa” e “considera” que conclui, nos casos
mais radicais, na impossibilidade do conhecimento. David Hume (1711–1776) se diz cético, ao
admitir que “estamos subjugados pelos sentidos e pelos hábitos, o que reduz as certezas à
probabilidades”.
Augusto Comte (1798–1857) diz que a vida humana existe em estado dogmático ou
cético, refletindo o antagonismo entre ambos, e acrescenta “ceticismo nada mais é do que uma
passagem de um dogmatismo anterior para um novo dogmatismo”.
O Pragmatismo surgiu nos EUA com os norte-americanos William James (1842–1910),
Charles Pierce (1839–1914) e John Dewey (1859–1952) quando afirmam que “a verdade de
uma proposição se estabelece a partir dos efeitos dos resultados práticos”; ao subordinar o
conhecimento a uma finalidade prática, eles mostram a utilidade e eficácia do conhecimento
para o homem.
Segundo Lakatos & Marconi (1990) os tipos de conhecimentos são: teológico que apoiase em doutrinas que contém proposições sagradas; filosófico que procura discernir entre o
certo e o errado tendo como fundamentação a razão humana; popular que é o conhecimento
96
Revista Científica da Faculdade Lourenço Filho - v.6, n.1, 2009
acumulado de tradições e experiências vividas e científico que é o conhecimento sistemático,
caracterizado pela capacidade de analisar, explicar, desdobrar, justificar, induzir e predizer.
A disciplina filosófica que trata do problema da fundamentação do conhecimento é a
Gnosiologia, ou Teoria do Conhecimento. Pode-se dizer que a Gnosiologia não produz
conhecimentos, mas reflete sobre os conhecimentos produzidos pelo sr humano, colocando
diversas questões e elaborando doutrinas acerca do modo como conhecemos, do que nos é
possível conhecer, o que torna um conhecimento válido, o que significa falar do progresso do
conhecimento e de suas aplicações práticas .
2 A ORIGEM DO CONHECIMENTO
O ponto básico da discussão é este: “qual a origem do conhecimento: a razão ou a
experiência?”. As respostas filosóficas a esta questão defendem três doutrinas: o Racionalismo,
o Empirismo e o Criticismo (FONTES, 2008).
O Racionalismo é a doutrina que afirma que tudo que existe tem uma causa inteligível,
mesmo que não possa ser demonstrada de fato. Privilegia a razão (conhecimento a priori) em
detrimento da experiência e considera a dedução como o método superior da investigação
filosófica. Os racionalistas afirmam que “a razão é a fonte principal do conhecimento” e suas
representações são as únicas que podem conduzir ao conhecimento logicamente necessário e
universalmente válido.
Relativo ao conhecimento a priori, surge o “apriorismo” que reflete a relação
epistemologia básica em que todo a atividade do conhecimento é exclusiva do sujeito; o meio
não participa dela. Aprioristas são, então, todos aqueles que pensam que as condições de
possibilidades do conhecimento são dados hereditários, obtidos de forma inata ou
predeterminados a priori. A Gestaltheorie (teoria da forma) trabalha sobre este pressuposto,
dentro da tradição do racionalismo alemão (BECKER, 1993).
Entre os filósofos que assumiram uma perspectiva racionalista do conhecimento,
destacam-se René Descartes, Benedictus Spinoza (1632–1677) e Gottfried Leibniz (1770–
1831) que introduziram o racionalismo na filosofia moderna. Immanuel Kant (KANT, 1989)
Revista Científica da Faculdade Lourenço Filho - v.6, n.1, 2009
97
revê essa tendência de associar o pensamento à análise pura e simples e inaugura o neoracionalismo que aceita os conceitos sustentados pela razão, mas identifica a necessidade de
relacioná-lo aos dados da experiência, ou do que ele denomina de razão prática, como forma de
ampliar o conhecimento.
O Empirismo é a doutrina filosófica segundo a qual todo o conhecimento, com exceção
do lógico e do matemático, deriva da experiência. Os empiristas negam a existência de idéias
inatas, admitindo que a mente esteja vazia antes de receber qualquer tipo de informação;
consideram que o conhecimento só é válido dentro dos limites da observação e rejeitam os
enunciados metafísicos devido à impossibilidade de teste ou controle.
