Brasília - DF 2012 1 EMBOLIZAÇÃO DE ARTÉRIA UTERINA EM PACIENTES QUE VISAM A PRESERVAÇÃO DO ÚTERO Belo Horizonte Julho/2012 2 MINISTÉRIO DA SAÚDE Secretaria de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos Departamento de Ciência e Tecnologia HOSPITAL DAS CLÍNICAS DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS EMBOLIZAÇÃO DE ARTÉRIA UTERINA EM PACIENTES QUE VISAM A PRESERVAÇÃO DO ÚTERO Belo Horizonte Julho/ 2012 Este estudo foi financiado pelo Departamento de Ciência e Tecnologia (DECIT/MS) e 3 não expressa decisão formal do Ministério da Saúde para fins de incorporação no Sistema Único de Saúde (SUS). Informações: MINISTÉRIO DA SAÚDE Secretaria de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos Departamento de Ciência e Tecnologia Esplanada dos Ministérios, Bloco G, Edifício Sede, 8° andar, sala 852 CEP: 70058-900, Brasília – DF Tel.: (61) 3315-3633 E-mail: [email protected] [email protected] Home Page: http://www.saude.gov.br/rebrats Elaboração: Silvana Márcia Bruschi Kelles Médica MsC NATSHC/UFMG Revisão Técnica Carlos Faria Santos Amaral Médico PhD NATS/UFMG Bibliotecária Mariana Ribeiro Fernandes 4 DECLARAÇÃO DE POSSÍVEIS CONFLITOS DE INTERESSE. Nenhum dos autores ou revisores recebe qualquer patrocínio da indústria ou participa de qualquer entidade de especialidade ou de pacientes que possam ser caracterizados como conflito. 5 RESUMO Intensidade da recomendação: Ai Miomas uterinos são os tumores benignos mais comuns entre as mulheres, com prevalência entre 5% a 21% e são a principal causa de histerectomia. São heterogêneos em tamanho, localização e número. Quanto à localização, podem se dividir em submucosos, intramurais ou subserosos. A maior parte das mulheres com miomas é assintomática, portanto a maioria dos tumores permanece sem diagnóstico. Quando há sintomatologia, o mais típico é o sangramento uterino aumentado. As opções terapêuticas para esses tumores, quando sintomáticos, incluem medicamentos ou intervenções cirúrgicas. Entre as intervenções cirúrgicas estão disponíveis a histerectomia aberta ou videolaparoscópica ou a miomectomia quando as condições são favoráveis e há desejo de preservação do útero. Há muitos estudos avaliando a associação entre miomatose uterina e infertilidade, mas seus dados são conflitantes. O mioma submucoso está associado à infertilidade, mas o mioma intramural parece estar associado somente quando leva à distorção da cavidade endometrial. Daí a dificuldade de se relacionar o tratamento desse tipo de mioma com a melhora na fertilidade. A embolização de artérias uterinas (EAU) envolve a injeção de pequenas partículas nos vasos sanguíneos que irrigam o mioma. A obstrução desses vasos leva à isquemia do tumor. O procedimento é realizado em sala de hemodinâmica, sob sedação ou bloqueio peridural, por médico com especialização em radiologia intervencionista. Para avaliar a eficácia e segurança da embolização de artérias uterinas em mulheres que desejam preservar o útero, foi realizada uma ampla busca nas bases The Cochrane Library (via Bireme), Medline (via Pubmed), CRD (Centre for Reviews and Dissemination), Tripdatabase, Scielo (via Bireme) e Lilacs (via Bireme). Foram encontradas duas metanálises que incluíram todos os ensaios clínicos randomizados existentes até a presente data sobre o tema. Os resultados demonstraram que as pacientes que realizaram EAU tiveram alta hospitalar significativamente mais cedo do que as submetidas a procedimentos cirúrgicos, entretanto apresentaram significativamente mais intercorrências, com necessidade de reintervenção. Mesmo assim, o grau de satisfação não diferiu entre os grupos. Na análise de desfechos relacionados à gestação e parto, os resultados mostraram melhores taxas para as pacientes submetidas à miomectomia. As indicações para EAU não estão claramente definidas. Mais estudos são necessários para determinar qual localização, o tamanho e o número de miomas ideal para melhor resposta a esta terapêutica. Por outro lado, existem intervenções seguras e já disponíveis para tratar as pacientes com miomatose uterina. Ainda não existem dados suficientes para concluir que a EAU é um procedimento seguro para mulheres que desejam preservar a fertilidade. O procedimento exige ainda disponibilidade de centro de alta complexidade e médicos altamente treinados, além de envolver custos expressivos. Recomendação: Recomendação fraca contra a tecnologia. i Representa revisão sistemática de ensaios clínicos controlados randomizados, que traduz boa intensidade de recomendação, baseada na tabela de nível de evidência do Oxford Centre for Evidence Based Medicine: http://www.projetodiretrizes.org.br/projeto_diretrizes/texto_introdutorio.pdf 6 7 SUMÁRIO CONTEXTO................................................................................................................. 9 PERGUNTA ............................................................................................................... 10 INTRODUÇÃO .......................................................................................................... 11 Aspectos epidemiológicos, demográficos e sociais. ................................................. 11 DESCRIÇÃO DA TECNOLOGIA A SER AVALIADA ............................................ 14 Embolização de artéria uterina ............................................................................. 14 Descrição das tecnologias alternativas consideradas padrão-ouro de comparação .... 14 Tratamento medicamentoso ................................................................................. 14 Tratamento cirúrgico ............................................................................................ 15 Preços .................................................................................................................. 16 BASES DE DADOS E ESTRATÉGIA DE BUSCA ................................................... 19 CRITÉRIOS DE SELEÇÃO E EXCLUSÃO DE ARTIGOS....................................... 20 AVALIAÇÃO DA QUALIDADE DA EVIDÊNCIA .................................................. 20 RESULTADOS DOS ESTUDOS SELECIONADOS ................................................. 