Os ingleses Francis Bacon (1561–1626) e John Locke (1632–1704) são os precursores do
empirismo moderno que alia teoria e experiência; o escocês David Hume (1711–1776) introduz
o método experimental nas ciências morais, já Ludwig Wittgenstein (1889–1951) representa o
empirismo contemporâneo quando afirma que a Filosofia deve limitar-se à análise da
linguagem científica que expressa o conhecimento baseado na experiência.
O debate histórico entre racionalistas e empiristas, no final do século XVIII, conduziu ao
criticismo que procura superar as limitações de ambas correntes filosóficas.
Segundo Kant,o criador do Criticismo, todo o conhecimento começa com a experiência
mas é organizado pelas estruturas a priori do sujeito. Ele afirma que o conhecimento é a síntese
do dado na nossa sensibilidade e daquilo que o nosso entendimento produz, ou seja, o sujeito
conhece porque possui categorias e conceitos puros a priori, que se adequam a experiência e
que permitem conhecer; e completa, “não é a experiência que possibilita e quem forma as
categorias a priori; são antes estas que possibilitam a experiência” .
Levado às suas últimas conseqüências, o criticismo pode ser encarado como uma atitude
que nega a verdade de todo o conhecimento que tenha sido previamente submetido a uma
crítica em seus fundamentos; o termo é empregado para denominar a filosofia kantiana que se
propõe a investigar as categorias ou formas a priori do entendimento.
Alguns filósofos contemporâneos defendem que o conhecimento resulta de uma interação
entre o sujeito e a experiência; entre eles destaca-se Jean Piaget (1896–1980) que desenvolveu
98
Revista Científica da Faculdade Lourenço Filho - v.6, n.1, 2009
uma concepção construtivista quando diz que o conhecimento é um processo de construção de
estruturas que permitem ao sujeito apreender e interpretar a realidade.
3 A NATUREZA DO CONHECIMENTO
O problema da natureza do conhecimento consiste em saber se o que se conhece são os
próprios objetos ou uma idéia ou representação dos mesmos. A discussão de como ocorre o
conhecimento se dá essencialmente na questão de se saber de quem é a primazia na relação
sujeito/objeto. Nesse sentido surgem as seguintes respostas filosóficas: Realismo e Idealismo.
O Realismo defende que conhecer é apreender a realidade existente na experiência
interna (consciência) ou externa (objetos). Os objetos existem independentemente dos sujeitos
(FONTES, 2008).
Em um sentido geral, o realismo é uma tese sobre o problema epistemológico dos limites
do conhecimento contestado por doutrinas anti-realistas diversas, dependendo do tipo de
conhecimento em questão. O realismo científico sustenta que aquilo que as teorias científicas
afirmam acerca do mundo pode, de fato, representar conhecimento genuíno; o conhecimento
humano seria passível de avançar além dos limites do que é diretamente observável (CHIBENI,
2008).
O realismo científico recebeu formulações diferentes e, em geral, não equivalentes, por
parte dos filósofos que dele se ocuparam. Para Bas van Fraassen (1980), o realismo científico é
a tese segundo a qual "a ciência objetiva a nos fornecer, em suas teorias, uma estória
literalmente verdadeira de como é o mundo; e a aceitação de uma teoria científica envolve a
crença de que ela é verdadeira"
Essa tese filosófica tem sido negada de vários modos, o que leva a três tipos diferentes de
anti-realismo científico: a) Instrumentalismo – sustenta que as proposições da ciência que,
quando interpretadas literalmente, referem-se a coisas e processos não-observáveis, sendo na
verdade instrumentos de cálculo, predição, ou regras de inferência, que auxiliam a conexão e a
estruturação das proposições sobre os processos observáveis; b) Redutivismo – as proposições
teóricas da ciência são proposições legítimas, porém de fato referem-se indiretamente apenas ao
Revista Científica da Faculdade Lourenço Filho - v.6, n.1, 2009
99
que é observável, sendo, na verdade, abreviações para proposições mais complexas sobre
entidades e processos observáveis; não devem, portanto, ser interpretadas literalmente, mas
"reduzidas" a proposições por meio de certas convenções lingüísticas (regras de
correspondência) para que seu verdadeiro conteúdo empírico e significado se evidenciem; c)
Empirismo construtivo – doutrina anti-realista proposta por van Fraassen, segundo a qual as
proposições teóricas da ciência são proposições genuínas e devem ser interpretadas
literalmente; porém a determinação de seu valor de verdade não constitui o objetivo da ciência.