21 Apresentação dos resultados dos estudos ................................................................. 21 Interpretação dos resultados..................................................................................... 24 Recomendações de agências internacionais de ATS................................................. 26 RECOMENDAÇÕES ................................................................................................. 28 REVISÃO ................................................................................................................... 28 REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 29 8 CONTEXTO Este Parecer Técnico-Científico (PTC) foi elaborado pela Área de Avaliação de Tecnologias em Saúde do DECIT/SCTIE/MS para avaliar as evidências científicas disponíveis atualmente acerca da eficácia e segurança da tecnologia em questão, visando ao bem comum e à eficiência do Sistema Único de Saúde (SUS). Este PTC tem a finalidade de subsidiar a tomada de decisão do Ministério da Saúde e dos demais gestores do SUS, e não expressa a decisão formal do Ministério da Saúde para fins de incorporação. 9 PERGUNTA O objetivo deste PTC é analisar as evidências científicas disponíveis atualmente sobre a eficácia e a segurança da embolização de artérias uterinas para pacientes portadoras de miomatose uterina que desejam preservar o útero. Para sua elaboração, estabeleceu-se a seguinte pergunta, cuja estruturação encontra-se apresentada no quadro 1 : Quadro 1: Pergunta estruturada para elaboração do PTC População Intervenção (tecnologia) Comparação Parâmetros Desfechos (resultados em saúde) Pacientes portadoras de miomatose uterina que desejam preservar o útero Embolização de artérias uterinas Tratamento medicamentoso – contraceptivos hormonais, agonistas GnRH Tratamento cirúrgico – miomectomia (histeroscópica, laparoscópica, aberta). Segurança e eficácia Melhora das taxas de fertilidade (nascidos vivos, gestações), diminuição das taxas de aborto. Melhora da qualidade de vida Tempo de internação Complicações no pós-operatório imediato e tardio Necessidade de reintervenção. Pergunta: A embolização de artérias uterinas em portadoras de miomatose é eficaz e segura com melhores taxas de fertilidade e qualidade de vida em comparação com alternativas medicamentosas ou cirúrgicas já disponíveis no SUS? 10 INTRODUÇÃO Aspectos epidemiológicos, demográficos e sociais. Miomas ou leiomiomas uterinos são tumores benignos de células musculares lisas. Sua etiologia ainda é desconhecida, mas há evidências de que estrógenos e progestógenos contribuem para seu crescimento; assim raramente aparecem antes da menarca e regridem após a menopausa. Miomas uterinos são os tumores benignos mais comuns entre as mulheres e a principal causa de histerectomia nos EUA. Sua prevalência varia entre 5% a 21% da população feminina. Parece haver risco associado à raça e a outros fatores como idade precoce da menarca, predisposição familiar e sobrepeso. Paridade e tabagismo podem ser fatores de proteção.1 Miomas uterinos são heterogêneos em tamanho, localização e número. Quanto à localização, os miomas podem se dividir em submucosos, quando estão dentro da cavidade endometrial ou causam distorção desta; intramurais que são lesões que não distorcem a cavidade e se desenvolvem no miométrio ou subserosos que predominantemente se estendem para fora do miométrio.2 A maior parte das mulheres com miomas é assintomática, motivo porque a maioria dos tumores permanece sem diagnóstico. Quando há sintomatologia, o mais típico é o sangramento uterino aumentado. Além disso, mulheres com miomas queixam-se mais frequentemente de dispareunia e dor pélvica não cíclica. As opções terapêuticas para esses tumores, quando sintomáticos, incluem medicamentos ou intervenções cirúrgicas. O tratamento medicamentoso para sangramento aumentado pode ser o contraceptivo oral ou progesteronas, apesar de não existirem evidências sobre sua eficácia no tratamento de miomas. Outras intervenções medicamentosas são os dispositivos intrauterinos que liberam levonorgestrel (DIUs com medicamentos) ou agonistas de GnRH. Entretanto, os DIUs com medicamentos não podem ser usados quando há distorção acentuada da cavidade uterina e a utilização dos agonistas de GnRH está limitada devido aos sintomas de hipoestrogenismo que provocam. De acordo com o desejo de procriação da paciente e a gravidade dos sintomas, os procedimentos cirúrgicos como miomectomia, ablação de endométrio ou histerectomia podem ser a melhor indicação. 11 Um grande estudo transversal foi levado a cabo envolvendo 21.746 mulheres entre 15 e 49 anos de sete países – Brasil, Canadá, França, Alemanha, Itália, Coréia do Sul, Reino Unido- e entre 18 e 49 anos dos Estados Unidos. Os autores encontraram prevalência de 7% de mioma relatado pelas mulheres brasileiras. Os sintomas mais frequentemente relacionados aos miomas foram períodos de sangramento menstrual mais prolongados e fluxo mais intenso; pressão sobre a bexiga ou intra-abdominal ou dor pélvica crônica. Outros sintomas relatados foram a dor em diferentes momentos do ciclo menstrual e/ou dispareunia. A maioria das mulheres recebeu o diagnóstico de mioma entre os 30 e 40 anos. O percentual de mulheres que recebeu tratamento medicamentoso para os sintomas após o diagnóstico variou entre 18,5% na Alemanha até 55,8% no Brasil, sendo os contraceptivos orais os mais prescritos. Aproximadamente metade das mulheres foi tratada por meio de abordagem cirúrgica, sendo a histerectomia a intervenção mais frequente, exceto na Itália e França onde as mulheres foram tratadas preferentemente por miomectomia. Entre as mulheres brasileiras portadoras de mioma, 10,1% (IC95% 7,3% a 13,5%) haviam sido histerectomizadas1. Embora esse estudo tivesse limitações metodológicas, por exemplo, tratava-se de um questionário respondido pelas próprias pacientes, mesmo considerando um possível viés de amostragem, pode ser usado como estimativa da prevalência e dos efeitos sobre a vida das pacientes provocados pela presença de miomas. Miomatose uterina e infertilidade Há muitos estudos avaliando a associação entre miomatose uterina e infertilidade, mas seus dados são conflitantes, principalmente devido a falhas metodológicas em seus delineamentos. 