Observa-se que o instrumentalismo, o redutivismo e o empirismo construtivo são posições
realistas quanto aos objetos materiais ordinários (CHIBENI, 2008).
O Idealismo nega a existência do real. A realidade é reduzida a idéias; os objetos só
existem enquanto representações, ou seja, não têm uma existência independente. O
conhecimento resulta então da relação entre o sujeito e a representação que este faz do objeto; o
sujeito não tem acesso direto à realidade, uma vez que dessa realidade ele conhece apenas
representações. Ao contrário do realismo empírico do pensamento materialista que afirma que
todo o conhecimento se fundamenta na própria natureza dos objetos, o idealismo defende a tese
de que só há conhecimentos das idéias ou que a consciência é o fundamento do real.
Apesar de o idealismo remontar ao pensamento platônico, é Kant na sua “Crítica da
Razão Pura” que caracteriza o pensamento idealista que consiste na tese de que só há
conhecimento ontológico (realista) daquilo que a razão coloca previamente nas coisas. Diz-se
que o idealismo teve sua criação em Kant, seu apogeu em Johann Fichte (1762–1814), sua
maturidade em Friedrich Schelling (1775–1854) e sua consumação em Wilhelm Hegel (1770–
1831).
4 A EVOLUÇÃO DO CONHECIMENTO
A teoria do conhecimento investiga as condições do conhecimento verdadeiro. Na
Antiguidade e na Idade Média, o conhecimento estava vinculado aos problemas metafísicos. Na
Idade Moderna, o realismo metafísico dos gregos começa a ser criticado por filósofos como
Descartes, Locke e Hume que se ocupam de forma explícita e sistemática com questionamentos
100
Revista Científica da Faculdade Lourenço Filho - v.6, n.1, 2009
sobre origem, essência e certeza do conhecimento humano, culminando com a “Crítica da
Razão Pura” de Kant.
A evolução do conhecimento pode ser resumida assim: a primeira parte (Antiguidade e
Idade Média) trata da filosofia pré-socrática, da metafísica aristotélica, da filosofia medieval e
da questão dos universais; na segunda parte (Idade Moderna) observa-se o paradigma da
modernidade, o racionalismo cartesiano, o empirismo inglês e o criticismo kantiano; na terceira
parte (Idade Contemporânea - Século XIX) tem-se o cientificismo, o idealismo hegeliano, o
materialismo marxista e a ideologia e por último (quarta parte) debate-se a Crise da Razão, que
envolve a crise da modernidade e a crítica ao racionalismo; além do pragmatismo, neopragmatismo e iluminismo (ARANHA e MARTINS, 2003).
Atualmente, entretanto, os conceitos da razão e da crítica precisam ser examinados;
quando se fala em razão não mais é possível acreditar ingenuamente que ser racional é apenas
uma decorrência de ser humano. O paradigma da racionalidade moderna precisa ser contestado,
mas não por meio do irracionalismo e, sim pela atividade crítica da razão.
5 O CONHECIMENTO CIENTÍFICO
O conhecimento científico é uma conquista recente da humanidade, tendo surgido no
século XVII com a revolução de Galileu Galilei (1564–1642) (ARANHA e MARTINS,
2003).
No pensamento grego, ciência e filosofia achavam-se vinculadas, e somente vieram se
separar a partir da Idade Moderna. A ciência moderna nasce ao determinar seu objetivo
específico de investigação e ao criar um método confiável pelo qual seria feito o controle
desse conhecimento sistemático, preciso e objetivo, e que passou a ser chamado de método
científico.
Cada ciência se torna então, uma ciência particular, no sentido de delimitar um campo
de pesquisa e procedimentos específicos (conceito de demarcação). Porém, a partir do
século XX, surgem as ciências híbridas, tais como a bioquímica, a biofísica e a mecatrônica,
Revista Científica da Faculdade Lourenço Filho - v.6, n.1, 2009
101
com o objetivo de resolver problemas que exigem ao mesmo tempo o conhecimento de mais
de uma delas.
Não é conveniente imaginar o método científico como um conjunto de regras fixas; há
muito de engenhosidade no processo de descoberta e seleção das hipóteses. As ciências da
natureza se tornaram, então, rigorosas por serem altamente “matematizáveis” e por
utilizarem o método experimental, porém, no outro extremo encontram-se as ciências
humanas, onde algumas delas, no caso da Psicanálise, não fazem uso da experimentação.
David Hume (1711–1776) diz “não se pode inferir qualquer causa ou efeito sem auxílio
da observação ou da experiência” e acrescenta “a inferência não é intuitiva, nem demonstrativa,
e sim experimental”.
A investigação científica envolve além da observação, a hipótese, os tipos de raciocínio
usados pelos cientistas na sua proposição (indução, dedução ou analogia), o exame dos critérios
para julgar seu valor ou aceitabilidade (relevância e possibilidade de ser submetida a testes), a
compatibilidade com outras hipóteses já confirmadas, a experimentação e a generalização.
Karl Popper (1902–1994) diz que o cientista deve estar mais preocupado não com a
justificativa de sua teoria mas com o levantamento de possíveis maneiras de refutá-la pela
experiência (POPPER, 1981), e acrescenta “se não podemos provar que uma teoria universal é
verdade, podemos provar que ela é falsa” ou “o critério que define o status científico de uma
teoria é sua capacidade de ser refutada ou testada”.
Popper critica a psicanálise de Sigmund Freud (1856–1939), a teoria da história de Karl
Marx (1818–1883) e a psicologia individual de Alfred Adler (1870–1937) cujos universos
teóricos se restringem às explicações de seus idealizadores e não dão condições de
refutabilidade empírica (POPPER, 1972), pois não seria possível um tipo de comportamento
humano capaz de contradizê-los.
Para Thomas Kuhn (1922–1996), a ciência progride pela tradição intelectual representada
pelo paradigma (visão do mundo assumida pela comunidade científica) que fornece problemas
e soluções exemplares para a pesquisa futura; e acrescenta que “ao se alcançar o consenso, na
chamada ciência normal, o trabalho científico desenvolve-se a partir do paradigma adotado que
102
Revista Científica da Faculdade Lourenço Filho - v.6, n.1, 2009
dirige a resolução dos problemas e o acúmulo das descobertas”; no momento em que o
paradigma é questionado leva-se a uma “revolução científica” (KUHN, 1970).
Ao finalizar este capítulo, pode-se resumir e estabelecer as seguintes características do
conhecimento científico (SERRÃO e GRÁCIO, p.202-208): (a) Objetividade – a ciência intenta
afastar de seu domínio a subjetividade, no sentido de que o conhecimento deve ser válido para
todos; (b) Positividade – deve haver uma plena aderência aos fatos e uma absoluta submissão à
fiscalização da experiência; (c) Racionalidade – não obstante a oposição dos empiristas, a
ciência moderna é essencialmente racional, isto é, não consta de meros elementos empíricos,
mas de uma construção do intelecto; (d) Revisibilidade – não há posição definitiva e
irreformável, como já foi citado, “toda verdade científica aparece em certo sentido como
provisória, susceptível de revisão e de aperfeiçoamento”; (e) Autonomia – a ciência tem seu
próprio campo de estudo, seu próprio método de pesquisa e uma fonte independente de
informação que é a Natureza.