2 Foram selecionadas três metanálises que avaliaram a associação entre miomatose uterina e infertilidade. A primeira, publicada em 2009 por Pritts et al 2, procurou responder duas perguntas: miomas com tamanhos ou localizações específicas diminuem a fertilidade? A retirada de miomas aumenta a fertilidade? As conclusões foram que miomas submucosos diminuem a fertilidade e sua retirada por métodos intracavitários proporciona maiores taxas de nascidos vivos. Por outro lado, para miomas subserosos não foi encontrada associação com infertilidade de suas portadoras. Finalmente, para os miomas de localização intramural, os dados são controversos. Foi demonstrado que há associação entre a menor taxa de gestação e a presença de tumores intramurais, mas os estudos têm baixa qualidade metodológica. Por outro lado, não foram observados 12 benefícios, em termos de fertilidade, com a retirada desses miomas. Além disso, os autores discutem a propedêutica utilizada para classificar os miomas como intramurais, apontando para a possibilidade de subdiagnóstico de alterações da cavidade uterina. Essa alteração da cavidade poderia interferir na fertilidade e proporcionaria a reclassificação do mioma intramural para submucoso. A segunda metanálise publicada por Sunkara3 em 2010 avaliou a possível associação entre o mioma intramural e a fertilidade de pacientes submetidas a fertilização assistida. Embora tenha encontrado associação entre a presença de mioma intramural e a diminuição da taxa e nascidos vivos, sua metanálise envolvia apenas estudos observacionais. Além disso, não foi feita a análise de outros fatores de confusão, como o número de miomas e as causas de infertilidade. A terceira metanálise, publicada em 2011 por Metwally et al4, procurou avaliar novamente a associação entre o mioma intramural ou sua retirada e a fertilidade da mulher. Usando critérios mais estritos para classificação do mioma como intramural e ajustando a idade das pacientes, como fator de confusão, não foi encontrada associação entre a taxa de gestações, de nascidos vivos ou de abortos até 20 semanas e a presença de miomas intramurais. O único ensaio incluído que avaliou o efeito da retirada do mioma sobre a fertilidade também não mostrou alteração da fertilidade após a intervenção. Em síntese, existe associação positiva entre a presença de mioma submucoso e deformidade da cavidade uterina e infertilidade, sendo que a retirada desses miomas melhora a taxa de fertilidade. Claramente, os miomas subserosos não interferem nas taxas de fertilidade. A indicação de tratamento medicamentoso ou cirúrgico para essa classe de tumores não se relaciona com fertilidade. Finalmente, existem evidências conflitantes sobre a associação entre o mioma intramural e infertilidade, da mesma forma que a retirada de miomas nessa localização não altera taxas de nascidos vivos, gestações ou abortamento. 13 DESCRIÇÃO DA TECNOLOGIA A SER AVALIADA Embolização de artéria uterina A embolização de artérias uterinas (EAU) envolve a injeção de pequenas partículas nos vasos sanguíneos que irrigam o mioma. A obstrução desses vasos leva à isquemia do tumor. As candidatas à EAU devem ser submetidas a rigoroso exame ginecológico e de imagem que confirmem o diagnóstico de mioma uterino e excluam outras doenças pélvicas ou gestação.5 O procedimento é realizado em sala de hemodinâmica, por médico com especialização em radiologia intervencionista. O procedimento é feito sob sedação5 e bloqueio peridural6, com acesso por artéria femoral uni ou bilateral, acompanhado por angiografia com subtração digital e roadmap, utilizando contrastes de baixa osmolaridade ou não iônicos. Se possível, ambas as artérias uterinas são seletivamente cateterizadas até distalmente aos ramos alvo da embolização. Ambas as artérias são, então, embolizadas, geralmente com partículas. O objetivo é a oclusão de todos os ramos que alimentam distalmente o mioma. Uma vez posicionados os cateteres, procede-se a injeção das partículas embolizantes. A interrupção da injeção ocorre quando o intervencionista percebe a diminuição do fluxo da injeção do contraste nas artérias uterinas com a imagem de “poda de árvore” ou “end point”.6 A paciente é acompanhada por 24 a 48 horas para tratamento adequado da náusea e dor e avaliação de potenciais complicações imediatas. A eficácia do procedimento é medida após 3 a 6 meses, por meio de exames de imagem para verificar a redução do volume uterino e a diminuição do mioma.5 Descrição das tecnologias alternativas consideradas padrão-ouro de comparação Tratamento medicamentoso O tratamento medicamentoso é menos invasivo e é feito com contraceptivos orais ou agonistas e antagonistas de GnRH. Os contraceptivos orais têm bom efeito na diminuição do sangramento, principalmente em mulheres com miomas pequenos. Já os agonistas do GnRH, além de permitirem o controle satisfatório do sangramento, proporcionam redução do volume do útero e do mioma. Entretanto, esses medicamentos não podem ser usados cronicamente, por ocasionarem importante perda de tecido ósseo trabecular e, com sua retira, o mioma recupera rapidamente seu tamanho original, com 14 restabelecimento da sintomatologia. São medicamentos indicados para diminuição temporária do tumor antes de um procedimento cirúrgico.5 Tratamento cirúrgico A histerectomia é o tratamento mais comum para miomas uterinos, com a vantagem de ser um tratamento definitivo. É um procedimento que atinge alto grau de satisfação (90%) entre as pacientes. Sua limitação é o impacto sobre a fertilidade. Existem três estudos prospectivos, randomizados, comparando EAU e histerectomia. Todos mostram altas taxas de sucesso e de satisfação das pacientes para ambos os tratamentos, com manutenção de melhores escores de satisfação para a histerectomia com o passar dos anos.5 A miomectomia é uma alternativa cirúrgica que permite a conservação do útero. Como outros procedimentos mais conservadores, apresenta o risco de recorrência do mioma. Tanto para procedimentos laparotômicos como laparoscópicos, a taxa de recorrência varia entre 23% a 33%. Pelo menos dois estudos compararam miomectomia com EAU, com taxas de sucesso similares e tendência a menores efeitos adversos. Entretanto os estudos não eram randomizados. 5 A ablação de endométrio é usada para tratamento de sangramento uterino disfuncional (SUD) de várias etiologias, inclusive o mioma submucoso. Não está indicado para mulheres que desejam futura gestação. Para tratamento de SUD há relatos de até 95% de satisfação.5 Há poucos estudos sobre a oclusão laparoscópica de artéria uterina para tratamento de miomas. Dois pequenos estudos randomizados compararam oclusão laparoscópica com EAU, mostrando que o procedimento laparoscópico levava a menor permanência hospitalar e menor intensidade da dor, com resultados clínicos semelhantes avaliados após três meses.5 15 Preços Além da necessidade de uso de sala de hemodinâmica, com angiografia por subtração digital durante o procedimento, há necessidade de material para punção arterial, como introdutores valvados, cateteres e eventualmente microcatéteres. Além desses, devem ser usadas partículas embolizantes como partículas de álcool polivinil (PVA) ou microesferas de gelatina tris-acril, graduadas. A Tabela 1 mostra o número de procedimentos e a média de valor pago pelo SUS, por AIH, em 2011 para procedimentos relacionados ao tratamento de miomas. TABELA1. Número e valor de procedimentos cirúrgicos que podem estar relacionados ao tratamento de miomas, pagos pelo SUS durante o ano de 2011. Ano 2011 N° procedimentos Valor total R$ média/AIH R$ 0409060194 MIOMECTOMIA 5.884 3.272.327,77 556,14 0409060208 MIOMECTOMIA VIDEOLAPAROSCOPICA 223 100.644,20 451,32 9.463 4.739.376,36 500,83 0409060100 HISTERECTOMIA (VIA VAGINAL) 0409060127 HISTERECTOMIA SUBTOTAL 0409060135 HISTERECTOMIA TOTAL 0409060151 HISTERECTOMIA VIDEOLAPAROSCOPICA 6.142 3.739.374,35 608,82 60.176 40.601.526,23 674,71 270 137.002,79 507,42 FONTE: Dados retirados DATASUS, disponível em http://tabnet.datasus.gov.br/cgi/tabcgi.exe?sih/cnv/qiuf.def, acesso em 15/07/2012 Como o procedimento não está disponível no SUS, para estimarmos o seu custo fizemos uma composição de valores com procedimentos existentes. Para estimar o custo da arteriografia com subtração digital, parte integrante do procedimento, o valor desse exame foi recuperado do banco de dados TABNET. A Tabela 2 mostra o valor médio pago por exame de arteriografia seletiva por vaso, pelo SUS durante o ano de 2011. 16 TABELA2. Número e valor de exames que seriam necessários para a realização da embolização de artéria uterina Ano 2011 0210010142 ARTERIOGRAFIA SELETIVA POR CATETER (POR VASO) N° exames Valor total R$ 7.260 média/Exame R$ 1.462.962,60 201,51 FONTE: Dados retirados DATASUS, disponível em http://tabnet.datasus.gov.br/cgi/tabcgi.exe?sia/cnv/qauf.def, acesso em 15/07/2012 Quanto ao tipo de partículas para embolização, buscamos no site da ANVISA a descrição dos embolizantes e a validade de seu registro. TABELA3. Tipos de partículas para embolização e seu registro na Anvisa Descrição CONTOUR MICROPARTICULAS DE PVA PARA EMBOLIZACAO MICROESFERAS DE PVA PARA EMBOLIZAÇÃO SCITECH PARTICULAS DE PVA PARA EMBOLIZACAO BEAD BLOCK MICROESFERA PARA EMBOLIZACAO MICROESFERAS PARA EMBOLIZACAO BIOCOMPATIBLES DC BEADS MICROESFERAS PARA EMBOLIZACAO BIOCOMPATIBLES BEAD BLOCK Nº registro Data de vencimento 10341350316 06/10/2014 10413960162 26/05/2013 10212990054 80012280078 6/7/2014 26/12/2015 80012280086 02/04/2017 80012280096 14/04/2013 FONTE: Disponível em http://portal.anvisa.gov.br/wps/content/Anvisa+Portal/Anvisa/Inicio/Produtos+para+Saude, acesso em 16/07/2012 Para estimar o custo do material necessário para o procedimento, buscamos dados na tabela SIGTAP. O conjunto de insumos que mais se aproximou daquele necessário para embolização de artérias uterinas foi encontrado no procedimento 04.03.07.013-9 EMBOLIZAÇÃO DE TUMOR INTRA-CRANIANO OU DA CABEÇA E PESCOÇO. Nesse procedimento estão previstos um microcateter, um microguia, um frasco de partículas embolizantes e um fio guia 0,35. O procedimento tem custo unitário de R$1645,44, sendo R$1238,88 de serviços hospitalares e R$406,56 de honorários. Para estimar o valor incremental anual com a possível introdução da embolização das artérias uterinas no SUS, adotamos as seguintes premissas: O procedimento referência para preço do EAU foi a embolização de tumor intracraniano ou da cabeça e pescoço que requer os mesmos insumos para sua realização. Entretanto, a quantidade necessária de embolizante para a EUA é o 17 dobro, em média, da prevista no procedimento referência. Esse acréscimo não foi considerado para estimativa de custo, que seria de R$300,00ii. Utilizamos toda a produção anual de miomectomia aberta ou por vídeo do SUS – essa premissa tem o risco de superestimar as indicações da EAU porque pode incluir tratamento de mioma subseroso ou submucoso para os quais não está indicada a EAU. Utilizamos 60%7 da produção anual de histerectomia (total, subtotal e vaginal) como o percentual de histerectomias realizadas devido à presença de miomatose uterina. Considerando a necessidade equipamentos de alta complexidade, como sala de hemodinâmica, disponível apenas em grandes centros, foi realizada análise de sensibilidade para substituição dos procedimentos elegíveis por EAU em 10%, 30% e 50%. TABELA 4. Custo incremental com a substituição dos procedimentos atuais pela tecnologia proposta Procediment os elegíveis Miomectomi a Histerectomi a Total Númer o em 2011 6107 76051 82.158 Gasto no ano 2011 (R$) 3.372.972,0 0 49.217.280, 00 52.590.252, 00 Custo médio unitári o (R$) 2011 552,31 647,16 - Número (%) utilizado para cálculo 6.107 (100) 45.631(6 0) 51.738 Custo incremental (R$) para substituição dos procedimentos elegíveis por EAU Cenários(percentual de substituição) 10% 667.573,00 4.555.205, 00 5.222.778, 00 30% 50% 2.002.719,0 0 13.665.613, 00 15.668.333, 00 3.337.865,0 0 22.776.023, 00 26.113.888, 00 FONTE: Dados obtidos para fins de comparação de custos , disponível em http://sigtap.datasus.gov.br/tabelaunificada/app/sec/procedimento/exibir/0403070139/07/2012,acesso 16/07/2012. ii Disponível em http://www.abraidi.com.br/pdfs/Tabela_OPME_Republica%C3%A7%C3%A3o_694_18_fev_2011.pdf 