6 CONCLUSÃO
A origem do conhecimento é a razão, pois todas as idéias que culminam para as teorias
científicas tiveram origem no raciocínio humano e em sua inteligência; portanto, os
racionalistas “têm razão”. De acordo também com o neo-racionalismo de Kant, quando se
refere à “razão prática”, ou seja, como racionalista, entende-se que além das idéias originais, os
testes e observações em laboratório são necessários para obter a verdade de uma teoria, ou
quando não for possível, podem ser refutá-las, conforme sugere Popper (1981).
O enfoque relativo à evolução do conhecimento leva a concluir também que os empiristas
têm um papel importante nessa evolução, pois com as experiências realizadas sobre as
hipóteses originárias da razão as teorias são consolidadas. É fato que a Ciência está em
constante evolução e que suas verdades são sempre provisórias.
A “comunidade científica” que pode ser definida como um conjunto de indivíduos que se
reconhecem e são reconhecidos como possuidores de conhecimentos específicos nas suas áreas
Revista Científica da Faculdade Lourenço Filho - v.6, n.1, 2009
103
de investigação científica, contrapondo a até pouco tempo, em que as grandes realizações
científicas originavam-se das genialidades individuais.
Por fim, pode-se afirmar que em nenhum caso a ciência é dependente de um sistema
filosófico ou poderá encontrar numa tese filosófica uma barreira que impeça a priori a
aplicação livre e integral de seu método de pesquisa.
A study on knowledge
Abstract:
This article presents a review on the concepts of knowledge. Describes the theory and discusses
the nature and source of knowledge in terms of three doctrines: the Rationalism, Empiricism and the
Criticism. Concludes that the science is not dependent on a philosophical system, it can make a free and
full implementation of its research method and that the great scientific achievements do not depend of the
individual genius, but the work of the scientific community.
Keywords: Epistemology, pragmatism, empiricism, skepticism, rationalism.
REFERÊNCIAS
ARANHA, Maria Lúcia de A.; MARTINS, Maria Helena P. Filosofando, 3.ed. São Paulo:
Moderna, 2003.
BECKER, Fernando, A Epistemologia do Professor - O cotidiano da Escola, 6.ed. PetrópolisRJ: Vozes, 1993.
FONTES, Carlos. Teoria Filosófica sobre o Conhecimento. Disponível
<http://afilosofia.no.sapo.pt/11.Modelosexplicativos.1.htm>. Consultado em 24/02/2008.
CHIBENI, Silvio Seno .A inferência abdutiva e o realismo científico. Disponível em:
em:
104
Revista Científica da Faculdade Lourenço Filho - v.6, n.1, 2009
<http://www.unicamp.br/~chibeni/public/abdrea.htm>. Consultado em 24/02/2008.
KANT, Immanuel, Crítica da Razão Pura, 2.ed. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian,
1989.
KUHN, Thomas S., A estrutura das Revoluções Científicas, 5.ed. São Paulo: Perspectiva,
1970.
LAKATOS, Eva M.; MARCONI, Marina de A. Metodologia Científica, 2. ed. São Paulo:
Atlas,1990.
POPPER, Karl Raimund, A Lógica da Pesquisa Científica, São Paulo: Cultrix, 1972.
_________. Conjecturas e Refutações, 3.ed. Brasília: Editora da UnB, 1981.
SERRÃO, Joel ; GRÁCIO, Rui. Lógica e Teoria do Conhecimento, 2 ed. Lisboa: Livraria Sá
da Costa Editora, 1962.
WIKIPEDIA - Epistemologia. Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Epistemologia>.
Consultado em 24/02/2008.
Gerardo Valdisio Rodrigues Viana
Doutor em Ciência da Computação - UFC/USP
Professor associado - UFC/UECE
e-mail: [email protected]
Eliéser Sales Pereira
Mestre em Química Inorgânica, USP
Professor de Metodologia Científica e Monografia da Faculdade Lourenço Filho.
Especialista em Métodos e Técnicas de Ensino Superior, UFC.
e-mail: [email protected].
Rua Barão do Rio Branco, 2101 – Centro – Fortaleza – Ce. CEP: 60025-062.
Fone: 4009 6066.
Download