18 BASES DE DADOS E ESTRATÉGIA DE BUSCA Foi realizada uma ampla busca nas bases The Cochrane Library (via Bireme), Medline (via Pubmed), CRD (Centre for Reviews and Dissemination), Tripdatabase, Scielo(via Bireme) e Lilacs (via Bireme), objetivando-se encontrar revisões sistemáticas ou, na falta dessas, ensaios clínicos randomizados, considerados as evidências científicas de melhor qualidade. Os termos utilizados nas buscas e os números de referências encontradas, selecionadas e disponíveis estão apresentados na tabela a seguir: TABELA 5. Pesquisa em bases de dados eletrônicas Base Termos Resultados Referências selecionadas Referências utilizadas The Cochrane Library (via Bireme) “Fibroid and embolization” 1 1 1 6 2 1 45 0 0 47 0 0 ("leiomyomatosis"[MeSH Terms] OR "leiomyomatosis"[All Fields]) AND ("quality"[All Fields] AND ("life"[MeSH Terms] OR "life"[All Fields])) 9 9 0 “uterine artery embolization” 42 2 2 14 2 0 9 0 0 1 0 0 ("uterine artery embolization"[MeSH Terms] OR ("uterine"[All Fields] AND "artery"[All Fields] AND "embolization"[All Fields]) OR "uterine artery embolization"[All Fields]) AND Meta-Analysis[ptyp] ("uterine artery embolization"[MeSH Terms] OR ("uterine"[All Fields] AND "artery"[All Fields] AND "embolization"[All Fields]) OR "uterine artery embolization"[All Fields]) AND Randomized Controlled Trial[ptyp] Medline (via Pubmed) (("uterine artery embolization"[MeSH Terms] OR ("uterine"[All Fields] AND "artery"[All Fields] AND "embolization"[All Fields]) OR "uterine artery embolization"[All Fields]) AND ("complications"[Subheading] OR "complications"[All Fields])) AND Clinical Trial[ptyp] Tripdatabase Centre for Leiomyoma and embolisation Reviews and Dissemination Scielo (via “Uterine AND artery AND embolization” Bireme) (((embolização OR embolization) AND Lilacs (via (artéria OR artery) AND (uterine OR Bireme) uterina)) AND clinical_trials))) 19 CRITÉRIOS DE SELEÇÃO E EXCLUSÃO DE ARTIGOS Foram selecionados somente as revisões sistemáticas e ensaios clínicos controlados que não haviam sido incluídos nas revisões sistemáticas e que comparassem a embolização de artéria uterina com alternativas cirúrgicas ou medicamentosas. Foram excluídos estudos abertos e ensaios, ainda que randomizados, que comparassem dois tipos de embolizante. Não foram incluídos, também, estudos observacionais como coortes e séries de casos, ou revisões narrativas e estudos de custo efetividade. Foi encontrada uma revisão sistemática na base de dados da Biblioteca Cochrane8 e uma revisão com metanálise na base de dados Medline (via Pubmed)9. Todos os ensaios clínicos que comparavam embolização com outras intervenções estavam contidos nas duas revisões sistemáticas. Na pesquisa por revisões sistemáticas no Tripdatabase foram encontradas duas avaliações de tecnologias em saúde. Uma avaliação do National Guideline Clearinghouse10 e uma do NICE11 (National Institute for Health and Clinical Excelence). Os resultados dos estudos disponíveis encontram-se detalhados no item “resultados”. AVALIAÇÃO DA QUALIDADE DA EVIDÊNCIA Para a avaliação da qualidade da evidência apresentada, utilizaram-se os modelos para avaliação da qualidade de revisões sistemáticas e ensaios clínicos randomizados propostos por Guyatt e colaboradores.12 As revisões sistemáticas selecionadas apresentam boa qualidade metodológica e nível de evidência “1A”*, por se tratar de revisão sistemática de ensaios clínicos. * Baseada na tabela de evidências do Oxford Centre for Evidence Based Medicine 20 TABELA 6. Avaliação da qualidade da evidência Estudo Busca Número de estudos incluídos Gupta 8 JK et al, 2012 EMBASE, OVID(Medline), Ovid PsycINFO, The Cochrane Central Register of Controlled Trials, metaRegister of Controlled Trials, ClinicalTrials.gov , Cochrane Library, Menstrual Disorders and Subfertility Group’s Specialised Register of controlled trials Onze artigos referentes a cinco estudosREST 2011, EMMY 2010, Ruuskanen 2010, Mara 2008 e Pinto 2003 van der Kooij 9 SM et al, 2011 EMBASE, MEDLINE, The Cochrane Register of Controlled Trials 11 estudos Qualidade dos estudos primários Todos os estudos incluídos eram ensaios clínicos randomizados sem cegamento (em um estudo-RESTfoi permitido que a paciente optasse por histerectomia ou miomectomia. Todos os estudos tinham amostras pequenas. Ensaios clínicos randomizados Conflitos de interesse Avaliação Perfil dos participantes Realizada por dois pesquisador es Mulheres sintomáticas com miomas uterinos (meno ou metrorragia, dor e sintomas relacionados) Três estudos compararam EAU com histerectomia. Um comparou EAU com histerectomia ou miomectomia e um estudo comparou EAU com miomectomia Nenhum conflito declarado Dois revisores independent es Mulheres sintomáticas portadoras de miomatose uterina EAU comparada com histerectomia ou miomectomia Não declarado Intervenção RESULTADOS DOS ESTUDOS SELECIONADOS Apresentação dos resultados dos estudos TABELA 7. Resultados de revisões sistemáticas ESTUDOS Gupta 8JK et al, 2012 TIPO DE ESTUDO/ POPULAÇÃO - Revisão sistemática - 11 artigos contendo os resultados de 5 ECR - 3 estudos compararam EAU com histerectomia291 mulheres -1 estudo, com 157 comparou EAU com histerectomia ou miomectomia -1 estudo com 121 mulheres comparou EAU com miomectomia (exclusivamente mulheres que queriam preservar a fertilidade). DESFECHOS Desfechos primários - Satisfação da paciente (entre 12 e 24 meses até 5 anos) -Nascidos vivos (apenas para estudos que compararam com cirurgias que preservava o útero). Desfechos secundários: -eventos adversos (complicações imediatas, necessidade de transfusão de hemoderivados), complicações imediatas e em longo prazo. - reintervenções -readmissões -custos (duração do procedimento, RESULTADOS OR (IC95%) Satisfação da paciente EAU X qualquer cirurgia entre 12 e 24 meses OR= 0,69, (0,40 – 1,21) com 5 anos OR=0,90 (0,45 a 1,80) Cirurgia específica: 12 a 24 meses -EAU X histerectomia: OR=0,63 (0,30 – 1,32) -EAU X histerec ou miomectomia:OR=0,55 (0,14 – 2,06) -EAU X miomectomia OR=1,05 (0,33 – 3,36) Resultados não significativos também para o acompanhamento de 5 anos. Nascidos vivos AEU X miomectomia 0,33 (0,11 – 1,00) Eventos adversos X qualquer cirurgia Intraoperatório: OR=1,15 (0,57 -2,29) Até um mês: OR=1,38 (0,55 – 3,50) Complicações maiores Até um ano – OR=0,61(0,31-1,22) Até 5 anos- OR=0,71(0,32-1,58) Complicações menores Até um ano –OR=2,41(1,56 – 3,72) 21 permanência hospitalar, retorno às atividades habituais) -Níveis de FSH pósprocedimento (como marcador de função ovariana) -taxa de recorrência do mioma* -gestações* *somente para cirurgias que preservam o útero) Necessidade de transfusão de sangue OR=0,06 (0,01-0,34) Eventos adversos X cirurgia específica EAU X histerectomia – sem diferença no intraoperatório, necessidade de transfusão e complicações maiores. Para complicações menores OR=2,75(1,59 – 4,76) EAU X histerec ou miomectomia Sem diferença para complicações menores até um ano e maiores até 5 anos. Para complicações maiores aos 5 anos OR=2,55(1,265,19) EAU X miomectomia Sem diferença para eventos intraoperatórios, complicações em um ou dois anos e necessidade de transfusão de sangue. Outras intervenções- qualquer cirurgia Maior necessidade de reintervenção para mulheres submetidas a EAU em dois anos OR=5,64(2,92 – 10,90) ou 5 anos OR=5,79(2,65 – 12,65) Outras intervenções-cirurgia específica Tanto para histerectomia isolada, histerectomia + miomectomia ou miomectomia isolada – maior necessidade de reintervenção no grupo EAU, com significância estatística Visitas de emergência ou readimissões EAU X qualquer cirurgia OR=2,48 (1,40-4,40) EAU X histerectomia OR=2,50 (1,38-4,51) EAU X miomectomia OR=2,21(0,20 – 25,09) Média da diferença na duração do procedimento Qualquer cirurgia – não foi avaliado EAU X histerectomia – Media -16,4 min (-26,04 a -6,76 min) EAU X miomectomia – Media -49,7 min (-58,76 a -40,64 min) Média na diferença na permanência hospitalar EAU X histerectomia média: 2,83 dias(-3,21 a -2,45) EAU X histerec ou miomectomia média -3,10dias (-3,65 a -2,55) EAU X miomectomia média -1,10 dias(-1,64 a -0,56 dias) Média na diferença no tempo para retorno às atividades diárias EAU X histerectomia média -24,28 dias (-27,59 a -20,98 dias) Nível de FSH EAU X qualquer cirurgia OR1,01(0,53 a 1,94) em dois anos Recorrência do mioma EAU X miomectomia OR=1,32 (0,38 – 4,57) Taxa de gravidez EAU X miomectomia OR=0,29(0,10 a 0,85) 22 ESTUDOS van der Kooij9 SM et al, 2011 TIPO DE ESTUDO/ POPULAÇÃO Revisão sistemática - 11 artigos publicados a partir de 4 ensaios clínicos randomizados, envolvendo 515 pacientes com menorragia causada por miomas uterinos. Todos os estudos, exceto Pinto 2003, mostraram os resultados pelo princípio de Intenção de Tratar. DESFECHOS RESULTADOS OR (IC95%) Resultados da cirurgia - intraoperatório -pós-operatório imediato -Permanência hospitalar -Retorno às atividades diárias -Dor e outros sintomas -complicações - necessidade de reintervenções -nível de hemoglobina -HRQOL -Satisfação da paciente Resultados intraoperatórios - Tempo operatório foi menor para EAU tanto comparado com histerectomia/miomectomia; média da diferença -16,40 (-26,04 a -6,76), quanto para a miomectomia isolada: média -49,70 (-58,76 a -40,64) Necessidade de transfusão de sangue menor no grupo EAU: média -405,20 ml (-512,71 a -297,69) Complicações intraoperatórias – diferença não significante estatisticamente Resultados imediatos (primeiras 24 horas, durante internação ou até 30 dias) Febre < no grupo EAU OR 0,21 (0,07 – 0,66) Necessidade de transfusão de sangue <EAU comparada à histerectomia com p<0.001; sem diferença entre os grupos quando comparado à miomectomia – p=0,32. Permanência hospitalar < EAU em comparação 120 tanto para histerectomia quanto para miomectomia, com p< 0,001. Dor < EAU comparado à histerectomia nas primeiras 24 horas e sem diferença entre os grupos considerando toda a permanência hospitalar. Resultados tardios (entre 30 dias e 6 meses) Taxa de readmissão > EAU comparada com histerectomia: diferença no número de pacientes readmitidos no hospital=6,00 (1,14 a 31,53), p=0,03. Consultas de urgência- similar nos dois grupos Febre = similar nos dois grupos Complicações > EAU comparado com histerectomia (61,7% VS 41,3%, P=0,01); mas semelhante se comparado ao grupo miomectomia. Sintomas > EAU comprado à histerectomia/miomectomia, P=0,004. Retorno às atividades: mais rápido no grupo EAU comparado com qualquer cirurgia, P<0,01. Satisfação da paciente: similar nos dois grupos Resultados com um ano Reintervenções > no grupo EAU que no grupo histerectomia: OR 5,78 (2,14 a 15,58) Sintomas (sangramento, dor, pressão) > EAU com P=0,03. Nível de hemoglobina mais alto no grupo histerectomia, P=0,001. Taxa de complicações; semelhante nos dois grupos Níveis de FSH: semelhante para os dois grupos Satisfação e HRQOL: semelhante nos dois grupos. Resultados com dois anos Reintervenções > EAU, P=0,002 Hemoglobina mais alta no grupo histerectomia: P=0,02 Dor e outros sintomas correlatos: semelhante para os dois grupos Nível de FSH: semelhante para os dois grupos HRQOL: semelhante para os dois grupos Satisfação das pacientes: maior no grupo histerectomia – P=0,02 Resultados com cinco anos Reintervenções > EAU, OR 5,41 (2,48 – 11,81) HRQOL: semelhante nos dois grupos Sintomas da menopausa: semelhantes nos dois grupos. Satisfação das pacientes: semelhante nos dois grupos. 23 Interpretação dos resultados A revisão da Cochrane8 mostrou que a EAU é efetiva para tratamento de miomatose uterina, comparada com histerectomia ou miomectomia. A satisfação das pacientes foi similar nos dois grupos, apesar maior taxa de complicações pós-operatórias e da necessidade de reintervenções no grupo EAU. A satisfação do paciente é um aspecto subjetivo, sujeito a viés de informação. Mesmo utilizando questionários validados, como HRQOL e EuroQOL, há risco de viés pela falta de mascaramento. O impacto sobre a fertilidade foi abordado apenas em um estudo e mostrou significância estatística limítrofe, favorecendo a miomectomia, assim como maior número de gestações nesse grupo. A taxa de gestação após EAU foi de 50%, de nascimentos 19% e de abortos 53%, comparada com 78%, 48% e 25% respectivamente no grupo submetido à miomectomia. Essa diferença foi estatisticamente significativa (P<0,05).8 Esse é provavelmente o evento limitante para a inclusão da tecnologia. A intervenção com preservação do útero pressupõe o desejo de manter a fertilidade. Nesse aspecto, até o momento, a miomectomia mostrou-se mais eficaz. A EAU mostrou vantagens em termos de permanência hospitalar, retorno mais rápido às atividades e menor necessidade de tranfusão de sangue. Não houve diferença em termos de complicações maiores, tanto em curto como em longo prazo. Entretanto, o número de complicações menores foi estatisticamente maior no EAU, tanto em curto como em longo prazo. A necessidade de reintervenção cirúrgica foi cinco vezes maior no grupo EAU.8 Esses resultados se aplicam a mulheres na peri-menopausa, com menorragia causada por miomatose uterina, confirmada por ultrassom ou RNM e com indicação de abordagem cirúrgica, incluídas nos estudos que serviram de base para a revisão. Incluiu-se, nesse PTC, a revisão sistemática de van der Kooij9 que, embora envolvesse os mesmos estudos da revisão anterior, apresentava análise detalhada de aspectos que não foram abordados na primeira revisão. Nessa metanálise foram encontrados resultados que favorecem a EAU em curto prazo como menor permanência hospitalar e menor tempo para retorno às atividades diárias. Mas a necessidade de reintervenção, tanto em curto como em longo prazo, manteve-se maior no grupo EAU. Os níveis de hemoglobina foram menores no grupo EAU, entretanto essa diferença não apresentou repercussão clínica. O nível de FSH não variou entre os grupos, sugerindo que a EAU 24 afeta a função ovariana da mesma forma que a histerectomia. Os autores decidiram não avaliar a taxa de gestações pós-procedimento porque as mulheres incluídas tinham idade >45 anos e os estudos não haviam sido delineados para avaliar esse desfecho. Nessa metanálise9, diferente da revisão Cochrane,8 os autores decidiram não dividir os resultados entre os subgrupos histerectomia e miomectomia, e os apresentaram como resultados de “cirurgia”. Uma importante limitação apontada pelos autores é o fato de a maioria dos estudos envolverem histerectomia ou miomectomia por via laparotômica, sendo que, atualmente, a maior parte desses procedimentos é realizada por via laparoscópica. É possível que a comparação com o acesso laparoscópico diminua a diferença em termos de permanência hospitalar e eventos adversos no pós-operatório imediato. Entretanto, pela produção observada no ano de 2011 no SUS, a via laparotômica foi usada em 99,4% das cirurgias. Portanto, os dados dos estudos avaliados nessas revisões são aplicáveis para a população alvo desse PTC. Finalmente, a EAU implica em disponibilidade de centros de referência de alta tecnologia, hoje disponibilizados pelo SUS apenas para neurocirurgia intervencionista ou para o tratamento de doenças coronarianas, além de outros poucos procedimentos que impactam fortemente na sobrevida do paciente. O acesso à alta tecnologia e consequente alto custo para afecções tão prevalentes como os miomas uterinos e com repercussão clínica efetivamente menor que a síndrome coronariana aguda ou o aneurisma cerebral tem que ser cuidadosamente avaliado pelos gestores. Ainda sobre a miomatose uterina, os estudos mostraram ganhos marginais em desfechos, quando os há, significando que existem alternativas aceitáveis do ponto de vista clínico, sem prejuízo para a paciente. Quanto ao principal motivo para preservação do útero, que é a manutenção da fertilidade, a EAU não mostrou trazer qualquer benefício em relação à intervenção alternativa, a miomectomia. Entretanto esse resultado foi baseado em um único ensaio com poucas pacientes e mais estudos sobre esse tema precisam ser realizados para uma conclusão definitiva. A incidência de complicações é baixa, com complicações maiores em 3% dos casos. Cerca de 10% das pacientes necessitam reinternação para controle da dor. Pode ocorrer amenorreia em 10% das pacientes e a amenorreia permanente parece ser dependente da idade, com risco de até 20% para mulheres acima de 45 anos.5 Como em outras intervenções que preservam o útero, o período de alívio dos sintomas é incerto após a EAU. Os melhores resultados parecem ocorrer com mulheres 25 apresentando sangramento uterino disfuncional e miomas pequenos. De modo geral há recorrência dos sintomas em 20% a 25% das pacientes entre 5 a 7 anos após a EAU.5 A possibilidade de gestação após a EAU é ainda incerta, e os estudos com amostras pequenas não permitem avaliação adequada dos riscos. Estudos comparando o impacto sobre a fertilidade da EAU versus miomectomia mostraram que mulheres submetidas à EAU tinham mais risco de parto prematuro, apresentação pélvica, hemorragia pós-parto e aborto espontâneo. Outro estudo prospectivo mostrou melhores desfechos para a miomectomia em termos de sucesso na gestação e diminuição de abortamento precoce.5 A EAU no tratamento da adenomiose é também controversa, com taxas de recorrência após dois anos de até 50%. 5 Recomendações de agências internacionais de ATS Em 2009, a National Guidelines Clearinghouse, do U.S. Department of Health and Human Services realizou revisão sobre a EAU, com as seguintes considerações e recomendações10: Não existem critérios para seleção de candidatos à EAU como tamanho do mioma ou gravidade dos sintomas. A presença e localização do mioma devem ser confirmadas por ultrassonografia ou RNM e sua associação com a sintomatologia deve ser determinada. Consentimento informado é necessário com discussão de complicações potenciais, riscos e benefícios e discussão sobre intervenções alternativas. Contato com o médico assistente deve ser disponibilizado no pós-operatório imediato. O seguimento clínico é responsabilidade do radiologista intervencionista. Exames de imagem devem ser disponibilizados, caso haja dúvidas sobre a evolução no pós-operatório. Sintomatologia do mioma varia conforme sua localização, sendo sangramento mais frequente no mioma submucoso e efeitos de massa (pressão, aumento da frequência urinária ou constipação) no mioma intramural. Não foram estabelecidos critérios de contraindicação para a EAU. Algumas, como gestação, infecção, suspeita de malignidade, distúrbios de coagulação, alergia a contraste e insuficiência renal estão bem estabelecidas. 26 Existe uma contraindicação relativa para a EAU que é o desejo de manutenção da fertilidade, o que não pode ser sustentado pela literatura até o momento. Outra contraindicação relativa é o uso concomitante de hormônios agonistas do GnRH que parecem impactar no sucesso técnico do procedimento. Endometriose ou adenomiose extensa podem coexistir com miomas e a EAU não oferece benefícios nessas situações. Mioma subseroso pedunculado apresenta risco de se destacar do útero, situação em que necessitaria intervenção cirúrgica. Segundo essa agência, a EAU está indicada para miomas que causam sintomas que interferem com a vida diária, principalmente efeito de massa sobre bexiga e intestino, associado à dismenorreia grave ou anemia grave. Há dúvidas no que se refere ao potencial de fertilidade e viabilidade do procedimento comparado com alternativas medicamentosas ou cirúrgicas. Riscos potencias com a EAU: Amenorreia transitória ou permanente. Expulsão transcervical do mioma Endometrite não infecciosa Infecção do útero ou endométrio Trombose profunda ou embolia pulmonar Necrose uterina Embolização de outras estruturas Exposição à radiação da fluoroscopia Óbitos secundários à infecção ou tromboembolismo pulmonar. Em 2010 o National Institute for Health and Clinical Excellence11 publicou seu protocolo para EAU, tomando como base não só ensaios clínicos randomizados, mas também séries de casos. As recomendações do NICE sobre EAU são as seguintes: Os resultados em curto e médio prazo da EAU são promissores indicando ser um procedimento tão seguro quanto as alternativas cirúrgicas para alívio dos sintomas e do sangramento aumentado. Para mulheres com miomas sintomáticos, EAU pode ser considerada como uma opção de tratamento. 27 A EAU para pacientes portadoras de miomas sintomáticos que desejam engravidar, só deve ser oferecida após discussão detalhada. Além da dificuldade de gestação, os riscos aumentados de cesariana e a possibilidade de gravidez complicada devem estar muito claras para a paciente. Há contraindicação de EAU para mulheres com infecção presente ou recente, para mulheres que não desejam histerectomia em nenhuma circunstância ou quando há dúvidas sobre a etiologia benigna do tumor. O diagnóstico acurado pré-tratamento é essencial. O procedimento só deve ser realizado por radiologista com especialização em embolização e treinamento apropriado. RECOMENDAÇÕES Apesar de alguns resultados favoráveis, como menor permanência hospitalar e menor necessidade de transfusão de sangue, a EAU apresenta resultados de satisfação da paciente e resolução de sintomas muito semelhantes àqueles observados com outras intervenções. Além disso, apresenta significativamente maior necessidade de reintervenção. As indicações para EAU não estão claramente definidas. Mais estudos são necessários para determinar qual localização, o tamanho e o número de miomas ideal para melhor resposta a esta terapêutica. Ainda não existem dados suficientes para concluir que a EAU é um procedimento seguro para mulheres que desejam preservar a fertilidade. Considerando que existem intervenções seguras e já disponíveis para tratar as pacientes com miomatose uterina, o procedimento, para ser recomendado, deveria oferecer claros benefícios adicionais. Isso não foi verificado nessa revisão. O procedimento exige ainda disponibilidade de centro de alta complexidade e médicos altamente treinados, além de envolver custos expressivos. Recomendação fraca contra a tecnologia REVISÃO Recomenda-se o monitoramento de estudos sobre a manutenção da fertilidade nas pacientes submetidas à EAU. Localizamos um estudo francês, ainda não publicado, sobre a avaliação de fertilidade de mulheres submetidas à EAU, com idade inferior aos estudos disponíveis até o momento. 28 REFERÊNCIAS 1. Zimmermann A, Bernuit D, Gerlinger C, et al. Prevalence, symptoms and management of uterine fibroids: an international internet-based survey of 21,746 women. BMC Womens Health 2012; 12:6. 2. Pritts EA, Parker WH, Olive DL. Fibroids and infertility: an updated systematic review of the evidence. Fertil Steril 2009; 91(4):1215-23. 3. Sunkara SK, Khairy M, El-Toukhy T, et al. The effect of intramural fibroids without uterine cavity involvement on the outcome of IVF treatment: a systematic review and meta-analysis. Hum Reprod 2010; 25(2):418-29. 4. Metwally M, Farquhar CM, Li TC. Is another meta-analysis on the effects of intramural fibroids on reproductive outcomes needed? Reprod Biomed Online 2011; 23(1):2-14. 5. Burke CT, Funaki BS, Ray CE, Jr., et al. ACR Appropriateness Criteria(R) on treatment of uterine leiomyomas. J Am Coll Radiol 2011; 8(4):228-34. 6. Bernardo A, Gomes MT, Castro RA, et al. [Impact of the myoma arterial embolization by uterine volume, diameter myoma greater and in the ovarian function]. Rev Bras Ginecol Obstet 2011; 33(8):201-6. 7. Sória HLZ, Fagundes DJ, Sória-Vieira S, et al. Histerectomia e as doenças ginecológicas benignas: o que está sendo praticado na Residência Médica no Brasil? Rev. Bras. Ginecol. Obstet. 2007; 29(2):67-73. 8. Gupta JK, Sinha A, Lumsden MA, et al. Uterine artery embolization for symptomatic uterine fibroids. (Cochrane Database Systematic Review). In: The Cochrane Library, n.5, 2012. Oxford: Update Software. CD005073. 29 9. van der Kooij SM, Bipat S, Hehenkamp WJ, et al. Uterine artery embolization versus surgery in the treatment of symptomatic fibroids: a systematic review and metaanalysis. Am J Obstet Gynecol. 2011; 205 (4): 317 e1-18. 10. Hovsepian DM, Siskin GP, Bonn J, et al. Quality improvement guidelines for uterine artery embolization for symptomatic leiomyomata. J Vasc Interv Radiol. 2009; 20 (7 Suppl): S193-9. 11. National Institute for Tealth and Clinical Excellence - NICE. Interventional procedure overview of uterine artery embolisation for fibroids.2010. [Acesso em 14 jul.2012] Disponível em http://www.nice.org.uk/nicemedia/live/11025/51706/51706/pdf 12. Guyatt G, Rennie D. Diretrizes para utilização de literatura médica: fundamentos para prática clínica da medicina baseada em evidências. Porto Alegre: Artmed, 2006. 416p. 30